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Bioquímica Básica João Vitor Novaes | 74A Medicina FCM-MG 1º período 2020.2 FUNÇÕES DAS PROTEÍNAS Objetivos da aula: - Compreender as principais funções das proteínas - Entender como ocorre a ligação reversível de uma proteína com um ligante - Elucidar as principais propriedades do grupo heme - Conhecer as interações complementares entre proteínas e ligantes - Interpretar as interações entre proteínas moduladas por energia química - Elucidar o processo da contração muscular e seus mecanismos bioquímicos Funções das proteínas que serão trabalhadas: - Ligação reversível de uma proteína com um ligante - Interação complementar entre proteína e ligante - Interação entre proteína modulada por energia química 1. LIGAÇÃO REVERSÍVEL DE UMA PROTEÍNA COM UM LIGANTE Para exemplificar essa função, temos a proteína hemoglobina (dentro dos eritrócitos na corrente sanguínea – transporta oxigênio). Para que esse transporte ocorra, essa proteína deve estar ligada ao grupo heme (seu grupo prostético). Para entendermos a interação entre o oxigênio e a hemoglobina, é de extrema importância entender a conformação do grupo heme – um anel de protoporfirina ligado ao ferro (em seu estado ferroso – Fe2+), tendo ainda dois sítios de ligação a serem realizadas. Quando olhamos no meio do anel de protoporfirina, vemos que o Fe está fazendo 4 ligações com os nitrogênios, mas ainda existem duas ligações para serem feitas. Nessa imagem, o anel de protoporfirina está sendo representado pelo retângulo preto. Sobraram duas ligações (uma para o plano inferior e outra para o plano superior do grupo heme). E é justamente nessas duas ligações que teremos a interação do grupo heme com a proteína, porque o grupo heme vai se ligar covalentemente a um aminoácido da proteína (representado pelo X). E no plano superior vemos o grupo heme realizando uma ligação com o oxigênio. Plano representado pela tira rosa: anel de protoporfirina. O grupo heme também consegue interagir com o monóxido de carbono – na verdade, tem mais afinidade do que com o oxigênio. Isso é preocupante, pois pode causar um quadro de intoxicação com o monóxido de carbono, justamente porque o monóxido de carbono compete com o oxigênio pelo sítio de ligação (e, como ele tem maior afinidade, ele se liga mais ao grupo heme do que o oxigênio). Lembrar: temos que ter uma concentração muito maior de monóxido de carbono para que isso realmente consiga gerar um efeito tóxico no nosso organismo. A mioglobina é uma proteína que tem a função de armazenas oxigênio nos nossos tecidos. Para que isso ocorra, ela também precisa da presença do grupo heme (representado em vermelho na figura ao lado). A ligação inferior do grupo heme está sendo feita com a histidina (um aminoácido da mioglobina) e a ligação superior é realizada com o oxigênio. Aminoácidos superiores: valina, histidina e fenilalanina. - Esses aminoácidos auxiliam a interação com o oxigênio, mesmo que não estejam estabelecendo ligação covalente com ele. Assim como na mioglobina, também temos a presença do grupo heme na hemoglobina. - Interações dominantes entre as subunidades da hemoglobina: A hemoglobina é formada por 4 subunidades: - 2 subunidades β (idênticas entre si) - 2 subunidades α (idênticas entre si) Essas subunidades interagem entre si (pontos dominantes de interação entre as subunidades destacados pelos círculos). A cada mudança conformacional que houver em uma das subunidades, a estrutura das outras subunidades será interferida. - Grupo heme da hemoglobina: Ao lado, as setas vermelhas representam o grupo heme de cada subunidade da hemoglobina. - O Fe (elemento central) está simbolizado pela bolinha cinza. Cada grupo heme consegue interagir com um oxigênio. Com isso, até quantos oxigênios podem se ligar a hemoglobina ao mesmo tempo? Até 4 oxigênios, visto que cada grupo heme se liga a um O. - Estados da hemoglobina: A hemoglobina pode apresentar dois estados: - T (tensionado) - R (relaxado) - Os dois estados apresentam diferenças estruturais (geralmente, influenciadas por mais de um fator). Por exemplo, pelo estado de ionização dos aminoácidos que compõem a hemoglobina: - Estado T: afinidade ao oxigênio - Estado R: afinidade ao oxigênio Porém, importante lembrar que nos dois casos, a hemoglobina consegue se ligar ao oxigênio. - Hemoglobina: alta ou baixa afinidade? A partir do conhecimento de que a hemoglobina é responsável pelo transporte de oxigênio (na figura ao lado, oxigênio interage com o grupo heme presente na hemoglobina, que, por sua vez, está dentro do eritrócito), é interessante que a hemoglobina tenha alta ou baixa afinidade pelo oxigênio? - Número 1 (alta afinidade): função desempenhada pela hemoglobina no pulmão. (captação de oxigênio – nesse momento precisa ter uma alta afinidade a ele). - Número 2: hemoglobina vai pela corrente sanguínea do pulmão até chegar aos tecidos. - Número 3 (baixa afinidade): função desempenhada pela hemoglobina nos tecidos. (liberação de oxigênio – nesse momento precisa ter baixa afinidade a ele). Portanto, conclui-se que a afinidade deve ser alta nos pulmões e baixa nos tecidos. - Na ordenada desse gráfico, temos o grau de saturação da hemoglobina (quantos sítios da hemoglobina estão ocupados por oxigênio). índice número de oxigênios ligados à hemoglobina - Na abcissa, temos a pressão de oxigênio. - A hemoglobina, então, apresenta um estado de transição ente a alta e a baixa afinidade de hemoglobina com oxigênio (curva central do gráfico). - Nessa curva de transição, a pressão de oxigênio nos pulmões (em vermelho) é quase máxima – ou seja, a hemoglobina terá uma alta capacidade de captar o oxigênio. A pressão de oxigênio nos tecidos (em azul), por sua vez, reduz muito, permitindo com que a hemoglobina seja capaz de liberar o oxigênio para os tecidos. O que faz a proteína mudar o seu estado de afinidade? - Efeito Bohr: é o efeito do pH e da concentração de CO2 sobre a ligação e a liberação do oxigênio pela hemoglobina. - Devido ao fato dos aminoácidos serem ionizáveis, eles podem receber ou doar prótons através do seu grupo radical. Com isso, podemos mudar a característica química do aminoácido (+, neutro ou -), alterando sua estrutura da hemoglobina e afetando, diretamente, a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio. O CO2 também afeta essa estrutura, porque ele pode se ligar em uma das extremidades amino-terminais, transformando-a em extremidade carbamino-terminal (carga negativa), influenciando na estrutura da hemoglobina e, consequentemente, na afinidade com o oxigênio. - Onde tem mais CO2? Nos músculos, porque ele é metabolicamente mais ativo. CO2 e H2O ácido carbônico pH do músculo mais baixo ionização dos aminoácidos afinidade da hemoglobina ao oxigênio no tecido muscular. pH 7,4 pH sanguíneo pH 7,2 pH muscular pH 7.6 pH pulmonar Afinidade diferente de acordo com o pH. Menor afinidade = pH de 7.2 (tecido muscular) Maior afinidade = pH de 7.6 (pulmão) pH acidez afinidade com O2 - 2,3-bifosfoglicerato ou 2,3-BPG: 2,3-BPG + hemoglobina redução da afinidade Hb-O2. Quando isso vai ser importante no organismo? - Altitudes elevadas - Hipóxia ( [O2] nos tecidos) Quando será mais importante a liberação do oxigênio nos tecidos Na figura ao lado, o BPG interage no centro do tetrâmero da hemoglobina (lembrar que o BPG age na hemoglobina somente quando ela está em seu estado tensionado – menor afinidade à Hb). Dessa forma, o BPG estabiliza a hemoglobina e faz com que ela transite do estado T para o estado R (relaxado). Com a transição, ocorre a saída do BPG do centro do tetrâmero. - O que pode promover isso? A ligação do próprio oxigênio a um grupo heme (ligação cooperativa).Quando o oxigênio se liga a um grupo heme, ele faz com que a afinidade da outra subunidade pelo oxigênio aumente. Então, de acordo com o número de ligação, essa molécula da hemoglobina vai tender a passar para o estado relaxado. 2. INTERAÇÃO COMPLEMENTAR ENTRE PROTEÍNA E LIGANTE Como exemplo desse tipo de interação, citaremos uma função do nosso sistema imune: a imunidade adquirida – na qual teremos receptores de antígenos específicos. - Receptores de antígenos: Dois receptores de antígenos específicos são: - Imunoglobulina/anticorpo (presente no linfócito B) - TCR – receptor de célula T (presente no linfócito T) À esquerda da figura acima, podemos ver a estrutura do anticorpo. - É uma proteína quaternária (quatro cadeias polipeptídicas) 2 cadeias leves (vermelhas) – idênticas entre si. 2 cadeias pesadas (azuis) – também idênticas entre si. - Porção Fab (sítio de ligação ao antígeno). - Porcão Fc (porção efetora). A junção das cadeias leve e pesada na parte amino-terminal é um sítio de ligação ao antígeno. Fab: porção amino-terminal Sítio de ligação ao antígeno O anticorpo tem dois sítios de ligação ao antígeno (molécula verde). Na foto da direita, podemos ver que dois antígenos ligados à mesma molécula do anticorpo, na extremidade amino-terminal. Em amarelo, temos as pontes de sulfeto. - Especificidades dos anticorpos: Uma das características mais marcantes dos anticorpos é a especificidade – porção Fab liga ao antígeno de maneira específica. Para que exista essa especificidade, deve existir uma complementariedade entre o epítopo do antígeno e a superfície do anticorpo. Ao lado, por exemplo, o anticorpo só consegue se ligar ao antígeno A. - Representação tridimensional da região do anticorpo ligadora ao antígeno: (Fab – aminoterminal do anticorpo) Focar nas regiões coloridas! Região Fab sem antígeno Região Fab com antígeno Região Fab com antígeno ligado - Receptor de célula T: - Linfócito T: azul - Receptor de célula T (TCR): roxo Esse receptor de antígeno não reconhece antígenos solúveis no corpo – como exemplo, anticorpos. Precisa de uma Célula Presentadora de Antígenos (em verde). - Qual molécula terá nessa célula? MHC (Complexo Principal de Histocompatibilidade) associada a um antígeno, que será apresentado ao linfócito T. Ao lado, conseguimos observar a estrutura proteica do TCR (verde e lilás). Qual o nível estrutural secundário que observamos no TCR? - Folha β antiparalela TCR interage com o MHC das células apresentadoras. - Antígeno: amarelo. Interação MHC-peptídeo com o TCR será uma interação complementar. 3. INTERAÇÃO ENTRE PROTEÍNAS MODULADAS POR ENERGIA QUÍMICA - Principalmente, ACTINA e MIOSINA processo de contração muscular (modulado por energia química). MIOSINA - Proteína quarentenária - Formada por 6 subunidades - 2 cadeias pesadas (vermelha e rosa) - 4 cadeias leves (azuis) – ligadas na cabeça da miosina (extremidade aminoterminal) - Dividida em cabeça e cauda Na figura a, temos várias miosinas reagindo entre si. Formam o filamento grosso do sarcômero. ACTINA - Nível estrutural quaternário - Cada bolinha é uma subunidade - Forma o filamento fino - Interação entre actina e miosina: A cabeça da miosina interage com o sitio de ligação presente no filamento de actina. - Estrutura do músculo esquelético: - Sarcômero: Banda I: o Filamentos finos - actina Banda A: o Duas colorações diferentes Mais escura: sobreposição entre actina e miosina Mais clara: filamentos grossos – miosina - Contração muscular: Deslizamento da actina sobre a miosina. Dessa maneira, a parte onde só tinha miosina diminui. - Banda I diminui (actina desliza sobre miosina) - Banda A: região de sobreposição aumenta Figura a: músculo relaxado Figura c: contração muscular - Princípio básico da contração muscular: O filamento de actina é formado por várias subunidades (uma subunidade destacada com um amarelo mais escuro e um amarelo mais claro). O amarelo mais escuro interage com a cabeça da miosina. Na figura logo abaixo, conseguimos ver que o ATP agora passou a interagir com a cabeça da miosina (e o que vai acontecer com esse ATP? Ele vai ser hidrolisado). Essa hidrólise vai formar justamente ADP e fosfato (com liberação de energia química). Essa energia química promove uma mudança estrutural na cabeça da miosina, o que faz com que ela movimente. Assim, podemos perceber, na figura inferior, que a cabeça da miosina passou a interagir com outra subunidade da actina (primeiro, ela estava interagindo com o amarelo mais escuro e, agora, está interagindo com o amarelo mais claro). Com isso, conseguimos gerar o movimento a seguir: as cabeças da miosina vão interagindo com diferentes subunidades da actina, promovendo um deslizamento do filamento de actina sob o filamento da miosina. Em amarelo, temos a proteína actina (amarelo) e a miosina (azul). Além delas, temos a troponina e a tropomiosina. - Tropomiosina: bloqueia o sitio de ligação da cabeça da miosina. Então, a miosina não consegue se ligar na actina se a tropomiosina estiver bloqueando esse sítio. - Troponina: é quem regula esse bloqueio. Tem um sítio de ligação ao cálcio. - Na figura acima, temos a cabeça da miosina normal e uma cabeça da miosina com uma áurea vermelha (energizada). Quem vai energiza-la? ATP (quando o ATP é clivado em ADP e fosfato, a cabeça da miosina fica energizada). - Então, para dar início ao processo de contração muscular, a primeira coisa que precisamos fazer é adicionar o cálcio. Quando adicionamos o Ca, ele vai se ligar à troponina – gerando uma mudança conformacional na tropomiosina, que acaba por liberar um sítio de ligação da actina, que interage justamente com a cabeça da miosina. - Quando a cabeça da miosina interage com a actina, ela vai conseguir clivar o ATP em ADP e fosfato. Fica energizada (tem uma mudança estrutural, sendo possível se ligar no próximo sitio da actina). Teremos, então, um deslocamento da actina. Quando teremos um relaxamento? Quando se cessa o estímulo do cálcio (quando tiramos o cálcio, a tropomiosina volta a tampar o sítio de ligação da actina – com isso, a miosina não consegue mais interagir).
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