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Curso Gratuito Transtorno 
Global do Desenvolvimento - 
TGD na Educação Especial 
 
Carga horária: 45 hs 
 
 
 
Conteúdo programático: 
 Transtorno desintegrativo da infância (psicose infantil). 
Transtornos invasivos do desenvolvimento. 
Os paradigmas da educação especial e os transtornos globais do desenvolvimento. 
Antecedentes e surgimento da categoria de transtornos globais do desenvolvimento 
na psiquiatria. 
Repercussões do conceito de transtornos globais do desenvolvimento sobre os 
processos de inclusão nas escolas regulares. 
Repercussões teóricas sobre o campo da Educação Especial na perspectiva da 
educação inclusiva. 
Repercussões técnico-legais: métodos de intervenção e nomenclaturas. 
Repercussões sobre a nomenclatura da legislação. 
Transtornos globais do desenvolvimento. 
Autismo. 
Síndrome de Rett. 
Transtorno de Asperger. 
Transtorno Desintegrativo da Infância. 
Espectro Autista. 
Como lidar com os transtornos globais do desenvolvimento (TGD). 
Alguns cuidados e como lidar com educando com TGD na escola. 
Tipos de Intervenções para crianças com TGD. 
Aspectos importantes dos transtornos globais do desenvolvimento para a educação 
escolar. 
Teoria da mente. 
A formação e aprendizagem da criança com transtorno global do desenvolvimento. 
A criança ao ingressar na escola. 
A família. 
O desenvolvimento da função executiva de alunos com Transtornos globais do 
desenvolvimento na escola. 
O desenvolvimento da cognição social de alunos com Transtorno global do 
desenvolvimento na escola. 
Estratégias que propiciam a formação e a aprendizagem da criança com transtorno 
global do desenvolvimento. 
A comunicação. 
O trabalho em sala de aula. 
O registro escolar. 
O AEE e o aluno com TGD. 
Marcos legais que ampara a integração. 
O transtorno global do desenvolvimento na educação inclusiva: escola comum ou 
escola especial? 
Referências. 
Transtorno desintegrativo da infância (psicose infantil) 
 
O Transtorno Desintegrativo da Infância (TDI) foi inicialmente descrito por 
Theodore Heller, um educador austríaco, 1908. Heller relatou o caso de seis crianças, 
que após um desenvolvimento aparentemente normal nos quatro primeiros anos de 
vida, apresentaram uma grave perda das habilidades de interação social e 
comunicação. 
Segundo o Manual de Diagnóstico e Estatístico de Distúrbios Mentais (DSM- 
IV) da Associação Americana de Psiquiatria (1994), o transtorno desintegrativo da 
infância é também conhecido como síndrome de Heller, Demência Infantil ou Psicose 
desintegrativa. A atual Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da 
Educação Inclusiva usa a terminologia transtorno desintegrativo da infância (psicoses) 
ao se referir ao público alvo do AEE. 
A definição sobre psicose, fornecida pelo (DSM-IV), é entendida como uma 
perda dos limites do ego ou um amplo prejuízo no teste da realidade. O termo psicose 
refere-se a delírios, quaisquer alucinações proeminentes, discurso desorganizado ou 
catatônico. Tradicionalmente os psiquiatras definem o termo psicose como um 
distúrbio da realidade. Em contrapartida, numa visão psicodinâmica, a psicose seria 
uma desorganização da personalidade, podendo então ser compreendida como uma 
confusão entre o mundo imaginário e perceptivo na ausência do Ego segundo Freud, 
estrutura limitante entre os dois mundos. 
Embora rara, a esquizofrenia pode ocorrer em crianças com menos de 12 anos 
(apud, Mercadante e Scahill, 2005). Seguindo a definição proposta pelo DSM- IV, a 
prevalência para a esquizofrenia na infância está estimada em dois casos a cada 
100.000 pessoas, sendo mais frequente em meninos. Com relação aos sintomas 
podemos citar: alucinações (ver, ouvir coisas que não existem, fora de contexto 
cultural), delírios (pensamento absurdo, levando-se em conta as 
características do pensamento segundo a idade), distúrbios do pensamento e 
afetividade inapropriada. Outras manifestações frequentes: idiossincrasias (maneira 
própria de ver, sentir e reagir) de linguagem, tais como neologismos, ecolalia e 
dificuldades de comunicação verbal, considerando-se o adequado para a idade. Esses 
sintomas causam alterações significativas em todas as áreas de funcionamento, e as 
crianças afetadas podem apresentar um atraso do desenvolvimento. 
Em relação à esquizofrenia, admite-se que a vulnerabilidade genética 
desempenha um papel importante no desenvolvimento desse quadro. O diagnóstico 
de esquizofrenia na infância exige um exame cuidadoso para que se faça o 
diagnóstico diferencial com autismo e outros transtornos degenerativos do sistema 
nervoso central. 
O autismo pode ser diferenciado da esquizofrenia pela idade início, que tende 
a ser mais precoce no autismo, assim como pela falta de alucinações e delírios. 
 
Transtornos invasivos do desenvolvimento 
 
 
 
Com aporte dos autores Mercadante e Scahill (2005) os transtornos invasivos 
do desenvolvimento são um grupo de transtornos caracterizados por importante 
atraso no desenvolvimento em diferentes áreas de funcionamento, incluindo a 
socialização, comunicação e relacionamento interpessoal. 
O DSM-IV descreve alguns tipos de transtornos invasivos, como: o autismo, a 
síndrome de Asperger, a síndrome de rett, o transtorno desintegrativo e o transtorno 
invasivo do desenvolvimento sem outra especificação. 
O transtorno invasivo do desenvolvimento sem outra especificação é composto 
por um grupo heterogêneo de crianças com tendências a apresentar comportamento 
inflexível, intolerância à mudança, e explosão de raiva e birra quando submetidas às 
exigências do ambiente ou até mesmo a mudanças de rotina. “Assim, muitas vezes, 
ao discutir a minha impressão sobre determinada criança, quando afirmo que, na 
minha compreensão, se trata de um transtorno invasivo do desenvolvimento sem 
outra especificação, a pessoa do outro lado da mesa ou do outro lado da linha diz 
“aliviada”: “ Ah! Que bom! Achei que pudesse ser um quadro de autismo! ”. Esse é 
um duplo equívoco: primeiro, porque o diagnóstico nessa área nada mais é do que a 
organização de um conhecimento, sendo que o comportamento da criança, por si só, 
já mostra quais são suas limitações, possibilidade e incapacidades (“chamá-la” ou 
não de autista não modifica essa condição); e segundo (aqui um desconhecimento 
do termo) porque dizer que é um transtorno invasivo do desenvolvimento tem o 
mesmo status, em termos da complexidade do quadro, que o transtorno 
autista.“(MERCADANTE, M. T. SCAHILL, 
.. 2005). 
Dentre os Transtornos Invasivos do Desenvolvimento mais comumente 
encontrados nas escolas, destacamos o Autismo Infantil, Transtorno de Asperger e 
Psicose. 
 
Os paradigmas da educação especial e os transtornos globais do 
desenvolvimento 
 
Os estudos sobre a Educação Especial nos revelam a constituição de um 
percurso que, a seu tempo e mediante os recursos técnicos e científicos disponíveis, 
buscaram dar respostas educacional e socialmente adequadas face às diversas 
formas de compreensão sobre a diferença, estabelecendo proposições e paradigmas 
diferentes para lidar com as dificuldades escolares vivenciadas por determinados 
alunos. As mudanças observadas nesta trajetória também 
sedimentaram designações para as marcas singulares que alguns alunos trouxeram 
para o contexto da organização das práticas pedagógicas na escola regular. 
Desta forma, falar de inclusão escolar é ter em mente o campo conceitual da 
Educação Especial que, historicamente, delineou práticas e designações para as 
diferenças. De um modo geral, a gênese das primeiras discussões e abordagens a 
estas diferenças remonta ao final do século XVI, com as atenções médicas e 
pedagógicas às deficiências físicas e sensoriais. As premissas da Educação Especial 
ganham vulto a partir do século XIX, com a pesquisae a atenção médico- pedagógica 
ao sofrimento mental infantil, selando uma relação entre a Medicina e a Pedagogia e, 
mais especificamente, entre a Psiquiatria e a Pedagogia que, ao longo de sua 
existência, passa por aproximações e distanciamentos. No campo da Educação 
Especial brasileira, verifica-se que ainda hoje esta articulação se faz presente. Apesar 
de todas as proposições encontradas no sentido de amenizar os efeitos do uso destas 
terminologias no âmbito das escolas, ainda hoje se identifica a designação de quadros 
de impasses escolares por meio de terminologias psiquiátricas. 
Este é o caso específico do apontamento feito em torno dos alunos identificados 
nas legislações educacionais a partir de suas dificuldades de aprendizagem e de seus 
comportamentos peculiares. São os alunos com transtornos globais do 
desenvolvimento (BRASIL, 2008; 2009; 2010). Sua inserção nas escolas regulares 
costuma levantar questionamentos sobre a educação especial em detrimento da 
regular ou comum, sobre o diagnóstico psicopatológico encaminhado às escolas e 
sobre as estratégias pedagógicas pertinentes aos processos de adaptação da criança 
na escola. De certa forma, tais questões impelem o educador no sentido de revisitar 
momentos, práticas e conceitos que contribuíram para o que atualmente se concebe 
por inclusão escolar. 
Ao se consultar alguns teóricos da inclusão escolar (COLL, 2004; MARCHESI, 
2004; MANTOAN, 2006; MENDES, 2006; PALÁCIOS, 2007, GLAT; 
BLANCO, 2009), torna-se possível observar que as mudanças paradigmáticas 
impressas no campo da Educação Especial trazem em si um deslocamento primordial 
para que este campo seja reconhecido como o lócus privilegiado das práticas 
pedagógicas de inclusão escolar. Este deslocamento se processa do olhar lançado 
sobre a deficiência como algo potencialmente irreversível e inerente a alguns 
indivíduos para a visão não só sobre as potencialidades dos sujeitos 
deficientes as quais podem ser observadas para além destes quadros, como também 
para a verificação de que, no processo escolar, todos estão sujeitos a déficits maiores 
ou menores em algum momento de sua trajetória educativa. Neste sentido, a 
deficiência passa a ganhar a conotação de dificuldade, entendida como transitória ou 
permanente conforme cada caso. Isso embasa o conceito de necessidades 
educativas especiais, definidor do paradigma da inclusão escolar, arrolado pelos 
autores aqui referidos. 
O que se recolhe disto é um constante tensionamento entre o que pode ser 
compreendido como possibilidades em torno de um projeto educativo inclusivo, bem 
como acerca da definição sobre quem deve ser o alvo destas ações, imprimindo-se, 
a partir destas questões, modelos paradigmáticos constantemente revisitados e 
aperfeiçoados. Sendo uma particularidade presente na Educação Especial Inclusiva 
brasileira a partir do ano de 2008, a inserção de crianças com transtornos globais do 
desenvolvimento nas escolas regulares não foge a um campo de discussões em que 
a questão da diferença se faz presente de forma radical. 
Para buscarmos um entendimento sobre os fatores determinantes para esta 
inserção, iniciaremos nossas discussões a partir de uma breve exposição sobre os 
modelos paradigmáticos que sustentaram a formulação da Educação Especial até a 
concepção do que hoje se compreende como Educação Inclusiva e os conceitos neles 
envolvidos. 
 
Antecedentes e surgimento da categoria de transtornos globais do 
desenvolvimento na psiquiatria 
 
Uma das particularidades da Psiquiatria é ser um campo de saber que, desde 
os primórdios de sua organização, se interessa pelas classificações das condições 
mentais. Trata-se do estabelecimento de balizas que configuraram critérios para os 
diagnósticos clínicos psiquiátricos e que terminaram por definir as possibilidades de 
alcance desta clínica e de seus pressupostos, mediante uma mutação conceitual 
verificada ao longo dos tempos. Identifica-se, com isto, um movimento em que as 
investigações psicopatológicas e o corpus de saber da Psiquiatria, inicialmente 
localizado no campo restrito ao especialista, paulatinamente deixaram o espaço dos 
hospitais psiquiátricos e se inseriram em outros contextos institucionais, assim como 
identificamos no capítulo 2 a propósito da Psiquiatria Infantil. 
Em última análise, as investigações realizadas tanto no campo estrito da 
Psiquiatria quanto em sua aplicação a outros espaços têm como objetivo principal 
definir os critérios clínicos possíveis na distinção entre o normal e o patológico. O que 
se observa em relação a essas investigações é que os seus critérios são variáveis. 
Tal variação implica não somente em metodologias variáveis de abordagem 
classificatória e diagnóstica do fenômeno mental, como também em formas aleatórias 
de nomeá-los, dentro e fora do dispositivo da clínica psiquiátrica. Implica, portanto, em 
concepções epistemológicas distintas, sobretudo em relação à etiologia do 
adoecimento mental. Vê-se que, no que se refere aos transtornos globais do 
desenvolvimento, eles são fruto desta variação classificatória, não estando presentes 
desde sempre, nem na história da Educação Inclusiva nem no desenvolvimento da 
Psiquiatria. 
Na verdade, estes dois campos de saber tornam-se conjugados justamente a 
partir do momento em que um passa a ser destinatário da aplicação das classificações 
produzidas no outro e das formas de intervenção sobre os quadros patológicos, assim 
como pode ser demonstrado no capítulo anterior. No caso da Educação Especial 
Inclusiva brasileira, conta-se um espaço de 21 anos entre o estabelecimento da 
categoria em questão na área das investigações da psicopatologia psiquiátrica até sua 
entrada no escopo das legislações que regulamentam a delimitação do público-alvo 
específico das ações de inclusão escolar. Repete-se um processo em que, uma vez 
mais, as escolas regulares brasileiras sabidamente se tornaram representantes dos 
contextos em que as classificações produzidas pela Psiquiatria se aplicaram à 
avaliação dos impasses de crianças e jovens com a escolarização, dentre eles 
aqueles com transtornos globais do desenvolvimento. 
Este cenário, no momento, nos faz levantar as seguintes questões: ao importar 
mais um conceito e uma nomeação do campo da Psiquiatria, quais são os 
antecedentes na organização do que se concebe como transtornos globais do 
desenvolvimento? Em que bases conceituais ele se constitui? De que maneira esta 
questão pode nos auxiliar a responder nossas duas questões básicas de pesquisa 
(como ocorrem os processos de inclusão destes alunos na escola regular e por que 
alguns destes alunos representam um problema para os professores)? 
Observa-se que, no campo específico da Psiquiatria, os critérios classificatórios 
e diagnósticos que lhe são pertinentes foram sendo alterados ao longo do tempo, 
imprimindo-se às classificações valores conceituais distintos, que marcam os 
antecedentes da formação da categoria dos transtornos globais do desenvolvimento. 
Isto porque, no histórico deste campo de saber, é possível identificar a existência de 
formas diferenciadas de identificar, analisar, descrever e nomear os fenômenos 
mentais, na justa tentativa de se diagnosticar os limiares existentes entre a patologia 
mental e a normalidade, bem como para, finalmente, determinar os destinos possíveis 
de tratamento para os casos identificados como patológicos. 
Em última análise, no campo da Psiquiatria, as diferenciações aqui referidas 
nos permitem caracterizar este campo em três momentos particularmente distintos e, 
em certo sentido, antagônicos, em razão das formas de investigação psicopatológica 
correspondentes a cada um deles. Para fins de localização, coloca-se de um lado o 
que, juntamente com Paul Bercherie (1989), podemos chamar de Psiquiatria Clássica 
e Psiquiatria Moderna, cujas cronologias, sucessivas, são passíveis de seremlocalizadas, respectivamente, entre o início do século XIX e o início do século 
XX. Estes dois períodos serão descritos em separado, a fim de se identificar suas 
particularidades em relação às formas de investigação psicopatológica que lhes foram 
próprias. Em conjunto, eles delimitam uma forma de se proceder às investigações 
psicopatológicas que podem ser denominadas clássicas e cujos conceitos e 
premissas encontram-se estabelecidos nos grandes tratados e manuais de 
Psiquiatria. De outro lado, verifica-se um terceiro período, iniciado na segunda metade 
do século XX, que apresenta critérios investigativos bastante distintos dos períodos 
que o precedem, pois, entre outras razões, conta com a instituição dos códigos 
classificatórios de cunho estatístico em substituição aos grandes manuais e tratados. 
Este último período, que, juntamente com Francisco Barreto (2010), denominamos 
Psiquiatria das Classificações Internacionais, é apresentado ainda por Júlio Flávio 
Figueiredo Fernandes (2009) como um segundo momento do desenvolvimento da 
Psiquiatria, tendo em vista a diferença marcante existente na organização 
metodológica das pesquisas psicopatológicas que passam a vigorar. Este autor 
identifica a produção das investigações psicopatológicas do período como 
psicopatologias da segunda fase. 
Para defini-los e, assim, alcançarmos as bases conceituais de estruturação da 
categoria dos transtornos globais do desenvolvimento, seguimos os textos dos três 
autores referidos acima, pertencentes a campos de pesquisa diferenciados. O primeiro 
deles é Bercherie (1989; 2001), cuja obra se propõe a investigar o histórico da 
Psiquiatria, bem como seus pressupostos epistemológicos, desde o início das 
primeiras investigações de Pinel acerca da loucura até o período que se estabelece 
no intervalo das duas grandes guerras mundiais. Para localizar esta cronologia, 
Bercherie (1989) adota as nomenclaturas Psiquiatria Clássica e Psiquiatria Moderna, 
identificando-as ao período já referido. Acrescentamos ainda que este autor refere- se 
à década de 30 do século XX como o momento pertinente ao ápice da organização 
das investigações psicopatológicas infantis (BERCHERIE, 2001). 
O segundo autor é Barreto (2010), em um texto em que ele realiza uma análise 
crítica sobre a evolução da Psiquiatria, denominando Psiquiatria das Classificações 
Internacionais, o período de produção nosológica iniciado após a Segunda Grande 
Guerra. Este período traz a particularidade de abandonar a produção estabelecida nos 
períodos anteriores, bem como a metodologia de pesquisa aplicada anteriormente, 
em prol de firmar conceitos e formas investigativas próprias. 
Por último, mas não por menos, nos valemos do texto de Fernandes (2009). 
Este autor apresenta os períodos de produção nosológica da Psiquiatria através do 
percurso epistêmico das investigações psicopatológicas próprias a eles. Entretanto, 
em seu texto é possível verificar uma delimitação que, de um lado, faz abranger o que 
Bercherie (1989) denomina Psiquiatria Clássica e Psiquiatria Moderna e, de outro, o 
que Barreto (2012) denomina Psiquiatria das Classificações Internacionais. Ao lado 
dos dois primeiros períodos, denominados por Barreto (2012) como Psiquiatria 
Clássica e Psiquiatria das Grandes Escolas e por Bercherie (1989) como Psiquiatria 
Clássica e Psiquiatria Moderna, Fernandes (2009) situa o que ele designa como 
período das investigações psicopatológicas clássicas, ao passo que, ao lado da 
Psiquiatria das Classificações internacionais (BARRETO, 2012), encontramos a 
denominação psicopatologias da segunda fase, em razão da ênfase dada às formas 
de investigação psicopatológicas deste terceiro período de organização da Psiquiatria. 
Ao estabelecer estas duas delimitações das classificações psicopatológicas, 
Fernandes (2009) realiza uma análise crítica sobre a utilização, pelos educadores, das 
categorias das investigações psicopatológicas da segunda 
fase para nomear o mal-estar subjetivo de seus alunos. Em sua visão, a proliferação 
de nomeações psicopatológicas para as manifestações subjetivas nas escolas acaba 
afastando os profissionais da Educação da possibilidade de entendimento sobre a 
questão da subjetividade envolvida nos processos de ensino e de aprendizagem. 
Salientamos que, apesar das contribuições de Figueiredo (2009) e Barreto 
(2012), de ambos, somente Barreto (2012) se refere ao trabalho de Bercherie (1989). 
Apesar disto, em nossa avaliação, estes autores mantêm a essência das 
descrições realizadas na história da Psiquiatria e acreditamos que, de certa forma, 
alinham-se a Bercherie (1989), na medida em que, assim como este autor, 
estabelecem uma referência aos grandes psiquiatras, fundadores das tradições 
clássicas e modernas de pesquisa psicopatológica – Emil Kraepelin (198561926), 
Eugen Bleuler (1875-1939), Karl Jaspers (1883-1969) - e a Michel Foucault (1926- 
1984), em texto de 1972, intitulado de O Nascimento da Clínica (FOUCAULT, 2001). 
Desta forma, ressaltamos que, apesar das formas diferenciadas para nomear 
a referida cronologia, não são observadas entre estes autores distinções conceituais 
que impliquem em prejuízos ao delineamento dos antecedentes da categoria dos 
transtornos globais do desenvolvimento. Apresentam ainda a vantagem de 
descreverem e estabelecerem uma crítica bastante similar em relação a um período 
que, seguramente, sucede ao tempo da Psiquiatria Moderna estabelecido por 
Bercherie (1989), mas que não se encontra definido na obra deste autor. Em relação 
à presente dissertação, tanto a demarcação histórica (BERCHERIE, 1989, 2001; 
BARRETO, 2010) dos períodos que compõem o histórico da Psiquiatria quanto a 
conceituação das formas de investigação psicopatológica impressas ao sofrimento 
mental (FERNANDES, 2009) têm a importância de determinar a constituição da 
categoria transtornos globais do desenvolvimento, a partir da forma impressa pela 
investigação das entidades clínicas descritas nas psicopatologias infantis. Dessa 
forma, para situar o campo conceitual de onde emergem as entidades clínicas que 
compõem a categoria patológica em questão em nossa pesquisa, inicialmente, serão 
utilizadas as referências trazidas por estes autores. Ao longo do percurso, a estas 
referências também serão acrescentadas outras que possam nos auxiliar a buscar a 
noção investigativa que dirige a formação da categoria. 
Acreditamos que a investigação das origens deste termo, das balizas 
conceituais que envolvem sua instauração no corpus conceitual do campo da 
Psiquiatria e a problematização sobre a sua inserção no campo conceitual da 
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008; 2009) pode 
nos auxiliar a responder às questões que ora levantamos, bem como as que norteiam 
nossa pesquisa. Sendo assim, passaremos a apresentar e discutir as formas de 
investigação psicopatológica presentes em cada um destes tempos, buscando 
identificar, na evolução metodológica das descrições patológicas e dos diagnósticos, 
as bases da categoria transtornos globais do desenvolvimento. 
 
Repercussões do conceito de transtornos globais do desenvolvimento 
sobre os processos de inclusão nas escolas regulares 
 
As repercussões em torno da entrada do conceito de transtornos globais do 
desenvolvimento no âmbito da Educação Especial na perspectiva da Educação 
Inclusiva podem ser verificadas em quatro níveis distintos, porém complementares: o 
da produção acadêmico-científica, o das orientações técnico legais, o das nomeações 
na legislação educacional e o da execução dos processos de inclusão dos alunos 
identificados com transtornos globais do desenvolvimento, conforme se segue: 
 
Repercussões teóricas sobre o campo da Educação Especial na 
perspectiva da Educação Inclusiva 
Em princípio, cabe destacar a inexistência de uma produção acadêmica no 
campo da Educação brasileira que volte seu olhar paraa categoria dos transtornos 
globais do desenvolvimento sem que ela esteja vinculada ao conceito de autismo. Ao 
se estabelecer uma investigação no Banco de Teses e Dissertações do Portal CAPES, 
utilizando apenas o termo transtornos globais do desenvolvimento como palavra-
chave, nada será encontrado; ao passo que, utilizando o descritor autismo, encontra-
se o termo em poucas incidências e, via de regra, associado a produções que 
circunscrevem muito mais o campo da Psicologia, da Fonoaudiologia e da Neurologia 
que os da Educação e da Educação Especial Inclusiva. 
A partir das pesquisas desenvolvidas por Carla Vasques (2008b)53 a respeito 
da produção acadêmico-científica do campo da Educação e circunscritas no período 
compreendido entre os anos de 1978 e 2006, de um total de 264 produções 
acadêmicas, verificam-se 53 títulos ligados à temática da escolarização e inclusão de 
alunos com transtornos globais do desenvolvimento (identificados por ela como alunos 
com autismo e psicose infantil). Segundo a autora, as investigações produzidas a 
respeito destes alunos podem ser dívidas em pesquisas de bases fenomenológico-
hermenêuticas e em pesquisas de cunho empírico-analítico. Citando Sanches 
Gamboa (1996) e Turato (2005), a autora afirma que as pesquisas fenomenológico-
hermenêuticas possuem a característica de serem qualitativas e de estabelecerem 
uma crítica contundente ao objetivismo científico defendido pela outra corrente 
investigativa, presente no campo da Educação. 
As investigações de tipo qualitativo fundamentam sua proposição na 
subjetividade dos indivíduos e no interesse pelo processo descritivo, entendido como 
capaz de compreender a dinâmica subjetiva dos alunos em questão. Normalmente, 
estas investigações são realizadas a partir de estudos de casos através dos quais 
busca-se compreender “[…] as possibilidades, os limites, oferecendo visibilidade a 
„encontros minúsculos‟, únicos, construídos nas fronteiras de uma ou várias 
disciplinas” (VASQUES, 2008b, p. 7). Ao desenvolverem este tipo de investigação, 
tais pesquisas também não fogem à regra de estabelecerem uma predominância em 
torno de uma investigação sobre a educação de crianças autistas e psicóticas. É o 
que também pudemos verificar a partir do acesso a alguns resumos ou a trabalhos 
completos de dissertações e teses, produzidos no campo da Educação e registrados 
no portal da CAPES entre os anos de 2004 e 2011 (RUBLESCKI, 2004; VASQUES, 
2003; VASQUES, 2008a; 2008b; MARTINS, 2009; CRUZ, 2009; TEIXEIRA, 2010; 
BRAGIN, 2011; MARROCCO, 2012). Contudo, as pesquisas qualitativas, definidas 
por VASQUES (2008b) como sendo de base fenomenológico-hermenêutica e 
representadas pelos autores aqui mencionados, não constituem a maioria das 
pesquisas em Educação Inclusiva. De acordo com a autora, nesta seara concentram-
se as pesquisas de perspectiva empírico-analítica, justificadas a partir de noções 
positivistas. Estas noções dão às investigações educacionais sobre os transtornos 
globais do desenvolvimento um caráter científico, cuja racionalidade instrumental é 
transferida para este tipo de abordagem (VASQUES, 2008b). São estas pesquisas 
que encontramos referidas aos códigos classificatórios da Psiquiatria das 
Classificações Internacionais e que, de acordo com a autora, são aceitas pela maioria 
dos pesquisadores, pois objetivam “[…] estabelecer relações de 
causalidade entre os fenômenos considerados típicos do autismo, a fim de aprimorar 
o processo educacional […]” (VASQUES, 2008b, p. 6). 
Observando a inexistência de consenso entre a corrente fenomenológico 
hermenêutica e a empírico-analítica, a autora corrobora o que nossa própria 
investigação até agora pode detectar: pautadas nas premissas de falhas e déficits do 
sistema nervoso central ou em falhas do psiquismo, as pesquisas produzidas 
primeiramente no campo da Psiquiatria e absorvidas pelo campo da Educação 
repercutem a significação, em torno do aluno autista e demais alunos com transtornos 
globais do desenvolvimento, como um indivíduo doente mental, deficitário e incapaz 
para a aprendizagem, sendo necessário providenciar-lhe recursos suplementares 
para que, ao menos minimamente, sejam cumpridas as metas educativas 
(BAREOHFF, 2005; MELO, 2010; AVILA, 2011; OLIVEIRA, 2011). 
 
Repercussões técnico-legais: métodos de intervenção e nomenclaturas 
 
Atualmente, recolhemos na literatura especializada uma perspectiva de 
abordagem que repete as investigações psicopatológicas quantitativas estabelecidas 
pela Psiquiatria em torno dos transtornos globais do desenvolvimento, buscando 
identificar possibilidades educacionais a partir da descrição de fenômenos 
relacionados ao autismo e das justificativas etiológicas de cunho deficitário presentes 
nesta patologia. 
Além das referências trazidas por Vasques (2008) a respeito das pesquisas 
desenvolvidas nos programas de pós-graduação em Educação e daquelas que 
também pudemos averiguar através de consultas a resumos de teses e dissertações 
sobre o eixo ensino-aprendizagem de alunos com transtornos globais do 
desenvolvimento, verifica-se a influência referencial do texto de Ángel Rivière (2004), 
o qual é seguido pelos autores brasileiros Priscila Augusta Lima (2010) e por José 
Ferreira Belisário Filho e Rosane Lowenthal (2010). Nestes trabalhos, vemos que, 
assim como na Psiquiatria, a categoria dos transtornos globais do desenvolvimento 
encontra-se referida ao autismo e que os métodos de aprendizagem recomendados 
direcionam a criança para programas de ensino cuja base é a utilização de 
metodologias estruturadas, tais como o Método Teacch – Treatment and Education of 
Autistic and Comunication Handcapped Children e as tecnologias assistidas, tais 
como a Comunicação Aumentativa e Alternativa. Também a partir de Rivière (2004), 
os demais autores consubstanciam seus posicionamentos teóricos a partir das 
teorias biológicas de Lev Semenovitch Vygotsky (1896-1934) a respeito da formação 
dos processos de pensamento e do conceito de zona de desenvolvimento proximal. 
Estes conceitos de Vygotsky oferecem a noção da emergência da função superior do 
pensamento a partir de um substrato construído na confluência da maturação cerebral 
orgânica e dos estímulos oferecidos pelo meio (OLIVEIRA, 1992). Também lançam 
mão de explicações em torno da falha orgânica, de origem neurológica, presente nos 
autistas e supostamente determinante da impossibilidade de elaboração de uma 
Teoria da Mente56 por parte destes indivíduos e dos demais alunos que apresentam 
transtornos globais do desenvolvimento (RIVIÈRE, 2004; MARQUES; MELO, 2005; 
LIMA, 2010; BELISÁRIO FILHO; LOWENTHAL, 2010), 
assim como defendem a aplicação de teorias de análise comportamental (RIVIÈRE, 
2004; BRAGA-KENYON; KENYON; MIGUEL, 2006) e de rotinas estruturadas na 
educação de autistas (NUNES, 2010) e, por extensão, de outros transtornos globais 
do desenvolvimento. 
Neste sentido, a produção técnica encontrada nos documentos legais 
pertinentes à Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação 
Inclusiva (BRASIL, 2010) a respeito do atendimento educacional especializado, 
alinha-se às pesquisas que tomam o caminho da investigação empírica, na medida 
em que direciona a prática pedagógica para a utilização de técnicas de 
Comunicação Aumentativa e Alternativa para alunos com transtornos globais do 
desenvolvimento, independentemente da especificidade patológica que lhe acomete. 
Cabe destacar que o que se coloca como pano de fundo à indicação destes métodos 
de intervenção para alunos com transtornos globais do desenvolvimento diz respeito 
ao direcionamento de um modelo de atendimento. No caso, o atendimento 
educacional especializado encontra-se baseado no modelo de investigação 
psicopatológica quantitativo em que sobressaem as descrições em torno dos 
fenômenos deficitários, utilizados para definir e descrever acategoria 
psicopatológica. Pode-se dizer que, ao procederem desta maneira, promovem uma 
homogeneização em torno de características fenomenológicas do autismo, 
traduzindo a linguagem, a socialização e a cognição como áreas deficitárias a serem 
suplementadas a bem do melhoramento do desempenho social e acadêmico de todo 
e qualquer aluno diagnosticado a partir da categoria patológica dos transtornos 
globais do desenvolvimento. Repete-se, por vezes, uma transposição fidedigna às 
descrições feitas pelos códigos classificatórios da Psiquiatria, assim como podemos 
verificar em Bareohff (2005), dentre outros já mencionados no presente trabalho. Tal 
questão nos remete à crítica estabelecida por Tendlarz (1997) em torno da 
homogeneização da particularidade subjetiva existente nas psicoses infantis, feita a 
partir dos tratamentos propostos em nome da adaptação social dos comportamentos. 
 
Repercussões sobre a nomenclatura da legislação 
 
 
Ainda em relação às orientações técnico-legais sobre a inclusão de alunos com 
transtornos globais do desenvolvimento, identifica-se que uma das repercussões 
relativas à transposição do conceito do campo da Psiquiatria para o campo da 
Educação refere-se à proliferação de nomenclaturas nos documentos legais da 
Educação Especial Inclusiva, utilizados para especificar quem, de fato, seriam os 
alunos com transtornos globais do desenvolvimento. 
Nos campos da Educação Especial e da Educação Especial Inclusiva, a 
evolução terminológica verificada no capítulo anterior, a partir de Marchesi (2004), e 
utilizada para denominar as deficiências e as patologias relativas à saúde mental de 
crianças e jovens, cujo tratamento foi entendido como pertinente à interlocução entre 
o viés da Medicina e o da Educação, por si só evidencia o quanto estes dois campos 
de saber têm caminhado em uma consonância histórica. Contudo, o rebaixamento 
conceitual verificado no campo da Psiquiatria para definir a categoria dos transtornos 
globais do desenvolvimento parece ter propiciado a pluralidade de expressões e 
nomenclaturas que vimos emergir para designá-la, assim como para nomear as 
entidades clínicas que a compõem (APA, 2002; OMS, 2003). Quando o conceito de 
transtornos globais do desenvolvimento é trazido para o corpo dos documentos 
regentes da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação 
Inclusiva (BRASIL, 2010) com todas as diversas nomenclaturas utilizadas para 
designar os fenômenos comuns ao Autismo, esta questão parece se potencializar. 
Para designar os fenômenos que se tornam alvo de queixas dos educadores, nos 
documentos legais observa-se a utilização da designação da categoria psiquiátrica em 
questão. Porém, nestes documentos, observam-se variações na nomenclatura 
utilizada para identificar as entidades clínicas que compõem esta categoria 
psiquiátrica. 
Sendo assim, no documento que inaugura a atual política de inclusão brasileira, 
por exemplo, encontramos os alunos com transtornos globais do desenvolvimento 
especificados como aqueles que apresentam “[…] autismo, síndromes do espectro do 
autismo e psicose infantil” (BRASIL, 2008, p. 08). Já no documento que institui 
diretrizes para a operacionalização do atendimento educacional especializado na 
Educação Básica, sob a modalidade Educação 
Especial (BRASIL, 2009), consideram-se os alunos com transtornos globais do 
desenvolvimento como aqueles diagnosticados com “[…] autismo clássico, síndrome 
de Asperger, síndrome de Rett, transtorno desintegrativo da infância (psicoses) e 
transtornos invasivos sem outra especificação […]” (BRASIL, 2009, p. 1). 
Ocorre que estes documentos não apresentam as bases referenciais das quais 
estes termos são retirados, restando ao conhecimento do educador, leigo nas 
questões psicopatológicas infantis, o exercício de uma dedução que pode ser 
realizada apenas por aproximação, caso ele não aprofunde suas pesquisas. 
Entretanto, ele, caso se decida por proceder de forma contrária a uma arriscada e 
simples dedução, poderá verificar que são os códigos classificatórios (APA, 2002; 
OMS, 2003) as bases conceituais utilizadas pelos consultores da Câmara de 
Educação Especial do Conselho Nacional de Educação – CEB/CNE para descrever a 
atual categoria inserida nos textos educacionais voltados para inclusão escolar 
(BRASIL, 2008, 2009, 2010). Por outro lado, a confrontação destas designações com 
os seus referenciais - os códigos classificatórios da psiquiatria traduzem 
especificações que também não encontram consonância direta ou imediata em 
nenhum deles e cuja correspondência somente pode ser realizada a partir da consulta 
à literatura especializada sobre a categoria. Nela, verificam-se variações de 
terminologias provenientes de entendimentos diversos ou mesmo de variações de 
tradução de uma língua a outra (KAPLAN, 1992; ASSUMPÇÃO JR.; CURATÁLO, 
2004; RIVIÈRE, 2004; KLIN, 2006; LIMA, 2006; STUBB, 2008; SADOCK; SADOCK, 
2011; DUMAS, 2011). 
Contudo, deve-se lembrar que, se são os códigos classificatórios (APA, 2002; 
OMS, 2003) que constituem as bases referenciais conceituais utilizadas pelos 
consultores da CEB/CNE (BRASIL, 2008; 2009; 2010) para a construção de diretrizes 
e resoluções da área, estes não são os primeiros materiais de consulta técnica 
utilizados pelos educadores. Sendo assim, no campo da Educação, a 
proliferação de nomeações produzida pelo campo da Psiquiatria das Classificações 
Internacionais, ao invés de promover esclarecimentos ao educador, seguramente 
também gera uma pluralização de nomes que são aplicados de forma aleatória a 
alguns alunos que recebem diagnóstico psicopatológico, assim como nos indicará um 
dos casos a serem apresentados nesta dissertação. Como desdobramento desta 
questão, uma primeira consequência desta pluralização sobre a prática da inclusão 
de alunos, cujos impasses com a aprendizagem e com o ambiente escolar não 
encontram ressonância nem nas deficiências físicas nem nas altas habilidades, diz de 
uma sucessão de dúvidas conceituais dos educadores, colocadas reiteradamente em 
questões tais como: “Conduta típica é o mesmo que transtorno global do 
desenvolvimento?”, “Esquizofrenia é transtorno global do desenvolvimento?”, “O que 
é, afinal, transtorno global do desenvolvimento?”. 
 
Transtornos globais do desenvolvimento 
 
 
 
O conceito de Transtornos Globais do Desenvolvimento surge no final dos anos 
60, derivado especialmente dos trabalhos de M. Rutter e D. Cohen. Ele traduz a 
compreensão do autismo como um transtorno do desenvolvimento. O autismo é 
explicado e descrito como um conjunto de transtornos qualitativos de funções 
envolvidas no desenvolvimento humano. Esse modelo explicativo permitiu que o 
autismo não fosse mais classificado como psicose infantil, termo que acarretava um 
estigma para as famílias e para as próprias crianças com autismo. Além disso, o 
modelo permite uma compreensão adequada de outras manifestações de transtornos 
dessas funções do desenvolvimento que, embora apresentem semelhanças, 
constituem quadros diagnósticos diferentes. A compreensão dos transtornos 
classificados como TGD, a partir das funções envolvidas no desenvolvimento, aponta 
perspectivas de abordagem, tanto clínicas quanto 
educacionais, bastante inovadoras, além de contribuir para a compreensão dessas 
funções no desenvolvimento de todas as crianças. O Transtorno Global do 
Desenvolvimento não diz respeito apenas ao autismo. Sob essa classificação se 
descrevem diferentes transtornos que têm em comum as funções do desenvolvimento 
afetadas qualitativamente. São eles: 
 
• Autismo; 
• Síndrome de Rett; 
• Transtorno ou Síndrome de Asperger; 
• Transtorno Desintegrativo da Infância; 
• Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra especificação. 
 
 
Autismo: 
De acordo com o DSM.IV, podemos descrever algumas características que 
podem ser manifestadas pelas pessoas com autismo. 
Oautismo se caracteriza pela presença de um desenvolvimento 
acentuadamente prejudicado na interação social e comunicação, além de um repertório 
marcantemente restrito de atividades e interesses. As manifestações desse transtorno 
variam imensamente a depender do nível de desenvolvimento e idade. Os prejuízos na 
interação social são amplos, podendo haver também prejuízos nos comportamentos 
não verbais (contato visual direto, expressão facial, gestos corporais) que regulam a 
interação social. As crianças com autismo podem ignorar outras crianças e não 
compreender as necessidades delas. Os prejuízos na comunicação também são 
marcantes e podem afetar habilidades verbais e não verbais. Pode haver atraso ou falta 
total de desenvolvimento da linguagem falada. Naqueles que chegam a falar, pode 
existir prejuízo na capacidade de iniciar ou manter uma conversação, uso estereotipado 
e repetitivo da linguagem ou uma linguagem idiossincrática (uso peculiar de palavras 
ou frases não possibilitando entender o significado do que está sendo dito). Quando a 
fala se desenvolve, o timbre, a entonação, a velocidade, o ritmo ou a ênfase podem 
ser anormais (ex.: o tom de voz pode ser monótono ou 
elevar-se de modo interrogativo ao final de frases afirmativas). As estruturas 
gramaticais são frequentemente imaturas e incluem o uso estereotipado e repetitivo 
(ex.: repetição de palavras ou frases, independentemente do significado, repetição de 
comerciais ou jingles). Pode-se observar uma perturbação na capacidade de 
compreensão da linguagem, como entender perguntas, orientações ou piadas 
simples. As brincadeiras imaginativas em geral são ausentes ou apresentam prejuízos 
acentuados. Existe, com frequência, interesse por rotinas ou rituais não funcionais ou 
uma insistência irracional em seguir rotinas. Os movimentos corporais estereotipados 
envolvem mãos (bater palmas, estalar os dedos), ou todo o corpo (balançar-se, 
inclinar-se abruptamente ou oscilar o corpo), além de anormalidades de postura (ex.: 
caminhar na ponta dos pés, movimentos estranhos das mãos e posturas corporais). 
Podem apresentar preocupação persistente com partes de objetos (botões, partes do 
corpo). Também pode haver fascinação por movimentos (rodinhas dos brinquedos, 
abrir e fechar portas, ventiladores ou outros objetos com movimento giratório). 
 
Síndrome de rett: 
 
 
A Síndrome de Rett foi identificada em 1966 por Andréas Rett, tendo ficado 
mais conhecida após o trabalho de Hagberg. Do ponto de vista clínico, a Síndrome de 
Rett pode ser organizada em quatro etapas, de acordo com Mercadante (2007), 
conforme segue: 
 
Estagnação precoce: 
•Dos 6 aos 18 meses, caracterizando-se pela estagnação do desenvolvimento, 
desaceleração do crescimento do perímetro cefálico e tendência ao isolamento social. 
Rapidamente destrutiva: 
•Entre o primeiro e o terceiro ano de vida, com regressão psicomotora, choro 
imotivado, irritabilidade, perda da fala adquirida, comportamento autista e movimentos 
estereotipados das mãos. Podem ocorrer irregularidades respiratórias e epilepsia. 
Pseudoestacionária: 
• Entre os dois e dez anos de idade, podendo haver certa melhora de 
alguns dos sintomas como, por exemplo, o contato social. Presença de ataxia, 
apraxia, espasticidade, escoliose e bruxismo. Episódios de perda de fôlego, aerofagia, 
expulsão forçada de ar e saliva. 
Deterioração motora tardia: 
• Inicia-se em torno dos dez anos de idade, com desvio cognitivo grave e 
lenta progressão de prejuízos motores, podendo necessitar de cadeira de rodas. 
Mesmo com a identificação do gene, os mecanismos envolvidos na Síndrome de Rett 
ainda são desconhecidos. Reduções significativas no lobo frontal, no núcleo caudado 
e no mesencéfalo têm sido descritas, havendo também algumas evidências de 
desenvolvimento sináptico. 
 
Transtorno de Asperger: 
 
De acordo com o DSM.IV, as características essenciais do Transtorno de 
Asperger consistem em prejuízo persistente na interação social e no desenvolvimento 
de padrões repetitivos de comportamento, interesses e atividades. 
A perturbação pode causar prejuízo clinicamente significativo nas áreas social, 
ocupacional ou em outras áreas importantes do funcionamento. 
Diferentemente do que ocorre no Autismo, não existem atrasos significativos 
na linguagem. Também não existem atrasos significativos no desenvolvimento 
cognitivo ou nas habilidades de autoajuda, comportamento adaptativo (outro que não 
a interação social) e curiosidade acerca do ambiente na infância. 
O Transtorno de Asperger parece ter um início mais tardio do que o Autismo, 
ou parece ser identificado mais tarde. As dificuldades de interação social podem 
tornar-se mais manifestas no contexto escolar, e é durante esse período que 
interesses idiossincráticos (peculiares em relação aos interesses comuns às pessoas) 
ou circunscritos podem aparecer e ser reconhecidos. Quando adultos, podem ter 
problemas com a empatia e modulação da interação social. 
 
Transtorno Desintegrativo da Infância: 
 
O Transtorno Desintegrativo da Infância foi descrito pela primeira vez por 
Heller, em 1908. Foi então denominado “dementia infantilis”. Essa definição, 
entretanto, não corresponde ao quadro, já que as características de perda de memória 
e de habilidades executivas não são proeminentes e não há causa orgânica do 
prejuízo. Posteriormente, é introduzido na classificação psiquiátrica, categorizado 
como Transtorno Global do Desenvolvimento em função da perda das habilidades 
sociais e comunicativas proeminentes. É um transtorno extremamente raro. Nesse 
transtorno, não há deterioração continuada; após a regressão inicial, chega-se a um 
estado estável, mas com grande impacto durante toda a vida. 
Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra especificação: 
Essa é uma categoria diagnóstica de exclusão. Alguém pode ser assim 
diagnosticado se preencher critérios no domínio social e apenas mais um dos dois 
outros domínios. Podem se considerar também pessoas que possuam menos do que 
seis sintomas no total requerido para o diagnóstico do autismo ou idade de início 
maior do que 36 meses. 
Espectro Autista 
 
 
 
Em 1979, estudos de Wing e Gould deram origem ao conceito de Espectro 
Autista. Ao estudarem a incidência de dificuldades na reciprocidade social, 
perceberam que as crianças afetadas por essas dificuldades também apresentavam 
os sintomas principais do autismo. A incidência foi praticamente cinco vezes maior do 
que a incidência nuclear do autismo. Portanto, são crianças afetadas por dificuldades 
na reciprocidade social, na comunicação e por um padrão restrito de conduta, sem 
que sejam autistas, propriamente ditas, o que permitiu atenção e ajuda a um número 
maior de crianças. O Espectro Autista é um contínuo, não uma categoria única, e 
apresenta-se em diferentes graus. Há, nesse contínuo, os Transtornos Globais do 
Desenvolvimento e outros que não podem ser considerados como Autismo, ou outro 
TGD, mas que apresentam características no desenvolvimento correspondentes a 
traços presentes no autismo. São as crianças com Espectro Autista. 
 
Como lidar com os transtornos globais do desenvolvimento (TGD) 
Para falar sobre os Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD) que são 
distúrbios nas interações sociais recíprocas que costumam manifestar-se nos 
primeiros cinco anos de vida da criança. Que vem caracterizar pelos padrões de 
comportamentos e comunicações estereotipados e repetitivos, assim como pela 
inibição nos interesses e nas atividades diárias. Os prejuízos quantitativos e 
qualitativos que definem estas condições representam um hibridez acentuado em 
relação ao nível de desenvolvimento ou idade mental do indivíduo. 
Os TGD englobam as diferentes desordens do aspecto autista, as psicoses 
infantis, a Síndrome de Asperger, a Síndrome de Kanner e a Síndrome de Rett. 
Com relação à interação social, crianças com TGD apresentam dificuldadesem 
iniciar e manter uma conversa. Algumas evitam o contato visual e demonstram 
aversão ao toque do outro, mantendo-se isoladas. Podem estabelecer contato por 
meio de comportamentos não-verbais e, ao brincar, preferem ater-se a objetos no 
lugar de movimentar-se junto das demais crianças. Ações repetitivas são bastante 
comuns. 
Tendo em vista, a característica descrita acima, o processo de aprendizagem 
e desenvolvimento da criança diagnosticada com TGD, se dá de forma diferente das 
crianças “normais”, portanto, nos primeiros meses de vida tal criança já apresenta 
alguns comportamentos que a distingue dos comportamentos padrões desta etapa do 
desenvolvimento, não responder aos estímulos da mãe é um comportamento típico 
de crianças com tal transtorno (COLL, PALACIOS, MARCHESI (orgs.), 1995), 
entretanto, deve-se ter cuidado, pois, estes comportamentos não necessariamente 
são características da criança com TGD, podendo assim ser apresentado em crianças 
que tiveram mães alcoólatras, ou que usaram drogas, durante a gestação, por 
exemplo (BEE, 2010), porém, ao decorrer dos anos essa característica tende a 
persistir em crianças que apresentam tal transtorno, por volta dos cinco anos a criança 
tende a não reconhecer as diferentes emoções como raiva e alegria, apresentam um 
olhar perdido, sem foco em algo ou alguém. 
Segundo Santos (2000, p. 59), o “brincar é a forma mais perfeita para perceber 
a criança e estimular o que ela precisa aprender a se desenvolver”, pois, além dela 
aprimorar o seu psíquico, físico-cognitivo sente prazer naquilo que lhe é proposto. Ou 
seja, para criança, a partir desta concepção, a escola torna-se um ambiente 
emancipatório. 
Os Transtornos Globais do Desenvolvimento também causam variações na 
atenção, na concentração e, eventualmente, na coordenação motora. Mudanças de 
humor sem causa aparente e acessos de agressividade são comuns em alguns casos. 
As crianças apresentam seus interesses de maneira diferenciada e podem fixar sua 
atenção em uma só atividade, como observar determinados objetos, por exemplo. 
Com relação à comunicação verbal, essas crianças podem repetir as falas dos 
outros - fenômeno conhecido como ecolalia - ou, ainda, comunicar-se por meio de 
gestos ou com uma entonação mecânica, fazendo uso de jargões. 
 
Alguns cuidados e como lidar com educando com TGD na escola 
 
Crianças com TGD são facilmente oprimidas pelas mínimas mudanças, 
altamente sensíveis a pressões do ambiente. São ansiosos e tendem a temer 
obsessivamente quando não sabem o que esperar. Stress, fadiga e sobrecarga 
emocional facilmente os afeta das atividades propostas pelo professor. 
 
O Professor deve se atentar para: 
*Fornece um ambiente agradável e seguro 
*Minimizar as transições das tarefas 
*não se apegue às possíveis estereotipias do aluno. 
*Oferecer rotinas diárias consistentes para reforçar o aprendizado 
*A criança precisa entender cada rotina do dia e saber o que a espera 
Incluir sinais manuais à linguagem é um facilitador, segundo Hernandéz 
Rodrigues. 
• Métodos desenvolve habilidades comunicativas em contextos naturais 
da criança. Facilitador da aprendizagem. 
Não permita a estigmatização desse aluno. Invista nas relações baseadas no 
respeito e na valorização dos talentos e competências de todos. 
Sabe-se que a criança possui necessidades e características peculiares e a 
escola desempenha um papel importante nesse aspecto, que é oferecer um espaço 
às brincadeiras associadas a situações de aprendizagem que sejam significativas, 
contribuindo de forma agradável e saudável (VYGOTSKY, 1984). Segundo afirma 
Kishimoto (2002, p. 45): 
Quando a criança constrói seu conhecimento a partir de suas brincadeiras e 
leva a realidade para seu mundo de fantasia, ela transforma suas incertezas em algo 
que proporcionam segurança e prazer, pois vai construindo seu conhecimento sem 
limitações. 
O momento da brincadeira é de grande importância, pois contribui para 
desenvolvimento do potencial integral da criança. Sendo também, o espaço que 
proporciona liberdade criadora, oportunidades de socialização, afetividade e um 
encontro com seu próprio mundo, descobrindo-se de forma prazerosa, isto é, à medida 
que a criança interage com os objetos e a brincadeira, construirá relações e 
conhecimentos a respeito do mundo em que vive (KISHIMOTO, 2002). 
Crianças com transtornos de desenvolvimento apresentam diferenças na 
aprendizagem e merecem atenção com relação às áreas de interação psicossocial, 
comunicação e comportamento. Na escola, mesmo com tempos diferentes de 
aprendizagem, esses alunos devem ser incluídos em classes com os pares da mesma 
faixa etária. 
De acordo com (FREIRE, 1996, p.59). Partindo desse princípio, cria-se 
situações para que o educando realize algumas atividades sozinho ou com ajuda dos 
professores e dos colegas, uma vez que isso se fez necessário, diante da dificuldade 
de movimentação corporal. Essas ocorreram no seguinte sentido: estimulá-lo a 
segurar a colher para se alimentar e pedir para ir ao banheiro, uma vez que ainda não 
tinha o controle dos esfíncteres, tirar e colocar a farda, guardar e organizar seus 
pertences e os objetos da escola, como jogos, brinquedos, livros, etc.; fazer tentativas 
para andar sem segurar na mão de alguém, opinar acerca da sua compreensão a 
respeito dos assuntos discutidos, entre outras. 
Estabelecer rotinas em grupos e ajudar o aluno a incorporar regras de convívio 
social são atitudes de extrema importância para garantir o desenvolvimento na sala 
de aula. Boa parte da aula, as crianças precisam de ajuda para desenvolver sua 
aprendizagem. 
(OLIVEIRA, 2002, p.136,) diz: A construção de significações, a gênese do 
pensamento e a constituição de si mesmo como sujeito se fazem graças às interações 
constituídas com outros parceiros em práticas sociais concretas de um ambiente que 
reúne circunstâncias, artefatos, práticas sociais e significações. Ao interiorizar formas 
de interação social já vivenciadas, o indivíduo se apropria de estratégias para 
memorizar, narrar, solucionar problemas etc., criadas pelos grupos humanos com os 
quais ele partilha experiências. Com isso, formas concretas de organização das 
atividades humanas em um meio sociocultural específico geram normas, regras e 
valores sempre potencialmente conflituosos e confrontantes, podendo ser 
confirmados, desaparecer ou diversificar-se. 
Promova o relacionamento pleno entre os alunos com TGD e seus colegas sem 
deficiência. Essa será a melhor maneira de propiciar a todos uma convivência 
produtiva e natural. O professor é peça fundamental nesse processo; • seja bastante 
flexível com relação às suas estratégias didáticas. O aluno com TGD pode te ensinar 
novas formas de lidar com assuntos e conteúdos cristalizados; 
• invista em aprimorar sua comunicação com o aluno com TGD. Eles possuem 
dificuldades na comunicação e precisam que você encontre formas de estabelecer 
uma comunicação plena com ele; 
Quando ingressas na escola, não interagem com os outros indivíduos, 
preferindo o isolamento, são alheias a estímulos externos, indiferente as pessoas, 
apresentam rituais sem sentido, em muitos casos como esses são comportamentos 
típicos do autismo, porém, muito destes comportamentos são característicos da 
Síndrome de Asperger, considerada um tipo de autismo de grau leve. 
Apesar do foco no dado trabalho ser a criança, é importante saber que na fase 
da adolescência, uma fase considerada complexa, para todos os indivíduos, o 
adolescente com TGD, podem apresentar avanços em alguns comportamentos ou 
regredirem ainda mais nos comportamentos citado acima, tais situações dependem 
do como este indivíduo será tratado – acompanhamento psicológico, escolas 
competentes que possuem um planejamento em torno de tal necessidade especial. 
A partir da explicitação supracitada, destaca-se a importância das brincadeiras 
lúdicas na escolae o que ela pode proporcionar aos sujeitos envolvidos. Para Wajskop 
(2005): A criança desenvolve-se pela experiência social, nas interações que 
estabelece, desde cedo, com a experiência sócio histórica dos adultos e do mundo 
por eles criado. Dessa forma, a brincadeira é uma atividade humana na qual as 
crianças são introduzidas constituindo-se em um modo de assimilar e recriar a 
experiência sociocultural dos adultos. (WAJSKOP, 2005, p.25). 
Apresentar as atividades do currículo visualmente é outra ação que ajuda no 
processo de aprendizagem desses alunos. Faça ajustes nas atividades sempre que 
necessário e conte com a ajuda do profissional responsável pelo Atendimento 
Educacional Especializado (AEE). Também cabe ao professor identificar as potências 
dos alunos. Invista em ações positivas, estimule a autonomia e faça o possível para 
conquistar a confiança da criança. As criança e adolescentes com TGD costumam 
procurar pessoas que sirvam como 'porto seguro' e encontrar essas pessoas na 
escola é fundamental para o desenvolvimento. 
 
 
Tipos de intervenções para crianças com TGD 
Sua eficácia está ligada ao comprometimento cognitivo e aos comportamentos 
apresentados pela criança, e para que ocorra de forma efetiva e responsável são 
necessárias: preparação e orientação de professores, realização de adaptações 
curriculares e atenção mais próxima de uma professora auxiliar. 
 
ABA - Análise Aplicada ao comportamento; 
1- avaliação inicial, 
2- definição de objetivos a serem alcançados, 
3 elaboração de programas/procedimentos, 
4 ensino intensivo, 
5 avaliação do progresso. 
 
 
O tratamento comportamental caracteriza-se, pela experimentação, registro e 
constante mudança. A lista de objetivos a serem alcançados é definida pelo 
profissional de Educação, juntamente com a família com base nas habilidades iniciais 
do indivíduo. Assim, o envolvimento dos pais e de todas as pessoas que participam 
da vida da criança é fundamental durante todo o processo de ensino aprendizagem. 
 
Aspectos importantes dos transtornos globais do 
desenvolvimento para a educação escolar 
 
Algumas características dos Transtornos Globais do Desenvolvimento, 
presentes de forma mais típica no Autismo, são semelhantes aos déficits da função 
executiva presentes nas pessoas que possuem lesões dos lobos frontais. 
Os aspectos semelhantes são: ansiedade diante de pequenas alterações no 
entorno, insistência em detalhes da rotina, condutas estereotipadas e repetitivas, 
interesse centrado em detalhes ou parte de informações de forma perseverante, 
dificuldade de perceber o todo e de integrar aspectos isolados. 
Há evidências suficientemente consistentes para supor déficits da Função 
Executiva nas pessoas com autismo. 
Segundo Goldman - Rakic (1987), as funções pré-frontais (lobos frontais e 
regiões corticais pré-frontais) estão implicadas no funcionamento tanto cognitivo 
quanto socioemocional. 
Os lobos frontais têm várias funções: o planejamento da fala, dos atos motores, 
dos movimentos do corpo, o controle do humor, dos impulsos, das 
situações que envolvam as relações com o ambiente e das demais funções da vida 
de relação. Eles possibilitam a intencionalidade, a planificação e a organização da 
conduta. 
O mais importante talvez, para nós educadores, é a perspectiva de 
compreender as manifestações das crianças com autismo por meio da Função 
Executiva. Isso porque, no desenvolvimento de todas as crianças que recebemos na 
escola, tal função encontra-se implicada, já que o aprendizado a ser desenvolvido ali 
se sustenta, em grande parte, no uso dela. Por outro lado, já que nossa atuação, 
mediante todas as crianças, como professores, está implicada no aprimoramento e 
ampliação de possibilidades de uso dessa função, essa compreensão é a interface 
que permite identificar possibilidades de atuação com nossos alunos com TGD. 
O que Kanner e Eisenberg chamavam de insistência na invariância, ou seja, 
que as pessoas com autismo insistem na mesma rotina e reagem a variações, 
corresponderia ao conceito neuropsicológico de Função Executiva. A compreensão 
de que o autismo implica um transtorno da Função Executiva é, atualmente, uma das 
ideias centrais das investigações. Não significa uma simples troca de termos, mas 
trata-se de conceitos muito mais precisos do que aqueles utilizados por Kanner e 
Eisenberg. A Função Executiva consiste em uma disposição adequada com o fim de 
alcançar um objetivo. Essa disposição pode implicar um ou vários aspectos: 
• A intenção de evitar ou adiar uma resposta (inibição do impulso de agir 
imediatamente sobre uma situação); 
• Um plano estratégico de ações sequenciadas; 
• Uma representação mental da tarefa. 
Na Função Executiva, portanto, está implicada a flexibilidade estratégica. Esta 
é a marca fundamental do funcionamento frontal tão desenvolvido no ser humano, 
pela necessidade de estratégias de caráter propositivo e dirigidas ao futuro. 
A flexibilidade estratégica permite adiar, inibir, avançar ou retroceder para 
alcançar um propósito. Em testes com tarefas de Função Executiva, os autistas 
demonstraram muita inflexibilidade. Quando esses testes comparavam pessoas com 
autismo e com Transtorno de Asperger, evidenciou-se a presença de inflexibilidade 
em ambos, enquanto testes que envolviam tarefas de Teoria da Mente resultaram em 
diferenças (o conceito de Teoria da Mente será desenvolvido adiante). 
Esses testes levaram os autores a supor que o transtorno da Função Executiva 
pode ser considerado como sendo o transtorno primário. O problema 
fundamental do autismo seria a inflexibilidade, sendo o restante explicável a partir 
desse problema. Assim, podemos entender, por exemplo, que as dificuldades no 
campo da relação social são decorrentes do fato de que, nesse campo, a flexibilidade 
se faz mais necessária do que em qualquer outro domínio mental. 
A antecipação é uma importante função dos lobos frontais e se encontra 
prejudicada nas pessoas com TGD. Essa função pode estar alterada em diferentes 
níveis entre as pessoas com Espectro Autista e com TGD, mas todas apresentam 
algum prejuízo na antecipação. Esse prejuízo pode se manifestar pela aderência 
inflexível a estímulos que se repetem, como na reprodução do mesmo filme inúmeras 
vezes, no mesmo itinerário para a escola, na permanência dos objetos no ambiente, 
etc. 
As estereotipias são um exemplo da manifestação do prejuízo na flexibilidade. 
Trata-se de estereotipias sensório-motoras: balançar o corpo, bater palmas, fazer e 
desfazer, ordenar e desordenar. São rituais simples. Também podemos encontrar 
rituais mais elaborados, como apego a objetos que são carregados a todos os lugares, 
controle rigoroso de situações do ambiente ou da rotina e rígido perfeccionismo. 
Outra característica do prejuízo na Função Executiva apresentada pelas 
pessoas com Espectro Autista é a dificuldade de dar sentido aos acontecimentos e às 
atividades. Para dar sentido é preciso antecipar, dar propósito, e isso tem a ver com 
a finalidade de algo. Na manifestação desse prejuízo, encontramos pessoas que 
apresentam predominantemente atividades sem sentido, sem propósito, sem 
funcionalidade. Também encontramos aquelas que conseguem fazer atividades 
funcionais simples e breves, e outras que desenvolvem atividades funcionais e com 
autonomia, mas motivadas externamente. 
A característica de prejuízo na reciprocidade social, descrita inicialmente como 
"extrema solidão", pode ser explicada pela inflexibilidade mental das pessoas com 
autismo, em decorrência do prejuízo da Função Executiva. A indiferença nas relações 
sociais tem a ver com o nível de exigência de flexibilidade nesse campo humano, 
tornando-o o campo de maior impossibilidade para algumas dessas pessoas. As 
relações sociais exigem antecipar, dar sentido, significados e ter propósitos. Mais do 
que isso implica no uso de símbolos, de sentidos múltiplos e no lidarcom situações 
não antecipáveis. Nessa característica, também está implicada a Teoria da Mente, 
que será explicada a seguir. 
Teoria da mente 
 
 O termo Teoria da Mente surgiu no final da década de 70, em decorrência de 
pesquisas na área da cognição animal. A partir dessa época, a psicologia cognitiva 
ocupou-se do desenvolvimento de modelos explicativos para esse termo e suas 
aplicações. 
A Teoria da Mente significa a 
capacidade de atribuir estados mentais a outras pessoas e predizer o seu 
comportamento em função destas atribuições (PREMACK & WOODRUFF, 1978). O 
termo "Teoria" resulta do fato de que tais estados não são diretamente observáveis, 
solicitando uma verdadeira "teorização" de quem infere um estado mental em outro 
indivíduo. 
A Teoria da Mente é essencial para o ser humano, uma vez que permite a 
teorização do estado mental das outras pessoas, o que sentem, o que pensam, quais 
as suas intenções e como poderão agir. Isto nos permite modular nossas reações e 
nosso comportamento social, além de desenvolver nossa empatia frente a 
sentimentos inferidos nas outras pessoas. 
Baron - Cohen (1995) propuseram um modelo para explicar o sistema de leitura 
da mente. Tal sistema postula quatro mecanismos que interagem para produzir tal 
leitura: o detector de intencionalidade, o detector de direcionamento do olhar, o 
mecanismo de atenção compartilhada e o mecanismo de Teoria da Mente. 
O mecanismo detector de intencionalidade constitui um aparato perceptivo que 
interpreta estímulos móveis em termos de desejos e metas. Em paralelo, o detector 
da direção do olhar é responsável pela detecção da presença e direção do olhar, bem 
como é o encarregado da interpretação do olhar de alguém que está deliberada e 
conscientemente vendo (este mecanismo permite a seguinte questão: ela vê aquilo?). 
Estes dois mecanismos mandam informações para o terceiro mecanismo (mecanismo 
de atenção compartilhada), o qual se encarrega de criar relações entre o eu, outros 
agentes e objetos (este mecanismo formula a seguinte questão: eu e você vemos a 
mesma coisa?). Finalmente, o quarto mecanismo (mecanismo da Teoria da Mente) é 
o responsável pela união das noções (até então 
separadas) de atenção, desejo, intenção, crença dentro de um aparato teórico 
coerente para o entendimento do comportamento em termos mentalistas, isto é, 
dentro de um contexto de representações. 
Nas crianças com autismo, os mecanismos de atenção compartilhada e de 
Teoria da Mente estariam prejudicados, o que acarretaria prejuízos nas relações 
sociais e na comunicação. Tais prejuízos ocorrem pelo fato de que o déficit na Teoria 
da Mente dificulta a compreensão do que as pessoas pensam, sentem e do modo 
como se comportam. Não conseguindo atribuir estes significados, a criança com 
autismo não interage com o meio social da mesma forma que as demais crianças. 
 
A formação e aprendizagem da criança com transtorno global do 
desenvolvimento 
 
Para iniciar este capítulo, descreveremos situações comumente vividas pelas 
crianças, pelas famílias e pelas escolas ao receberem alunos com TGD. O objetivo é 
de proporcionar a identidade entre o presente texto e a realidade vivida pelos 
professores, buscando subsidiar teoricamente a compreensão dessa realidade e 
propor alternativas de atuação e de valorização desse desafio. 
 
A criança ao ingressar na escola 
 
 
Conforme já foi mencionado, a oportunidade de trabalhar com alunos com TGD 
na turma tem sido nova para a grande maioria das escolas. De acordo com a nossa 
observação, é grande o impacto nos profissionais da educação que atuam na escola 
quando se deparam com as reações dessas crianças que, tanto quanto os 
professores, estão diante de uma experiência nova. 
É comum que essas crianças apresentem manifestações de sua inflexibilidade 
de maneira exacerbada. Se utilizarmos os subsídios teóricos trabalhados 
anteriormente nesse texto, é fácil compreender que, no ambiente escolar, com todos 
os seus estímulos e vendo-se em meio a muitas outras crianças, a tantas falas e 
atitudes das outras pessoas que, aliás, não lhe são familiares, a criança reaja assim. 
Essas reações, de forma recorrente, podem ser de choro intenso, de 
movimentos corporais repetitivos, de indiferença em relação aos apelos e tentativas 
de ajuda, de apego a determinados locais fixos na escola e de recusa em deslocar- 
se conforme orientado. Também já observamos, em casos mais complexos, 
autoagressões ou reações abruptas envolvendo objetos ou mesmo alguma outra 
pessoa. 
A ocorrência de tais manifestações não deve ser interpretada como o estado 
permanente da criança ou no que consiste o seu porvir. Na verdade, trata-se de 
reações esperadas mediante uma alteração importante na sua rotina. A escola, 
naquele momento, é uma experiência desconhecida e de difícil apropriação de sentido 
e propósito pela criança. 
Por parte dos professores, a vivência desses primeiros momentos pode ser 
paralisante, carregada de sentimento de impotência, angústia e geradora de falsas 
convicções a respeito da impossibilidade de que a escola e o saber/fazer dos 
professores possam contribuir para o desenvolvimento daquela criança. 
Mediante as dificuldades iniciais, as escolas recorrem a todo tipo de tentativa 
de acolhimento ao aluno. Essa é uma atitude absolutamente compreensível, embora 
sejam importantes alguns cuidados. Se conseguirmos deslocar nossa atenção das 
estereotipias e reações da criança e nos projetarmos a um cotidiano futuro, é possível 
"cuidar" de algumas questões. 
Considerando os subsídios teóricos já disponibilizados nesse texto, 
entendemos que tais dificuldades iniciais ocorrem em decorrência da inflexibilidade 
mental dessa criança. É pela falta de flexibilidade que a experiência de estar na escola 
não é significada facilmente, representando inicialmente apenas a perda da rotina 
cotidiana, que permitia a essa criança não se desorganizar. Devemos lembrar de que 
o apego a rotinas e rituais é uma característica comum às crianças com TGD. 
Os professores que trabalham com as idades iniciais da escolarização 
acumulam farta experiência como testemunhas de diferentes graus de reação das 
crianças aos primeiros dias na escola e à primeira separação da família para um meio 
social mais amplo. Algumas conseguem rapidamente se adaptar às novas vivências, 
enquanto outras levam muitos dias nessa empreitada, absorvendo toda a atenção dos 
professores em atitudes de choro contínuo, apego à mãe na entrada da 
escola, sem deixarmos de poder mencionar o apego de mães aos seus filhos e a 
grande insegurança de algumas ao deixá-los na escola. 
O que é importante então nesses primeiros dias? É importante entender que as 
primeiras manifestações correspondem àquelas acima descritas, comuns às demais 
crianças, potencializadas pela inflexibilidade decorrente do TGD. Assim, no decorrer 
dos primeiros dias, é fundamental ter em mente que a experiência da escola necessita 
entrar, o quanto antes, num terreno mais previsível para aquela criança. Isso deve ser 
feito, obviamente, sem retirar a naturalidade do ambiente escolar, mas tendo em 
mente que a mesma inflexibilidade que torna tão difíceis as primeiras experiências 
nesse ambiente poderá também promover o apego a situações que posteriormente 
poderão se tornar indesejáveis. 
Em outras palavras, é importante, na tentativa de acolhimento àquela criança, 
não proporcionar a ela vivências que não farão parte da sua rotina no futuro. A 
inflexibilidade e o apego a rotinas poderão levar a criança a estabelecer rotinas 
inadequadas no interior da escola, que causarão dificuldades posteriores para os 
profissionais e para a própria criança quando forem reformuladas. Exemplos disso são 
o acolhimento individual com acesso a brinquedos que não é dado às demais crianças, 
horários reduzidos para adaptação progressiva, permanência separada da turma em 
espaços como salada coordenação ou direção da escola, alimentação em horário 
diferente do restante da turma etc. 
O cotidiano escolar possui rituais que se repetem diariamente. A organização 
da entrada dos alunos, do deslocamento nos diversos espaços, das rotinas em sala 
de aula, do recreio, da organização da turma para a oferta da merenda, das aulas em 
espaços diferenciados na escola, da saída ao final das aulas e outros são exemplos 
de rituais que se repetem e que favorecem a apropriação da experiência escolar para 
a criança com TGD. 
Esses rituais escolares proporcionam a todas as crianças o desenvolvimento 
de aspectos cognitivos úteis à vivência social, envolvendo antecipação, adiamento da 
atuação imediata, entre outros. A diferença é que a necessidade de exercício explícito 
de ensino e aprendizagem empreendidos junto à criança com TGD, em tais situações, 
torna visível tal processo. 
O grande valor desses rituais já inerentes à escola para a criança com TGD é 
o fato de que acontecem para todos os alunos e não são artificiais ou preparados 
exclusivamente para a criança com TGD, já que constituem regras de organização 
de um meio social real e, portanto, diverso. O aprendizado advindo das situações reais 
é de utilidade real para a criança, ou seja, passível de ser utilizado em outros 
contextos, diferentemente daquele advindo de situações artificiais. 
Quanto mais cedo a criança com TGD puder antecipar o que acontece 
diariamente na escola, mais familiar e possível de ser reconhecida se tornará para ela 
a vivência escolar, tornando as primeiras manifestações da criança progressivamente 
menos frequentes. Tendo em vista que a capacidade de antecipar é uma função que 
se apresenta prejudicada para aqueles que apresentam TGD, consiste em facilitador 
da familiarização com o ambiente escolar essa antecipação, com a ajuda de outra 
pessoa. 
Por antecipação realizada por outra pessoa, estamos nos referindo à 
necessidade de que a criança seja comunicada antes, de forma simples e objetiva, a 
respeito do que vai ocorrer no momento seguinte. Isso pode parecer não funcionar por 
um tempo, pois a criança poderá aparentar não ter prestado atenção ou não entender, 
quando não altera suas atitudes diante dessa antecipação. O importante é tornar a 
antecipação uma rotina e não desistir da expectativa de adesão da criança. Como 
efeito da antecipação, a cada dia mais o contato diário da criança com o ambiente 
escolar e com seus rituais, que se repetem, vão tornando o cotidiano mais previsível 
e seu comportamento poderá ir se transformando. 
Com o passar do tempo, a escola poderá ir dispensando tal antecipação nas 
situações que se repetem diariamente, podendo verificar que um precioso progresso 
foi conquistado no cotidiano daquela criança. 
As intervenções dos colegas consistem em importante estratégia 
transformadora de padrões de comportamento da criança com TGD. O envolvimento 
da criança com TGD pelos colegas proporciona, não raras vezes, intervenções que 
partem deles espontaneamente, na tentativa de que aquela criança participe como 
eles da rotina. A intervenção dos colegas acontece quando eles reconhecem a 
expectativa da escola de que a criança com TGD conseguirá comportar-se melhor. O 
efeito dessa intervenção dos pares na adesão da criança com TGD a esses rituais é 
mais frequentemente eficaz do que aquela que provém dos adultos. Se, por um lado, 
esses rituais são inerentes à rotina escolar, também o são as situações inusitadas, as 
novidades e surpresas. Como veremos no decorrer do texto, a escola tem se mostrado 
essencial por ambos os aspectos, demonstrando que a exposição ao meio social é 
condição de desenvolvimento para qualquer ser humano. 
 
 
A família 
 
A descoberta de que o filho ou a filha é uma criança com Transtorno Global do 
Desenvolvimento consiste numa das etapas do desconforto que, na verdade, se inicia 
bem antes, quando se percebe que algo não vai bem. Desde a primeira desconfiança 
até a identificação do quadro, e daí em diante, um leque extremamente extenso de 
sensações, angústias, incertezas, inseguranças, tentativas, erros, medos e 
esperanças envolve a família. 
Temos observado que os prejuízos na área da comunicação comprometem, 
com frequência, a possibilidade imediata de confiança por parte da família na 
permanência da criança na escola durante todo o turno ou, até mesmo, na 
permanência dessa criança sem a presença da mãe. Tal insegurança se pauta, por 
exemplo, na crença de que a criança passará por fome e sede, por não saberem 
comunicar suas necessidades ou pedir ajuda a outras pessoas além da família. 
Nesse momento, torna-se fundamental o reconhecimento, por parte dos 
educadores, de que a escola é o espaço de aprendizagens que propicia a aquisição 
da autonomia para todos os alunos. Para alguns, a autonomia em relação às próprias 
necessidades básicas é adquirida no meio familiar, tornando a escola uma 
oportunidade de exercício dessa autonomia em ambiente social diferenciado e mais 
amplo do que a família. Neste caso, a aprendizagem refere-se à experiência que 
oportuniza a generalização das competências já adquiridas, mediante novas 
situações-problema. 
Para crianças com TGD, poderá ocorrer que a permanência no ambiente 
escolar por si só represente uma exposição a situações-problema que poderão fazer 
emergir competências ainda não adquiridas. Nos casos em que há ausência da 
comunicação, as necessidades e desejos da criança são, geralmente, subentendidos 
por outro familiar, sendo poucas as oportunidades de exposição a situações em que 
a busca de ajuda ou de satisfação das necessidades tenha que ser exercida com a 
contribuição da própria criança. Certamente, o enfrentamento de tais situações deve 
ser mediado pela escola de modo a torná-las eficazes para o desenvolvimento de tais 
competências. 
Se, no trabalho com a maioria das crianças, não fica tão evidente o 
desenvolvimento da autonomia em decorrência da escolarização, no caso das 
crianças com TGD, esta decorrência se evidencia, demandando intenção pedagógica 
para desenvolvê-la. 
O reconhecimento da escola como espaço de desenvolvimento de 
aprendizagens, em prol da autonomia, e a convicção na possibilidade de se exercer 
este papel junto à criança com TGD são fundamentais na relação inicial com a família, 
no sentido de sustentar a permanência da criança na escola desde o início e o 
estabelecimento de vínculo de confiança com os familiares. 
Desde o início, é importante que tanto a escola quanto a família tenham a 
compreensão de que nem todos os dias tudo vai dar certo. Além disso, os profissionais 
da escola necessitam observar os progressos que a criança vai conquistando do ponto 
de vista da própria criança. Isto significa que não faz sentido utilizar parâmetros 
inflexíveis e impessoais de avaliação pedagógica sob o risco de nos privarmos dos 
subsídios para a ação pedagógica apropriada à criança. É preciso analisar o processo 
desde seu ingresso na escola, como a criança se portava e o que passou a ser capaz 
de realizar. 
Tanto a família quanto a escola precisam compreender que, mesmo quando a 
criança supera as dificuldades iniciais e abandona determinadas atitudes ou 
estereotipias, eventualmente elas podem se manifestar novamente, não significando 
por isso que o trabalho da escola está sendo mal sucedido. A escola precisa estar em 
permanente interlocução com a família. Além de todos os benefícios inerentes a essa 
interlocução, isso poderá contribuir para que, juntos, a família e os profissionais da 
escola possam compreender mais rapidamente os motivos para eventuais retomadas 
pela criança de reações que já haviam sido superadas. 
Como exemplo disso, podemos relatar um dos casos que observamos em que 
a troca da empregada doméstica, que havia trabalhado por vários anos com a família, 
e a mudança na rotina de horários da mãe, em função do trabalho, eram os motivos

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