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Resenha do livro - Sobre o autoritarismo no Brasil - primeira parte - Disciplina Antropologia jurídica

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Resenha: SCHWARCZ, Lília Moritz. Sobre o autoritarismo brasileiro, São Paulo: Companhia das Letras, 2019, 88-239.
A autora Lilia Moritz Schwarcz antes desconhecida por mim, se tornou uma das minhas autoras favoritas em história do Brasil. Sempre busca fazer uma contextualização sobre todos os assuntos a serem tratados por ela em suas obras. Uma coisa que notei nas outras obras e também nessa é que Lilia possui um conhecimento profundo sobre o período colonial e escravocrata no Brasil.
	Sobre isso, é interessante que a própria autora no final do livro lembra que o historiador é aquele que lembra o que as pessoas querem esquecer e ela fala isso para justificar tudo que ela apresenta sobre nós mesmos. Somos aqueles que reclama do passado e o reproduz.
	A obra aqui analisada, é assim como as demais de Lilia uma leitura prazerosa, com textos objetivos e cheio de informações sobre termos e acontecimentos. Uma leitura direcionada a qualquer pessoa que se interesse pelo país em toda sua dimensão – passado, presente ou até uma análise do futuro (quando digo que pode ser uma análise do futuro é porque ela sempre destaca que sempre repetimos os fatos e ela comprova isso através de fatos).
	No capítulo quatro, intitulado “Corrupção”, um dos capítulos que mais me chamaram atenção, pela riqueza de informações e algumas que, inclusive eu desconhecia. Nesse capítulo ela começa demonstrando a origem da palavra corrupção e propina.
	Ela demonstra que a corrupção está presente em qualquer momento histórico e seu significado é amplo e contínuo e sendo hoje um dos primeiros inimigos da República, a corrupção faz parte do nosso cotidiano desde o Brasil colônia, o que comprova esse nosso passado já muito depreciado são os relatos do século XVII de viajantes que afirmavam que era preferível ser roubado por piratas em alto-mar a aportar no Brasil, “onde teriam que pagar uma série de taxas sobre a mercadoria comercializada, além de serem obrigados a adular os administradores e grandes proprietários com todo tipo de presente”.
	Embora Jessé de Souza critique o termo “jeitinho brasileiro”, segundo Lilia, segundo os mesmo relatos, essas práticas já chamavam atenção daqueles que percorriam as Minas Gerais em pleno século XVIII. Mas, obviamente a corrupção não é um problema apenas nacional, todavia, o fato de termos sido uma colônia de exploração e termos um domínio frágil, levou-nos a desenvolver vários artifícios para burlar o pacto colonial.
	Existia um dito popular naquela época que demonstrava perfeitamente como funcionava no Brasil: “Quem furta pouco é ladrão/ quem furta muito é barão/ quem furta e esconde/ Passa de barão a visconde”. 
	Além do fato de que tudo se comprava no Brasil, ainda o excesso de burocracia levava até mesmo os menos abonados a cometer atos ilícitos, burlando as regras.
	Nesses relatos sobre o Brasil daquele período, achei interessante quando a autora conta “o caso do roubo das joias da coroa”, nesse caso, os ladrões simplesmente foram perdoados e o caso se deu por encerrado pelo Imperador. Esse caso em específico foi um motivo para os nativos começarem a se sentir inseguros em relação ao Imperador, que supostamente não tinha sequer condições de proteger as joias da coroa (nitidamente haviam outros motivos por trás em deixar tudo como estava.
	Mas a república não nos livrou da corrupção e nem mesmo com nossa Constituição cidadã conseguimos nos livrar desse mal. A autora nos mostra como desde o suposto descobrimento do Brasil somos vítimas e culpados disso.
	Entre todos os períodos, o tema ganhou voz principalmente a partir das operações “Mensalão” e “Lava Jato”. Em 2013, após inúmeros escândalos, inúmeros brasileiros foram às ruas lutar contra a corrupção e por melhorias em todos os sistemas (educacional, saúde, segurança) que estavam sucateados e esquecidos.
	Mas algo que acho importante destacar, que a autora diz na página 114, é que “a corrupção só pode existir se estiver disseminada na própria sociedade, a qual, de alguma forma, a acoberta ou redime”. E isso significa que mesmo apesar das inúmeras críticas que fazemos com frequência, acabamos por naturalizar todas as práticas, como se isso fizesse parte de nós e não fosse possível mudar.
	O problema que, essas crises sempre possibilitam a subida de governos autoritários, que se utilizam do discurso de “denúncia” ás práticas corruptas do outro para se autolegitimar e assim , conseguem subir ao poder, sem ao menos apresentar propostas ou planos que venham a modificar alguma coisa no cenário atual. E tudo isso para demonstrar “Sobre o autoritarismo brasileiro”.
	Junto com a corrupção temos as desigualdades, a violência e intolerância como motivos fortes para estarmos entre um dos países no caminho da autocracia. 
	A desigualdade social, não permite a todos as mesmas oportunidades, e principalmente no que diz respeito à educação, isso traz influências muitos perversas. 
Nesse capítulo sobre a desigualdade social o que pra mim é mais marcante é como o governo autoritário de Getúlio Vargas utilizou o nacionalismo e a educação como seus trunfos.
	Algo que preciso destacar sobre esse capítulo é o que a autora diz na página 139: “Para além da manutenção desse tipo de dualismo (faculdade para classe rica x curso profissionalizante para classe ‘ralé’), o sistema educacional brasileiro, em consonância com o seu contexto, criou um curso primário voltado para um modelo de nacionalismo autoritário, então vigente. Elevar a figura do presidente Getúlio Vargas, como ‘pai da nação’, e fazer da escola uma instituição que exige que seus alunos mais ‘absorvam’ conhecimento do que se formem como cidadãos críticos era os objetivos naquele contexto”.
	No final deste capítulo a autora colaciona trecho do texto “A escola perfeita”, impressionantemente lindo, a escola seria um lugar festivo e onde todos aprendem. O que, segundo a autora, seria uma boa utopia diante da nossa realidade. Eu prefiro acreditar na possibilidade de uma geração consciente e comprometida.
	No capítulo seguinte – “Raça e gênero” - , não nada novo do que já estamos “cansados de saber”, Brasil sempre em primeiro como violento, intolerante com as raças e com os gêneros que são marcados para sofrer e morrer (como se não fossemos um país de negros e mestiços aos olhos do resto do mundo).
	Os demais capítulos também mostram muito do que já sabemos. Não que seja dispensável ler sobre isso, jamais! É super importante lembrar a posição que desempenhamos na nossa própria sociedade, legitimando nossos principais problemas e reclamando daquilo que nós mesmos provocamos. A mudança, a meu ver, é muito mais complexa do que a autora apresenta, mas é bom, ser lembrada sempre (considerando ser a função do historiador nos lembrar daquilo que gostaríamos de esquecer) onde estão nossos problemas e que temos, urgentemente, que tomar uma atitude para mudar isso.
	O mundo todo enfrenta uma virada democrática, as crises nos levam a acreditar em discursos vazios, sobre integridade, família e religião, sendo que a democracia está muito acima disso, diz respeito à liberdade e cidadania.

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