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CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre Alves AS ELEIÇÕES INDIRETAS DE 1985 Apesar de toda a mobilização e toda a movimentação realizada em torno da Proposta de Emenda à Constituição Dante de Oliveira, a decisão pela sucessão presidencial ocorreria via Colégio Eleitoral. Ou seja, as eleições de 1985 que retornariam o país para o regime democrático aconteceria de forma indireta, sem participação popular. O Colégio Eleitoral era formado por deputados e senadores mais os chamados biônicos e representantes indicados pelas bancadas estaduais. Dessa forma, o PDS (partidos do regime) tinha ligeira maioria. O Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) decidiu lançar Tancredo Neves como candidato da oposição. Tancredo era governador de Minas Gerais, era um oposicionista moderado e um hábil negociador que conseguia, de certa forma, agradar a direita e a esquerda. Á direita, Tancredo acenava que não haveria um “revanchismo” contra o regime ditatorial. Á esquerda, indicava o interesse em avançar com políticas sociais e sobretudo, convocar uma Constituinte para elaborar a nova carta magna que substituiria o documento militar de 1967. O Partido Democrático Social (PDS) por sua vez decidiria o candidato da situação na convenção do partido ainda em 1984. Nesse sentido, pode-se destacar três nomes como os principais que estavam nessa disputa. Mário Andreazza, Ministro do Interior de Figueiredo e militar. Paulo Maluf, governador de São Paulo e amigo de Figueiredo e Aureliano Chaves, vice-presidente em 1984. Contudo, Chaves logo se afastou da disputa. Maluf, no entanto, fez forte campanha junto aos convencionais do partido, o que causou um forte mal-estar. Paulo Maluf prometia toda sorte de cargos e atenções, caso fosse eleito. Maluf conseguiu ser indicado como candidato da situação, derrotando Mário Andreazza. Contudo, o custo da indicação foi muito alto. O mal-estar causado pelo ex-governador paulista seria determinante para o insucesso de sua campanha. Dessa situação, Aureliano Chaves e Marco Maciel (Senador por Pernambuco) lançaram uma dissidência dentro do PDS chamada de Frente Liberal. Desse movimento, em breve se formaria o Partido da Frente Liberal (PFL). Tão logo se formou, o PFL se aproximou do PMDB para formar uma coalização. Dessas negociações foi formada a Aliança Democrática, coalização que durou até os trabalhos da Constituinte. A Aliança apoiou a chapa Tancredo Neves (PMDB) e José Sarney (PMDB). Sarney tinha pouca relação com a proposta democrática levantada pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro. Isso porque, o maranhense foi líder da ARENA e presidente do partido, além disso, apoiou o regime militar durante quase todo o período ditatorial. Contudo, o PFL fez questão e o PMDB aceitou. Não era possível, naquele momento, determinar o alcance dessa decisão. Sarney se filiou ao PMDB como forma de evitar que o PDS tentasse impugnar sua candidatura. Antes da eleição, a Aliança Democrática divulgou um documento intitulado “Compromisso com a Nação”. Nessa carta estavam elencados as diretrizes e os princípios que norteariam a atuação da Coalização, caso saísse vitoriosa da disputa. O documento buscava agradar tanto a direita como a esquerda. Tancredo indicava mudanças sociais e reformas que agradavam em muito a esquerda, mas ao mesmo tempo, se encontrava com lideranças de direita e militares para fazer negociações. Em certa medida, agradava tanto um lado como o outro. CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre Alves ` O resultado da eleição foi a vitória de Tancredo Neves e José Sarney sobre Paulo Maluf. A chapa da Aliança Democrática alcançou 480 votos, contra apenas 180 do candidato do PDS. O apoio dos políticos da situação em dissidência foi importante para essa vitória. Apesar de tudo, Tancredo não assumiu a presidência. Com uma saúde frágil, foi internado e veio a falecer em 21 de abril de 1985. Conforme estabelecido, o vice José Sarney assumiu o cargo. IMAGEM 01 – Tancredo Neves (a direita) e José Sarney (a esquerda). Chapa lançada pela Aliança Democrática para concorrer às eleições para Presidente da República em janeiro de 1985. Fonte: Jornal O Estado de Minas. Disponível em: https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2016/01/04/interna_politica,721637/pmdb-acalenta-sonho-de-disputar-a- presidencia-da-republica.shtml Acesso em 25 de junho de 2021. A chegada de Sarney ao poder representava a última etapa da transição “lenta, gradual e segura” planejada por Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva. Sarney era um homem do regime e político conservador que poderia fazer a transição para a democracia sem grandes rupturas. Contudo, assumiu um país com uma situação econômica delicada e com uma série de resquícios do regime anterior. Dessa forma, seus maiores desafios seriam a solução da questão econômica e a remoção do “entulho ditatorial”. Vejamos a seguir como foi seu governo. POLÍTICA NO GOVERNO SARNEY Sarney assumiu o cargo de presidente de surpresa, já que a expectativa era que Tancredo assumisse. Esse fato foi destacado pelo próprio Sarney em entrevista ao Programa Roda Viva. Seus desafios contemplavam as áreas política e econômica. Em termos políticos, precisava reconduzir o Brasil para uma democracia e remover os dispositivos militares que ficaram de resquício do regime anterior. O chamado “entulho ditatorial”. A questão econômica, por sua vez, será tratada em tópico separado. https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2016/01/04/interna_politica,721637/pmdb-acalenta-sonho-de-disputar-a-presidencia-da-republica.shtml https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2016/01/04/interna_politica,721637/pmdb-acalenta-sonho-de-disputar-a-presidencia-da-republica.shtml CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre Alves Uma das primeiras medidas que merecem destaque nesse sentido é a Emenda à Constituição 25 de 15 de maio de 1985. Esse dispositivo trouxe importantes alterações eleitorais no sentido de reconduzir o Brasil a uma democracia. Restabelece, assim, as eleições diretas. Dessa forma, o ano seguinte, 1986, seria de suma importância. Isso porque, nessa data seriam eleitos pelo voto popular os deputados e senadores constituintes. Constituintes são aqueles representantes do povo eleitos com a responsabilidade de elaborar uma nova constituição para o país. As eleições realizadas em 1986 foram gerais, tanto para os cargos legislativos como para os executivos. O PMDB com todo o prestígio daquele momento conseguiu eleger os governadores de todos os estados menos no Sergipe, onde venceu Antônio Carlos Valadares do PFL. Com relação aos cargos legislativos a vitória do PMDB também foi bastante expressiva. Conquistou 53% dos assentos na Câmara dos Deputados e 38 das 49 cadeiras em disputa no Senado Federal. Considerando que o PFL conquistou 24% das cadeiras da Câmara e que a Aliança Democrática era formada por PMDB e PFL, Sarney tinha ampla maioria para conduzir a cena política e econômica. Contudo, não foi tão fácil assim. Nas eleições gerais de 1986 foi eleito em Alagoas Fernando Collor de Melo, nome que será bastante importante, uma vez que governará o Brasil após a saída de Sarney. Collor assume a presidência em 1990, sendo o primeiro a assumir essa função tendo sido eleito por voto popular, desde 1961 quando Jânio Quadros venceu o pleito. O Governo Collor, no entanto, é assunto da próxima aula. A transição sob Sarney teve suas limitações, como era de se esperar. É notório, no entanto, que o avanço democrático em seu governoé bastante expressivo, uma vez que o período anterior foi de governos autoritários. Sarney avançou muito em termos de liberdades políticas. Como por exemplo, o direito de voto aos analfabetos, permitido com restrições desde a Emenda á Constituição 25 e a legalização de partidos políticos de esquerda, como o PCB e PC do B. Esses partidos, no entanto, perdiam seu prestígio na medida em que o PT avançava nos meios trabalhadores. Por outro lado, Sarney também manteve o SNI e os recursos que o órgão recebia. Ponto alto do Governo Sarney são os trabalhos em torno da nova Constituição Federal. A nova carta magna substituiria o documento militar de 1967 e era foco de atenção em todo o país. Havia muita expectativa em torno da nova carta. Os deputados e senadores constituintes começaram a se reunir em fevereiro de 1987, ficando o documento pronto em 1988. Dado a importância desse assunto, será tratado em tópico a parte. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 A Constituição de 1988 é a Carta Magna que vigora atualmente no Brasil. Esse documento substitui o de 1967 que vigorou durante os anos da Ditadura Militar. Antes de tratar do documento propriamente dito é preciso destacar dois conceitos: Constituição Outorgada e Constituição Promulgada. Outorgada é quando a Carta não passa por um parlamento democraticamente eleito e é imposta de cima para baixo. É o caso da Constituição de 1967, apesar de passar pelo Congresso, o parlamento brasileiro daquele ano não possuía representantes da oposição de forma satisfatória. Assim CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre Alves sendo, a carta foi imposta, portanto, foi outorgada. Promulgada é o documento que é produzido por um grupo parlamentar eleito segundo regras democráticas. É o caso da Constituição de 1988. A Assembleia Nacional Constituinte começou os seus trabalhos em 1º de fevereiro de 1986 e concluiu o documento em 5 de outubro de 1988. A carta resultante foi apelidada de Constituição Cidadã por conta de uma série de avanços sociais que ela trouxe para o contexto brasileiro. Esse apelido veio de Ulysses Guimarães. Ulysses foi um importante opositor da Ditadura Militar e líder dos movimentos em torno das Diretas Já. Era presidente da Câmara e deputado eleito pelo PMDB. É famosa a filmagem na qual Ulysses ergue a CF para o alto e proclama estar aprovado o “documento da liberdade” se referindo a nova Carta Magna. IMAGEM 02 – Ulysses Guimarães ergue a Constituição Federal de 1988. Fonte: Senado Notícias. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/10/05/senadores-comemoram-28-anos-da-constituicao-cidada Acesso em 26 de junho de 2021. A Carta de 88 foi apelidado de “cidadã” por conta de uma série de progressos que esse documento traz para o contexto brasileiro. Vamos analisar brevemente alguns desses pontos. Inicialmente, podemos afirmar que a Carta Magna de 88 põe fim de fato ao regime de exceção que vigorou no Brasil de 1964 até 1985. Isso porque ela substitui o documento anterior de 1967. Não é de se estranhar que a nova lei traga uma série de dispositivos que impeçam um novo período ditatorial e uma série de abusos, como foi comum durante os governos dos generais militares. “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.” (BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: 1988.) https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/10/05/senadores-comemoram-28-anos-da-constituicao-cidada CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre Alves O primeiro artigo da CF 88 traz um importante conceito no seu parágrafo único. O conceito de República e Democracia. O poder emana do povo por meio da eleição de seus representantes ou de forma direta, como em um plebiscito. Além disso, o conceito de Estado Democrático de Direito é muito importante, definição que grosso modo trata das leis feitas pelo povo e para o povo. Respeitando a dignidade da pessoa humana. Conceito muito importante inclusive para o Brasil se inserir no contexto internacional, onde o respeito aos Direitos Humanos se constitui como um requisito básico e essencial para as relações internacionais. Como já mencionado a nova Carta Magna trouxe uma série de dispositivos que evitassem os abusos que foram cometidos durante a Ditadura. Nesse sentido, é especial, por exemplo, todo o artigo 5º. Isso porque, no mesmo estão expressos os direitos e garantias fundamentais. Trata-se de um dos maiores artigos da Constituição e elenca muito direitos para os cidadãos. O exemplo que cabe aqui ressaltar é o seguinte: “Art. 5º [...] III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; [...] XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;” (BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: 1988.) Como já mencionado nas aulas anteriores, a tortura foi amplamente utilizada nos porões da Ditadura como técnica de interrogatório ou por punição. Muitas vezes resultando em mortes. Famoso é o caso do Jornalista Vladmir Herzog, assassinado durante interrogatório que utilizava técnicas de tortura. Esse método é amplamente criticado por Organismos Internacionais pela questão dos Direitos Humanos. Além disso, como mecanismo para obter informações, a tortura é ineficiente. Isso porque, o torturado fala o que seu carrasco quer ouvir, não necessariamente a verdade. Dessa forma, não é de estranhar que o documento que pôs fim ao regime de exceção, deixasse expresso em texto a proibição dessa prática. Lembrando que muitos dos deputados eleitos no ano de 1986 para serem os constituintes foram perseguidos ou punidos pela ditadura. Por fim, vale aqui destacar um ponto extremamente importante do novo documento que é a questão dos direitos políticos. Nesse aspecto, é de suma relevância mencionar a extensão do direito de voto aos analfabetos. Até a carta anterior, de 1967, era proibido por lei que aqueles que não soubesse ler e escrever exercem o direito de escolha de seus representantes. Contudo, não se pode dizer que os analfabetos não saibam selecionar seus candidatos apenas por não saber ler. Dessa forma, um grupo numeroso (no Brasil daquele momento) ficou excluído do processo decisório. A Carta Cidadã de 1988 altera esse aspecto, ampliando assim, nossa democracia. “Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular. § 1º O alistamento eleitoral e o voto são: I - obrigatórios para os maiores de dezoito anos; II - facultativos para: a) os analfabetos; b) os maiores de setenta anos; c) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos.” (BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: 1988.) Concluindo, a Constituição Cidadã de 88 trouxe importantes avanços que foram analisados acima. Claro que os aqui mencionadossão apenas os mais relevantes e comentados, existindo muitos CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre Alves outros detalhes a serem tratados em um curso mais específico. Contudo, a Carta também apresentou problemas que seriam mais visíveis nos anos sequentes. A questão tributária é um exemplo. Outro aspecto é que o documento nasceu com um desafio muito grande de pôr fim ao regime militar, no entanto ainda havia muitos representantes do mesmo nas esferas de poder. Por fim, o documento ficou extenso e todos tentaram ao máximo incluir algum item, como forma de assegurar sua realização, já que estaria presente na Carta Magna. POLÍTICA ECONÔMICA Sem sombra de dúvida, a política econômica no Governo Sarney é o tema mais abordado quando se fala sobre o mandato do referido presidente. Além disso, aqueles que viveram aqueles anos tem amargas memórias do período. Quem não viveu, com certeza já ouviu falar dos fracassados Planos Econômicos que foram implementados entre 1985 e 1990. Quatro no total e todos fracassados. A seguir analisaremos de forma mais minuciosa todos eles. Sarney assumiu um país com os resquícios da política econômica da Ditadura. O milagre econômico, a marcha forçada do Governo Geisel e os dois choques do petróleo foram fatores que convergiam para uma situação bastante delicada. Esse período é inclusive conhecido por “década perdida” em alusão a péssima situação da economia brasileira. Nesse sentido, o Governo precisava tratar de dois problemas: A dívida externa bastante alta resultado dos empréstimos obtidos no exterior a juros flutuantes; e a hiperinflação. Inflação é um aumento generalizado do preço de produtos e serviços em uma economia, é um evento natural. Contudo, quando atinge valores mais altos é bastante danosa para a economia de um país. Quando esse valor passa de 50% ao ano é chamado de hiperinflação. Esse foi um conceito cotidiano do brasileiro que viveu esse momento histórico. Como já mencionado, Sarney manteve a equipe selecionada por Tancredo Neves quando assumiu o poder. Por conta disso, o Ministro da Fazenda do governo no ano de 1985 foi Francisco Dornelles, sobrinho de Tancredo. Dornelles aplicou uma política ortodoxa buscando controlar as contas públicas. Sua análise identificou nos gastos do governo a principal causa para a inflação. Suas medidas contemplavam um corte de 10% do orçamento da União e congelamento de contratos vigentes. Seu objetivo era, dessa forma, evitar um déficit público e a emissão de papel moeda. Contudo, as consequências de uma política de austeridade não eram muito populares e as pressões fizeram com que Sarney afastasse o Ministro da Fazenda. Antes de prosseguir cabe uma observação relativa à emissão de papel moeda. Sempre que ocorria um déficit nas contas do governo, ou seja, quando os gastos superavam as receitas obtidas com impostos e títulos públicos, era preciso recorrer a empréstimos ou mais comumente a emissão de papel moeda pelo Banco Central. Contudo essa medida é inflacionária, já que aumenta a quantidade ofertada de moeda na economia. Outra forma de solucionar essa equação seria aumentando a arrecadação de impostos ou reduzindo o gasto do governo. Como essa frente de atuação é bastante impopular, poucos governos aceitam ir por esse caminho. Vale destacar ainda que a emissão de papel moeda gera um imposto inflacionário que acaba recaindo sobre a população mais pobre que tem seu poder aquisitivo bastante reduzido. CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre Alves Com a saída de Dornelles, Sarney nomeou para Ministro da Fazenda Dílson Funaro, presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Sob a gestão de Funaro será elaborado o primeiro Plano de Combate Inflacionário de destaque no Governo Sarney: O Plano Cruzado. IMAGEM 03 – Presidente José Sarney (a esquerda) e Dílson Funaro Ministro da Fazenda (a direita). Fonte: Jornal Opção. Disponível em: https://www.jornalopcao.com.br/colunas-e-blogs/memorando/o-dialogo-entre-o-ministro-dilson-funaro-e-o- ministro-iris-rezende-259866/ Acesso em 27 de junho de 2021. O objetivo do Plano Cruzado era controlar a hiperinflação e reestabelecer a normalidade na economia brasileira. Para que isso ocorresse foram tomadas uma série de medidas. Primeiramente, a moeda nacional foi substituída. O Cruzeiro (Cr$) foi substituído pelo Cruzado (Cz$). A troca tinha um fator psicológico, uma vez que o Cruzeiro já era uma moeda desacreditada. Além disso, a troca foi seguida de um corte de zeros. Ou seja, a troca não foi feita na proporção 1 para 1. Na verdade, a troca foi feita na proporção de 1000 Cruzeiros para 1 Cruzado. Junto com a troca foi feita a conversão de salários, aluguéis e mensalidades escolares da moeda antiga para a atual. Os salários entraram na regra da indexação. Dessa forma, foi criado um mecanismo de ajuste, sempre que a inflação medida pelo IBGE acumulada alcançasse 20%, os salários seriam corrigidos. Ademais, alterou a política cambial, fixando a taxa de câmbio em Cz$: 13,80 para cada dólar. Além disso foram tomadas diversas outras medidas, muitas delas apenas “cosméticas” para mascarar os efeitos da inflação. A mais famosa medida do Plano Cruzado além da troca de moeda foi o congelamento de preços. Dessa forma, como não era permitido aumentar os preços, a tendência da inflação era reduzir, mesmo que de forma artificial. Sarney ainda convocou a população a auxiliar na execução do Plano, surgem https://www.jornalopcao.com.br/colunas-e-blogs/memorando/o-dialogo-entre-o-ministro-dilson-funaro-e-o-ministro-iris-rezende-259866/ https://www.jornalopcao.com.br/colunas-e-blogs/memorando/o-dialogo-entre-o-ministro-dilson-funaro-e-o-ministro-iris-rezende-259866/ CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre Alves assim, os chamados Fiscais do Sarney. Os fiscais eram pessoas comuns que iam aos mercados para fazer as compras e poderiam denunciar caso percebesse que o estabelecimento tinha realizado um aumento do preço. Existia, inclusive, um broche que os fiscais utilizavam quando iam fazer as compras. Com os preços congelados e os salários reajustados houve uma expansão do consumo. Com o tempo, os empresários começaram a cobrar um ágio sobre o preço congelado. Sarney e Funaro confrontaram o empresariado que não estava satisfeito com o intervencionismo. Com as medidas estabelecidas com o congelamento, em pouco tempo, ficou desinteressante para os empresários produzir e vender os produtos pelo preço tabelado. Como consequência houve a escassez nos supermercados. Além disso, o congelamento prejudicou as estatais de água, eletricidade, petróleo e telecomunicações, empresas que não tinham mecanismos para cobrar “ágio” sobre o preço de seus serviços. IMAGEM 04 – Prateleiras vazias em supermercado durante o Governo Sarney e o Plano Cruzado. Fonte: Valor Econômico. Disponível em: https://valor.globo.com/eu-e/coluna/a-experiencia-amarga-do-cruzado.ghtml Acesso em 27 de junho de 2021. Apesar dos bons resultados iniciais do Plano Cruzado, não era possível manter esses números por muito tempo. Dessa forma, tão logo os preços foram descongelados, a inflação explodiu novamente. Ainda em 86 Sarney e Funaro lançaram mais um plano que ficou conhecido como Cruzadinho. A principal medida era a cobrança de um empréstimo compulsório sobre o preço de produtos como álcool, gasolina e automóveis. Além do aumento da taxa de overnight, referência usada pelos bancos para empréstimos de uma noite realizado diariamente pelos bancos. Assim comoo Plano Cruzado, o Cruzadinho fracassou. No final do ano de 1986 foi lançado o Plano Cruzado II que tentou corrigir os erros do plano anterior. A equipe econômica percebeu que havia um excesso de demanda na economia brasileira, https://valor.globo.com/eu-e/coluna/a-experiencia-amarga-do-cruzado.ghtml CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre Alves dessa forma, foi recomendada uma receita fiscal e monetária contracionista. Esse plano foi dividido em seis medidas: estímulos a poupança, correção de preços, medidas fiscais, estímulos a exportação, desindexação e redução da participação do Estado na economia. Apesar de tudo, foi um plano de vida curta que, assim como seu antecessor, fracassou. Ambos os planos fracassavam por não atacar as causas reais da inflação que estavam na emissão de papel moeda pelo Banco Central para cobrir o déficit das contas do governo. Outro detalhe da economia sob a gestão de Funaro está no descontrole das contas externas. A dívida externa do Brasil já era bastante alta quando Sarney assumiu o governo. Nesse momento, diante da valorização artificial do Cruzado, sem contrapartida em exportações e investimentos, houve um avanço das importações sobre as exportações de forma que as reservas de dólar do Brasil sofreram redução. Em 1987 esse descontrole levou o Brasil a declarar uma moratória técnica do pagamento de juros da dívida externa, o que foi recebido com indiferença pelo FMI e pelos credores internacionais. Além dos Planos já mencionados, ocorreram dois Planos de menor importância no Governo Sarney: O Plano Bresser e o Plano Verão. Vejamos cada um deles. Em 1987 a situação econômica do Brasil estava caótica, a hiperinflação, a alta taxa de desemprego e a crise cambial fizeram com que Sarney optasse pela saída de Dílson Funaro. Para seu lugar foi escolhido Luís Carlos Bresser Pereira. Bresser percebeu que o poder de consumo adquirido com o Plano Cruzado era insustentável. A valorização real da taxa de câmbio ficou impossibilitada devido a redução das reservas de dólar. A compressão das taxas públicas estava levando a uma expansão monetária, o que era uma medida inflacionária. Por fim, o aquecimento da atividade econômica estava em tendência de baixa em uma economia com preços congelados. Dessa forma, Bresser tentou combinar a redução dos salários reais com a queda de inflação. Associação que fracassou. O Plano congelou os preços e salários, dessa vez, por tempo determinado, 90 dias. Além disso, alterou a forma de correção dos salários para quando o congelamento expirasse. Bresser também desvalorizou a taxa de câmbio como forma de contrair as importações e favorecer as exportações. O objetivo era reduzir a inflação na medida que os salários reais reduzissem junto, como forma de contrair o consumo. Contudo, a nova forma de reajuste salarial gerou um descompasso entre a inflação que continuou em taxas altas e o poder de compra real. Dessa forma, houve forte pressão por parte dos trabalhadores para que os ordenados fossem reajustados. Sem muita saída e com pouca legitimidade no poder para tocar a política econômica de forma austera, Sarney cedeu e os salários foram corrigidos. Bresser Pereira não conseguiu bons resultados e acabou pedindo demissão em dezembro de 1987. Com a saída de Luís Carlos Bresser Pereira foi escolhido como novo Ministro da Fazenda Maílson da Nobrega. Maílson assumiu uma postura chamada de “arroz com feijão” onde não buscava a redução da inflação, mas apenas evitar que a mesma continuasse a subir. Dois fatores, no entanto, contribuíam para o insucesso dessa proposta. O aumento dos gatos públicos decorrentes das determinações estipuladas com a entrada em vigor da nova Constituição Federal de 1988 e a postura de Sarney, incapaz de estabelecer uma política austera. CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre Alves Maílson estabeleceu a troca da moeda nacional mais uma vez. O Cruzado (Cz$) foi substituído pelo Cruzado Novo (Czn$). A proporção da troca foi de 1000 cruzados para 1 cruzado novo. O corte de zeros era uma medida de controle que valoriza a moeda de forma artificial. Congelou a taxa de câmbio e os preços por tempo indeterminado. Desvalorizou a taxa de câmbio e reajustou as tarifas públicas. Contudo, o plano foi sendo desconfiguradas ao longo de 1989, que era ano eleitoral. O Plano Verão foi mais um fracasso. Sarney praticamente desiste de resolver a questão inflacionária com o insucesso das medidas anteriores e tenta apenas conviver com elas e deixa a situação para o novo presidente resolver. Em 1990 Sarney conclui o seu mandato e em seu lugar assume Fernando Collor de Melo, governador de Alagoas. Collor foi o primeiro presidente eleito por voto popular depois dos longos anos da Ditadura Militar. Esse contudo, é o assunto da próxima aula. CURSO: HISTÓRIA, GESTÃO PÚBLICA E DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO RESUMO 08 – GOVERNO JOSÉ SARNEY E A REDEMOCRATIZAÇÃO (1985-1990) Alexandre A. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal. 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