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SÍNDROME PRÉ-MENSTRUAL A síndrome pré-menstrual (SPM) é um distúrbio crônico que ocorre na fase lútea do ciclo menstrual e desaparece logo após o início da menstruação. Foi cientificamente descrita pela primeira vez em 1931, pelo ginecologista Robert Frank, que classificou sintomas cíclicos de 15 mulheres como tensão pré-menstrual. O termo tensão foi utilizado até 1950, quando foi substituído por síndrome pré-menstrual. A SPM caracteriza-se por uma combinação de sintomas físicos, psicológicos e comportamentais que afetam as relações interpessoais da mulher de forma negativa. Entre 3 e 8% das mulheres têm sintomas muito intensos, interferindo nas suas atividades diárias e comprometendo a sua produtividade e qualidade de vida, o que constitui o transtorno disfórico pré-menstrual (TDPM). EPIDEMIOLOGIA A ausência de um consenso diagnóstico para definir essa síndrome justifica, pelo menos em parte, a discrepância nos dados de prevalência encontrados na literatura. Estima-se que até 90% das mulheres apresentem a percepção de sintomas pré-menstruais. Estudos demonstram que 20 a 40% das mulheres sofrem de SPM e que, dessas, 3 a 8% apresentam sintomas intensos – o TDPM. QUADRO CLÍNICO Os sintomas da SPM são muitos e variados, sendo citados mais de 100 sintomas físicos, psicológicos e comportamentais associados. O sintoma psicológico mais frequente é a labilidade de humor, ocorrendo em até 80% das pacientes. Outros sintomas são ansiedade, irritabilidade, depressão, sentimento de desvalia, insônia ou aumento de sonolência, diminuição da memória, confusão, concentração diminuída e distração. As queixas físicas comuns incluem aumento do volume abdominal e sensação de fadiga, cefaléia tensional, enxaqueca, mastalgia, dores generalizadas, aumento de peso, tonturas, náuseas e palpitação. Entre as mudanças de comportamento, são comuns mudanças nos hábitos alimentares, aumento de apetite, avidez por alimentos específicos (particularmente doces ou comidas salgadas), não participação em atividades sociais ou profissionais, maior permanência em casa, aumento de consumo de álcool e aumento ou diminuição da libido. ETIOLOGIA A etiologia da SPM permanece desconhecida e, por isso, muitas hipóteses têm sido cogitadas, porém, nenhuma delas pode ser comprovada. Há consenso de que seja secundária à atividade cíclica ovariana. A menstruação em si não é fundamental, visto que os sintomas se mantêm após histerectomia. Parece ser consequência de uma interação complexa e pouco compreendida entre hormônios esteróides ovarianos, peptídeos opióides endógenos, neurotransmisores centrais, prostaglandinas e sistemas autonômicos periféricos e endócrinos. Estudos comprovaram que não há alteração na dosagem sérica dos hormônios sexuais das mulheres com SPM quando comparadas às mulheres normais (grupo-controle). Recentemente, vem sendo estudado um neurotransmissor, o fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF, do inglês brain-derived neurotrophic factor), que estaria associado à etiologia da SPM. Fatores inflamatórios podem estar relacionados à etiologia da SPM. A fase lútea está relacionada com aumento de produção de fatores pró-inflamatórios, como as interleucinas (IL-6) e o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α)), quando comparada com a fase folicular. O nível de proteína C-reativa varia ao longo do ciclo menstrual; contudo, um aumento da PCR é observado quando se administra progesterona. Algumas doenças inflamatórias também tendem a piorar no período pré-menstrual, como a síndrome do intestino irritável. DIAGNÓSTICO Os sintomas do TDPM podem ser muito semelhantes aos de outras doenças, por isso, uma avaliação prospectiva acurada é necessária para realizar o diagnóstico. A International Society for Premenstrual Disorders (ISPMD) indica a realização de diários por 2 a 3 meses consecutivos, e não apenas por um ciclo. A SPM e o TDPM sempre devem ser diferenciados de outros sintomas psiquiátricos que, eventualmente, apenas se exacerbam no período pré-menstrual, e de algumas condições médicas como hipotireoidismo ou hipertireoidismo. Uma variedade de sintomas clínicos, como cefaléia, fadiga crônica e síndrome do intestino irritável, é exacerbada frequentemente próximo à menstruação, contudo, os sintomas não são típicos de SPM, e o período em geral não coincide com a fase lútea. Exames laboratoriais poderão ser realizados excepcionalmente, quando for necessário afastar outras patologias. O uso de entrevistas, questionários e escalas de autoavaliação da paciente já está bem estabelecido, particularmente no âmbito de pesquisas. O questionário DRSP (Daily Record of Severity of Problems [Registro Diário da Intensidade dos Problemas]) é considerado, por muitos profissionais, a melhor ferramenta para diagnóstico de SPM. A aplicação do DRSP para um diagnóstico de SPM com base nas suas diretrizes atuais requer um registro diário dos sintomas por pelo menos 2 meses. No entanto, essa exigência acaba limitando a sua aplicabilidade prática no dia a dia de atendimento de pacientes com sintomas pré-menstruais. TRATAMENTO Estratégias de manejo para pacientes com SPM só podem ser realizadas seguindo uma quantificação adequada dos sintomas e um diagnóstico acurado. O manejo inicial consiste em educação e orientação. As pacientes e seus familiares devem conhecer as características da SPM, pois ela é uma patologia endocrinoginecológica de causa incerta e não proveniente da imaginação da mulher. Apoio médico, empatia, discussão e paciência parecem ser bastante úteis. O tratamento deve ser individualizado, iniciando com intervenções no estilo de vida. Muitas mulheres obtêm alguma melhora com modificações dietéticas, por isso o aconselhamento nutricional é um componente da terapia. As modificações dietéticas são amplamente indicadas. Recomenda-se que as pacientes tenham alimentação equilibrada – proteínas, fibras e carboidratos adequados e baixa ingestão de gorduras saturadas; alimentos muito salgados ou muito doces devem ser evitados, pois podem produzir retenção hídrica e consequente desconforto. Bebidas como café, chá e à base de cola devem ser evitadas, pois são estimulantes, podendo agravar a irritabilidade, a tensão e a insônia. Também o álcool e outras drogas podem piorar os sintomas psicológicos. O exercício aeróbio pode elevar os níveis de endorfinas e, com isso, melhorar o humor. Várias evidências reforçam que a atividade física tem seu lugar no tratamento dos sintomas pré-menstruais. Ainda que essas medidas careçam de estudos para determinar seu real papel no tratamento da SPM, são extremamente válidas como orientação global de saúde e devem ser recomendadas às pacientes. As opções de tratamento medicamentoso seguem duas linhas: - Aquela que influencia o sistema nervoso central (particularmente moduladores do neurotransmissor serotonina); - Aquela que suprime a ovulação. Estudos indicam que a maioria das pacientes utiliza alguma forma de medicina complementar, mesmo quando satisfeitas com seus tratamentos. Os ISRSs são considerados fármacos de primeira linha, eficazes e de boa tolerabilidade para o tratamento da SPM e do TDPM. Muitos estudos avaliaram a eficácia dos ISRSs no manejo da SPM e do TDPM, apresentando taxas de 60 a 90% de melhora, comparadas a 30 a 40% do placebo. Os medicamentos mais utilizados são citalopram, fluoxetina, paroxetina, sertralina e um inibidor seletivo da recaptação de noradrenalina (ISRN), a venlafaxina Os ISRSs podem ser usados de forma contínua ou intermitente, a partir do 15o dia do ciclo. O tratamento intermitente tem sido particularmente útil para sintomas de irritabilidade, labilidade emocional, e o tratamento contínuo, mais útil em tratamentos de quadros depressivos. Benzodiazepínicos Sedativos como os benzodiazepínicos (alprazolam na dose de 0,25 mg 2 ×/dia na fase lútea) fazem parte dos recursos terapêuticos da SPM e são comprovadamente eficazes, mas é preciso considerar os riscos de dependência e a rápida tolerância induzida por esses medicamentos. Eles estariam indicados em situações de extrema ansiedade,sempre com muito critério. Supressão da ovulação utilizando anticoncepcionais orais combinados Os ACOs eliminam a ciclicidade ovariana e poderiam ter eficácia terapêutica, principalmente para as mulheres com dismenorreia e mastalgia pré-menstrual, embora os resultados na literatura sejam controversos e não haja evidência de que possam aliviar os sintomas pré-menstruais. Uma possibilidade seria a tomada de ACO contínuo. A formulação contendo 30 µg de etinilestradiol + 3 mg de drospirenona tem sido considerada eficaz no tratamento dos sintomas pré-menstruais. RECOMENDAÇÕES Pacientes com critérios para SPM e TDPM devem ser inicialmente bem avaliadas por meio de anamnese, exame físico e, excepcionalmente, alguma avaliação laboratorial complementar. Caso haja suspeita de qualquer patologia psiquiátrica associada, a paciente deve ser encaminhada ao profissional de saúde mental para receber tratamento concomitante. Como os sintomas pré-menstruais são crônicos e recorrentes, o tratamento deve considerar os custos e as reações adversas. O manejo inicial deve abordar mudança de hábitos e dieta. O ACO contendo drospirenona mostrou-se efetivo para tratar os sintomas somáticos e físicos da TDPM, podendo ser indicado como primeira escolha. É possível que os ACOs, de maneira geral, quando utilizados de forma contínua, tenham benefício no alívio dos sintomas da SPM. Os ISRSs são comprovadamente eficazes para tratar SPM e TDPM. A sua utilização deve ser avaliada pelo médico após detalhada análise clínica.
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