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MARXISMO E EDUCAÇAO ABORDAGEM FENOMENOLÓGICA E MARXISTA DA EDUCAÇÃO 68381 Tradução de Waltensir Dutra ZAHAR EDITORES RIO DE JANEIRO Madan Sarup Professor de Sociologia, Goldsmiths' College, Universidade de Londres Título original .Marxism and Education Capa: Eliane Stephan Composição: Zahar Editores S.A. ZAHAR EDITORES S.A. Caixa Postal 207, ZC-00, Rio que se reservam a propriedade desta versão Impresso no Brasil Copyright © 1978 by Madan Sarup AH rights reserved. Direitos reservados Proibida a reprodução (lei n9 5.988) Traduzido da primeira edição inglesa publicada em 1978 por Routledge & Kegan Paul, de Londres, Inglaterra. 1980 Direitos para a língua portuguesa adquiridos por 636A índice 1. 21 544. 5. 68 826. 917. 101 2. 3. 30 40 PARTE II - MARXISMO E EDUCAÇÃO 8. Introdução ao Marxismo Necessidade de uma sociologia marxista da educação, 101; A ini ciação teórica de Marx, 102; Idealismo hegeliano: o pensamento dialé tico e negativo, 103; O materialismo de Feuerbach e seu método Agradecimentos Introdução Considerações teóricas, 12. Perspectivas sociológicas e educação, 14 9 11 PARTE I ALGUNS ASPECTOS DA NOVA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO As Injunções da Nova Abordagem Algumas proposições da nova abordagem, 24 O Uso de Estudos Antropológicos A Adoção de um Modelo Fenomenológico do Homem Fenomenologia e positivismo, 40; O "modelo do homem" de Sartre, 43; O marxismo fenomenológico de Sartre, 47; Duas versões da fe nomenologia a analítica e a possibilitária, 49 A Rejeição da Filosofia Liberal da Educação Algumas críticas a Peters e Hirst, 55, O solapamento das hierarquias tradicionais, 58; A filosofia da educação liberal como uma ideolo gia, 62 A Importância dos Estudos de Sala de Aula Diferentes abordagens na sociologia da educação: a funcionalista- estrutural e a interpretativa, 68; Alguns estudos de sala de aula, 71; "Rotulação" e negociação, 72; Algumas limitações da abordagem tipo "rotulação", 74; Conhecimento de sala de aula, 75; A ideologia na sala de aula: progressismo, 78 Alguns Problemas da Sociologia Fenomenológica Introdução, 82; A validade das explicações e o dilema da imposição, 83; O problema do mentalismo, 85; Relativismo, 87 Para uma Reavaliação Radical 8 índice 1199. 13510. 149 165 172 transformativo, 104; A crítica de Marx a Hegel e Feuerbach, 105; A síntese de Marx: o homem e a história, 107; Duas visões da aliena ção: Hegel e Marx, 109; A visão hegeliana da alienação, 110; A visão marxista da alienação, 1 10; A visão marxista da práxis, 111; A ten dência para o marxismo positivista, 116 Alienação e Ensino A concepção relacional de Marx sobre a sociedade, 119; A alienação e os adversários da escola, 124; Alunos, professores e conhecimento, 127 Fatos Atuais: o Primado do Modo de Produção A contribuição de Louis Althusser: educação e ideologia, 136; A contribuição dos historiadores e economistas políticos da educação americanos, 138; A adaptação da educação às necessidades de traba lho, 14 1; O modo de produção capitalista, 143 11. A Economia Política da Educação: o Ensino Escolar na Sociedade Capitalista A economia política de Bowles e Gintis, 149; Algumas críticas a Schooling in Capitalist America, 154; Os mecanismos da mudança educacional, 161 12. Sumário e Conclusões Conclusão, 170 Notas Agradecimentos Este breve volume é o resultado de um estudo da Sociologia da Educação, realizado com Michael F.D. Young, e do ensino dessa matéria, em compa nhia de meus amigos, Bob Colquhoun e lan Hextall. Sem a ajuda e o estí mulo dessas pessoas, ele não teria sido possível. Desejo agradecer também aos meus colegas do Departamento de Sociologia, e sou grato aos meus muitos amigos, em vários grupos de estudo de que participo, por terem dis cutido comigo essas idéias, nos últimos três anos — este livro é um produto de nossa colaboração. Como é resultado de um curso de palestras proferido a meus alunos do Goldsmiths' College, agradeço principalmente a eles. Aju daram-me mais do que provavelmente pensam. Nas fases finais, beneficiei- me muito com os comentários e a crítica de Barry Cole. A doutrina materialista de que os homens são produto das circunstâncias e educação, que homens diferentes são portanto produtos de outras circuns tâncias e de uma educação diferente, esquece que as circunstâncias são, na verdade, modificadas pelos homens e que o próprio educador deve ser educado. Marx, Teses sobre Feuerbach Introdução Este livro é uma introdução a alguns dos enfoques mais recentes sobre a Sociologia da Educação. Tanta coisa aconteceu nos últimos dez anos que a matéria transformou-se. É uma área empolgante. Houve uma sucessão de perspectivas novas, que é necessário compreender e aprender a usar, como o interacionismo simbólico, a etnometodologia e a fenomenologia social. Durante o mesmo período houve uma explosão na teoria marxista. Não só textos novos, mas teóricos,com novas interpretações do marxismo, surgiram. A Parte I deste livro é uma análise da perspectiva "interpretati- va", ou fenomenológica, tal como aplicada à educação. Depois de uma dis cussão de seus pontos fortes e de suas debilidades, examino, na Parte II, algumas abordagens marxistas. Centralizo a atenção nessas perspectivas porque são maneiras importantes de compreender o mundo em que vive mos. Não são simples modas, mas tradições em evolução, com inter-rela- çÕes complexas que parecem antagónicas, coincidentes ou mutuamente necessárias, para diferentes teóricos. Procurei explorar essas relações não como um intelectual eclético, desligado, mas a partir de uma determinada posição. Tenho um compro misso com uma transformação radical da educação, e da maneira pela qual trabalhamos e vivemos juntos. Poder-se-ia perguntar: Como um autor enga jado pode ser um guia útil para as principais controvérsias na Sociologia d? Educação? Mas creio que o engajamento não implica uma visão doutrinária limitada, estática. O engajamento refere-se à manutenção de um princípio moral e político, como a criação de um mundo mais aceitável— mas nossa análise do mundo, a compreensão que dele temos, pode achar-se num esta do de fluxo, e em evolução contínua. O leitor talvez note, com surpresa, a ausência dos habituais títulos de capítulo que aparecem nos manuais tradicionais. Não há capítulos intitula dos "Educação e Mobilidade Social", ou "Formação Familiar, Valores e Realizações". Parece-me que muitas dessas questões surgem neste livro, mas apresentadas de forma incomum. Toda perspectiva tem seu vocabulá rio, sua maneira de ver e dar um sentido ao mundo. A perspectiva fenome nológica postula o exame das questões como se fossem "antropologica- mente estranhas". Por isso, abordei muitos problemas formulando pergun- 12 marxismo e educação Considerações Teóricas tas que não são feitas em geral na Sociologia "tradicional” da Educação. E, embora os títulos "Estratificação e Mobilidade", "Seleção Social”, "Igual dade de Oportunidade Educacional” não se encontrem aqui, os problemas relacionados com a liberdade e igualdade humanas são discutidos primeiro em termos fenomenológicos e, em seguida, em termos marxistas. Esta últi ma abordagem é útil porque insiste no exame das relações dentro de uma totalidade, ou seja, as relações entre escolas, a família, o trabalho e a polí tica partidária. Além do mais, todas essas relações são vistas dentro de uma sociedade ou formação social específicas. Admite-se, é claro, que as con trovérsias aqui discutidas não foram solucionadas; que não são controvér sias já resolvidas. Os problemas daquilo que devemos fazer para tornar nossa vida mais feliz, e o mundo melhor, e como fazer isso, não podem ser solucionados com facilidade. Mas pelo menos é possível iniciar um diálogo. Como este livro tem por temas algumas das principais controvérsias da ciên cia social, um esquema dos principais argumentos talvez seja útil. O resumo da argumentação, porém, leva inevitavelmente à abstração seca,e por isso alguns leitores podem preferir passar diretamente ao primeiro capítulo, e voltar a este sumário mais tarde. O principal argumento baseia-se na supo sição de que é nossa tarefa modificar o mundo, torná-lo melhor, não apenas menos inaceitável. 0 enfoque do livro não é, portanto, sobre a questão da ordem social, mas da mudança social. Procurei basear minha discussão da teoria sociológica sempre num mundo vivo — o da educação — que profes sores, alunos e outros experienciam diariamente. Embora a discussão das perspectivas sociológicas esteja interligada com as questões educacionais e delas seja inseparável, para os objetivos deste livro esboçarei primeiro os aspectos teóricos. 0 que pode parecer pouco claro neste resumo se tornará mais compreensível nos capítulos que se seguem. De maneira geral, este livro discute três modelos de ciência social: o positivista, o interpretativo (ou fenomenológico) e o marxista. As principais controvérsias de que nos ocupamos são as seguintes. Uma atitude altamente crítica é adotada em relação à Sociologia tradicional e seu enfoque positivista. Não trato dela diretamente em ne nhum capítulo específico, mas a rejeito em todo o livro. O positivismo é repudiado porque supõe que a realidade existe de maneira não-problemá tica; ele ressalta o método "científico” e a medida estatística, e separa "fa tos" de "valores”, "conhecimento” de "interesse”. Em suma, essa posição pressupõe uma visão passiva do homem, e, como a sua ligação com o beha- viorismo mostra, é determinista. Esse modo "científico” tornou-se domi nante; foi criada uma hierarquia entre os que possuem esse conhecimento, os peritos, e aqueles que dele não dispõem. Um número cada vez maior de introdução 13 áreas de nossa vida estão sendo definidas como "problemas técnicos", dis tantes do debate e da ação políticos, com a esperança de que os técnicos os possam resolver. Essa visão da racionalidade (manipulativa ou instru mental) leva àquilo que foi chamado de "visão tecnológica da política". Uma das críticas mais vigorosas ao positivismo foi feita pelo modelo interpretativo da ciência social, ou, mais especificamente, pela Sociologia Fenomenológica. Fazemos uma exposição simpática dessa interpretação e de sua crítica do empirismo e cientismo, sua ênfase na intencionalidade, e da experiência que o ator tem do mundo. O modelo fenomenológico do homem é explicado por uma discussão das opiniões de Sartre sobre a liber dade humana. Parece-me que tal abordagem é adotada por muitos como uma correção consciente de uma Sociologia tradicional que negava a im portância da construção do significado pelo ator. Os fenomenologistas afirmam que nossa consciência do mundo, nosso conhecimento dele, se faz pela interpretação. Argumento então que o modelo fenomenológico com sua ênfase na liberdade completa, e a capacidade que tem a consciên cia de modificar o mundo, tem deficiências idealistas. Embora ressalte que os homens agem em termos de suas interpretações de suas condições exter nas, e de suas intenções para com elas, tem dificuldades em analisar os me canismos particulares pelos quais uma determinada estrutura social impõe limites aos seus membros. Não pode explicar como, ou por que, certas ca- racterísticas repressivas da sociedade continuam a existir. Argumento, em seguida, que a perspectiva fenomenológica tem outras inadequações. Ne gligencia questões como a ideologia e a falsa consciência. Quer dizer, deixa de examinar como a realidade pode ser mascarada de uma maneira impor tante, em particular pelo obscurecimento ou racionalização de uma situa ção. A Sociologia Fenomenológica, além disso, tem pouco a dizer sobre o conflito estrutural numa sociedade, e nada sobre o entendimento dialético da mudança histórica. Mas a debilidade fundamental desse modelo é que sua teoria da consciência é insuficiente. Ressalta a desreificação mental, às expensas de outros aspectos. Tende a ignorar as condições materiais de exis tência que, embora socialmente produzidas, tornaram-se objetificadas e não podem ser simplesmente "racionalizadas". Sugiro que a perspectiva fenomenológica — porque sua base é o idealismo filosófico — estimula a mudança através da maneira pela qual pensamos, em lugar de oferecer os meios pelos quais podemos modificar aquilo que se está fazendo, A desrei ficação teórica, uma possível consequência dessa perspectiva, não é bastan te. Deve haver uma desreificação prática — uma derrubada real das relações sociais através da praxis. Argumenta-se então que esse entendimento pode ser proporcionado pela teoria marxista. Depois de ter argumentado que a perspectiva fenomenológica pode resultar numa desreificação teórica apenas, e não numa desreificação práti ca, um terceiro modelo, o marxismo, é então proposto, superando e trans- 14 marxismo e educação Perspectivas Sociológicas e Educação Em todo este livro, as controvérsias epistemológicas e metodológicas são consideradas no contexto da educação. Faço, adiante, um sumário dos aspectos principais dessa discussão. Meu argumento é que a Sociologia "tradicional" da Educação é posi tivista. Ela vê o conhecimento e as categorias educacionais consensualmen te, como se fossem objetivas, estivessem "lá fora" e existissem de um modo não-situado, livre de contexto. A Sociologia da Educação positivista acredita que seu método é neutro, mas quero dizer que mantém certas suposições não-explicadas sobre a natureza do homem e da sociedade. Sugere-se que, quando o positivismo é usado nas Ciências Sociais, há certas implicações lógicas que se seguem. O positivismo está ligado à racionalida de técnica, a previsão e controle. Acredito que esse método, se aplicado à educação, não pode ir além de uma engenharia social estreita reformista e fragmentada. cendendo as contradições dos outros dois. A versão do marxismo sugerida (e que muito deve a Hegel) é antipositivista, embora conserve alguns dos aspectos que nos parecem valiosos no modelo interpretativo. Quero dizer, com isso, por exemplo, a tentativa de compreender as intenções e desejos dos atores observados. Argumento, então, que o marxismo era originalmente um método dialético no qual o pensamento crítico era confirmado pela ação revolucio nária, mas que surgiram nele tendências deterministas que ressaltam uma lógica da história como um processo causal. Esta última visão é rejeitada por não deixar margem para a noção de que a história pode ser criada pela ação humana. A interpretação "científica", causal, leva a um marxismo vulgar que nega a importância da ação humana. Várias formas de marxismo são discutidas. Primeiro, em contraste com o marxismo determinista, uma visão humanista é apresentada, que explica o conceito de alienação em Marx. Na última parte deste livro, focalizo as versões do marxismo que represen tam um passo na direção de uma análise das estruturas económicas e polí ticas. Um dos principais argumentos deste livro é que, embora a ciência económica e a política nos possam proporcionar um entendimento do ca pitalismo, a praxis é necessária. Quer dizer, deve haver uma unidade entre a compreensão teórica e a prática política. Mas temos de enfrentar, conti- nuadamente, questões como as relações precisas entre nossa teoria e nossa prática: Como definimos, para nós mesmos, a unidade da teoria e da práti ca? Ou, em outras palavras, como resolvemos a necessidade de um entendi mento adequado, de um lado, e a necessidade de traduzir a filosofia em ação social, de outro? Esse tema reaparece còntinuamente, em formas di ferentes, neste livro. introdução 15 Um grupo de jovens sociólogos, inspirados pelo trabalho de Michael F.D. Young, questionaram a tradição positivista na Sociologia da Educação. Young foi o organizador de um livro intitulado Knowledgeand Control: New Directions for the Socio/ogy of Education ("Conhecimento e Controle: Novas Direções para a Sociologia da Educação"). Mencionarei a abordagem que estelivro exemplifica como "Novas Direções", ou como a "nova" So ciologia da Educação (em oposição à "tradicional"), compreendendo, é certo, as limitações dessa forma abreviada de referência. Em oposição a uma Sociologia da Educação positivista, o grupo acima mencionado ado tou uma posição fenomenológica. Como essa posição parte da suposição de que nada é fora de dúvida, foi útil por ter ajudado a questionar ("tornar problemáticas") noções como racionalidade, infância, educação etc., que haviam sido consideradas anteriormente como realidades objetivas. Uma das características da "nova" Sociologia da Educação é o uso que faz dos estudos antropológicos. Mostro como a Antropologia contri buiu para o exame de nossas suposições: mostrou-nos que há maneiras alternativas de ordenar não só a educação, mas a própria vida. Argumenta-se que, embora existam diferenças culturais, outras culturas não são necessa riamente deficientes. A existência de outras lógicas e racionalidades ade quadas desafia o absolutismo de nossas próprias categorias. Em nossas escolas, uma definição particular de conhecimento tornou-se reificada. Argumento que as divisões feitas entre conhecimento escolar e conheci mento não-escolar, entre o trabalho teórico e prático, mental e manual, não são naturais, mas convencionais. Essas "divisões" não são absolutas, fixas, mas produzidas pelos homens em certos períodos sócio-históricos. Acreditando, portanto, que as definições predominantes de educação são limitadas, hierárquicas e repressivas, argumentamos que se compreendermos bem que a capacidade, inteligência e outras categorias são formulações his tóricas, feitas pelo homem, então estaremos prontos a pensar em alternativas. A Antropologia e a Fenomenologia têm em comum o fato de levar a um questionamento daquilo que normalmente aceitamos sem análise e nos dar consciência de outras maneiras de fazer as coisas, e outras formas de vida. Embora as principais influências fenomenológicas fossem Schutz (e certos aspectos da obra de Merleau-Ponty), sugiro que o espírito da "nova" Sociologia, o entusiasmo que provoca e o senso de possibilidades abertas, são melhor compreendidos pelo estudo da obra de Sartre, com sua ênfase no engajamento e na ilimitada liberdade do homem. Esse questionamento das concepções dominantes da racionalidade "científica" ocidental, da educação, o currículo e a relativização do conhecimento, foi considerado como uma ameaça pelos tradicionalistas. Discuto, em seguida, o conflito entre os "novos" sociólogos da educação e os "filósofos liberais" como Peters e Hirst, cujas opiniões estão tão generalizadas. Minha explicação desse debate deve ser vista como (o início de) um estudo de caso de uma 16 marxismo e educação ideologia. Minhas críticas são dirigidas basicamente contra uma certa tradi ção (que inclui Leavis, Eliot, Bantock, Cox e outros), que propaga um con ceito elitista de cultura. Há elementos dessa tradição dentro da Sociologia, também; refiro-me aos autores que ressaltam a "transmissão cultural" e a "reprodução social" de maneira não-dialética. Há, porém, uma tradição al ternativa de educação e cultura, como Raymond Williams observou, e que procura mostrar a colocação histórica do conhecimento e seu caráter social. Argumenta-se que as opiniões dos "filósofos liberais" levaram à reificação e alienação e que isso tem implicações conservadoras. A educação não deve ser para a "domesticação", mas para a libertação. Argumento, então, que uma das principais realizações da "nova" Sociologia é ter transferido a atenção do lar para a escola. Isso leva a um capítulo em que são focalizados os estudos sobre sala de aula, no qual é comentada a literatura existente sobre o assunto. Focalizo as maneiras pelas quais os professores classificam, "rotulam" as crianças em categorias hierárquicas, e sugiro que é a escola que cria o "fracasso". Embora a posição fenomenológica tenha um enorme potencial des- mistificador, há certos problemas que negligencia. Depois de um exame de tais problemas, sugerimos que a transferência da atenção para o estudo daquilo que é chamado de "conhecimento escolar", usando uma aborda gem fenomenológica, significou que certos problemas tenderam a ser es quecidos. A posição fenomenológica radical, adotada por alguns dos‘auto- res, como Michael F.D. Young, Nell Keddie e Geoff Esland, em Knowledge and Control, é considerada como um pouco limitada. Sugere-se que o tra balho deles expressa tendências para o individualismo, o a-historicismo, para uma tese de "construção social" ingenuamente idealista e um relativis- mo cultural e epistemológico — problemas que surgem, todos, basicamente de uma posição fenomenológica. Essas limitações podem ser exemplificadas, creio, pelo argumento sobre a "privação cultural" e o debate sobre se as práticas de outras culturas representam uma deficiência ou uma diferen ça. Um estudo antropológico, como o realizado por Thomas Gladwin em East is a Big Bird: Navigadon and Logic on Puluwat Atoll ("O Leste é um Pássaro Grande: Navegação e Lógica no Atol de Puluwat"), 1970, embora útil por nos levar a questionar nossas distinções e categorias educacionais, também suscita muitos problemas. Em suma, muitas das críticas da priva ção cultural foram insuficientemente críticas quanto à sua própria moldura interpretativa (fenomenológica). O questionamento das suposições e o poder da consciência de desreificar são fatores importantes, mas que não são suficientes em si mesmos. Não podem transformar o status quo e a coerção e opressão que experimentamos. Não obstante, a nova Sociologia da Educação oferece uma crítica valiosa de uma visão exclusiva e hierárqui ca do conhecimento e ressaltou, continuadamente, a opinião de que o mundo dos alunos foi predefinido para eles. Nas seções seguintes, argu- introdução 17 mento que as contradições existentes em nossas escolas e em nossas vidas cotidianas, como a alienação que se segue das relações hierárquicas e a se paração entre a teoria e a prática, são aspectos das contradições mais pro fundas de nossa sociedade. Elas podem ser melhor compreendidas pela leitura de Marx, para aprofundar nossa análise. Embora alguns livros signi ficativos sobre a Sociologia da Educação tenham sido publicados nos últi mos anos, é evidente que na maioria deles Marx é uma figura ausente. Os poucos livros que mencionam o marxismo o fazem, em geral, de um ponto de vista muito estreito e limitado, fechando a discussão, em lugar de abri-la. Neste livro (capítulos 8 e 9) o marxismo é apresentado de maneira não in conciliável com algumas percepções da fenomenologia, que também são consideradas valiosas. Em minha tentativa de demonstrar isso, ressalto par ticularmente a influência do pensamento hegeliano e da realização de Marx na transformação desse pensamento. Há uma exposição do conceito que Marx tinha de realidade e sua filosofia das relações internas, suas opiniões sobre a dialética e sua concepção da natureza humana e do trabalho. Minha argumentação focaliza particularmente os conceitos de alienação e práxis. Minha intenção é apresentar um marxismo que evita os perigos do determi nismo e do idealismo — um marxismo libertário. Depois de delinear "a lógica geral da produção de mercadorias", argu mento que o mesmo processo ocorre no caso do conhecimento. Nas condi ções de capitalismo, a educação é conduzida sob condições tão alienantes que se constitui num processo de desumanização. Isso foi mostrado com precisão nos escritos dos "desescolarizadores", mas a sua solução — a de que cada indivíduo é responsável pela sua própria desmistificação — é idea lista, porque para superá-la é necessária não só uma forma de autocrítica teórica, mas também de ação social. As tentativas teóricas para resolver problemas como a alienação através de um ênfase fenomenológica sobre o poder da consciência apenas fracassam inevitavelmente porque o problema e sua solução envolvem uma prática social.A mudança radical tem de ma nifestar-se na praxis. A segunda parte deste livro ocupa-se, portanto, em grande parte com a perspectiva marxista e a educação. Mas, como o marxismo não é mono lítico, passo a discutir várias versões diferentes. Estas incluem as contribui ções do teórico francês Louis Althusser, e de historiadores e economistas políticos da educação, americanos, e selecionados. Esses últimos teóricos, especialmente Samuel Bowles e Herbert Gintis, argumentam que as experi ências do local de trabalho são formadas, pela primeira vez, na escola — que há ligações entre família e escola e a estrutura ocupacional. É por isso que qualquer discussão da natureza do ensino e da legitimidade persistente de seus métodos tem de levar em conta as maneiras pelas quais são influen ciados pelas estruturas económicas. Argumento, portanto, que uma compre ensão das inter-relações complexas entre a educação e a economia deve 18 marxismo e educação basear-se numa análise da natureza do trabalho e do capitalismo monopo lista no século XX. Mas nosso objetivo principal, ao estudarmos essas dife rentes versões do marxismo, ao realizarmos trabalho intelectual, não deve ser esquecido. Devemos indagar sempre: Como isso pode contribuir para que formulemos uma Sociologia da Educação que tenha sentido? Se nosso projeto é, na realidade, a libertação humana, que tipo de teorias alternativas da educação podemos construir — e colocar em prática? Esta introdução se está tornando demasiado longa. Vamos começar. Não que saibamos por onde, mas chega o momento em que temos de começar — em algum ponto. PARTE I ALGUNS ASPECTOS DA NOVA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO CAPÍTULO 1 As Injunções da Nova Abordagem Uma nova abordagem revolucionou a Sociologia da Educação. Sua principal expressão e fonte de inspiração foi o livro organizado e apresentado por Michael E.D. Young, Knowledge and Control. Seus colaboradores têm perspectivas e interesses diferentes, mas a coletânea de trabalhos, particu larmente os de Young, Esland e Keddie, expressam uma crítica da Sociolo gia da Educação tradicional. Essa "nova Sociologia da Educação" foi des crita como uma modificação fundamental dentro da própria Sociologia da Educação.1 Quais foram, então, as suas principais críticas, e o que a abor dagem alternativa nos sugere? Michael Young começa a "Introdução" com duas críticas da con cepção predominante da Sociologia da Educação: a ausência de discussão teórica e a incapacidade de questionar as suposições em que se baseia gran de parte do trabalho "convencional". O debate sério limitou-se ao "proble ma da ordem" em áreas como estratificação, desvio e política. Discussões da obra de Durkheim, Weber e Marx raramente são incluídas nos manuais tradicionais sobre a Sociologia da Educação. Por "problema da ordem" en tendo o problema de como a sociedade consegue manter-se de pé. Durkheim, Weber e Marx tinham opiniões diferentes sobre isso. A explicação tradicio nal, durkheimiana, é que os indivíduos não podem criar e manter a ordem, e que a coerção, através da internalização, é portanto necessária à existência da sociedade. Esta deve definir os significados sociais para os atores indivi duais, que são simplesmente um reflexo do sistema social. A segunda crítica é que os sociólogos do passado aceitavam os pro blemas educacionais, e que suas próprias suposições implícitas são aceitas "sem discussão". Eles levantaram questões importantes, mas não examina ram ou questionaram seus pressupostos básicos, como, por exemplo, o que era ser educado. Tratando "o que é ser educado" como uma questão não- problemática, ou sobre a qual havia acordo consensual, o trabalho deles podia ser utilizado com o objetivo de legitimar a ordem política existen te.2 Em outras palavras, não devemos aceitar sem discutir as definições da realidade da educação existentes, mas indagar que suposições implícitas 22 O fato de ser o conhecimento social construído significa que o conhecimento transmitido pela educação não é absoluto, nem arbitrário, mas que existem "séries de significados" que não "emergem", mas são dados coletivamente. 0 que é considerado como "lógico" ou "válido", baseia-se em vários modelos padronizados que são necessariamente séries de significados comuns que pas sam a ser aceitos sem discussão. As "regras" do modelo padronizado são esta belecidas e selecionadas de acordo com o objetivo do discurso, ou as intenções dos investigadores. Um dos resultados dessa posição é que os professores podem aceitar sem discussão essas "regras”, essas convenções comuns, signi ficativas, sobre o que é considerado lógico, sensato, bom raciocínio, e, em consequência, considerar a incapacidade de ajustar-se às convenções sociais dos professores como formas de desvio. Isso nada significa quanto ao "acerto" ou "erro" absoluto das afirmações dos professores ou dos alunos, mas sugere que a interação existente é em parte produto das categorias definidoras dominan tes, aceitas pelo professor. levaram à formulação de determinadas perguntas e não de outras, ou à aceitação de algumas "respostas", mas não de outras, como corretas ou válidas. No século XVIII, foram aceitos os dogmas feudais e clericais, e, no século XIX, o suposto absolutismo do mercado e de suas leis predominou sem ser questionado. Hoje, é o "científico" e o "racional" que dominam nossas vidas. Certas crenças sociais, políticas e educacionais seguem-se, ao que se supõe, da aceitação cega dessas categorias legitimadoras. Deveria, portanto, haver um questionamento crítico de tudo o que é aceito tacita mente como "coisa natural". Como não posso ter esperanças de oferecer uma exposição geral dos escritos de Michael Young, o que se segue é um resumo seletivo. Sua tese básica de 1971 talvez se possa sintetizar da seguinte maneira: os "filósofos liberais", como Richard Peters e Paul Hirst, partem de suposições a priori sobre as formas do conhecimento. Têm uma concepção absoluta que justi fica o que não são mais do que formulações sócio-históricas de uma deter minada época. A interpretação deles ignora o fato de ser o conhecimento uma seleção e organização do conhecimento disponível num determinado momento, o que envolve escolhas conscientes e inconscientes. Como os currículos sâjo, com frequência, definidos em termos das idéias que o grupo dominante tem sobre o homem educado, podemos indagar: Que modelo de homem está implícito nas visões dos "filósofos liberais"? Michael Young argumenta que não são apenas as pessoas, mas o conhecimento, o que é processado, e, se assim for, podemos fazer pergun tas sobre a seleção e organização do conhecimento. Houve, é claro, várias contribuições ao nosso estudo do conhecimento: a marxista, a weberiana, a durkheimiana, por exemplo, foram valiosas, mas até agora o currículo não foi estudado. 0 aspecto mais notável da tese de Young é a sugestão de que trata mos o conhecimento, ou o que passa por ser conhecimento, como social mente construído. Discutindo isso, ele observa:3 a nova sociologia da educação injunções da nova abordagem 23 3. 1. 2. As relações entre a estrutura do poder e os currículos. O acesso ao conhecimento, e como certas formas deste são legitimadas como superiores a outras. As relações entre o conhecimento e suas funções nos diferentes tipos de sociedade. E segue-se que devemos explorar como e por que certas categorias domi nantes persistem, e seus possíveis elos com séries de interesses e grupos ocupacionais. Devemos considerar também a influência das tradições de uma elite centralizada que tem laços íntimos com os que detêm o poder económico e político. Devemos notar, porém, que não nos referimos nem a uma teoria mecanicista-determinista nem a uma teoria grosseira da cons piração. É possível que certas teorias educacionais venham a ser aceitas pelos professores que começam a agir à base dessas suposições. Algumas delas tornam-se institucionalizadas e são em seguida usadaspara legitimar nossas práticas, que, num círculo vicioso, justificam as teorias. Uma de nossas tarefas, portanto, é examinar nossas teorias e práticas educacionais institucionalizadas e perguntar: Como é possível que os padrões acadêmicos ocidentais sejam tratados como se fossem absolutos? 0 que Michael Young propõe é um enfoque da relação entre a estra tificação social e a estratificação do conhecimento, isto é, o valor social atribuído a diferentes áreas e tipos de conhecimento, Com isso, podemos levantar questões sobre: Então, como que para nos dar um exemplo, ele formula certas perguntas sobre a organização e transmissão do conhecimento que tem um "alto status" em nossa sociedade. Observa que tal conhecimento é transmitido às crianças "mais capazes", habitualmente em grupos homogéneos, sendo em seguida avaliado formalmente. Sugere que os currículos acadêmicos, o co nhecimento de alto status, tende a ser "abstrato", a ter um elevado nível de alfabetização, uma correlação mínima com atividades não-escolares e uma ênfase sobre o desempenho individual. Essas dimensões são definições sociais do valor educacional e persistem porque são as escolhas que concor dam com os valores e crenças do grupo dominante num determinado mo mento. Mas esses valores legitimam a organização existente do conheci mento de tal modo que mesmo a discussão de alternativas em nossa socie dade é, por muitas razões, difícil. Mas ele formula a pergunta: Não pode ríamos modificar os critérios do conhecimento de alta classe, para que se tornasse concreto e não abstrato, oral e não alfabetizado, relacionado e não desligado, e comunal e não individual? Numa seção mais adiante, em que afirmo que uma das características importantes da "nova Sociologia da Educação" é seu uso dos estudos an tropológicos, procuro mostrar, pelo exame de Gladwin e de outros etnó- grafos, ser concebível a possibilidade de conceder uma igualdade destatt/s 24 2. Deve haver um continuo questionamento crítico do que é "aceito sem discussão" Essa proposição, ou antes, esse processo, não é uma característica, ou pro priedade exclusiva, de qualquer perspectiva, mas neste contexto talvez possa ser visto como parte integrante de uma abordagem fenomenológica. Essa autoconsciência crítica é hoje um dos significados de "reflexividade”. a nova sociologia da educação Algumas Proposições da "Nova Abordagem" 1. Não deve haver ausência de debate teórico na Sociologia da Educação Pode-se argumentar, de maneira convincente que a Sociologia da Educa ção foi um desenvolvimento do senso comum dos leitores (sendo essa a razão pela qual ela é, sob certos aspectos, tão atraente); até recentemente, pelo menos, era considerada como uma disciplina parasitária. Mas como a distinção entre Sociologia e Sociologia da Educação está desaparecendo, é possível dizer, hoje, que a Sociologia da Educação se vale da disciplina "mãe". Na minha opinião, a importância da Sociologia da Educação, em termos de sua contribuição geral e de suas percepções, está aumentando. Os limites entre a teoria sociológica, a Sociologia do Conhecimento e a So ciologia da Educação se estão tornando cada vez mais indistintos. Há uma consciência crescente de que a separação entre o "puro" (teoria sociológica) e o "aplicado" (Sociologia da Educação) é improdutiva. a outras séries de escolhas culturais. Isso é possível por ser a "educação” — o que é "esquecido” com frequência — uma formulação social. Haveria, é claro, modificações em rótulos como "êxito” e "fracasso”, mas se muitos, e não apenas uns poucos, tivessem êxito, isso implicaria uma redistribuição paralela das recompensas em termos de riqueza, prestígio e poder. Em suma, é essa a tese de Michael Young. Até agora, não houve es tudo sociológico do currículo, do conhecimento escolar. Ele propõe que aceitemos a noção dos currículos e formas de avaliação como formu lações sociais, que "conhecimento" e educação são invenções, tal como as outras invenções do homem. Delineia, em seguida, o início do projeto e argumenta que devemos adotar uma nova abordagem e examinar alterna tivas para uma finalidade política radical. O que dissemos acima é um esboço muito esquemático das primeiras seis páginas apenas da Introdução ao Knowledge and Control, mas até mesmo a partir de um trecho tão pequeno é possível apresentar algumas características importantes da reorientação, em Sociologia da Educação, na forma de várias proposições interligadas. Vamos passar agora a essas "injunções”, muitas das quais se tornaram pressupostos para a maior parte daqueles que apoiam a "nova" Sociologia da Educação. injunções da nova abordagem 25 3. Devia haver um movimento no sentido de se tratar o conhecimento, ou o que é considerado como conhecimento, como socialmente formulado, e um estude das implicações que disso se seguem Pode-se dizer que essa injunção contém as seguintes suposições coinciden tes, que são implícitas: uma rejeição do positivismo e da epistemologia objetivista, e a adoção da noção de que a realidade é socialmente construí da. A tese de que o conhecimento é socialmente construído é parte de uma tese mais ampla de que a realidade é uma construção social. Essa opinião se baseia na noção de que não é a estrutura ontológica dos objetos, mas o significado de nossas experiências, que constitui a realidade.5 Isso significa que não há significado inerente, intrínseco, nos objetos, como se fossem "fatos” evidentes para todos. Até mesmo os chamados "fatos” têm de ser interpretados, e nesse processo damos significado a objetos, situações e experiências. O aborto de uma criança pode ser uma ocasião feliz para certas mães, e uma perda lamentável para outras, dependendo da maneira pela qual prefiram ver a situação, e como a explicam, ou lhe dão sentido, para si mesmas. Quer dizer, a realidade do mundo social é formulada pelos seus membros em termos de seus procedimentos justificativos para a sua explicação. A fenomenologia é uma tradição e um movimento filosófico com uma íntima ligação com muitas áreas do discurso, e está lentamente influ enciando a Sociologia. Husserl e Schutz, por exemplo, acreditavam que o ato de filosofar devia começar por não se aceitar nada sem exame. Em nossa experiência cotidiana não levantamos normalmente questões funda mentais: elas ficam sem exame. Nossa consciência está enterrada em nossa preocupação pelo mundo natural, cotidiano, e vivemos na "atitude natural”. Os fenomenologistas dizem que devemos primeiro suspender essa atitude natural. A isso dá-se o nome de "redução" fenomenológica, ou epoché, o que já foi comparado à remoção sucessiva de camadas de suposições antes aceitas sem exame, para se ver o que restaria, o que seria apresentado ou construído como essencial, pelo pensamento. Somos convidados, então, a considerar como problemáticas noções como "científico”, "racional”, "infância", "o aluno" — e "educação”.4 A maior parte do trabalho empreendido nessas áreas partiu de suposições apriorísticas, de natureza limitadora e restritiva. E por essa razão que a "nova abordagem" utiliza o trabalho dos antropólogos. Pelo exame de outras culturas, e em seguida da nossa própria cultura, certos aspectos desta última, que sempre consideramos como "naturais", surgem a uma nova luz, como antropologicamente estranhos. A Antropologia contribui para o exame de nossas suposições e mostra-nos que há concepções alter nativas da ordenação do mundo. 26 a nova sociologia da educação Se a realidade social for concebida dessa maneira, como constituída socialmente, e não "lá fora", existindo sem problemas, como ocorre em certas versões da teoria de correspondência, ou verdade, então uma crítica da Sociologia tradicional, com sua ênfase no método científico e na men- suração, é inevitável. Uma das melhores contribuições da fenomenologia para nossa compreensão do mundo social é sua crítica do positivismo, e isso tem influenciado certos autores para que rejeitemquaisquer teorias do conhecimento baseadas numa epistemologia "objetivista" que tratem o conhecimento como se fosse fixo, e não relativo. Muitos professores acham, por exemplo, que Paul Hirst afirma (e age na sala de aula segundo essa suposição) que o conhecimento não é relativo e sim fixo, que certos tipos de conhecimento, "as formas", são intrinsecamente superiores a outros, "os campos". Já se argumentou que essa visão do conhecimento, implican do um aprendiz passivo, é fundamentalmente conservadora e elitista. Ela institucionaliza as práticas atuais, as legitima. E, o que é mais importante, essas visões do conhecimento podem ser consideradas como uma ideologia que serve aos interesses daqueles que desejam resistir à mudança educacio nal e, portanto, política. O que os autores simpáticos à nova abordagem na Sociologia da Educação estão pretendendo é que não consideremos neces sariamente os currículos acadêmicos como superiores; que se considerar mos o conhecimento, ou o que passa como conhecimento, como social mente formulado, poderemos reconhecer esses currículos acadêmicos como formulações humanas, que limitam o acesso a uns poucos privilegia dos — e que isso não precisa ser assim. A rejeição do positivismo e do objetivismo, implícita na adoção de uma perspectiva fenomenológica, significou que houve uma nova ênfase naquilo que poderíamos chamar, para nossas finalidades presentes, de "modelo do homem" fenomenológico. Uma das características mais im portantes desse modelo é a noção de intencionalidade, usada para distin guir a "ação" humana do "comportamento" humano. Os fenomenologistas sustentam que todas as atividades mentais são sempre dirigidas para algum objeto. Em suma, as intenções determinam a relevância e ordenam o pen samento. O que se ressalta são os próprios processos de ordenação mental do indivíduo - que o homem é um criador de significados. Alguns sociólo gos se entusiasmaram por essa maneira de ver o mundo e deram ênfase à Sociologia Fenomenológica como método de transcender as realidades experimentadas da vida, dia a dia. Se a realidade é construída por nossa consciência, por nossas mentes, então temos liberdade, apesar das condi ções materiais que nos podem oprimir; preferindo vê-las de modo diferen te, temos uma maneira de alcançar a liberdade. Essas opiniões, habitual mente implícitas, são baseadas num modelo fenomenológico do homem e acredito que podem ser explicadas mais claramente por um resumo da obra de Sartre, que dá ênfase à noção de que o homem é livre, que pode esco- injunçoes da nova abordagem 27 5. Deve haver um estudo de como e por que certas categorias definidoras persistem, de como e por que os padrões acadêmicos ocidentais são tratados como absolutos Como alguns sociólogos da educação usaram argumentos relativistas pro venientes de fontes diferentes, como a Fenomenologia e a Antropologia, para criticar noções estreitas e fixas do conhecimento e educação, e para 4. Deve haver uma movimentação no sentido de se aceitarem as categorias e explicações dos membros como maneiras válidas de dar sentido e significado Essa injunção metodológica está em acentuado contraste com a aborda gem tradicional, que se valia quase que exclusivamente das categorias do observador e dos significados por ele deduzidos; além disso, o observador era apresentado como dotado das características de neutralidade de valores de um cientista natural. É em parte por essa razão que são tão poucas as descrições, na literatura, de como os pacientes veem o pessoal médico e psiquiátrico, de como os "marginais" vêem a polícia, ou de como alunos e professores sentem, pensam e agem. A aceitação da exposição dos mem bros não é, evidentemente, apenas uma característica do método fenome- nológico, sendo adotada também, como iremos ver, por muitos antropólo gos e etnólogos também. Charles Frake é um exemplo de etnógrafo que usa os relatos dos nativos, e dá a isso o nome de "método explícito". Essas preocupações levaram ao interesse pelos diferentes tipos de pes quisa. Os estudos interacionais de alunos e professores ganharam impulso com essa abordagem; grande parte da pesquisa focaliza a sua experiência de sala de aula, o aprendizado e ensino de uma matéria escolar, o signifi cado do currículo para os participantes, ou a significação do conhecimento escolar. Além desse tipo de pesquisa, houve também um desenvolvimento dos estudos históricos que tratam das origens, crescimento e institucionali zação das diferentes matérias, como Matemática, Ciência, História ou Mú sica. A luta pelas diferentes definições do conhecimento escolar tornou esse tipo de pesquisa pertinente ao nosso entendimento das concepções concorrentes de conhecimento. Iher, transcender a opressão.6 Essa exposição será feita na seção seguinte, mas é relevante, para seu objetivo presente, observar aqui que os pressupos tos de um "modelo do homem" fenomenológico estão ligados a uma visão do conhecimento, através de noções como a intencionalidade e o signifi cado. Ocorre, assim, que a nova abordagem sugere ser o conhecimento par tilhado ou comum; que a verdade e a objetividade são produtos humanos e que o conhecimento está inseparavelmente ligado aos métodos de conheci mento. O homem é o autor do conhecimento e da realidade. 28 a nova sociologia da educação sugerir outras possibilidades, versões alternativas do mundo, acreditou-se que estavam dizendo, implicitamente, que todas as racionalidades ou mo dos de examinar o mundo são igualmente aceitáveis; que todas as proposi ções são do mesmo valor. Foi, creio eu, um mal-entendido em relação à posição dos autores que, embora usassem a abordagem fenomenológica, es tavam também politicamente comprometidos com a modificação das con cepções hierárquicas predominantes de "conhecimento", "capacidade" e, portanto, "êxito". Tinham, portanto, "razões" e justificações, valores e critérios, mas não os explicitaram. Além disso, devemos admitir que houve também ambiguidades sobre os métodos práticos a serem usados no questionamento e modificação desses aspectos do conhecimento escolar, como padrões acadêmicos, que são tratados como absolutos. Esta seção delineou rapidamente o que considero como algumas das principais proposições, ou, melhor, "injunções", das "novas direções" na Sociologia da Educação. O argumento que desenvolverei é que essa nova abordagem foi uma reação contra a Sociologia da Educação "tradicional", que predominava na época. A nova Sociologia da Educação rejeitou a abor dagem tradicional, que se preocupava com assuntos como "mobilidade social e educação", "a família e a realização educacional", "a escola como organização formal". Hostil para com o positivismo, a nova abordagem rejeitou a metodo logia empirista com sua ênfase na matéria bruta, estatísticas, mensuração numérica. O positivismo, falando de modo geral, implica uma aceitação das categorias do cientista, ou do observador, como válidas; em consequência, isso tem implicado com frequência uma imposição de significado pelo cientista (supostamente neutro, isento em relação a valores) — uma forma de dominação cognitiva pelo "especialista" em relação ao ator. Parece-me que a indignação moral foi, sem dúvida, um elemento na rejeição do posi tivismo. Os novos sociólogos da educação adotaram a visão "interpretativa" da ciência social, que encerra muitos caminhos diferentes, dos quais um dos mais influentes é a fenomenologia social. Essa perspectiva rejeita a crença de que o observador científico está automaticamente certo, e afir ma o valor do ponto de vista do ator. É assim (em parte) um corretivo moral do positivismo porque respeita as opiniões que os atores têm de seu contexto, de sua "racionalidade", da maneira pela qual "veem" o mundo e experimentam suas situações de vida. Na tentativa de desafiar as interpre tações aceitas da educação, os autores da nova Sociologia da Educação usaram a Antropologia como uma arma. Em particular,os estudos etno gráficos foram empregados para exemplificar seu ponto de vista. Eles que riam questionar o que é habitualmente admitido sem discussão, sugerir que aquilo que frequentemente se tomava como "natural" era na realidade "convencional", e que havia outras maneiras de organizar nosso aprendiza do, outras possibilidades de viver nossas vidas juntos. injunções da nova abordagem 29 Pode-se notar que certos temas reaparecem continuamente. Selecio nei alguns deles, que considero como características importantes dessa adordagem. Nos quatro capítulos que se seguem apresentarei uma discussão do uso dos estudos antropológicos, a adoção de um modelo antropológico do homem (que envolve o repúdio do positivismo), a rejeição da Filosofia da Educação liberal e a afirmação da importância dos estudos de sala de aula e do currículo. Vamos, agora, ocupar-nos do primeiro desses temas, uma discussão de como o trabalho dos antropólogos e etnógrafos contri buiu para a nossa compreensão da educação. capitulo 2 O Uso de Estudos Antropológicos Além da rejeição da "cultura do positivismo", uma característica impor tante da nova Sociologia da Educação é o uso e interesse crescentes pelo trabalho de certos antropólogos, particularmente os etnógrafos. (Os etnó grafos recolhem dados pela observação e trabalho de campo, e não são necessariamente antropólogos.) Vamos começar com uma apresentação dos pressupostos não-examinados dos antropólogos do século XIX e de certos educadores do século XX, notando-se entre eles um certo paralelis mo. Algumas das notáveis contribuições metodológicas da nova Etnografia são discutidas aqui, em particular o trabalho de Gladwin. Para formular a pergunta: "Como compreendemos a Lógica?", examinaremos alguns trabalhos de Conklin e Frake. Isso nos leva inevitavelmente à questão de como compreendemos uma outra cultura. A seção conclui com um retor no ao tópico inicial: um exame da contribuição da exposição dos etnó grafos ao nosso entendimento do aprendizado de uma criança. Argumenta mos que é em parte através dessa nova tendência que estamos adquirindo consciência de que, embora existam diferenças culturais no pensamento, outras culturas não são necessariamente deficientes. De fato, a existência de outras lógicas e racionalidades adequadas desafia o caráter absoluto de nossa própria cultura. Vamos examinar agora algumas das questões levan tadas pelo material antropológico. Pretendo argumentar neste capítulo, portanto, que podemos identi ficar semelhanças entre as suposições de muitos antropólogos do século XIX e os pressupostos de muitos educadores do século XX. No decorrer da discussão, tentarei também examinar a questão: Que contribuição as exposições dos etnógrafos sobre as culturas não-ocidentais fizeram para o nosso entendimento da "privação cultural"? Vamos examinar primeiro algumas das suposições dos antropólogos do século XIX: os cientistas sociais pós-darwinianos acreditavam que a so ciedade evoluía num contínuo, a partir da sociedade primitiva para a socie dade civilizada — como os estados tecnológicos da Europa ocidental. Isso se relacionava com sua opinião de que os jovens das espécies recapitulam a história dessa espécie. Também se afirmava que o adulto primitivo era uso de estudos antropológicos 31 equivalente à criança civilizada. Lévy-Bruhl chamou de "pré-lógica" a men talidade primitiva: "as representações coletivas do europeu são exclusiva mente intelectuais e distintas dos elementos emocionais, e na pessoa primi tiva essas crenças básicas se fundem com os componentes emocionais". A cultura primitiva, portanto, implicava um pensamento primitivo, era místi ca e pré-lógica. A opinião predominante era que as diferenças observadas no pensamento eram interpretadas como reflexo das diferentes capacida des. Boas esteve entre os primeiros a rejeitar essa idéia — de que diferenças em cultura implicam diferenças de pensamento — e argumentou que obser vadores anteriores não haviam compreendido o povo que descreviam; tomaram, erroneamente, sua própria falta de compreensão como prova de estupidez de seus informantes. Ora, sob certos aspectos, as suposições de muitos educadores con temporâneos em relação às crianças da classe operária são muito semelhan tes. Essa opinião se origina, em parte, da maneira pela qual "o problema", com iodas as suas consequências, foi conceptualizado: Por que as crianças dos grupos mais pobres de nossa sociedade não têm na escola o desempe nho que deveriam ter? A principal suposição relaciona-se com o conheci mento escolar; as crianças da classe operária, como os "primitivos", não teriam os instrumentos conceptuais para compreender as formas de conhe cimento que resultaram historicamente no conhecimento escolar. Maxine Greene escreveu sobre a reificação do conhecimento que ocorre então; essa opinião do conhecimento considera o currículo como "uma estrutura do conhecimento recomendado socialmente, externo ao conhecedor, e para ser dominado, aprendido". Uma consequência desse tratamento do conhe cimento como uma "facticidade" é que a noção do aprendiz como uma pessoa existente, interessada principalmente em encontrar um sentido para seu "mundo de vida", é ignorada. Minha opinião é que essa interpretação da educação equivale ao etnocentrismo dos antropólogos antigos. Assim como se levavam os nativos a ter vergonha de seu mundo, sendo prescrito um novo modo de ver o mundo pelo antropólogo ocidental, assim também as crianças são submetidas a formas reificadas de conhecimento, que pro duzem uma visão mecanicista e determinista da realidade social. Predomina em nossa sociedade, em especial, uma teoria da capa cidade que afirma que alguns grupos ou indivíduos desenvolvem capaci dades intelectuais melhores, mais generalizadas, do que outros. Isso se pode ver no trabalho de muitos psicólogos educacionais que dão ênfase às medidas de capacidade, como "Ql", à base da suposição de que uma deter minada tarefa evocará o mesmo tipo de comportamento, a despeito de quem desempenha a tarefa. O desenvolvimento cognitivo é visto, assim, como a aquisição de estruturas de uma ordem superior mais elevada. Uma aplicação popular desse princípio é a atual abordagem da criança "cultural- 32 a nova sociologia da educaçao mente carente", que é vista como um nativo primitivo, sem instrumentos conceituais. Ao grande progresso feito pelos antropólogos, os etnógrafos e os antropólogos linguistas fizeram uma considerável contribuição. Ressalta ram dois pontos importantes: primeiro, sustentaram que a descrição etno gráfica deve estar de acordo com os princípios de classificação dos povos estudados. Segundo, que as diferenças culturais em processos de pensa mento são redutíveis a diferenças de classificação.1 Embora se tenham realizado muitos trabalhos sobre diferentes cultu ras, pouco se fez sobre os processos lógicos, isto é, as estratégias cognitivas usadas para solucionar problemas. Por que os pobres tendem a sair-se mal na escola e nos testes de inteligência? Sugere-se que a pesquisa existente ressalta contrastes com o pensamento de classe média — quantifica diver gências a partir da cultura da classe média, e aceita as qualidades a serem medidas como dadas. Todo esse trabalho é, porém, em grande parte psico lógico e nada nos diz sobre os processos de raciocínio. A cognição não é apenas um fator psicológico, é também um processo que sofre influência cultural. Uma das razões pelas quais alguns sociólogos da educação estão com preendendo, cada vez mais, a importância das exposições dos etnógrafos é que muitos deles demonstram que, embora existam diferenças culturais no pensamento, outras culturas não são necessariamente deficientes.2 De tato, a existência de outras lógicas e racionalidades adequadas questiona o cará ter absolutista de nossas próprias lógicas e racionalidades. Sua obra apóia a afirmação de C. Wright Mills de que existem lógicas diferentes, socialmenteconstruídas e socialmente situadas entre o grupo para o qual são os modos lógicos de pensar e agir. Em nossa cultura, muitas pessoas supõem que a Lógica formal é absoluta, que somente através das "formas de conheci mento" pode haver o desenvolvimento da racionalidade e da mente. Mas sabemos que a definição do conhecimento varia nas diferentes culturas; que ele é feito pelo homem; e que se em nossas escolas ele se tor nou não só institucionalizado e objetificado, mas também reificado e alie- nante, sabemos que as divisões que fizemos entre conhecimento escolar e não-escolar, intelectual e manual, teórico e prático, liberal e vocacional, não são necessárias e podem ser modificadas. Parece-me que, quanto maior a compreensão de que nossas noções de, digamos, "capacidade", "inteli gência", "professor", "aluno", são formulações históricas feitas pelo ho mem, mais prontamente seremos capazes de imaginar alternativas se as de finições predominantes nos parecerem estreitas, limitadoras, hierárquicas e, portanto, coercivas. Mas como o nosso entendimento de aprendizado nas escolas foi en riquecido pelas exposições dos etnógrafos? Acredito que eles fizeram as seguintes contribuições: primeiro, mantêm que as categorias não devem ser uso de estudos antropológicos 33 impostas. 0 etnógrafo não procura impor suas opiniões e categorias de experiência sobre os fenômenos que estuda. Essa opinião é partilhada pelos sociólogos fenomenologistas, que sustentam ser necessário assumir o papel de ator, ver o mundo do seu ponto de observação. Em muitos aspectos da educação, porém, a imposição ainda ocorre, os valores de "classe média" são considerados como a "corrente principal" e impostos a outros pela seleção, "ritmo" e avaliação do conhecimento escolar. Argumenta-se en tão que o desenvolvimento cognitivo dos grupos mais pobres é embotado, ou, como diria Arthur Jensen, são deficientes em aprendizado conceptual Tipo 2. Segundo, os etnógrafos sustentam que a cognição está relacionada com o contexto cultural. Ressaltam que o conhecimento não pode ser es tudado como atividade isolada de seu contexto cultural. Estudar a cogni ção é estudar o comportamento cognitivo numa determinada situação, e a relação desse comportamento com outros aspectos da cultura. Mais uma vez, essa interpretação é semelhante às opiniões daqueles que adotaram o chamado "paradigma interpretativo", alguns dos quais influenciados pela teorização fenomenológica. Ressaltam também que as ações são sempre dependentes de seu contexto situacional. Não só as ações, mas as palavras, a própria linguagem, e os significados, deveriam ser sempre estudados em relação ao seu contexto. (Isso é um significado de indexalidade.) Quer di zer, as ações devem ser vistas em termos do significado do contexto, e o contexto por sua vez deve ser entendido como aquilo que é através das mesmas ações. Não obstante, se assim é, por que no contexto educacional o aprendizado nas escolas ainda é considerado, com frequência, como uma atividade isolada da cultura doméstica? Por que a experiência de vida que a criança leva para a escola ainda não é reconhecida? O aprendizado de qual quer lógica é uma atividade altamente situada, que não pode ser tratada como se estivesse livre do contexto, para que se torne parte do mundo de vida do aprendiz. Terceiro, os etnógrafos afirmam que as pessoas sabem fazer bem o que é importante para elas. Mostraram-nos que os tipos de tarefas que as sociedades atribuem aos seus membros são diferentes. Segue-se que as pes soas saberão fazer bem as coisas que são importantes para elas e que têm oportunidade de fazer com frequência. Assim, os Kpelle, da Nigéria, são peritos nos cálculos relacionados com o arroz, os Subanun das Filipinas no diagnóstico de enfermidades e os ilhéus de Puluwat, no Pacífico, na na vegação. Quero focalizar agora um desses exemplos, o dos ilhéus de Puluwat, e em particular a contribuição de Thomas Gladwin para o debate educacio nal. East is a Big Bird é um estudo daqueles ilhéus, que vivem num pequeno atol na Micronésia.3 Ele descreve os princípios incorporados à forma de suas canoas e as surpreendentes habilidades navegacionais que eles apren- 34 a nova sociologia da educação dem pela tradição oral. Cada viagem é planejada com antecipação e depen de de um corpo específico de conhecimento, que é prático e útil. Ignoran do os navios de passageiros á sua disposição, eles pilotam suas canoas sem uma bússola, através de milhares de milhas, em pleno oceano Pacífico. Sua navegação depende de aspectos do mar e do céu, baseando-se num sistema de lógica tão complexo que os ocidentais não o podem reproduzir sem o uso de instrumentos avançados. Assim, o que é aprendido como "prático" em Puluwat, seria considerado como altamente "teórico","abstrato", num de nossos colégios navais. Ironicamente, quando um navegador de Puluwat é submetido a um de nossos "testes de inteligência", seu índice de realiza ção mental parece baixo! Tais testes são em grande parte inadequados por que violam os princípios que delineamos antes: que as pategorias não devem ser impostas, a cognição se relaciona com o contexto cultural, e a apreciação do fato de que as pessoas fazem bem o que é importante para elas. Gladwin argumenta que os testes são, pelas mesmas razões, igualmen te inadequados para os pobres, em nossa sociedade; assim como diferentes sociedades têm diferentes estilos de pensar, a diferença em cognição entre as crianças de classe média e as de classe operária, em nossas escolas, pode estar no estilo de reflexão, nas estratégias. Comenta, então, a possibilidade de que estabeleçamos uma falsa dicotomia em nossas escolas entre o pensa mento abstrato e o concreto. 0 abstrato e o concreto podem coexistir inti- mamente na mente prática do navegador e, digamos, de um motorista de táxi urbano. Portanto, não precisamos associar sempre o pensamento de classe média com a "abstração", e o pensamento de classe inferior com a "concretitude". Devemos lembrar-nos aqui, talvez, que Robin Horton tam bém lançou dúvida sobre a maioria das dicotomias gastas: orientado causal- mente/orientado supranaturalmente, racional/místico, etc. Gladwin nos lembra, além disso, que pensamento "abstrato" nem sempre deve ser rela cionado com pensamento inovador. A navegação em Puluwat encerra abs trações de alta ordem, mas dentro do sistema ali existente não há muita margem nem necessidade de inovação. Nas sociedades modernas, o pen samento abstrato e a solução inovadora de problemas estão ligados a uma inteligência superior. Todas essas três qualidades são, com frequência, atribuídas à "inteligência de classe média" e acredita-se que sejam defi cientes no estilo "concreto" de pensar das pessoas de classe inferior, dota das de educação precária. A navegação em Puluwat, embora inteligente e "abstrata", não é inovadora. Para muitas pessoas não há necessidade de inovações, mas isso não significa que elas não possam inovar, mas simples mente que têm pouca prática no uso de heurística, recursos experimentais para resolver problemas novos. A opinião de Gladwin é que, para obter quali ficações, para sair-se bem na escola, pura fazer os testes de inteligência, é necessário usar a heurística, e podemos estar sendo injustos para com as crianças pobres que não véem a necessidade de heurística e ainda assim são uso de estudos antropológicos 35 capazes de pensamento "abstrato"(se temos de usar essa palavra). Para mim, a contribuição mais valiosa da obra de Gladwin é levantar questões fundamentais, como: Que é abstrato, que é teoria? Isso questiona certos modos de pensar, a "racionalidade universalista" e sugere que noções como "abstrato" são problemáticas. Não existe um tipo universalista de pensa mento, ou de lógica; eles não são absolutos, mas situacionalmente específi cos. Isso é argumentar, como mostra a obra de Robin Horton,4 Michael Cole e Thomas Gladwin, que aquilo que é considerado como"abstrato" está culturalmente situado. Não se nega tratar-se de uma visão "relativista" do conhecimento — mas não é uma forma de relativismo na qual "tudo é válido". Essa suposição relativista fundamenta-se num interesse teórico: a opinião de que o conhecimento não deve ser considerado como um corpo de conhecimentos, mas como uma atividade humana. 0 conhecimento não é absoluto e "dado", mas é relativo e "produzido" pelos homens. A nova Sociologia da Educação é uma crítica fundamental de qualquer visão hierárquica e exclusiva do conhecimento. Se os modos de pensar e a Lógica são situacionalmente específicos, como prrcurei argumentar aqui, surge então a pergunta: Como as com preendemos, essas "lógicas"? Para esclarecer esse problema vou referir-me, primeiro, a um estudo de campo por Conklin, e em seguida a outro, de Fra- ke.5 A cor, no sentido técnico ocidental, não é um conceito universal e em muitas línguas não há um equivalente terminológico unitário. Em seu trabalho de campo nas Filipinas, estudando o sistema de cores dos Hanu- noo, Harold Conklin descobriu muitas incoerências; mas depois de algum tempo compreendeu que a complexidade evidente do sistema podia ser reduzida, no nível mais generalizado, a quatro termos básicos: luz/escuri- dão, umidade/secura. Não conseguira distinguir com precisão, a princípio, entre recepção sensória, de um lado, e categorização perceptiva, do outro. Assim, constatou que a aparente confusão de cores resultava de seu pró prio conhecimento inadequado da estrutura interna do sistema de cores. Os antropólogos têm de aprender, além dessas estruturas internas, não só um vocabulário substantivo, mas também suas "regras de uso", que surgem de um contexto social e não podem ser separadas dele. De um tra balho como "O Diagnóstico de Doenças entre os Subanun de Mindanau" podemos ver como Charles Frake teve de lutar com problemas semelhan tes aos das crianças que tentam aprender o conhecimento escolar. Frake constatou que não poderia realizar seu trabalho de campo sem primeiro descobrir as regras e esquemas de conhecimento usados pelos membros da comunidade, para perceber, classificar e explicar a realidade social. Como poderia conhecer as regras de interpretação usadas pelos nativos? A discus são da enfermidade é uma questão muito importante para os Subanun, e por isso Frake focaliza o problema de como os nativos realizam trabalho de classificação do diagnóstico de doença. Ele sugere três métodos que me 36 a nova sociologia da educação parecem importantes em qualquer estudo que procure tentar identificar um padrão subjacente atrás de uma série de aparências: o analítico, o per- ceptivo e o explícito. O método analítico utiliza os meios de codificação do estranho. Na prática, isso significa o método de categorização do observador, seu diag nóstico de uma enfermidade em termos ocidentais, e em seguida a sua comparação com o diagnóstico dos nativos. Esse método, porém, não é útil, porque as concepções ocidentais são demasiado diferentes para per mitir qualquer comparação significativa. Segundo, há o método perceptivo; isso ocorre quando uma doença recebe um nome de um nativo e o observa dor procura registrar os sintomas físicos que o nativo está percebendo. A dificuldade desse método é que não sabemos exatamente o que o nativo percebe e por isso existe possibilidade de erros. Terceiro, há o método ex plícito, que compreende as perguntas ao nativo. Verifica-se que os infor mantes raramente discordam quanto ao termo em si, mas não obstante houve um desacordo frequente sobre sua aplicação a um caso particular. É uma das desvantagens desse método, porque dá o conhecimento do signifi cado dos termos "em princípio", mas não de sua aplicação em situações socialmente definidas. Em outras palavras, não basta conhecer uma regra abstrata: temos de saber "a regra em uso", quando e como ela se aplica num determinado contexto ou numa determinada ocasião. Não obstante, a vantagem desse método é que existe uma confirmação intrínseca: quando os nativos concordam quanto a um diagnóstico, o observador pode aceitá- lo como certo. 0 uso desse método significa que as proposições de um ob servador podem ser exatas na medida em que suas descrições dos costumes nativos permitem a um estrangeiro passar, entre eles, como se fosse nativo. Isso foi dito por Goodenough da seguinte maneira: "Conhecer uma cultura é ter aprendido tudo o que há para saber ou acreditar, a fim de agir de uma maneira aceitável aos seus membros e fazê-lo em qualquer papel que eles aceitem para si mesmos."6 Um dos temas frequentes deste livro vem sendo o de que o "conhe cimento" é aceito sem análise, é visto consensualmente e como se fosse objetivo, "lá fora"e não-situado ou livre de contexto. Não houve muita pesquisa sobre a experiência da alienação e outras consequências dessa opinião, mas o trabalho de alguns antropólogos estimulou, sem-dúvida, os sociólogos da educação a levantar questões que com frequência não reco nhecemos antes. 0 trabalho de Frake, por exemplo, pode ajudar-nos a lembrar de certos problemas sobre o aprendizado nas escolas: as crianças que tentam aprender o conhecimento escolar enfrentam as mesmas difi culdades e problemas dos antropólogos que tentam compreender uma cul tura diferente. Mas como o conhecimento escolar é posto à disposição das crianças? Como esperamos que as crianças cumpram a tarefa de conhecer as regras do conhecimento em uso? 37uso de estudos antropológicos Os etnógrafos levantaram outras questões importantes e até mesmo mais amplas. O problema de como chegamos a entender as "lógicas" foi mencionado antes, mas isso faz parte da questão básica: Como consegui mos "conhecer" outra cultura? Como compreendemos outra cultura? A esta altura, desejo falar rapidamente de algumas questões suscita das pelas opiniões de Peter Winch, em The Idea of a Social Science'1 ("A Idéia de uma Ciência Social"). Fomos advertidos por ele do perigo de come ter erros de categoria. (Isso ocorre com frequência em consequência daquilo que Frake chama de método analítico.) Concisamente, seu argumento é que há diferentes domínios de discurso, e que cada domínio (ou cultura) tem sua própria lógica e senso de coerência, e deve ser compreendido a partir de suas próprias convenções, seus próprios critérios de racionalidade. Se não fizermos isso, cometeremos erros de categoria. Embora eu concorde com Winch em que as ações devem ser necessariamente identificadas com os conceitos dos atores, discordo de sua opinião de que as culturas não são comparáveis. A essência do argumento de Winch, e a razão pela qual foi incluído nesta análise, é que o uso do material etnográfico em relação à nossa própria cultura, com o objetivo de levantar questões sobre alternati vas na educação (como sugerimos), seria considerado como inválido. Devemos observar, porém, que, segundo o argumento de Winch, a Sociologia estaria culturalmente limitada — seria impossível a um primitivo compreender afirmações sobre sociedades civilizadas, e igualmente impos sível ao homem civilizado compreender afirmações sobre as sociedades pri mitivas. Não há espaço, aqui, para essa controvérsia, e aconselhamos o leitor a consultar as referências, mas talvez pudéssemos dizer que Winch nos está simplesmente mostrando que certos antropólogos fizeram mal o seu trabalho. Se Winch está errado e se podemos utilizar as contribuições dos etnógrafos, teremos então outro problema. Então, os sociólogos da educação nos devem informar quais os critérios de lógica e racionalidade pelos quais escolhem uma etnografia, e não outra, e nos dizer que uso se pode dar a esse material. Em outras palavras, se pretendermos que os estudos etnográficos nos oferecem motivos (boas razões) para o relativis- mo, se todo o conhecimento está relacionado com o contexto de sua pro dução, então os relativistas não podem pretender ser superiores àqueles que sustentam opiniões "absolutistas".Os relativistas são, dessa forma, colhidos em sua própria armadilha. Não podem fazer julgamentos de valor. E, se tais julgamentos não podem ser feitos, esse ponto de vista não pode ter relevância para a ação política emancipatória. O problema é o seguinte: depois de ter rejeitado a "cultura do positivismo", os novos sociólogos da educação não podem pretender basear suas exposições num mundo social objetivamente encontrável — pois esse mundo seria uma criação de seu mé todo. Qual é, então, a justificativa para a sua teorização e como baseiam suas descrições? Quais são "os auspícios" de sua teorização e por que a sua 38 a nova sociologia da educação investigação é melhor ou mais adequada? Algumas dessas questões serão retomadas em seções posteriores, quando se argumentará que muitas des crições de autores influenciados pela nova orientação da Sociologia da Educação baseiam-se num interesse particular, num igualitarismo político. Em conclusão, sugeri neste capítulo algumas das razões pelas quais a "nova” Sociologia da Educação utilizou os estudos antropológicos e etno gráficos. Foi, é claro, uma maneira de questionar as nossas suposições, nos sos modos de pensar habituais e de aceitar as "normas” educacionais exis tentes. Mas foi um pouco mais do que isso: foi uma maneira de intervir no debate sobre a deficiência/diferença, foi um ato moral baseado no reconhe cimento de que algumas culturas são oprimidas — como o termo habitual para esse tópico mostra e, não obstante, ao mesmo tempo disfarça: pri vação cultural. Inevitavelmente as etnografias de diferentes culturas sus citaram questões sobre a natureza da pesquisa e racionalidade, isto é, como nós, qualquer um de nós, fazemos sentido para outras pessoas, e o que pen samos daqueles que têm uma forma de vida diferente da nossa? Também mencionei a questão do relativismo, problema para alguns e solução para outros — mas voltarei a ele em capítulos posteriores. Não obstante, uma contribuição valiosa das exposições dos etnógra- fos está, ao que me parece, no fato de que, ao estudar como compreende mos outra cultura, somos forçados a tentar compreender como nossos filhos entendem o conhecimento escolar. Ao reconhecer isso, somos levados a outras questões: em que proporções o conhecimento escolar transmitido aos alunos continua objetificado e externo? Em que proporções determina, para eles, um modo de ver o mundo? E, se o mundo é predefinido como um assunto centralizado, hierárquico e elitista, podemos dizer que o co nhecimento escolar é uma característica da alienação do Homem. Sabemos que o entendimento de uma cultura é muito difícil, mas so mente agora estamos compreendendo que sabemos muito pouco sobre os processos de aprendizagem dos estrangeiros nas escolas. Pouco se sabe como as crianças dão significado à sua experiência educacional, como elas adaptam, interpretam e lhe dão sentido. O fato de que as crianças possam fazer isto, e não aquilo, é a expressão de uma certa interpretação e eu gos taria de argumentar que muitas declarações como esta, na "nova Sociologia da Educação”, indicam um "modelo do homem" fenomenológico. Para muitos, a adoção desse modelo, em contraste com o modelo positivista e determinista, foi uma experiência entusiasmadora e libertadora. Procurarei descrever algumas das características do "modelo do homem" fenomenoló gico examinando algumas das opiniões de Jean-Paul Sartre. Isso não por que a "nova Sociologia da Educação” tenha sido influenciada especifica- mente por ele, mas porque seu trabalho é acessível e pode ser usado como introdução a certos aspectos da Fenomenologia de Husserl, Heidegger, Merleau-Ponty e outros. Mas, antes de voltarmos nossa atenção para Sartre, I uso de estudos antropológicos 39 examinemos algumas das questões subjacentes a uma das realizações des tacadas da Fenomenologia: sua crítica do positivismo e da ciência. CAPITULO 3 Fenomenologia e Positivismo A Adoção de um Modelo Fenomenológico do Homem Há uma vasta literatura sobre a natureza da Ciência, Filosofia e Socio logia da Ciência. Há também muitas críticas, mas a maioria desses estudos são feitos, em geral, dentro da moldura ou do paradigma aceitos — não são críticas que rejeitam inicialmente os pressupostos básicos da ciência. Uma das características mais importantes da Fenomenologia é constituir uma re jeição da ciência a partir do exterior. Autores como Husserl, Heidegger e Merleau-Ponty tiveram um papel importante nesse movimento, e procura rei isolar alguns aspectos importantes de sua obra, para oferecer uma base sobre a qual delinear um modelo do homem usado em algumas das obras recentes sobre a Sociologia da Educação. Os autores da tradição fenomenológica quiseram libertar as pessoas da ilusão de objetividade, e da tendência de generalizar, prever e explicar. Consideram a objetividade, a aceitação das opiniões do observador, como um obstáculo ao entendimento, e admiram o método de indagação socráti ca, que desmonta os pressupostos aceitos. Isso produz, com frequência, confusão e espanto, é claro — significa deixar de lado o mito de que há fatos concretos identificáveis no mundo, sobre os quais são possíveis afir mações definidas e concretas. Em geral, a maioria dos fenomenologistas não acredita na existência de uma verdade objetiva absoluta na ciência, mas Edmund Husserl foi uma exceção interessante a essa regra, pois acre ditava ser a Fenomenologia um método científico. Sua crença na exatidão científica só existiu, porém, em seu período inicial, e mais tarde ele passou a aceitar a idéia de que os objetos são constituídos como objetos para nós em virtude de sua significação também para nós. Quer dizer, nossa cons ciência e nosso conhecimento do mundo se fazem pela interpretação. Ele chegou a acreditar que antes que a experiência possa ser analisada pelos fenomenologistas, uma espécie de redução preliminar, ou epoché, uma sus pensão da ciência, era necessária, para que as suas pressuposições pudessem modelo fenomenológico do homem 41 ser expostas. O fenomenologista concentra-se, na medida em que isso lhe é possível, na experiência pura tal como se lhe apresenta, sem pressuposi ções ou conceitos derivados de outras fontes que não a própria experiência. 0 fenomenologista põe de lado seu ponto de vista normal, ou realiza uma epoché. Ele põe entre aspas, ou despreza, as causas de sua experiência. Rea liza uma redução fenomenológica aos próprios fatos. Essa opinião — a de que a experiência deve ser examinada tal como se nos apresenta interna mente — é o método de Husserl, Heidegger, Merleau-Ponty e Sartre.1 Uma abordagem anticientífica do mundo pode ser vista na obra de Maurice Merleau-Ponty, para quem a linguagem científica se apega sempre ao que é percebido e não vai além do que é realmente dado. Ele acreditava que havia um grande perigo na suposição científica de que o mundo consiste em objetos completa e totalmente distintos do sujeito que os observa. Afirmava que, enquanto a ciência insistir numa distinção absoluta entre o sujeito que percebe e o objeto que é percebido, não pode remos compreender a percepção. Além disso, não pode haver uma conexão causal entre meus atos e o mundo. Num julgamento causal, há dois elemen tos separáveis: o acender de um fósforo, por exemplo, provoca o incêndio de uma fábrica. Mas Merleau-Ponty argumenta que minha ação não pode ser causada pelo mundo físico, já que Ele e Eu somos uma mesma coisa; não somos dois elementos separáveis. E, se minhas ações não são causadas pelo mundo, então elas são livres. Fenomenologistas, como Husserl e Merleau-Ponty, dizem que a ciên cia não consegue compreender sua natureza, ao tentar permanecer fora do "mundo da vida". Mas como a ciência chegou a pretender representar, com exclusividade, a tradição européia do pensamento racional? Segundo uma opinião, para compreender isso teremos de examinar o pensamento grego, em particular o de Platão. Para os gregos, o homem
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