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Antígenos e Anticorpos Os anticorpos são proteínas circulantes produzidas nos vertebrados em resposta à exposição a estruturas estranhas conhecidas como antígenos. Os anticorpos são incrivelmente diversos e específicos em suas habilidades de reconhecer estruturas moleculares estranhas e constituem os mediadores da imunidade humoral contra todas as classes de microrganismos. Pelo fato de essas proteínas terem sido descobertas como moléculas séricas que fornecem proteção contra a toxina diftérica, elas foram inicialmente chamadas de antitoxinas. Quando foi observado que proteínas similares poderiam ser geradas contra muitas substâncias, não somente toxinas microbianas, elas receberam o nome geral de anticorpos. As substâncias geradas ou que foram reconhecidas pelos anticorpos foram, então, denominadas antígenos. Anticorpos, moléculas do complexo maior de histocompatibilidade (MHC) e receptores de antígeno da célula T são as três classes de moléculas usadas pelo sistema imune adaptativo para se ligar aos antígeno. Os anticorpos são sintetizados somente pelas células da linhagem de linfócitos B e existem em duas formas: anticorpos ligados à membrana na superfície dos linfócitos B que funcionam como receptores de antígenos, e anticorpos secretados neutralizam as toxinas que previnem a entrada e espalhamento dos patógenos e eliminam os microrganismos. O reconhecimento do antígeno pelos anticorpos ligados à membrana nas células B imaturas ativa esses linfócitos a iniciarem uma resposta imune humoral. As células B ativadas se diferenciam em plasmócitos que secretam anticorpos de mesma especificidade do receptor do antígeno. As formas secretadas dos anticorpos estão presentes no plasma (a porção fluida do sangue), nas secreções mucosas e no fluido intersticial dos tecidos. Na fase efetora da imunidade humoral, esses anticorpos secretados se ligam aos antígenos e disparam vários mecanismos efetores que eliminam os antígenos. A eliminação do antígeno frequentemente necessita da interação do anticorpo com outros componentes do sistema imune, incluindo moléculas tais como proteínas do complemento e células que incluem fagócitos e eosinófilos. As funções efetoras mediadas por anticorpo incluem: neutralização dos microrganismos ou produtos microbianos tóxicos; ativação do sistema complemento; opsonização dos patógenos para fagocitose aumentada; citotoxicidade mediada por célula e dependente de anticorpo, pela qual os anticorpos têm como alvo células infectadas para a lise pelas células do sistema imune inato; e ativação de mastócito mediada por anticorpo para expelir vermes parasitas. Quando o sangue ou plasma forma um coágulo, osanticorpos permanecem no fluido residual, o que é chamado de soro. O soro não possui os fatores da coagulação (que são consumidos durante a formação do coágulo), mas contém todas as outras proteínas encontradas no plasma. Qualquer amostra de soro que apresente moléculas detectáveis de anticorpo que se ligam a um antígeno em particular é comumente chamada de antissoro. O estudo dos anticorpos e suas reações com antígenos é, portanto, classicamente chamado de sorologia. Os soros com alta concentração de moléculas de anticorpo específicas para um antígeno em particular são ditos terem alto título. Um homem adulto e saudável, com 70 kg, produz cerca 2 a 3 g de anticorpos a cada dia. Quase dois terços destes correspondem a um anticorpo chamado de IgA, que é produzido por células B ativadas e plasmócitos nas paredes dos tratos gastrintestinal e respiratório e é ativamente transportado através das células epiteliais para os lúmens destes tratos. Estrutura do Anticorpo Proteínas plasmáticas ou séricas podem ser fisicamente separadas baseando-se nas características de solubilidade das albuminas e globulinas e podem ser separadas com mais precisão pela migração em um campo elétrico, um processo chamado de eletroforese. A maioria dos anticorpos é encontrada no terceiro grupo mais rápido de migração das globulinas, chamado de globulinas gama. Outro nome comum para o anticorpo é imunoglobulina (Ig), fazendo referência à porção que confere imunidade da fração gamaglobulina. Todas as moléculas de anticorpo compartilham as mesmas características estruturais básicas, mas apresentam marcante variabilidade nas regiões onde os antígenos se ligam. Esta variabilidade das regiões de ligação do antígeno é responsável pela capacidade de diferentes anticorpos se ligarem a um grande número de antígenos estruturalmente diversos. Em todos os indivíduos, existem milhões de diferentes clones de células B, cada uma produzindo moléculas de anticorpo com os mesmos locais de ligação do antígeno e diferentes nestes locais dos anticorpos produzidos por outros clones. Uma molécula de anticorpo tem uma estrutura simétrica do núcleo composta de duas cadeias leves idênticas e duas cadeias pesadas idênticas. Ambas as cadeias leve e pesada contêm uma série de unidades homólogas repetidas, cada uma com cerca de 110 resíduos de aminoácidos de comprimento, que se dobram independentemente em um motivo globular que é chamado de domínio Ig. Um domínio Ig contém duas camadas de folhas β-pregueadas, cada camada composta de três a cinco fitas de cadeia polipeptídica antiparalela. As duas camadas são mantidas unidas pela ponte dissulfeto, e faixas adjacentes de cada folha β são conectadas por pequenas alças. Os aminoácidos localizados em algumas destas alças são os mais variáveis e críticos para o reconhecimento do antígeno. ➢ Características estruturais das regiões variáveis do anticorpo A maioria das diferenças de sequência e variabilidade entre os diferentes anticorpos está confinada a três pequenos trechos na região V da cadeia pesada e a três trechos na região V da cadeia leve. Estes segmentos da maior diversidade são conhecidos como regiões hipervariáveis. Elas correspondem a três alças protuberantes conectando fitas adjacentes das cadeias β que compõem os domínios V da cadeia pesada da Ig e as proteínas da cadeia leve. As regiões hipervariáveis são compostas, cada uma, de 10 resíduos de aminoácidos de comprimento, e eles podem ser mantidos no local pelas sequências mais conservadas que formam o domínio Ig da região V. Na molécula de anticorpo, as três regiões hipervariáveis do domínio VL e as três regiões hipervariáveis do domínio VH são mantidas juntas para criar uma superfície de ligação ao antígeno. As alças hipervariáveis podem se assemelhar a dedos protuberantes de cada domínio varável, com três dedos de cada cadeia pesada e três dedos de cada cadeia leve permanecendo juntos para formar o local de ligação do antígeno. Pelo fato de essas sequências formarem uma superfície que é complementar à forma tridimensional do antígeno ligado, as regiões hipervariáveis também são chamadas de regiões de determinação de complementariedade (CDRs). Procedentes de cada região aminoterminal VL ou VH, essas regiões são chamadas de CDR1, CDR2 e CDR3. As CDR3s de ambos os segmentos VH e VL são as mais variáveis das CDRs. As diferenças na sequência entre as CDRs de diferentes moléculas de anticorpo contribuem para superfícies distintas de interação e, dessa maneira, para as especificidades dos anticorpos individuais. A habilidade de uma região V em se dobrar em um domínio Ig é primordialmente determinada pelas sequências conservadas de regiões adjacentes aos CDRs. O confinamento da sequência de variabilidade para três trechos curtos permite que a estrutura básica de todos os anticorpos seja mantida, a despeito da variabilidade das especificidades entre os diferentes anticorpos. A ligação do antígeno pelas moléculas de anticorpo é primariamenteuma função das regiões hipervariáveis de VH e VL. Análises cristalográficas dos complexos antígeno-anticorpo mostram que os resíduos de aminoácidos das regiões hipervariáveis formam múltiplos contatos com os antígenos ligados. O contato mais extenso é com a terceira região hipervariável (CDR3), que também é a mais variável das três CDRs. Entretanto, a ligação do antígeno não é primariamente uma função dos CDRs e os resíduos do arcabouço também podem fazer contato com o antígeno. Além disso, na ligação de alguns antígenos, um ou mais CDRs podem estar do lado de fora da região de contato com o antígeno, não participando, assim, na ligação com ele. ➢ Características estruturais das regiões constantes do anticorpo As moléculas de anticorpo podem ser divididas em classes e subclasses distintas com base nas diferenças na estrutura das regiões C da cadeia pesada. As classes de moléculas de anticorpo também são chamadas de isotipos e são nomeadas como IgA, IgD, IgE, IgG e IgM. Em humanos, os isotipos IgA e IgG podem ainda ser divididos em subclasses, ou subtipos, intimamente relacionadas, chamadas de IgA1 e IgA2 e IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4. As regiões C da cadeia pesada de todas as moléculas de anticorpo de um isotipo ou subtipo têm essencialmente a mesma sequência de aminoácidos. Esta sequência é diferente nos anticorpos de outros isotipos ou subtipos. As cadeias pesadas são designadas pela letra do alfabeto grego correspondente ao isotipo do anticorpo: a IgA1 contém cadeias pesadas α1; IgA2, α2; IgD, δ; IgE, E; IgG1, γ1; IgG2, γ2; IgG3, γ3; IgG4, γ4; e IgM, μ. Nos anticorpos humanos IgM e IgE, as regiões C contêm quatro domínios Ig. As regiões C da IgG, IgA e IgD possuem somente três domínios Ig. Estes domínios são genericamente designados como domínios CH e são numerados sequencialmente a partir do aminoterminal para o carboxiterminal (ex. CH1, CH2 e assim por diante). Em cada isotipo, essas regiões podem ser designadas mais especificamente (ex. Cγ1, Cγ2 na IgG). ➢ Anticorpos Monoclonais Um tumor de plasmócitos (mieloma ou plasmacitoma), assim como a maioria dos tumores de qualquer origem celular, é monoclonal e, dessa maneira, produz anticorpos de uma única especificidade. Na maioria dos casos, a especificidade do anticorpo derivado do tumor não é conhecida; assim, o anticorpo do mieloma não pode ser usado para detectar ou se ligar a moléculas de interesse. Entretanto, a descoberta de anticorpos monoclonais produzidos por esses tumores leva à ideia de que pode ser possível produzir anticorpos monoclonais similares de qualquer especificidade desejada com a imortalização de células secretoras de anticorpo individuais de um animal imunizado com um antígeno conhecido. Os anticorpos monoclonais têm inúmeras aplicações práticas na pesquisa e diagnóstico médicos e na terapia. Algumas das suas aplicações comuns incluem as seguintes: •Identificação de marcadores fenotípicos únicos aos tipos celulares particulares: A base para a classificação moderna dos linfócitos e outros leucócitos é o reconhecimento de populações celulares individuais por anticorpos monoclonais específicos. Esses anticorpos têm sido usados para definir os marcadores dos clusters de diferenciação (CD) para vários tipos celulares. •Imunodiagnóstico: O diagnóstico de muitas doenças infecciosas e sistêmicas se baseia na detecção de antígenos ou anticorpos particulares no sangue, urina ou tecidos pelo uso de anticorpos monoclonais em imunoensaios (Apêndice IV). •Identificação tumoral: Anticorpos monoclonais marcados e específicos para várias proteínas celulares são usados para determinar a fonte tecidual de tumores por meio da coloração de seções tumorais histológicas. •Terapia: Um número de anticorpos monoclonais atualmente é usado terapeuticamente. Alguns exemplos incluem anticorpos contra a citocina fator de necrose tumoral (TNF) usada para tratamento da artrite reumatoide e outras doenças inflamatórias; e anticorpos contra CD20 para o tratamento de leucemias de célula B e para a depleção das células B em certos distúrbios autoimunes. •Análise funcional da superfície celular e moléculas secretadas: Na pesquisa biológica, os anticorpos monoclonais que se ligam a moléculas da superfície celular e estimulam ou inibem funções celulares em particular são ferramentas valiosas para a definição das funções das moléculas de superfície, incluindo receptores para antígenos. Anticorpos monoclonais também são amplamente usados para a purificação de populações celulares selecionadas a partir de misturas complexas, para facilitar o estudo das propriedades e funções dessas células. Síntese, montagem e expressão das moléculas de Ig As cadeias pesadas e leves da imunoglobulina, assim como a maioria das proteínas secretadas e de membrana, são sintetizadas em ribossomas ligados à membrana no retículo endoplasmático rugoso. A proteína é translocada para o retículo endoplasmático, e as cadeias pesadas da Ig são N-glicosiladas durante o processo de translocação. A dobra apropriada das cadeias pesadas da Ig e sua montagem com as cadeias leves são reguladas por proteínas residentes no retículo endoplasmático chamadas de chaperones. Essas proteínas, que incluem a calnexina e a molécula BiP (proteína de ligação), se ligam a polipeptídios Ig recentemente sintetizados e garantem que eles sejam retidos ou alvo para a degradação, a menos que dobrem apropriadamente e se encaixem em moléculas de Ig completas. A associação covalente das cadeias pesadas e leves, estabilizada pela formação de pontes dissulfeto, é parte do processo de montagem e também ocorre no retículo endoplasmático. Após a montagem, as moléculas de Ig são liberadas dos chaperones, transportadas para a cisterna do complexo de Golgi em que carboidratos são modificados e, então, encaminhadas para a membrana plasmática em vesículas. Anticorpos da forma membranar são ancorados na membrana plasmática, e a forma secretada é transportada para fora da célula. A maturação das células B dos progenitores da medula óssea é acompanhada por alterações específicas na expressão do gene da Ig, resultando na produção de moléculas de Ig em diferentes formas. A célula mais inicial na linhagem do linfócito B e que produz polipeptídios Ig, chamada de célula pré-B, sintetiza a forma membranar da cadeia pesada μ. Essas cadeias μ se associam a proteínas chamadas cadeias leves suplentes, para formar o receptor da célula pré-B, e uma pequena proporção do receptor da célula pré-B sintetizado é expressa na superfície celular. Células B imaturas e maduras produzem cadeias leves κ ou l, que se associam às proteínas μ para formar moléculas de IgM. As células B maduras expressam formas membranares de IgM e IgD (cadeias pesadas μ e δ associadas a cadeias leves κ ou l). Esses receptores Ig de membrana servem como receptores da superfície celular que reconhecem antígenos e iniciam o processo da ativação da célula B. O receptor da célula pré-B e o receptor de antígeno da célula B estão não covalentemente associados a duas outras proteínas de membrana, Igα e Igβ, que servem para funções de sinalização e são essenciais para a expressão de IgM e IgD na superfície. Meia-vida dos Anticorpos A meia-vida dos anticorpos circulantes é uma medida de quanto tempo esses anticorpos permanecem no sangue após a secreção pelas células B (ou após a injeção, como no caso de um anticorpo administrado). A meia-vida é o tempo médio antes que o número de moléculas de anticorpo seja reduzido à metade. Diferentes isotipos de anticorpo têm meias-vidas muito diferentes na circulação (embora a IgE ligada à célula associada ao receptor de IgE de altaafinidade no mastócito tenha pequena meia-vida). A IgA circulante possui meia-vida de cerca de 3 dias, e a IgM circulante tem meia-vida de aproximadamente 4 dias. Em contrapartida, as moléculas de IgG circulantes têm meia-vida de cerca de 21 a 28 dias. A longa meia-vida da IgG é atribuída à sua habilidade em se ligar a um FcR específico chamado de receptor Fc neonatal (FcRn), que também está envolvido no transporte da IgG da circulação materna através da barreira placentária, bem como na transferência de IgG materna através do intestino nos neonatos. Em vertebrados adultos, o FcRn é encontrado na superfície das células endoteliais, macrófagos e outros tipos celulares e se liga à IgG micropinocitada nos endossomas acídicos. O FcRn não tem como alvo a IgG ligada aos lisossomas, mas recicla para a superfície celular e o libera em pH neutro, retornando a IgG para a circulação. Este sequestro intracelular da IgG longe dos lisossomas a previne de ser rapidamente degradada, como ocorre como a maioria das outras proteínas séricas, incluindo outros isotipos de anticorpo, e como resultado, a IgG tem meia-vida relativamente longa. Existem diferenças nas meias-vidas de quatro isotipos de IgGs humanas. A IgG3 tem meia-vida relativamente curta porque se liga fracamente ao FcRn. A IgG1 e a IgG3 são as de meia-vida mais longa e mais eficientes em termos de funções efetoras. Ligação dos anticorpos a antígenos Todas as funções dos anticorpos são dependentes de sua habilidade em se ligar especificamente a antígenos. Abordaremos agora a natureza dos antígenos e como eles são reconhecidos pelos anticorpos. ➢ Características dos Antígenos Biológicos Um antígeno é qualquer substância que pode ser especificamente ligada por uma molécula de anticorpo ou receptor de célula T. Os anticorpos podem reconhecer como antígenos praticamente todos os tipos de moléculas biológicas, incluindo simples metabólitos intermediários, açúcares, lipídios, autacoides e hormônios, bem como macromoléculas tais como carboidratos complexos, fosfolipídios, ácidos nucleicos e proteínas. Isso se contrapõe às células T, que reconhecem principalmente peptídios Embora todos os antígenos sejam reconhecidos por linfócitos específicos ou por anticorpos, somente alguns deles são capazes de ativar os linfócitos. Moléculas que estimulam as respostas imunes são chamadas de imunógenos. Macromoléculas são efetivas para estimular os linfócitos B a iniciarem as respostas imunes humorais, porque a ativação da célula B necessita que múltiplos receptores de antígenos sejam mantidos juntos (ligação cruzada). Agentes químicos pequenos, tais como dinitrofenol, podem se ligar aos anticorpos e são, portanto, antígenos, mas não podem ativar as células B por si só (e eles não são imunogênicos). Para gerar anticorpos específicos para esses agentes químicos pequenos, os imunologistas comumente ligam múltiplas cópias destas pequenas moléculas a uma proteína ou polissacarídio antes da imunização. Nestes casos, a pequena molécula química é chamada de hapteno e a molécula grande à qual ele está conjugado é denominada carreador. O complexo hapteno- carreador, ao contrário do hapteno livre, pode agir como um imunógeno. Macromoléculas, tais como proteínas, polissacarídios e ácidos nucleicos, normalmente são muito maiores do que a região de ligação do antígeno de uma molécula de anticorpo. Dessa maneira, qualquer anticorpo se liga a somente uma porção da macromolécula, que é chamada de determinante ou um epítopo. Estas duas palavras são sinônimos usados indistintamente ao longo deste livro. Macromoléculas contêm tipicamente múltiplos determinantes, alguns dos quais podem ser repetidos e cada um, por definição, pode estar ligado por um anticorpo. A presença de múltiplos determinantes idênticos em um antígeno é referida como polivalência ou multivalência. A maioria das proteínas globulares não contém múltiplos epítopos idênticos e não é polivalente, a menos que eles estejam em agregados. A organização espacial de diferentes epítopos em uma única molécula de proteína pode influenciar a ligação dos anticorpos de várias maneiras. Quando os determinantes estão bem separados, duas ou mais moléculas de anticorpo podem ser ligadas ao mesmo antígeno proteico, sem influenciar cada um, tais determinantes são ditos serem não sobrepostos. Quando dois determinantes estão próximos um do outro, a ligação do anticorpo ao primeiro determinante pode causar uma interferência estérica com a ligação do anticorpo ao segundo, tais determinantes são ditos estarem sobrepostos. Em raros casos, a ligação de um anticorpo pode causar uma alteração conformacional na estrutura do antígeno, influenciando positiva ou negativamente a ligação de um segundo anticorpo a outro local na proteína por outros meios além do impedimento estérico. Essas interações são chamadas de efeitos aloestéricos. No caso das proteínas, a formação de alguns determinantes depende somente da estrutura primária e a formação de outros determinantes reflete a estrutura terciária ou conformação (forma). Os epítopos formados pelos vários resíduos adjacentes de aminoácidos são chamados de determinantes lineares. O local de ligação do antígeno de um anticorpo pode normalmente acomodar um determinante linear composto por cerca de seis aminoácidos. Se os determinantes lineares surgem na superfície externa ou em uma região de conformação estendida na proteína dobrada nativa, eles podem ser acessíveis aos anticorpos. Em outros casos, os determinantes lineares podem estar inacessíveis na conformação nativa e aparecem somente quando a proteína é desnaturada. Em contrapartida, os determinantes conformacionais são formados por resíduos de aminoácidos que não estão em sequência, mas se tornam espacialmente justapostos na proteína dobrada. Anticorpos específicos para certos determinantes lineares e anticorpos específicos para determinantes conformacionais podem ser usados para verificar se uma proteína está desnaturada ou em sua conformação nativa, respectivamente. As proteínas podem estar sujeitas a modificações como glicosilação, fosforilação, ubiquitinação, acetilação e proteólise. Essas modificações, por alteração na estrutura da proteína, podem produzir novos epítopos. Tais epítopos são chamados de determinantes neoantigênicos, e eles também podem ser reconhecidos por anticorpos específicos. ➢ Bases Estruturais e Químicas da Ligação do Antígeno Os locais de ligação de muitos anticorpos a antígenos são superfícies planares que podem acomodar epítopos conformacionais de macromoléculas, permitindo que os anticorpos se liguem às grandes macromoléculas. Os seis CDRs, três de cadeia pesada e três de cadeia leve, podem se espalhar para formar uma grande superfície. Em um número de anticorpos específicos para pequenas moléculas, tais como monossacarídios e fármacos, o antígeno é ligado a uma fenda gerada pela aposição próxima dos CDRs dos domínios VL e VH. O reconhecimento do antígeno pelo anticorpo envolve ligação não covalente e reversível. Vários tipos de interações não covalentes podem contribuir para a ligação do anticorpo ao antígeno, incluindo forças eletrostáticas, ligações de hidrogênio, forças de van der Waals e interações hidrofóbicas. A importância de cada um desses depende das estruturas do local de ligação de um anticorpo individual e de um determinante antigênico. A força da ligação entre um único local de combinação de um anticorpo e um epítopo de um antígeno é chamada de afinidade do anticorpo. A afinidade comumente é representada por uma constante de dissociação (Kd), que indica como é fácil separar um complexo antígeno-anticorpo em seus constituintes.Um Kd menor indica uma interação de afinidade mais forte ou maior porque uma menor concentração de antígeno e de um anticorpo é necessária para a formação do complexo. O Kd dos anticorpos produzidos em respostas imunes humorais típicas normalmente varia de cerca de 10 -7 M a 10 -11 M. O soro de um indivíduo imunizado conterá uma mistura de anticorpos com diferentes afinidades para o antígeno, dependendo primariamente das sequências de aminoácidos dos CDRs. Pelo fato de a região de dobradiça dos anticorpos conferir flexibilidade, um único anticorpo pode se ligar a um único antígeno multivalente em mais de um local de ligação. Para a IgG ou IgE, essa ligação pode envolver, no máximo, dois locais de ligação, um de cada Fab. Para a IgM pentamérica, entretanto, um único anticorpo pode se ligar a até 10 diferentes locais. Antígenos polivalentes terão mais de uma cópia de um determinante em particular. Embora a afinidade de qualquer local de ligação de antígeno seja a mesma para cada epítopo de um antígeno polivalente, a força da ligação do anticorpo ao antígeno deve levar em conta a ligação de todos os locais a todos os epítopos disponíveis. Esta força geral de ligação é chamada de avidez e é muito maior do que a afinidade a qualquer local de ligação do antígeno. Assim, a molécula de IgM de baixa afinidade ainda pode se ligar fracamente ao antígeno polivalente porque muitas interações de baixa afinidade (até 10 por molécula de IgM) podem produzir uma interação de alta avidez. Antígenos polivalentes são importantes pelo ponto de vista da ativação da célula B. Interações polivalentes entre o antígeno e o anticorpo também têm significado biológico, uma vez que muitas funções efetoras dos anticorpos são disparadas otimamente quando duas ou mais moléculas de anticorpos são mantidas próximas e juntas pela ligação a um antígeno polivalente. Se um antígeno polivalente é misturado com um anticorpo específico em um tubo de ensaios, os dois interagem para formar imunocomplexos. Na concentração correta, denominada zona de equivalência, anticorpo e antígeno formam uma malha extensamente cruada de moléculas ligadas, de tal forma que a maioria ou todas as moléculas de antígeno e anticorpo estão complexadas em grandes massas. Os imunocomplexos podem ser dissociados em agregados menores pelo aumento da concentração do antígeno, de modo que moléculas de antígeno livre deslocarão o antígeno ligado ao anticorpo (zona de excesso de antígeno), ou pelo aumento da concentração do anticorpo, de modo que as moléculas de anticorpo livre deslocarão o anticorpo ligado aos determinantes antigênicos (zona de excesso de anticorpo). Se uma zona de equivalência é alcançada in vivo, grandes imunocomplexos podem se formar na circulação. Os imunocomplexos que são presos ou formados nos tecidos podem iniciar uma reação inflamatória, resultando em doenças de imunocomplexos. ➢ Características Relacionadas com o Reconhecimento do Antígeno Os anticorpos são capazes de reconhecer especificamente uma grande variedade de antígenos com afinidades variadas. Todas as características do reconhecimento do antígeno refletem as propriedades das regiões V do anticorpo. •Especificidade: Os anticorpos podem ser específicos para os antígenos, diferenciando entre pequenas distinções na estrutura química. A fina especificidade dos anticorpos se aplica ao reconhecimento de todas as classes de moléculas. Por exemplo, os anticorpos podem diferenciar entre dois determinantes proteicos lineares, distinguindo em somente uma única substituição de aminoácidos conservados que tem pouco efeito na estrutura secundária. Este alto grau de especificidade é necessário para que anticorpos gerados em resposta aos antígenos de um microrganismo normalmente não reajam com as próprias moléculas estruturalmente similares ou com os antígenos de outros microrganismos. Entretanto, alguns anticorpos produzidos contra um antígeno podem se ligar a um antígeno diferente, mas estruturalmente relacionado. Isso é conhecido como reação cruzada. Os anticorpos que são produzidos em resposta a um antígeno microbiano algumas vezes têm reação cruzada com os próprios antígenos, o que pode ser a base de certas doenças imunológicas •Diversidade: Um indivíduo é capaz de produzir um grande número de anticorpos estruturalmente distintos, talvez na ordem dos milhões, cada um com uma especificidade distinta. A habilidade dos anticorpos em qualquer indivíduo de se ligar especificamente a um grande número de diferentes antígenos é um reflexo da diversidade do anticorpo, e a coleção total de anticorpos com diferentes especificidades representa o repertório do anticorpo. Essa diversidade é gerada pela recombinação randômica de um quadro limitado de sequências de DNA herdadas para formar genes funcionais que codificam as regiões V das cadeias pesadas e leves, além da adição de sequências de nucleotídios durante o processo de recombinação. As inúmeras variações na estrutura estão concentradas nas regiões hipervariáveis de ligação do antígeno de ambas as cadeias pesada e leve e, assim, determinam a especificidade para os antígenos. •Maturação de Afinidade: A habilidade dos anticorpos em neutralizar toxinas e microrganismos infecciosos é dependente da firme ligação dos anticorpos, sendo a firme ligação alcançada pelas interações de alta afinidade e alta avidez. O mecanismo para a geração de anticorpos de alta afinidade envolve sutis mudanças na estrutura das regiões V dos anticorpos durante as respostas imunes humorais dependentes de célula T aos antígenos proteicos. Essas alterações acontecem por um processo de mutação somática em linfócitos B estimulados pelo antígeno e que gera novas estruturas no domínio V, algumas das quais se ligam ao antígeno com maior afinidade do que o fazem os domínios originais. Aquelas células B produzindo anticorpos de maior afinidade se ligam preferencialmente ao antígeno e, como resultado da seleção, se tornam células B dominantes com cada exposição subsequente ao antígeno. Este processo, chamado de maturação da afinidade, resulta em um aumento na afinidade média de ligação dos anticorpos para um antígeno à medida que a resposta imune evolui. Dessa maneira, um anticorpo produzido durante uma resposta imune primária a um antígeno proteico frequentemente tem um Kd na faixa de 10 -7 a 10 -9 M; nas respostas secundárias, a afinidade aumenta, com um Kd de 10 - 11M ou mesmo menos.
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