Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Universidade de Ribeirão Preto Faculdade de Direito Laudo de Camargo Curso de Direito Créditos sujeitos aos efeitos da recuperação judicial MARIA EDUARDA CASTRO CORRÊA RIBEIRÃO PRETO Junho/2021 CRÉDITOS SUJEITOS AOS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL RESUMO Este presente trabalho acadêmico tem como finalidade tratar sobre o instituto da recuperação judicial, mais especificamente os créditos sujeitos aos seus efeitos, bem como o crédito trabalhista. Para tanto foram utilizadas doutrinas, legislação vigente e jurisprudência. 1 INTRODUÇÃO O princípio da preservação da empresa é um dos alicerces que orienta o Direito Empresarial. Por essa razão, a crise econômica de uma empresa é juridicamente examinada como suscetível de recuperação quando se tratar de devedores viáveis, ou seja, crise superável. O instituto de recuperação de empresa com previsão na Lei 11.101/2005, é considerado um grande avanço jurídico quanto a preservação da empresa e sua função social, reabilitando os empresários e as sociedades empresariais à retomada das suas atividades econômicas no mercado. Garantindo dessa forma a fonte produtora de emprego e os interesses dos credores. E ao contrário da falência, a recuperação permite que o devedor se mantenha no comando das atividades da empresa durante o processo. Perdendo esse direito apenas se julgado e condenado por prática de ato ilícito (art. 65 da Lei 11.101/2005). Existem duas formas de recuperação previstas em lei, a forma judicial e extrajudicial. A recuperação judicial, tema do presente trabalho, pode ser requerida somente por empresários ou sociedades empresárias. Após a decisão de deferimento do processamento da recuperação judicial, o devedor deverá apresentar, em até sessenta dias, o plano de recuperação, o qual contará a discriminação dos meios, demonstração de sua viabilidade econômica, laudo econômico-financeiro e avaliação dos bens do ativo. 2 DESENVOLVIMENTO 2.1 Créditos sujeitos e não sujeitos aos efeitos da recuperação judicial. Conforme previsão do art. 49 da Lei 11.101/05, submetem-se a recuperação judicial da empresa todos os créditos existentes na data do pedido. Essa definição ampla, comporta exceções que serão abordadas em diante, mas salvo os créditos fiscais, todos os demais, inclusive créditos trabalhistas e com garantia real, estão sujeitos à recuperação judicial. Em observância à norma supra elucidada, se considerada inequívoco o entendimento de que a recuperação judicial não alcança as relações jurídicas novas, ou seja, posteriores ao aforamento da petição inicial. Cabe ressaltar que os créditos sujeitos a recuperação são limitados à relação jurídica pré-existente entre o credor e o empresário ou sociedade empresária, ou seja, será conservado os direitos e privilégios de eventuais coobrigados, fiadores ou obrigados de regresso (art. 49, § 1º da Lei 11.101/2005). Esse entendimento é firmado nos Tribunais, como se observa no julgado do Recurso Especial 1.333.349/SP STJ: “A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos artigos 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o artigo 59, caput, por força do que dispõe o artigo 49, § 1º, todos da Lei n. 11.101/2005”. Como já visto, os créditos de natureza fiscal não estão sujeitos a recuperação judicial de empresa (artigo 187 do Código Tributário Nacional). Da mesma forma, segundo os parágrafos do art. 49 da Lei 11.101/2005, não se sujeitará a recuperação: a) a importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação (artigo 75, §§ 3º e 4º, da Lei nº 4.728/65), desde que o prazo total da operação, inclusive eventuais prorrogações, não exceda o previsto nas normas específicas da autoridade competente (artigo 49, §4º) b) o credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio (artigo 49, § 3º) Dentre as hipóteses de não submissão do crédito, convém salientar alguns pontos. Primeiramente, o legislador faz menção ao proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis. Conforme bem preceitua MAMEDE (2020), considera-se fiduciária: (...) a propriedade resolúvel de coisa infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor (artigo 1.361 do Código Civil). Essa transferência da propriedade para garantir o pagamento do crédito é chamada de alienação fiduciária ou alienação fiduciária em garantia, e o domínio dela decorrente é qualificado como resolúvel (propriedade resolúvel) pois, uma vez ocorrendo o adimplemento da obrigação à qual estava vinculada a propriedade fiduciária, será essa transferida para o devedor. Apesar do artigo 1361 do Código Civil não fazer menção a coisa imóvel infungível, este foi incluído, e tratado de igual forma, pela Lei 11.101/05. Quanto ao contrato de arrendamento mercantil ocorre quando a instituição arrendante adquire o bem e transfere sua posse e uso ao arrendatário, mediante contraprestação. Sendo assim, apesar do bem se encontrar na empresa, o empresário ou sociedade empresária não é seu proprietário. Também não são submetidos aos efeitos da recuperação judicial o proprietário ou promitente vendedor de imóvel no qual os contratos tenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade. O mesmo ocorre no caso do proprietário em contrato de venda com reserva de domínio. Ademais a Lei 13.288/16 determinou que, ocorrendo pedido de recuperação judicial ou decretação de falência da integradora, o produtor rural integrado poderá: pleitear a restituição dos bens desenvolvidos até o valor do crédito ou requerer habilitação de seus créditos com privilégio especial sobre os bens desenvolvidos (art. 13). 2.2 Como fica o crédito trabalhista na recuperação judicial e as possibilidades de pagamento possíveis no plano de recuperação apresentado pelo devedor. No que tange ao crédito trabalhista na recuperação judicial, elucida o artigo 449 da CLT: “os direitos oriundos da existência do contrato de trabalho subsistirão em caso de falência, concordata ou dissolução da empresa”. Consoante MATOS (2013), são considerados créditos trabalhistas os valores oriundos das obrigações previstas na legislação laboral, incluindo-se nesta espécie os créditos constituídos em decorrência de acidente de trabalho.1 1 TIAGO, B. S de Matos. Os Impactos da Lei de Recuperação e Falências nos Créditos Trabalhistas. XVII Revista do CEPEJ; 2013. Portanto, com base no artigo 449 da CLT c/c 49 da Lei. 11.101 analisado anteriormente, não restam dúvidas quanto ao direito da inclusão dos créditos trabalhistas no quadro geral de credores na recuperação judicial da empresa. Ademais, a Terceira Turma do STJ em julgamento do REsp1721993, reafirmou o esse entendimento, e ainda determinou que mesmo a condenação trabalhista decretada depois do pedido de recuperação judicial deve ser inclusa no quadro. Assegurando ao trabalhador o seu direito de ser abrangido no processo. O crédito trabalhista pode ser habilitado à lista geral de credores em recuperação judicial por via administrativa ou judicial. A primeira ocorre quando o pedido é encaminhado ao administrador judicial, observando o prazo de até 15 dias da publicação do edital, onde constará o deferimento da recuperação judicial e a lista decredores (caso o trabalhador conste neste rol, com os valores devidos, é desnecessárias habilitação do crédito). Agora, ocorrerá a habilitação por via judicial se passado o prazo de 15 dias e não houver constado o crédito trabalhista na lista de credores. O trabalhador através de seu advogado, deverá transmitir o pedido ao juízo onde o processo de recuperação judicial tramita. O plano de recuperação possui limitações quanto aos créditos trabalhistas, constante no art. 54 e seu parágrafo único: a) para os créditos vencidos, derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho, a proposta de pagamento não poderá exceder o prazo de um ano; b) os créditos decorrentes de crédito de natureza estritamente salarial, no teto de até cinco salários-mínimos, vencidos nos três meses anteriores ao pedido de recuperação judicial, deverão ser pagos em até trinta dias. Contudo, a lei não determina o termo inicial dos prazos de um ano e de três meses, causando divergências de interpretação. Parte da doutrina interpreta de forma pró-devedor estendendo ao máximo o termo inicial, até a data da homologação do plano aprovado pela assembleia geral, gerando diferentes prazos a depender do processamento da recuperação. Por outra lado, há quem entende que o prazo deve ser único para situações idênticas, resultando em duas soluções: iniciam-se na data do pedido ou na data da apresentação do plano. Os integrantes das Câmaras Empresariais do TJ/SP, conforme Enunciado I, publicado no DJe em 17/01/2019, acordaram pela segunda corrente: I: O prazo de um ano para o pagamento de credores trabalhistas e de acidentes de trabalho, de que trata o art. 54, caput, da Lei n. 11.101/2005, conta-se da homologação do plano de recuperação judicial ou do término do prazo de suspensão de que trata o art. ٦º, § 4º, da Lei n. 11.101/2005, independentemente de prorrogação, o que ocorrer primeiro”. 3 CONCLUSÃO Com base no que foi apresentado pode se concluir que a Lei nº 11.101 de 2005, trouxe ao ordenamento jurídico brasileiro inúmeros avanços com o objetivo de evitar o fechamento desnecessários de empresas que estejam passando por crises econômicas, e por consequência, impedir o aumento do desemprego e o desiquilíbrio do mercado. Como foi demonstrado no decorrer do presente trabalho, os créditos sujeitos a recuperação judicial de empresa são expressamente descritos na lei, assim como suas exceções e implicações aos credores trabalhistas. A partir da análise conclui-se que a continuidade de uma empresa e sua gestão financeira e administrativa se torna um assunto de interesse coletivo, pois suas atividades influenciam diretamente e constantemente a sociedade. Justificando-se, portanto, a proteção legal e a implementação do instituto da recuperação de empresa. REFERÊNCIAS MAMEDE, Gladston. Falência e recuperação de empresas. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2020. NEGRÃO, Ricardo. Comercial e de empresa: recuperação de empresas, falência e procedimentos concursais administrativos. volume 3. 14. ed. São Paulo. Saraiva Educação, 2020. BRASIL. [Constituição (1998)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidente da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituticao/constituição.htm. Acesso em: 26 de jun. de 2021. BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11101.htm. Acesso em: 26 jun. 2021
Compartilhar