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EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NO CENÁRIO DE EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: A UAB EM FOCO Kátia Regina Rodrigues Lima Universidade Estadual Vale do Acaraú-UVA Bolsista Produtividade-BPI/FUNCAP katialima@multimeios.ufc.br Hermínio Borges Neto Universidade Federal do Ceará-UFC herminio@multimeios.ufc.br Introdução A problemática da expansão da educação superior ocupa centralidade nos debates atuais em decorrência dos baixos indicadores de cobertura nesse nível de ensino, da redefinição do papel do Estado e da implementação de medidas que integraram a ―reforma‖ universitária do governo Lula da Silva (2003-2010) e de sua continuidade e aprofundamento no governo Dilma Rousseff (2011-atual). O texto versa sobre a educação a distância no cenário de expansão da educação superior destacando a criação da Universidade Aberta do Brasil (UAB) seus objetivos e papel na consolidação dessa modalidade educacional. 1 A educação superior no cenário atual: ações marcas e tendências Para entendimento da educação superior atual, tomaremos como recorte tempo- ral inicial o governo Lula da Silva e destacaremos alguns elementos essenciais, enfati- zando as ações, marcas e tendências desse nível de ensino. Ao assumir Lula da Silva a Presidência da República em 2003, a educação su- perior brasileira contava com 3.479.913 matrículas, sendo 1.051.655 no setor público e 2.428.258 no privado. Do total de 1.637 instituições de educação superior (IES), 195 (11, 9%) eram públicas e 1.442 (88,1%) privadas. Isto representava um baixo índice de estudantes de 18 a 24 anos no ensino superior e elevado grau de privatização do sistema. Além disso, estava em vigência o Plano Nacional de Educação nº 10.172, ela- borado em consonância com as diretrizes dos organismos internacionais, que estabelecia a meta de ―prover, até o final da década, a oferta de educação superior para, pelo menos, 30% da faixa etária de 18 a 24 anos‖. mailto:katialima@multimeios.ufc.br 2 Para dar resposta à necessidade de garantia do acesso e de expansão do ensino superior, o governo Lula da Silva implementou um conjunto de medidas que formataram a reforma universitária de seu governo, tais como: a criação do Grupo de Trabalho Interministerial que elaborou dois documentos fundamentais — Bases para o Enfrentamento da Crise Emergencial das Universidades Federais e Roteiro para a Reforma Universitária Brasileira e Reafirmando Princípios e Consolidando Diretrizes da Reforma da Educação Superior; A Lei nº 10.801, de 14/04/2004, que institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior-SINAES; a Lei de Inovação Tecnológica, 10.973/04, que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo; o Decreto Presidencial 5.205/04, que regulamenta as parcerias entre as universidades federais e as fundações de direito privado; a Medida Provisória nº 213/2004, instituindo o Programa Universidade para Todos (PROUNI); a Lei da Parceria Público-Privado de nº 11.079/2004; as diversas versões dos anteprojetos de lei da reforma da educação superior e o PL 7.200/06, que trata da reforma da educação superior; a criação da Universidade Aberta do Brasil (UAB) pelo Decreto nº 5.800/2006, o Decreto Presidencial nº 6.096/2007, que institui o Programa de Apoio a Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais REUNI; e a criação do Banco de Professor-Equivalente, parte constituinte do Plano de Desenvolvimento da Educação-PDE, apresentado em 2007; a proposta de reformulação do Exame Nacional do Ensino Médio-ENEM, criado no governo Fernando Henrique Cardoso, entre outras. No âmbito da educação superior pública do País, predominaram as políticas afirmativas por meio do Projeto de Lei 3.627/2004, aprovado em 2008, que garantiu a reserva de vagas de 50% nos cursos de graduação das instituições de ensino superior (IES) públicas para alunos egressos do ensino médio público 1 (PAULA, 2011);e a expansão e reestruturação das universidades federais por meio do Programa de Apoio a Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), visando à ampliação de vagas nessas instituições. O REUNI tem recebido muitas críticas de especialistas em educação superior, pois introduz nas instituições federais de ensino superior a lógica do contrato de gestão, apresenta desproporção entre as metas e os recursos investidos, desenha um cenário de precarização do trabalho docente, uma expansão sem qualidade e a liquidação da herança humboldtiana. 1 A nova versão uniu cota racial e cota social. 3 No setor privado, a ampliação do acesso ocorreu mediante transferência de recursos públicos a este setor educacional por meio de isenção fiscal em troca de vagas nestas instituições pelo Programa Universidade para Todos (PROUNI) e por intermédio do financiamento estudantil (empréstimo financeiro ao estudante para pagamento de mensalidades) como o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES). O PROUNI, criado pela Medida Provisória n o 213, de 10 de setembro de 2004, e institucionalizado pela Lei nº 11.096/2005, visa à oferta de bolsas de estudo em instituições de ensino superior privado, com ou sem fins lucrativos, para cursos de graduação e sequenciais de formação específica. As bolsas são concedidas a egressos do ensino médio da rede pública de ensino ou particular, na condição de bolsistas integrais, que tenham renda familiar de até três salários mínimos e que tenham realizado a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). As bolsas são disponibilizadas em dois tipos — parciais (25% ou 50%) e integrais. As IES que aderiram ao PROUNI são isentas de três contribuições e um imposto (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), da Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) e da Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ)) que deixaram de compor o fundo público. No período 2005 a 2011, a isenção fiscal do Programa atingiu os seguintes patamares financeiros: R$ 106.737.984, em 2005; 114.721.465, em 2006; R$ 126.050.707, em 2007 em valores estimados, e a previsão para o primeiro semestre de 2008 325,8 milhões; previsão para 2010, R$ 599.078.735,00; e para 2011, R$ 666.287.785,00. O Fundo de Financiamento ao Estudante de Ensino Superior (FIES) substituiu o Crédito Educativo (CREDUC), reformulado no governo FHC. A partir de 2010, foi assumido pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Os beneficiários do FIES devem estar regularmente matriculados em cursos superiores não gratuitos e com avaliação positiva no SINAES. A expansão da educação superior efetivou-se mediante processo de privatização e por meio da diversificação do sistema. Em 2010, no tocante ao número e percentual de IES por categoria administrativa, o cenário era de 88,3% (2.100) de IES privadas e 11,7 (278) públicas, sendo 4,2% federais, 4,5% estaduais e 3,0% municipais. O setor privado concentrou 74,2% (4.736.001) do total de 6.379.299 matrículas. A diversificação institucional, impulsionada pelo Decreto nº 2.306/1997 do go- verno Fernando Henrique Cardoso e uma das metas do PNE 2001-2010 é consolidada http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/Mpv/213.htm 4 pela Portaria Normativa nº 40, de 12 de dezembro de 2007, que classifica as instituições de educação superior, de acordo com a organização acadêmica, em: faculdades, centros universitários, universidades, institutos federais de educação, ciência e tecnologia e cen- tros federais de educação tecnológica. A participação de faculdades é predominante, com 85,2% (2.025) do total de 2.378 instituições existentes em 2010. As universidades correspondem a 8,0%, os centros universitários a 5,3% e os institutos federais de educa- ção, ciência e tecnologia (IF)e centros federais de educação tecnológica (Cefet) a 1,6%. A educação a distância foi outro mecanismo presente. A LDB nº 9.394/96 definiu a EAD como uma modalidade de ensino. A partir de 1998, houve um aumento considerável do número de credenciamento e autorização de cursos superiores regulares de educação a distância 2 . Dourado (2008) indica que em 1999, apenas duas instituições de ensino superior ofertavam cursos a distância e, em 2007, essa realidade já estava bem diferenciada, pois havia 104 instituições credenciadas, sendo 62 (59,61%) do setor privado. Conforme o Censo da Educação Superior de 2010, a presença da EAD é expressiva, com 930.179 matrículas a distância (14,6%), das quais 80,5% oferecidas pelo setor privado, enquanto 5.449.120 matrículas são presenciais. A expansão significativa das matrículas a distância concentrou-se no período de 2005 a 2009 3 . As matrículas da EAD localizaram-se nos cursos de licenciaturas, 426.241 (46%), enquanto que 268.173 (29%) foram matrículas de bacharelado e 235.765 (25%) em cursos superiores de tecnologia 4 . A educação superior brasileira no quadro atual é uma das mais privatizadas e elitistas da América Latina. Do total de 2.365 instituições de ensino superior, 88% (2.081) são privadas e apenas 12% (284) públicas, sendo 7% estaduais, 4,3% federais e 3,0% municipais, conforme Censo da Educação Superior 2011. A diversificação institucional permanece como marca e tendência do sistema com 84,7% (2.004) de faculdades, 8,0% (190) de universidades, 5,6% (131) de centros universitários e 1,7% (40) expressa a totalidade dos institutos federais de educação, ci- ência e tecnologia (IF) e de centros federais de educação tecnológica (Cefet). Ocorre, 2 Os pedidos totalizaram 87 e, destes, 80% consistiam em solicitações para cursos de graduação de formação de professores. E 60% do percentual citado anteriormente correspondiam a pedidos para cursos de Pedagogia e de Normal Superior. 3 Ver Anexo I. 4 Diferentemente, em 2010, as matrículas nos cursos presenciais atingiram 3.958.544 de bacharelado, 928.748 de licenciatura e 545.844 de grau tecnológico, conforme Censo de 2010. 5 assim, a predominância da organização acadêmica faculdades, principalmente no setor privado (1.869). A liberalização ou mundialização é outra tendência da educação superior 5 . Os fatos comprovam essa afirmação. A revista Caros Amigos, de março de 2013, noticia a compra de ―100% das ações da universidade paulistana Anhembi Morumbi pelo grupo estadunidense Laureate Education‖. A matéria enfatiza que a incorporação de IES brasi- leiras pelo capital estrangeiro não é recente nem restrita ao caso Laureate, e que o pro- fessor Roberto Leher explica que essa operação financeira está assumindo novas confi- gurações com a ―entrada dos setores bancários e rentistas nos negócios educacionais‖ (CAROS AMIGOS, 2013, p. 16). Destaca ainda que ―por meio de fundos de investi- mentos (private equity), o processo de aquisições tem sido muito agressivo, acarretando na inédita concentração e oligopolização das empresas educacionais, e varrendo, rapi- damente, as empresas de cunho familiar‖. (LEHER apud CAROS AMIGOS, 2013, p. 16). A edição especial da revista Forum, de julho de 2013, também divulga a fusão anunciada no dia 22 de abril do corrente ano, da empresas Kroton Educacional S. A 6 e Anhanguera Educacional, cuja transação é estimada em 14,1 bilhões, passando o grupo a controlar 800 unidades de ensino superior 7 . Na matéria, são citados quatro grupos privados que, até 2007, haviam ―conseguido abrir o respectivo capital no mercado financeiro: Anhanguera Educacional, Kroton, Estácio Participações e o grupo SEB (Sistema Educacional Brasileiro)‖. (FORUM, 2013, p. 21). A Faculdade Nordestes (FANOR) é outro exemplo de instituição de ensino superior brasileira comprada por grupo estrangeiro, o estadunidense DeVry. Nessa realidade de liberalização ou mundialização, surge mais um agente — os fundos de investimentos — responsáveis pelas movimentações de entrada de capital e ingerência estrangeira. Conforme matéria da Forum, esse processo foi iniciado [...] antes mesmo da entrada dos grupos na bolsa de valores, mais pre- cisamente em 2006, quando a estadunidense Laureate International, controlada pelo fundo KKR, comprou a Anhembi Morumbi. Hioje, a 5 Liberalização ou mundialização entendida conforme ideia expressa no artigo de Maria do Carmo de Lacerda Peixoto ao afirmar que ―se aproxima mais da noção de educação como bem global, por implicar a eliminação de barreiras para incrementar o movimento dos serviços educativos, facilitar o estabelecimento de filiais de universidades estrangeiras, executar cooperação dominada por critérios asistenciais, vender franquias acadêmicas, criar universidades corporativas, programas multimeios e universidades virtuais, sob controle de universidades e empresas dos países mais desenvolvidos‖. (2010, p. 33). 6 São marcas do Grupo Kroton a Faculdade Pitágoras e a Universidade Norte do Paraná (Unopar). 7 810 escolas privadas associadas à educação básica, conforme a reportagem da Forum. 6 Estácio de Sá é administrada também por um fundo, o GP; a Anhan- guera, pelo banco Pátria; a Kroton, pela Advent International. Na composição da nova companhia Kroton/Anhanguera, os fundos Advent e Pátria, já presentes no comando dos grupos atuais, continua- rão à frente. (2013, p. 22). A revista Forum também mostra trecho de entrevista contida no portal IG, do sócio da Anhanguera, Gabriel Mário Rodrigues, que explicita e ratifica as afirmações retrocitadas: ―[Hoje] não tem mais dono de empresas. A tendência á não ter mais donos. Os donos são os fundos de pensão e os fundos de private equity feitos pelos bancos‖. 2 Educação a distância no cenário de expansão da educação superior 2.1 conceituação e gerações da educação a distância Inicialmente, as tentativas de conceituar educação a distância tomaram como referência a educação presencial, em que o professor, presente à sala de aula, é o protagonista do processo educacional (BRAGA, 1997). Walter Perry e Greville Rumbe (apud NUNES, 1994, p. 9-10) apontam como característica básica da educação a distância ―digital‖ O estabelecimento uma comunicação de dupla via, na medida em que professor e aluno não se encontram juntos na mesma sala requisitando assim, meios que possibilitem a comunicação entre ambos como correspondência postal, correspondência eletrônica, telefone ou telex, rádio, ―modem‖, videodisco controlado por computador, televisão apoiada em meios abertos de dupla comunicação etc. (...) há muitas denominações utilizadas correntemente para descrever a educação a distância, como: estudo aberto, educação não tradicional, estudo externo, extensão, estudo por contrato, estudo experimental. Conforme Braga (1997), outros autores também contribuem para a conceituação da educação a distância, a exemplo de Antônio Costa ao asseverar que A educação a distância constitui uma modalidade de ensino diferido, onde o tempo de produção é separado do tempo de uso que, por sua vez, se processa sem que as reações dos alunos possam ser contornadas pela improvisação do professor. A interação professor- aluno se efetiva intermediada por algum tipo de meio, recurso ou material estrategicamente elaborado, que estimula o aluno à auto- aprendizagem, assumindo, assim, papel ativo na assimilação do ensino, sendo que isto pode ser feito individualmente ou em grupo. (1994, p. 42-43) A Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) concebe essa modalidade não como feição de ensino, mas como ―a modalidade de educação em que as atividades de ensino-aprendizagem são desenvolvidas, em sua maioria, ‗sem que 7 alunos e professores estejam presentes no mesmo lugarà mesma hora‘‖. (DIAS e LEITE, 2010, p. 9). Mattar (2011) amplia essa conceituação, incorporando a presença das tecnologias de comunicação. Para o autor, ―a EAD é uma modalidade de educação, planejada por docentes ou instituições, em que professores e alunos estão separados espacialmente e diversas tecnologias de comunicação são utilizadas‖. (p. 3). Analisando os conceitos, percebe-se que uma das características centrais citadas para a definição de EAD é a separação física entre professor e aluno, que seria mediada pelo uso de tecnologias da informação e comunicação (incluindo aqui material impresso), bem como o aluno é alçado à condição de agente ativo de uma aprendizagem mais autônoma. O emprego da educação à distância não constitui novidade. Esta já foi utilizada em diferentes momentos e modalidades. Há autores que dividem a história da EAD em três gerações, quatro gerações e há os que falem em cinco. Mattar (2011) assevera que a primeira geração da EAD é a dos cursos por correspondência, tendo surgido em meados do século XIX. A segunda é a das novas mídias e universidades abertas; caracterizada pelo uso de mídias como o rádio, a televisão, fitas de áudio e telefone (como o sistema telensino utilizado pelo Estado do Ceará, no período de 1974 a 2004 8 ), e pela criação das universidades abertas influenciadas pela Open University, de 1969. A terceira geração é a EAD on-line, com a introdução da ―utilização do videotexto, do microcomputador, da tecnologia de multimídia, do hipertexto e de redes de computadores, caracterizando a EAD on-line‖. (MATTAR, 2011, p. 6). Dias e Leite (2010) fazem referência aos autores Cabral, Oliveira e Tarcia (2007), que dividem a história da EAD em quatro gerações. A primeira é baseada em textos impressos ou escritos a mão; a segunda marcada pelo uso da televisão e do áudio; a terceira pela utilização multimídia da televisão, texto e áudio; a quarta organizada em torno das mídias digitais e internet. Os autores retrocitados destacam também a divisão feita por Taylor (2001) em cinco gerações: o Modelo por Correspondência, empregando a tecnologia de impressão; o Modelo Multimídia, usando tecnologias impressas e audiovisuais; o Modelo de 8 Conforme Lima (2001, p. 44), o telensino surgiu em 1974 para ―suprir carências educativas (docente e técnica) e para atender à exigência de oferta das séries terminais do 1º grau (5ª, 6ª, 7ª e 8ª) feita pela lei 5.692/71‖ e foi universalizado em 1993/94, pela Secretaria de Educação do Estado, de 5ª a 8ª série nas escolas públicas estaduais. 8 Teleaprendizagem, baseada em tecnologias de comunicação; Modelo de Aprendizagem flexível, com a utilização da internet para envio on line do material; a última, emergindo e derivando da quarta geração, visa a potencializar a utilização dos recursos da internet e web. Em todos estes casos, o que se há de destacar é a capacidade de estas tecnologias promoverem canais de retorno ao aprendiz, quer em tempo real quer em um espaço de tempo de resposta razoável. Este é o nó górdio do trabalho docente em um ambiente a distância. 2.2. A criação da Universidade Aberta do Brasil no governo Lula da Silva No Brasil, nos anos 1990, As bases legais da EAD foram estabelecidas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, em seu artigo 80. art. 80- o poder público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada. § 1º - a educação a distância, organizada com abertura e regime especiais, será oferecida por instituições especificamente credenciadas pela união. § 2º - a união regulamentará os requisitos para a realização de exames e registro de diploma relativos a cursos de educação a distância. § 3º - as normas para produção, controle e avaliação de programas de educação a distância e a autorização para sua implementação, caberão aos respectivos sistema de ensino, podendo haver cooperação e integração entre os diferentes sistemas. § 4º - a educação a distância gozará de tratamento diferenciado, que incluirá: I- custos de transmissão reduzidos em canais comerciais de radio- difusão sonora e de sons e imagens; II- concessão de canais com finalidades exclusivamente educati- vas; III- reserva de tempo mínimo, sem ônus para o poder público, pelos concessionários de canais comerciais. Em 1996, o Ministério da Educação 9 criou a Secretaria de Educação a Distância (SEED) 10 , que teve como um de seus objetivos ―formular, fomentar e implementar políticas e programas de EAD, visando à universalização e democratização do acesso à informação, ao conhecimento e à educação‖. (DIAS e LEITE, 2010, p. 24). 9 O Ministério da Educação, em 2003 elaboram os Referenciais de Qualidade para Educação a Distância. Esse documento foi atualizado por uma comissão de especialistas em 2007. O documento faz referência a aspectos pedagógicos, administrativos e financeiros. 10 A Secretaria de Educação a Distância foi extinta e seus programas e ações estão vinculados à Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI). 9 A educação a distância é caracterizada como modalidade educacional, no governo Lula da Silva, organizada segundo metodologia, gestão e avaliação peculiares por meio do Decreto nº 5.622, de 19 de dezembro de 2005, que regulamenta o art. 80 da Lei no 9.394/96. Art. 1º Para os fins deste Decreto, caracteriza-se a educação a distância como modalidade educacional na qual a mediação didático- pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos. (BRASIL, 2005, p. 1). Pode ser ofertada nos seguintes níveis e modalidades: educação básica, educação de jovens e adultos, educação especial, educação profissional (técnico, nível médio e tecnológico, nível superior), educação superior (sequenciais, graduação, especialização, mestrado e doutorado. Momentos presenciais são exigidos no processo. São eles: a) avaliações de estudantes; b) estágios obrigatórios; defesa de Trabalho de Conclusão de Curso; e atividades de laboratórios de ensino. A Portaria nº 4.059, de 10 de dezembro de 2004, permite a introdução da oferta de disciplina ―integrantes do currículo que utilizem modalidade semipresencial‖, de cursos superiores reconhecidos, desde que não ultrapasse vinte 20% da carga horária total do curso, permanecendo a obrigatoriedade da avaliação presencial. Belloni (2012, p. 100), em sua obra Educação a Distância, identifica dois blocos categoriais que agrupam tipos variados de instituições atuantes na área de EaD desde os seus primórdios: instituições especializadas (single-mode) que se dedicam exclusivamente ao ensino a distância, como a espanhola UNED (Universidad Nacional de Educación a Distancia (www.uned.es/); as instituições integradas (dual-mode) que desenvolvem experiências por meio de instituições convencionais, públicas ou privadas como as existentes nos Estados Unidos e Austrália. Destaca ainda a presença do terceiro tipo, o das instituições educacionais organizadas sob a forma de associação, rede ou consórcio. No Brasil, o Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), criado no governo Lula da Silva, é emblemático do terceiro bloco categorial. O Sistema foi instituído mediante o Decreto nº 5.800, de 8 de junho de 2006, como sistema ―voltado para o desenvolvimento da modalidade de educação a distância, com a finalidade de expandir e 10 interiorizar a oferta de cursos e programas de educação superior no país‖, conforme art. 1º do referido Decreto. A ideia de criação da UAB teve origemno Fórum das Estatais pela Educação, do Ministério da Educação e da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES). A proposta tem na ―fundação de direito privado a referência para gestão do financiamento e da organização dos consórcios a serem criados com o objetivo de desenvolver atividades de educação a distância ...‖ e estabelece ―gestão em regimes consorciados entre empresas estatais, o MEC, as instituições federais de ensino superior (Ifes) e empresas e universidades privadas que se agreguem ao projeto‖. (LIMA, 2006), além da organização de um conselho gestor da Fundação 11 com a participação da Confederação Nacional da Indústria (CNI). São objetivos do Sistema UAB: I- oferecer, prioritariamente, cursos de licenciatura e de formação inicial e continuada de professores da educação básica; II- oferecer cursos superiores para capacitação de dirigentes, gestores e trabalhadores em educação básica dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; III - oferecer cursos superiores nas diferentes áreas do conhecimento; IV - ampliar o acesso à educação superior pública; V - reduzir as desigualdades de oferta de ensino superior entre as diferentes regiões do País; VI - estabelecer amplo sistema nacional de educação superior a distância; e VII - fomentar o desenvolvimento institucional para a modalidade de educação a distância, bem como a pesquisa em metodologias inovadoras de ensino superior apoiadas em tecnologias de informação e comunicação. (BRASIL, 2006, p. 1). A UAB oferta cursos e programas de educação superior a distância em colaboração com entes federativos por meio de instituições públicas de ensino superior. (DECRETO 5.800/2006). De acordo com o histórico do Sistema, seu primeiro edital, publicado em 20 de dezembro de 2005, conhecido como UAB1, ―permitiu a concretização do Sistema UAB, por meio da seleção para integração e articulação das propostas de cursos, apresentadas exclusivamente por instituições federais de ensino superior ...‖. Dentre as primeiras Ifes a ofertar cursos a distância encontram-se a Universidade Federal do Pará e a Universidade Federal do Ceará, com as licenciaturas de Matemática, Física, Química e Biologia. Com o segundo edital, de 18 de outubro de 2006, denominado UAB2, a participação foi aberta a todas as instituições públicas. 11Fundação de Fomento à Universidade Aberta do Brasil. 11 Dados do 6º Fórum Nacional de Coordenadores do Sistema Universidade A- berta do Brasil (UAB) mostram que o total de instituições públicas de ensino superior (Ipes) vinculadas ao sistema é de 103 (56 universidades federais, 30 estaduais e 17 insti- tutos federais de educação, ciência e tecnologia). O sistema possui 636 polos de apoio presencial, estando 218 deles concentrados na região Nordeste. No Ceará, os cursos e programas da UAB são ofertados pela Universidade Federal do Ceará-UFC, Universidade Estadual do Ceará-UECE, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará – IFCE, Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ, Universidade Federal da Paraíba – UFPB, Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE. As IES citadas ofertam cursos de Licenciatura, Bacharelado, Extensão, Pós-Graduação Lato Sensu e Tecnólogo. São 29 polos da UAB distribuídos pelo Estado 12 . A instituição do Sistema UAB consolidou a modalidade de ensino a distância no Brasil que corresponde atualmente a 14,7% (992.927) do total de matrículas em 2011 (6.739.689) e a presencial a 85,3% das matrículas (5.746.762). A oferta de cursos de graduação está assim distribuída: do total de 30.420 cursos, 29.376 (96,6%) são da modalidade presencial e 1.044 (13,4%) já são a distância. Na modalidade presencial, o setor privado é responsável pela oferta de 68,1% dos cursos de graduação 13 , enquanto na modalidade a distância a oferta dos cursos está mais equilibrada entre os setores públicos e privados: as IES privadas ofertam 55,5% dos cursos de graduação e as IES públicas 44,5% 14 , conforme Censo da Educação Superior de 2011. Considerações Finais A educação superior brasileira tem como uma de suas marcas e tendências a expansão privatizada, descaracterizando-a como direito social e transformando-a em campo de investimento da burguesia de serviços. A diversificação institucional, outra marca do sistema, iniciada no governo FHC, foi consolidada no governo Lula da Silva e favorece a expansão privatizada. A liberalização ou mundialização da educação superior mediante a fusão de megaempresas e participação de fundo de investimentos configuraram um cenário de 12 Dados extraídos do catálogo da UAB no sítio da CAPES. 13 O setor federal por 18,2%, o estadual por 11,1% e o municipal por 2,6%. 14 Sendo as IES federais responsáveis por 32,0% dos cursos de graduação e as IES estaduais e municipais por 10,6% e 1,9% dos cursos respectivamente. 12 mercantilização da educação num país onde a taxa de escolarização líquida é de 14,6% 15 . A educação a distância, no Brasil, embora não seja novidade, teve suas bases legais e expansão consolidadas no governo Lula da Silva. Sua presença é predominante no setor privado. A criação da Universidade Aberta do Brasil, entretanto, impulsionou as matrículas a distância no setor público, que até outubro de 2012 já contava mais de 140 mil matrículas nos cursos de licenciatura, 24.207 no bacharelado, mais de 6.877 no nível tecnólogo 16 . Referências BELLONI, Maria Luiza. Educação a distância. 6 ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2012. BRAGA, Kátia Regina Rodrigues. A universalização do telensino nas escolas públicas estaduais de 1º grau e a democratização do saber: o caso de Camocim. Fortaleza, 1997. Dissertação (Mestrado em Educação) Faculdade de Educação, Universidade Federal do Ceará. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Disponível em http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/2762/ldb_5ed.pdf. Acesso em 30 de maio de 2013. ______. Decreto 2.306, de 19 de agosto de 1997. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2306.htm. Acesso em 4 de agosto de 2013. ______. Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10172.htm. Acesso em 4 de agosto de 2013. 15 De acordo com Censo da Educação Superior 2011, a taxa de escolarização líquida identifica o percen- tual da população de 18 a 24 anos que declara cursar graduação. 16 Dados apresentados nos dias 7 e 8 de novembro, no 6º Fórum Nacional de Coordenadores do Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), realizado na sede da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). No referido evento, também foram apresentados dados referentes a matrículas nos seguintes cursos: ―mais de 66 mil nas especializações, 21.176 para aperfeiçoamento e 2.800 no Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional (Profmat). Juntando também os cursos de formação pedagógica, extensão e sequencial, totalizam-se 268.028 matrículas ativas em outubro de 2012 e 42.611 concluintes até este período‖. http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/2762/ldb_5ed.pdf http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2306.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10172.htm 13 BRASIL. Medida Provisória nº 213, de setembro de 2004. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/Mpv/213.htm. Acesso em 4 de agosto de 2013. ______. Portaria Nº 4.059, de 10 de dezembro de 2004. Disponível em http://portal.mec.gov.br/sesu/arquivos/pdf/nova/acs_portaria4059.pdf. Acesso em 8 deabril de 2013. ______. Lei nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005. Institui o Programa Universidade para Todos-PROUNI, regula a atuação de entidades beneficentes de assistência social no ensino superior, altera a Lei n o 10.891, de 9 de julho de 2004, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004- 2006/2005/Lei/L11096.htm. Acesso em: 09 maio 2009. ______. Decreto nº 5.622, de 19 de dezembro de 2005. Regulamenta o art. 80 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em http://uab.capes.gov.br/images/stories/downloads/legislacao/decreto5622.pdf. Acesso em 12 ago. 2012. ______. Decreto nº 5.800, de 8 de junho de 2006. Dispõe sobre o Sistema Universidade Aberta do Brasil- UAB. Disponível em http://uab.capes.gov.br/images/stories/downloads/legislacao/decreto5800.pdf. Acesso em 12 ago. 2012. _______. Portaria Normativa nº 40, de 12 de dezembro de 2007. Disponível em http://meclegis.mec.gov.br/documento/view/id/17. Acesso em 4 de agosto de 2013. ______. Censo do ensino superior de 2010. Disponível em http://www.inep.gov.br/superior/censosuperior/sinopse/default.asp. Acesso em: 27 fev. 2011. ______. Censo do ensino superior de 2011. 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