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Desastre Perfeito_ Ato I (Serie - Amanda Maia

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Prévia do material em texto

Copyright © 2020 Amanda Maia
DESASTRE PERFEITO
SÉRIE THE RECKLESS 2
1ª Edição
 
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte dessa obra poderá ser
reproduzida ou transmitida por qualquer forma, meios eletrônicos ou
mecânico sem consentimento e autorização por escrito do
autor/editor.
 
Capa: Thais Alves
Revisão: Carla Santos
Diagramação: April Kroes
 
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e
acontecimentos descritos são produtos da imaginação do autor(a).
Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.
 
TEXTO REVISADO SEGUNDO O ACORDO ORTOGRÁFICO
DA LÍNGUA PORTUGUESA.
 
 
Playlist
Nota da autora
Prólogo
PARTE I
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
https://calibre-pdf-anchor.a/#a8
https://calibre-pdf-anchor.a/#a11
https://calibre-pdf-anchor.a/#a16
https://calibre-pdf-anchor.a/#a22
https://calibre-pdf-anchor.a/#a26
https://calibre-pdf-anchor.a/#a32
https://calibre-pdf-anchor.a/#a38
https://calibre-pdf-anchor.a/#a44
https://calibre-pdf-anchor.a/#a50
https://calibre-pdf-anchor.a/#a57
https://calibre-pdf-anchor.a/#a63
https://calibre-pdf-anchor.a/#a69
https://calibre-pdf-anchor.a/#a75
https://calibre-pdf-anchor.a/#a81
https://calibre-pdf-anchor.a/#a88
https://calibre-pdf-anchor.a/#a95
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
PARTE II
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
https://calibre-pdf-anchor.a/#a105
https://calibre-pdf-anchor.a/#a112
https://calibre-pdf-anchor.a/#a119
https://calibre-pdf-anchor.a/#a125
https://calibre-pdf-anchor.a/#a131
https://calibre-pdf-anchor.a/#a135
https://calibre-pdf-anchor.a/#a141
https://calibre-pdf-anchor.a/#a150
https://calibre-pdf-anchor.a/#a156
https://calibre-pdf-anchor.a/#a163
https://calibre-pdf-anchor.a/#a170
https://calibre-pdf-anchor.a/#a177
https://calibre-pdf-anchor.a/#a190
https://calibre-pdf-anchor.a/#a197
https://calibre-pdf-anchor.a/#a209
https://calibre-pdf-anchor.a/#a218
https://calibre-pdf-anchor.a/#a226
https://calibre-pdf-anchor.a/#a239
https://calibre-pdf-anchor.a/#a245
https://calibre-pdf-anchor.a/#a253
https://calibre-pdf-anchor.a/#a259
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Agradecimentos
Biografia
 
 
https://calibre-pdf-anchor.a/#a267
https://calibre-pdf-anchor.a/#a277
https://calibre-pdf-anchor.a/#a285
https://calibre-pdf-anchor.a/#a293
https://calibre-pdf-anchor.a/#a302
https://calibre-pdf-anchor.a/#a308
https://calibre-pdf-anchor.a/#a314
https://calibre-pdf-anchor.a/#a328
https://calibre-pdf-anchor.a/#a331
 
SPOTIFY
 
 
 
https://open.spotify.com/playlist/2MPBfahnnpozCpCGBM8mQX?si=why0SbPhSPSPRGiUqOBUpw
 
 
Contém cenas de sexo, palavras impróprias, uso de álcool e drogas,
violência e gatilhos emocionais.
Leitura recomendada para maiores de 18 anos.
 
 
 
 
Mais um livro da série The Reckless que vocês começam, mas antes
gostaria de escrever para os leitores que vão iniciar essa leitura.
Se é seu primeiro contato com a série, seja bem-vindo(a). Os leitores do
primeiro livro e que, em seguida, foram ler o segundo no Wattpad
(@amandamaiabooks) se autonomearam como Recklovers.
É o nome que os fãs da série escolheram para se chamar no fandom e eu
amei demais, acabei aderindo! É por esse motivo que vocês sempre me veem
chamando meus leitores de Recklovers no Twitter e Instagram
(@amandamaiabooks).
Quero dizer também que, apesar de ser recomendado que você leia
Sintonia Perfeita antes de ler Desastre Perfeito: Ato I, não é uma
obrigatoriedade; então, se esse é o caso, pode seguir em frente, só tenho um
alerta para te fazer: é possível que você pegue alguns spoilers do primeiro livro.
Se você não se importar com isso, basta seguir adiante (mas termine de ler
essa nota, por favor).
Minha segunda explicação para essa nota é a respeito da divisão do livro.
Não sei se todos os leitores que me acompanham sabem, mas cada livro da
série The Reckless contará a história de um integrante da banda. O primeiro
livro é sobre Bryan e Mackenzie; o segundo (este que vocês lerão a seguir)
Aidan e Delilah.
Sintonia Perfeita é o maior livro que eu escrevi em toda a minha carreira e,
inicialmente, relutei para dividir as histórias. Eu queria que houvesse apenas um
único volume para cada integrante, a ideia era fazer com que Desastre Perfeito
fosse menor, mas, conforme ia escrevendo, percebi que não dava para cortar
nenhum acontecimento.
Todos são extremamente importantes para o desenvolvimento dos
personagens e suas evoluções, além de, claro, cada livro contar a ascensão da
banda. Eu não podia simplesmente ignorar todos esses acontecimentos.
Então aconteceu: Desastre Perfeito começou a ficar maior que o previsto e
devido às críticas do primeiro volume (por ser muito grande) optei pela divisão
dele.
Ficou dividido em duas partes: Desastre Perfeito: Ato I e Desastre Perfeito:
Ato II.
A previsão de lançamento para o Ato II é fevereiro de 2021, mas,
eventualmente, pode acontecer de eu precisar alterar. De qualquer forma, achei
interessante informar a vocês que a história de Aidan e Delilah não termina
nesse livro e que aguardem pacientemente para o desfecho final.
Dadas às explicações, quero desejar uma boa leitura!
Com amor,
Amanda Maia.
 
P.S.: Todas as cidades e lugares citados neste livro são fictícios, criados por
mim para uso exclusivo da série!
 
 
 
21 DE ABRIL DE 2015
 
Dezessete segundos é o que você e eu temos de diferença de idade,
Delilah. Desde que éramos crianças, estivemos destinados a proteger um ao
outro. Você sabe que muitas vezes senti que Deus havia nos abandonado e que
duas crianças inocentes pagavam pelos pecados de outra pessoa.
Não importava quantas vezes tentasse entender o nosso pai, ainda não
conseguia encontrar justificativas para as escolhas que ele fazia. Na primeira
vez que o vimos agredir nossa mãe, mesmo que tenha sido só um tapa de nada,
como ele disse, foi quando nós entendemos a que par estava nossa situação. A
vida por nenhum segundo foi justa conosco, não é?
Sou dezessete segundos mais velho que você e não sei por que merda é
sempre você quem me protege. Sei que seu relacionamento com Bryan é algum
tipo de escape, que você sequer gosta dele de verdade. Ele é o garoto que
supre toda a carência que tem no seu coração. Só espero que você perceba a
tempo, porque eu sei disso, porque te conheço. Toda aquela baboseira de
gêmeos é verdade. Você não tem brilho nos olhos. Você só se agarra a ele
como um bote salva-vidas. E não estou dizendo isso porque senti algo parecido
como amor por Bryan. Não, seu namorado é incrível, sim. Mas cacete, Delilah,
você não o ama. Entenda isso antes que seja tarde demais, tá?
Mas não estou te escrevendo essa carta para falar sobre Bryan. Estou aqui
para falar sobre nós.
Seria muito piegas se dissesse: se está lendo essa carta significa que estou
morto?
Definitivamente, este é o caso. São quase dez da noite e consigo ouvir o
som da sua tevê ligada no quarto ao lado. Te escrevo essa carta, mas tem uma
grande chance de você nunca a encontrar ou até mesmo de não ser necessário.
Mas se este for o caso, quer dizer que mudei de ideia e nada de ruim aconteceu
comigo. Dizem que as pessoas escrevem esse tipo de carta com a intenção de
se despedir, no meu caso, só estou lhe escrevendo porque gostaria de te contar
umas coisas que ainda não sabe.
Estou um pouco nervoso, mas lá vai:
Não é segredo para ninguém que nos últimos meses nos distanciamos, e,
puta merda, Lilah, não era exatamente isso que eu queria. Mas, sei lá, chegou
num nível onde não sentia mais vontade de estar tão preso a você. Não significa
que deixei de te amar. Não. Seria impossível. Sei que muitas vezes você sente
queestá me perdendo para Mackenzie e Effy, mas não consigo imaginar alguém
que eu possa amar mais do que amo você. Então, se em algum momento sentiu
que você significava menos que meu tudo, eu lamento, porque provavelmente é
minha culpa. Escondo coisas de você, mas não é por mal.
É que durante toda a minha vida sinto que estive buscando ser o melhor
exemplo de força e superação para você. O peso de ser dezessete segundos
mais velho fez toda a diferença nos meus esforços e durante os meus quatorze
anos de vida, tenho tentado demais ser o melhor irmão do mundo. Está mais do
que na cara que não consegui te proteger, afinal nosso pai conseguiu
engalfinhar suas garras tóxicas no seu coração, te transformando numa garota
insegura e carente, às vezes, obcecada e possessiva.
Você tem medo do abandono.
Tem medo de ficar sozinha.
Por causa da personalidade dele, não se acha digna do amor de ninguém.
Mas você está enganada mais uma vez. Você não só é digna do amor,
como o merece. Mais do que qualquer pessoa que eu conheça, Lilah. Quero te
ver feliz, independente do lugar onde eu esteja, quero que saiba que não há
nada nesse mundo que eu deseje mais do que a sua liberdade.
É aqui que entra uma coisa mais louca ainda e espero que não me odeie
por ter escondido mais uma coisa de você, só não queria uma nova carga em
seus ombros. Mas, se eu não estiver mais aqui, cabe a você continuar o que
comecei.
Meses atrás comecei a pensar que, se eu descobrisse mais sobre nosso
pai, poderíamos viver uma vida de compreensão. Você sabe, quando alguém
passa por momentos difíceis e precisa de todo o apoio que a família puder lhe
dar. Fiquei imaginando que talvez houvesse uma explicação para as ações dele.
Por que é tão obcecado por política e poder? Por que essa necessidade de
estar no comando de Humperville?
Delilah, para mim eram perguntas sem nenhuma resposta e não conseguia
mais pregar os olhos.
Acha que papai me bateu por que descobriu que eu era gay?
Não.
Ele me bateu porque descobri seu segredo.
 
 
 
31 DE AGOSTO DE 2019
 
— Quero te perguntar uma coisa — Mackenzie ergue os olhos
para mim, consigo fisgar sua atenção.
Ela pode não perceber, mas sob cada camada de tecido das
minhas roupas, estou tremendo. Faz meses que estou a fim dela,
que não durmo, que sua presença ilusória me visita à noite me
impedindo de ter paz.
— Claro. Se não for “quer sair comigo”, por mim tudo bem.
Ela ri. É inocente, entretanto. Não está tentando zombar de mim
ou me deixar desconfortável. Mack não é assim. É uma garota doce,
gentil e determinada. Todas as características que me fizeram
gostar dela a cada dia; e, quanto mais tempo passamos juntos, mais
ela ganha espaço no meu coração. Deveria refrear esses
sentimentos. Eu sei que, numa escala de zero a dez, a chance de
ela dizer sim, é de cinco, contudo, estou disposto a arriscar.
— Ah. Ok. Era isso.
Seus ombros murcham em desânimo. Detesto vê-la chateada.
Fiz tudo que esteve ao meu alcance nos últimos tempos para ser
um bom amigo e apoiá-la, mas ela me ancorou na “friendzone”.
— Já que você estragou o clima... — Dou de ombros,
demonstrando indiferença. Posso ser o mestre dos disfarces,
manter minhas emoções sob controle e não expelir na hora errada o
que estou sentindo, portanto, ela não percebe que sua fala de
segundos atrás me afetou. — Sou a fim de você desde aquele dia
na casa do Jasper.
É. Ela estava sentada à escada, perdida, cabisbaixa, como se
aquele não fosse seu lugar. Assim que seus olhos cruzaram os
meus, senti uma profunda conexão. Eu a quis imediatamente, tanto
quanto meus pulmões precisam de ar.
Seus pais perceberam, seu irmão notou, seus vizinhos
testemunharam cada olhadela que lancei para essa garota durante
todo aquele dia, mas Mack estava ocupada demais pensando em
lidar com Bryan, porque ela está sempre em busca de maneiras de
superar o que sente por ele. Mesmo que nunca estiveram juntos
num relacionamento, é óbvio que a história dos dois não pode ser
superada. Não é o que estou tentando fazer.
Quero um espaço no coração dela, que se permita gostar de
mim de verdade, sem restrições, sem hesitar.
— Impossível, Aidan. A gente mal se conhecia. Você olhou para
mim por, sei lá, dois segundos? — Coloco as mãos nos bolsos da
calça, me impedindo de tocá-la. As pontas dos meus dedos estão
formigando de vontade. — Eu não sou assim. Não fico a fim de
alguém depressa e não esqueço de repente. Leva tempo.
— Você não me deu uma chance. — Dou um passo adiante,
diminuindo poucos centímetros nossa distância. — Uma — repito,
tirando uma de minhas mãos do bolso e ergo o indicador na frente
do rosto. — Eu sei que você não é assim, que é diferente e é por
isso que eu gosto de você.
— Aidan…
— Deixa eu terminar — peço, virando a mão com a palma para
a frente diante do seu rosto. Ela aperta os lábios com firmeza,
atendendo à minha súplica. — Sou seu amigo. Adoro o que nós
temos. Mas preciso de mais, Mackenzie. Não sei como dar o
próximo passo com você, fico nervoso — rio, porque é mesmo
engraçado. — Então pensei que, se eu fosse direto, facilitaria para
mim e para você. Sem rodeios. Sem muitas palavras. Só eu dizendo
claramente que quero ficar com você, se me der uma chance.
Sua cabeça cai para o lado, me estudando. Eu gostaria de
saber o que ela está pensando, se está cogitando. Gostaria que
estivesse, que sua hesitação fosse um sinal para eu dar um passo à
frente, seguir meu instinto natural e beijá-la.
Foco seus lábios macios, prensados um no outro. Sua
respiração falha, as rajadas irregulares de ar que saem de suas
narinas expandidas me fazem dar um passo adiante. Arrisco,
porque é melhor tentar do que continuar fracassando em não pensar
na sua boca.
Cada passo que dou em sua direção, sinto que estou prestes a
vacilar. Posso recuar porque não quero fazer nada que ela não
queira.
Portanto, eu espero.
Ela umedece os lábios, arquejando o ar.
Vou beijá-la.
Então ela deixa.
O começo é um toque inocente. Apenas a sinto. Toco
suavemente sua boca e, devagar, busco por autorização
pressionando a língua nos seus lábios. Ela cede e a outra mão
estocada no bolso da minha calça ruma para a sua cintura, enfim,
excluindo a distância que nos separa.
Ela retribui o beijo.
Puta merda! Sua boca é ainda mais macia e doce que imaginei.
Estou ponderando, com medo de que seja um sonho. Eu a toco,
mas não exatamente com a necessidade exploratória que tem
circulado meus desejos. Calculo onde posso colocar minha mão, de
modo que, se ela quiser parar, eu recue rapidamente.
Costumo ser calmo quando beijo uma garota. Saboreio o
momento e com Mackenzie é ainda mais lento.
Porém, uma fração de segundo é suficiente para eu sentir seu
corpo esfriando em contato com o meu. Agarra meus braços com
leveza e suavemente, me afasta.
— Desculpa — pede, constrangida. — Não dá, Aidan.
— Eu fiz algo errado?
— Não. Você não fez nada errado. — Ela cruza os braços e
toca a ponta do indicador nos próprios lábios.
Fecha os olhos, inspirando profundamente.
— Acho que esse é o problema. Você é tão… perfeito.
Eu a encaro, curioso.
— Você nunca erraria comigo. Se esforçaria demais para não
me machucar. E se esforçaria tanto, com medo de errar em cada
passo estando ao meu lado, que acho que nunca te conheceria
como homem de verdade. Não saberia dizer quais são seus defeitos
e suas qualidades, porque você parece sempre tão perfeito para
mim. Eu tenho medo de que se torne artificial, tentando esconder
suas falhas. — Ela para por um instante antes de continuar: —
Ninguém é perfeito, Aidan. As pessoas cometem erros. Magoam
quem elas amam. E está tudo bem. É isso que faz com que a gente
aprenda a dar valor e seja sincero. — Fico mais confuso, arqueando
as sobrancelhas. — Não estou dizendo que você não é sincero,
mas, comigo, tenho a impressão de que tem medo de ser
verdadeiro e isso acabar pesando em como me sinto sobre você.
Sou sempre sincera, eu digo como me sinto e tudo o que penso;e
mesmo que se machuque, você não se defende. Você deixa que eu
te magoe. Por quê?
Não respondo imediatamente.
Não tenho resposta para essa pergunta.
— Porque você quer que eu te ame a qualquer custo.
— Não é verdade.
— É sim, Aidan. Você sabe que é. — Mackenzie dá um passo à
frente, em busca das minhas mãos. — Sobre o que eu falei hoje
mais cedo no café, você claramente discordou de mim, não é?
— Não sei do que você está falando.
— Você não concorda comigo sobre seu pai. Sobre Dannya ou
Gravity, mas não tenta defender seus motivos porque não quer
discordar de mim.
— Mas não anula o fato de você ser uma pessoa incrível — ela
diz, acariciando meu queixo. Aperto os olhos sob seu toque. — Você
e eu somos tão bons juntos, como amigos. Acho que nunca fui clara
com você sobre minhas intenções. Deixei que pensasse que
teríamos alguma chance porque estava sendo egoísta, gosto de me
sentir exclusiva e importante para você.
Permaneço em silêncio, embora as palavras estejam
arranhando minha garganta.
— Aidan?
— Por que eu tenho a sensação de que tem a ver com Bryan e
acabei ficando no meio de vocês dois?
— Nós ficamos juntos ontem.
O choque me faz dar um passo para trás, estremeço com sua
voz chegando à minha consciência.
— Ontem? Na festa?
Ontem deram uma festa de inauguração para o seu
apartamento novo. Ela, Effy, Gravity – irmã de minha madrasta – e
estive com ela instantes antes de deixá-la sozinha.
— Depois dela.
Puxo os fios de cabelo, bufando. Estou irritado com Bryan e
nem sei se tenho o direito. Nós falamos sobre Mackenzie. Ele disse
que não estava interessado e não precisei fingir, fui honesto, avisei
que eu estava.
Nós somos parte de um grupo, uma banda de rock alternativo
que, aos poucos, ganha espaço na cidade. Nossa lei é que as
garotas nunca estejam acima dela, mas, olha só para mim,
sentindo-me traído por ele ter ficado com a garota que eu gosto. E o
pior é que ele sabia.
— Não acredito que ele fez isso.
— Ele não fez nada, Aidan. Nós fizemos.
— Ele sabia que eu estava a fim de você.
— Assim como você sabia que Bryan sempre esteve a fim de
mim.
Fecho os lábios numa linha dura.
Decido que não vou discutir com ela, porque, apesar de estar
magoado, não vou feri-la para me sentir melhor.
Bryan sempre falou de Mackenzie com descontentamento,
como se não suportasse ficar no mesmo ambiente que ela por muito
tempo.
Os dois foram amigos na adolescência. Estudaram no mesmo
colégio, ele a protegia tanto quanto ela o protegia, no entanto, eles
tiveram problemas. Milhares deles. Do tipo que não consegue
consertar com uma conversa e pedido de desculpas. Foi necessário
distância, tempo e espaço para que ambos digerissem a dor.
Agora estou parado na frente da garota que meu melhor amigo
provavelmente gosta e a deixando partir o meu coração também.
— Sinto muito, Aidan. Não quis te magoar — é tudo que ela diz.
— Eu...
Ela dá um passo para a frente, a mão estendida para me tocar.
Estou quase sentindo o calor da sua mão em minha pele.
Mas ela é interrompida.
As luzes dos postes oscilam até que sejamos atingimos por um
manto de escuridão, seguida de um disparo agudo vindo de dentro
do salão de festas, onde está acontecendo o baile de recepção aos
calouros na universidade.
Um filme começa em minha cabeça. Meu pai. Meus amigos.
Todos que eu amo estão lá dentro.
Não conheço o som do disparo de uma arma, não faço ideia da
diferença entre o barulho de um tiro e um foguete, mas a
consciência não precisa de muito entendimento para os fatos.
Uma sequência de gritos em agonia irrompe na frente do prédio,
as pessoas fogem ao passo em que estou correndo para a direção
oposta, direto para onde o som ensurdecedor se originou.
 
 
Bryan uma vez me disse que minha força está concentrada na
minha família e acho que ele tem razão.
O ferimento do meu pai não foi grave; um tiro no ombro
esquerdo e precisou operar para retirar os estilhaços da bala, mas o
que estou sentindo é como se meu mundo tivesse sofrido um
terremoto.
Minhas mãos estão meio manchadas com o sangue porque
segurei a mão dele na ambulância, o sangue começou a secar, só
não consegui me mover ainda.
Por alguma razão, sabia que aquele som agudo perfurando meu
tímpano era um alerta para eu correr para o meu pai. Há meses
venho dizendo que ele precisa de proteção, que precisa de cuidado.
Darnell Lynch é um dos homens mais ricos de Humperville, sendo
assim, é difícil competir com ele nos negócios. E ao longo dos anos,
em busca de credibilidade, ele fez inimigos. Muitos deles.
Meu pai não é uma pessoa ruim, não acredito que ele tenha
enriquecido e conquistado seu espaço no seu empreendimento
fazendo barganhas ilegais, contudo, acredito que Humperville se
corrompeu. O dinheiro gera ambição e onde existe obsessão por
poder, existem pessoas ruins.
Eu o vi desmaiado em uma poça de sangue, as mãos de Bryan
pressionavam a lesão para tentar parar o sangramento. Ele acabou
com as roupas imundas com o sangue do meu pai.
Willa recosta a cabeça em meu ombro, saio do transe em que
estou ao sentir sua bochecha quente e úmida de baba me usar de
travesseiro. Estreito os olhos, as pálpebras escuras de maquiagem
da minha irmã estão fechadas levemente. A inspiração encorpada
me diz que caiu num sono profundo.
Cubro sua cabeça com minha mão, alisando a massa de
cabelos pretos.
O ar denso cheira a água sanitária e pó látex, o típico odor de
hospital.
Passei parte da noite com o celular na mão. Estou tentado a
enviar uma mensagem para ela porque, apesar do que aconteceu
entre nós instantes antes do meu mundo virar de cabeça para baixo,
ela continua sendo minha melhor amiga. Mas, no último segundo,
acabo apagando a mensagem e desisto.
Preciso me concentrar e ela é uma distração.
A partir de agora, vou fazer qualquer coisa para proteger minha
família. Não vou me deixar levar.
Respiro aliviado, mas durante todo o trajeto do campus da
universidade de Humperville ao hospital, a pressão em meu peito
me fez sufocar inúmeras vezes, o ar foi roubado de mim por muitas
horas até que o médico viesse nos dizer que a cirurgia foi um
sucesso. Não tem espaço na minha vida agora para caprichos,
preciso cuidar de Willa. Do meu pai e do seu negócio, que é seu
maior orgulho.
O que sinto por Mackenzie precisa esperar até que eu possa
lidar com meu coração de novo.
 
 
 
23 de junho de 2020, às 18h32.
 
Não sou fã de uísque puro nem de roupas sociais ou gravata
apertada e terno engomado, mas existem situações que pedem uma
mudança extraordinária de comportamento. Seja a vestimenta ou
seu jeito de agir; precisa se adaptar, fazer sacrifícios, mudar seu
estilo de vida. Talvez até se preparar para uma possível guerra entre
ricaços em uma cidade pequena chamada Humperville, com pouco
mais de cinquenta mil habitantes e comandada por aqueles que têm
cartas na manga para comprar seu silêncio e sua verdade. É preciso
ter cuidado; caso contrário, venderá sua inocência por migalhas. Se
deixará ser chafurdado na ganância e descobrirá que o dinheiro não
compra só a felicidade, te compra liberdade e respeito.
Em 31 de agosto de 2019, quase um ano atrás, meu pai,
Darnell Lynch, fora alvejado na recepção de calouros da
Universidade de Humperville. Desde aquele maldito dia, tenho feito
o possível para protegê-lo. Já perdi a minha mãe e não estou
disposto a jogá-lo para os lobos só porque ele se considera
invencível por ser o homem mais rico da cidade. Ele não é a porra
do Super-Homem, mas acho que essa realidade ainda não o
chocou. Daquele dia em diante prometi a mim mesmo que mudaria
minha vida. Faria com que ele enxergasse que não pode colocar um
alvo em suas costas porque minha irmã e eu ainda precisamos dele.
Com muito dinheiro, você faz excelentes negócios, começando
por uma segurança reforçada. Meu pai é dono de vários pubs e
boates nessa cidade, não há um cidadão de Humperville que não o
conheça ou já não tenha escutado seu nome perambulando poraí.
Está mais do que na cara que alguém não o quer mais fazendo
negócios por aqui e estou disposto a descobrir quem e por quê.
Apesar de ter minhas suspeitas, não encontrei provas concretas
para incriminar minha madrasta, Dannya Monaghan, e fazê-la sair
dessa mansão de uma vez por todas.
A questão é que poucos dias depois do atentado contra meu
pai, contratei uns investigadores particulares, porque não confio na
polícia de Humperville. Como disse, todos foram inteiramente
corrompidos pelo dinheiro e qualquer um poderia ser falsamente
incriminado para que o verdadeiro culpado não fosse encontrado.
Tudo que queria era justiça e proteção para o meu pai e minha irmã
mais nova. Afinal, se tentaram matá-lo, qualquer coisa poderia
acontecer com Willa.
Pouco tempo depois, meu pai me proibiu de continuar com isso.
Ele demitiu os três investigadores que contratei, a empresa de
segurança que cuidava da casa e do seu escritório no Purple Ride –
só uma de suas inúmeras boates na cidade – e me proibiu de usar
seu dinheiro para investigar o caso.
Definitivamente meu pai não estava interessado em encontrar o
culpado. Não sei o porquê de fato ele não queria encontrar um
suspeito. Cheguei a pensar que ele sabia que Dannya estava
envolvida e só estivesse tentando protegê-la. Mas ele seria tão
estúpido ao ponto de manter uma quase assassina sob seu teto e
proteção? Não conseguia, de jeito nenhum, entender suas razões.
Então no começo deste ano, para ser mais específico, em maio,
descubro que meu pai andava esse tempo todo colaborando com a
polícia de Humperville para encontrar um culpado e finalmente, há
três dias, prenderam o filho da puta.
Um traficante meia-boca chamado Jev Adams. Encontraram a
arma usada no dia, na casa de sua mãe, mas tem uma coisa nessa
história que, para mim, ainda não está esclarecida.
Falta o porquê.
Por que Jev tentaria matar o meu pai? Por diversão? Não faz
sentido nenhum, a não ser, claro, que tenha sido mandado.
Engulo mais um gole de uísque, descendo rasgando por minha
garganta e queimando minha traqueia. Do outro lado, Tucker
Kirkland e Bullock Hill estão apreciando a belíssima coleção de
livros antigos que meu pai mantém em seu escritório em casa.
Bullock insere o indicador entre a capa de um dos livros e o puxa
para fora.
Analisando a capa dura e a textura envelhecida, sussurra:
— O Morro dos Ventos Uivantes.
— Pensei que o caso tivesse se encerrado — Tucker observa
com as pálpebras entreabertas, encarando-me em dúvida.
Vagueio meu olhar de Bullock para Tucker. O homem alto, de
cabelos na altura dos ombros e uma expressão questionadora
dominando sua feição.
— É, o desgraçado não foi preso no sábado depois de colocar
fogo no Anarchy? — Bullock emenda, devolvendo o livro para a
estante. Ótimo, se meu pai souber que trouxe dois novos
investigadores para a mansão Lynch, a fim de desenterrar um
assunto que tecnicamente já acabou, ele acabaria congelando
minha conta bancária. Levei meses para juntar uma grana e investir
nisso outra vez. — Aliás, soube que você estava no lugar. É pura
sorte que você e seus amigos tenham sobrevivido.
Deixo o copo ainda com o fundo cheio de uísque de lado e me
levanto. Fecho o segundo botão do terno, caminho para a frente da
mesa. Não acredito que estou usando essa merda para parecer
mais sério para esses caras.
Mackenzie, minha melhor amiga, diz que estou tentando
parecer um “chefe” como meu pai, usando roupas sociais com mais
frequência; e, segundo sua opinião, não é colocando roupas caras
que fará com que eu conquiste respeito. Contudo, não concordo
com ela. Pelo contrário, acho que tudo começa na aparência.
— Jev estava lá naquela noite porque tinha intenção de se
vingar. — Cruzo os braços, estufando o peito. — Não souberam?
— Sim, ouvimos falar. Notícias correm rápido em Humperville.
— Bullock continua se esgueirando pelo escritório, futricando cada
canto dos móveis do meu pai e mexendo em coisas que não
deveria. Estou me controlando para não o recriminar porque preciso
desses caras. — Soubemos que a polícia o investigava há um
tempo. Mas estou pensando aqui... — Ele para, virando o corpo
coberto por uma capa de chuva preta. E porra, nem está chovendo.
Esses caras são estranhos, mas disseram que são bons e, por
sorte, meu pai não os conhece. Eles são como sombra cobrindo a
cidade, ninguém os toca e, quando são vistos, passam
despercebidos. — O que seu pai acharia de você não ter ficado
satisfeito com a investigação da polícia?
— Meu pai está cego pelo que sente pela minha madrasta.
— Ou você não consegue aceitar que seu pai seguiu em frente?
— Tucker provoca e afundo os dedos no tecido do paletó,
controlando a raiva que sinto sempre que tratam minhas
desconfianças como paranoia. Sei o que estou falando e Dannya
não me transmite confiança.
Meu pai não me deu acesso à investigação. Ele me deixou de
fora de propósito. Então como eu poderia esquecer? Como poderia
ficar tranquilo com uma estranha vivendo nesta casa? Preciso de
respostas. Se Dannya for inocente como ele diz que é, não terá
nenhum problema se descobrir algumas coisas a seu respeito.
Começando com: por que ela e Gravity, sua irmã mais nova,
vieram para Humperville? Por que ela, inclusive, se recusa a
convidar os próprios pais para o casamento?
Se eu estiver errado, pedirei desculpas. Não sou o tipo
orgulhoso que não consegue reconhecer os próprios erros. De todas
as pessoas que conheci, acredito que eu seja o mais honesto e
transparente, aquele que preza por justiça e boa educação. Não sou
babaca. Conheço meu lugar. Só estou fazendo tudo que está ao
meu alcance para manter a minha família segura.
— Vocês vão pegar o trabalho ou não? — murmuro com
impaciência.
Já estamos aqui há uma hora e ainda não me deram nenhuma
resposta. Passei todas as instruções, como tudo aconteceu naquela
noite e cada passo que meu pai deu durante o dia. Contei tudo que
soube da investigação que a polícia fez – cá entre nós, nada muito
eficiente.
— Sim — Bullock concorda antes do seu amigo, que manteve a
boca entreaberta, pronto para emendar mais algumas condições. —
Mas não vai sair barato pra você, garoto. Uma investigação com
uma quantidade tão escassa de informações? Além disso,
precisaremos sair da cidade. Significa que você terá que
desembolsar custos adicionais de viagem.
— Pago o valor que quiserem, contanto que esse trabalho seja
feito de modo sigiloso e discreto.
— Garoto, discrição é nosso modo de trabalho, quanto a isso
não tem com que se preocupar. Você mencionou o prefeito, Thomas
Linderman. — Tucker puxa uma cadeira e se senta à minha frente,
ajeitando sua capa de chuva. Cruza os tornozelos, um sobre o
outro. — O que ele tem a ver com essa história?
— Quando meu pai se mudou alguns anos atrás para
Humperville, Thomas ofereceu dinheiro para que voltássemos a
Grev Willow. É claro que meu pai se recusou. Ele não cederia tão
fácil assim para Thomas e, naquela época, ele nem era prefeito da
cidade ainda. Alguma coisa me diz que esse homem nunca quis
minha família por aqui, só queria entender o porquê.
— Mas você disse também que desconfia da sua madrasta.
— Minha madrasta, sim. Acredito que ela possa ser mais um
peão. Dannya é peixe pequeno perto de todo o resto.
— Por que você acha que Thomas queria vocês fora da cidade?
— Não sei. Talvez meu pai fosse um concorrente em potencial?
Ou por que ele é mais rico e poderoso? Honestamente, Bullock, não
sei qual a motivação de homens como Thomas para fazer as
escolhas que fazem. O que quer que seja, não pode ser bom.
— Hum... — Tucker rumoreja, soprando o ar com visível
cansaço. — Tudo bem. Dez mil para começarmos.
— Dez mil? Porra, isso tudo?! — reclamo, abismado.
— É pegar ou largar, garoto. E nem estou acrescentando a
quantia de gastos extras. Te enviarei uma mensagem com meus
dados bancários e sempre que precisar de mais dinheiro, vou
contatar você. — Ele se levanta e ambos parecem satisfeitos com o
acordo quefizemos. — Estamos mexendo aqui com um pessoal da
pesada. Traficantes? É fichinha. Mas estamos falando de políticos,
agiotas, policiais corruptos e rendidos, empresários que
basicamente mandam aqui. Nós podemos acabar mortos ou presos
por um crime que não cometemos e você sabe bem disso.
Gostaria de não saber.
— Tudo bem. — Abano as mãos, rendendo-me às condições.
— Farei isso, só terminem logo essa merda. Quero voltar a dormir
em paz!
— Em pouco tempo, você terá as respostas que procura.
Aperto a mão de cada um, firmando o acordo que fizemos.
Não é como se eu quisesse mesmo me envolver em algo assim,
mas se Jev Adams não passou de um bode expiatório para quem
quer que tenha feito isso, significa que não estamos completamente
a salvo, quer dizer que a pessoa tentará de novo e, dessa vez, não
errará.
Não voltou a acontecer porque até então não tinham um
culpado ou suspeito, as coisas estavam aparentemente sob
controle. Mas Jev preso e nenhuma resposta do porquê e por quem,
então a história ainda não terminou.
 
 
 
15 DE AGOSTO DE 2020, ÀS 21H33.
 
Você já sentiu que fez coisas por puro ego? Orgulho? Para sentir que existe
uma coisa que só você pode ter?
É assim que tenho feito com Brooks. Quando nos conhecemos estava claro
para mim que me apaixonaria. Ele me tira o foco, a concentração e quase
sempre mudo meus planos para me encontrar com ele, mesmo sabendo que é
errado e que serei eu a pessoa a partir o seu coração de novo.
Estico o pescoço, abrindo espaço para seus lábios percorrerem a veia
saltada em êxtase. Comprimo os lábios, com seu pau investindo contra mim. O
barulho da cabeceira da cama arrebata o som da voz de Bahari do lado de fora.
Minha virilha pulsa, satisfeita e a camada fina de suor que cobre meu corpo se
une ao seu. Escuto o baque o oco do movimento, os lábios abertos soprando ar
e a respiração entrecortada. Ele geme, aumenta o ritmo, seu pau sai e entra
mais a fundo, e cravo as unhas longas na carne de suas escápulas.
Sinto muito, Brooks, por te trazer até aqui só para te machucar. Mas eu
precisava de um momento para não pensar no que vou fazer amanhã. Para
atenuar o temor em meu coração. É quase como uma faca encravada e meu pai
está a girando aos poucos, matando a mim como matou meu irmão.
Brooks cede o peso do corpo, caindo em cima de mim. Ele tem mais de um
metro e oitenta, o peso contra mim é sufocante. Fecho os olhos para recuperar
o fôlego e o afasto para que se deite ao meu lado.
Mantenho as pálpebras apertadas, obrigando-me a não olhar para ele.
Tento muito não ser uma babaca porque ele é um cara incrível, mas tenho o
dom para estragar tudo que é bom para mim, inclusive o relacionamento que
tínhamos antes de voltar a Humperville.
Tudo começou cinco anos atrás quando meu irmão gêmeo, Sebastian
Linderman, cometeu suicídio na suíte de seu quarto e toda a cidade se
comoveu. Não exatamente como ele merecia, mas como meu pai quis que
acontecesse. Ah, meu pai, o Sr. Thomas Linderman e prefeito de Humperville, o
controlador, obcecado e possessivo. Pensei que minha mãe e eu estaríamos
presas a ele pela eternidade. Felizmente ela escolheu se divorciar assim que
meu irmão foi enterrado e, na verdade, sinto que minha história só começou
quando não estava mais perto do lugar onde tudo deu errado.
Seb deixou uma carta para mim. Uma que nunca mostrei para ninguém e
desde que a encontrei, presa em uma página de um dos livros da minha
estante, não consegui compartilhá-la. Parecia tão íntima e pessoal. Aquilo era
só meu e não queria que as pessoas tivessem acesso a ela, embora tivesse
certeza de que Mack e Effy – minhas melhores amigas – gostariam de ver
qualquer coisa que fosse minimamente relacionada a ele. Afinal, costumávamos
ser um grupo. Não éramos parecidos, tampouco tínhamos coisas em comum.
Pertencíamos a mundos diferentes.
Mackenzie tinha a vida e família perfeita. Effy sempre conseguia ser
compreensiva e perdoar. Mas Sebastian e eu tínhamos tantos problemas que,
na realidade, tinha vergonha de confiar a elas a vida lamentável que meu irmão
e eu vivíamos. O tempo passou e não necessariamente isso faria qualquer
diferença se tratando da nossa amizade.
Quando meus pais se divorciaram, minha mãe e eu nos mudamos para
Dashdown, cidade onde vivi os últimos cinco anos e conheci Brooks. Quase que
imediatamente me senti atraída por ele. Acho que os membros avantajados de
seu corpo, os bíceps definidos e o torso torneado foram as coisas que notei em
um primeiro momento. Quanto mais perto dele ficava, mais me envolvia.
Voltei para Humperville há alguns meses para estudar, mas recebi um
recado do meu pai ontem. Ele quer me ver. Não consigo pensar em nada de
bom para que tenha me pedido para visitá-lo. Desde que os papéis do divórcio
saíram e a coisa toda se tornou oficial, não nos falamos mais. Essa distância era
segura para mim. Mas Seb me pediu para continuar de onde ele parou, então
não posso ignorar.
Faria qualquer coisa que ele me pedisse, só para ter certeza de que ainda
estou tentando cumprir as promessas que fiz a ele.
Ser feliz.
Ter uma boa vida.
Amar todos os seus defeitos e qualidades.
E o perdoar pelo seu terrível erro de tirar a própria vida.
Ninguém nunca seria capaz de compreender o que senti naquela época e
como perdê-lo foi ver o meu mundo inteiro ruir diante dos meus olhos, e estar de
mãos atadas porque não tinha por onde segurá-lo.
A respiração de Brooks suaviza e, enfim, abro os olhos. Viro a cabeça,
vendo o maxilar rijo. Tenho certeza de que ele sabe o que acontece agora.
Estamos nisso desde que voltei para Humperville. Ele vem, transamos e o
mando embora de volta.
Se ele ao menos soubesse que me sinto péssima ao mesmo tempo em que
não consigo evitar. Pode ser autodestrutivo, mas, às vezes, não consigo segurar
sozinha essa bola demolidora que são meus sentimentos e ele, de algum jeito,
consegue me amparar.
— Porra, se alguém estiver trepando na minha cama… — A voz de Ashton
retumba através das paredes. Ele soca a porta e aperto os lábios para não rir.
Cruzo os dedos na barriga e olho para o teto. Suas tentativas de girar a
maçaneta foram para o espaço.
Ashton Baker é contrabaixista e membro da banda The Reckless. Inclusive,
uma banda que, com certeza, tem um futuro brilhante pela frente e mal posso
esperar para vê-los fazendo sucesso fora dos limites dessa cidade.
— A gente devia falar para ele que estamos aqui — Brooks sussurra e só
balanço a cabeça, negando.
Ashton bate à porta mais algumas vezes e finalmente o som cessa.
— Vai ser engraçado vê-lo imaginar quem estava aqui. — Afasto os lençóis
e coloco as pernas para fora da cama.
Brooks repete meus passos e caminha pelo quarto iluminado pelo abajur de
cabeceira. Ele sai em busca de suas peças de roupa e dou uma boa olhada em
sua bunda durinha antes que a cubra com a cueca.
As pernas torneadas e o torso definido são uma atração física inegável para
mim. Nosso relacionamento durou mais de um ano e acho que não teríamos
terminado se eu não estivesse decidida a voltar para Humperville. Teria me
casado com ele porque o amava.
Mas hoje Brooks não está aqui só por minha causa. Ele acabou se
aproximando bastante de Bryan e, consequentemente, dos membros da The
Reckless. Ao menos uma vez, a cada quinze dias, ele aparece em um show ou
vem para as festas que a banda dá.
Hoje, inclusive, é um desses fins de semana que Ashton reserva sua
propriedade e monta um palco improvisado de paletes do lado de fora. Convida
tantas pessoas que poderia apostar que a universidade inteira consegue se
acomodar entre as copas das árvores e mais um pouco em sua cabana, que
não é muito grande, mas dá para as festas valerem o esforço.
Ashton mora entremeado na floresta da Street Powell. Sua propriedade
começa no alto de uma montanha íngreme e termina onde os olhos não
alcançam. Cercado por árvores e o começo do rio Dark Water, que ladeia a
cidade de Humperville. Ainda tenho muitas lembranças da minha infânciacom
Seb, brincando na orla da água escura e juntando as pedrinhas pretas que se
acomodam em terra firme.
Uma vez, Seb me fez um colar com uma dessas pedrinhas. Foi um
“achado”. Ele encontrou uma, em especial, que tinha o formato de um coração.
Me deu de presente no nosso aniversário de doze anos, em 18 de fevereiro.
Brooks encontra minha camisa de gola alta e a lança em minha direção.
Pego-a no ar, antes de ser atingida no rosto.
Em seguida me levanto, em busca da minha saia jeans. Encontro-a e
começo a me vestir. O blazer está sobre a cadeira, perto da escrivaninha de
Ashton e o visto também. Ele está quase completamente vestido quando
termino de calçar minhas botas.
— Lilah. — A voz de Mackenzie chega aos meus ouvidos e ajeito o lençol
da cama antes de ir até a porta para abri-la.
Ela está em pé do outro lado, os braços cruzados e Effy ao seu lado. O ar
repreensivo quase como uma expressão duradoura.
— Que foi?
— Te procuramos em tudo quanto é canto — Effy diz em tom crítico. Olho
por cima do ombro, vendo Brooks se aproximar.
A camiseta branca colada salienta os peitorais. Ele para atrás de mim,
encostando-se ao caixilho de madeira. Dou uma espiada nos lados e não vejo
Ashton.
— Ele já foi. Vão subir no palco — Mack esclarece ao perceber o que estou
fazendo e relaxo os ombros. — Oi, Brooks.
— Oi, Mackenzie — ele pigarreia, coçando a nuca.
— Quando você chegou?
— Não faz muito tempo.
— Se Ashton descobre que estavam trepando na cama dele, você está
muito ferrada — Mack pontua, com o indicador erguido em riste para mim. Meu
rosto esquenta com o rubor e cruzo os braços para disfarçar a vergonha se
evidenciando em sinais corporais.
— Ele devia trancar a porta — Brooks entra em defensiva. — Mas você está
certa. Se fosse minha cama e o meu quarto, também ficaria puto.
— Que bom que vocês dois entenderam — Effy enfatiza, mas continuo
quieta e mordendo o lábio inferior. — Nós vamos te esperar perto do palco e não
voltem para o quarto! — ordena e se afasta, Effy me envia um sorrisinho e sai
com ela.
Saio primeiro e Brooks fecha a porta atrás de si.
Bryan começa o show da The Reckless cantando Maybe I, de Des Rocs.
— Se eu não for encontrá-las dentro de cinco minutos, provavelmente vão
me procurar de novo — explico, encostando-me à parede.
Brooks mantém a distância, mas cruza os tornozelos ao se encostar na
parede à minha frente. Coloca as mãos nos bolsos da calça jeans e balança a
cabeça, com a decepção corroendo seus olhos. Se está relacionada a mim ou a
si mesmo, não sei.
Ele sabe o tamanho do perigo que estamos correndo nos encontrando
assim, reacendendo a esperança, quebrando as regras óbvias de um pós-
término.
Terminamos há cinco meses, mas continuamos nos encontrando e
acabando na cama. Não ter chorado quando terminamos não significa que não
senti tanta dor quanto ele. Só precisava passar por cima dela porque estar aqui
agora é uma prioridade.
— Preciso de uma resposta, Delilah. Não vou mais viajar por oito horas só
para trepar com você quando tiver vontade. Se não quer ficar comigo, então
deixa meu caminho livre.
Cubro o rosto com ambas as mãos, respirando pesado.
— Desculpa, Brooks.
Ele revira os olhos, soprando o ar com impaciência. É muito difícil tirá-lo do
sério e tenho habilidade para fazer isso.
— Não quero suas desculpas. Venho até aqui porque te amo e me importo
com você. Porra, eu poderia me mudar para cá se esse for o problema. — Ele
abre os braços, esbravejando. — Mas a distância e todo o resto é só uma
desculpa que você usa para me afastar. Como faz com todas as outras pessoas
que tentaram se aproximar. Então, diz o que quer de mim porque você me
conhece bem e sabe que não tenho paciência para joguinhos. Ou você está
comigo, ou não está.
Meu coração perde o compasso e minha visão é toldada por um borrão.
Não é o tipo de conversa que quero ter com ele aqui e agora. Não estou pronta
para deixá-lo ir, mas não quero o que tínhamos antes.
São sacrifícios, Delilah. Faça-os.
— Não podemos ficar juntos — digo sem deixar que a voz trema ou que
meus olhos marejem. Adquiri uma habilidade surreal para driblar meus
sentimentos. Consigo contorná-los e disfarçá-los com a frieza. — Desculpa te
fazer vir até aqui. Não vai mais acontecer.
Brooks parece digerir o que disse aos poucos, engolindo a contragosto
minha decisão. Seus olhos castanhos saltam de um ponto para o outro e uma
de suas mãos ruma para os fios escuros de seu cabelo, entremeando os dedos
e os desalinhando mais.
Mad World é a próxima canção que a The Reckless toca e só consigo me
concentrar em meu coração sendo esmagado mais uma vez. A culpa não é
dele. É minha. Tenho habilidade para ser a rainha do desastre e ele está certo.
Estou sempre afastando as pessoas, principalmente aquelas que me amam.
Os únicos que não consegui de fato deixar para trás foram Mack, Effy e
Bryan. Elas, porque sempre souberam amar meus defeitos com todo o coração;
e Bryan, porque seu pai se casou com a irmã da minha mãe. Então meio que
fomos colocados no caminho um do outro, mais uma vez. Namoramos na
adolescência e tudo acabou tão rápido quanto começou, porque Seb tinha
razão. Não gostava dele de verdade, só tentava suprir minha carência com sua
companhia.
É muito louco imaginar como nossas vidas estão entrelaçadas. Seja por
destino, coincidência ou porque nos colocamos nessa posição.
Nós cinco estudamos juntos em uma escola particular chamada Saint Ville
Prep. Naquela época, tinha meu irmão como base de toda a minha existência,
como se eu respirasse só por ele, então Mack e Effy chegaram, ambas bolsistas
e de um mundo completamente diferente do meu. Bryan também, pouco tempo
depois de Seb e eu termos nos tornado amigos de Mack e Effy, nos
conhecemos em uma sorveteria. Ele começou a correr com meu irmão na
educação física e eram os melhores da turma. Nos aproximamos, mas no fundo
sabia que Bryan sempre esteve apaixonado por Mackenzie.
Anos depois nos reencontramos em Dashdown e descobrimos que nossas
famílias agora eram uma só. Ele e Mack, no entanto, estão juntos tem mais de
um mês. É bom ver que, mesmo com tantos problemas, eles encontraram uma
forma de fazer funcionar. Não desejo o que eles têm, mas desejo poder amar
alguém tanto quanto Mack ama Bryan.
Amo Brooks, mas não o suficiente para que mude meus planos por ele.
Não sei há quanto tempo estamos parados aqui, encarando um ao outro,
mas parece que, mesmo decidido a me deixar para trás, ele ainda não
consegue aceitar minha resposta. Brooks queria que eu tivesse dito para vir
para cá, que nós ficaríamos juntos. Mas a distância não é o único problema.
Não posso perder o foco do que estou procurando. Ele é uma distração.
— Você precisa encontrar seu caminho, Delilah, e parar de usar as pessoas
como se elas pudessem te salvar — ele finalmente quebra o silêncio entre nós e
se afasta, rastejando em direção à saída.
Atravessa com dificuldade a porta bloqueada por um aglomerado de
pessoas e, quando não pode mais me ver, solto um suspiro pesado. Deixo a
cabeça cair para trás e escorrego na parede até estar sentada ao chão. A
música, as pessoas e o mundo à minha volta não me trazem a segurança que
procuro.
Quero encontrar meu lugar aqui, apaixonar-me pela vida, por tudo que vejo
e toco. Mas, desde que Sebastian me deixou, cada dia que passa é uma
sobrevivência e estou cansada de só sobreviver.
 
 
A música que a The Reckless está tocando é Friends, de Chase Atlantic.
Consigo reparar em vários momentos que Bryan encontra Mackenzie na plateia
e ignora qualquer outra garota que tente chamar sua atenção. Noto Ashton, que
está quase sempre buscando por uma transa depois de um show e começa a
sua procura em cima do palco. Finn, que se concentra apenas na guitarra, não
olha para os lados, apenas faz os acordes; Chase, que faz a segunda voz e toca
teclado, às vezes sério, às vezes sorrindo, isso depende do humor, o que é
sempre um enigma. E tem Aidan, o baterista que me odeia.
Sim,Aidan Lynch me odeia. O motivo? Não tenho certeza, mas, por um
lado, acredito que se trata do meu pai; por outro, desconfio que tem a ver com
Mackenzie. Mas não é um caso que eu pretenda interferir. Meu objetivo é evitá-
lo até que ele tenha superado sua antipatia por mim. Ora ou outra irá acontecer.
Estamos vivendo em meio às mesmas pessoas, na companhia um do outro
quase todos os dias e, quando as aulas começarem, a tendência é que fique
mais intenso. É melhor que ele me supere, porque não estou indo para lugar
nenhum.
Por um breve segundo, ele me flagra o encarando. O sorriso estampado em
seu rosto desmancha instantaneamente, mas não fujo. Sou boa em sustentar
qualquer tipo de afronta, com ele não seria diferente. Graças ao meu pai, criei
um tipo de resistência. Ele continua descendo os braços pesados na bateria e
minando a suor. Gotas pingam e molham sua camisa social.
Soube que seu pai, dono de quase metade dos pubs e boates da cidade,
comprou o Anarchy depois que ele pegou fogo. Ficou difícil para o antigo dono
manter o local, então ele não teve escolha e, recentemente, Darnell Lynch
deixou a administração do negócio para o filho, ao menos enquanto Willa, sua
irmã mais nova, não retorna de Paris. Darnell conseguiu reerguer o lugar em
menos de um mês. É surreal o que o dinheiro pode fazer por pessoas como
Darnell e Aidan.
Aidan continua me encarando e não desvio, embora já me sinta cansada
disso. Coloco as mãos nos bolsos do blazer, protegendo-as da brisa gelada e
giro a cabeça quando Effy me oferece um gole de sua cerveja. Aceito e volto a
olhar para a frente, minha vez de flagrá-lo com os olhos em mim. Franzo o
cenho, desconfortável, e Mack finalmente nota.
— O que deu em vocês dois?
— Ele que não para de encarar.
— Esquece o Aidan. Ele ainda não aceita que Thomas é o seu pai.
— Mas o que é que isso tem a ver? Por que ele me odeia?
— Escuta, Gravity passou o último ano sendo odiada por ele — Effy relata,
enganchando seu braço no meu. — Aidan é muito fiel às pessoas que ama, isso
quer dizer que seu pai ser Thomas Linderman faz de você uma inimiga da
família Lynch.
— Inimiga? Por quê? Pensei que ele detestasse meu pai só por ele ser
babaca.
— Sim, é verdade. Mas ele é rico. Thomas também. Significa que eles têm
uma rixa nos negócios, com certeza. Só ignora, uma hora ele vai perceber que
está sendo idiota e se acostuma com você também. Por fim, Gravity desistiu de
tentar colocar juízo na cabeça dele e passou a agir como se nem o conhecesse.
Gravity e eu não tivemos tempo de nos conhecer direito, mas sei que sua
irmã, Dannya Monaghan, é noiva de Darnell e que Aidan nunca aceitou a mulher
como sua madrasta. Não o conheço direito para dizer que tem motivos
plausíveis para não gostar dela, assim como não tem para gostar. É complicado.
Com certeza, eu gostaria que minha mãe saísse com outra pessoa e ficasse
feliz. Por um tempo cheguei a imaginar como teria sido se ela tivesse se casado
com Casey, pai de Bryan, ao invés da minha tia Daily. Há coisas que, vendo de
fora, não é possível dizer o que está certo e errado.
Aidan odiar meu pai por ele ser um babaca é justificável, mas me odiar
porque sou filha dele não faz o menor sentido. Uma hora ou outra, quero
confrontá-lo e tentar entender, por enquanto devolvo seus olhares enviesados e
desprezo.
— Gravity mandou mensagem — Mack anuncia, levantando o celular à
altura de nossos olhos.
 
G������
Paris é tudo.
 
Tem uma foto dela sentada na sacada de seu apartamento em Paris. A
Torre Eiffel fazendo pano de fundo, um cenário incrível. Willa está com ela, mas
ambas são quase desconhecidas para mim. Mack e Effy estudaram comigo,
mas quando retornei a Humperville, Gravity e Willa já faziam parte da vida das
minhas antigas amigas. Às vezes, sinto que sou um peixe fora d’água, tentando
encontrar meu espaço na imensidão que é o oceano ao qual elas pertencem.
Em resumo: Gravity era uma antiga moradora do apartamento que Mack e
Effy dividem, e, atualmente, estou morando com elas. Basicamente uma
inquilina temporária e estou pronta para fazer as malas no próximo dia 7 de
setembro, que é quando Gravity retorna. Toda informação que tenho de Willa é
que é a irmã mais nova de Aidan. Apesar de ter saído com todas desde que
cheguei à cidade, não foi suficiente para considerá-las minhas amigas.
— Vamos tirar uma foto. — Mackenzie levanta o celular e abro um sorriso
para a câmera esperando o click.
A foto de nós três juntas fica um pouco borrada e escura, ainda assim dá
para distinguir nossos rostos.
 
M���
Um pouco da The Reckless essa noite.
 
G������
Lindas. Estou costurando roupas para todas enquanto faço meu curso
com Amélie Fay.
 
G������
Pra você também, Delilah. Mack me passou suas medidas!
 
Pisco, assimilando a mensagem. Confesso que tivemos dificuldade de nos
aproximar, porque Gravity e eu temos personalidades bem parecidas. Não
aceitamos desaforo ou coisas assim. Estamos sempre na defensiva, prontas
para repelir qualquer ataque. Quando cheguei, era uma intrusa na amizade que
ela, Effy e Mackenzie nutriram. É claro que ficou esperando o momento em que
eu pisaria na bola ou cometeria erros imperdoáveis. Porém, desde a minha
decisão de retornar à cidade, estive disposta a me redimir se tivesse uma
chance.
Quando fui embora, não ousei me despedir delas. Apesar de querer muito
olhar para seus rostos familiares e gentis uma última vez, não sei se teria forças
o suficiente para fazer o que era preciso se as encontrasse. Tornaria tudo mais
difícil e para mim, impossível. Elas eram tudo o que eu tinha naquela época e já
tinha perdido tanto, que me recusava a perder mais. Me despedir significava dar
um ponto final em nossa história também e eu não queria.
 
M���
Estamos ansiosas para provar!
 
Mack responde a mensagem sorrindo para a tela como se Gravity pudesse
vê-la.
Bryan fala no microfone que cantará uma última música para encerrar o
show da noite. Ele está com a alça da correia do violão sobre o ombro e dedilha
as primeiras notas da música. Finn o acompanha com a guitarra e Chase
cantarola baixinho um “Ooh-ooh” enquanto Bryan não começa. Aidan bate o
bumbo à medida em que as notas se intensificam e prendo meus olhos neles. O
público acompanha a melodia da música batendo palmas estaladas e, por fim,
Bryan começa:
— I should’ve stayed at home, cause right now I see all these people that
love me, but I still feel alone. Can’t help, but check my phone.
Chase entra com o teclado e meus olhos pairam sobre os meninos,
apreciando o ritmo e como eles sintonizam com a música quando tocam juntos.
Bryan me contou que tinha uma banda em Humperville e foi uma surpresa,
porque, quando nos conhecemos, ele tinha uma personalidade diferente, quase
como se não quisesse ser atingido pelo resto do mundo. Vivia feliz sendo
solitário. E vi alguns de seus vídeos no YouTube.
Lembro-me de ter digitado The Reckless na barra de pesquisa e visto
alguns vídeos. Muitos deles não tinham o foco que a banda merecia e o som
não estava tão bom porque havia sido gravado através do celular de alguém da
plateia. Então sugeri que eles começassem a investir em equipamentos para
filmarem alguns ensaios, coisas assim, para que mais pessoas pudessem ter
acesso a eles.
É quando percebo que a letra da música Best Friend, de Rex Orange
Country, é basicamente coisas que penso sobre mim mesma.
Eu deveria ter ficado em casa porque agora vejo todas essas pessoas que
me amam, mas ainda me sinto sozinho.
— And that’s because I wanna be your favourite boy, I wanna be the one
that makes your day, the one you think about as you lie awake, I can’t wait to be
your number one, I’ll be your biggest fan and you’ll be mine, but I still wanna
break your heart and make you cry — Bryan canta enquanto brinca com os
meninos, dançando e sacudindo a cabeça, como se houvesse uma mensagem
subliminar na música.
Meus olhos correm de um rosto para outro e recaem em Aidan, que está
balançandoa cabeça de um lado para o outro, rindo e se negando a entrar na
brincadeira com eles. Por fim, os fios escuros de cabelo pendem para a sua
testa, cobrindo um de seus olhos. Mack e Effy me puxam mais adiante do palco,
para ficarmos mais próximas deles.
E é porque eu quero ser seu garoto favorito. Eu quero ser aquele que faz o
seu dia, aquele em que você pensa ao se deitar para dormir. Eu mal posso
esperar para ser seu número um. Eu serei o seu maior fã e você será a minha,
mas eu ainda quero partir seu coração e te fazer chorar.
Assim que Bryan nota que estamos à orla do palco, estende a mão para
puxar Mack e, em seguida, Ashton ergue a sua para Effy, colocando-as lá em
cima. Ambas enrubescidas de vergonha. Eles a incentivam a dançar e correr
pelo palco como loucas enquanto cantam o refrão.
— You’re still my favourite girl, you better trust me when I tell you there ain’t
no one else more beautiful. In this damn world, in this damn world!
Você ainda é minha garota favorita, é melhor você confiar em mim quando
eu te digo que não há ninguém mais linda nesse maldito mundo, neste maldito
mundo.
— You’re gonna wanna be my best friend, baby. You’re gonna wanna be my
best friend!
Bryan e Chase repetem essa frase enquanto Mack e Effy dançam. O
público e eu seguimos a melodia da canção batendo palmas e repetindo a
coreografia que elas fazem. Movendo os ombros para a frente e para trás,
dando uma meia voltinha com o tronco e Aidan intensificando as batidas no
chimbal e prato de ataque.
Você vai querer ser minha melhor amiga, baby. Você vai querer ser minha
melhor amiga.
Noto que Aidan está olhando para mim e não consigo entender porque hoje
ele decidiu começar a reparar em mim. Os últimos meses foram desprezo e
olhares tortos. Sem contar que eu o conheci antes de todos, na semana em que
estive em Humperville para fazer minha matrícula na faculdade. Ele apareceu no
hotel onde estava hospedada e fomos apresentados, naquele momento não
senti que tivesse qualquer problema comigo.
Eles finalizam o show e Ashton pega o microfone de Bryan para avisar que,
embora o show tenha terminado, a festa não tem hora para acabar.
Fico de braços cruzados, esperando que as meninas desçam do palco, mas
Mackenzie segue Bryan pela multidão. Ele não tira o braço de seu quadril por
nenhum segundo enquanto fala com os fãs. Finn dá um jeito de desaparecer,
sendo, como sempre, o mais complicado deles. Chase conversa com algumas
pessoas, mas são respostas sucintas. Ashton, claro, parece um furacão
enquanto guia duas garotas rumo a sua casa.
Look What You Made Me Do perfura meus tímpanos e leva os convidados a
um nível de loucura extraordinário, porque todos param para escutar e cantar a
música com Taylor Swift.
Effy também desapareceu. Busco por ela, passo os olhos à minha volta em
busca das ondas ruivas de seu cabelo.
— Merda — sussurro, virando apressada nos calcanhares.
Ficar sozinha numa festa onde não conheço ninguém e a maioria das que
conheço não se importam nem um pouco comigo. Lá vamos nós de novo. Pego
o celular no bolso da saia e entro no Kik.
 
D������
Onde você se meteu?
 
Envio para Effy.
 
E���
Tive que resolver uma coisa. Acho que vou pra casa de Uber depois.
 
Finalmente recebi meu carro esse mês, então estou independente se
tratando de condução. E todo fim de semana, Mackenzie acaba ficando no
apartamento de Bryan. Na realidade, acho que ela nem mora mais com a gente.
Sendo assim, não tenho motivos para ficar aqui.
Busco pelas chaves do carro em outro bolso e começo a abrir caminho
entre as pessoas dando leves cotoveladas nos corpos amontoados. Chego ao
outro lado, no morro íngreme onde a propriedade de Ashton começa, dou uma
última olhada na festa acontecendo sob meus olhos e volto a andar rumo ao
meu Volvo preto estacionado entre duas árvores.
Desarmo o alarme e abro a porta. O teto do carro está úmido pelo orvalho e,
assim que entro, ligo o ar para desembaçar o vidro. A temperatura na cidade cai
exponencialmente ao anoitecer.
Verifico o horário no relógio digital do carro, já passa da meia-noite. Estou
tentada a enviar uma mensagem para Brooks. Não tenho certeza se ele pegará
estrada essa noite ou se ficará em um hotel até amanhecer. Espero que seja a
segunda opção.
Solto o ar me rendendo, apanho o celular no bolso e digito para ele no
aplicativo.
 
D������
Desculpa. Não queria te enviar uma mensagem depois da nossa conversa,
mas estou preocupada. Você vai embora hoje?
 
D������
Se for, tome cuidado.
 
Ele não demora para responder.
 
B�����
Vou ficar no Bryan hoje.
 
D������
Ok.
 
Jogo a cabeça para trás, descansando-a no encosto. Fecho os olhos e
respiro fundo. Melhor enviar uma mensagem para Mackenzie. Já que Brooks
ficará no apartamento de Bryan hoje, não tenho certeza se ela ainda irá para lá.
 
D������
Vai pra casa ou ficará no Bryan?
 
M���
Bryan. Aconteceu alguma coisa?
 
D������
Não. Estou indo embora, só queria ter certeza de que você tinha carona.
 
M���
Já está indo? Por quê?
 
D������
Cansada. Hahaha.
 
M���
Ah... :( Te vejo amanhã então!
 
Ligo o som do carro conectado em um pen drive que Brooks me deu antes
de eu me mudar. A primeira música na playlist é 7 Rings. Levo a chave a ignição
e engato a ré para sair da vaga. Dou uma olhada nos retrovisores, acelero e
endireito a direção para a estrada estreita.
Então sinto o baque e meu corpo sendo lançado para a frente, contra a
direção. Eu sacudo, para a frente e para trás, o efeito chicote me tirando a
estabilidade. O gosto de sangue em minha língua me obriga a levar o dedo aos
lábios e sinto o sangue sob os dedos.
Olho para trás, para tentar entender que merda acabou de acontecer
comigo e meu carro. Não estou de cinto, por isso não posso culpar ninguém por
ter cortado a boca, mas, de repente, escuto um baque na traseira do meu carro
e um cara extremamente nervoso, chutando minha roda traseira.
— Ei! — repreendo-o, saindo do carro e andando mais depressa.
— Você tirou sua carteira? Tem certeza? Porra! — Ele leva a mão à cabeça
e meus olhos pairam da traseira do meu carro para a lateral da BMW
estacionada logo atrás.
Mas que merda? Como foi que eu não o vi ali?
— Ah, que droga, me desculpa, eu não… — paro de falar.
Aidan Lynch me encara com as narinas infladas e as bochechas coradas de
raiva. Controlo a respiração e apoio uma das mãos em meu carro para não
acabar cedendo às pernas bambas. É uma merda. O conserto desse carro
ficará uma fortuna. Um dinheiro que não posso gastar de jeito nenhum. Ainda
estou tentando resolver minha vida por aqui.
— Você destruiu meu carro! — Aponta com o braço estendido para a lataria
da BMW amassada e percebo a rachadura na pintura preta. Ah, que merda, que
merda!
— Como é que… Eu não sei. Não te vi. Desculpa, puta merda. Me
desculpa, Aidan!
— Desculpa não vai pagar o conserto.
Ele é rico. Não acredito que vai mesmo me cobrar o conserto do carro.
Ainda meio zonza, meus olhos seguem para o estrago no meu – que está
ainda pior – e em seguida para o seu.
— Não posso pagar por ele.
— Como é?
— Seu carro vale uma fortuna. Não tenho dinheiro para pagar.
— Já ouviu falar em: se vira?
Contorço o rosto em reprovação. Já escutei muito sobre sua personalidade.
Como ele é amoroso e gentil, mas não vejo muito disso nele agora.
— Aidan, você é, no mínimo, milionário e nós nos conhecemos.
— Não. Você é, sei lá, prima do Bryan? Não te conheço de verdade. A
gente só sabe o nome um do outro.
Suspiro, colocando as mãos na cintura e encaro o estrago. Começo a
pensar nas consequências financeiras desse pequeno acidente e fico
apavorada. Não tenho dinheiro para pagar e não quero ter que pedir para a
minha mãe.
— Acho que não fui clara. — Tento de novo, mantenho a voz calma e
controlada. — Não tenho dinheiro para pagar o estrago do seu carro. Realmente
sinto muito, mas não tenho de onde tirar esse dinheiro.
— Peça para o seu pai.
Paro, com a boca entreaberta e quase peçopara que ele repita o que
acabou de dizer, porque não consigo acreditar.
— Pedir para o meu pai?
— Ele não é a porra do prefeito? Então!
— Você sabe que não falo com meu pai desde que ele se divorciou da
minha mãe, não é? Bryan deve ter te contado que meu pai e eu não temos
nenhum contato. Não tem como eu pedir que ele pague pelo conserto da sua
BMW! Você está louco! Aidan, eu não te vi e disse que sinto muito.
— E eu disse que não ligo. Você precisa arcar com as consequências
quando comete um erro.
Pressiono os lábios com força, para não perder a cabeça com ele. Estou
tentando me encaixar, mas as pessoas não estão facilitando. Principalmente
Aidan.
— Tá. Vou dar um jeito.
Giro nos calcanhares, voltando para o carro. Abro a porta, mas detenho o
corpo quando ele me chama.
— Dê um jeito até amanhã. Não posso andar com o carro assim.
— Pode deixar. — Entro e assumo meu lugar na direção. — Playboyzinho
de merda — solto, socando o volante.
Pego o celular e começo a digitar uma mensagem para Effy e Mackenzie.
Preciso de mais cabeças para pensar no que fazer a respeito desse problema.
 
 
 
— Jesus Cristo, que merda aconteceu com seu carro? — Effy indaga, os
olhos amendoados encarando a lanterna traseira saltada para fora e o porta-
malas afundado. — Você está bem?
— Bati em Aidan.
— No Aidan? Tipo, literalmente? — Mackenzie começa a vasculhar ao
redor, vagando os olhos preocupados.
— Não nele — respondo e cruzo os braços ao deixar o corpo cair até estar
escorada no carro. — Bati na BMW dele. E ele está furioso.
— Eu imagino que sim, ele ama aquele carro — ela observa, mordendo o
lábio inferior enquanto estuda o estrago em meu carro. — Está pior que o seu?
— Amassou a porta e acabou com a pintura.
— Ok. — Effy gesticula as mãos como se pedisse calma, embora eu não
esteja tão apavorada como dez minutos atrás quando Aidan saiu daqui
erguendo poeira na estrada. — Vamos pensar. Ele não vai cobrar por isso, com
certeza, ele tem dinheiro para arcar com o conserto.
— É aí que começa o problema. Ele quer que eu pague pelo conserto.
— O quê? — Mack pergunta afetada, a voz escapando em um sopro. — Ele
quer que você pague pelo conserto da BMW? Mas vai ficar uma fortuna!
— Sei disso. — Dou de ombros. — Mas ele meio que disse e pronto. Nem
quis me escutar. Vocês têm alguma ideia de como posso pagar por isso sem ter
que pagar de verdade?
— Tecnicamente Aidan tem tudo. Não tem nada que você possa oferecer a
ele em troca do conserto.
Tenho uma reserva, mas não é muita coisa. Conseguiria pagar pelo
conserto do meu Volvo e sobraria um pouco para dar a Aidan, porém me
deixaria sem dinheiro algum e ainda estou pensando no meu futuro quando
Gravity voltar de Paris.
Mesmo que elas tivessem dito que daremos um jeito de alugar um lugar
maior, não sei como seria viver com as três. Effy e Mack conheço há muito
tempo; embora tenhamos nossas diferenças de personalidade, ainda consigo
me adaptar a elas. Mas não sei como seria minha convivência com Gravity.
— Vou falar com ele — Mackenzie promete enquanto dobra o corpo para
olhar a tintura lascada. — E ver se consigo convencê-lo a mudar de ideia.
Se tem alguém que conseguiria fazê-lo mudar de ideia, esse alguém é
Mackenzie. Os dois têm uma amizade forte e são próximos. Não sei se Bryan
teria tanta influência sobre Aidan como a namorada.
— Está tudo bem, não quero pensar nisso agora. Preciso me concentrar no
que vai acontecer amanhã — digo com a voz arrastada e ambas erguem os
olhos para mim. — Meu pai — lembro a elas.
— Ah, que merda — Mack murmura se encostando no carro ao meu lado e
Effy faz o mesmo do outro. — Tinha me esquecido. Você tem certeza de que
quer ir sozinha até lá?
— Eu tenho escolha? — Forço um sorriso.
— Tem. Escolha não ir — Effy emenda.
Sua reprovação quanto a minha visita à casa do meu pai amanhã é visível.
Das duas. Elas, assim como eu, não acreditam que Thomas Linderman tenha
qualquer boa intenção me convidando para jantar com ele num domingo.
Principalmente sozinha.
Não que ele tivesse me pedido para ir sozinha, mas se meu pai ainda é
como cinco anos atrás, ele não gosta de visitas e de estranhos. Embora
Mackenzie e Effy não sejam rostos desconhecidos para o meu pai, agora que é
prefeito acho que gosta menos ainda de visitas inesperadas. Lembro-me de
uma época onde eu evitava falar dele para elas e vice-versa.
Meu pai sempre esteve envolvido na carreira política. Inteiramente. E
Sebastian e eu tínhamos que seguir algumas regras se quiséssemos ter ao
menos uma vida de adolescente normal. A primeira delas é não sermos notados
de forma negativa, por exemplo, meu irmão ser gay, para o meu pai, tinha uma
influência horrível para a sua candidatura para prefeito de Humperville.
Precisávamos ter boas notas e estar em boas companhias. Mack, Effy e até
mesmo Bryan sempre foram bons para mim, mas “boas companhias” para o
meu pai significa pessoas mais como ele: com dinheiro, sucesso e influência na
cidade.
Estou nervosa de ter que revê-lo depois de tanto tempo, mas, ao mesmo
tempo, sinto saudade. Não dele, claro. Mas de Sebastian e tudo que está
relacionado ao meu irmão, que ficou dentro daquela casa: suas roupas, seu
cheiro, seus pertences. Meu pai com certeza não teve vontade de voltar no
quarto de Seb, mas, sem sombra de dúvidas, quero ir até lá e pegar meu colar
de volta.
— Delilah? — Effy me chama, a voz mansa me tira do devaneio.
— Hum?
— Nós podemos ir juntas nesse jantar, se você quiser.
— É, eu ficaria muito mais tranquila se tivesse certeza de que você está
bem com ele — Mack fala, com o corpo se contorcendo em repúdio.
A morte de Sebastian fora tão difícil para ela quanto para mim. Os dois
eram próximos, melhores amigos até e preciso confessar que muitas vezes
tinha medo de perdê-lo para ela. Não é que eu fosse uma lunática, mas meu
irmão era tudo que eu tinha naquela época e perdê-lo seria meu fim. De fato,
aconteceu, mas teria preferido mil vezes que não tivesse sido dessa maneira.
Queria que Seb estivesse aqui comigo, que fôssemos para a faculdade
juntos e que me dissesse como resolver esse problema com Aidan. Meu irmão
sempre foi melhor do que eu para lidar com as pessoas e os problemas. Não
tenho nem metade da sua habilidade e inteligência para muitas coisas.
Refreio os pensamentos porque já sinto os olhos arderem e não quero
chorar. Fiz muito isso durante um longo tempo. Sebastian não ia querer me ver
desse jeito.
— Não, tudo bem. Meu pai não vai fazer nada comigo, tenho certeza.
— Sério. Eu pensei que vocês tivessem uma ordem de restrição.
— Ela expirou há seis meses.
— E você não pensou em renovar? — Effy diz, embasbacada.
— Na verdade, não. Não achei que fosse precisar, afinal nós passamos os
últimos anos sem ter contato um com o outro. Mas é natural que ele queira me
ver, né? Não deixei de ser filha dele só porque fui embora.
— Você está falando sério? — Em tom repreensivo, Mackenzie se inclina
para a frente em busca do meu rosto. — Ele é um babaca, imbecil, sem noção e
totalmente pirado! Poderia sentar aqui e dar uma lista beeeeem longa de
motivos pra você nunca mais ter nenhum contato com Thomas.
— Olha só, vou ativar meu GPS e voltar antes das onze. Se eu não estiver
em casa até este horário, vocês podem chamar a polícia. Está bem?
— A polícia é corrupta.
— Tá. Então vocês podem… — Mordo o lábio enquanto penso. — Não sei.
Contatar o FBI? — Caem na gargalhada e começo a rir também.
Acho que o que mais senti falta em estar com Mackenzie e Effy foram as
minhas risadas fáceis. Nunca preciso fingir quando estou com elas e posso sair
da pose de ataque. Relaxo e meus músculos agradecem. Meu corpo, que
implora por endorfina, saltita de alegria por eu me permitir relaxar.
Infelizmente perder Sebastian me tornou a mulher que sou hoje. Descobri
toda a dor que posso aguentar e quantas decisões ruins acabo tomando com
boas intenções.
 
 
G������
Me mande uma foto do seu look. Quero ter certeza de que você estáusando o vestido que pedi para a Mackenzie te dar.
 
G������
Delilah, é bom que você saiba: eu detesto ser ignorada.
 
G������
Se não me responder nos próximos cinco minutos, VOU TE LIGAR ATÉ SE
CANSAR DE MIM.
 
Encaro as mensagens, uma em sequência da outra, rindo para a tela como
se Gravity fosse capaz de ver. Começo a sentir que estou sendo pessimista
demais em relação a ela, nos faltou oportunidade para fortificar nosso
relacionamento e me sinto empolgada para seu retorno a Humperville.
 
G������
Talvez eu ligue para o seu pai e o mande para o inferno por ser tão
indelicado te convidando de repente, quando sua mãe nem sabe o que
está acontecendo. Não duvide da minha capacidade de persuadir a
habilidade de hacker do Ashton, posso obrigá-lo a descobrir o telefone do
Thomas! Ah, e não dou a mínima se ele é prefeito ou presidente, ele é um
monte de merda.
 
D������
Desde quando você envia mensagens diretamente pra mim?
 
G������
Desde que eu decidi que posso fazer isso, se quiser. Então, onde está a
sua foto usando o lindo vestido que fiz para você antes de ir embora? :)
 
Olho para o meu reflexo no espelho. Pele pálida, sardas claras e um cabelo
loiro escuro com mechas descoloridas na altura dos ombros – o cortei dias atrás
–, ondulados e uma parte presa atrás com uma presilha de estrela. Effy me
ajudou com o cabelo, mas não quis nenhuma maquiagem. É só um encontro
casual com meu pai.
Coloco o celular em minha penteadeira, afasto para melhorar a imagem de
captação da câmera e coloco as mãos na cintura.
É um vestido longo de tecido leve branco com bolinhas pretas, mangas e
uma fenda mediana que começa na metade da coxa – soube que é um dos
designers favoritos de Gravity. Um laço envolve minha cintura, marcando o
formato ampulheta do quadril. Uso tênis branco, mas ele não aparece na foto
quando o celular dispara.
Pego-o da penteadeira e envio através do Kik para Gravity.
 
G������
Linda e afrontosa. Tenho certeza de que seu pai está esperando um
vestido formal. Mostre pra ele!
 
D������
Mostrar pra ele? Hahahaha.
 
G������
Que as aparências enganam, afinal, ele é bonitão, mas só faz merda.
 
D������
Entendi. Acho que vou me atrasar e ele não vai gostar nada.
 
G������
As coisas não precisam funcionar do jeito dele. Você não precisa da
opinião dele para nada.
 
Não contei para Gravity sobre o meu pai, obviamente, e não posso culpar
Mack e Effy por terem feito isso. Estão tentando me proteger e até onde soube,
das três, Gravity é a maior protetora de todas.
 
D������
Tenho que ir.
 
Envio a mensagem e vou até a cama atrás de minha bolsa. Coloco o celular
lá dentro e dou uma última olhada no espelho da penteadeira. O quarto está
organizado, mas olho, mais uma vez, para ter certeza de que não deixei nada
fora do lugar.
Assim que saio, deparo-me com Mackenzie na cozinha, picando uma
cebola e os olhos vermelhos. Aperto os lábios para não começar a rir.
No último mês, quando me mudei para cá, Effy não a deixa ficar na cozinha
de jeito nenhum. Mackenzie não tem habilidade para cozinhar e acaba deixando
queimar a comida, e o apartamento fica dias cheirando a queimado. Contudo,
escuto o barulho do chuveiro e tenho certeza de que Effy não faz ideia que
Mack resolveu assumir a cozinha hoje.
— Pensei que estivesse com o Bryan — anuncio minha presença e
Mackenzie levanta os olhos úmidos em minha direção.
— Nós decidimos ficar sozinhos hoje.
— Brigaram?
Eles brigam um pouco demais, mas ainda estão se adaptando ao
relacionamento e suas diferenças.
— Não. Só quero estar aqui quando você voltar.
— Entendi. Antes das onze — lembro a ela ao pegar minhas chaves na
mesinha de centro da sala.
— Envie mensagem se precisar de alguma coisa.
— Pode deixar.
Saio para o corredor e sigo para o elevador. Soube que o prédio foi
reformado há pouco tempo e que antes ele demorava para chegar no andar que
fora chamado e mais um pouco para descer ou subir.
Na recepção encontro Chaz, o novo porteiro. Ele não deve ser muito mais
velho que eu e, se não me engano, Effy comentou ser o quarto desde que se
mudaram para o prédio.
A brisa leve da noite lambe meu rosto, jogando alguns fios de cabelo para
trás. Desço os degraus da entrada e pesco o celular da bolsa para chamar um
Uber, mas paro quando vejo Bryan do outro lado da rua. Braços cruzados,
apertados um no outro, evidenciando os bíceps sob o tecido da camiseta. Ele e
Mackenzie andam fazendo corridas matinais juntos, mas ele tem treinado na
academia também para passar o tempo enquanto as aulas na faculdade não
começam.
Olho para ele confusa, minha testa se vinca quando noto que não está
sozinho. Aidan está sentado no banco do passageiro, mexendo no celular.
Verifico a rua antes de atravessar.
— O que está fazendo aqui? Mackenzie disse que ia ficar em casa hoje.
— Vou com você ver o seu pai — conta com calma.
— Mas não vai mesmo.
— Sim, eu vou. E se você não quiser, tudo bem, mas vou ligar para a sua
mãe e contar que seu pai anda te perseguindo.
— Bryan! — repreendo-o e ignoro a presença de Aidan no carro, embora
esteja com os olhos vidrados na tela do celular, ele não presta atenção no
Instagram. Está com os ouvidos bem atentos para nos ouvir.
— Entra no carro — ordena apontando com o polegar por cima do ombro.
— Você ficou louca se achou que íamos mesmo te deixar ir sozinha ver aquele
maluco.
— Mas por que ele está aqui? — murmuro, gesticulando com a ponta do
queixo para Aidan.
O que eu disse ganha mais sentido quando ergue os olhos para mim,
provando que estava certa quando reparei que não estava prestando nem um
pouco de atenção no celular.
— Para garantir que seu pai não tente nada contra você ou ele — Aidan
responde por Bryan e não espero para ouvir mais nada.
Abro a porta e me sento no banco de trás. Bryan assume seu lugar atrás do
volante e vejo o sorrisinho satisfeito em seu rosto ao girar a chave.
— Vou transferir o dinheiro — digo a Aidan, sem olhar para ele.
Mantenho o foco na rua enquanto Bryan arranca com o carro. Ele liga o som
e Summertime Sadness ressoa através das caixas traseiras.
— Pensei que tivesse dito que não tinha o dinheiro.
— Não vou pagar pelo conserto do meu carro. Pago pelo seu — concluo,
sucinta.
— Não precisa. — Bryan levanta os olhos para mim pelo retrovisor. — Pago
por você. Dinheiro não é problema para mim.
Aidan fica tão surpreso quanto eu. Bryan tomba a cabeça para a frente,
controlando a risada ao fazer uma curva fechada e preciso me segurar no
puxador para meu corpo não ser arremessado para o outro lado.
— Tenho uma ideia melhor — Aidan diz, também me encarando pelo
retrovisor. — Você pode trabalhar no Anarchy para mim até pagar o valor do
conserto.
Bryan e ele trocam um olhar. Não consigo dizer o que significa, mas ele está
com certeza reprovando a ideia. Porém, as engrenagens do meu cérebro
começam a trabalhar, pensando no assunto. Teria que arrumar um emprego de
qualquer forma e é uma oportunidade.
— Quais as chances de eu continuar depois que terminar de pagar o
conserto do seu tão amado carro?
Aidan contorce os lábios segurando o sorriso, mas consigo notar o cantinho
da boca vibrar.
— Você quer um emprego fixo? — Bryan atravessa impedindo Aidan de me
responder.
— Uma hora ou outra teria que arranjar um.
— Mas no Anarchy?
— Você tem alguma sugestão?
Bryan fica em silêncio enquanto pensa no assunto, mas na verdade não tem
muitas vagas de emprego em Humperville. A não ser que existam pessoas que
ajeitem para você e coloquem sua mão no fogo apostando que você será de
grande importância para uma empresa, não tem muitas possibilidades. E claro,
se for tão rico quanto Darnell e meu pai suas chances aumentam bastante.
— A gente pode tentar — Aidan enfim responde. — Mas você vai trabalhar
ao menos uns quatro meses de graça para compensar o estrago no meu carro.
— Esse tempo todo?
— É pegar ou largar, Delilah.
Fico em silêncio quando reparo que estamos na entrada do condomínio
onde

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