Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Da exclusão à inclusão: aspectos históricos APRESENTAÇÃO Assim como o próprio conceito de deficiência não é unívoco, o tratamento dado às pessoas com deficiência também varia nas diferentes épocas e culturas. Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar algumas fases históricas relevantes do posicionamento social frente às pessoas com deficiência. Além disso, você vai refletir sobre as razões pelas quais, na Contemporaneidade, muitos esforços estão sendo realizados no sentido de pensar a educação de uma forma mais inclusiva tanto para as pessoas com ou sem deficiência. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Reconhecer algumas fases históricas e o tratamento dado às pessoas com deficiência ao longo da história. • Identificar as razões pelas quais, na sociedade atual, existem esforços para se pensar em uma educação inclusiva. • Descrever as diferentes nomenclaturas utilizadas para se referir às pessoas com deficiência ao longo da história. • DESAFIO Segundo a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008), a educação inclusiva “constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola” (BRASIL, 2008, p. 5). É nessa perspectiva que o conceito de “deficiência” é pensado, visto como um conceito em evolução. O decreto 6949/2009 (advindo da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com deficiência – ONU/2006), em que traz essa perspectiva, também ressalta: “a deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas” (BRASIL, Decreto 6949/2009). Por isso, em uma perspectiva inclusiva, é necessário buscar transpor barreiras, tornando espaços e propostas acessíveis a todas as pessoas, sejam elas com ou sem deficiências. Perante as o exposto acima, um local pode ou não proporcionar acessibilidade às pessoas com alguma deficiência. Por exemplo, um elevador com numeração também em braile permite que uma pessoa cega o exposto acima, um local pode ou não proporcionar acessibilidade às pessoas com alguma deficiência; No momento em que não há a numeração em braile, há uma barreira para essa pessoa, colocando em evidência a sua deficiência visual. Diante do exposto, o seu Desafio é descrever um espaço, situação ou proposta, no ambiente escolar, em que um estudante com deficiência encontraria barreiras para se locomover, compreender, lidar ou resolver, trazendo em sua escrita a forma como essas barreiras poderiam ser transpostas ou, até mesmo, eliminadas. INFOGRÁFICO Hoje, as pessoas com deficiência são reconhecidas pela legislação como pessoas de direito. Isso significa que elas têm garantidos por lei os mesmos direitos das pessoas sem deficiência, mas nem sempre foi assim. Acompanhe, neste Infográfico, as formas como as pessoas com deficiência foram tratadas ao longo da história e as diferenças entre exclusão, segregação, integração e inclusão. CONTEÚDO DO LIVRO As pessoas com deficiência, ao longo da história, sofreram e ainda sofrem segregação e discriminação em todos os setores da sociedade, e na área da educação não poderia ser diferente. Isso não significa que não houve avanços no sentido de incluir essas pessoas. Muito pelo contrário, desde a época medieval, em que as pessoas com deficiência eram consideradas sub- humanas, até os dias atuais, muita coisa mudou. Hoje, já existem várias políticas públicas que garantem a inclusão, a permanência e a aprendizagem dessas pessoas nas escolas regulares. Para entender mais sobre esse assunto, leia o capítulo Da exclusão à inclusão: aspectos históricos, parte integrante da obra Educação Inclusiva: Fundamentos e Metodologia. Boa leitura. PSICOLOGIA E A PESSOA COM DEFICIÊNCIA Daiane Duarte Da exclusão à inclusão: aspectos históricos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Reconhecer algumas fases históricas e o tratamento dado às pessoas com deficiência ao longo da história. � Identificar razões pelas quais, na sociedade atual, existem esforços para se pensar em uma educação inclusiva. � Descrever as diferentes nomenclaturas utilizadas para referir-se às pessoas com deficiência ao longo da história. Introdução A construção de uma trajetória da exclusão para a inclusão é processual e se dá principalmente por meio da educação — de uma educação para a inclusão. Desse modo, é importante conhecer a deficiência ao longo do tempo e da história, especialmente no que concerne ao desenvolvimento de práticas inclusivas. Neste capítulo, você vai estudar diferentes momentos históricos do tratamento oportunizado às pessoas com deficiência, bem como as origens da educação especial. Em seguida, identificará quais motivos levam a sociedade atual a discutir os aspectos que circundam a edu- cação especial e que promovem uma busca pelo desenvolvimento da educação inclusiva. Por fim, refletirá sobre os conceitos mais apropriados para referir-se à temática sobre pessoas com deficiência. As pessoas com deficiência e o tratamento dado a elas ao longo da história Ao longo da história da humanidade, as pessoas com deficiência foram vistas das mais variadas formas, acompanhando a evolução do pensamento humano característico de cada época. Elas foram sujeitadas a situações que iam desde uma visão divina sobre as suas condições até métodos de correção e cura por meio de torturas e sacrifícios. Dessa maneira, as pessoas com deficiência ficaram à mercê das resoluções alheias, discriminadas e pouco ou nada com- preendidas ao longo da história. Já nos tempos mais remotos, em civilizações arcaicas, é possível encontrar registros sobre os métodos adotados para o manejo com as pessoas com defici- ência, levando muitas vezes à sua aniquilação. Como exemplo, podemos citar Esparta, onde, de acordo com a legislação instaurada, as crianças nascidas com alguma deformidade ou diferença anatômica não eram consideradas pessoas e, portanto, eram levadas ao alto de montes e atiradas de lá. Imaginava-se que essas crianças deveriam ser imediatamente eliminadas por representarem impedimentos para a procriação de sujeitos que se encaixavam em um padrão de “normalidade” (LORENTZ, 2006). Métodos semelhantes são encontrados em estudos antropológicos sobre tribos indígenas de diversas regiões do planeta, demonstrando visivelmente um estigma criado em relação àqueles que possuíam alguma diferença. Mesmo pessoas nascidas com um padrão anatômico aceitável ou não muito discrepante dos demais, ao desenvolverem e demonstrarem qualquer dificuldade, eram afastadas do grupo e deixadas à própria sorte em locais afastados, em meio à florestas. Demonstra-se assim que as pessoas com deficiência carregam consigo, ao longo de toda a história da civilização, marcas e estigmas engen- drados para excluí-las e segregá-las, sendo essas condutas justificadas por ideias hegemônicas e preconceituosas (GOFFMAN, 1978). Tais métodos eram justificados por códigos e escritos que relatavam os modos de viver da época, conforme os registros de Aristóteles e Platão, sobre legislações ideais na Antiguidade Clássica. Nesses registros, fica claro que os direitos individuais não eram reconhecidos e, portanto, eram colocados em segundo plano em relação ao direito público coletivo. Dessa forma, o Estado tinha o direito de não tolerar as deformidades ou monstruosidades de seus cidadãos (COULANGES, 2003). As religiões contribuíram para o entendimento de que as pessoas com deficiência deveriam ser vistas como pessoas em uma situação passívelde cuidado e atenção, ainda que essa perspectiva tenha seus aspectos exclu- dentes, por meio da criação de instituições como asilos e hospitais, onde as pessoas acabavam ficando confinadas sob a alegação de que deveriam receber assistência. Tal perspectiva contribuiu para um olhar mais orgânico sobre as deficiências, inserindo a ideia de que a pessoa com deficiência poderia ser curada, tratada ou desenvolvida de alguma maneira que a aproximasse de Da exclusão à inclusão: aspectos históricos2 um padrão de normalidade, atribuindo funcionalidade e independência aos sujeitos (PIOVESAN, 2012). No decorrer de todos os momentos históricos, da civilização mais arcaica até bem recentemente, há registros de condutas excludentes e exterminadoras de pessoas com deficiência. Esses indivíduos foram eliminados por meio de assassinatos, abandonados sem qualquer cuidado, encarcerados e expostos a experimentos e pesquisas desumanas — como visto em relatos da Segunda Guerra Mundial (LORENTZ, 2006). O período entre guerras da primeira metade do século XX e a escassez da mão de obra qualificada oportunizaram a necessidade de educar e desenvolver, de maneira a construir a autonomia e as competências das pessoas com defi- ciência. Além disso, também possibilitaram o surgimento de classes especiais de educação dentro de escolas regulares, bem como o desenvolvimento de centros de reabilitação para as mais variadas deficiências. De acordo com Canziani (1995), foi somente a partir da segunda metade do século XX que as pessoas com deficiência puderam escapar da concepção de invalidez e ser vistas como pessoas aptas ou inaptas — ideia que coincidiu com a expansão do modelo econômico capitalista. Conforme indica Lorentz (2006), a educação especial começou a ser deli- neada por meio do assistencialismo de clínicas e locais para o desenvolvimento das pessoas com deficiência. Nesses espaços, era priorizada a necessidade de ajustar, moldar, condicionar e, ainda, almejar a cura das pessoas com de- ficiência, para somente depois promover a sua inserção na sociedade. Nesse sentido, mesmo quando começaram a surgir classes especiais dentro das escolas regulares, estas ainda tinham o intuito de segregar, pois se compreendia, nessa época, que era preciso preparar a pessoa com deficiência para o convívio social, para, numa fase posterior, permitir o seu convívio com a sociedade. A década de 1980 foi um marco importante para as pessoas com deficiência, em especial para a construção de considerações relacionadas à sua educação. O ano de 1981 foi declarado como o Ano Internacional da Pessoa Deficiente (como era denominada a pessoa com deficiência nessa época) e deu o primeiro pontapé para as tessituras da efetivação dos direitos humanos das pessoas com deficiência. Esse fato produziu nas pessoas com deficiência consciência de si e de suas condições e potencialidades, possibilitando, a partir disso, uma organização política (FIGUEIRA, 2008). Somente em 1986, a expressão “alunos excepcionais” foi substituída por “alunos portadores de necessidades especiais”, conforme Bueno (1993). Nesse sentido, a partir dessa apropriação das pessoas com deficiência, a sociedade passou a desenvolver a sua aceitação e respeito, buscando superar a ideia de 3Da exclusão à inclusão: aspectos históricos que esses indivíduos deveriam ter superado as suas diferenças, para somente depois se inserirem no convívio social. Aos poucos, em meio ao crescente interesse de diversos estudiosos para a construção de teorias da educação e a consciência de uma impossibilidade de cura para muitas deficiências, foi se potencializando a necessidade de abertura de oportunidades para as pessoas com deficiência, para a cons- trução de seus direitos basilares a partir de seus próprios discursos. Dessa maneira, a tolerância à pessoa com deficiência também foi consubstanciada na proteção e no paternalismo da sociedade em relação esse grupo de pessoas, por meio de declarações como a de Salamanca, em 1994, sobre princípios, políticas e práticas na área das necessidades educativas espe- ciais, e as convenções internacionais da Organização das Nações Unidas (ONU) de 1996 e 1997. Em essência, as lutas pelos direitos das pessoas com deficiência implicaram fortemente na construção e no delineamento da educação especial. Contudo, apesar de todo o embasamento legislativo e da conquista dos direitos das pessoas com deficiência, ainda se contem- plava a ideia de que era a pessoa com deficiência que precisava se adaptar à sociedade, e não a sociedade que lhe propiciaria meios de acessibilidade (PIOVESAN, 2012). Assim, as pessoas com deficiência foram percebidas como pessoas so- mente na história bem recente, ao fim do século XX e início do século XXI. Todavia, ainda são pouco escutadas e contempladas de acordo com as suas singularidades, sendo muitas vezes encaixadas em códigos que só visualizam a doença, beirando a negação da existência de uma pessoa única e pluralizada em sua subjetividade (SAVIANI, 1992). O Quadro 1 apresenta as diferenças entre os conceitos de inclusão, exclusão e segregação. Fonte: Adaptado de Sassaki (1997). Exclusão Não é possível o convívio entre pessoas com deficiência e pessoas sem deficiência. Segregação Existem espaços onde as pessoas com deficiência são toleradas e podem conviver com as pessoas sem deficiência. Inclusão Todas as pessoas estão verdadeiramente integradas. Quadro 1. Diferenças entre exclusão, inclusão e segregação Da exclusão à inclusão: aspectos históricos4 Da exclusão à inclusão No Brasil, conforme Saviani (1992) a situação da educação ainda apresenta como agravante o reflexo da carência das políticas públicas. Em outras pa- lavras, a educação das classes mais baixas era inexistente ou precária, pois as minorias eram usadas como mão de obra em zonas rurais ou fábricas. Dessa forma, as pessoas com deficiência que não tinham grande dificuldade de locomoção eram condicionadas ao trabalho desde muito cedo, deixando passar despercebidas muitas das suas necessidades educacionais especiais. A pessoa com deficiência passou (e ainda passa) por estigmas relacionados à sua aparência ou apresentação, à sua maneira de se comportar e de pensar ou reproduzir o seu pensamento por meio da comunicação. Pensando no sujeito em integração com o meio, a pessoa com deficiência sofre de maneira mais significativa as carências do contexto no qual está inserida. Ela é atingida de forma que impede ou limita o seu desenvolvimento, conforme as vulnerabili- dades às quais está exposta, sejam elas econômicas (com situações de pobreza e miséria), culturais (acesso restrito à educação), sociais (pelas violências), entre outras. As condutas excludentes infelizmente são reflexo de uma formação carente de humanidade da nossa sociedade e das políticas públicas. Ainda pouco tole- rantes com as diferenças e diversidades, as instituições de ensino equilibram-se entre o manejo com o público de pessoas com deficiência e das sem deficiências. Embora essa realidade esteja aos poucos se transformando, ainda há muitas pessoas com deficiência que se veem excluídas da sociedade. A educação especial de desenvolveu de maneira a considerar as peculia- ridades educacionais de cada sujeito e teve seu início por meio de turmas de classe especial. Nessas classes, as pessoas com deficiência conviviam entre si, de acordo com a sua idade e as fases do desenvolvimento, em uma instituição de ensino regular com outras turmas de classes regulares. Essa modalidade educacional ofertava espaço para que as turmas ocupassem um mesmo terri- tório, mas sem que houvesse uma integração entre os alunos, impossibilitando o convívio mais efetivo entre as pessoas com e as sem deficiência, salvo em momentos de chegada ou partida — ainda que algumas instituições realizassem até mesmo esses momentos em horários separados (BUENO, 1993). A educação especial pretendia, dessa maneira, proteger a pessoa com deficiênciae ainda oportunizar o seu desenvolvimento. Todavia, essa pro- teção ficava à sombra de uma segregação ou exclusão e, por esses motivos, essa modalidade de educação especial não é mais mantida na atualidade. 5Da exclusão à inclusão: aspectos históricos Outra modalidade da educação especial foi a criação de escolas específicas e exclusivas para as pessoas com deficiência. Hoje essas instituições ainda existem, mas são raras, e visam o pleno desenvolvimento educacional das pessoas com deficiência, possibilitando o convívio com os seus pares e estimulando a socialização. Por contarem com um espaço mais amplo do que somente uma sala, como ocorria nas instituições com classes especiais, as pessoas com deficiência podem ter acesso a uma estrutura com adaptações arquitetônicas e acessibilidade plena, podendo exercer livre circulação, exploração e apropriação dos espaços. Desde os anos 1990, como explica Sassaki (1997), existe um esforço da sociedade para que se possibilite a efetiva inclusão das pessoas com deficiência. A partir desse ideal, construiu-se a ideia da educação inclusiva, na qual pessoas com deficiência convivem na mesma turma de educação regular, mas com ensino adaptado às suas singularidades, mediante a consecução de projetos de desenvolvimento específicos para cada sujeito. Essa acepção favoreceu transformações na mentalidade social, não só com relação às famílias das pessoas com deficiência, como também com todas as pessoas com deficiência (SASSAKI, 1997). No entanto, a trajetória inclusiva da prática educativa encontrou alguns percalços. As pessoas com deficiência precisam ser compreendidas em sua individualidade, e algumas necessitam de atenção integral e exclusiva de um agente educador. O agente educador como mediador do processo educacional pode atuar de múltiplas maneiras, podendo facilitar o processo e estimular o desenvolvimento. No entanto, também pode causar prejuízos, como pressupor condutas vitimizadoras e limitantes das pessoas com deficiência ou ainda inibir o convívio entre os pares. A educação inclusiva em instituições regulares de ensino precisa ser acompanhada caso a caso, com todas as considerações singulares e subjetivas implicadas no processo educativo de cada sujeito (PIOVESAN, 2012). A educação inclusiva estimula o olhar sobre a diversidade social, que passa a ser objeto de aceitação e desejo em um novo modelo de inclusão social. As- sim, para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária, deve haver a aceitação da diversidade social como um aspecto do direito à igualdade, sobretudo nas atuais sociedades multiculturais, nas quais a diversidade é a tônica social medular (ASSIS; POZZOLI, 2005). Uma consideração bem importante para a educação da pessoa com defici- ência é que ela deve, necessariamente, ser agente condutor de sua autonomia, e não mero recebedor passivo de prestações alheias (FIGUEIRA, 2008). Em Da exclusão à inclusão: aspectos históricos6 resumo, a pessoa com deficiência deve ser protagonista e condutor de seu processo de inclusão. Assis e Pozzoli (2005) inserem que a educação deve preferencialmente ser vista como um todo, entre as pessoas com deficiência e as pessoas sem deficiência. Ela necessita de uma integração verdadeira desde a sua base, na educação infantil, estimulando as virtudes, a tolerância, a empatia e o apoio mútuo, assim como promovendo e desenvolvendo a coletividade e a equidade. Conforme Lorentz (2006), a mera tolerância da pessoa com deficiência não proporciona a dignidade humana. A verdadeira inclusão é proveniente do tratamento de respeito pleno, da admiração e do sentimento de amor entre as pessoas, com base na igualdade e na aceitação plena. Os Delegados da Conferência Mundial de Educação Especial, representando 88 governos e 25 organizações internacionais, em assembleia realizada na cidade de Salamanca, na Espanha, entre 7 e 10 de junho de 1994, reafirmaram o compromisso para com a educação para todos. Assim, reconheceram a necessidade e a urgência do providenciamento de educação para crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais dentro do sistema regular de ensino e reendossaram a estrutura de ação em educação especial. É por ela que governos e organizações, com o espírito de suas provisões e recomendações, devem se guiar. Assim, acreditam e proclamam que: � toda criança tem direito fundamental à educação, a quem deve ser dada a opor- tunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem; � toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de apren- dizagem que são únicas; � sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam ser implementados, no sentido de se levar em conta a vasta diversidade de tais características e necessidades. As pessoas com deficiência e as diferentes nomenclaturas utilizadas ao longo da história A inclusão social se refere a um processo no qual a sociedade se adapta para poder incluir em seus sistemas sociais as diferenças e diversidades apresentadas pelos sujeitos, entre os quais estão as pessoas com deficiência, ao mesmo tempo em que estes se preparam para assumir os seus papéis 7Da exclusão à inclusão: aspectos históricos sociais. Para Sassaki (1997), a inclusão social se configura a partir de uma cooperação entre pessoa com deficiência e sociedade, com o objetivo de buscar soluções viáveis para problemas mútuos e estabelecer equidade de oportunidades e relações. Assim, para se estabelecer meios em que sejam oportunizadas trocas íntegras e equânimes entre os membros da sociedade, faz-se necessária a problematização de estigmas e do engessamento de ideias que limitem a compreensão do outro em sua singularidade. Nesse sentido, o modo como as pessoas são vistas e nomeadas reflete a sua integridade, o respeito, a atuação e apropriação de uma efetiva inclusão social. As terminologias designadas para nomear as pessoas com deficiência acom- panharam o desenvolvimento de sua compreensão e respeito ao longo da traje- tória histórica da sociedade. Assim, esses indivíduos já foram apontados como aleijados, retardados, mongoloides excepcionais, entre outros. Excepcional, por exemplo, foi o termo utilizado nas décadas de 1950, 1960 e 1970 para se referir às pessoas com deficiência — especificamente a deficiência intelectual. No entanto, com o desenvolvimento de estudos e práticas educacionais referentes às altas habilidades, nas décadas de 1980 e 1990, esse termo passou a se referir a pessoas com inteligência lógico-matemática abaixo da média, ou excepcionais negativos, assim como a pessoas com inteligências múltiplas acima da média, ou excepcionais positivos (SASSAKI, 2003). Por fazer inferências pejorativas e discriminatórias, tais termos são raramente usados e não são recomendados. “Deficiente” é outro termo pejorativo reconhecidamente associado à incapacidade e ineficiência, que não deve ser utilizado. Já o termo “pessoa com necessidades especiais” engloba um conceito muito amplo, pois compreende idosos, gestantes, obesos e outras pessoas que possam ter dificuldade para realizar alguma ativi- dade. Por contemplar um grupo muito vasto, considerando que todas as pessoas possuem alguma necessidade especial em algum nível, não é recomendado para se referir especificamente às pessoas com deficiência (SASSAKI, 2003). Outra terminologia bastante utilizada entre 1986 e 1996, como refere Sassaki (2003), foi a expressão “portador de deficiência”. Todavia, não é adequado o uso desse termo, já que a deficiência não é algo que possa ser portado, pois portar algo implica a possibilidade de não portar, se assim se desejar, como uma bolsa ou outro objeto. O termo mais adequado é, portanto, “pessoa com deficiência”. Sassaki (2003) orienta que, ao proferir o termo “pessoa com deficiência”, a pessoa se posiciona antes da deficiência. Essa simples inferência destaca que o sujeito, com as suas característicassingulares, é mais importante do que a Da exclusão à inclusão: aspectos históricos8 deficiência. Assim, é correto afirmar que existem pessoas com deficiência auditiva, pessoas com deficiência visual, pessoas com deficiência física, pessoas com deficiência intelectual. Leia o artigo de Romeu Kazumi Sassaki, intitulado Termino- logia sobre deficiência na era da inclusão. Neste texto, você conhecerá as terminologias adequadas para nomear as mais variadas formas de deficiências. https://goo.gl/qDSmOh É importante destacar que, para haver inclusão, as pessoas e a sociedade como um todo — e o reflexo de seu espírito coletivo — devem preferencial- mente se propor à mudança, a ponto de compreender que, para aceitar as diferenças e oportunizar a expansão da diversidade, faz-se imprescindível estar atento às formas de comunicação. Dessa forma, elas se colocam a favor de construções e trocas permanentemente mútuas. Por meio dessa relação plena entre as pessoas — as suas diferenças e diversidades, os seus modos de ser e existir singulares — e a sociedade, a criação de oportunidades torna-se a base para se estabelecer o equilíbrio social. É por meio dela que se asseguram os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa enquanto sujeito individual e coletivo, como está previsto na Constituição. João é um menino de 10 anos e tem deficiência. Ele frequentou diversos ambientes educacionais; entretanto, por possuir dificuldades com relação à sensibilidade sensorial, alguns deles se apresentaram demasiadamente hostis. O primeiro movimento da família sempre circulou em torno de proteger a integridade física de João, nem que para isso fosse necessário excluí-lo de alguns convívios. No entanto, a família sempre compreendeu que João precisava se adaptar ao ambiente, tanto quanto o ambiente precisava se adaptar a ele. A família mediou, então, o processo de inclusão de João em um ambiente educacional onde fosse possível incluí-lo de maneira suave, com tempos e recursos individualizados, pensando em cada momento como único e promissor para o próximo momento da inclusão social. 9Da exclusão à inclusão: aspectos históricos ASSIS, O. Q.; POZZOLI, L. Pessoa com deficiência: direitos e garantias. 2. ed. São Paulo: Damásio de Jesus, 2005. BUENO, J. G. S. Educação especial brasileira: integração/segregação do aluno diferente. São Paulo: EDUC, 1993. CANZIANI, M. L. Crianças deficientes, psicodiagnóstico. Educação, 1995. COULANGES, F. de. A cidade antiga. São Paulo: Martin Claret, 2003. FIGUEIRA, E. Caminhando no silêncio: uma introdução à trajetória das pessoas com deficiência na história do Brasil. São Paulo: Giz, 2008. GOFFMAN, E. Estigma, notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978. LORENTZ, L. N. A norma da igualdade e o trabalho das pessoas com deficiência. São Paulo: LTr, 2006. PIOVESAN, F. Direitos humanos e o direito constitucional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. SASSAKI, R. K. Como chamar as pessoas que têm deficiência. In: SASSAKI, R. K. Vida independente: história, movimento, liderança, conceito, filosofia e fundamentos. São Paulo: RNR, 2003. SASSAKI, R. K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997. SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1992. Da exclusão à inclusão: aspectos históricos10 Leituras recomendadas ARAUJO, L. A. D. (Coord.). Direito da pessoa com deficiência: uma tarefa a ser comple- tada. Bauru: EDITE, 2003. ARAUJO, L. A. D. Direitos das pessoas com deficiência: garantia de igualdade na diver- sidade. São Paulo: WVA, 2004. ARAUJO, L. A. D. Proteção constitucional das pessoas com deficiência. Brasília: CORDE, 1994. NAÇÕES UNIDAS. Declaração de Salamanca e enquadramento da acção na área das necessidades educativas especiais. Salamanca: UNESCO, 1994. Disponível em: <http:// redeinclusao.pt/media/fl_9.pdf>. Acesso em: 24 jul. 2018. SASSAKI, R. K. Terminologia sobre deficiência na era da inclusão. Revista Nacional de Reabilitação, v. 5, n. 25, mar./abr. 2002. Disponível em: <https://acessibilidade.ufg.br/ up/211/o/TERMINOLOGIA_SOBRE_DEFICIENCIA_NA_ERA_DA.pdf?1473203540>. Acesso em: 24 jul. 2018. 11Da exclusão à inclusão: aspectos históricos DICA DO PROFESSOR Confira a seguir uma reflexão sobre os pontos mais relevantes desta Unidade de Aprendizagem e amplie os seus conhecimentos em relação aos aspectos históricos relativos ao tratamento dado à pessoa com deficiência. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! EXERCÍCIOS 1) Eventos históricos e valores culturais influenciaram a trajetória das pessoas com deficiências, em decorrência de suas condições. Na Antiguidade, muitos princípios religiosos e a crença em maldições e misticismos justificavam o banimento e marginalização de pessoas com deficiências e enfermidades. É com a evolução da sociedade que essas pessoas passaram a receber maior aceitação. Analisando a história, podemos recortar três fases distintas, sobre as quais se pode afirmar: A) O tratamento da pessoa com deficiência como doente, através da medicina, se inicia na fase da criação dos serviços especiais. B) A fase mais importante na trajetória das pessoas com deficiência foi a da criação dos serviços especiais. No Brasil são criadas as Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAEs). C) Pais e parentes da pessoa com deficiência passam a receber apoio e orientação na fase da institucionalização, o que vem a colaborar para maior aceitação e trato com o excepcional, por parte da família. D) Os manicômios e leprosários são criados na fase da institucionalização, tratando a pessoa com deficiência e reintegrando-o à sociedade. A fase da exclusão foi a que menos perdurou na história em vista do seu caráter de E) negligência total. 2) Segundo os estudos de Lorentz (2006), civilizações mais arcaicas aniquilavam as pessoas que tinham alguma deficiência. Como exemplo o autor traz Esparta, onde, de acordo com a legislação instaurada, as crianças nascidas com alguma deformidade ou diferença anatômica não eram consideradas pessoas e, portanto, eram levadas ao alto de montes e atiradas de lá. Marque a alternativa que explica corretamente porque isso acontecia: A) Consideravam um ritual, para que a alma da criança fosse “salva”. B) Acreditavam que as crianças carregavam alguma maldição para a família. C) Imaginavam que essas crianças deveriam ser eliminadas por representarem impedimentos para a procriação de sujeitos “normais”. D) Entendiam que não havia recursos e espaços adequados para o cuidado e educação desses sujeitos. E) Reconheciam que tribos indígenas de diversas regiões já eliminavam os sujeitos que tinham alguma diferença. 3) Segundo estudos da história da educação especial, a partir do século XX, em meio às guerras, as pessoas com deficiência puderam se livrar da percepção de invalidez e serem vistas como pessoas “úteis” ao trabalho. Esta nova concepção proporcionou o surgimento de classes especiais em escolas regulares e centros de reabilitação para deficiências diversas. Qual foi a razão para esse novo movimento ocorrer? Marque a alternativa que corresponde corretamente à questão: A) Pela ampliação do olhar de educadores que passaram a perceber que crianças e jovens com deficiências também eram capazes de aprender e se desenvolver. B) Por um movimento das pessoas com deficiência que desejavam trabalhar. C) Da escassez de mão de obra qualificada, com a necessidade de educar e desenvolver, de maneira a construir a autonomia e as competências das pessoas com deficiência, avaliando-as como aptas ou inaptas. D) Em função da carência de mão de obra para atuar nas guerras e frente à percepção de que todas as pessoas com deficiência poderiam se tornar aptas ao trabalho. E) Não havia motivos, o movimento ocorreu para proporcionar novas oportunidades às pessoas com deficiência. 4)Em tempos mais recentes, mesmo com os constantes progressos no campo da Educação, muitas pessoas com deficiência e seus familiares ainda se sentem desconfortáveis devido a preconceitos e rotulações. O próprio sistema educacional ainda faz uso de algumas expressões que podem ser consideradas discriminatórias. Nesta perspectiva, em relação aos conceitos empregados no período da criação dos chamados "serviços especiais", pode-se dizer que: A) A “pessoa com necessidade especial", quando se refere à criança com deficiência, é a forma mais adequada de tratamento atualmente. B) A expressão "necessidade" leva a uma ideia de dependência e define bem a situação de pessoas com deficiência. C) O conceito de "necessidade" faz parte das definições legislativas na atualidade, referindo a exigências educacionais, e não ao indivíduo propriamente. D) O uso da palavra "excepcional" para substituir a terminologia "necessidades", ao se referir ao indivíduo com deficiência, evita a discriminação. E) Todas as crianças com deficiência possuem as mesmas necessidades; por isso, a expressão "necessidades educacionais especiais" é correta. 5) A utilização de novos termos e conceitos para se referir ao universo das pessoas com deficiência passou a indicar também novas perspectivas e desafios. Considerando esta mudança conceitual e a realidade que tal mudança acarreta, é possível afirmar, em relação ao conceito de inclusão, que: A) A inclusão, na prática, não implica em mudanças estruturais ou curriculares nas escolas regulares. B) As crianças com deficiências não recebem nenhum tipo de tratamento diferenciado no processo de inclusão. C) Integração e inclusão são palavras sinônimas. D) Para que o trabalho de inclusão obtenha bons resultados, é necessária uma preparação especial do professor. E) O processo da inclusão pode ser considerado pronto, não sendo passível de mudanças. NA PRÁTICA A equidade não significa que todos sejam tratados da mesma forma, mas que cada sujeito tenha as suas necessidades ou especificidades atendidas de maneira individual para que ele se encontre nas mesmas condições de igualdade de seus semelhantes. Nesse sentido, é importante destacar que independentemente da deficiência ou não, cada pessoa tem necessidades diferenciadas, por isso, os processos de inclusão são complexos e requerem um olhar diferenciado para cada sujeito, inclusive pessoas que tenham a mesma deficiência. SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Inclusão, exclusão, in/exclusão O texto de Alfredo Veiga-Neto e Maura Corcini Lopes discute e problematiza o conceito de inclusão a partir de meados da década de 1990, período no qual o conceito de inclusão foi amplamente divulgado e pesquisado. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Visão histórica da Deficiência O vídeo, criado pelo MEC, mostra como os sujeitos Com deficiência, foram e são vistos pela sociedade ao longo da história. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
Compartilhar