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HERMENêUTICA - APOSTILA - ACATO

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1 
 
 
 
 
 
ACADEMIA E TREINAMENTO DE OBREIROS 
 
 
 
 
 
APOSTILA 
 
 
 
 
 
 
DISCIPLINA: Hermenêutica 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Vitor Paulo Abdias Soares 
2 
 
 
 
 
 
ACADEMIA E TREINAMENTO DE OBREIROS 
 
CURSO BÁSICO EM TEOLOGIA 
 
PROGRAMA GERAL DA DISCIPLINA 
 
I. IDENTIFICAÇÃO 
Disciplina: Hermenêutica 
Professor: Vitor Paulo Abdias Soares 
Carga Horária: 30 horas/aula 
Turma: Única 
Ano: 2014 
Créditos: 02 
Turno: Diurno 
Semestre: 2014.1 
II. EMENTA 
Hermenêutica, sua natureza, história e necessidade, fundamentos e processo; 
considerando algumas regras básicas para na sua aplicação. 
III. OBJETIVO GERAL 
 Fornecer aos alunos condições para ler e interpretar a Bíblia de forma 
responsável, séria e frutífera, seguindo os princípios de interpretação 
consagrados pela história, e que derivam-se das convicções da Bíblia como 
Palavra de Deus. 
IV. OBJETIVO ESPECÍFICO 
 Proporcionar aos alunos um conhecimento básico de hermenêutica; 
 Despertar o aluno a compreender a importância do uso da hermenêutica; 
 Apresentar aos alunos algumas regras básicas para o uso da interpretação 
bíblica. 
V. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO. 
Unidade I - A NATUREZA DA HERMENÊUTICA. 
1. A palavra hermenêutica 
2. Objeto da hermenêutica 
3. O processo hermenêutico 
3 
 
Unidade II - SÍNTESE HISTÓRICA DA INTERPRETAÇÃO CRISTÃ DA BÍBLIA 
1. Escola de Alexandria 
2. Escola de Antioquia 
3. Os Pais Latinos 
4. A Idade Média 
5. A Reforma Protestante 
6. Período Pós-Reforma 
7. Período Moderno e Contemporâneo 
Unidade III - A NECESSIDADE DA HERMENÊUTICA. 
1. O distanciamento causado pela natureza humana da Bíblia 
2. O distanciamento causado pela natureza divina da Bíblia 
Unidade IV - CONSCIENCIA PRÉVIA PARA UMA ELABORAÇÃO 
HERMENÊUTICA. 
1. A Bíblia é Inerrante. 
2. Houve erros de copistas. 
3. Os autores bíblicos não receberam conhecimento pleno e onisciente 
acerca do mundo ao escreverem. 
4. Existem partes difíceis de entender na Bíblia. 
5. As traduções da Bíblia não são inerrantes. 
Unidade V – ASPECTOS DA HERMENEUTICA BÍBLICA 
1. Aspecto Pneumatológico 
2. Aspecto Teológico 
3. Aspecto Gramático 
4. Aspecto Literário 
Unidade VI – REGRAS BÁSICAS DA HERMENÊUTICA BÍBLICA 
1. A Bíblica como autoridade máxima em questão de religião, fé e 
doutrina. 
2. Consideração da Bíblia como revelação de Deus em Jesus Cristo – a 
história da redenção - como mensagem central. 
3. Escritura com Escritura. 
4. Experiência pessoal a luz da Escritura, e não Escritura a luz da 
Experiência pessoal. 
5. Os exemplos morais e éticos da Bíblia somente têm autoridade a sua 
prática, quando recomendados pelo Novo Testamento. 
6. O Antigo Testamento é interpretado pelo Novo. 
7. O texto quer dizer o que o seu autor quis dizer. 
8. O sentido natural deve ser preferido ao figurado. 
9. Cada texto tem apenas um sentido, mas muitas aplicações. 
10. Todo texto deve ser lido à luz do seu contexto 
11. A história da Igreja, embora importante, não deve ser decisiva na 
interpretação das Escrituras. 
12. O texto descritivo só deve ser normatizado se for ensinado em textos 
didáticos. 
 
4 
 
VI. METODOLOGIA 
 Aulas expositivas-dialogais utilizando o projetor de mídia 
 Apresentação de vídeos 
 Círculos de debates 
VII. AVALIAÇÃO 
 Observação participativa e proveitosa do aluno 
 Leitura da bibliografia básica 
VIII. BIBLIOGRAFIA BÁSICA 
KAISER, Walter C; SILVA, Moisés. Introdução à Hermenêutica Bíblica. São Paulo – SP: Ed. 
Cultura Cristã, 2002 
IX. BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR 
VIRKLER, Henry A. Hermenêutica Avançada, Princípios e Processos de Interpretação Bíblica. 
SP: Vida Nova, 1996 
BERKHOF, Louis. Princípios de interpretação bíblica. Trad. de Merval Rosa. 4a ed.RJ: 
JUERP, 1988. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
Introdução 
O estudo da hermenêutica tem sido de fundamental importância ao cristão em 
todas as eras, pois a sua falta nos púlpitos e nos devocionais tem gerado uma 
infinidade de interpretações, heresias e confusão no seio da igreja. O biblicismo ou o 
uso de textos bíblicos sem critérios apropriados, tem gerado muitas discrepâncias 
interpretativas, não é a toa que alguém disse que ―a Bíblia é a mãe das heresias‖. O 
conhecimento de textos bíblicos, embora necessário, não garante o uso adequado dos 
mesmos, é preciso interpretação adequada. O apóstolo Pedro admite, falando das 
Escrituras, que entre as do Novo Testamento "há certas coisas difíceis de entender, que 
os ignorantes e instáveis deturpam, como também deturpam as demais Escrituras [as 
do Antigo], para a própria destruição deles" (2 Pe 3:16). E para maior desgraça e 
calamidade, quando estes ignorantes nos conhecimentos hermenêuticos se apresentam 
como doutos, torcendo as Escrituras para provar seus erros, arrastam consigo 
multidões à perdição. Não há livro mais perseguido pelos inimigos, nem livro mais 
torturado pelos amigos, que a Bíblia, devido à ignorância da sadia regra de 
interpretação. 
Toda leitura de um texto envolve um processo de interpretação do mesmo. Não 
existe compreensão de um texto sem que haja interpretação, mesmo que esta leitura 
seja do jornal e o processo de interpretação aconteça inconscientemente. Sendo um 
texto, a Bíblia não foge a esta regra. Cada vez que a abrimos e lemos, buscando 
entender a mensagem de Deus para nós, engajamo-nos num processo de interpretação. 
A maioria de nós toma por certo que, enquanto lemos, também entendemos o que 
lemos. Tendemos a pensar que nosso entendimento é a mesma coisa do Espírito Santo 
ou o autor humano. Apesar disso, levamos invariavelmente para o texto tudo quanto 
somos, com toda nossa experiência, cultura e entendimento prévio de palavras e idéias. 
Às vezes, aquilo que levamos para o texto, sem o fazer deliberadamente, nos 
desencaminha ou nos leva a atribuir ao texto idéias que lhe são estranhas. 
Como Palavra de Deus, a Bíblia deve ser lida como nenhum outro livro. Mas, 
tendo sido escrita por homens, ela deve ser interpretada como qualquer outro livro. 
Além disto, a Bíblia está distante de nós em diversos aspectos, como veremos adiante, 
o que faz com que nossa leitura dela exija um esforço consciente de interpretação. 
Há muitas pessoas que consideram desnecessária o estudo e o esforço 
intelectual para a compreensão da Bíblia, outras ficam desanimadas com as 
controvérsias e as polêmicas que existem nos meios intelectuais onde se estuda a Bíblia. 
Alguns até pensam que estudos acadêmicos da Bíblia são uma barreira à 
espiritualidade e ao crescimento da Igreja. Podemos entender a atitude de pessoas 
assim, pois realmente existem muito academicismo e intelectualismo árido e infrutífero 
em muitos círculos evangélicos. Por outro lado, rejeitar o estudo da Bíblia não vai 
resolver o problema, pois continuamos diante de um texto antigo, distanciado de nós, 
escrito em outras línguas e que precisa ser interpretado para poder ser entendido. 
Alguns dizem: "Vamos deixar de lado estas questões e simplesmente ler a Bíblia como 
ela é". Infelizmente, uma leitura assim não é possível. Não existe leitura e 
6 
 
entendimento de um texto sem que haja interpretação, mesmo que esta interpretação se 
processe de forma inconsciente. 
As Sagradas Escrituras tratam de temas que abrangem o céu e a terra, o visível e 
o invisível, o material e o espiritual, o tempo e a eternidade. Foram registradas por 
pessoas de variadas classes sociais, em países muito distantes, com diferentes 
costumes, e linguagem tão simbólica que, para uma reta compreensão da sua 
mensagem não podemos dispensar o valioso auxílio da hermenêutica. A liderança e a 
Igreja deve se esforçar ao máximo para compreender e fazer uma boa interpretação da 
Bíblia, tendo em vista que a saúde da nossa fé depende muito disto; pois a nossa visão 
e prática de fé está intrinsecamente ligada a interpretação que fazemos da Bíblia.7 
 
I. A NATUREZA DA HERMENÊUTICA 
1.1. A Palavra Hermenêutica 
A palavra ―interpretar‖ é a tradução de um verbo grego hermeneuo, que tem sua 
origem no nome de Hermes, um deus mensageiro na mitologia grega. Havia uma 
crença na mitologia grega de que havia um deus chamado Zeus, o pai de todos os 
deuses, que morava em panteão, uma espécie de mansão celestial, cercado por outros 
deuses que eram seus filhos; quando Zeus queria falar aos homens enviava Hermes, o 
deus mensageiro, que trazia a sua palavra; Hermes, por sua vez, falava a uma 
sacerdotisa que havia na cidade de Delfos e essa sacerdotisa interpretava para o povo a 
mensagem que ele trazia. Daí a palavra hermeneuo, que significa interpretar a 
mensagem trazida pelos deuses. 
A palavra hermeneuo veio a ser usada com o sentido de explicar, interpretar, 
traduzir. No Novo Testamento temos: Lucas 24:27; 1 Coríntios 12:10; 1 Coríntios 14:28; 
Hebreus 7:2. Roy Zuck define assim hermenêutica: ―Hermenêutica é a arte e a ciência 
de interpretação. É ciência porque postula princípios seguros e imutáveis; é arte 
porque estabelece regras práticas e envolve uma tarefa.‖ 
 
1.2. Objeto da Hermenêutica 
 O objeto da interpretação pode ser uma mensagem escrita (como na 
hermenêutica bíblica) ou oral (como na tradução ou na teoria da comunicação), ou 
pode ser um fenônemo ou ato realizado em outra cultura (como na análise 
transcultural). Em todos estes casos, procura-se entender algum símbolo ou ato 
simbólico desconhecido. 
1.3. O Processo Hermenêutico 
O processo da hermenêutica, ou o processo de como nós entendemos ou 
interpretamos outros símbolos (mensagens, costumes, rituais ou ações), pode ser 
representado graficamente. Vários autores já propuseram modelos visuais do processo 
hermenêutico: um círculo, dois horizontes, três planos, e um espiral. 
 
II. SÍNTESE HISTÓRICA DA INTERPRETAÇÃO BÍBLICA. 
A Interpretação da Bíblia no Período Pós-apostólico. 
Após a morte dos apóstolos, inicia-se a chamada era pós-apostólica, que vai do 
século II até o século IV, época dos grandes concílios ecumênicos na Igreja. No período 
pós-apostólico, a Igreja de Cristo era liderada por pastores e bispos que vieram a 
exercer considerável influência sobre a Cristandade daquela época. São os chamados 
―Pais da Igreja‖. É uma época de intensos debates teológicos sobre questões 
doutrinárias vitais para a sobrevivência da Igreja. Os Pais da Igreja procuravam 
entender qual a verdade de Deus examinando as Escrituras. Debates vigorosos 
acontecem quanto ao sentido exato das palavras dos apóstolos e profetas. Uma das 
questões hermenêuticas centrais era como a Igreja Cristã poderia interpretar as 
profecias, instituições, personagens e eventos do Antigo Testamento de forma a refletir 
a Cristo. 
Duas linhas nítidas e diferentes de interpretação surgem nessa época. A 
primeira, mais alegórica, está relacionada com a cidade de Alexandria. A outra, que 
surge depois em Antioquia em reação à primeira, é mais voltada para o sentido literal 
do texto bíblico. Os problemas que enfrentaram de certa forma anteciparam as 
questões de interpretação que a Igreja iria encarar através da sua história, até o dia de 
hoje. 
8 
 
2.1. A escola de Alexandria (Egito): 
O sistema interpretativo que veio a associar-se com a cidade de Alexandria tem 
suas raízes históricas nas idéias de dois importantes filósofos gregos: Heráclito (Éfeso, 
540?-475?) e Platão (Atenas, 427?-347?); que deram origem a um sistema de 
interpretação chamada de alegorese , termo que vem da palavra grega ―alegoria‖ que 
significa dizer uma coisa em termos de outra. É o conceito de que a verdade se 
encontra alegoricamente oculta além da letra e da realidade visível. Esse modo de 
interpretação influenciou mais tarde um judeu de Alexandria, chamado Filo que tentou 
fazer síntese entre as idéias de Platão e de Moisés, que os tinham como seus heróis, Filo 
escreveu diversas obras e comentários sobre a Lei de Moisés interpretando as 
Escrituras alegoricamente, em termos das idéias, virtudes e moralidade do platonismo. 
Eis alguns exemplos da interpretação de Filo em seus comentários sobre Gênesis: 
 A criação do jardim do Éden (Gn 2.8-14) - O rio Gion (2.13) significa ―coragem‖ e 
circunda a terra de Cuxe, que significa ―humilhação‖; o sentido alegórico é que a 
coragem dá demonstrações de bravura diante da covardia. Já o rio Tigre (2.14) significa 
temperança, pois como um tigre, resiste resolutamente ao desejo. Eufrates (2.14) não se 
refere ao rio. O sentido alegórico é justiça. O rio Pisom (2.11) significa ―mudança na 
boca‖ e Havilá ―tagarelar‖, que Filo interpreta como significando ―insensatez‖. A 
interpretação alegórica da passagem é que a insensatez é destruída pela ―mudança na 
boca‖, que é o falar com prudência! 
 A criação e queda do homem (Gn 2-3) - Filo considera fábula a narrativa da criação da 
mulher da costela de Adão, após o mesmo haver adormecido. Ele rejeita a interpretação 
literal da passagem. O sentido verdadeiro é que Deus tomou o poder dos sentidos 
externos (Eva) e o conduziu à mente (Adão). Esse poder é sempre ameaçado pelo 
prazer (a serpente). A promessa messiânica, ―Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o 
calcanhar‖ (3.15) é interpretada como Deus dizendo ao prazer (serpente) que a mente (o 
homem) vai vigiá-la e que em troca, o prazer (serpente) vai atacar a mente (homem) 
oferecendo os prazeres mais básicos (morder o calcanhar)! 
Quando o Evangelho alcançou Alexandria, muitos se tornaram cristãos. Um dos 
líderes foi Barnabé (150? AD) que ficou conhecido pela Carta de Barnabé, onde 
interpreta alegoricamente o Antigo Testamento seguindo os métodos de Filo. O 
exemplo mais famoso da carta é a interpretação que ele faz de Gênesis 14.14 (onde se 
mencionam os 318 homens de Abraão) para provar que Abraão sabia não somente o 
nome de Cristo, mas até que ele haveria de morrer na cruz: 
Barnabé 9:6 – Portanto, filhos do amor, aprendam abundantemente a respeito de 
Abraão. Ele, que primeiro estabeleceu a circuncisão, olhava em espírito para Jesus, 
quando circuncidou a sua casa. Pois a Escritura diz ―Abraão circuncidou 318 homens da 
sua casa‖ [―Ouvindo Abrão que seu sobrinho estava preso, fez sair trezentos e dezoito 
homens dos mais capazes, nascidos em sua casa, e os perseguiu até Dã‖, Gn 14.14]. Que 
conhecimento lhe foi dado naquela ocasião? Compreendam: Ele [Deus] disse primeiro 
18 e depois do intervalo, 300. No 18, o número 10 equivale a ―I‖ (no alfabeto grego) e 8 a 
―H‖. Aqui tu tens JESUS (IHSOYS). 300 equivale a ―T‖ e aqui tens a cruz. Então, Ele 
[Deus] revelou Jesus nas duas letras e a cruz na última. 
Um outro líder foi Pantenus. Inicialmente um filósofo estóico, Pantenus 
converteu-se e fundou uma escola cristã catequética em Alexandria no século II. O 
sistema utilizado na escola para interpretar a Bíblia era alegórico. Desde o seu 
nascimento, a escola de Alexandria estava influenciada pelo neoplatonismo, uma 
escola filosófica que segue as idéias de Platão. Os principais representantes cristãos 
com esse sistema de interpretação foram: Pantenus, Clemente de Alexandria, Origenes. 
Orígenes dizia que os cristãos detinham o sentido mais profundo das Escrituras, que 
havia sido ocultado dos judeus incrédulos. 
9 
 
Orígenes dizia haver três níveis de sentido nas Escrituras, correspondentes às 
três dimensões da personalidade humana: 
1) Carne – a interpretação literal e óbvia corresponde à carne ou ao corpo humano, que 
é visível e evidente a todos que o vêem. Esse tipo de interpretação é para os indoutos. 
2) Alma – aqueles que já fizeram algum progresso na vida cristã começam a discernir 
sentidos mais além do óbvio. 
3) Espírito – a interpretação alegórica, própria dos que são espirituais. 
Alguns exemplos de sua interpretação das Escrituras: 
 Rebeca vem tirar água do poço e encontra os servos de Abraão (Gn 24.15-17) - 
significa que diariamente devemos vir aos poços da Escritura para ali nos 
encontrarmos com Cristo. 
 Faraómandando matar os meninos e preservando as meninas hebréias (Ex 
1.15-16) - os meninos significam o espírito intelectual e sentidos racionais 
enquanto que as meninas significam paixões carnais. 
 As seis talhas de pedra, que os judeus usavam para as purificações (Jo 2.6), 
significam os sentidos moral e literal das Escrituras e às vezes, o espiritual. 
 O sentido verdadeiro (alegórico) da passagem sobre o divórcio (Mt 19.9) é a 
separação da alma do seu anjo da guarda. 
Devemos nos lembrar que Origines e outros estavam tentando defender a Igreja 
dos ataques dos judeus e dos pagãos, e achavam que alegorizar as passagens difíceis 
da Bíblia era o caminho. Por exemplo, quando os pagãos acusavam Deus de ser 
desumano por mandar matar mulheres e crianças, Origines respondia com uma 
interpretação alegórica das passagens, dizendo que não eram para ser entendidas 
literalmente. 
Origines influenciou muitos Pais da Igreja como Dionísio o Grande, Eusébio de 
Cesaréia, Didimo, o Cego, e Cirilo de Alexandria, que seguiram sua interpretação 
alegórica. Embora Origines tivesse um alto apreço pelas Escrituras (que ele 
considerava como Palavra de Deus inspirada) e reconhecesse a presença de Cristo nas 
Escrituras do Antigo Testamento, defendeu, sistematizou e promoveu um sistema de 
interpretação que ao fim diminuía o caráter histórico de algumas passagens e que não 
dispunha de controles adequados contra o subjetivismo. Entretanto, a reação viria 
alguns séculos depois, em Antioquia. 
2.2. Escola de Antioquia (Síria): 
A escola de Antioquia foi fundada por Luciano de Samosata (240-312 AD), 
teólogo cristão que deu origem a uma tradição de estudos bíblicos que ficou conhecida 
pela erudição e conhecimento das línguas originais. Luciano fundou em Antioquia da 
Síria uma escola de estudos bíblicos em oposição consciente ao método alegórico 
ligado a Alexandria, particularmente ao método de Orígenes. Essa escola tornou-se 
famosa por sua abordagem literal das Escrituras. 
O sistema de interpretação adotado por Antioquia teve muitos e ilustres 
defensores entre os Pais da Igreja. Alguns dos mais conhecidos e importantes foram: 
Deodoro de Tarso (m.390 AD) ,Teodoro de Mopsuéstia (m.428 AD) ,João Crisóstomo 
(m.407 AD) 
Podemos resumir os principais princípios de interpretação desenvolvidos e 
utilizados pela escola de Antioquia e por seus representantes da seguinte forma: 
1. Sensibilidade e atenção ao sentido literal do texto. Era uma abordagem que poderia 
ser chamada de "gramático-histórica". 
2. Desenvolvimento do conceito de theoria. Esse termo designava o estado mental dos 
profetas em que recebiam as visões, em oposição à alegoria. Era uma intuição ou visão 
10 
 
pela qual o profeta podia ver o futuro através das circunstâncias presentes. Depois da 
visão, era possível para ele descrever em seus escritos tanto o significado 
contemporâneo dos eventos bem como seu cumprimento futuro. A theoria era o 
princípio usado pelos antioquianos para se descobrir um sentido mais que literal nas 
palavras dos profetas do Antigo Testamento, permanecendo-se fiel ao seu sentido 
literal. Entretanto, embora reconhecessem que havia um sentido mais profundo e 
completo nas palavras dos profetas, estavam bem distantes da alegorese alexandrina. 
3. Não negavam o caráter metafórico de algumas passagens: reconheciam que havia 
um sentido mais profundo nas profecias do Antigo Testamento e que havia tipologias, 
como a que Paulo fez em Gálatas 4.21-31. Entretanto, afirmavam a historicidade da 
narrativa vétero-testamentária e procuravam em seguida descobrir o sentido teológico 
da mesma. 
4. Buscavam determinar a intenção do autor, pela atenção cuidadosa ao sentido 
histórico das palavras em seu contexto original. 
5. Eram contra descobertas arbitrárias de Cristo no Antigo Testamento, como as feitas 
pela alegorese alexandrina. Concordavam que Cristo estava presente nas Escrituras do 
Antigo Testamento, mas reagiam contra a idéia de que cada palavra, evento, número, 
personagem ou instituição das mesmas poderia ser interpretada de forma alegórica de 
modo a sempre encontrar-se a Cristo nelas. 
Exemplos de interpretação 
Teófilo de Antioquia, um dos precursores da escola de Antioquia, numa obra 
entitulada ―A Autólico‖, enfatiza que o Antigo Testamento é um livro histórico 
contendo a história autêntica dos atos de Deus para com Israel. Ele esforça-se para 
traçar uma cronologia bíblica, da criação até seus dias. A mensagem do Antigo 
Testamento é que o Deus de quem ele dá testemunho é o criador dos céus e da terra. 
Isso é possível porque os autores humanos foram inspirados por Deus e podiam 
portanto escrever sobre coisas que aconteceram antes e depois de sua época. 
Lembremos que muitos intérpretes alexandrinos tendiam a rejeitar a importância da 
historicidade do relato da criação (Gen 1 e 2), valorizando o sentido mais profundo ou 
espiritual do mesmo. Deodoro de Tarso, que viveu 200 anos após Teófilo, deixou-nos 
um comentário dos Salmos onde a interpretação cristológica moderada de Antioquia 
reflete-se claramente. Ali vemos em ação o princípio antioquiano de não atribuir a um 
texto do Antigo Testamento uma interpretação cristológica que não possa ser provada 
e demonstrada pelo Novo Testamento. Comentando o Salmo 22, Deodoro nega que o 
mesmo seja messiânico, pois a descrição literal dos sofrimentos do autor do Salmo não 
combinam com os sofrimentos de Cristo. O Salmo 24 também não é messiânico, mas 
refere-se ao judeus que voltaram do cativeiro babilônico. 
Teodoro de Mopsuéstia é provavelmente o intérprete que seguiu mais 
rigidamente os princípios de interpretação da escola de Antioquia quanto à abordagem 
cristológica do Antigo Testamento. Para ele, uma passagem no Antigo Testamento só 
pode ser considerada messiância se for usada como tal no Novo Testamento. Meras 
alusões não são suficientes. Assim, passagens como o sacrifício de Isaque, que nunca 
são referidas no Novo Testamento como referindo-se a Cristo, não são consideradas 
messiânicas. 
Podemos perceber vários aspectos positivos na obra dos antioquianos. A escola 
de Antioquia adotou uma leitura das Escrituras que pode ser chamada de ―gramático-
histórica‖, pois buscava principalmente descobrir a intenção do autor humano como 
11 
 
meio de determinar-se o sentido de uma passagem bíblica. Os antioquianos 
procuravam fazer justiça ao caráter histórico da Escritura. 
Um ponto negativo é que em alguns casos, a rigidez da abordagem restringia o 
alcance das profecias do Antigo Testamento somente aos tempos de Israel e produziu 
uma tipologia cristã muito pobre. 
Em que pese a influência de sua interpretação especialmente nas igrejas sírias, a 
escola de Antioquia não prevaleceu na Igreja Cristã como o sistema interpretativo mais 
aceito. Uma das razões foi que alguns líderes heterodoxos ou heréticos condenados 
pelos concílios ecumênicos eram seguidores do método de Antioquia. Dois exemplos: 
1. Nestório (morreu em 451 AD), o patriarca sírio de Constantinopla. Foi condenado 
pelo Concílio de Éfeso por fazer uma distinção por demais exagerada entre as duas 
naturezas de Cristo, ao ponto de quase admitir a existência de duas pessoas no mesmo 
Cristo. 
2. No Ocidente, Juliano, o bispo pelagiano de Eclano (morreu em 454 AD), era o 
principal defensor dos princípios de Antioquia. 
Apesar do fracasso da escola de Antioquia em estabelecer o seu método de 
interpretação, sua influência foi muito além dos limites da cidade de Antioquia. Os 
Pais Latinos, estudiosos que escreveram em latim e cuja influência haveria de 
perpetuar-se na Igreja, seguiram via de regra um sistema de interpretação semelhante 
ao desenvolvido pelos antioquianos. 
2.3. Os Pais Latinos 
É a designação que se dá aos Pais da Igreja que viveram nos séculos IV e V, 
cujas obras foram escritas em latim. Os mais relevantes para nossa História da 
Interpretação são: Tertuliano (155- após 220 AD); Jerônimo (c.347-420 AD) na Palestina 
(Belém); Agostinho (354-430AD) em Roma, Ticônio, que viveu no Norte da África; 
Ambrosiaster, nome dado ao autor desconhecido de um comentário sobre as cartas de 
Paulo datando do séc. IV. 
Principais características hermenêuticas 
1. Favoreciam a interpretação literal 
Os Pais Latinos seguem no geral a linha de interpretação da escola de 
Antioquia, ou seja, mais atentos ao sentido gramático-histórico do texto bíblico. Alguns 
exemplos: 
2. Davam atenção ao contexto histórico da passagem 
Muito embora respeitassem as Escrituras como a Palavra de Deus, os intérpretes 
alegoristas tendiam a desprezar o contexto histórico e cultural em que elas foram 
escritas, tratando-as via de regra quase que como um livro que havia caído já pronto do 
céu. Os Pais Latinos eram mais sensíveis ao contexto em que as Escrituras foram 
produzidas: 
 Jerônimo, por exemplo, declarou que o Antigo Testamento era um livro 
oriental, escrito numa língua oriental e num contexto oriental – coisas que 
precisavam ser levadas em consideração pelo intérprete. 
 Em sua obra Cidade de Deus, Agostinho, tentando explicar o mais terrível evento 
de sua época – a queda de Roma – demonstra sensibilidade para com a maneira 
pela qual Deus lida com Israel na história (história da redenção) como 
princípios da ação de Deus na história que explicariam a queda do Império 
Romano. Em contraste com a ―cidade terrena‖ (civitas terrena) representada por 
Roma, mas energizada pelos desejos humanos de receber glória e honra, 
12 
 
Agostinho projeta a civitas dei, construída para o louvor e glória de Deus, a 
Jerusalém celestial, da qual a nova Roma da Igreja Católica era a imagem. 
3. Algumas vezes alegorizavam o Antigo Testamento 
Os Pais Latinos não estavam de todo livres da maior tentação hermenêutica da sua 
época, que era interpretar as Escrituras alegoricamente. Uma das ocasiões em que 
acabavam alegorizando o texto bíblico era quando respondiam aos ataques dos judeus 
de que os cristãos torciam o sentido do Antigo Testamento para provar que Cristo era o 
Messias. No afã de provar que Cristo estava em todas as passagens do Antigo 
Testamento, eles acabavam forçando algumas passagens, dando-lhes uma 
interpretação alegórica, para ―achar‖ a Cristo nelas. De qualquer forma, era menos 
ruim do que alegorizar os textos bíblicos para encontrar neles as virtudes e as teses do 
platonismo! 
A espiritualização do Antigo Testamento se dava principalmente por causa da 
convicção de que o Novo Testamento está oculto no Antigo Testamento, e o Antigo é 
iluminado pelo Novo. Nas palavras de Agostinho, In vetere novum lateat, et in novo vetus 
pateat (―No Velho o Novo está subentendido e no Novo o Velho se torna patente‖, 
Quaest. in Heptateuchum 2.73). 
4. Passagens mais obscuras devem ser interpretadas à luz das mais claras 
Para muitos intérpretes nessa época, a solução para resolver contradições entre 
passagens das Escrituras era alegorizar as que fossem mais obscuras. Os Pais Latinos, 
ao contrário, adotam outra solução. Procuravam interpretar uma passagem obscura e 
difícil à luz de outras que tratassem do mesmo assunto e que fossem mais claras. Era 
essa a regra que procuravam seguir. O que estava por detrás dessa regra era a crença 
na unidade da Escritura, ponto que Agostinho faz explicitamente em seu comentário 
em Gênesis 22. 
5. Harmonia com a regra da fé da Igreja 
Os Pais Latinos viveram numa época em que a Igreja estava começando a 
adquirir uma estrutura fixa em Roma. Ao contrário da tradição oriental, que era 
influenciada por Alexandria e que via o texto como ―aberto‖ (no sentido de ser uma 
rica mina de sentidos), os Pais Latinos praticavam uma exegese ―fechada‖, seguindo os 
dogmas dos concílios da época, onde o texto aceitava apenas uma interpretação, que 
devia ser crida e recebida por todos. 
De entre os Pais Latinos, aquele cujas idéias e cuja hermenêutica mais 
influenciou a Igreja Ocidental foi Agostinho. Infelizmente, foi somente um aspecto da 
sua hermenêutica que prevaleceu, o reconhecimento de que havia um sentido além do 
literal nas palavras da Bíblia. Na Idade Média, a preocupação por sentidos além do 
literal dominou quase que completamente; isso não quer dizer que houve somente 
interpretações alegóricas da Bíblia durante a Idade Média. Em meio a esse período, 
uma pequena, mas forte tradição interpretativa, em muito similar à de Antioquia, 
surgiu e acabou por preparar o caminho da hermenêutica utilizada pelos 
reformadores. 
2.4. A Idade Média 
Nesse período (séculos VI a XVI). No geral, prevaleceu o sistema de 
interpretação difundido por Alexandria (alegórico), Entretanto, nem toda exegese 
dessa época foi alegórica. 
Um dos primeiros representantes dessa época é João Cassiano (m. cerca de 435 
AD). Cassiano foi um dos maiores defensores do semi-pelagianismo naquela época. É 
atribuída a ele a famosa distinção entre os 4 sentidos da Escritura, também chamada de 
―quadriga‖: 
13 
 
1. Histórico ou literal - o sentido evidente e óbvio do texto 
2. Alegórico ou cristológico - o sentido mais profundo, geralmente apontando 
para Cristo 
3. Tropológico ou moral - o sentido que determinava as obrigações do cristão e 
a sua conduta 
4. Anagógico ou escatológico - o sentido que apontava para as coisas vindouras 
que o cristão deveria esperar 
 
Características da Interpretação Bíblica dessa época 
Apoio à liturgia da Igreja 
O ponto interpretativo central era o lugar da lei de Moisés especialmente nas 
cerimônias litúrgicas da Igreja. Para justificar o seu uso, era preciso alegorizar o texto 
do Antigo Testamento de forma a permitir que as cerimônias do culto do Antigo 
Testamento pudessem ser aplicadas ao contexto cristão. Práticas como uso de corais, 
velas, imagens, etc., passaram a ser justificadas com base em textos da Escritura 
interpretados alegoricamente. 
Apoio ao dogma eclesiástico 
O ensino bíblico feito na Igreja tinha como alvo primário sustentar os dogmas 
eclesiásticos. Assim, o ensino da Bíblia passou a ser identificado com tais dogmas. Para 
isso, era preciso muitas vezes alegorizar o texto sagrado. Uma relativa falta de 
criatividade marcou o período. A maioria dos comentaristas perpetuava os 
comentários antigos, citando-os e não produzindo nada novo a não ser inventando 
criativamente novos sentidos para justificar os novos dogmas e cerimônias. 
Aplicações Práticas 
A preocupação principal era prática. O período das polêmicas havia passado 
após o Concílio de Calcedônia (451 AD, sobre a pessoa de Cristo). No desejo de aplicar 
as Escrituras, espiritualizava-se seu sentido para permitir a acomodação. 
Ênfase na obscuridade das Escrituras 
Segundo Farrar nos informa em seu livro de história da interpretação, com o 
objetivo de proteger a usurpação hierárquica, os monges, bispos e padres exageraram o 
fato de que existem passagens obscuras na Bíblia e assim a mantiveram longe das 
multidões. Transformaram-na em algo semelhante ao livro fechado a 7 chaves 
mencionado em Apocalipse, cujo sentido somente os bispos e monges podiam 
desvendar. 
Exemplos da interpretação alegórica da Idade Média 
 A interpretação alegórica de Jó 1.1-5 feita por Gregório é bem representativa. Jó 
teve 7 filhos e 3 filhas; 7 representa os apóstolos, já que 7 é composto de 4 e 3, 
que multiplicados dão 12. Os números 3 e 4 indicam que a Trindade é pregada 
nos 4 cantos da terra. As 3 filhas representam os 3 santos de Ezequiel 14.14, 
Noé, Daniel e Jó, que por sua vez representam os sacerdotes, o celibato e o que 
é fiel no casamento! 
 A ressurreição da filha de Jairo na presença de umas poucas testemunhas 
provava a confissão auricular privada a um sacerdote. 
 O sistema levítico era empregado para defender a idéia de que cada presbítero 
cristão era um sacerdote apto a realizar o santo sacrifício da missa. 
14 
 
 ―Do SENHOR são as colunas da terra‖ (1 Sm 2.8) defendia a existência de 
cardeais. 
 Salmo 8.7-8: ―Deste-lhe domínio sobre as obras da tua mão e sob seus pés tudo 
lhe puseste:ovelhas e bois, todos, e também os animais do campo; as aves do 
céu, e os peixes do mar, e tudo o que percorre as sendas dos mares‖. Essa 
passagem foi usado por Antônio, bispo de Florença, para provar que Deus 
havia posto todas as coisas debaixo dos pés do papa: as ovelhas são os cristãos; 
os bois, são os judeus e os heréticos; os animais do campo são os pagãos; os 
peixes do mar são as almas no purgatório. 
 As duas varas mencionadas em Zacarias 11.7 são os Franciscanos e os 
Dominicanos. 
 Salmo 74.13: ―Esmagaste sobre as águas a cabeça dos monstros marinhos‖ era 
usado para defender a expulsão de demônios através do batismo. 
Presença de uma tradição hermenêutica gramático-histórica 
O tipo de interpretação praticado durante a Idade Média era alegórico, 
fantasioso, arbitrário, como os exemplos acima demonstram. Isso não quer dizer que 
nada desse período foi de algum proveito. Uma nova apreciação pelo sentido literal 
das Escrituras surgiu no período Medieval, devido a alguns fatores: Surgimento das 
escolas de teologia nos mosteiros, A influência de Rashi um judeu erudito famoso, 
Publicação de obras que favoreciam a interpretação literal (a exemplo as obras de 
Aristóteles), Surgimento das ordens mendicantes (O que levou Francisco de Assis a 
vender tudo o que tinha, dar aos pobres e sair pelo mundo pregando o Evangelho 
como ele o entendia), A tradução das Escrituras para o vernáculo (obra pioneira de 
João Wycliffe, que foi traduziu a Vulgata (em latim) para o inglês, a língua do seu 
povo). 
O apreço renovado pelo sentido literal por parte de estudiosos e monges não 
representou o abandono do método alegórico. Este permaneceu inatacado na Idade 
Média, como o principal método empregado. Os que haviam descoberto a importância 
do sentido literal mantiveram também o sistema alegórico de interpretação. 
O ressurgimento do interesse no final da Idade Média pela interpretação 
gramático-histórica preparou, em certo sentido, a grande revolução hermenêutica que 
foi a Reforma protestante. 
2.5. A Reforma Protestante 
A Reforma protestante foi, em muitos sentidos, um movimento hermenêutico. 
Representa um momento crucial na história da interpretação cristã das Escrituras. O 
domínio de séculos de interpretação alegórica é finalmente quebrado. O retorno aos 
princípios de interpretação defendidos pela escola de Antioquia marca a pregação, o 
ensino e os princípios dos reformadores. 
A Bíblia na Reforma 
Os reformadores rejeitaram e combateram o conceito de que a hierarquia da 
Igreja era a autoridade máxima em questões religiosas, com um papa decidindo 
infalivelmente as questões. Os reformadores insistiram que a Bíblia era o juiz maior de 
todas as controvérsias religiosas, interpretando-se a si mesma através de suas partes. 
Ela passou a ser central e crucial no pensamento e na prática dos seguidores da 
Reforma, ao contrário do lugar secundário que ocupava no catolicismo da Idade 
Média. 
Com o resgate da posição central da Bíblia na fé e na prática da Igreja, a sua 
certeza, divindade, veracidade e autoridade ganharam ainda mais destaque, já que os 
cristãos agora tinham de apelar a ela para resolver debates teológicos. Antes, era uma 
15 
 
hierarquia infalível encabeçada por um papa infalível que decidia todas as questões 
religiosas. A Reforma protestante, agora, sabia que a decisão destas questões somente 
podia ser alcançada através do Espírito Santo falando através da Palavra de Deus 
inspirada e infalível. 
A tendência então passou a ser a harmonização das passagens difíceis da Bíblia. 
Na época medieval as passagens difíceis eram interpretadas e resolvidas em harmonia 
com a tradição e os dogmas da Igreja. No passado, Origines havia recorrido à alegoria 
nesses casos. Mas os Reformadores tinham de achar uma outra solução, já que 
rejeitavam a autoridade da hierarquia eclesiástica e a alegorese. E esse caminho foi o de 
interpretar a Escritura com a Escritura visando harmonizar as aparentes contradições. 
A ênfase à infalibilidade da Escritura (doutrina nunca negada por Roma, mas 
subjugada pela tradição medieval) evitou que ela recebesse um tratamento crítico como 
um livro comum de religião. Os Reformadores estavam conscientes de que a Bíblia era 
um livro humano, isto é, foi escrito por homens em uma linguagem humana, vivendo 
numa época e cultura específicas. Por outro lado, reconheciam o caráter divino da 
mesma. Empregaram todos os recursos disponíveis na época para o estudo bíblico, 
mas suas conclusões eram controladas pela doutrina da inspiração, veracidade e 
infalibilidade das Escrituras. Foi somente após o Iluminismo e a chegada do 
racionalismo na Igreja que o método histórico-crítico foi desenvolvido. A partir daí,a 
Bíblia passou a ser examinada sem os pressupostos que controlavam a exegese da 
Reforma, mas com os pressupostos do racionalismo. 
Características da interpretação dos reformadores 
Associada à essa perspectiva das Escrituras, e mesmo em decorrência dela, os 
reformadores desenvolveram um sistema de interpretação que representou um 
rompimento radical com a hermenêutica alegórica medieval. Eis suas principais 
características: 
1) Ênfase no sentido literal, gramático-histórico do texto 
Havia a preocupação dos reformadores em chegar ao sentido óbvio, claro e 
simples de cada passagem das Escrituras. Eles ensinavam que cada texto tem um só 
sentido, que é o literal — a não ser que o próprio contexto ou outro texto das Escrituras 
requeiram claramente uma interpretação figurada ou metafórica 
2) Rejeição da alegorese 
Os reformadores rejeitaram o conceito que prevaleceu na Idade Média de que o 
texto tinha diversos sentidos, sendo o alegórico o mais importante. Rejeitaram o uso da 
alegorese por parte dos escolásticos medievais. Lutero costumava referir-se às alegorias 
dos escolásticos em termos como "fábulas nojentas". 
3) A necessidade da iluminação do Espírito Santo 
Os reformadores enfatizaram a natureza divina das Escrituras, isto é, que elas 
foram dadas por inspiração divina. A natureza espiritual da mensagem das Escrituras 
era a principal barreira à sua compreensão por parte de pessoas que não tinham o 
Espírito. Assim, enfatizaram o papel indispensável do Espírito Santo no processo de 
interpretação da mensagem da Bíblia. 
4) A necessidade de estudar as Escrituras 
Igualmente, os reformadores reconheciam que a Bíblia era um livro humano. 
Muito embora insistissem na clareza das Escrituras, já que eram divinas quanto à 
origem, reconheciam por outro lado a necessidade de estudar e pesquisar as Escrituras, 
visto que também eram humanas. Isto é, haviam alguns pontos obscuros nelas que 
precisavam de maior atenção para serem elucidados. 
5) Escritura com Escritura 
16 
 
"Se são obscuras num lugar, são claras em outros", disse Lutero com referência 
às Escrituras. Esse princípio da Reforma estabeleceu que a única regra infalível de 
interpretação das Escrituras é a própria Escritura. Ela se auto-interpreta, elucidando, 
assim, suas passagens mais difíceis. 
O ponto de Lutero e dos demais reformadores era que o sentido das Escrituras 
não poderia mais ser determinado por tradição, nem por decisão eclesiástica, nem por 
argumento filosófico, nem por intuição espiritual, mas sim, unicamente, por outras 
partes das mesmas que explicassem e esclarecessem o seu sentido. 
6) Intenção do autor humano 
Todos os reformadores se preocuparam em determinar a intenção do autor, que 
era geralmente o sentido literal de uma passagem, a menos quando o próprio autor 
indicava em contrário. Essa era a chave que abria o sentido do texto e determinava o 
seu sentido. 
7) Uso de outras obras 
Os reformadores fizeram uso abundante da erudição antiga, citando 
comentaristas medievais, as obras dos pais apostólicos e obras de contemporâneos. 
Apesar de insistirem na necessidade da iluminação do Espírito para a correta 
interpretação das Escrituras, não desprezaram o que o Espírito já havia revelado a 
outros antes deles. 
Foramesses princípios que serviram de base para o surgimento da 
interpretação gramático-histórica que veio a prevalecer na Igreja após a Reforma. Estes 
e outros princípios de interpretação praticados pelos reformadores (Lutero, Calvino e 
demais reformadores alemães, suíços, franceses e ingleses), viriam a ser desenvolvidos 
e adotados pelo protestantismo ortodoxo em geral desde então, e se tornaram 
conhecidos pelo nome de método gramático-histórico de interpretação bíblica. 
Entretanto, o grande ímpeto hermenêutico da Reforma, que representou um 
retorno às Escrituras, sofreu diversas influências no período pós-reforma. 
2.6. Período Pós-Reforma 
Alguns estudiosos consideram que o período após a Reforma protestante foi 
negativo para a interpretação cristã das Escrituras e representou, em vários aspectos, 
um retrocesso das conquistas hermenêuticas dos reformadores. Podemos concordar 
que nem tudo correu bem nos arraiais protestantes nessa área, mas seria uma 
radicalização injustificada rejeitar o trabalho dos estudiosos dessa época. 
Dogmatismo e controvérsias 
Um dos estudiosos mais críticos dessa época é Frederic Farrar, que escreveu uma obra 
sobre a história da interpretação da Bíblia pelos cristãos. A opinião de Farrar 
representa bem a de outros estudiosos, que podemos resumir em 4 pontos: 
1. A academia pós-reforma reintroduziu o escolasticismo cristão da Idade Média, 
pois promoveu o confessionalismo, o sobrenaturalismo (em detrimento do 
aspecto humano das Escrituras) e a crença num conceito de inspiração verbal 
das Escrituras que ia além daquele dos reformadores. Um exemplo citado é a 
"Fórmula Consensual Helvética", feita por François Turretini e dois outros 
teólogos em 1675, onde afirmam que até mesmo os sinais usados para a 
vocalização do texto hebraico (que certamente não faziam parte dos 
manuscritos originais do Antigo Testamento) foram divinamente inspirados e 
por isso eram inerrantes. 
2. A exegese passou a ser controlada pela dogmática, isto é, pelo conjunto de 
doutrinas características dos reformadores. Com isso, o lado humano das 
Escrituras foi minimizado e foram impostos limites doutrinários à liberdade de 
investigação. 
17 
 
3. Já que a autoridade da hierarquia da Igreja católica para interpretar 
corretamente as Escrituras havia sido rejeitada, o caos instalou-se com as 
muitas e diferentes interpretações e idéias entre os protestantes. 
4. Tornaram a Bíblia num "papa de papel", ao colocá-la no lugar da interpretação 
infalível da Igreja. Como vimos na aula anterior, os Reformadores rejeitaram a 
doutrina de que a interpretação final das Escrituras era dada pela hierarquia 
católica, encabeçada pelo papa, e sujeitaram-se à autoridade unicamente das 
Escrituras, como a melhor intérprete de si mesma. Para Farrar e outros, isso 
representou apenas a transferência do conceito de infalibilidade do papa para 
um livro, ou seja, a troca de um "papa" humano por outro de papel. 
Segundo alguns críticos, foi esse tipo de interpretação que veio a dominar o 
período subseqüente e a marcar a hermenêutica reformada. 
Entendendo a hermenêutica da Pós-Reforma 
Sem negar que houve extremos e radicalizações em setores da academia pós-
Reforma, dizemos que o momento que ela viveu não permitia caminhos muito 
diferentes dos que ela tomou. 
A tendência à sistematização do ensino bíblico e o surgimento de confissões e 
tratados teológicos nasceu das controvérsias doutrinárias entre os protestantes. Essas 
controvérsias eram inevitáveis, desde que a Reforma havia rejeitado a autoridade final 
da hierarquia da Igreja de Roma e introduzido o conceito do livre exame das 
Escrituras. Com isso, vários entendimentos diferentes apareceram, provocando o 
desejo de uma formulação sistemática cada vez mais detalhada. 
O desejo de sistematizar em detalhes a doutrina cristã era também uma questão 
de sobrevivência: a Contra-Reforma, movimento católico de reação aos protestantes, 
vinha desde o século XVI recuperando o terreno perdido, através dos Jesuítas. Era 
preciso que as igrejas reformadas tivessem respostas claras e prontas para seus 
membros. Catecismos e tratados eram a saída mais rápida e fácil. 
Também devemos lembrar que no período da pós-Reforma havia uma 
preocupação maior entre os estudiosos protestantes de harmonizar e sintetizar o 
ensino das Escrituras de forma racional, para que o mesmo pudesse ser melhor 
compreendido e ensinado. Um outro fator a ser lembrado é o profundo desejo dos 
estudiosos protestantes daquela época de preservar a doutrina bíblica e rechaçar os 
falsos ensinos de Roma. A melhor maneira era organizar cuidadosamente a doutrina 
protestante, de forma sistemática, para que pudesse servir de manual doutrinal e 
confessional da Igreja. Foi nesse contexto que apareceram as confissões protestantes 
mais importantes, que serviriam mais tarde para a preservação doutrinária do 
Protestantismo histórico. 
Finalmente, existem profundas diferenças entre a doutrina reformada da 
autoridade das Escrituras e a católica da infalibilidade papal, e as conseqüências de 
ambas para a vida da Igreja. A crítica de que os reformadores adotaram um "papa de 
papel" parece-nos na verdade dirigida à doutrina reformada da infalibilidade das 
Escrituras. 
De fato, a hermenêutica da pós-Reforma teve seus problemas. Seria um 
exagero, entretanto, dizer que toda exegese que foi feita naquela época era ruim. Veja-
se o clássico comentário de Matthew Henry e o sério trabalho de exegese feito pelos 
autores da Confissão de Fé de Westminster. 
Vemos também que qualquer que seja o sistema religioso ou hermenêutico, a 
questão final é quem decide qual a interpretação correta. A Igreja Católica resolveu 
essa questão criando a idéia de uma hierarquia eclesiástica encabeçada por um papa 
18 
 
infalível e descendente espiritual dos apóstolos de Cristo. Seitas geralmente têm seus 
líderes e fundadores. Para nós, reformados, a autoridade máxima é o Espírito de Deus 
falando através das Escrituras. Por mais subjetivo que isso possa parecer, essa 
abordagem tem garantido nos anos de existência da Igreja reformada uma coesão de 
pensamento nos pontos fundamentais do Cristianismo, em meio à enorme variedade 
que caracteriza os protestantes. 
2.7. Período Moderno e Contemporâneo 
O impacto do Iluminismo e do Racionalismo na Hermenêutica bíblica 
O Iluminismo, movimento surgido no início do século XVIII, era em vários aspectos 
uma revolta contra o poder da religião institucionalizada e contra a religião em geral. 
As pressuposições filosóficas do movimento eram, em primeiro lugar, o Racionalismo 
de Descartes, Spinoza e Leibniz, e o empirismo de Locke, Berkeley e Hume. Os efeitos 
combinados dessas duas filosofias -- que mesmo sendo teoricamente contrárias entre si 
concordavam que Deus tem de ficar de fora do conhecimento humano -- produziu 
profundo impacto na hermenêutica bíblica. Não é que os teólogos se tornaram ateus 
ou agnósticos, mas sim que tentaram combinar o Racionalismo com as verdades da fé 
cristã. Surge então o deísmo. Deísmo é o termo aplicado ao pensamento dos livre 
pensadores dos séculos XVII e XVIII que procuraram compatibilizar a crença em Deus 
e o Racionalismo do Iluminismo. O deísmo afirma a existência de Deus, mas nega sua 
intervenção na história humana, quer através de revelação, quer através de milagres 
ou da providência. 
Podemos destacar dois importantes resultados da influência do Iluminismo 
sobre a interpretação bíblica: Rejeição do sobrenatural e da revelação, Exegese 
controlada pela razão. 
Assim, muitos pastores e teólogos que criam que a Bíblia era a Palavra de Deus, 
influenciados pela filosofia da época, tentaram criar um sistema de interpretação da 
Bíblia que usasse como critério o que fosse racional ao homem moderno. Muitos 
desses estudiosos passaram a ser "deístas". Seguiram-se várias tentativas 
hermenêuticas de unir fé e Racionalismo, dando origem ao chamado "método 
histórico-crítico" de interpretação bíblica. 
Característicasda interpretação bíblica desenvolvida nesse período 
1) Reação contra o dogmatismo e o controle da exegese feito pela teologia sistemática 
2) Surgimento do conceito de "mito" na Bíblia 
3) Exige-se a separação entre os dois Testamentos -- Houve reação dos estudiosos 
críticos contra a interpretação do Antigo Testamento feita do ponto de vista do Novo 
4) Abandono da doutrina da inspiração e inerrância das Escrituras. 
5) A influência da dialética de Hegel marcou o final desse período. 
 A tentativa de unir o Racionalismo com a exegese bíblica não produziu um 
resultado satisfatório. Muito embora o método histórico-crítico tenha avançado em 
alguns aspectos nosso conhecimento de como a Bíblia foi feita, seus pressupostos 
acabaram por tirar o sobrenatural da Bíblia. 
Ficamos com uma Bíblia que deixou de ser a Palavra de Deus para se tornar o 
testemunho de fé do povo de Israel e da Igreja Primitiva. Quando leio a Bíblia, não é 
Deus quem eu encontro, mas a fé dos antigos. Foi Deus quem nos deu a capacidade de 
raciocinar e de analisar logicamente as coisas. Entretanto, o Racionalismo esqueceu-se 
de que a razão do homem está corrompida pelo pecado. A simples análise racional, 
não pode trazer o verdadeiro conhecimento de Deus ao homem. "O homem natural 
não entende as coisas do Espírito de Deus" (1 Co 2.14). É somente com a assistência do 
Espírito, trazendo cativo todo pensamento à obediência de Cristo (2 Co 10.5), que 
podemos apropriadamente entender as coisas de Deus.A exegese racionalista 
19 
 
predominou por muitos anos na Igreja. Mas seu predomínio começou a ser quebrado 
quando os próprios racionalistas começaram a perceber as limitações do método 
histórico-crítico. Aí, entramos no período chamado de pós-moderno. 
O pós-modernismo 
Os estudiosos da nossa época situam em algum lugar das décadas de 70 e 80 o 
nascimento da pós-modernidade. Alguns historiadores e cientistas políticos têm 
tomado como símbolo da queda da modernidade a queda dos muros de Berlim, que 
separava as Alemanhas Oriental e Ocidental, inaugurando uma nova era na Europa e 
posteriormente no mundo. 
Como o nome indica, a pós-modernidade é o período da história que veio para 
tomar o lugar do período moderno. Como já vimos nas aulas anteriores, a 
hermenêutica bíblica sempre acompanhou os movimentos da história. E não tem sido 
diferente no caso da pós-modernidade: profundas mudanças têm acontecido na 
hermenêutica em anos recentes. 
Para melhor entendermos essas mudanças, notemos algumas das características da 
pós-modernidade. 
1. A pluralidade da verdade. 
2. A rejeição do ideal racionalista da busca da verdade. 
3. O abandono do conceito de neutralidade na pesquisa científica. 
4. A defesa do pluralismo inclusivista. 
5. O conceito do "politicamente correto". 
O impacto na interpretação cristã das Escrituras 
Como era de se esperar, essa mudança afetou profundamente a academia cristã 
com reflexos na hermenêutica bíblica. É verdade que as "novas luzes" (novos 
conceitos) trazidas pela pós-modernidade têm sido recebidas com cautela e cuidado 
pelos estudiosos reformados conservadores, que ainda relutam em aceitá-las, 
especialmente por causa dos efeitos que terão na pregação, na evangelização e na vida 
das igrejas cristãs. Mas os novos conceitos hermenêuticos da pós-modernidade 
conseguiram entrar em muitos círculos acadêmicos de estudo da Bíblia e produziram 
diversos tipos novos de interpretação e abordagem das Escrituras, como veremos nas 
aulas seguintes. 
Em linhas gerais, podemos destacar os seguintes efeitos da pós-modernidade na 
hermenêutica bíblica: 
1. O abandono do uso de métodos críticos para reconstruir o processo histórico 
da formação dos textos bíblicos. 
2. A abertura para a pluralidade de interpretações. 
3. Mudança na natureza da hermenêutica. 
4. Impossibilidade da recuperação do sentido original do texto. 
5. Emprego das teorias atuais de lingüística e de obras de hermenêutica 
filosófica. 
6. Retorno à Alexandria? 
7. Deslocamento do foco do sentido. 
As principais idéias e autores desse período foram: mantendo a tradição da 
interpretação literal F. Turrentin, John Wesley, J. A. Turretin, Cappell, Ernesti, Bengel 
e Wettstein; o racionalismo com a rejeição do sobrenatural e da revelação de 
Descartes, Spinoza e Leibniz influenciou uma hermenêutica marcada 1. Reação contra o 
dogmatismo e o controle da exegese feito pela teologia sistemática 2. Surgimento do conceito de 
"mito" na Bíblia 3. Exige-se a separação entre os dois Testamentos 4. Abandono da doutrina da 
inspiração e inerrância das Escrituras 5. A influência da dialética de Hegel; na pós-
20 
 
modernidade a hermenêutica está marcada pela 1. Pluralidade da verdade 2. A rejeição do 
ideal racionalista da busca da verdade 3. O abandono do conceito de neutralidade na pesquisa 
científica. 4. A defesa do pluralismo inclusivista. 5. O conceito do "politicamente correto". Essa 
hermenêutica da pós modernidade foi influenciada por Friedrich Schleiermacher 
(1768-1834); Rudolf Karl Bultmann (1884-1976); Ferdinand de Saussure (1857-1913); 
Hans-Georg Gadamer (n. 1900); Jacques Derrida (francês, n. 1930). 
As mudanças acontecidas no mundo acabam por afetar a Igreja, quer queiramos 
ou não. Isso não significa dizer que todas as igrejas, seminários, pastores e estudiosos 
evangélicos foram afetados pela pós-modernidade ao ponto de conscientemente 
alterar a abordagem das Escrituras e adotar os seus postulados. Muitos seminários e 
eruditos evangélicos, conservadores e reformados permanecem cautelosos diante do 
entusiasmo precoce de outros que abraçaram rapidamente o espírito da pós-
modernidade. 
Observemos que o pêndulo hermenêutico do relógio da história da Igreja está 
movendo-se outra vez, saindo do campo mais literalista para o do além-do-literal, 
numa versão pós-moderna da antiga alegorese alexandrina. Essa é a tendência atual. E 
como na Antigüidade, podemos apreciar o que há de positivo nessas tendências e usá-
las a serviço do Reino, examinando-as, é claro, com critério e cautela. 
Em nossos labores como professores, pastores e crentes, devemos manter juntas 
essas três coisas que vão nos guiar no caminho de uma hermenêutica sadia: 
compromisso e fidelidade à Palavra de Deus, conhecimento da história da Igreja, 
disposição para aprender com a nossa geração. 
III. A NECESSIDADE DA INTERPRETAÇÃO BÍBLICA 
 Alguém pergunta: por que devemos interpretar a Bíblia, ela não é a Palavra de 
Deus? E não foi dada por Ele com o objetivo de se fazer conhecido, portanto a leitura 
não deveria ser algo de simples compreensão?De fato, embora a Bíblia tenha sido dada 
por Deus com objetivo de se revelar é notório que ao longo dos séculos na história da 
interpretação da Bíblia, determinados textos suscitaram diferentes interpretações às 
vezes contraditórias causando confusão e divisão. Existe, portanto, algo na Bíblia que 
não a torna assim tão óbvia e tão fácil ao leitor superficial, daí a importância de 
entendermos o que é a Bíblia e da necessidade que temos de interpretar. 
Existem alguns obstáculos que distanciam uma compreensão adequada das 
Escrituras que precisam ser superados. 
3.1. O Distanciamento Causado Pela Natureza Humana da Bíblia. 
O fato de que a Bíblia não caiu pronta do céu, mas que foi escrita por diferentes 
pessoas em diferentes épocas, línguas e lugares, alerta-nos para o que alguns 
estudiosos têm chamado de distanciamento. O fenômeno do distanciamento aparece 
em diversas áreas: 
 Distanciamento temporal - A Bíblia está séculos distante de nós. Seu último 
livro foi escrito pelo final do século I da Era Cristã, o que nos separa 
temporalmente em cerca de dois milênios. A distância temporal, num mundo 
em constantes mudanças, faz com que a maneira de encarar o mundo, os 
aspectos culturais e linguísticos dos escritores da Bíblia se percam no passado 
distante. Portanto, como qualquer documento antigo, a Bíbliaprecisa ser lida 
levando-se isto em conta. Os princípios de interpretação da Bíblia procuram 
condições de transpor este abismo temporal. 
 Distanciamento contextual - Os livros da Bíblia foram escritos para atender a 
determinadas situações, que já se perderam no passado distante. É verdade que 
ao serem incluídos no cânon bíblico, eles passaram a ser relevantes para a Igreja 
21 
 
universal. Por outro lado, recuperar o contexto em que estes livros foram 
escritos é essencial para entendermos melhor a sua mensagem. As cartas de 
Paulo foram escritas visando atender às necessidades de igrejas locais. Não 
posso entender corretamente o ensinamento do apóstolo sobre o uso do véu 
pelas mulheres (1 Coríntios 11) se não estiver consciente do problema que 
estava acontecendo na Igreja relacionado com a participação das mulheres no 
culto. Igualmente, 1 João toma outra relevância quando fico consciente de que 
João estava escrevendo contra a influência de uma forma incipiente de 
Gnosticismo nas igrejas da Ásia Menor. Ou ainda, que o livro de Habacuque foi 
escrito num contexto de iminente invasão por potências estrangeiras. A 
mensagem do evangelho de Marcos fica mais clara quando descobrimos que 
Marcos escreveu provavelmente para ajudar os crentes romanos a enfrentar as 
provações que sofriam por causa de Cristo. E o livro de Jonas - especialmente a 
atitude de Jonas contra os ninivitas - ganha maior clareza quando descubro que 
havia uma antipatia natural dos judeus contra os ninivitas por causa dos seus 
grandes pecados. Os princípios de interpretação da Bíblia procuram transpor as 
dificuldades criadas pela distância contextual. 
 Distanciamento cultural - O mundo em que os escritores da Bíblia viveram já 
não existe. Está no passado distante, com suas características, costumes, 
tradições e crenças. Muito embora a inspiração das Escrituras garanta que sua 
mensagem seja relevante para todas as épocas, devemos lembrar que esta 
mensagem foi registrada numa determinada cultura, da qual traços foram 
preservados na Bíblia. Os princípios de interpretação da Bíblia devem levar em 
conta o jeito de escrever daquela época, a maneira de expressar conceitos e 
ilustrar as verdades, para poder transpor a distância cultural. 
 Distanciamento linguístico - As línguas em que a Bíblia foi escrita também já 
não existem. Não se fala mais o hebraico, o grego e o aramaico bíblicos nos dias 
de hoje, mesmo nos países onde a Bíblia foi escrita. Como cada língua tem seu 
jeito próprio de comunicar conceitos (apesar de uma estrutura comum a todas), 
princípios de interpretação da Bíblia devem levar em conta estas 
peculiaridades. O conhecimento do paralelismo hebraico certamente nos ajuda 
a entender os Salmos melhor, bem como os profetas. 
 Distanciamento autorial - Devemos ainda reconhecer que teríamos uma 
compreensão mais exata da mensagem de alguns textos bíblicos 
reconhecidamente obscuros se os seus autores estivessem vivos. Poderíamos 
perguntar a eles acerca destas passagens complicadas que escreveram e que 
continuam até hoje dividindo os melhores intérpretes quanto ao seu 
significado. Por exemplo, Pedro poderia nos esclarecer o que ele quis dizer com 
"Cristo foi e pregou aos espíritos em prisão". Ou ainda, Paulo poderia nos dizer 
o que ele quis dizer com "o que farão os que se batizam pelos mortos?". Mateus 
poderia finalmente tirar a dúvida sobre o sentido da frase de Jesus "não 
terminarão de percorrer as cidades de Israel até que venha o Filho do Homem". 
Daniel poderia nos esclarecer a quem ele se referia por Ciro (de quem não 
temos registro fora da Bíblia) e porque considerava Belsazar filho de 
Nabucodonosor, quando era filho de Nabonido. Não endossamos o que alguns 
estudiosos afirmam, que com a morte do autor perdeu-se a possibilidade de 
recuperar-se a intenção dos mesmos. A razão é que a intenção deles sobrevive 
no que escreveram. Mas certamente a ausência do autor faz com que a 
interpretação de textos obscuros seja necessária. Princípios de interpretação 
devem levar em conta o distanciamento autorial, e buscar meios de recuperar a 
intenção deles nos próprios textos que escreveram. 
22 
 
O distanciamento, portanto, exige de nós a tarefa de interpretar. Interpretar é 
exatamente tentar transpor o distanciamento em suas várias formas, como 
mencionadas acima, e chegar ao sentido exato do texto. De forma geral, o ponto central 
da mensagem da Bíblia é tão claro que pode ser entendido por todos, mesmo os que 
não estão conscientes do distanciamento. A prova disto é que a Igreja vem se 
mantendo viva e ativa através dos séculos, sendo composta em sua quase absoluta 
maioria de pessoas que não têm treinamento teológico, histórico e lingüístico que 
permitiriam uma leitura mais informada das Escrituras. Por outro lado, uma maior 
exatidão e clareza acerca de todos os aspectos da mensagem bíblica não poderá ser 
alcançada sem interpretação consciente. 
3.2. O Distanciamento Causado Pela Natureza Divina da Bíblia. 
Por outro lado, o fato de que a Bíblia foi inspirada por Deus, sendo assim a Sua 
Palavra, deve ser levado em conta por aqueles que desejam interpretá-la corretamente. 
A divindade e a humanidade das Escrituras devem ser mantidas em equilíbrio. 
Quando enfatizamos uma em detrimento da outra, acabamos por cair em algum dos 
erros hermenêuticos que caracterizam a história da interpretação cristã das escrituras. 
 Distanciamento natural - a distância entre Deus e nós é imensa. Ele é o Senhor, 
criador de todas as coisas, do céu e da terra. Somos suas criaturas, limitadas, 
finitas. Nossa condição de seres humanos impõe limites à nossa capacidade de 
entender e compreender as coisas de Deus. Não impede a possibilidade deste 
conhecimento, com certeza, mas o limita. O fato de sermos seres humanos 
tentando entender a mensagem enviada pelo Deus criador em si só representa 
um distanciamento. A distância entre a criatura e o Criador, tão freqüentemente 
mencionada nas Escrituras, tem seus efeitos também na nossa hermenêutica. 
Princípios de interpretação não podem ignorar isto e pensar que bastam 
ferramentas hermenêuticas corretas para que possamos entender a Deus. O 
distanciamento provocado pela nossa humanidade deve procurar ser 
transposto por princípios de interpretação que reconheçam a necessidade da 
iluminação do Espírito. 
 Distanciamento espiritual - o fato de que somos pecadores impõe ainda mais 
limites à nossa capacidade de interpretação da Bíblia. Somos seres afetados pelo 
pecado tentando entender os desígnios do Deus puro e santo. A Queda é um 
conceito espiritual, mas com certeza não pode ser deixado de lado em qualquer 
sistema interpretativo das Escrituras. Transpor o abismo epistemológico 
causado pela Queda é certamente o ponto de partida. A regeneração e a 
conversão são a resposta de Deus a esta condição. 
 Distanciamento moral - é a distância que existe entre seres pecadores e egoístas 
e a pura e santa Palavra que pretendem esclarecer. A corrupção de nossos 
corações acaba por introduzir na interpretação das Escrituras motivações 
incompatíveis com o Autor das mesmas. Infelizmente a história da Igreja 
mostra como diferentes grupos manipulam as Escrituras para defender, provar 
e dar autoridade a seus pontos de vista. Certamente existem pessoas sinceras, 
embora equivocadas. Mas não podemos negar que o distanciamento moral 
acaba nos levando a torcer o sentido das Escrituras, procurando usá-la para 
nossos fins nem sempre louváveis. No parágrafo seguinte mencionamos alguns 
exemplos. 
A Bíblia tem sido usada como prova das mais conflitantes teorias e idéias, o que 
mostra que ler e entender imparcialmente a sua mensagem não é tão fácil e costumeiro 
assim. A Bíblia foi usada pelos protestantes de países colonizadores para justificar a 
23 
 
escravidão, usando textos do Antigo e Novo Testamentos que falam da escravidão sem 
contudo aboli-la (Ex. 21.2-6). Os seus opositores usaram também a Bíblia para defender 
as idéias abolicionistas,usando a parábola do bom samaritano e "amarás o teu próximo 
como a ti mesmo". 
A Bíblia também foi usada para provar que os judeus deveriam ser 
perseguidos, que a guerra santa contra os muçulmanos era a vontade de Deus, que os 
protestantes brancos são uma raça superior, para executar as bruxas, para impedir o 
casamento dos padres, para defender a masturbação, para justificar o aborto e a 
eutanásia, para regular o tamanho das saias e do cabelo das mulheres cristãs, para 
prover aceitação e fortalecimento dos homossexuais, para proibir ingerência de 
qualquer tipo de bebida alcoólica, para proibir transfusão de sangue, para proibir o 
serviço militar, para defender a poligamia nos dias de hoje, para defender o suicídio 
religioso em massa, etc. O catálogo é imenso. 
Tudo isto mostra que não é tão fácil "simplesmente ler a Bíblia e fazer o que ela 
diz". Nunca desanimemos da possibilidade (muito real!) de entendermos com clareza o 
ensinamento das Escrituras, mas reconheçamos humildemente que nunca poderemos 
ter uma compreensão unânime de todas as suas passagens complicadas. Sabendo que a 
Bíblia vem de Deus, temos ânimo para buscá-lo em oração, suplicando a Sua graça e 
Sua iluminação em nossa tarefa como intérpretes. 
IV. CONSCIENCIA PRÉVIA PARA UMA ELABORAÇÃO HERMENÊUTICA. 
 Alguns esclarecimentos são imprescindíveis a uma boa trajetória interpretativa 
do estudante bíblico, a seguir listaremos alguns: 
4.1. A Bíblia é Inerrante. 
Por toda história da Igreja tem se aceitado o fato de que a Bíblia, como Deus no-
la concedeu, está livre de erro. Desde os dias dos primeiros gnósticos, com quem Paulo 
contendeu, até o advento do deísmo, no século XVIII, não havia contestação, porém, o 
racionalismo e o movimento deísta do século XVIII, conduziu a uma modificação 
drástica da posição de inerrância atribuída a Bíblia. A Bíblia como Palavra de Deus 
assume a prerrogativa de ser infalível e digna de confiança. Esta doutrina é 
fundamental, pois sem ela nos perderíamos sobre o que e não crer. Contudo se faz 
necessário alguns esclarecimentos. 
4.2. Houve erros de copistas. 
Existem cerca de 5000 manuscritos do N.T. hoje e sempre aparecem outros a 
medida que avançam as descobertas, estes manuscritos consiste em livros inteiros da 
Bíblia ou fragmentos tanto dos evangelhos como das cartas de Paulo ao serem 
comparados se percebe diferenças de palavras, inversão de frases, ausência ou 
duplicação de frases. Depois que os autores bíblicos escreveram os textos começaram a 
ser copiados pelas Igrejas, não havia Xerox nem imprensa na época, esses escritos eram 
feitos a mão e com isso, naturalmente, ao copiarem os textos acabaram tendo certos 
descuidos incorrendo em certos erros. Contudo os estudiosos da manuscritologia 
afirmam que esses erros não afetam a mensagem essencial das Escrituras, e que esses 
erros chegam de 5% a 7% apenas, de toda a Bíblia. 
4.3. Os autores bíblicos não receberam conhecimento pleno e onisciente acerca do 
mundo ao escreverem. 
 Na sua revelação Deus respeitou a cultura e o conhecimento que os escritores 
possuíam em seu tempo. Um exemplo está em Lv 11:19 quando Moisés escreve a 
respeito das aves impuras colocando o morcego como ave, ou em Josué 10:13 onde se 
fala que o sol e a lua parou ou em vários momentos onde se descreve o sol se 
24 
 
levantando ou se pondo. A Bíblia não foi escrita em linguagem científica moderna, mas 
em linguagem comum partindo da observação do escritor de sua época. 
4.4. Existem partes difíceis de entender na Bíblia. 
 É preciso está ciente que na Bíblia existem muitos trechos difíceis de entender e 
até mesmo de harmonizarem-se é preciso um esforço mais detido e uma pesquisa mais 
aplicada para que possa chegar a uma compreensão mais razoável. Ex: a descrição do 
cego de Jericó Mt 20:29-30 e Lc 18:35, o pedido da mãe de Tiago Mt 20:20 e Mc 10:35, a 
geneologia de Jesus descrita diferente entre Mt 1:1-16 e Lc 3:23-37. Textos dessa 
natureza existem vários; para um maior conhecimento indico o livro: Gleason Archer, 
Enciclopédia de Temas Bíblicos, Ed: Vida, 2001. 
 O fato de haver partes difíceis ou aparentes contradições na Bíblia, não significa 
que ela tenha erros ou não seja a verdade, apenas que não temos informações 
suficientes para compreendê-la melhor, em virtude do distanciamento que temos, 
porém, as grandes verdades da Bíblia são muito claras e se repetem várias vezes ao 
longo das Escrituras. 
4.5. As traduções da Bíblia não são inerrantes. 
 A Bíblia não foi escrita em Português as nossas Bíblias é a tradução de um texto 
escrito em Hebraico, Aramaico e grego. É preciso está ciente de que nenhuma tradução 
consegue captar todas as nuances de maneira precisa os conceitos da língua original 
pra língua receptora. 
V. ASPECTOS DA HERMENEUTICA BÍBLICA. 
5.1. Aspecto Pneumatológico. 
 Podemos dividir em três etapas a obra do Espírito Santo em comunicar a 
verdade de Deus: 
 Revelação, que foi o primeiro estágio, objetivo em sua natureza. Consistiu na 
atuação do Espírito nos autores bíblicos (sonhos, visões, teofanias etc.) e no 
texto que produziram, de tal forma a termos o registro infalível da Palavra de 
Deus. 
 Inspiração, diz respeito o momento em que o autor bíblico foi registrar a 
revelação; ele contou com a supervisão do Espírito de Deus de tal maneira que 
foi preservado de errar. 
 Iluminação, que é subjetivo, consiste na iluminação de nossa mente para 
compreender a verdade revelada nas Escrituras. Esta é a etapa em que o 
intérprete da Bíblia se ocupa, nesse sentido o que temos agora nem é revelação 
nem inspiração, mas iluminação para compreender a Palavra de Deus. 
Portanto, embora o processo hermenêutico seja um processo mecânico de 
aplicações de regras, a atuação do Espírito é de fundamental importância para a tarefa 
interpretativa sadia. . Há uma série de textos bíblicos que tratam desta relação. (Jo 
14:26, 16:13-15; 1Co 2:10-11,13; 2Co 3:14-16, 1Jo 2:20,27). Porém para não cair em um 
extremismo carismático nocivo se faz necessário traçar um caminho de equilíbrio: 
1. É necessário orar e labutar (o lema de Calvino) para entendermos corretamente 
as Escrituras: orar por iluminação do Espírito e labutar estudando as Escrituras, 
usando todos os recursos disponíveis. 
2. Quanto mais alguém entristece o Espírito de Deus, desobedecendo as Escrituras 
e diminuindo o respeito por sua autoridade, mais e mais tenderá a torcer o 
texto (2 Pe 3.15-16). 
3. Os que crêem que o Espírito de Deus intervém de forma direta no mundo, 
estarão em melhor condição de interpretar os relatos bíblicos sobre profecias e 
25 
 
milagres. Os incrédulos tenderão a interpretar estas passagens como vaticinia ex 
eventu e mitológicas, perdendo de vista a intenção do texto. 
4. O objetivo da exegese não é somente adquirir conhecimento, mas sermos 
transformados pelo poder do Espírito, através da Palavra. Assim, devemos ler 
as Escrituras abertos para sermos transformados pelo Espírito (2 Co 3.18). 
5. Não devemos pressupor que nossa exegese será correta se simplesmente 
orarmos e somos espirituais. O castigo para a preguiça e falta de estudo sério 
será uma exegese forçada e superficial. O Espírito de Deus não me transmitirá 
miraculosamente conhecimentos que eu posso adquirir estudando. 
5.2. Aspecto Teológico. 
Um outro importante aspecto dentro dos princípios de interpretação da Bíblia é a 
influência dos pressupostos, da experiência e de outros fatores inconscientes na leitura 
do texto sagrado, especialmente daquilo que cremos em relação a Deus e às Escrituras. 
As afirmações abaixo têm como alvo abordar alguns pontos essenciais deste 
aspecto da interpretação. 
1. Não existe interpretação "neutra" -- Os estudiosos racionalistas, entusiasmados 
com o pretenso poder da razão para alcançar a verdade através da análise 
lógica, condenaram qualquer atitude ou convicção anterior à investigação, que 
pudesse já condicionar o resultado da mesma. Neste sentido, insistiram em 
deixar de fora da exegese"científica" da Bíblia idéias pré-concebidas sobre ela, 
como a sua inspiração e infalibilidade. O que não quiseram ver na época foi que 
simplesmente substituíram pressupostos teológicos por filosóficos, como a 
concepção do universo como sendo um sistema fechado de causa e efeito e uma 
concepção dialética (hegeliana) da história. 
2. O papel dos pressupostos teológicos sempre foi destacado pela Igreja -- Em 
nossos dias, depois da obra de Schleiermacher, Gadamer, Saussure, Bultmann e 
Derrida, vemos um abandono gradual da utopia racionalista e uma nova 
apreciação pelo envolvimento do intérprete na exegese. Pode parecer a alguns 
que seja uma conquista da hermenêutica pós-moderna. Mas, na verdade, a 
Igreja reformada sempre ensinou que sem fé e sem o auxílio do Espírito não se 
pode entender a Bíblia corretamente. 
3. A natureza da revelação e do entendimento garantem a validade na 
interpretação -- Muito embora nossos pressupostos teológicos formem 
perspectivas dentro das quais o conhecimento da verdade revelada se faz 
possível, isto não torna viciados os resultados da nossa investigação, ao ponto 
de se relativizar irremediavelmente toda interpretação. Na verdade, os 
pressupostos teológicos corretos acerca de Deus e da Escritura nos colocam 
numa posição de melhor entender a sua mensagem. É isto que faz com que 
cristãos do mundo todo, com diferentes horizontes de compreensão, vindos de 
diferentes culturas e que passaram por diferentes experiências, consigam 
interpretar a Bíblia da mesma forma, ao ponto de chegarem aos mesmos 
resultados (adaptados e acomodados à sua linguagem e cultura): Cristo morreu 
pelos nossos pecados, ressuscitou literalmente de entre os mortos, está a direita 
de Deus e virá para julgar os vivos e os mortos. 
4. É essencial o uso correto do círculo hermenêutico - "Círculo hermenêutico" 
refere-se à interação entre o texto e o leitor. O leitor se aproxima do texto 
trazendo seu horizonte de compreensão e lê o texto dentro dos limites deste 
horizonte. O texto, em troca, desafia o leitor a rever criticamente seus 
pressupostos e mudá-los. Após estas mudanças, o leitor novamente aproxima-
26 
 
se do texto, com seu horizonte agora mais definido pelo próprio texto. E aí 
fecha-se o círculo. Já que pressupostos são inevitáveis, bem como o círculo 
hermenêutico, devemos estar constantemente revendo estes pressupostos à luz 
do texto, deixando que a Palavra de Deus nos transforme. O problema não são 
os pressupostos, mas pressupostos incompatíveis com a natureza do texto 
bíblico. O problema com os exegetas histórico-críticos é que não se deixam 
desafiar nem transformar pela Bíblia. 
Pressupostos Reformados 
Na tabela abaixo mencionamos alguns dos principais pressupostos teológicos 
que nos dão perspectivas dentro das quais podemos interpretar as Escrituras com 
competência: 
A existência de Deus Deus existe e atua na história. Milagres e profecia são possíveis. Portanto, 
podemos interpretar os relatos da atividade sobrenatural de Deus como 
história e não mito. Nada impede que o Cristo da fé tenha sido o mesmo 
Jesus da história. 
Revelação 
Progressiva 
Deus se revelou progressivamente. A revelação não foi dada de uma única 
vez, da mesma forma, numa mesma época e às mesmas pessoas. Portanto, 
devo ler o texto bíblico comparando as suas diferentes partes, considerando 
que as mesmas têm uma unidade básica, mas que existe desenvolvimento 
dentro delas. 
Inspiração e 
Autoridade 
Os escritores bíblicos foram movidos pelo Espírito, de tal forma que seus 
escritos são inspirados por Deus. Portanto, são autoritativos e infalíveis. 
Devemos interpretar suas partes difíceis sem recorrer a soluções que 
impliquem na presença de erros, contradições ou inverdades nelas. 
História da 
Redenção 
A Bíblia deve ser lida como o registro dos atos redentores de Deus na 
história. Estes atos foram interpretados e registrados por escritores 
inspirados por Deus. Portanto, a Bíblia deve ser lida, não como um manual 
de ciências, astronomia, geografia ou física, mas como um livro teológico. 
Cristo Devemos ler a Bíblia sabendo antecipadamente que Cristo é a substância de 
todos os tipos e símbolos do AT, do pacto da graça e de todas as promessas. 
Que os sacramentos, genealogias e cronologias da Escritura nos mostram as 
épocas e tempos de Cristo. Cristo, portanto, é a própria substância, centro, 
escopo e alma das Escrituras. 
Cânon O cânon protestante das Escrituras é a coleção feita pela Igreja de livros que 
ela reconheceu que foram dados pela inspiração de Deus. Cada livro deve 
ser lido e entendido dentro deste contexto canônico, que é o contexto 
apropriado para a interpretação. Podemos usar material extra-bíblico para 
esclarecer determinadas passagens, mas os limites do cânon determinam o 
horizonte da exegese. 
 
5.3. Aspecto Gramático. 
As Escrituras foram escritas em línguas humanas: O Antigo Testamento em 
hebraico e aramaico e Novo em grego. Estas línguas não são mais faladas em nossos 
dias. Cada uma delas tinha suas peculiaridades, formas de transmitir conceitos. 
Princípios de interpretação devem levar em conta o papel e a importância do 
conhecimento das línguas originais. 
Além disto, já que não temos os autógrafos, é preciso também considerar a 
importância da crítica textual para o estabelecimento do texto bíblico e para nossa 
27 
 
compreensão adequada das Escrituras. Um outro elemento é o trabalho de tradução da 
Bíblia feito pelos especialistas. Em resumo, sob o aspecto gramático devemos abordar: 
 gramática das línguas originais 
 crítica textual 
 tradução 
Infelizmente prevalece nos meios evangélicos brasileiros um preconceito contra o 
estudo sério e acadêmico da Bíblia. Em muitos círculos acredita-se que basta ter 
comunhão com Deus e vida de oração, para que a leitura da Bíblia, mesmo em 
português, produza um conhecimento exato do seu sentido primário. Conforme já 
enfatizamos antes, a mensagem geral da Bíblia é clara para todos que não conhecem 
outra língua senão o português. A maior parte de nossas traduções é confiável. Mas, 
para os que desejam especializar-se em Bíblia, ter algum conhecimento das línguas 
originais é indispensável. 
Muitos pastores e obreiros simplesmente desejam aprender como fazer as coisas, 
dando pouca ou nenhuma importância ao estudo sério de gramática, esquecendo que 
conhecimento sólido da Palavra de Deus é a base de toda a prática correta na Igreja. Os 
seguintes argumentos visam estimular nossos alunos a estudar hebraico e grego, ainda 
que apenas para conhecer seus fundamentos: 
1. Toda prática precisa de um sólido fundamento teórico. Os que abandonam o 
estudo sério da Bíblia e vão diretamente para a "prática" cedo ou tarde sentirão 
falta de fundamentos teóricos e doutrinários. A Palavra de Deus é o 
fundamento da prática missionária, do aconselhamento, do culto, do serviço 
cristão. Estudá-la com seriedade e profundidade é dever de todo aquele que usa 
a Bíblia como base do que faz. 
2. Como pastores e obreiros, deveríamos ser mais profissionais, e conhecer melhor 
aquilo que usamos diariamente em nosso ministério. Confiaríamos nossas vidas 
a um médico que não leva a sério o estudo de anatomia, de medicina, etc.? E 
confiaremos nossas almas a pastores e líderes que não sabem com exatidão o 
que está escrito no Livro que usam para falar ao povo? 
Avaliando as Traduções 
Desde que a maioria dos estudantes da Bíblia realmente se utiliza de traduções, 
visto não serem treinados para ler a Bíblia nos originais, é uma parte importante do 
aspecto gramático da interpretação avaliar as traduções disponíveis. Os seguintes 
critérios podem ser utilizados pelos estudantes para selecionar as traduções que vai 
usar para interpretar a Bíblia. 
1. A identidade e a capacidade dos tradutores -- escolha traduções que foram 
feitas por comitês ou equipes de estudiosos de várias orientações teológicas, 
como a Almeida e a NVI. Traduções feitas por uma única pessoa são limitadas 
pelo conhecimento

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