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AMBULATÓRIO | Amanda Távora Dispepsia ou síndrome dispéptica é um conjunto de sintomas que acomete 20-40% da população e pode ser classificada em orgânica (associada à úlcera péptica ou qualquer outra patologia gastroduodenal, excetuando-se a gastrite) ou funcional. A dispepsia funcional pode vir associada à DRGE, à síndrome do cólon irritável e/ou à dor torácica não cardíaca. DEF: Distúrbio da digestão caracterizado por um conjunto de sintomas relacionados ao trato gastrointestinal superior, como dor, queimação ou desconforto na região superior do abdômen, que pode estar associado à saciedade precoce, empachamento pós-prandial, náuseas, vômitos, timpanismo, sensação de distensão abdominal, cujo aparecimento ou piora pode ou não estar relacionado à alimentação ou ao estresse A fisiopatologia da DF permanece desconhecida e, da mesma forma que em outros distúrbios funcionais, uma série de anormalidades fisiológicas e psicológicas tem sido identificada, embora sua real importância seja controversa. Vários fatores etiológicos são considerados como hipersecreção ácida, alterações da motilidade gastroduodenal, da sensibilidade visceral, da acomodação gástrica, fatores psicossociais, além de gastrite associada ao Helicobacter pylori. Importante salientar que, em alguns pacientes, vários desses fatores etiopatogênicos podem estar presentes e, atualmente, acredita-se que uma combinação de fatores fisiológicos e psicossociais seja responsável pelo quadro clínico. Tabagismo, etilismo e uso de anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) não são considerados fatores de risco de DF. Contudo, os pacientes portadores de DF apresentam maior probabilidade de desenvolver sintomas quando tratados com AINEs. Alguns novos mecanismos fisiopatológicos têm sido propostos, como dispepsia pós-infecciosa (sintomas surgem após episódio de gastrenterite, particularmente depois de surtos de salmonelose), presença de inflamação crônica no duodeno (infiltração eosinofílica) e fatores genéticos. O gene GN beta-3 tem sido associado com frequência à DF e este é um caminho promissor para o entendimento da síndrome. Dieta Muitos pacientes com DF relatam que determinados alimentos, especialmente os gordurosos, as frutas cítricas, os condimentos, o café e o álcool, promovem o aparecimento de seus sintomas, porém existem poucas evidências de que esses alimentos possam sempre originar os sintomas dispépticos. Um estudo envolvendo 12 pacientes cuja sintomatologia dispéptica era diretamente relacionada com a ingestão de alimentos gordurosos foi incapaz de reproduzir sintomas semelhantes ao serem oferecidos os mesmos alimentos, mas de forma disfarçada e não identificada. Nos casos mais refratários, é importante avaliar a possibilidade de intolerância à lactose e ao glúten (doença celíaca ou apenas hipersensibilidade ao glúten), especialmente em pacientes com sintomatologia agravada pela alimentação. Secreção gástrica de ácido Tem sido demonstrada a inexistência de relação causal primária entre a secreção gástrica de ácido e a DF. Tanto a secreção basal de ácido quanto a secreção máxima de ácido pelo estômago são normais nos dispépticos, quando comparados com indivíduos assintomáticos, não havendo evidências de que haja um subgrupo de hipersecretores. Vários estudos, no entanto, sugerem que alguns dispépticos funcionais possam ter uma sensibilidade exagerada a infusões intragástricas de ácido, AMBULATÓRIO | Amanda Távora enquanto, em outros, a injeção de pentagastrina se associa à maior frequência de episódios dolorosos. Além disso, ensaios terapêuticos controlados sugerem que alguns pacientes melhoram com antiácidos e/ou antissecretores. Motilidade gastroduodenal Existem inúmeras evidências de que a motilidade gastrintestinal é anormal em uma grande parcela de pacientes com DF. Malagelada e Stanghellini encontraram distúrbios de motilidade em 72% dos pacientes dispépticos estudados, e mais da metade destes pacientes apresentavam dismotilidade gástrica isolada; em aproximadamente 40%, observaram-se alterações gástricas e intestinais associadas. A contribuição de anormalidades motoras na geração de sintomas, no entanto, não é completamente estabelecida. Distúrbio motor (tipicamente retardo) do esvaziamento gástrico de sólidos é a alteração motora mais estudada na dispepsia. Para responsabilizar as alterações motoras pela sintomatologia dispéptica, seria necessária, no entanto, a observação temporal direta, ou seja, a ocorrência simultânea do distúrbio motor e do sintoma, o que raramente é observado. Além disso, é também discutível o fato de a dismotilidade ser constante e os sintomas intermitentes. A importância clínica desses achados é, dessa forma, muito controvertida, e a presença de sintomas sugestivos de dispepsia tipo dismotilidade não indica, com segurança, que esses pacientes tenham dismotilidade gastroduodenal e que possam beneficiar-se com drogas procinéticas. Gastrite crônica e Helicobacter pylori O papel da infecção pelo H. pylori em pacientes com DF permanece controvertido, mas os resultados de metanálises recentes sugerem um pequeno benefício com a erradicação da bactéria em pacientes infeccionados. Embora o microrganismo seja encontrado em cerca de 50% dos pacientes portadores de dispepsia funcional, tal prevalência não é significativamente superior àquela observada em grupos-controles adequadamente pareados. Alguns estudos demonstram que esta infecção é mais prevalente entre os dispépticos tipo úlcera do que entre aqueles com dispepsia tipo dismotilidade ou inespecífica, sugerindo a possibilidade de que existam mecanismos fisiológicos distintos e que o H. pylori possa ter importância na patogenia de subgrupos de dispépticos funcionais. A erradicação do H. pylori acompanha-se quase sempre de normalização histológica da mucosa gástrica, mas o efeito sobre a sintomatologia dispéptica é, no mínimo, muito controvertido. QUADRO CLÍNICO Dispepsia ou síndrome dispéptica é um conjunto de sintomas que acomete 20-40% da população e pode ser classificada em orgânica (associada à úlcera péptica ou qualquer outra patologia gastroduodenal, excetuando-se a gastrite) ou funcional. A dispepsia funcional pode vir associada à DRGE, à síndrome do cólon irritável e/ou à dor torácica não cardíaca. Os sintomas da dispepsia são: epigastralgia (“tipo úlcera”), desconforto epigástrico, náuseas, vômitos, saciedade precoce, plenitude pós-prandial, distensão abdominal e eructações. Os sintomas da dispepsia são: epigastralgia (“tipo úlcera”), desconforto epigástrico, náuseas, vômitos, saciedade precoce, plenitude pós-prandial, distensão abdominal e eructações. Tais sintomas podem ser agrupados em três padrões clínicos de dispepsia: AMBULATÓRIO | Amanda Távora Dispepsia “tipo úlcera”: predomina a dor epigástrica, frequentemente aliviada por antiácidos, bloqueadores H2 ou alimento, eventualmente despertando o paciente à noite. Tem caráter periódico (períodos dolorosos de semanas a meses, intercalados com remissões de, no mínimo, duas semanas). Dispepsia “tipo dismotilidade”: predomina o desconforto abdominal, além de saciedade precoce, náusea, peso epigástrico pós-prandial, vômito, sensação de gases no abdome sem distensão abdominal. Dispepsia “tipo inespecífica”: sintomas vagos e inespecíficos que não se enquadram nos dois tipos anteriores. O aparecimento da dispepsia ou sintomas dispépticos pode estar associado a vários distúrbios do trato gastrointestinal superior, como, por exemplo, doença ulcerosa péptica, doença dorefluxo gastrointestinal, gastrites, neoplasias do trato gastrointestinal superior, doença do trato biliar e dispepsia funcional. Dispepsia funcional ou dispepsia não ulcerosa ou síndrome dispéptica é uma desordem heterogênea caracterizada por períodos de abrandamentos e exacerbações, e seu diagnóstico é em geral empregado quando, em uma avaliação completa em um paciente que apresenta dispepsia, não se consegue identificar a causa para os seus sintomas. O mecanismo fisiopatológico ainda é desconhecido e o tratamento ainda não totalmente estabelecido DIAGNÓSTICO: Para o diagnóstico de dispepsia não ulcerosa, ou dispepsia funcional, são necessárias pelo menos 12 semanas de sintomatologia, não necessariamente consecutivas. Diversos estudos foram e estão sendo conduzidos para descobrir a patogênese da dispepsia não ulcerosa, contudo, existem mais dúvidas do que certezas. Atribuir os sintomas a determinados alimentos ou ao aumento da secreção gástrica de ácido clorídrico não parece ter respaldo nas observações de trabalhos controlados. Apesar de os mecanismos fisiopatológicos não estarem totalmente esclarecidos, diferenças relacionadas ao gênero foram observadas em vários estudos. Algumas investigações mostraram que há uma diferença na esfera psicossocial das mulheres com dispepsia, tanto relacionadas à sensação de bem-estar como com associação à história de abuso na infância ou adolescência quando comparados com homens com sintomas de dispepsia funcional. Diferenças relacionadas ao gênero também foram observadas em alguns estudos tanto de prevalência dos sintomas como em função motora proximal e esvaziamento gástrico anormal na dispepsia funcional.1-6 O efeito do gênero no mecanismo da dispepsia funcional, na apresentação dos sintomas e AMBULATÓRIO | Amanda Távora na resposta ao tratamento é uma área de crescente interesse e de vários estudos. Portanto, apesar de os mecanismos fisiopatológicos e a causa não estarem totalmente esclarecidos, parece haver algumas características específicas relacionadas ao gênero na dispepsia funcional.1-6 Esvaziamento gástrico lento ou gastroparesia primária ou idiopática é uma condição em que ocorre um retardo no esvaziamento gástrico na ausência de obstrução mecânica. Esta condição pode ocorrer em até 30% dos pacientes com diagnóstico de dispepsia funcional e pode contribuir para os sintomas. Alterações motoras no estômago são encontradas em 20-60% dos pacientes com dispepsia funcional, não se sabendo, contudo, a relação entre elas e os sintomas. As mais encontradas são: hipomotilidade antral, relaxamento fúndico inadequado, diminuição do número de complexos motores migratórios, hipermotilidade intestinal pós-prandial. O achado mais consistente nesses pacientes é a hipersensibilidade visceral, revelada pela distensão de um balão no interior do estômago. Os pacientes com dispepsia funcional apresentam maior sintomatologia com uma menor distensão, quando comparados ao grupo controle. Fatores psicossociais provavelmente possuem importante influência nesta alteração, regulando a integração neuronal ao longo do eixo cérebro-tubo digestivo. Embora cerca de 60% dos pacientes apresente gastrite crônica pelo H. pylori, esta cifra é semelhante à da população assintomática. Existe certa controvérsia a respeito da indicação de erradicação do H. pylori somente pela presença de dispepsia funcional, mas a maioria das referências atualmente recomenda o tratamento antimicrobiano neste contexto... Apesar de as drogas pró-cinéticas melhorarem a função motora, não há relação entre a alteração na função motora e a melhora dos sintomas na dispepsia funcional.7-9 Outros possíveis mecanismos fisiopatológicos sugerem distúrbios na acomodação gástrica ou relaxamento receptivo, hipersensibilidade à distensão gástrica, sensibilidade duodenal alterada a lipídios ou ácidos, motilidade duodenojenunal anormal, suscetibilidade familiar, alterações da função neuro-hormonal, disfunção autonômica, hipersensibilidade visceral a ácido ou distensão mecânica, infecção por Helicobacter pylori, infecções do trato gastrointestinal, co- morbidade psicossocial e estresse.1-15 H. pylori é uma bactéria espiralada Gram-negativa que pode estar presente no muco que cobre a superfície do estômago identificada por dois pesquisadores australianos em 1983, Warren e Marshall, ganhadores do prêmio Nobel de Medicina em 2005, por demonstrar que esta bactéria poderia ser a causa da doença ulcerosa péptica gastroduodenal.16 A confirmação da infecção do trato gastrointestinal por H. pylori pode ser dada pela pesquisa direta da bactéria no material coletado por endoscopia digestiva alta (histoquímica, cultura e reação em cadeia de polimerase) e por um teste indireto (teste rápido da urease), e também por testes que não exigem a endoscopia digestiva alta, que são o teste respiratório usando ureia marcada com isótopos C13 ou C14 e a pesquisa de anticorpos no sangue O papel da infecção do trato gastrointestinal por H. pylori na fisiopatologia dos sintomas na dispepsia funcional ainda não está bem esclarecido. Apesar de controverso, alguns autores têm recomendado prescrever medicamentos para a erradicação do H. pylori em pacientes com dispepsia mesmo na ausência de sintomas de alarme.14,15,22 Apesar de vários estudos epidemiológicos sugerirem uma incidência aumentada de infecção por H. pylori em países subdesenvolvidos, parece não haver nenhuma diferença estatística da melhora dos sintomas dispépticos após a erradicação H. pylori em pacientes com dispepsia funcional.23 Embora nenhum tratamento específico tenha sido estabelecido para tratar os sintomas da dispepsia AMBULATÓRIO | Amanda Távora funcional, vários medicamentos com o objetivo de aliviar os sintomas têm sido empregados como, por exemplo, drogas que inibem a secreção ácida, drogas pró-cinéticas, antibióticos indicados para a erradicação de H. pylori e antidepressivos, associados ou não. TRATAMENTO O tratamento da dispepsia funcional representa um dos maiores desafios dentro da gastroenterologia... Uma boa relação médico-paciente continua sendo determinante e fundamental no tratamento dos transtornos funcionais. A primeira conduta é tranquilizar o paciente quanto ao caráter benigno de seu quadro, sem desmerecer seus sintomas. Quanto à dieta, devemos respeitar as intolerâncias específicas de cada paciente. A saciedade precoce pode ser aliviada com o fracionamento das refeições e a plenitude pós- prandial, evitando-se alimentos gordurosos e condimentos. A psicoterapia tem bons resultados em um subgrupo de pacientes, especialmente quando os fatores emocionais parecem predominar. O tratamento farmacológico em geral é pouco eficaz quando comparado ao placebo! Vale ressaltar que o placebo pode melhorar transitoriamente 30-60% dos pacientes, mostrando a necessidade de se prescrever algum medicamento para eles... Como já enfatizamos, se o H. pylori estiver presente recomenda-se instituir o tratamento de erradicação da bactéria. Para os pacientes com dispepsia “tipo úlcera”, os bloqueadores H2 e os IBP se mostraram 20% superiores ao placebo, devendo ser prescritos por 1-2 meses. A domperidona (Motilium) 10 mg 12/12h tem sido o procinético mais recomendado na dispepsia “tipo dismotilidade”, por apresentar vantagens de menor toxicidade em relação à metoclopramida e à cisaprida. Os antidepressivos tricíclicos (amitriptilina, imipramina) e a fluoxetina, em baixas doses, mostraram eficácia em alguns estudos. A maneira mais apropriada de tratar o paciente é através de uma abordagem ampla e global, tentando identificar fatores desencadeantes ou agravantes da sintomatologia, inerentes a cada paciente. Uma boa relação médico-paciente continua sendofundamental. É necessário que os pacientes sejam esclarecidos de que seus sintomas são decorrentes de distúrbios funcionais e não caracterizam nenhuma doença grave ou risco de vida, assegurando-lhes que o problema será tratado de forma interessada e racional. Muitos pacientes obtêm melhora com simples mudanças em seu estilo de vida e adoção de hábitos salutares em seu cotidiano como a dieta mais saudável, atividade física regular e exercícios de relaxamento. Devemos sempre recomendar hábitos dietéticos saudáveis (comer devagar, mais vezes/dia, menor quantidade), evitando-se alimentos gordurosos, condimentados, ácidos, café, cigarro e álcool em excesso. O empachamento pós-prandial em geral melhora com a retirada de alimentos gordurosos da dieta, enquanto a saciedade precoce pode ser aliviada com o fracionamento das refeições. A utilização de medicamentos está indicada para as fases sintomáticas, cuja duração é variável, esperando-se pelos períodos de melhora clínica em que deverão ser suspensos. O tratamento medicamentoso preconizado visa a aliviar o sintoma predominante. Os fatores emocionais devem ser abordados em todos os grupos de pacientes, através de uma conversa franca e aberta, tentando também esclarecer ao paciente a provável associação de seus sintomas com distúrbios emocionais. Muitas vezes, está indicada a psicoterapia, ou outras técnicas que objetivem a redução do estresse, sendo observada AMBULATÓRIO | Amanda Távora excelente resposta em alguns subgrupos de pacientes. -Terapêutica atual O tratamento medicamentoso disponível visa principalmente a aliviar o sintoma predominante, e a estratégia terapêutica vai depender basicamente da natureza e intensidade da sintomatologia, do grau do comprometimento funcional e dos fatores psicossociais envolvidos. Inúmeros estudos demonstraram que a melhora clínica, durante e após o tratamento medicamentoso tradicional, ocorre em menos de 60% dos dispépticos, e em geral não se observa resposta uniforme a essa terapêutica. Sabemos que a DF é uma síndrome heterogênea e é frequente o relato concomitante de pirose ou sintomas gastrintestinais baixos, o que dificulta ainda mais a real interpretação dos resultados terapêuticos. Deve-se lembrar que a resposta ao placebo é, em geral, muito alta. Estudos controlados e duplo-cegos demonstram que o placebo é capaz de promover melhora dos sintomas em um grande número de pacientes (25 a 60%), indicando que a terapêutica com drogas nem sempre é necessária. Para o tratamento clássico da DF, podem ser utilizados diversos medicamentos, destacando-se, entre eles, antiácidos, drogas antissecretoras, procinéticos, antibióticos para erradicação do H. pylori, ansiolíticos e antidepressivos. Os antissecretores são drogas seguras e se constituem em medicação de primeira linha para os pacientes com síndrome da dor epigástrica. Tanto os bloqueadores H2 como os inibidores da bomba de prótons são amplamente prescritos e recomendados como terapêutica de primeira linha. Recente metanálise sugere que os inibidores da bomba de prótons devem ser os escolhidos, pois se mostram mais eficazes no alívio da dor ou queimação epigástrica. Devem ser utilizados na dose padrão, 1 vez/dia. Tem sido demonstrado que a prescrição de doses mais elevadas não melhora a resposta terapêutica nos pacientes com DF. Os procinéticos se mostram superiores ao placebo em vários ensaios clínicos, estando indicados em especial para os pacientes portadores da síndrome do desconforto pós-prandial. Esses medicamentos (metoclopramida, domperidona, bromoprida, cisaprida, neostigmina, ondasetron e tegaserode, além dos motilíneos derivados da eritromicina) são potencialmente capazes de melhorar vários parâmetros da motilidade gastroduodenal ao aumentar o tônus gástrico, a motilidade antral e, sobretudo, a coordenação antroduodenal, além de alguns deles serem capazes também de relaxar o fundo gástrico. AMBULATÓRIO | Amanda Távora A melhora dos sintomas com o emprego dessas drogas tem sido de 20 até 45 pontos percentuais maiores que na do placebo, e os procinéticos devem ser indicados, de maneira especial, para pacientes com sintomas de empachamento pós-prandial. Entretanto, Moayyedi et al., em um estudo de metanálise, observaram inúmeras falhas metodológicas ao avaliar 19 ensaios clínicos que utilizaram procinéticos na DF, o que dificulta conclusões sobre a real eficácia dessas drogas no alívio dos sintomas dispépticos. A decisão de erradicar o H. pylori em pacientes dispépticos funcionais deve sempre levar em consideração o custo/benefício dessa opção terapêutica. Em se optando pela erradicação, o esquema terapêutico mais utilizado continua sendo IBP na dose-padrão, claritromicina (500 mg) e amoxicilina (1 g) antes do café da manhã e antes do jantar, durante 7 dias. Resultados bastante promissores têm sido obtidos com o emprego de antidepressivos tricíclicos (amitriptilina, desipramina e imipramina) e daqueles que atuam predominantemente na inibição da captação de serotonina dos neurotransmissores (fluoxetina, paroxetina, sertralina e citalopram). Esses medicamentos têm sido utilizados por apresentarem ação analgésica central, sendo capazes de bloquear a transmissão da dor do trato digestivo para o cérebro. Em recente estudo, a venlafexina, no entanto, não se mostrou mais efetiva do que o placebo nesses pacientes. A insatisfação com a limitada resposta às terapias convencionais utilizadas para o tratamento da DF tem estimulado, nos últimos anos, pacientes e médicos a buscarem terapias não convencionais que possam ser mais eficazes do que aquelas tradicionalmente utilizadas. O tratamento psicológico (hipnose, psicoterapia e terapia cognitiva comportamental) e/ou as terapias alternativas (ervas chinesas, japonesas e indianas, acupuntura e probióticos) devem ser considerados para pacientes com sintomas mais graves, para os que não respondem ao tratamento farmacológico e para aqueles com doenças psiquiátricas associadas. A escola de Manchester, na Inglaterra, tem relatado resultados animadores com hipnose no tratamento da DF. É necessário ressaltar que a maioria dos estudos realizados empregando esse tipo de intervenção terapêutica não foi randomizada, controlada com placebo e, nem tampouco, apresenta desenho metodológico adequado, o que dificulta qualquer conclusão sobre a possível eficácia desse tratamento na dispepsia funcional. O gastrenterologista deve, no entanto, sempre incentivar a prática de atividades ou técnicas que envolvam relaxamento físico e mental, como ginástica, ioga ou caminhadas, respeitando obviamente as preferências de cada paciente. -Terapias futuras Os novos conhecimentos fisiopatológicos têm propiciado o direcionamento das pesquisas na busca de novos fármacos capazes de atuar sobre a motilidade do TGI (exercendo um efeito procinético) e/ou sobre a hipersensibilidade visceral (reduzindo o limiar de sensibilidade), resultando teoricamente em melhora global dos sintomas. É nítida, entretanto, a lacuna ainda existente entre a pesquisa básica e a prática médica constatada pela escassez de novos fármacos liberados para comercialização. Atualmente, as principais drogas em investigação são os novos procinéticos, agentes serotoninérgicos, receptores opioides e analgésicos viscerais. Dentre os procinéticos, estudos promissores empregando mosaprida ou tegaserode demonstraram normalização do esvaziamento gástrico nos pacientes com DF. Metanálise publicada recentemente sugere que a mosapridaé superior à AMBULATÓRIO | Amanda Távora cisaprida no tratamento da DF. Outras drogas como o itopride e a levosulpirida mostraram eficácia similar à de procinéticos tradicionais em pacientes com dispepsia tipo dismotilidade. A fedotozina, droga que atua nos receptores káppa opioides, foi testada em um estudo multicêntrico preliminar e se mostrou superior ao placebo no alívio dos sintomas dispépticos. Outro agonista káppa opioide, a asimadolina, demonstrou ser eficaz em reduzir a plenitude pós-prandial e a saciedade precoce em voluntários saudáveis, mas estes achados não foram reproduzidos em pacientes com DF após 8 semanas de acompanhamento. Uma excelente revisão sobre novos procinéticos foi publicada recentemente e trouxe grande otimismo quanto à disponibilização de novas drogas capazes de atuar tanto na motilidade digestiva como no relaxamento do fundo gástrico. Entre essas drogas, a acotiamida, os derivados da motilina e da grelina têm se mostrado eficazes em ensaios iniciais e poderão se constituir, em breve, uma nova classe de procinéticos. Novos medicamentos serotoninérgicos também estão sendo testados. O alosetron demonstrou ser superior ao placebo (54% vs. 43%) no alívio dos sintomas em mulheres portadoras de DF. Outras promissoras drogas são as que atuam nos receptores do sistema nervoso aferente como os antagonistas purinoceptores e antagonistas dos receptores N-metil-D-aspartato (dextrometorfan, cetamina e memantina) potencialmente capazes de reduzir a dor visceral em resposta à distensão em animais de experimentação. Receptores capazes de modular a mucosa gastroduodenal e a função do músculo liso, como a capsaicina, que é um potente agonista, apresentam grande potencial terapêutico. Outras substâncias estão sendo avaliadas em vários centros de investigação como os receptores do canal de sódio, os antagonistas da colecistocinina (loxiglumide, dexloxiglumide), os antagonistas NK1 e NK3 e os receptores da somatostatina (estudos iniciais demonstram que o octreotídio é capaz de reduzir a sensação de plenitude gástrica em voluntários sadios). Também estão em desenvolvimento drogas capazes de prevenir a sensibilização central, como os antagonistas do receptor 1 PGA-2 (EP-1). Estudo duplo-cego, randomizado e controlado demonstrou significativa superioridade do citrato de tandospirona (agonista 5-HT1A) sobre o placebo no alívio dos sintomas em pacientes dispépticos funcionais.
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