Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Catalogação na Fonte Elaborado por: Josefina A. S. Guedes Bibliotecária CRB 9/870 C737 2018 Comportamento animal: uma introdução aos métodos e à ecologia comportamental / Cristiano Schetini de Azevedo, Luciana Barçante, Camila Palhares Teixeira (Organizadores). - 1. ed. - Curitiba: Appris, 2018. 221 p. ; 27 cm (Animais; zoologia) Inclui bibliografias ISBN 978-85-473-1641-9 1. Animais – Comportamento. I. Azevedo, Cristiano Schetini de, org. II. Barçante, Luciana, org. III. Teixeira, Camila Palhares, org. IV. Título. V. Série. CDD 23. ed. 591.5 Livro de acordo com a normalização técnica da ABNT. Editora e Livraria Appris Ltda. Av. Manoel Ribas, 2265 – Mercês Curitiba/PR – CEP: 80810-002 Tel: (41) 3156-4731 | (41) 3030-4570 http://www.editoraappris.com.br/ http://www.editoraappris.com.br/ Editora Appris Ltda. 1ª Edição - Copyright© 2018 dos autores Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda. Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98. Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores. Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010. FICHA TÉCNICA EDITORIAL Augusto V. de A. Coelho Marli Caetano Sara C. de Andrade Coelho COMITÊ EDITORIAL Andréa Barbosa Gouveia (UFPR) Jacques de Lima Ferreira (PUCPR) Marilda Aparecida Behrens (UFPR) Ana El Achkar (UNIVERSO/RJ) Conrado Moreira Mendes (PUC-MG) Eliete Correia dos Santos (UEPB) Fabiano Santos (UERJ/IESP) Francinete Fernandes de Sousa (UEPB) Francisco Carlos Duarte (PUCPR) Francisco de Assis (Fiam-Faam, SP, Brasil) Juliana Reichert Assunção Tonelli (UEL) Maria Aparecida Barbosa (USP) Maria Helena Zamora (PUC-Rio) Maria Margarida de Andrade (Umack) Roque Ismael da Costa Güllich (UFFS) Toni Reis (UFPR) Valdomiro de Oliveira (UFPR) Valério Brusamolin (IFPR). EDITORAÇÃO Lucas Andrade ASSESSORIA EDITORIAL Jhary Artiolli DIAGRAMAÇÃO Isabelle Natal CAPA Andrezza Libel REVISÃO Thayse Betazzi Lummertz GERÊNCIA COMERCIAL Eliane de Andrade COMUNICAÇÃO Ana Carolina Silveira Carlos Eduardo Pereira Igor do Nascimento Souza GERÊNCIA DE FINANÇAS Selma Maria Fernandes do Valle GERÊNCIA ADMINISTRATIVA Diogo Barros COMUNICAÇÃO Carlos Eduardo Pereira | Igor do NascimentoSouza LIVRARIAS E EVENTOS Milene Salles | Estevão Misael CONVERSÃO PARA E-PUB Carlos Eduardo H. Pereira Às nossas famílias e aos amigos pelo suporte; aos mestres pelos ensinamentos. AGRADECIMENTOS Esta obra é fruto de muito trabalho e pesquisa. Horas e horas de coleta de dados, de experiências e descobertas. Assim, seria difícil agradecer a todas as pessoas que contribuíram para que esta obra chegasse a suas mãos. Agradecemos às instituições que dão suporte à pesquisa: instituições financiadoras das pesquisas brasileiras e estrangeiras, intituições de ensino superior, instituições mantenedoras de fauna e instituições particulares. Aos revisores do texto, que ajudaram no seu melhoramento. Aos profissionais e alunos, que, com seu entusiasmo, tentam melhorar a vida dos animais que estudam. Aos animais, que em suas diversas formas, cores, tamanhos e hábitos nos encantam a cada dia. APRESENTAÇÃO O estudo do comportamento animal no Brasil vem crescendo nos últimos anos. Apesar disso, a maior parte das espécies brasileiras ainda não foi estudada, sendo seus comportamentos conhecidos apenas anedoticamente. Apesar do aumento expressivo de pessoas estudando o comportamento animal no País, a literatura nacional sobre o tema é ainda escassa. Esse foi o principal aspecto que motivou os organizadores a convidarem diversos pesquisadores da área a produzirem esta obra. Com ela, aspectos básicos e avançados sobre o comportamento dos animais são fornecidos, com linguagem acessível e utilizando as espécies brasileiras na maior parte dos exemplos citados. Assim, na presente obra, o leitor terá acesso a informações sobre: o que é o comportamento animal e como ele evolui e se desenvolve; como realizar um estudo sobre comportamento animal utilizando a metodologia científica; os principais métodos de coleta de dados comportamentais, tanto para espécies terrestres quanto para espécies aquáticas; como e onde obter referências bibliográficas adequadas para nutrir os estudos, além das bases fundamentais do comportamento animal. Esperamos que esta obra seja adotada não apenas por estudantes de ensino superior, mas também pelos demais estudantes, profissionais, leigos e entusiastas do comportamento animal. Os organizadores PREFÁCIO Eu tive a grande sorte na minha vida de trabalhar durante 12 anos no Brasil estudando o comportamento de seus animais maravilhosos. No entanto o ensino dessa tão interessante disciplina para estudantes universitários no Brasil foi dificultado pela falta de livros didáticos adequados. Os autores deste livro produziram algo que faltava há muito tempo: um livro sobre comportamento animal escrito por brasileiros para brasileiros. Por que isso é importante? A maioria dos livros escritos sobre o comportamento animal diz respeito ao estudo da fauna na Europa ou da América do Norte. A fauna brasileira é maravilhosamente única e diferente, sem mencionar que é incrivelmente diversificada. Além disso, o Brasil é o lar de uma ampla gama de habitats diferentes. Os autores trazem para este livro seu vasto conhecimento da vida selvagem brasileira e os métodos necessários para estudá-la. Dada a importância do estudo do comportamento animal e a importância da fauna brasileira, este livro é uma leitura essencial para todos os estudantes de Ciências Biológicas no Brasil. Naturalmente, os estudos clássicos de comportamento animal de todo o mundo também foram mencionados. Neste livro, os autores conseguiram transmitir seu grande entusiasmo pelo estudo do comportamento animal, o que torna sua leitura um prazer. Agradeço aos autores, por escreverem este livro, em nome de todos os alunos que o lerão e se beneficiarão de sua sabedoria. Prof. Dr. Rob J. Young Professor de Conservação da Vida Selvagem Universidade de Salford, Reino Unido SUMÁRIO CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO AO COMPORTAMENTO ANIMAL CAPÍTULO 2 PESQUISAS EM COMPORTAMENTO ANIMAL CAPÍTULO 3 COMO MEDIR O COMPORTAMENTO ANIMAL CAPÍTULO 4 COMO OS ANIMAIS PROCURAM ALIMENTO? CAPÍTULO 5 POR QUE OS ANIMAIS VIVEM EM GRUPOS? CAPÍTULO 6 COMPORTAMENTO SOCIAL E COMUNICAÇÃO CAPÍTULO 7 AGRESSÃO, COMPETIÇÃO E COMPORTAMENTO TERRITORIAL CAPÍTULO 8 REPRODUÇÃO, CUIDADO PARENTAL E CONFLITOS CAPÍTULO 9 ESTRESSE ANIMAL CAPÍTULO 10 DESENVOLVIMENTO DO COMPORTAMENTO ANIMAL CAPÍTULO 11 EVOLUÇÃO DO COMPORTAMENTO CAPÍTULO 12 MOTIVAÇÃO E BEM-ESTAR ANIMAL CAPÍTULO 13 COMPORTAMENTO E CONSERVAÇÃO SOBRE OS AUTORES CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO AO COMPORTAMENTO ANIMAL Cristiano Schetini de Azevedo & Jonas Byk 1.1 Definindo o comportamento animal O que é comportamento animal? Podemos definir o comportamento de um animal como as respostas que ele apresenta aos estímulos ambientais (externos); essas respostas são dependentes de fatores internos do animal (corporais, fisiológicos). Por exemplo, imagine um cavalo com sede; a resposta comportamental de beber água somente será exibida por esse cavalo se ele estiver com sede (resposta corporal, fisiológica, interna) e se existir água disponível no ambiente para ele beber (estímulo externo). Portanto mesmo que a temperatura ambiente esteja alta e o organismo do animal esteja sinalizando a necessidade de beber água, esse comportamento não será expresso se o fator ambiental estiver ausente. Concluímos, então, que o comportamento de um animal é a resposta resultante da ação de fatores internos e externos a ele. A ciência que estuda o comportamento animal é conhecida como Etologia. Proposta inicialmente por Karl von Frisch, Konrad Lorenz e Nikolaas Tinbergen, em 1930, a Etologia tentava explicar aspectos do comportamento dos animais nanatureza, levando os aspectos evolutivos em consideração. Hoje, a Etologia apresenta características multidisciplinares, contemplando áreas como a Ecologia, Fisiologia, Genética, Biologia da Conservação, Engenharia (no caso da construção de recintos naturalísticos para a manutenção de animais em cativeiro), Medicina Veterinária, Engenharia da Computação (no desenvolvimento de programas computacionais de análise comportamental) etc. O estudo do comportamento animal pode dar-se em diferentes esferas (Figura 1). Podemos estudar o comportamento de um animal como um todo ou o comportamento de apenas células de seu organismo; podemos estudar o comportamento de um indivíduo ou de grupos de indivíduos; assim como podemos estudar o comportamento de todas as populações de uma dada espécie. Ainda, o comportamento animal pode ser estudado tanto na natureza, em que os comportamentos espécie-específicos são definidos, quanto em cativeiro, em que as condições de estudo são controladas. Muitos dos estudos comportamentais ocorrem em cativeiro, principalmente pela possibilidade de controle de variáveis ambientais e de observação dos animais, já que muitas espécies são difíceis de serem vizualisadas em campo, ou por serem pequenas demais, ou por viverem em locais de difícil acesso, ou por terem hábitos de vida secretivos (vida noturna ou vida subterrânea, por exemplo). Idealmente, os estudos comportamentais devem ser conduzidos tanto na natureza quanto em cativeiro, assim informações complementares sobre a espécie-alvo serão adquiridas. FIGURA 1 – POSSÍVEIS ESFERAS DE ESTUDO DO COMPORTAMENTO ANIMAL FONTE: o autor. 1.2 Breve histórico do comportamento animal O interesse dos humanos pelo comportamento dos animais existe desde os primórdios; grupos nômades precisavam saber como os animais agiam para aumentar as chances de caçadas bem-sucedidas; muitas pinturas rupestres demonstram aspectos do comportamento dos animais. Em seguida, com o aparecimento da agricultura, algumas espécies animais de interesse foram domesticadas, especialmente para o fornecimento de alimentos (carne, ovos, leite etc.), mas também como força de trabalho. A domesticação dessas espécies teria ocorrido por volta de 8.000 anos atrás, e só foi possível pelo conhecimento prévio do seu comportamento pelos humanos. No século XVIII, ocorrem os primeiros estudos lidando com o comportamento animal. Em 1716, o alemão Ferdinand Johann Adam von Pernau observava os pássaros e tentava descobrir como os filhotes aprendiam a cantar. Outro alemão, August Johann Rösel von Rosenhof, publicou, em 1758, um livro contando a história natural de anfíbios, trazendo algumas contribuições sobre o comportamento desses animais. No final do século XIX, após muitos anos filosofando sobre a natureza dos animais, surgia a Psicologia Animal, ciência influenciada pelos estudos de Charles Darwin e marcada pela forte antropomorfização dos animais. Darwin foi o primeiro a comparar animais e humanos postulando que suas diferenças poderiam ser explicadas evolutivamente. Outros pesquisadores também contribuíram para a Psicologia Animal, como o inglês Douglas Alexander Spalding, considerado o primeiro biólogo experimental que estudou principalmente imprinting e instintos em aves, e o também inglês Sir John Lubbock, o primeiro a inserir os quebra- cabeças e labirintos no estudo da aprendizagem em formigas. Oriunda da Psicologia Animal, por volta de 1930, aparecia na Europa a Etologia. Os pesquisadores considerados os “pais” da Etologia foram Karl Ritter von Frisch (alemão; estudou o comportamento de abelhas), Konrad Lorenz (austríaco; estudou o comportamento de imprinting em aves) e Nikolaas Tinbergen (holandês; estudou o comportamento inato de aves). No Brasil, o estudo do comportamento animal teve início apenas em 1980, quando ocorreu o primeiro encontro paulista de Etologia, em 1982. 1.3 Para que serve o comportamento animal? Não importa qual seja o comportamento ou a espécie em questão, mas todos os comportamentos normais exibidos pelos animais têm dois objetivos finais: reprodução e sobrevivência. Pense em uma ave limpando as penas com o bico. Esse comportamento permite a retirada de ectoparasitos, além de manter os vexilos da pena em bom estado, o que é importante para o vôo. Se a ave consegue voar, porque suas penas estão em bom estado de conservação, ela consegue fugir de predadores, ou seja, consegue sobreviver. Se ela consegue sobreviver, tem a possibilidade de reproduzir, mas a reprodução também está atrelada à condição das penas; fêmeas escolhem seus machos utilizando a beleza e vistosidade da plumagem como parâmetro. Comportamentos anormais não permitem aos animais sobreviverem e se reproduzirem, portanto fogem das duas funções primordiais do comportamento. Animais de cativeiro que vivem altamente estressados podem se automutilar, e esse comportamento é claramente deletério. O comportamento de suicídio em humanos é outro exemplo. Ainda, alguns endoparasitos podem manipular o comportamento de seus hospedeiros tornando- os mais susceptíveis à predação ou menos aptos à reprodução. Por exemplo, uma larva de vespa consegue manipular o comportamento de uma aranha hospedeira estimulando-a a construir um casulo reforçado de seda, local de empupamento da vespa. Uma boa revisão sobre o assunto foi realizada por Thomas e colaboradores, em 2005, e por Poulin, em 2010. 1.4 Por que estudar o comportamento animal? Os motivos que levam os etólogos a estudar o comportamento animal são bastante variados, mas geralmente caem dentro de uma das seguintes categorias: curiosidade sobre o mundo animal, aprendizagem sobre as relações entre os animais e seu ambiente, estabelecimento de princípios gerais do comportamento animal, melhor entendimento do nosso próprio comportamento, controle de pestes, e conservação e manejo de espécies ameaçadas. A curiosidade sobre o mundo natural certamente é um dos fatores que mais motivam os etólogos. Normalmente, toda pesquisa tem início porque o pesquisador tem interesse em desvendar alguns dos mistérios comportamentais da espécie animal escolhida. Como veremos no Capítulo 3 deste livro, a escolha da espécie animal a ser estudada vem de interesses pessoais, curiosidades pessoais. Pense agora mesmo na espécie animal que você, leitor, gostaria de estudar. Além disso, pense por que você gostaria de estudar essa espécie. Pensou? Pronto, a curiosidade em responder essa pergunta que você acabou de fazer será o motivo de você começar a estudar o comportamento animal. A aprendizagem sobre as relações entre os animais e o ambiente que os cercam também motiva os estudos comportamentais. Imagine, por exemplo, bandos de aves migrando de um local para outro. O que motiva essas aves a desempenhar esse comportamento? Que tipo de relação com o ambiente essa espécie migradora mantém? As mudanças de temperatura são as responsáveis pela migração? Ou seria a escassez de alimentos na área inicial? Se pensarmos em um lobo-guará, podemos nos questionar o porquê de eles preferirem defecar no alto de cupinzeiros em vez de diretamente no solo. O estabelecimento de princípios gerais do comportamento, ou seja, as bases teóricas dessa ciência, talvez seja um dos principais motivos de se estudar o comportamento dos animais. Toda ciência precisa ter bases teóricas robustas. As teorias são postuladas baseando-se em hipóteses validadas por meio de estudos e experimentações; então, muitas ideias são lançadas para se tentar explicar um comportamento, gerando uma infinidade de estudos. Muitas hipóteses são aplicáveis para várias espécies animais, o que acaba permitindo que sejam consideradas universais, tornando as teorias originadas a partir delas fortes o suficiente para serem consideradas bases dessa ciência. Muitos comportamentos observados nos animais são também exibidos por nós. Comportamentos reprodutivos, sociais, de defesa contra predadores etc. são similares entre muitas espécies animais e o homem. Então, o entendimento das bases desses comportamentos podeser extrapolado dos animais para os humanos, permitindo-nos maior entendimento sobre nosso próprio comportamento. A Psicologia Evolutiva é a área da ciência que estuda o comportamento humano. É importante salientar que não podemos ou devemos usar o comportamento exibido pelos animais como justificativa para comportamentos humanos indesejados. Por exemplo, muitas espécies cometem infanticídio, ou seja, o ato de adultos matarem filhotes. A observação desse comportamento na natureza não pode ser justificativa para que humanos matem crianças. Nada melhor do que conhecer bem o comportamento do animal que se queira combater. Isso fica claro quando a espécie em questão é considerada praga. Por exemplo, sabemos que para combater a dengue temos que combater o mosquito Aedes aegypti. O combate ao mosquito vetor do vírus da dengue é facilitado pelo conhecimento do comportamento reprodutivo da espécie. Sabendo que as fêmeas ovipõem em poças de água limpa e parada, podemos focar as estratégias de combate nesses locais. Finalmente, a conservação de espécies ameaçadas de extinção, hoje, configura-se num grande motivador de estudos comportamentais. O número de espécies animais ameaçadas de extinção aumenta a cada dia, e muitas delas precisam ser corretamente manejadas para que sobrevivam. O manejo pode se dar tanto na natureza quanto em cativeiro. A criação de parques e reservas para a proteção de espécies só será válida se for grande o suficiente, ou que contemple microhabitats específicos, utilizados pelas espécies em questão. Imagine a criação de uma reserva, que tenha cerca de 100 hectares de tamanho, para a proteção de veados-campeiros (Ozotoceros bezoarticus). Ela de pouco adiantaria para a proteção da espécie, já que ela utiliza em média mais de 500 hectares de área. Criar animais em cativeiro, em recintos pouco estimulantes, tende a gerar a exibição de comportamentos anormais, e se existir a intenção de reintrodução desses indivíduos na natureza, a exibição desses comportamentos será ruim. Então, a estimulação adequada precisará ser oferecida ao animal cativo para que ele recupere e exiba os comportamentos naturais da espécie. 1.5 Considerações finais O comportamento exibido por um animal é resultado da soma de estímulos do ambiente com estímulos internos, como os hormonais. A ciência que estuda o comportamento animal é conhecida como Etologia e foi fundada na década de 1930 por dois pesquisadores europeus, Nikolaas Tinbergen e Konrad Lorenz. A motivação para se estudar o comportamento dos animais é bastante variável, mas normalmente começa pela curiosidade do pesquisador sobre a vida natural. Estudos mais aplicados de conservação e combate de pragas também utilizam dados comportamentais básicos. Não importando o grupo animal ou a motivação que levou o pesquisador a estudá-lo, os comportamentos normais sempre permitem a sobrevivência e a reprodução dos indivíduos. REFERÊNCIAS BERGER-TAL, O. et al. Integrating animal behavior and conservation biology: a conceptual framework. Behavioural Ecology, Oxford, v. 22, n. 2, p. 236-239, feb. 2011. BERGER-TAL, O.; SALTZ, D. Conservation Behavior: applying behavioral ecology to wildlife conservation and management. Cambridge: Cambridge University Press, 2016. BUSS, D. Evolutionary Psychology: the new science of the mind. 5. ed. London: Pearson, 2014. DALY, M.; WILSON, M. I. Human evolutionary psychology and animal behaviour. Animal Behaviour, London, v. 57, n. 3, p. 509-519, mar. 1999. EBERHARD, W. G. Spider manipulation by wasps larva. Nature, London, v. 406, p. 255- 256, jul. 2000. FERICEAN, M. L. et al. The history and development of ethology. Research Journal of Agricultural Science, Timisoara, v. 47, n. 2, p. 45-51, apr. 2015. LUBBOCK, J. On the Senses, Instincts, and Intelligence of Animals. London: Kegan Paul, 1888. POULIN, R. Parasite manipulation of host behavior: an update and frequently asked questions. In: BROCKMANN, H. J. (Org.). Advances in the Study of Behavior. Burlington: Academic Press, 2010, p. 151-186. v. 41. (Capítulo 5). SOSSINKA, R. Ethologie. Aarau: Sauerlander, 1981. SOUTO, A. Etologia: princípios e reflexões. 3. ed. Recife: Editora Universitária UFPE, 2005. SPALDING, D. A. On instinct. Nature, London, v. 6, p. 485-486, oct. 1872. STRESEMANN, E. Baron von Pernau, pioneer student of bird behaviour. The Auk, New York, v. 64, p. 35-52, jan. 1947. THOMAS, F. et al. Parasitic manipulation: where are we and where should we go? Behavioural Processes, London, v. 68, n. 3, p. 185-199, mar. 2005. VERSIANI, N. F. Área de vida e uso de habitat por fêmeas de veado-campeiro (Ozotoceros bezoarticus) nos diferentes períodos reprodutivos, no Pantanal Sul- Matogrossense. 2011. 102 f. Dissertação (Mestrado em Ecologia Aplicada Interunidades) – Universidade de São Paulo, Piracicaba, 2011. VON ROSENHOF, A. J. R. Historia Naturalis Ranarum nostratium. Nuremberg: Societatis Regiae Scientiarum, 1758. CAPÍTULO 2 PESQUISAS EM COMPORTAMENTO ANIMAL Camila Palhares Teixeira 2.1 O que é ciência? A palavra ciência vem da palavra latina scientia, que significa conhecimento. Até o período do Iluminismo (século XVIII), a palavra ciência (ou seu cognato latino) significava quaisquer conhecimentos gravados, sistemáticos ou exatos. A Ciência, consequentemente, teve um significado tão amplo quanto a Filosofia tinha naquele tempo. O conhecimento humano pode ser definido de várias maneiras. Na prática, é o processo pelo qual se determina a relação entre o sujeito e o objeto. Essa definição deixa entrever que pode haver vários tipos de conhecimento: o popular, o religioso, o científico, entre outros. O conhecimento popular é aquele baseado na experiência cotidiana, transmitido de geração para geração e, na maioria das vezes, relacionado às práticas que possibilitam ou facilitam a sobrevivência. Em Filosofia, esse conhecimento poderia ser definido, em um sentido amplo, como o atributo geral que tem os seres vivos de reagir ativamente ao mundo circundante, na medida de sua organização biológica e no sentido de sua sobrevivência. O conhecimento científico, por outro lado, consiste na apropriação do objeto pelo pensamento; por meio de uma metodologia apropriada, obtemos uma percepção clara, de representação completa, definição e análise dos fenômenos naturais. Atualmente, a Ciência pode ser definida como a soma dos conhecimentos humanos resultantes da observação e experimentação; ela não pode e não produz uma verdade absoluta e inquestionável; e pode fazer predições baseadas em observações. Essas predições geralmente beneficiam a sociedade ou os http://pt.wikipedia.org/wiki/Conhecimento http://pt.wikipedia.org/wiki/Verdade indivíduos humanos que fazem uso delas, por exemplo, a teoria da evolução ou a genética. O método científico é como a ciência será desvendada, ou seja, são os procedimentos e as estruturas das diversas ciências (ex.: biologia, matemática, física, química, entre outras). Aristóteles (384-322 a.C.) encarava a investigação científica como uma progressão desde a observação até o estabelecimento de princípios gerais, e daí um retorno às observações para a confirmação dos princípios estabelecidos. Esse procedimento é conhecido como método indutivo-dedutivo. A indução pode ser definida como o uso do raciocínio para, a partir de dados particulares (fatos, experiências, enunciados empíricos) e por meio de uma sequência de operações cognitivas, chegar a leis ou conceitos gerais, indo dos efeitos à causa, das consequências ao princípio, da experiência à teoria. A dedução seria o processo inverso, no qual, a partir de uma ou mais premissas aceitas como verdadeiras, há obtenção de uma conclusão necessária e evidente (ex.: A = B e B = C, logo A = C). Vários outros intelectuais discutiram o que seria o método científico. Por exemplo, Descartes (1596-1650) utilizava o método dedutivo e, para isso, considerava como exigência essencial que todos os princípios gerais fossem verdadeiros, e começou a sistematicamente colocar todos os princípiosem dúvida. Assim, ele construiu uma pirâmide das leis do universo, representando verdades científicas, em cujo topo estavam princípios metafísicos teísticos-creacionistas. Durante a Idade Média, os árabes alquimistas introduziram uma metodologia nova: a experimentação. Sabemos, hoje, que o método científico não é utilizado de forma arbitrária, porque deve ser sempre submetido à contraprova da observação do próprio fenômeno. A verificação experimental, ou seja, a contraprova, pode sugerir modificações substanciais no modelo teórico. Esse mecanismo de obter o conhecimento (teoria – contraprova – revisão da teoria) é a própria essência do método científico ou da metodologia científica, que não pode ser ignorado por nenhum cientista que pretende fazer avançar a Ciência. A Biologia é considerada uma ciência empírica, ou seja, não exata ou natural, apesar de hoje o tratamento dado aos resultados de vários tipos de experimentos, desde os utilizados na Sistemática, na Ecologia até na Biologia Molecular, ser altamente matematizado. A Ciência pode ser dividida em: básica e aplicada. A Ciência Básica, seja teórica ou experimental, propõe unicamente enriquecer o conhecimento humano, enquanto a Ciência Aplicada utiliza-se desses conhecimentos gerados pela Ciência Básica na vida cotidiana. Por exemplo, a Ciência Básica pode fornecer conhecimentos sobre a vida, a distribuição e o funcionamento orgânico de uma dada espécie de planta; já a Ciência Aplicada dedica-se ao estudo das eventuais propriedades dessa planta, seja para efeito do seu cultivo, utilização na alimentação ou outras finalidades. 2.1.1 A Navalha de Occam A Navalha de Occam, também conhecida como o Princípio da Parcimônia ou Lei da Economia, é uma teoria atribuída ao filósofo inglês e frade franciscano do século XIV, William de Ockhan. Essa teoria afirma, de forma simples, que não se devem fazer mais suposições do que o necessário, ou seja, no dia a dia, entre duas teorias iguais, escolha a mais simples. Occam defendeu o princípio de que a natureza é por si mesma econômica, sempre escolhendo o caminho mais simples. Por exemplo, depois de uma tempestade, você tem a notícia de que uma árvore está caída; baseada na evidência da tempestade e da árvore caída, uma hipótese razoável seria a de que a tempestade derrubou a árvore. Outra hipótese seria pensar que a árvore foi derrubada por uma nave alienígena que, passando a 200m da árvore, disparou um raio laser e a derrubou. Entretanto devemos assumir primeiro que alienígenas existem e que o raio laser pode ser usado como arma, uma hipótese bem mais complexa do que a anterior. Os biólogos ou os filósofos da Biologia usam essa teoria na Biologia Evolutiva e na Sistemática. A Sistemática é o ramo da Biologia que tenta estabelecer uma relação genealógica entre os organismos. Na Cladística, um campo da Sistemática, a lei da parcimônia é bastante utilizada: as filogenias mais aceitas são aquelas que requerem o menor número de passos evolutivos para serem produzidas. 2.2 O método científico O método científico é um conjunto de regras básicas que um cientista deve seguir rigorosamente para desenvolver uma pesquisa controlada que resulte em conclusões confiáveis. No método científico, a hipótese é o caminho que deve levar à formulação de uma teoria. O cientista, na sua hipótese, tem dois objetivos: explicar um fato e prever outros acontecimentos dele decorrentes. A hipótese deverá ser testada em experiências laboratoriais controladas e, se os resultados obtidos comprovarem perfeitamente a hipótese, então ela será aceita como uma teoria. O método científico consiste das seguintes fases: 1. observação de um fato; 2. formulação de um problema; 3. proposta de uma hipótese; 4. realização de uma experiência controlada para testar a validade da hipótese; 5. análise dos resultados; 6. aceitação ou rejeição da hipótese; 7. formulação de novas hipóteses e teorias. O procedimento é o seguinte: primeiro você observa um fato, depois formula uma hipótese, determina o melhor método para testar essa hipótese, observa e experimenta a hipótese, coleta e interpreta os dados; se os dados não confirmarem a hipótese, devemos formular uma nova hipótese e refazer todos os passos a partir da hipótese, mas se os dados confirmarem a hipótese, então usamos as hipóteses confirmadas como base para a formulação de teorias. Para maior segurança nas conclusões, toda experiência deve ser controlada. A experiência controlada é aquela realizada com técnicas as quais permitem descartar as variáveis que podem http://pt.wikipedia.org/wiki/Hip%C3%B3tese http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria http://pt.wikipedia.org/wiki/Experi%C3%AAncia_cient%C3%ADfica mascarar o resultado. Nesse tipo de experiência, utiliza-se o duplo- cego, um método que emprega um grupo teste (o grupo que será efetivamente testado) e um grupo controle (um grupo que não é testado e serve apenas para comprovar que o teste é válido). Imagine o teste de novos remédios, em que temos dois grupos: um que utiliza o medicamento real (grupo teste) e o outro que utiliza o placebo (grupo controle). O médico que aplica a medicação não sabe quais são os pacientes que estão tomando o placebo e quais os que estão tomando o medicamento real, somente o pesquisador sabe quem faz parte do grupo teste e do grupo controle. Isso é importante para que não haja vício de amostragem. Imagine um estudante que esteja pesquisando o comportamento de um quati em um zoológico. O estudante observa que o quati está desempenhando um comportamento anormal com muita frequência e resolve colocar no recinto um item de enriquecimento ambiental, como uma bola cheia de alimentos que, à medida que é rolada pelo quati, libera pequenas porções do alimento no chão. O aluno, ávido para que seu enriquecimento funcione e diminua a exibição dos comportamentos anormais, inconcientemente registra os comportamentos do quati segundos antes ou segundos depois do intervalo amostral, exatamente nos momentos em que o animal está usando a bola. Resultado do experimento: o item de enriquecimento ambiental foi adequado, pois foi bastante utilizado pelo quati e diminuiu a exibição do comportamento anormal. Entretanto o experimento foi filmado, e as análises posteriores em laboratório, feita por outro estudante que não conhecia os objetivos originais do trabalho, mostraram que o item não foi tão utilizado assim pelo quati, o qual continuou a apresentar altos níveis de comportamento anormal. Ou seja, o experimento duplo-cego forneceu resultados mais reais do que o ocorrido com o quati. 2.3 Como elaborar um projeto de pesquisa em comportamento animal Todo projeto de pesquisa deve ser iniciado por uma proposta escrita. Escrevemos uma proposta normalmente por duas razões: 1. para conseguir os recursos necessários; 2. para obter a permissão para fazer a pesquisa. Assim, uma proposta deve convencer os leitores de que ela tem muito valor, para que seja aprovada e o projeto seja executado. É importante observar que nunca devemos fazer uma proposta cuja execução precise que alguém descumpra as leis em vigor. A proposta deve, como já foi dito, seguir a metodologia científica, assim normalmente deve apresentar: a) título; b) nomes, endereços e contatos dos proponentes; c) resumo (às vezes); d) introdução; e) justificativa (pode ser incorporada à introdução); f) objetivos (metas a serem alcançadas durante a execução do projeto); g) materiais e métodos; h) resultados esperados; i) orçamento; j) cronograma; k) referências bibliográficas; l) outros documentos (ex.: currículo lattes – deve ser preenchido pelo portal: <http://www.cnpq.br/> – ou currículo vitae, licenças, aprovação do conselho de ética etc). Geralmente, as propostas são escritas utilizando-se as normas técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) – <http://www.abnt.org.br/>. Para representar de forma mais clara a elaboração de uma proposta, irei utilizar o meu projeto de mestrado como exemplo. a) Título O título deve ser claro e resumir o projeto. É muitoimportante que o título explique com qual espécie você pretende trabalhar. Devemos citar o nome científico e não simplesmente o nome comum: Didelphis albiventris e não Gambá (no Brasil é normal citar o nome do autor da espécie, por exemplo, Didelphis albiventris, Lund, 1840). O título deve ter palavras que indicam a metodologia empregada. Exemplo: “Os efeitos de ambientes impactados na assimetria http://www.abnt.org.br/ flutuante de duas espécies de marsupiais (Didelphis albiventris e Marmosops incanus) utilizando sistemas de informações geográficas”. Para os artigos, podemos utilizar títulos mais atrativos, por exemplo, “Marsupiais vistos do espaço: o uso de assimetria flutuante e sistemas de informações geográficas em conservação”. b) Nomes Devemos colocar o nome dos proponentes, a sua posição profissional (ex.: biólogo, professor etc.) e o endereço, sendo preferível o endereço profissional (incluir telefone, fax e e-mail). c) Resumo O resumo nem sempre é necessário, depende do financiador. Normalmente, um resumo de projeto tem um limite no número de palavras (o mais comum é entre 200 e 300 palavras). O resumo deve ser muito bem escrito, pois, se for ruim, o revisor provavelmente reprovará o projeto sem ler o restante. Um bom resumo contém: a) uma a duas frases de introdução (por que o projeto é importante, inclusive com os objetivos); b) três a cinco frases de metodologia (ex.: observações, espécies, número de animais, desenho do experimento etc.); c) duas a três frases de resultados esperados (o que você prevê); d) uma a duas frases de conclusão (mostra a importância do projeto). Normalmente, não citamos referências bibliográficas no resumo, a menos que seja uma exigência da agência financiadora. d) Introdução Na introdução, devemos explicar nossa proposta no contexto das pesquisas já publicadas (utilizando uma boa revisão bibliográfica). Então, precisamos apresentar informações sobre todas as áreas que são incluídas na proposta. O conteúdo deve ser bem atualizado e escrito em um estilo que uma pessoa não especialista compreenda. Devemos sempre colocar somente dados relevantes e importantes, nunca devemos ultrapassar o limite de palavras determinado. Exemplo: “Os efeitos de ambientes impactados na assimetria flutuante de duas espécies de marsupiais (Didelphis albiventris e Marmosops incanus) utilizando sistemas de informações geográficas”. Para essa proposta, precisamos de informações (parágrafos) sobre: a) conservação (ou seja, ambientes impactados); b) assimetria flutuante (especialmente no contexto de conservação); c) marsupiais (por que essas espécies); d) sistemas de informações geográficas (no contexto de conservação). e) Justificativa Frequentemente, após a introdução, precisamos justificar por que nossa proposta merece financiamento (recursos) ou permissão para execução. Precisamos enfatizar a importância de nossa proposta e, portanto, devemos pensar por que a instituição que receberá nossa proposta gastaria dinheiro financiando-a. Para fazer isso, precisamos ler os objetivos da instituição e escrever a proposta, especialmente a justificativa, de acordo com esses objetivos. Por exemplo, a instituição “Fundação O Boticário de Proteção à Natureza” tem como objetivo “[...] promover e realizar ações de conservação da natureza”. Portanto uma proposta enviada para essa instituição deve, obrigatoriamente, ter em sua justificativa um foco conservacionista. É fundamental ler os objetivos das instituições que se pretende enviar as propostas de financiamento dos projetos; se as propostas não se encaixarem nesses objetivos, é melhor não enviar e buscar financiadores alternativos. Existem muitas agências financiadoras de pesquisas, tanto públicas quanto privadas, que podem ser encontradas em buscas rápidas na internet. f) Objetivos Somente devemos colocar na proposta os objetivos que podem ser realizados no projeto. Normalmente as propostas têm dois tipos de objetivos: a) objetivo geral – esse objetivo é como você quer que o projeto se conclua em geral. Por exemplo: “desenvolver uma nova metodologia para relacionar o índice de assimetria flutuante e o grau de antropização da paisagem usando técnicas de geoprocessamento e de sensoriamento remoto”; b) objetivos específicos – são basicamente as etapas mais importantes para chegar ao objetivo geral. Por exemplo: a. testar uma nova metodologia, utilizando duas espécies de marsupiais neotropicais – uma generalista e outra especialista; b. medir, quando possível, a tolerância das espécies para sobreviver em ambientes impactados pelos diferentes graus de antropização; c. subsidar estratégias de conservação para grupos de animais e plantas, utilizando como modelos M. incanus e D. albiventris. Normalmente, três a cinco objetivos específicos são adequados, mais do que isso, somente quando o projeto for muito grande. g) Materiais e métodos Uma metodologia bem escrita deve permitir a qualquer pesquisador, mesmo que de outra área do conhecimento, repetir o experimento satisfatoriamente. Os métodos devem incluir: a) espécie; b) número e histórico de animais (idade, sexo, linhagem etc.); c) local (natureza ou cativeiro); d) manejo de animais, se necessário (dieta, manejo etc.); e) desenho ou protocolo do experimento (como será a pesquisa); f) como os dados serão coletados; g) equipamentos e recursos necessários; h) como pretende analisar os dados (análise estatística). É muito importante prestar atenção aos métodos, porque os revisores das agências financiadores certamente o farão. Se os métodos forem ruins e inadequados para testar as hipóteses sugeridas, de nada valerá sua pesquisa e seu projeto será rejeitado pelos revisores. h) Resultados esperados Resultados esperados não são os resultados de testes estatísticos, mas os produtos esperados do projeto, pois, somente depois de executar o projeto, poderemos ter resultados estatísticos substanciais. Como exemplos de produtos esperados, podemos citar: 1. atingir os objetivos (geral e específicos); 2. produzir artigos científicos; 3. produzir artigos de divulgação; 4. divulgar na mídia em geral (TV, rádio e internet); 5. confeccionar material educativo para profissionais ou o público; 6. apresentar trabalhos em congressos (resumos, posters, palestras etc.); 7. produzir monografias; 8. produzir dissertações e teses (mestrado ou doutorado); 9. capacitar técnicos; 10. produzir uma patente ou processo. i) Orçamento O padrão e as regras sobre como um orçamento deve ser descrito varia entre os diferentes órgãos de financiamento. Alguns financiadores, por exemplo, não incluem bolsas e salários nas despesas, outros não incluem materiais importados. É fundamental adequar seu orçamento às regras utilizadas pela instituição à qual se pretende enviar o projeto. Normalmente, o orçamento tem as seguintes categorias: 1. material de consumo – qualquer material que será utilizado durante o projeto (ex.: químicos, filmes, material de escritório); 2. material permanente – normalmente equipamentos (ex.: gravador) ou softwares que estarão disponíveis depois do projeto para a utilização em outros projetos; 3. despesas de viagens/diárias – combustível (proibido por algumas agências), refeições e hospedagem; 4. despesas com terceiros e outros – construção de equipamentos, aluguel de veículo, análises laboratoriais etc. Preste bastante atenção aos equipamentos importados, pois eles podem ter taxas de importação muito altas, as quais podem fazer o valor final dobrar. Caso essas taxas não sejam previstas, seu orçamento estará comprometido. j) Cronograma Anexar um cronograma de estudos é importantíssimo, pois nenhuma instituição financiará uma proposta sem prazo para terminar. O cronograma deve ser geral, contendo itens mais abrangentes do estudo. Ele é um importante norteador das atividades envolvidas na execução das pesquisas. Na Tabela 1, um exemplo de cronograma para um ano de estudo. TABELA 1 – EXEMPLO DE CRONOGRAMA UTILIZADO PARA PROJETOS DE PESQUISA Meses 01 02 03 04 05 06 0708 09 10 11 12 Levantamento bibliográfico X X X X X X X X X X X X Período de habituação X X X X X X Coleta de dados X X X X X X Análise de dados X X X X X Relatório final e divulgação X X X FONTE: o autor. k) Referências bibliográficas É preciso organizar as referências bibliográficas, como em um artigo, utilizando as normas da ABNT. Devemos sempre citar artigos científicos publicados em periódicos, trabalhos completos publicados em anais de eventos, trabalhos resumidos publicados em anais de eventos, livros publicados, capítulos de livros publicados. Com o advento da internet, a procura por referências bibliográficas para a realização, comparação e discussão de experimentos científicos se tornou facilitada. Os recursos oferecidos por páginas especializadas permitem uma pesquisa abrangente, rápida e fácil por artigos científicos dos mais diferentes campos da Ciência. Esses recursos precisam, então, ser explorados em sua plenitude, para que o máximo de trabalhos possa ser localizado pelo pesquisador. A pesquisa por referências pode ser conduzida em páginas especializadas em buscas científicas, como o “Web of Science”® ou “Pubmed”®, ou em páginas de procura não especializadas, como “Google”®. Infelizmente, a grande maioria das páginas especializadas na procura de artigos científicos é paga; para se ter acesso aos estudos, a universidade precisa manter uma conta anual (ou login), que normalmente é muito cara. Felizmente, as universidades federais possuem tal login de acesso e as pesquisas podem ser conduzidas em qualquer computador ligado à internet nessas instituições. Algumas universidades particulares e estaduais também possuem o login para os sites de procura especializados. Verifique em sua cidade as possibilidades. Quando o acesso ao computador não for possível, pode-se realizar pesquisas bibliográficas consultando-se dois catálogos internacionais (Zoological Records e Biological Abstracts). Esses catálogos são publicados anualmente e trazem um resumo de todos os artigos publicados no ano anterior nas áreas biológicas e zoológicas. Ambos os catálogos estão estruturados de maneira a facilitar as pesquisas, podendo-se utilizar tanto o nome da espécie de interesse quanto o nome de autores ou grupos zoológicos. A seguir, veremos como realizar uma pesquisa bibliográfica na internet. 1. Utilizando-se o site de procura não especializado “ Google”®. a) Abra a página principal do “Google”®: <www.google.com.br>. b) No campo “procurar”, digite uma palavra-chave de interesse: exemplo, Rhea americana (ema; o nome científico não precisa ser escrito em itálico para a realização da pesquisa). c) Clique em “procurar” (aparecerão várias páginas relacionadas, entretanto nem todas contêm informações confiáveis; devemos evitar páginas que não sejam de instituições científicas ou sabidamente confiáveis). d) Para melhorar a procura por artigos, na página principal do Google, clique em “pesquisa avançada”, à direita da tela, logo abaixo de uma lupa, ícone de procura. e) No campo “tipo do arquivo”, selecione Adobe Acrobat PDF (normalmente, os artigos científicos estão disponibilizados nesse formato; esse é um programa gratuito, que pode ser baixado da própria página da qual o arquivo será salvo). Após a seleção do formato, clique em “pesquisa avançada” ou tecle enter. http://www.google.com.br/ f) Vários artigos sobre Rhea americana aparecerão na tela. Alguns arquivos podem não ser artigos científicos e ser descartados após sua avaliação. Atualmente, foi desenvolvida uma página especial do “Google”® para a pesquisa acadêmica de trabalhos científicos. A página, nomeada de “Google Acadêmico”, pode ser acessada no endereço: <scholar.google.com.br>. Nessa página, não é necessário utilizar a procura avançada, e vários artigos já são disponibilizados diretamente. 2. Utilizando-se o site de procura especializado da Capes Professores, pesquisadores, alunos e funcionários de instituições de ensino superior e pesquisa em todo o País têm acesso imediato à produção científica mundial atualizada por meio desse serviço oferecido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). O Portal de Periódicos da Capes oferece acesso aos textos completos de artigos de mais de 38.000 revistas internacionais e nacionais, e há mais de 90 bases de dados, com resumos de documentos em todas as áreas do conhecimento. O uso do portal é livre e gratuito para os usuários das instituições participantes. O acesso é realizado a partir de qualquer terminal ligado à internet localizado nas instituições ou por elas autorizado. Entre na página principal do Portal Capes: <www.periodicos.capes.gov.br>. a) No campo “buscar periódico”, digite o nome da revista científica de interesse, por exemplo, Animal Behaviour; Zoologia etc. Note que para uma boa pesquisa nesse site, uma pesquisa anterior no “Google”® precisa ter sido realizada para que a revista científica de interesse (aquela em que o artigo foi publicado) seja definida. Caso contrário, o pesquisador deverá entrar em todos os sites das revistas, um a um, para procurar nos volumes se algum artigo com o tema de interesse foi publicado. O problema é que, geralmente, as revistas publicam quatro volumes anuais, com vários artigos cada, e disponibilizam muitos anos, o que torna esse tipo de pesquisa pouco eficiente. Na página principal do Portal Capes (clique no link “versão anterior”) estão alguns links para sites especializados de procura de artigos por palavras-chave, e não pelo título da revista. O mais utilizado é o “Web of Science”®, mas o “Scopus”® também é muito bom. Ambos os sites, além de permitirem a pesquisa por palavras- http://www.periodicos.capes.gov.br/ chave (como no “Google”®), já disponibilizam os artigos em PDF para download (nem todos os arquivos em PDF são disponibilizados). O problema reside no fato de que tanto o “Web of Science”® quanto o “Scopus”® são sites pagos, os quais necessitam do login e da senha da instituição. Caso sua instituição não tenha tal login, sugere-se a pesquisa na universidade federal mais próxima. a) Clique em “base” e digite “Web of Science”, na página principal do Portal Capes. b) Nos resultados, clique na base “Web of Science, Coleção principal”. c) No campo “search”, digite a palavra-chave de interesse. Exemplo: Chrysocyon brachyurus (não precisa ser em itálico). Outras palavras- chave podem ser tentadas, como no exemplo da pesquisa no “Google”®: maned wolf, aguará-guazú, lobo-guará etc. Tecle enter para a procura ser realizada. Na mesma janela do campo “search”, existem outros campos que refinam a pesquisa, como o campo “author”, em que é digitado o nome do autor do artigo de interesse, ou o campo “publication name”, no qual pode ser inserido o nome da revista em que o artigo foi publicado. Variações na pesquisa e nas palavras-chave melhoram os resultados. Todos os itens encontrados que vierem com o ícone “full text” possuem o artigo para download imediato. Os que não apresentarem esse ícone fornecem apenas o nome dos autores, da revista, do ano de publicação e do resumo. De posse desses dados, os artigos podem ser procurados no site da Capes, digitando-se o nome da revista no campo “buscar periódico”. Se a procura for realizada no site do “Scopus”®, os passos devem ser os mesmos, diferindo apenas na digitação da palavra “Scopus” no campo de procura da “base”. Esses dois sites (Web of Science® e Scopus®) são os melhores para a procura de referências bibliográficas, trazendo dados atualizados e mundiais. Devem, portanto, ser utilizados corriqueiramente. Outro site, “Pubmed”® (www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed), pode ser acessado de qualquer computador, sem necessidade de login e http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed senha especiais. Pesquisas nessa base de dados também devem ser realizadas. a) Entre na página do Pubmed: <www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed>. b) No campo de procura, digite as palavras-chave e depois clique em search. c) Os artigos que aparecerem com o link “free fulltext” possuem os artigos completos para download. Em muitos desses sites de procura, se os artigos não estão disponibilizados, eles podem ser adquiridos de três maneiras diferentes: 1. a revista em que o artigo foi publicado pode ser consultada na biblioteca da universidade e o artigo xerocado (obviamente, desde que a revista em questão seja assinada pela biblioteca e que não existam restrições autorais; os setores de periódicos das bibliotecas das universidades federais e privadas são excelentes e devem ser explorados); 2. o artigo pode ser solicitado via Comut nas bibliotecas das universidades (o Comut é um sistema de intercâmbio de artigos; todo artigo solicitado é cobrado e o valor deve ser pago no ato da solicitação e/ou no ato do recebimento das cópias); 3. enviando um e-mail de solicitação do artigo diretamente ao autor que o produziu (em quase todos os sites de procura mencionados, os e-mails dos autores são disponibilizados). Vários outros sites podem ser consultados e citados nos trabalhos científicos, e sua consulta dependerá do grupo zoológico de interesse, sendo muitas delas especializadas. Na sequência, segue uma lista de páginas conceituadas disponíveis na internet. 1. Animal Diversity Web: animaldiversity.ummz.umich.edu (traz informações sobre a maioria das espécies animais). 2. International Union for Conservation of Nature and Natural Resources (Iucn): <www.iucn.org> (traz informações sobre diversos programas de conservação de espécies, além de listas de animais ameaçados de extinção). 3. Fishbase: <www.fishbase.org> (traz informações sobre peixes). 4. Zoonomen: <www.zoonomen.net> (traz informações taxonômicas). 5. Scientific American Brasil: <www2.uol.com.br/sciam/> (traz reportagens excelentes sobre as mais novas descobertas da Ciência). http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed http://www.iucn.org/ http://www.fishbase.org/ http://www.zoonomen.net/ 6. Revista Science: <www.sciencemag.org> (traz reportagens excelentes sobre as mais novas descobertas da Ciência). 7. Revista Nature: <www.nature.com> (traz reportagens excelentes sobre as mais novas descobertas da Ciência). 8. Amphibian Species of the World: <research.amnh.org/iz/herpetology/amphibia/> (traz informações sobre as espécies de anfíbios do mundo). 9. The World Spider Catalog: <research.amnh.org/iz/spiders/catalog/> (traz a lista atualizada das espécies de aranhas do planeta); 10. Palaeos: <www.palaeos.org> (traz informações sobre fósseis de diversos grupos animais); 11. Animal Behaviour Society: <www.animalbehavior.org/ABS/> (traz informações sobre comportamento animal). Essa lista é apenas anedótica e pesquisas na internet devem ser conduzidas para o encontro de várias outras páginas conceituadas. Muitos pesquisadores mantêm páginas pessoais ou de seus laboratórios. Normalmente, nessas páginas estão disponibilizados vários artigos para download. Visitar tais páginas pode complementar as pesquisas bibliográficas. Evite citar páginas da internet na sua lista de referências bibliográficas, a não ser que sejam imprescindíveis e reconhecidamente aceitas pelo meio acadêmico. Infelizmente, o número de artigos escritos em português é irrisório quando comparado ao número de artigos escritos em inglês. Portanto, se você tem dificuldades com essa língua estrangeira, deve se aperfeiçoar, afinal, essa é a língua oficial mundial. Uma boa maneira de aprendizagem é a leitura constante de artigos científicos de seu interesse. Finalmente, você deve confirmar se todos os artigos que você citou no texto estão presentes no campo das referências bibliográficas. Faça uma revisão minuciosa para evitar falhas. 1) Outros documentos Normalmente, financiadores pedem outros documentos, como a cópia de currículo vitae ou currículo lattes, cópia de licença para trabalhar (ex.: licença do Sisbio, Comitê de Ética, entre outros) etc. Todos os documentos solicitados pelo financiador devem estar http://www.sciencemag.org/ http://www.nature.com/ http://www.palaeos.org/ http://www.animalbehavior.org/ABS/ anexados à proposta. Se apenas um documento faltar, a proposta terá grandes chances de ser recusada e excluída do processo seletivo. Após a aprovação da proposta, devemos começar a execução do projeto, e depois da execução são produzidos artigos científicos que devem ser publicados em revistas de divulgação científica, congressos e jornais científicos. 2.4 Por que começamos com uma questão? Em qualquer pesquisa científica, devemos começar sempre com uma questão. A questão surge a partir da observação de um fato. Primeiro observamos um fato, depois formulamos as questões, propomos uma previsão e elaboramos hipóteses para responder a essas questões. Após esse processo é que aplicamos a metodologia científica para responder às questões e comprovar as hipóteses, obtendo, assim, os resultados que são, geralmente, trabalhados estatisticamente. Em seguida, devemos discutir os resultados e escrever as conclusões. Como visto, todo esse processo deve sempre ser feito seguindo os passos do método científico. Somente para ilustrar a importância da elaboração das questões, iremos citar dois exemplos de trabalhos, de forma bem simplificada, realizados em comportamento animal. • Exemplo 1: “Relação do tamanho do grupo e padrões de atividade diária com o comportamento do quero-quero (Vanellus chilensis)” (MARUYAMA et al., Journal of Ethology, 2010). PERGUNTA: o tamanho do grupo influencia o comportamento de vigilância do quero-quero? HIPÓTESE: o tamanho do grupo aumenta a vigilância. PREVISÃO: quanto maior o grupo, menor é a taxa individual de vigilância. METODOLOGIA: amostragem focal + registro contínuo (as descrições das amostragens serão descritas no Capítulo 3). RESULTADOS: a taxa de vigilância foi inversamente proporcional ao tamanho do grupo. • Exemplo 2: “Temperatura e enriquecimento ambiental sobre o bem-estar de coelhos em crescimento” (SILOTO et al., Ciência Rural, 2009) PERGUNTA: coelhos vivendo em gaiolas enriquecidas expressam menos comportamentos estereotipados? HIPÓTESE: gaiolas com enriquecimento melhoram o bem-estar de coelhos, pois diminuem a exibição de comportamentos anormais. PREVISÃO: coelhos preferirão usar gaiolas com enriquecimento ambiental a gaiolas sem o enriquecimento ambiental. METODOLOGIA: amostragem scan + registro instantâneo (intervalo amostral de cinco minutos), e também o método do comportamento. RESULTADOS: coelhos exibiram menos comportamentos anormais em gaiolas com enriquecimento ambiental. 2.5 As quatro questões de tinbergen Nikolaas Tinbergen, nascido em 15 de abril de 1907, foi um etologista e ornitólogo holandês ganhador do Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina, juntamente com Karl von Frisch e Konrad Lorenz, por suas descobertas relativas à organização e extração dos padrões de comportamentos individual e social dos animais. O seu trabalho mais conhecido foi a elaboração das quatro questões que deveriam ser respondidas para qualquer comportamento exibido por um animal. Essas questões são conhecidas hoje como as quatro questões de Tinbergen, e são consideradas a base da Biologia Moderna. São as seguintes: • função – “por que o animal comporta-se dessa forma? Como esse comportamento aumenta as suas chances de sobrevivência?” – o comportamento tem um significado adaptativo; • evolução – “quais foram os fatores envolvidos na moldagem do comportamento? Por que determinados comportamentos evoluíram e outros não?” – o comportamento evoluiu durante a história da espécie; • causa – “como isso funciona? Quais fatores internos e externos estão envolvidos no comportamento?” – o comportamento depende de características estruturais e fisiológicas do animal; • desenvolvimento – “como o comportamento é formado? Como o processo de desenvolvimento ocorre? O comportamento é aprendido ou inato? – os comportamentos desenvolvem-se ontogeneticamente, influenciados por diversos fatores. Portanto um estudo comportamental, para ser completo, deve focar nesses quatro aspectos, pois somente assim será possível um entendimentogeral sobre o comportamento observado nos animais. Obviamente, cada tópico é abordado separadamente e demora-se um tempo para produzir resultados robustos o suficiente para se desenhar a história evolutiva do comportamento em questão. 2.6 Considerações finais A Etologia é a área da Ciência que estuda o comportamento animal. Para que suas pesquisas tenham mérito, a metodologia científica deve ser aplicada, com hipóteses sendo testadas e teorias criadas. Perguntas claras e objetivas, associadas a métodos adequados, ajudam a confirmar ou rejeitar as hipóteses testadas. Abordar as quatro questões de Tinbergen são importantes para se entender globalmente um comportamento observado. Pesquisas em comportamento animal, além de fascinantes, são fáceis de serem executadas. No Brasil, o campo está aberto e há muito que se pesquisar. REFERÊNCIAS GALLI, E. A. Conocimiento tecnológico, educacion y tecnologia. Revista Latinoamericana de Innovaciones Educativas, Buenos Aires, v. 5, n. 12, p. 13-46, dec. 1993. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002. KREBS, J. R.; DAVIES, N. B. Introdução à Ecologia Comportamental. São Paulo: Atheneu, 1996. MANNING, A.; DAWKINS, M. S. An Introduction to Animal Behaviour. 5. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 1998. MARTIN, P.; BATESON, P. Measuring Behaviour: an introductory guide. 3. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2007. MARUYAMA, P. K. et al. Relation of group size and daily activity patterns to Southern lapwing (Vanellus chilensis) behaviour. Jornal of Ethology, Tokyo, v. 28, n. 2, p. 339-344, may. 2010. MCFARLAND, D. Animal Behaviour: psychobiology, ethology and evolution. 3. ed. Harlow: Prentice Hall, 1999. MOURA, M. L. S. et al. Manual de elaboração de projetos de pesquisa. Rio de Janeiro: Editora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 1998. SEVERINO, A. J. Metodologia do Trabalho Científico. 22. ed. São Paulo: Cortez, 2003. SILOTO, E. V. et al. Temperatura e enriquecimento ambiental sobre o bem-estar de coelhos em crescimento. Ciência Rural, Santa Maria, v. 39, n. 2, p. 528-533, mar./apr. 2009. SILVA, C. R. O. Metodologia e organização do projeto de pesquisa: guia prático. Fortaleza: Centro Federal de Educação Tecnológica do Ceará, 2004. CAPÍTULO 3 COMO MEDIR O COMPORTAMENTO ANIMAL Cristiano Schetini de Azevedo & Laura Aichinger Dias O estudo do comportamento animal é complexo, embora pareça simples. É mais do que simplesmente observar o que um animal está fazendo, é também testar hipóteses sobre como e por que um animal responde a certos estímulos. Como toda Ciência, o estudo do comportamento animal apresenta técnicas e métodos específicos que, se aplicados corretamente, podem validar os dados coletados, ajudando a inferir ideias reais sobre os animais observados. Por parecer simples, todos se acham capazes de realizar um estudo nessa área e, com isso, vários problemas podem surgir. Um deles é o antropomorfismo, em que o pesquisador interpreta o comportamento de um animal segundo seus próprios pensamentos e intenções, e frequentemente deixa a impressão de que os animais têm a consciência e os sentimentos humanos. Usar pensamentos e valores humanos pode impedir o entendimento global do comportamento. Antropomorfizar o comportamento animal é ainda muito discutido no meio acadêmico, com vários pesquisadores a favor da interpretação antropomórfica do comportamento animal e vários pesquisadores contra essa questão. Outro problema decorrente da condução de estudos comportamentais por amadores é a obtenção de conclusões equivocadas. Por exemplo, a presença de visitantes perto do recinto dos chimpanzés (Pan troglodytes, Hominidae) em um zoológico é benéfica aos animais porque eles “sorriem” muito, demonstrando a sua “felicidade”. Na verdade, quando os dois lábios estão levantados, mostrando os dentes superiores e inferiores ao mesmo tempo, os chimpanzés estão demonstrando medo; quando estão excitados, eles mostram apenas os dentes inferiores (Figura 2). FIGURA 2 – FEIÇÕES DOS CHIMPANZÉS (A – EXCITADO; B – MEDO) FONTE: Gabriela L. Deus (2017). Finalmente, também pode surgir a possibilidade da criação de leis e regulamentos sem nenhuma base científica. Um exemplo hipotético seria o surgimento de uma lei que regulamentasse a criação de animais silvestres em cativeiro. Se o legislador não possuir nenhum conhecimento acerca do comportamento dos animais, ele pode formular diretrizes para a construção dos recintos, como o seu tamanho, totalmente incorretas. Por exemplo, no Brasil, a Instrução Normativa n. 4, de 2002, do Ibama, regulamenta que todo recinto que abrigue fêmeas adultas de aves deve possuir um local adequado para desova. Um leigo pode produzir uma norma de construção de recintos de flamingos, por exemplo, com ninhos artificiais em árvores, ou seja, essa norma estaria totalmente equivocada, já que os flamingos aninham no chão, em ninhos construídos com barro. 3.1 Estudos descritivos (dados qualitativos) x experimentos (dados quantitativos) Os estudos do comportamento animal geralmente dividem-se em duas grandes categorias: os estudos descritivos (com a produção de dados qualitativos) e os experimentos (com a produção de dados quantitativos). Os dois tipos de abordagem são muito importantes e se complementam. Os estudos descritivos geram hipóteses que levam aos estudos experimentais, e os estudos experimentais são precedidos por descrições completas do repertório comportamental da espécie (etograma). Como veremos adiante no capítulo, a confecção de um etograma é a condição necessária para a realização de qualquer pesquisa comportamental. Os estudos descritivos normalmente envolvem observações do animal no ambiente selvagem, sob condições naturais, uma vez que o objetivo é descrever o seu comportamento normal. Vários estudos descritivos, entretanto, são realizados em cativeiro, seja pela dificuldade de observação da espécie em seu habitat natural, seja pela raridade da espécie. A ambientação naturalística dos recintos, aliada ao cuidado do observador em não interferir no comportamento do animal, dá muita credibilidade a esses estudos. Muitos estudos descritivos já foram conduzidos e o etograma de várias espécies já se encontra disponível na literatura. O site Ethosearch (www.ethosearch.org) possui um excelente banco de dados com etogramas de vários grupos animais, de peixes a mamíferos. Estudos descritivos clássicos envolvem a criação do etograma da espécie, como os estudos de Weeks (1973), em que é fornecido o etograma da perdiz (Rhynchotus rufescens, Tinamidae), e de Codenotti et al. (1995), em que é fornecido o etograma da ema (Rhea americana, Rheidae). Os experimentos em comportamento incluem a quantificação numérica dos dados coletados e a aplicação de análises estatísticas. Essas análises ajudam a comprovar ou a rejeitar as hipóteses testadas, mas não devem ser superenfatizadas como garantia de um bom trabalho. Normalmente, ocorre uma oscilação entre os estudos descritivos e os experimentais. Inicialmente, monta-se o etograma das espécies e criam-se as hipóteses (estudo descritivo), e depois se testam as hipóteses formuladas (estudo experimental). 3.2 Métodos Assim como em todas as outras ciências, para a validação dos dados coletados nas pesquisas de comportamento, métodos devem ser empregados desde o início do trabalho. Os métodos http://www.ethosearch.org/ empregados baseiam-se no método científico, mostrado na Figura 3. FIGURA 3 – DIAGRAMA REPRESENTANDO O MÉTODO CIENTÍFICO FONTE: o autor. Sempre devemos iniciar uma pesquisa com uma questão, pois é ela que norteará todo o procedimento restante. Com a questão formulada, as hipóteses que serão testadas são sugeridas. Por exemplo: • questão – por que os micos-estrela (Callithrix penicillata, Callitrichidae) vivem em grupos?; • hipótese – vivem em grupos para evitar os predadores. A pergunta e as hipóteses são fundamentais para a definição dos métodos empregados no estudo. Sem uma questão clara e objetiva, a metodologiaempregada e os resultados obtidos terão grande chance de serem ruins. Sem a escolha correta dos métodos, você só perde tempo durante o estudo. E lembre-se: tempo é dinheiro! Ao contrário, se a pergunta e os métodos utilizados para respondê-la forem adequados, os resultados serão confiáveis, permitirão a replicação do experimento e fornecerão subsídios para a formulação de novas hipóteses e teorias (método científico). Portanto a tática de anotar pilhas e pilhas de dados comportamentais para depois, no laboratório, tentar-se imaginar uma questão para responder não funciona. Pense nisso! Para realizar uma boa pesquisa em comportamento animal, você deve seguir nove passos principais: 1. escolha da espécie; 2. conhecimento da espécie escolhida; 3. observações preliminares; 4. identificação do projeto; 5. esboço do projeto; 6. preparação da proposta; 7. desenvolvimento do projeto; 8. análise, discussão e conclusão dos dados; 9. publicação do trabalho. 3.2.1 Escolha da espécie O primeiro passo diz respeito à escolha da espécie com a qual você vai trabalhar. Geralmente, essa escolha envolve a vontade do pesquisador em trabalhar com um animal que ele goste ou tem relação com a situação de ameaça de extinção na qual a espécie se encontra; espécies ameaçadas são muito estudadas devido à urgência de conhecimentos para melhorar sua conservação in situ e ex situ. Obviamente, a oportunidade de estudar determinadas espécies também pode aparecer a partir de contratos de trabalho, em que empresas contratam os etólogos para estudar as espécies que ocorrem em suas propriedades. 3.2.2 Conhecimento da espécie escolhida Após escolher a espécie para o estudo, você deve compilar o máximo de informações sobre ela. Esse passo deve ser realizado em bibliotecas e/ou na internet. Na biblioteca, procuramos por livros e artigos científicos que envolvam a espécie escolhida ou seus parentes mais próximos. Algumas publicações de referência, como o Zoological Records e o Biological Abstracts podem nortear as buscas nas revistas especializadas. Na internet, além de sites de procura usuais (Google®, Yahoo®, Altavista®), pode-se utilizar bancos de dados específicos, como o Web of Science ou o PubMed. É importante lembrar que muitas informações obtidas nas páginas de procura usuais são fornecidas por fontes duvidosas e podem não ser corretas. Portanto tenha cuidado e prefira sempre informações contidas em livros, artigos científicos e páginas da internet reconhecidamente sérias e embasadas cientificamente. A procura por referências bibliográficas é um passo importantíssimo, que deve ser realizado ao longo de todo o estudo e não somente no seu início ou final. A procura e leitura de artigos no início do projeto ajudam na formulação da pergunta, das hipóteses e na escolha dos métodos de coleta de dados utilizados. 3.2.3 Observações preliminares As observações preliminares configuram-se um dos passos mais importantes do estudo de comportamento. É nessa fase que acontece o primeiro contato do pesquisador com os animais escolhidos, na qual o pesquisador fará o reconhecimento e a identificação dos indivíduos, habituará os indivíduos à sua presença, montará o etograma, definirá o melhor período para a coleta de dados etc. Várias espécies animais apresentam marcas naturais conspícuas ou dimorfismo sexual que permitem uma identificação rápida dos indivíduos. Outras vezes, os indivíduos da espécie não apresentam tais diferenças, tornando-se virtualmente idênticos uns aos outros. Se for necessária a identificação individual dos animais, pode ser utilizada uma variedade de marcações, como anilhas, colares, microchips, brincos, pinturas, raspagem de pelos, tatuagens e mutilação de artelhos. Dentre esses métodos de marcação, recomenda-se que a mutilação seja evitada, já que esse método tem sido proibido pelos Conselhos de Ética e Bem-Estar Animal em vários países do mundo, sendo considerado crime em vários deles, inclusive no Brasil. Além disso, as revistas de comportamento animal mais respeitadas mundialmente têm recusado a publicação de pesquisas que envolvam sofrimento de qualquer natureza aos animais. É também nessa fase que vamos habituar os animais a nossa presença; quando os animais estão habituados à presença do pesquisador, eles se comportam naturalmente, ignorando-o. Habituar significa acostumar os animais à presença do pesquisador. Devemos certificar-nos de que nossa presença não está influenciando no comportamento do animal observado, caso contrário, os dados coletados podem ser tendenciosos e não refletir a realidade. Por exemplo: imagine que você vai coletar dados de uma espécie de peixe qualquer em um grande aquário; seu objetivo é avaliar o comportamento de agrupamento dessa espécie. Se sua presença for uma ameaça aos peixes, eles podem ficar agrupados em todas as observações comportamentais, simplesmente porque você estava presente na frente do aquário, enviesando seus resultados. Durante o período de observações preliminares, esse problema poderia ter sido observado e um local escondido de observações poderia ter sido pensado para as coletas oficiais de dados, em que sua presença não seria problema para os peixes e os dados coletados refletiriam mais a realidade dos fatos. Para avaliar se a presença do pesquisador está influenciando o comportamento dos animais observados, realizamos experiências de coleta de dados a várias distâncias dos indivíduos. A comparação dos comportamentos exibidos a essas várias distâncias ajuda na decisão de qual distância é a mais adequada para se coletar os dados. Para habituar o animal, basta ficar parado próximo a ele, por um período de uma hora por dia em média, em dias consecutivos, sem realizar movimentos bruscos ou emitir ruídos altos. Essa exposição à sua presença permitirá ao animal aprender que você não é uma ameaça. No momento em que o animal começar a ignorar o observador, ele estará habituado à sua presença. Outro ponto importante a ser definido é o treinamento dos observadores, caso exista mais de um. É necessário que todos os observadores entrem em acordo sobre os comportamentos amostrados, para evitar erros de coleta de dados. Para avaliar o grau de similaridade entre os pesquisadores, todos devem coletar dados do mesmo animal, ao mesmo tempo. Após a coleta, devemos comparar os dados de cada pesquisador. Assumimos que os observadores estão identificando os comportamentos exibidos da mesma maneira quando a similaridade exibida entre eles for superior a 95%. Se a similaridade entre os dados for menor que 95%, então os pesquisadores devem treinar mais, até atingir o mínimo de similaridade. O estudo propriamente dito só deve começar após os pesquisadores terem atingido a igualdade na coleta dos dados. Quando os dados são coletados de maneira errônea, a análise torna-se dificultada e, às vezes, impossível de ser realizada, e os resultados estarão, obviamente, inadequados. Finalmente, é durante a fase de observações preliminares que se dá a montagem do etograma da espécie estudada. O etograma é o inventário completo (ou parcial, dependendo do tipo de estudo) do repertório comportamental da espécie. Um exemplo de etograma é fornecido para a perdiz (Rhynchotus rufescens, Aves – Tabela 2). O etograma deve ser o mais completo possível, englobando o maior número de comportamentos. O levantamento bibliográfico pode revelar estudos anteriores envolvendo a espécie, e a utilização do etograma já publicado é preferível, pois permite a comparação dos resultados entre os estudos. Por exemplo, se você escolher estudar o cágado irapuca (Podocnemis erythrocephala), pode usar o etograma já descrito e publicado por Schneider et al. (2010). Caso seja detectado um comportamento não descrito no etograma já publicado, ele deve ser acrescentado e descrito no trabalho em andamento. Normalmente, atribuímos siglas aos comportamentos estudados; elas são utilizadas na formulação da ficha de campo. TABELA 2 – ETOGRAMA RESUMIDO DA PERDIZ (RHYNCHOTUS RUFESCENS, AVES) Comportamento S���� DescriçãoFurando o solo com o bico FS A ave passa algum tempo furando o chão; joga terra para fora do buraco com o bico. Bicando as BAR A ave fica bicando o caule ou as folhas das plantas dos plantas do recinto recintos. Comendo CO A ave está comendo a ração no comedouro ou nos tanquescom areia. Fingindo fuga FF A ave dá um pulo, como se fosse levantar vôo, e, ao cair nochão, sai correndo para algum dos lados. Andando de um lado para o outro ALO A ave fica andando de um lado para o outro, usando os mesmos caminhos. Ativo AT Compreende os comportamentos: andando pelo recinto, copulando, arrumando as penas com o bico, correndo pelo recinto, espreguiçando (estica a asa e/ou a perna, do mesmo lado, ao mesmo tempo), construindo o ninho, tomando banho (água ou terra) e vocalizando. Outros comportamentos OUT Outros comportamentos. Não visível NV Quando a ave não está visível ao observador. FONTE: Azevedo e Faggioli (2001). O monitoramento por longos períodos nos permite o levantamento do maior número possível de comportamentos, inclusive os reprodutivos (que normalmente ocorrem em épocas distintas do ano). O ideal seria um ano de observações preliminares. Como na grande maioria dos estudos o prazo é um fator limitante, as observações realizadas durante uma semana inteira, em vários horários do dia, podem fornecer etogramas relativamente completos. Essas observações em horários diferentes ajudam a identificar os períodos de maior atividade dos animais (os melhores períodos para as coletas de dados da pesquisa acontecerem, uma vez que os animais estão ativos). Por exemplo, observe o animal na segunda-feira das 6h00 às 8h00; na terça-feira, das 8h00 às 10h00; na quarta-feira, das 10h00 às 12h00; na quinta-feira, das 12h00 às 14h00; na sexta-feira, das 14h00 às 16h00; no sábado, das 16h00 às 18h00; e no domingo, das 18h00 às 20h00. Assim, além de um bom etograma, você também poderá definir qual é o horário do dia em que o animal está mais ativo; este deverá ser o momento preferencial de coleta de dados comportamentais (obviamente, o horário das coletas dependerá dos objetivos do estudo). O método de coleta de dados utilizado para a montagem do etograma é o conhecido como ad libitum. Nesse método, anotamos tudo o que os animais observados fazem, sem nenhum critério de anotação. Depois compilamos dessas anotações os comportamentos observados para a montagem do etograma. Por exemplo, imagine que você vai montar o etograma de um lobo- guará mantido no zoológico de sua cidade; o seu material de coleta será uma prancheta, folhas de papel em branco, lápis, borracha e relógio; durante as coletas, anote dados como: às 8:00h, o lobo começou a andar pelo recindo, às 8:12h, o lobo bebeu água, às 8:44h, o lobo se coçou etc. No final das observações, separe os comportamentos e monte o etograma. Os comportamentos observados foram: “andando”, “bebendo água” e “coçando”. Ao montar um etograma, devemos evitar o antropomorfismo, como: “o animal está sorrindo, chorando, triste” etc. O etograma deve ser exaustivo; o animal deve estar sempre fazendo alguma coisa. Se o animal, no momento da anotação, não estiver fazendo “nada”, a anotação deverá ser feita na categoria “inativo”. O etograma também deve ser mutuamente exclusivo, ou seja, o animal precisa fazer apenas um comportamento por vez, necessitando sempre ter em mente a motivação do animal. Por exemplo: imagine um professor andando de um lado para o outro da sala e gesticulando ao mesmo tempo em que fala. Qual dos três comportamentos deve ser anotado na ficha de campo? “Falando”, “andando de um lado para o outro” ou “gesticulando”? Nenhum deles. O correto seria “dando aula”, já que era essa a motivação do professor. Portanto crie categorias que englobem mais do que um comportamento quando o animal observado realizar mais do que um comportamento ao mesmo tempo. Idealmente, o etograma deve conter entre seis e 12 comportamentos. Etogramas com menos de seis comportamentos são incompletos; com mais de 12 comportamentos devem ser utilizados com cuidado, apenas nos estudos que necessitem um grande número de comportamentos para responder à questão inicial da pesquisa, pois são difíceis de serem manuseados na ficha de campo (demoramos muito tempo para localizar o comportamento na ficha de campo caso sejam muitas as categorias comportamentais, e isso pode atrapalhar a coleta de dados). Durante o estudo, é importante utilizar apenas os comportamentos que sejam suficientes para responder à pergunta inicial. Por exemplo: se o objetivo é estudar por que os animais não estão se acasalando, deve-se optar por avaliar os comportamentos reprodutivos da espécie, e não os comportamentos de alimentação. O etograma deve sempre conter duas categorias: “outros comportamentos” e “não visível”. Sempre que durante o estudo o animal exibir um comportamento nunca visto antes, ele deve ser colocado na categoria “outros comportamentos”, e depois descrito e incorporado ao etograma original. A categoria não visível é autoexplicativa (não é um comportamento, mas sim uma categoria que completa as observações). Sempre que o animal observado sair do campo de visão do observador, o registro deve ser feito nessa categoria. É importante salientar que o observador não deve ser uma estátua na frente do animal. Desde que sua movimentação não influencie no comportamento do animal, o observador pode movimentar-se para que o comportamento seja observado pelo maior tempo possível (afinal, o que importa num estudo de comportamento é a anotação dos comportamentos do animal). 3.2.4 Identificação do projeto Após as observações preliminares e a montagem do etograma, iniciamos a montagem do projeto. Essa é a fase em que a pergunta será desenvolvida; ela deve ser clara e objetiva, pois norteará toda a coleta de dados, sua análise e discussão. Quanto mais complicada a pergunta, mais difícil e confuso torna-se o restante do trabalho. Lembre-se do método científico. • Exemplo: o estudo da perdiz (Rhynchotus rufescens, Aves). • Pergunta: por que o recinto das perdizes fica com o solo tão esburacado? • Hipótese: o solo fica esburacado porque a comida é fornecida numa bandeja, não dando a oportunidade de forrageio para as perdizes. • Predição: fornecer a comida num tanque com areia diminuirá a atividade de furar o solo e o recinto ficará mais adequado para a exposição ao público. 3.2.5 Esboço do projeto Chegou a hora de esboçar a proposta. Essa é a fase de delimitação dos materiais a serem utilizados e dos métodos de coleta de dados a serem empregados. De acordo com a pergunta inicial, separamos do etograma todos os comportamentos que serão relevantes para o estudo. Os comportamentos descartados podem ser agrupados em categorias mais abrangentes (como “ativo”, “inativo” etc.) ou serem agrupadas na categoria “outros comportamentos”. Para os dados coletados gerarem bons resultados, propõe-se que o estudo tenha pelo menos 20 horas de observações comportamentais. Obviamente, quanto mais horas, mais confiáveis serão os resultados (o poder estatístico aumenta com o tamanho da amostra), e o tempo de estudo depende da pergunta inicial. Com menos de 20 horas de observações, os resultados não são tão precisos, gerando conclusões duvidosas. Nessa fase são definidos os testes estatísticos a serem utilizados na análise dos dados. Testes paramétricos, como o Teste t, Anova (one-way ou two-way) etc., são utilizados quando a distribuição dos dados é normal. Testes não paramétricos, como o Kruskal-Wallis, Mann-Whitney e qui-quadrado, são utilizados quando a distribuição dos dados não é normal. Os programas estatísticos apresentam testes que ajudam na definição da normalidade dos dados. Como o teste de normalidade só é executado após a coleta de dados, eventualmente o teste estatístico escolhido para a análise pode ser trocado por outro mais adequado após a avaliação dos dados. Também é o momento de definir o tipo de medida que iremos tomar: latência, frequência e duração. A latência é o tempo que o animal leva para
Compartilhar