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SERÁ UMA VIROSE? M.S.D. comparece à unidade de atenção primária para trazer a filha, de 15 anos. Relata que a menina iniciou, há 72 horas, um quadro de diarreia aquosa e profusa (fezes tipo 7 na escala de Bristol), cerca de 5 episódios, sendo que, no primeiro dia do quadro, também apresentou um pico febril não aferido e quatro episódios de vômitos. A paciente negou a presença de muco, sangue ou resto de alimentos não digeridos nas fezes, quando questionada. Relata que, nas últimas 24 horas, não estava aceitando líquidos devido às náuseas. Mas que hoje, ao despertar, está ávida por água. Informa que a filha fez uso de repositor da flora intestinal, loperamida e antiemético, sem melhora. Nega viagens nos últimos 10 dias. Faz uso de água tratada. Informa que, na escola, alguns de seus colegas ausentaram-se das aulas devido a uma suposta “virose”. Ao exame: fácies atípica, alerta, com redução das lágrimas, enoftalmia, normocoradas, mucosas secas, turgor da pele diminuído, mas com retorno menor que 2 segundos. Aparelho respiratório: murmúrio vesicular fisiológico, sem ruídos adventícios, FR: 18 irpm. Aparelho cardiovascular: ritmo cardíaco regular em 2 tempos, sem sopros, pulsos cheios e perfusão capilar menor que 2 segundos. Abdômen: normotenso, indolor à palpação e sem massas palpáveis. Nesse momento, o médico deixou a paciente em observação para terapia com sais de reidratação oral e alertou sobre a necessidade de encaminhamento ao hospital em caso de piora. Diarreia aguda, infecciosa [colegas apresentaram virose] e alta. Paciente desidratada que encaixa no plano B, visto que apresenta os critérios: turgor cutâneo diminuído e enoftalmia. Mas não apresenta sinais de desidratação grave. Não tem critérios para exames complementares nem antibioticoterapia. Segundo o MS, teria recomendação para o uso de zinco. Conduta adequada. GIULIA PACHECO SOUZA • • • • • • • • GIULIA PACHECO SOUZA → No estado normal, a água é absorvida por osmose no intestino delgado por meio das junções estreitas entre as células epiteliais e do gradiente de sódio mantido pela difusão passiva de Na/K e o co-transporte ativo de Na e glicose. → Assim, o Na intracelular é transportado ativamente pela ATPase para o espaço intercelular, resultando em um gradiente osmótico entre os espaços intercelular e luminal, permitindo a difusão livre de água. → Na diarreia, o mecanismo de absorção passiva de Na e Cl está prejudicado, mas a absorção de glicose é inalterada. Isso permite a absorção de água e sódio suficientes para compensar as perdas de fluido. → Um indicador para a funcionalidade da fisiologia intestinal é a escala de Bristol, que avalia o aspecto das fezes. Fisiologia Intestinal trânsito intestinal lento, característico de constipação, indicando falta de fibras e água. bom funcionamento, sendo o 4 ideal. O 3 pode ser princípio de alguma desregulação intestinal. sinal de trânsito intestinal acelerado, com alimentação rica em carboidratos e gorduras. quadro diarreico, em que indica alteração na absorção de água e nutrientes. GIULIA PACHECO SOUZA → A diarreia é caracterizada pelo aumento do volume das fezes, diminuição da consistência ou aumento da aquosidade e/ou aumento da frequência de evacuações (≥ 3 por dia). → Os principais sintomas incluem: desconforto abdominal, cólica, plenitude, excesso de flatos, náuseas e vômitos. → A diarreia apresenta 3 classificações principais, conforme as características (osmótica x secretória x exsudativa x motora), origem (alta x baixa) e temporalidade (aguda x persistente x crônica). Classificação da Diarreia presença de sangue ou pus na diarreia, sendo mais comum na presença de Shigella, Salmonella e E... coli enterohemorrágica (O157: H7). mais comum na presença de vírus, toxina, cólera e C. difficile. Diarreia Osmótica: presença de moléculas solúveis em água e não absorvíveis pelo intestino que levam a retenção osmótica da água [ex. carboidratos], por isso não tem diarreia à noite. Gap osmolar fecal aumentado. Ex.: manitol, antiácidos, intolerância a lactose. Diarreia Secretória: aumento da secreção dos fluidos isotônicos da mucosa intestinal., perdendo grande quantidade de eletrólitos. Pode ser em decorrência de uma toxina ou patologias intestinais, a diarreia pode apresentar caráter noturno. Ex.: C. difficile, E. coli e fluoxetina. Diarreia Exsudativa/Inflamatória: áreas inflamadas do intestino que provoca a lesão e morte dos enterócitos, não conseguindo absorver açúcares, aminoácidos e eletrólitos. Ex.: DII, Salmonella. Diarreia Motora/Funcional: ressecção intestinal ou fístulas enteroentéricas, sendo um diagnóstico de exclusão. É mais comum em diarreia crônica. Diarreia Disabsortiva/Esteatorreica: ex.: doença celíaca, pancreatite aguda. Diarreia Alta: caracterizada por um grande volume contendo restos alimentares [devido ao processo de absorção é maior], baixa frequência, além de estar associada a esteatorreia e distensão abdominal e acompanhar cólicas abdominais. Diarreia Baixa: apresenta um pequeno volume de vezes, mas com alta frequência. Além disso, pode ocorrer a eliminação de muco, pus e até sangue. É comum ter associação com urgência e tenesmo. GIULIA PACHECO SOUZA → O diagnóstico da diarreia aguda é dado, principalmente, com a história clínica e o exame físico, sendo que na maioria dos casos não realiza a busca pela etiologia. → Em pacientes com > 70 anos + comobirdades, diarreia persistente (> 7 a 10 dias), desidratação grave, toxemia [comprometimento do estado geral], imunossupressão, disenteria deve ser realizado exames complementares, como coprocultura, hemograma, eletrólitos, função renal, pesquisa de marcadores inflamatórios, antígenos de patógenos, leucócitos fecais e toxina nas fezes [toxinas A e B: busca C. difficile], a fim de investigar a etiologia. Diarreia Aguda: tem duração < 2 semanas. As etiologias mais comuns são virais, bacterianas, parasitoses, alimentos contaminados e laxantes, por exemplo. Diarreia Persistente: a duração varia entre 2 a 4 semanas, estando associada à perda de peso e infecções não intestinais graves. Diarreia Crônica: diarreia com duração > 4 semanas. As causas envolvem condições crônicas, como doenças inflamatórias, câncer, alterações da imunidade [AIDS], intolerâncias alimentares à lactose ou glúten. GIULIA PACHECO SOUZA → A diarreia aguda é a passagem de quantidade acima do normal de fezes amolecidas ou líquidas associada ao aumento do número de evacuações (3 evacuações/dia), que durem menos de 14 dias. Assim, geralmente é autolimitada. → A fisiopatologia envolve o comprometimento no equilíbrio entre reabsorção e secreção pela mucosa intestinal, levando à liquidificação das fezes. → As etiologias são divididas em 4 grupos: bacterianas [C. difficile, Salmonella spp, E. coli], virais [adenovírus e rotavírus], parasitárias [E. histolytica e Giardia lamblia] e não infecciosas. → Vale ressaltar que as gastroenterites infecciosas estão relacionadas a alguns fatores de risco, por exemplo, viagem recente, alimentação [frutos do mar crus e refeições em restaurantes e lanchonetes] e uso recente de antibióticos. → Na anamnese é interessante investigar o tempo de início, número de evacuações por dia, consistência das fezes, bem como presença de muco ou sangue, associação com outros sintomas, como febre, náuseas e vômitos. Além disso, deve-se questionar se as pessoas com quem convive apresenta os mesmos sintomas e história de doenças crônicas. → Já no exame físico deve-se avaliara presença e o grau de desidratação, uma vez que é um ponto importante para definir o plano terapêutico. Diarreia Aguda resulta da ingestão de água e alimentos contaminados por agentes infecciosos [ex.: E. coli], sendo que o início dos sintomas, ocorre na 1º semana da viagem. mucosas desidratas, pele seca, olhos fundos, turgor cutâneo diminuído, pulso radial fraco, incapacidade de ingerir líquidos e diminuição do nível de consciência. GIULIA PACHECO SOUZA → O plano A é aquele em que o paciente está sem desidratação. Assim, ele é liberado para asa após prescrição de solução de reidratação oral (SRO) e demais orientações. → Assim, não há necessidade de suspender ou modificar a dieta, deve-se apenas instituir maior ingesta de líquido. → No plano B, o paciente está desidratado, permanecendo na UBS em observação, fazendo uso da reidratação oral. → Deve fazer a monitorização do paciente a partir da pesagem, visto que depois que cessa os sinais de desidratação, o paciente é colocado no plano A, → Nesses casos, a alimentação deve ser suspensa, e o SRO deve ser introduzido aos poucos. → Atenta-se também para a pessoa febril, que não deve usar antitérmico, pois a febre costuma ceder com a reidratação. não substitui as refeições, devendo ser ofertado ao paciente após cada evacuação. a hidratação oral deve ser trocada pela endovenosa ou por sonda nasogástrica, quando: perda de peso após 2 horas de uso de SRO, vômitos persistentes, distensão abdominal persistente ou dificuldade de ingestão de SRO. GIULIA PACHECO SOUZA → O plano C é instituído quando o paciente apresenta desidratação grave, sendo necessário reidratação endovenosa, está encaminhando para um quadro de choque. alteração neurológica, desidratação grave, vômitos incoercíveis, choque e íleo paralítico. GIULIA PACHECO SOUZA → Além da classificação em planos, o Ministério da Saúde faz outras recomendações em relação ao uso do zinco, antibióticos, antidiarreicos e antieméticos. → No que diz respeito ao uso do zinco, é recomendado essa prática, visto que diminui a gravidade e a duração da diarreia, principalmente em menores de 5 anos. Assim, a posologia é de 1x ao dia por 10 a 14 dias, até 6 meses de idade são 10 mg/dia, acima disso é 20 mg/dia. → Os antidiarreicos e os antieméticos [paciente vomitando muito pode iniciar, pois poderia agravar a desidratação] não devem ser utilizados, visto que reduzem a motilidade intestinal, prolongam o curso da doença, bem como o contato com o patógeno, podendo piorar os sintomas sistêmicos. → Em relação à antibioticoterapia [bactéria gram-negativo] deve ser prescrito em casos isolados, sendo que em crianças e adultos a primeira escolha é ciprofloxacino. A segunda opção é a ceftriaxona via intramuscular. → Além dessas terapias, pode ser utilizado os probióticos que reduzem a duração e a intensidade da diarreia. O mecanismo de ação dessa classe é estimular a competição entre os microrganismos benéficos e patogênicos. disenteria com comprometimento do estado geral. os antibióticos tem a capacidade de prolongar a interrupção da homeostase intestinal e atrasar a recuperação da flora intestinal. GIULIA PACHECO SOUZA → A desidratação é resultante das diarreias, sendo uma das causas mais significativas de morbimortalidade. → É classificada em 3 tipos (hipotônica, isotônica e hipertônica) a depender da quantidade de sódio no sangue. → Assim, a diminuição do volume do líquido extracelular é responsável pela maioria dos sinais clínicos da desidratação, como ocorre na desidratação iso e hipotônica. → A desidratação hipertônica apresenta os sinais clínicos menos evidentes, e tem uma tendência de levar ao choque de forma mais lenta, visto que o volume intravascular é protegido pelo deslocamento da água no espaço intracelular. Nesse caso, o paciente está mais irritado e ingere líquidos de forma ávida. Desidratação Desidratação a diminuição do turgor cutâneo pode ser um fator enganoso, pois pode estar presente em crianças desnutridas e sem desidratação. perda de fluido correspondente a 10% do peso corporal, acompanhado de perturbação hemodinâmica significativa.