Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Pedagogia PONTA GROSSA - PARANÁ 2012 LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Maria Antônia de Souza EDUCAÇÃO NO CAMPO CRÉDITOS UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA Núcleo de Tecnologia e Educação Aberta e a Distância - NUTEAD Av. Gal. Carlos Cavalcanti, 4748 - CEP 84030-900 - Ponta Grossa - PR Tel.: (42) 3220 3163 www.nutead.org 2012 Todos os direitos reservados ao Ministério d Educação Sistema Universidade Aberta do Brasil Colaboradores em Informática Carlos Alberto Volpi Carmen Silvia Simão Carneiro Adilson de Oliveira Pimenta Júnior Projeto Gráfico Anselmo Rodrigues de Andrade júnior Colaboradores em EAD Dênia Falcão de Bittencourt Jucimara Roesler Colaboradores de Publicação Rosecler Pistum Pasqualini– Revisão Vera Marilha Florenzano – Revisão Paulo Henrique de Ramos – Ilustração Vilmar Wrobel – Diagramação Colaboradores Operacionais Carlos Alex Cavalcante Edson Luis Marchinski Thiago Barboza Taques João Carlos Gomes Reitor Carlos Luciano Sant’ana Vargas Vice-Reitor Ficha catalográfica elaborada pelo Setor Tratamento da Informação BICEN/UEPG. Pró-Reitoria de Assuntos Administrativos Ariangelo Hauer Dias – Pró-Reitor Pró-Reitoria de Graduação Graciete Tozetto Góes – Pró-Reitor Divisão de Educação a Distância e de Programas Especiais Maria Etelvina Madalozzo Ramos – Chefe Núcleo de Tecnologia e Educação Aberta e a Distância Leide Mara Schmidt – Coordenadora Geral Cleide Aparecida Faria Rodrigues – Coordenadora Pedagógica Sistema Universidade Aberta do Brasil Hermínia Regina Bugeste Marinho – Coordenadora Geral Cleide Aparecida Faria Rodrigues – Coordenadora Adjunta Elenice Parise Foltran – Coordenadora de Curso Clícia Bührer Martins – Coordenadora de Tutoria Colaborador Financeiro Luiz Antonio Martins Wosiack Colaboradora de Planejamento Silviane Buss Tupich Souza, Maria antônia de S729f educação no caMpo / Maria antônia de Souza. ponta GroSSa : uepG/nutead, 2012. 125 p. il licenciatura eM pedaGoGia - educação a diStância. 1.educação rural - BraSil. 2. educação do caMpo - MoviMento nacional. i. Souza, Maria antônia de. ii.t. cdd : 370.193.46 APRESENTAÇÃO INSTITUCIONAL A Universidade Estadual de Ponta Grossa é uma instituição de ensino superior estadual, democrática, pública e gratuita, que tem por missão responder aos desafios contemporâneos, articulando o global com o local, a qualidade científica e tecnológica com a qualidade social e cumprindo, assim, o seu compromisso com a produção e difusão do conhecimento, com a educação dos cidadãos e com o progresso da coletividade. No contexto do ensino superior brasileiro, a UEPG se destaca tanto nas atividades de ensino, como na pesquisa e na extensão Seus cursos de graduação presenciais primam pela qualidade, como comprovam os resultados do ENADE, exame nacional que avalia o desempenho dos acadêmicos e a situa entre as melhores instituições do país. A trajetória de sucesso, iniciada há mais de 40 anos, permitiu que a UEPG se aventurasse também na educação a distância, modalidade implantada na instituição no ano de 2000 e que, crescendo rapidamente, vem conquistando uma posição de destaque no cenário nacional. Atualmente, a UEPG é parceira do MEC/CAPES/FNED na execução do programas Pró-Licenciatura e do Sistema Universidade Aberta do Brasil e atua em 40 polos de apoio presencial, ofertando, diversos cursos de graduação, extensão e pós-graduação a distância nos estados do Paraná, Santa Cantarina e São Paulo. Desse modo, a UEPG se coloca numa posição de vanguarda, assumindo uma proposta educacional democratizante e qualitativamente diferenciada e se afirmando definitivamente no domínio e disseminação das tecnologias da informação e da comunicação. Os nossos cursos e programas a distância apresentam a mesma carga horária e o mesmo currículo dos cursos presenciais, mas se utilizam de metodologias, mídias e materiais próprios da EaD que, além de serem mais flexíveis e facilitarem o aprendizado, permitem constante interação entre alunos, tutores, professores e coordenação. Esperamos que você aproveite todos os recursos que oferecemos para promover a sua aprendizagem e que tenha muito sucesso no curso que está realizando. A Coordenação ■ PALAVRAS DOS PROFESSORES 7 ■ OBJETIVOS E EMENTA 9 EEDUCAÇÃO RURAL NO BRASIL 11 ■ SEÇÃO 1- HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO RURAL 14 ■ SEÇÃO 2- LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL E ESCOLAS RURAIS 18 ■ SEÇÃO 3- ESTATÍSTICAS DA EDUCAÇÃO RURAL NO BRASIL 28 ■ SEÇÃO 4- A CONCENTRAÇÃO DA TERRA NO BRASIL E IMPACTOS NA EDUCAÇÃO ESCOLAR RURAL 33 A EMERGÊNCIA DO MOVIMENTO NACIONAL DA EDUCAÇÃO DO CAMPO 43 ■ SEÇÃO 1- A EMERGÊNCIA DA EDUCAÇÃO DO CAMPO COMO MOVIMENTO NACIONAL 47 ■ SEÇÃO 2- MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO 58 ■ SEÇÃO 3- DIVERSIDADE ENTRE OS POVOS DO CAMPO: DESAFIOS À EDUCAÇÃO 69 EEDUCAÇÃO DO CAMPO X EDUCAÇÃO RURAL 85 ■ SEÇÃO 1- EDUCAÇÃO DO CAMPO X EDUCAÇÃO RURAL: AS PRINCIPAIS DIFERENÇAS 88 ■ SEÇÃO 2- PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E EXPERIÊNCIAS EM EDUCAÇÃO E ESCOLAS DO CAMPO 97 ■ SEÇÃO 3- A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO 111 ■ PALAVRAS FINAIS 121 ■ REFERÊNCIAS 123 ■ NOTAS SOBRE OS AUTORES 125 SUMÁRIO PALAVRAS DO PROFESSOR Você está concluindo a sua graduação em Pedagogia e certamente já tem um panorama da história da educação e da escola pública no Brasil. Entendo que é importante trabalhar algumas peculiaridades da escola pública rural. Geralmente os estudos estão voltados à educação numa concepção ampla (educação escolar e não escolar). Aqui o interesse é que você esteja atento ao que se passa entre os povos do campo no Brasil, em especial quanto ao acesso à escola e à possibilidade de continuidade dos estudos. Deve-se considerar também as características do profissional e dos materiais didáticos que adentram às escolas rurais, a organização do trabalho pedagógico, o transporte escolar, entre outros aspectos. Você terá a oportunidade de verificar, no âmbito da história da educação, a luta por escolas do campo, as modificações ocorridas a partir da década de 1970 e os debates recentes que trouxeram novas contribuições para pensar a educação escolar dos povos do campo. Ao ler esta obra você identificará uma trajetória de práticas e políticas educacionais vinculadas ao paradigma da educação rural que, por sua vez, retrata a ideologia do capitalismo agrário. Também constatará que a partir de 1990 tais práticas e políticas desenvolveram-se com a participação efetiva dos povos do campo, em suas respectivas formas de organização política. Neste momento, você, então, verificará que há uma nova terminologia – educação do campo – que retrata uma concepção emancipatória de sujeito e de sociedade, originária nos movimentos sociais do campo e que reivindica do Estado a efetivação do direito social e fundamental à educação, bem como a luta por um projeto justo de sociedade, sem concentração de renda e terra. Você já observou, portanto, que estará em contato com dois conceitos – educação rural e educação do campo. Esteja sempre interessado(a) em analisar a sua própria realidade e verificar se nela existem ruralidades que foram (in)visibilizadas ao longo da história. Você, como professor(a), diretor(a), coordenador(a) pedagógico(a), certamente se defrontará, algum dia, com a realidade das escolas rurais e terá que tomar decisões sobre questões pedagógicas e políticas. Diante disso, desafie-se a compreender um pouco mais da história da educação brasileira. Bom trabalho! ObjetivOs Objetivos: · Caracterizar a história da educação rural no Brasil. · Identificar a legislação educacional em relação às escolas rurais. · Conhecer o movimento nacional da educação do campo e os seus marcos legais. · Diferenciar a concepção de educação rural da educação do campo.· Refletir sobre as práticas e projetos pedagógicos das escolas brasileiras localizadas no campo. · Refletir sobre as necessidades e possibilidades de atuação do profis- sional da educação nas escolas situadas no campo. ementa História da educação rural no Brasil. Emergência do movimento nacional da edu- cação do campo no Brasil. Diferenças entre educação rural e educação do cam- po. Marcos legais da educação do campo no Brasil. Características das escolas do campo no Brasil. Políticas e práticas da educação do campo. OBJETIVOS E EMENTA U N ID A D E IEDUCAÇÃO RURAL NO BRASIL ObjetivOs De aPRenDiZaGem Apropriar-se da história da educação rural no Brasil. Identificar as principais leis que influenciaram a educação e as escolas rurais. Conhecer as estatísticas da educação rural no Brasil. Refletir sobre as características da educação rural e sua relação com a histórica concentração da terra no Brasil. ROteiRO De estUDOs SEÇÃO 1 – História da educação rural SEÇÃO 2 – Legislação educacional e escolas rurais SEÇÃO 3 – Estatísticas da educação rural no Brasil SEÇÃO 4 – A concentração da terra no Brasil e impactos na educação escolar rural U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 12 UNIDADE I PARA INÍCIO DE CONVERSA Figura 1: Arquivo. In: TIBUCHESKI, 2010. Para começar o nosso estudo quero que você tente lembrar como foi o início de sua vida escolar: numa instituição pública ou particular, na zona rural ou urbana. Pergunte a seus pais e avós como foi o estudo de cada um deles. É possível que você encontre em sua família algum parente que tenha estudado em escola rural. A figura 1 nos remete a pensar a escolarização dos imigrantes que chegaram ao Brasil no final do século XIX e desperta o nosso imaginário para pensar sobre cultura, disciplina, organização pedagógica etc. Procure saber como era a economia e quais as possibilidades de trabalho na época de seus antepassados. Compare com o momento atual. Você poderá pensar que hoje o Brasil é urbano. Entretanto, ao longo do estudo deste livro, você verificará que não é bem assim. O que desejo é que a partir da Unidade I, você pense sobre dois temas: História da Sociedade Brasileira e História da Escola Pública Rural. E d u ca çã o n o C a m p o 13 UNIDADE I Para fins de estudo no curso de Pedagogia, selecionou-se como ponto de partida o século XX. No referido século, foram elaboradas as principais leis que interferiram e interferem na educação rural. Em alguns momentos estarão indicadas obras para seu estudo optativo. Também serão lembradas características do Brasil de 1800, de modo que você perceba como foi sendo projetada a necessidade de escolarização para a população brasileira. Estabeleça como centrais as seguintes perguntas que deverão ser respondidas ao final da leitura desta Unidade: Quais as características da sociedade brasileira no século XIX e XX? O que mudou em meados do século XX? Quais os marcos legais da educação rural? Quais os principais desafios postos à sociedade brasileira no contexto da educação rural? U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 14 UNIDADE I SEÇÃO 1 HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO RURAL O Brasil, ao longo de sua história, foi marcado pela concentração da terra, pelo trabalho escravo, por uma política patrimonialista1 e pelo analfabetismo. Vivenciou a elaboração de sete textos constitucionais, desde 1824, após a independência do país, até 1988. A primeira Constituição foi gestada no período imperial, em 1824, e a segunda foi elaborada após a Proclamação da República e data de 1891. Os textos constitucionais intermediários são de 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988 que ficou conhecido como “Constituição Cidadã”. Todos os textos mencionam a relevância da educação escolar. Rui Barbosa foi um defensor da escola e da escolarização para toda a população. Os seus pareceres sobre educação escolar pública demonstram que a cidadania de um povo viria por meio da alfabetização e da escolarização. Por volta de 1891, quando da proclamação da primeira Constituição da República (porque a anterior, de 1824, era do período imperial), o país contava com cerca de 80% da sua população analfabeta. Uma sociedade recém-saída das relações de trabalho escravocrata tinha como desafio superar a situação de analfabetismo. Note que, nesse período, o Brasil era eminentemente agrário. Como escreveu a professora Edla Soares, no parecer 36/2001 da CEB: (...) não se pode perder de vista que o ensino desenvolvido durante o período colonial, ancorava-se nos princípios da Contra–Reforma, era alheio à vida da sociedade nascente e excluía os escravos, as mulheres e os agregados. Esse modelo que atendia aos interesses da Metrópole sobreviveu, no Brasil, se não no seu todo, em boa parte, após a expulsão dos Jesuítas – 1759, 1 Entenda por política patrimonialista a prática de governantes (do município, do estado ou da federação) em lidar com a coisa pública como se fosse propriedade sua. Tratavam dos interesses do país como se particular fossem. Foi assim que muitas famílias tradicio- nais mantiveram-se nas instâncias governamentais por séculos. E d u ca çã o n o C a m p o 15 UNIDADE I mantendo-se a perspectiva do ensino voltado para as humanidades e as letras. (2001, p.3). O Brasil recebeu, a partir do século XIX, imigrantes de diversos países: Itália, Alemanha, Polônia, Espanha, entre tantos outros, cuja chegada gerou a necessidade de instituições escolares. Alguns grupos de imigrantes vieram para substituir a mão de obra dos escravos negros. Outros chegaram com a intenção de construir colônias, a exemplo das existentes na Região Sul do país. A pesquisadora Bezerra (2009) escreve que a imigração alemã para o estado de São Paulo estava vinculada a projetos de substituição da mão de obra negra, constituindo-se com isso as parcerias, o sistema de colonato, os núcleos coloniais e ainda os processos espontâneos de imigração que deram origem à construção do estado. Em São Paulo, segundo a autora, a formação do Núcleo Colonial de Santo Amaro, no ano de 1827, teve como objetivo povoar a região. Foram criadas escolas alemãs, num total de nove, no período de 1863 e 1900. (BEZERRA, 2009, p. 159-161). Nessa fase, as escolas distinguiam-se pelo nível de escolaridade oferecida, pelo financiamento – particular privado ou associativo comunitário -, pela opção religiosa e ainda pela localização, se rural ou urbana. (BEZERRA, 2009, p. 161). O período da imigração é bastante importante para a análise da educação rural. As escolas eram construídas para atender às necessidades de alfabetização e também para manutenção das características culturais dos povos que chegavam ao Brasil. Verifique na sua localidade se existem escolas rurais e como foi a sua origem. Investigue sobre a presença de imigrantes na sua região e como era a escolariza- ção deles na passagem no século XIX para o século XX. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 16 UNIDADE I Conforme escreve Bezerra (2009, p. 170), ao estudar escolas rurais no estado de São Paulo, a vinculação entre escola e Igreja era muito estreita, principalmente no século XIX, quando não havia liberdade religiosa, pois era a escola que servia como templo para as pregações. No final da década de 1890, formaliza-se o processo de nacionalização do ensino. A autora assim se refere aos marcos da nacionalização: “No ano de 1896, o governo de Campos Salles promulgou a lei nº. 489, em 29 de dezembro, sob o título ‘obrigatoriedade do ensino da língua nacional”’. (p. 170). O que significa a nacionalização do ensino? Algumas características serão impostas às escolas, a exemplo do uso restrito da língua de origem, haja vista que o Português deveria ser a língua primeira. A reforma de 1920 alterou a idade de ingresso no ensino para nove anos e instituiu a obrigatoriedade da língua nacional. Em1925, a lei 2.095 expressa que somente brasileiros poderão ensinar Português, História e Geografia. Essas e outras características são apontadas por Bezerra. (2009, p. 177). Os filhos de imigrantes relatam as discriminações que sofriam nas escolas, nesse período de meados do século XX, justamente em função da política de nacionalização do ensino. Com isso, muitos aspectos culturais se perderam. Pessoas que antes falavam polonês, alemão, italiano, entre outras línguas, foram aos poucos “abandonando” a língua do país de origem dos seus ascendentes. Alguns autores vão apontar a primeira metade do século XX como marco das preocupações com a educação rural. Para Leite (1999, p. 28), “(...) a sociedade brasileira somente despertou para a educação rural por ocasião do forte movimento migratório interno dos anos de 1910/1920(...)”. Conforme Gritti (2003, p. 22), a elaboração das Leis Orgânicas da década de 1940 constitui ponto de referência para se analisar as escolas rurais, pois elas tinham por função “(...) centralizar as diretrizes e fixar normas para a implantação e a organização do ensino em todo o território nacional, até então regulamentado por legislação estadual”. Uma expressão que você encontrará nos livros de História da Educação é “ruralismo pedagógico”, que se caracteriza como um movimento de pensadores da educação voltados a defender uma escola articulada à situação local e com o intuito de fixar o homem no campo. Também estes pensadores ressaltavam que o problema do analfabetismo E d u ca çã o n o C a m p o 17 UNIDADE I e da baixa escolaridade dificultava o desenvolvimento do país. Dentre os expoentes do ruralismo pedagógico citam-se Sud Mennucci e Carneiro Leão, cujas ideias e obras estão apontadas no livro organizado por Alves. (2009). Bezerra Neto e Santos Bezerra (2009, p. 264) escrevem que: A defender a educação campesina, Carneiro Leão defendia também um certo modelo de nacionalismo e a luta contra o que considerava um processo de industrialização dependente do Brasil, através da fixação do homem no campo. Para ele, isso seria possível por meio de uma pedagogia que fosse mais adequada aos homens do meio rural (...). Outros ruralistas pedagógicos, como Raimundo Pastor, segundo os pesquisadores citados, defendiam que a ação educativa, além de fixar o aluno no campo, teria que fixar o professor rural também na terra. Bezerra Neto e Santos Bezerra afirmam que, para Raimundo Pastor, (...) enquanto o professor não tivesse a roça como seu habitat e apenas por lá passasse à espera de uma oportunidade para se mudar para a cidade, não se poderia pensar na possibilidade de desenvolver aquele setor, comprometendo assim todo e qualquer trabalho que se quisesse fazer”. (2009, p. 275). Dois pontos merecem destaque no estudo que hoje fazemos do ruralismo pedagógico. O primeiro refere-se ao fato que no início do século XX os educadores colocaram em pauta a educação do povo brasileiro, algo que Rui Barbosa fizera no final do século XIX. Os educadores do ruralismo rural enfatizaram a educação da população rural. Mas, uma crítica feita a esse ideário pedagógico é que os seus pensadores destacavam a fixação do homem no campo. Além do que os povos do campo não participavam do debate educacional planejado para eles. O segundo ponto diz respeito ao fato que tais ruralistas afirmavam ser necessário um professor que estivesse vinculado à terra, o que certamente daria outro significado social ao trabalho pedagógico. Essa ideia é difundida nos documentos atuais da educação do campo, quando se afirma que o professor tem que conhecer e, de preferência, viver no campo. Portanto, o ruralismo pedagógico é uma corrente de pensamento na esfera educacional que se dedica a pensar a educação do homem do U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 18 UNIDADE I campo, com a intenção de contribuir para sua fixação no campo e para superar o atraso do país, que, os educadores entendiam à época, seria oriundo do analfabetismo e baixa escolaridade da população rural. A história da educação rural terá contornos mais nítidos a partir das Leis Orgânicas publicadas na década de 1940. Dessa forma, peço que dê atenção à continuidade da história da educação rural que será registrada na seção 2, apresentada a seguir. Você terá oportunidade de identificar os marcos legais da educação rural para, na seqüência, compreender as estatísticas que marcam esse segmento educacional. No período de 1910 a 1930, as ideias educacionais relacionadas à população rural adentraram ao cenário da política, pois a sociedade começava a vivenciar processos migratórios do campo em direção às cidades. De um lado, a população migrava porque acreditava que nas cidades, com a industrialização, teria melhores condições de emprego e de vida. De outro lado, porque a vida no campo vinha sendo afetada pelos baixos preços dos produtos agrícolas, especialmente nas zonas de cafeicultura. Na década de 1930, estava em desenvolvimento o movimento dos Pioneiros da Educação, que ficou conhecido pelo seu Manifesto publicado em 1932. De acordo com o caderno publicado pelo SECAD/MEC (2007): Em 1932, foi lançado o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que buscava diagnosticar e sugerir rumos às políticas públicas de educação e preconizava a organização de uma escola democrática, que proporcionasse as mesmas oportunidades para todos e que, sobre a base de uma cultura geral comum, possibilitasse SEÇÃO 2 LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL E ESCOLAS RURAIS E d u ca çã o n o C a m p o 19 UNIDADE I especializações para as atividades de preferência intelectual (humanidades e ciências) ou de preponderância anual e mecânica (cursos de caráter técnico) agrupadas em: extração de matérias-primas - agricultura, minas e pesca; elaboração de matérias-primas - indústria; distribuição de produtos elaborados - transportes e comércio. Nessa proposta, as demandas do campo e da cidade eram igualmente consideradas e contempladas. Entretanto, a separação entre a educação das elites e a das classes populares não só perdurou como foi explicitada nas Leis Orgânicas da Educação Nacional, promulgadas a partir de 1942. De acordo com essas Leis, o objetivo do ensino secundário e normal seria ‘formar as elites condutoras do país’ e o do ensino profissional seria oferecer ‘formação adequada aos filhos dos operários, aos desvalidos da sorte e aos menos afortunados, aqueles que necessitam ingressar precocemente na força de trabalho’. (2007, p. 10-11, grifo nosso). A partir da década de 1940, o Brasil vivenciou o fim do Estado Novo, que vigorou de 1937 até 1945. Em 1946 foi promulgada uma nova Carta Constitucional. Houve uma retomada do debate sobre os direitos sociais e a educação. Gustavo Capanema foi quem criou a Lei Orgânica da Educação, durante sua permanência como Ministro da Educação. A pesquisadora Silvana Gritti (2003) nos mostra que, no período de 1942 até 1946, o Ministério da Educação decretara as Leis Orgânicas da Educação, que regulamentavam o ensino nacionalmente. A Lei Orgânica do Ensino Primário, de janeiro de 1946, sob nº. 8.529, instituía a educação primária fundamental, composta pelo ensino primário destinado às crianças de 7 a 12 anos e o ensino primário e supletivo destinado aos adolescentes e adultos. Nesse período foram criados tipos de estabelecimento de ensino, a saber: 1) Escola isolada: aquela que possuía uma turma e um professor. Ficou conhecida como escola multisseriada. Nos dias atuais existem inúmeras escolas multisseriadas no campo. Veremos isso na seção 3 desta Unidade. 2) Escolas reunidas: quando a escola tivesse entre duas e quatro turmas e o mesmo número de professores, ou seja, um para cada turma. 3) Grupo escolar: com cinco ou mais turmas, sendo um professor para cada turma. 4) Escola supletiva: a que oferecia ensino supletivo para adultos.U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 20 UNIDADE I Em síntese, as leis orgânicas foram destinadas a dar organicidade nacional ao ensino. Elas também reforçaram a obrigatoriedade do ensino, como escreve Gritti (2003, p. 23): Outro momento em que a lei faz alusão ao meio rural é quando trata da obrigatoriedade da matrícula e frequência escolar: ‘Os proprietários agrícolas e empresas, em cuja propriedade localizar estabelecimentos de ensino primário, deverão facilitar e auxiliar as providências que visem à plena execução da obrigatoriedade escolar’. Foi também na década de 1940, no ano de 1942, que se criou o Fundo Nacional do Ensino Primário, mediante o Decreto do Presidente da República, sob nº. 4.958. Este Fundo previa que tal ensino fosse mantido mediante parceria financeira entre os estados e a União. Os estados deveriam aplicar pelo menos 15% no ensino primário e os municípios ao menos 10%. Por que o fundo é importante no âmbito da educação rural? Porque nessa época os estados ficaram responsáveis pelo ensino primário na área urbana, ao passo que os municípios se responsabilizaram pelo ensino primário na área rural. Era, portanto, a gestão municipal que decidia sobre contratação e demissão de professores. Jaqueline Tibucheski (2011), em sua pesquisa de mestrado, demonstrou como um município do estado do Paraná organizava as escolas rurais. Constatou que eram diversos os decretos e portarias municipais contratando e removendo professores. Mensalmente alguns professores deixavam escolas rurais e outros chegavam para iniciar o seu trabalho. Assim, a rotatividade era frequente, o que pode ser demonstrado com pesquisas históricas nos diversos municípios brasileiros. Em 1961 foi aprovada a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação no Brasil, sob nº. 4.024/612, que previa em seu artigo 1º os ideais de liberdade e solidariedade humana, como segue: Art. 1º A educação nacional, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por fim: a) a compreensão dos direitos e deveres da pessoa humana, do cidadão, do Estado, da família e dos demais grupos que compõem a comunidade; 2 Disponível em: <http://wwwp.fc.unesp.br/~lizanata/LDB%204024-61.pdf>. Acesso em: 30 nov. 2011. E d u ca çã o n o C a m p o 21 UNIDADE I b) o respeito à dignidade e às liberdades fundamentais do homem; c) o fortalecimento da unidade nacional e da solidariedade internacional; d) o desenvolvimento integral da personalidade humana e a sua participação na obra do bem comum; e) o preparo do indivíduo e da sociedade para o domínio dos recursos científicos e tecnológicos que lhes permitam utilizar as possibilidades e vencer as dificuldades do meio; f) a preservação e expansão do patrimônio cultural; g) a condenação a qualquer tratamento desigual por motivo de convicção filosófica, política ou religiosa, bem como a quaisquer preconceitos de classe ou de raça. O artigo 2º, com grifos nossos, mencionava que a educação é direito de todos: Art. 2º A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola. Parágrafo único. À família cabe escolher o gênero de educação que deve dar a seus filhos. Art. 3º O direito à educação é assegurado: I - pela obrigação do poder público e pela liberdade de iniciativa particular de ministrarem o ensino em todos os graus, na forma de lei em vigor; II - pela obrigação do Estado de fornecer recursos indispensáveis para que a família e, na falta desta, os demais membros da sociedade se desobriguem dos encargos da educação, quando provada a insuficiência de meios, de modo que sejam asseguradas iguais oportunidades a todos. Os artigos 23 e 24 previam o acesso das crianças ao jardim de infância ou maternal, como segue: Art. 23. A educação pré-primária destina-se aos menores até sete anos, e será ministrada em escolas maternais ou jardins de infância. Art. 24. As empresas que tenham a seu serviço mães de menores de sete anos serão estimuladas a organizar e manter, por iniciativa própria ou em cooperação com os poderes públicos, instituições de educação pré-primária. Tal lei determinava a escola infantil para todos. Entretanto, uma breve pesquisa com os seus ascendentes (pais, avós, bisavós) revelará que eles não tiveram acesso a essa educação. Também, a autora deste livro, que ingressou na escola primária no ano de 1976, não teve acesso U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 22 UNIDADE I à educação infantil, pois era moradora de área rural que não ofertava escolas para as crianças em fase maternal ou pré-escolar. Os artigos 29 e 30 faziam menção à responsabilidade dos municípios com “a chamada” da população para a matrícula dos filhos nas escolas. Art. 29. Cada município fará, anualmente, a chamada da população escolar de sete anos de idade, para matrícula na escola primária. Art. 30. Não poderá exercer função pública, nem ocupar emprego em sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público o pai de família ou responsável por criança em idade escolar sem fazer prova de matrícula desta, em estabelecimento de ensino, ou de que lhe está sendo ministrada educação no lar. Parágrafo único. Constituem casos de isenção, além de outros previstos em lei: a) comprovado estado de pobreza do pai ou responsável; b) insuficiência de escolas; c) matrícula encerrada; d) doença ou anomalia grave da criança. O artigo 29 dava atenção ao município no que diz respeito à matrícula escolar. O artigo 30 enumerava alguns casos em que a matrícula era documento necessário para a pessoa exercer função pública. Entretanto, as alíneas do artigo expressam os casos de exceção para essa comprovação, como o que está em negrito, alínea b, insuficiência de escolas. Um dos grandes problemas da área rural era exatamente a falta de escolas para atender à demanda dos pais quanto à educação dos filhos. Registre-se, portanto, o descompromisso do poder público com a educação escolar no meio rural. Meus progenitores narram a trajetória vivida para o ingresso e permanência na escola. Meu pai conta a vivência da época em que a palmatória era instrumento de castigo do aluno e registra que ficava escondido em meio aos pés de café para não ir à escola apanhar. Minha mãe relata que caminhava cinco quilômetros para chegar até a escola, nos anos de 1950. Tinha que percorrer a estrada de chão e sempre encontrava boiadas no caminho. A criançada tinha que correr e se esconder para não ser esmagada pelos bois, que à época não eram transportados em caminhões, mas sim pelas estradas. E d u ca çã o n o C a m p o 23 UNIDADE I Caso você tenha avós que moraram no campo em meados do século XX, ou mesmo os seus pais, busque um pouco da trajetória escolar deles. São muitas histórias que revelam o descaso do poder público com a formação escolar das maiorias. O discurso político defendia o direito de todos à educação, mas ainda hoje as pessoas contam que deixaram a escola para ir trabalhar na roça. Necessitamos saber além do que dizem. Temos que perguntar a elas qual era a distância da casa até a escola. Havia escolas suficientes? Em muitas localidades as pessoas não iam às escolas porque elas não existiam nas proximidades da residência. Entenda que “proximidade” pode indicar quilômetros de distância. O período que vai de 1950 até 1970 é marcado por investimentos internacionais no país. Observa-se a entrada das multinacionais. O Brasil que tinha iniciado um processo de industrialização nos anos de 1930, com centralidade no capital nacional, passou a receber o capital estrangeiro. Os primeiros anos de 1960 foram marcados por intenso interesse em realizar reformas de base no país, como educação e reforma agrária. Paulo Freire, que desde os anos de 1950, defendia uma educação popular, uma concepção dialógica de ensino-aprendizagem, publicou várias obras chamando a atenção para a educação como fundamentalpara a liberdade, para a emancipação humana. Entretanto, em 1964, a sociedade brasileira ingressou num modelo político autoritário e as reformas de base não foram efetivadas. Foi um momento de intensa repressão à população e aos movimentos sociais interessados na construção de um país democrático e justo, imbuídos em superar os processos de concentração de renda e da terra. Na década de 1970 tivemos a aprovação da Lei nº. 5.692/71, que unificou o ensino de 1º e 2º graus, conforme denominação daquela época. Havia uma preocupação de formar mão de obra para o mercado em expansão. Como escreveu Gritti (2003, p. 34): Essa lei, tendo como princípio a obrigatoriedade da profissionalização do ensino de segundo grau, iria atender a objetivos já determinados pelo U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 24 UNIDADE I poder econômico, qualificando mão de obra para o mercado de trabalho decorrente do processo de industrialização. O artigo 1º da lei determina que: O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de autorrealização, qualificação para o trabalho e preparação para o exercício consciente da cidadania. Importante é analisar, sempre, a conjuntura econômica e política do período em que as leis são aprovadas. Havia um ideário de preparação de mão de obra para o trabalho. Entretanto, esse ideário não se concretizou por meio da atuação da escola, até porque as necessidades das multinacionais eram específicas de cada região. O que nos interessa, no âmbito da educação rural, é que praticamente nada era dito sobre o trabalho rural, sobre a organização das comunidades. Os olhares estavam voltados para o urbano e para os processos de industrialização. É verdade que experiências estavam em desenvolvimento no campo brasileiro, a exemplo da Pedagogia da Alternância, desenvolvida inicialmente pela Escola Família Agrícola, que chegou ao Brasil nos anos de 1960. Posteriormente, nos anos de 1980, vieram as Casas Familiares Rurais. A pesquisadora Lourdes Helena da Silva, da Universidade Federal de Viçosa, em artigo de 20103, escreve sobre a Pedagogia da Alternância e nos mostra que os estados da Região Norte somam 18 Escolas-Família Agrícolas (EFAs) e 30 Casas Familiares Rurais (CFRs); a Região Nordeste conta com 72 EFAs e 21 CFRs; a Região Sudeste tem 51 EFAs e nenhuma CFR; a Região Sul possui 73 CFRs e nenhuma EFA. São organizações cujas iniciativas estão direcionadas a pensar e desenvolver experiências de educação para os povos do campo, especialmente os pequenos proprietários. A proposta pedagógica, denominada Pedagogia da Alternância, é operacionalizada a partir da divisão sistemática do tempo e das atividades didáticas entre a escola e o ambiente familiar. 3 O artigo está disponível em: <http://www.fae.ufmg.br/endipe/livros/Livro_2.PDF>. Acesso em: 15 nov. 2011. E d u ca çã o n o C a m p o 25 UNIDADE I Esse modelo tem sido estudado e elogiado por grandes educadores brasileiros e é apontado pelos movimentos sociais como uma das alternativas promissoras para uma Educação do Campo com qualidade. (MEC/SECAD, 2007, p.12). Essas são experiências que se encontram fora do sistema de ensino, conforme previsto na legislação até aqui analisada. Elas dependem da articulação da comunidade local e do apoio do poder público municipal. Procure no seu estado experiências relacionadas ao que se denomina Peda- gogia da Alternância. No arquivo on line, para aprofundamento dos seus estudos, deixarei um artigo sobre essas experiências. Fique atento(a). O fato é que a legislação educacional pouca ou nenhuma atenção tem dado à educação escolar da população rural. Em 1996, foi aprovada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº. 9.394/96. Esta lei trouxe dois artigos que mencionam diretamente a educação rural. Note que nessa época os movimentos sociais do campo estavam articulados na demanda por educação, escola, formação de professores, políticas públicas etc. Os artigos 26 e 28 da referida lei mencionam a organização curricular diferenciada para as escolas rurais. O artigo 28 expressa que: Na oferta da educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação, às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente. Incisos: I- Conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural; II- Organização escolar própria, incluindo a adequação do calendário escolar, as fases do ciclo agrícola e as condições climáticas; III- Adequação à natureza do trabalho na zona rural. (BRASIL, 1996). U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 26 UNIDADE I O artigo 26 dispõe que: Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela. (BRASIL, 1996, grifo nosso). Pode-se dizer que a base constitucional desses artigos encontra-se no artigo 210 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que versa sobre os conteúdos mínimos para o ensino fundamental, com respeito aos valores culturais e de modo a assegurar uma formação básica comum. O que você verificou até o momento? 1) Quatro legislações importantes no âmbito educacional deram pouca atenção à educação e escolas rurais. 2) Essas leis são respectivamente as Leis Orgânicas dos anos de 1940, a LDB 4.024/61, a Lei 5.692/71 e a LDB 9.394/96. 3) A história da educação rural não termina aí. Esses são os marcos da denominada educação rural, porém, na Unidade II você estudará a denominada educação do campo e encontrará um pouco da história recente das escolas localizadas no campo, em que duas ideologias se confrontam: a da educação rural em que o Poder Público pouca atenção deu ao campo e a da educação do campo, cujo debate sobre políticas e práticas educacionais emerge nos movimentos sociais do campo. Na seção 3, a seguir, você terá a oportunidade de conhecer um pouco da realidade das escolas rurais por meio de dados estatísticos. Explore-os. A figura 2 tem o intuito de chamar sua atenção para a realidade das escolas. Numa seção em que se discute legislação educacional, é sempre importante refletir sobre quem são os alunos, os professores, os familiares, os modos de vida, as principais necessidades etc. Importante olhar a sala de aula e perceber que há uma divisão no quadro/lousa. Essa divisão indica que a classe tem duas séries e que a professora organiza a exposição dos conteúdos de modo que as crianças de 1ª série olhem para o quadro a elas destinado e as crianças da 4ª série olhem para o outro quadro. Essa figura retrata uma classe multisseriada em que conviviam alunos das 1ª e 4ª séries. E d u ca çã o n o C a m p o 27 UNIDADE I Figura 2 – Classe Multisseriada. Fotografia: Maria Antônia de Souza, 2000. A figura 3 também é de uma escola com classes multisseriadas. Nesse espaço as professoras tinham uma cozinha, a sala de aula e um quarto para dormirem no local. Elas moravam na cidade e durante a semana permaneciam na escola. Esta figura tem o intuito de chamar sua atenção para a realidade das escolas públicas, pois elas estão nas cidades e no campo; elas têm necessidades que são comuns, porém no campo existem particularidades, a exemplo do transporte escolar, das classes multisseriadas, do deslocamento dos professores, da importância de materiais didáticos que possibilitem ao professor problematizar os conteúdos à luz das experiências vividas no campo. Figura 3 – Escola localizada em Assentamento de Reforma Agrária. Pontal do Paranapa- nema. Fotografia: Maria Antônia de Souza, 1994.U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 28 UNIDADE I Embora esta seção tenha o objetivo de apresentar as estatísticas relacionadas à educação rural, é importante ter em mente a realidade da escolaridade do povo brasileiro, para então voltar o olhar ao campo. O Brasil tem uma população de 191.796 milhões de pessoas, de acordo com a Síntese4 dos Indicadores Sociais, publicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, no ano de 2010. Desse total, 161. 041 milhões são habitantes do denominado espaço urbano e 30.755 milhões são moradores da área rural. Do ponto de vista educacional, a média de anos de estudo das pessoas com 10 anos ou mais de idade, na área rural, é de 4,6. Ou seja, são pessoas que não têm a 5ª série concluída. Entre a população de 15 anos ou mais, a média de anos de estudo é de 4,8. Repete-se a mesma realidade, uma média de estudo até final e início da 6ª série. A média da população brasileira de anos de estudo é de 7,2. Ou seja, a grande maioria não tem a 8ª série do Ensino Fundamental concluída. Interessante notar que a população do meio rural possui em torno de quatro anos de estudo. Por que será que isso ocorre? Para responder à pergunta é importante verificar a oferta de escolas em cada região. Geralmente há oferta dos quatro anos iniciais (atualmente cinco anos). Quando a criança ingressa na segunda fase do Ensino Fundamental, ela tem que se deslocar para a cidade, porque na maioria dos casos não há escola no campo. Para o Ensino Médio essa realidade é ainda pior, pois são poucas as escolas que oferecem esse nível de ensino aos jovens do campo. Em seu estudo da Educação do Campo, especialmente na seção 1 da Unidade II, você terá oportunidade de acompanhar o debate e a campanha contra o fechamento de escolas do campo. 4 A síntese está disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/con- dicaodevida/indicadoresminimos/sinteseindicsociais2010/SIS_2010.pdf>. Acesso em: 30 nov. 2011. SEÇÃO 3 ESTATÍSTICAS DA EDUCAÇÃO RURAL NO BRASIL E d u ca çã o n o C a m p o 29 UNIDADE I Os dados da taxa de frequência bruta aos estabelecimentos de ensino das pessoas residentes na área rural são os seguintes: 28,4% das crianças em idade de 0 a 5 anos estão matriculadas; 96,9% das crianças na faixa de 6 a 14 anos encontram-se matriculadas; na idade entre 15 e 17 anos cerca de 80% estão matriculadas; e das pessoas com 25 ou mais anos, somente 4,1% estão matriculadas. Note que a taxa de frequência bruta não indica a realidade, pois aí estão aqueles que se matricularam e depois desistiram da escola. O menor número de matrículas encontra-se entre aqueles que deveriam estar cursando o Ensino Médio. Isso ocorre porque no campo o número de escolas que oferece esse nível de ensino é reduzido. Documento produzido pelo INEP/MEC (2007, p. 8-9) apresenta outros dados que nos remetem à educação rural e revelam os principais problemas ainda presentes nesta área, a saber: a insuficiência e a precariedade das instalações físicas da maioria das escolas; as dificuldades de acesso dos professores e alunos às escolas, em razão da falta de um sistema adequado de transporte escolar; a falta de professores habilitados e efetivados, o que provoca constante rotatividade; currículo escolar que privilegia uma visão urbana de educação e desenvolvimento; a ausência de assistência pedagógica e supervisão escolar nas escolas rurais; o predomínio de classes multisseriadas com educação de baixa qualidade; a falta de atualização das propostas pedagógicas das escolas rurais; baixo desempenho escolar dos alunos e elevadas taxas de distorção idade- série; baixos salários e sobrecarga de trabalho dos professores, quando comparados com os dos que atuam na zona urbana; a necessidade de reavaliação das políticas de nucleação das escolas; a implementação de calendário escolar adequado às necessidades do meio rural, que se adapte à característica da clientela, em função dos períodos de safra. Dados sobre o transporte escolar publicados pelo SECAD/MEC (2007, p. 22) revelam a seguinte situação: Como reflexo dos programas de transporte escolar ou de modelos de nucleação inadequados, observa-se que, em 2005, foram transportados para escolas localizadas em áreas urbanas 42,6% dos alunos das séries iniciais do ensino fundamental, residentes na zona rural e atendidos pelo transporte escolar público, o mesmo acontecendo com 62,4% dos matriculados nas séries finais. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 30 UNIDADE I O problema do transporte escolar dos alunos que moram no campo ainda é pouco pesquisado na educação brasileira. Trata-se de uma questão que anualmente aflige os governos municipais e, especialmente, os familiares das crianças e adolescentes. Às vezes, a prefeitura municipal decide interromper o transporte escolar em nome da contenção de gastos ou ausência de verbas. Entretanto, é necessário verificar a efetivação dos direitos garantidos na Constituição e, ao mesmo tempo, avaliar a aplicação das verbas públicas e as prioridades municipais. A prioridade é pela construção de um monumento na “entrada” da cidade ou é pela garantia do direito à escola entre a população do campo e da cidade? É preciso sempre analisar o que há por trás dos números. Vamos ficar atentos a eles. A realidade da escolarização entre a população do campo publicada em documento do INEP/MEC (2007) foi assim registrada: nas séries iniciais, 41,4% das crianças apresentam distorção idade-série. Ou seja, são crianças que estão com idade acima da adequada para os anos iniciais. Quanto à organização do Ensino Fundamental de 1ª a 8ª séries, 53.700 estabelecimentos de ensino tinham organização exclusivamente multisseriada, no ano de 2005. O documento do INEP/MEC (2007, p. 27) se pronuncia sobre as classes multisseriadas: As classes multisseriadas têm alunos de diferentes séries e níveis em uma mesma sala de aula, independente do número de professores responsável pela classe. A unidocência ocorre quando um único professor é responsável pela condução do desenvolvimento de uma classe multisseriada. Embora possa acontecer de uma escola ou classe ser multisseriada e ter mais de um professor, as escolas multisseriadas do campo contam, na quase totalidade dos casos, com apenas um professor, o que torna unidocência e multisseriação termos equivalentes. Estabelecimentos exclusivamente seriados são cerca de 18.446 no ano de 2005 e 18.267 estabelecimentos possuem organização mista (multisseriada e seriada). O mesmo documento do INEP/MEC apresenta a seguinte discussão: Os professores das escolas multisseriadas, além da atividade docente, acumulam outras tarefas E d u ca çã o n o C a m p o 31 UNIDADE I administrativas voltadas para a manutenção da unidade escolar, chegando, na maioria das vezes, a ter que conciliar as atividades de limpeza com o preparo da merenda escolar. A situação que se coloca quanto à adequação das turmas multisseriadas é bastante delicada. Apesar de a primeira impressão ser negativa, em termos do processo ensino-aprendizagem, torna-se importante a consideração do contexto no qual estão inseridas. Algumas experiências têm demonstrado que o problema das turmas multisseriadas está na ausência de uma capacitação específica dos professores envolvidos, na falta de material pedagógico adequado e, principalmente, na ausência de uma infraestrutura básica – material e de recursos humanos – que favoreça a atividade docente e garanta a efetividade do processo de ensino- aprendizagem. Investindo nesses aspectos, as turmas multisseriadas poderiam se transformar numa boa alternativa para o meio rural, atendendo aos anseios da população em dispor de uma escola próxima do local de moradia dos alunos, sem prejuízo da qualidade do ensino ofertado, especificamente no caso das séries iniciaisdo ensino fundamental. (2007, p. 25). Nas figuras 2 e 3 da seção anterior, você verificou a organização da sala de aula e o aspecto exterior da escola. O Brasil apresenta diferentes realidades de escolas multisseriadas. Existe um programa do governo federal - Escola Ativa - por meio do qual é possível estabelecer parcerias entre governo federal e universidades públicas com as escolas públicas que possuem classes multisseriadas. Esse programa é voltado para a formação continuada dos professores que trabalham nas classes multisseriadas. Consulte o site<http://www.mec.gov.br> e busque por PROGRAMA ESCOLA ATIVA. Verifique como ele surgiu e como está organizado pedagogicamente. Existem muitas críticas a esse programa, especialmente por sua caracter- ística vinculada ao ideário de “aprender a fazer”. Entretanto, muitos municípios brasileiros tiveram a oportunidade de problematizar a realidade das escolas rurais por meio de atuação junto ao programa. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 32 UNIDADE I Outro dado estatístico que pode interessar ao estudo da educação rural é o que se refere à escolaridade dos professores. Dados do INEP/ MEC (2007, p. 34) indicam que 3,4% dos docentes que atuam nas primeiras séries do Ensino Fundamental têm até o Ensino Fundamental concluído, 75% possuem o Ensino Médio completo e 21,6%, o Ensino Superior concluído. Dentre os professores que trabalham nas séries finais do Ensino Fundamental a realidade é a seguinte: 46,7% têm o Ensino Médio completo e 53,1%, o Ensino Superior completo. Dos professores que trabalham no Ensino Médio, 11,3% possuem o Ensino Médio concluído e 88,7% têm o Ensino Superior concluído. São inúmeros os dados estatísticos que permitem problematizar a educação rural. Aqui foram apresentados apenas alguns deles para que você adentre nessa realidade da História da Educação brasileira e pense nos desafios que estão postos aos profissionais da educação e às políticas governamentais. Trabalhando com a disciplina Educação do Campo, no curso de Pedagogia, perguntei a uma aluna o que ela gostaria de fazer depois de formada. Ela respondeu que desejava prestar concurso público municipal. Indaguei sobre o que faria caso fosse aprovada como pedagoga do município e fosse convidada a integrar uma comissão para discutir educação infantil e políticas públicas. Ela ficou pensativa e disse que teria que refletir. Eu concluí dizendo o seguinte: Se você estiver numa comissão dessas, procure instigar o grupo a pensar a educação infantil entre os povos do campo. Afinal, as comissões destinadas a considerar a educação, às vezes, esquecem que o campo também necessita de escola pública e educação infantil. Então, qual é a função do pedagogo? É problematizar cada realidade local, instigar novas pesquisas, interrogar políticas públicas e, de forma democrática, sempre ouvindo a população local, tentar propor experiências que possam fazer valer direitos, valorizar identidade, trabalho e cultura. Eis o desafio do pedagogo: fazer a diferença nas práticas e políticas governamentais. Pense nisso! Enfim, você pode explorar outros dados da educação escolar rural na sua região. Procure verificar se existem escolas no meio rural; se existe transporte urbano; se os professores têm que se deslocar da cidade para E d u ca çã o n o C a m p o 33 UNIDADE I a escola do campo; identifique o número da população do campo na sua localidade. Essas informações poderão facilitar a sua compreensão acerca da história da educação brasileira e dar ênfase à escolarização da população rural. Figura 4 – Imagem da Antiga Fazenda Giacometti Marodin. Atual Assentamento Ireno Alves. Rio Bonito do Iguaçu, Paraná. Foto: Maria Antônia de Souza, 1997. Até agora você foi instigado(a) a refletir sobre a história da educação, as escolas rurais, a legislação etc. Já é momento de você relacionar a escola e a concepção de educação com a propriedade da terra. Afinal, o que historicamente tem gerado conflitos diversos é a luta pela posse da terra. Há uma luta do capital contra os povos do campo. Portanto, existem dois grandes projetos em disputa: um é o projeto do capital e do agronegócio; o outro é o projeto de vida e de sustentabilidade dos povos do campo na terra. SEÇÃO 4 A CONCENTRAÇÃO DA TERRA NO BRASIL E IMPACTOS NA EDUCAÇÃO ESCOLAR RURAL U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 34 UNIDADE I Dê atenção ao conceito de propriedade expresso por Rousseau no Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens: O primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer: ‘isto é meu’, e encontrou pessoas bastante simples para crê-lo, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil (...) Enquanto os homens se contentaram com suas cabanas rústicas, enquanto se limitaram a coser suas roupas de pele com espinhos ou cerdas, a se enfeitar de plumas e de conchas, a pintar o corpo de diversas cores, a aperfeiçoar ou embelezar seus arcos e flechas, a esculpir com pedras afiadas alguns botes de pescadores ou alguns grosseiros instrumentos musicais; em uma palavra, enquanto se dedicaram apenas às obras que um único homem podia criar, viveram livres, sãos, bons e felizes, tanto quanto o poderiam ser pela natureza, e continuaram a desfrutar entre si as doçuras de um comércio independente; mas desde o momento em que um homem teve necessidade do auxílio de um outro, desde que se apercebeu de que seria útil a um só indivíduo contar com provisões para dois, desapareceu a igualdade, a propriedade se introduziu, o trabalho se tornou necessário e vastas florestas se transformaram em campos aprazíveis, que foi preciso regar com o suor dos homens e, nos quais, viu-se logo a escravidão e a miséria germinarem e crescerem com as colheitas. (Retirado da obra Clássicos da Política, 1989, p. 201-13). Por que consideramos o discurso de Rousseau procedente? Pelo fato de que a propriedade é a prova da desigualdade entre os homens. E, como a propriedade se constituiu no Brasil? Podemos recorrer a Stefaniak (2003), obra em que a autora relembra o fato de o país ser povoado por indígenas que mantinham a propriedade coletiva da terra até a chegada dos colonizadores. No que tange às normas jurídicas, o regime de Sesmarias caracterizou a apropriação das terras brasileiras: (...) consistia na concessão de áreas de terras denominadas capitanias hereditárias para os chamados donatários, que deveriam assegurar a posterior fundação de vilas e povoados, nas quais deveriam criar meios para manter o poder político e militar. (STEFANIAK, 2003, p.52-53). E d u ca çã o n o C a m p o 35 UNIDADE I Conforme a autora, “o regime sesmarial – regulado pelas Ordenações do Reino, sistema legal em vigor na época, que determinou a origem dominial das terras brasileiras – foi criação do regime feudal português”. (p.53). Esse regime legal coexistiu ao lado das posses de terras oriundas da ocupação de seus habitantes. Não foi uma coexistência pacífica, inúmeros foram os conflitos de terras entre sesmeiros e posseiros. O regime sesmarial prevaleceu até 1822, passando, então, a vigorar o regime de posses. Cerca de 300 anos de regime sesmarial deram origem ao Brasil latifundiário. (STEFANIAK, 2003). Com a Carta Constitucional de 1824 foi estruturada a Lei nº. 601/1850, conhecida como Lei de Terras, estabelecendo que a aquisição da propriedade se daria exclusivamente através da compra mediada pelo mercado. As terras que não pertenciam a particulares passaram a ser de domínio do Império e foram denominadas devolutas. As pessoas que tinham posse de áreas devolutas poderiam tornar-se proprietárias mediante um pagamento à Coroa. Deu-se margem para o fenômeno da grilagem de terras. (STEFANIAK, 2003). O direito absoluto da propriedade foi estabelecido no Brasil desde o artigo 170 da Constituição de 1824 -“égarantido o direito de propriedade em toda a sua plenitude”-, reforçado pelo Código Civil de 1916, elaborado num contexto de Estado Patrimonialista. Em seu artigo 524, o Código prescreve que o proprietário tem o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e também de reavê-lo do poder de quem injustamente os possua. Essa determinação jurídica de propriedade tem duração até a Constituição de 1988, que define propriedade como direito fundamental (artigo 5º) destacando-a como um princípio de ordem econômica e financeira, no Capítulo 1 Dos Princípios Gerais da Atividade Econômica. Quanto à função social da propriedade, está disposto no artigo 186 da Constituição Federal de 1988 que ela é cumprida quando a propriedade rural atende simultaneamente: aproveitamento racional e adequado; utilização apropriada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; observância das disposições que regulam as relações de trabalho; exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. Em consonância com a referida Constituição, define o CC/2002, em seu artigo 1228 § 1º, que o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais. A finalidade social é a novidade que aparece no CC/2002 em relação ao CC/1916. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 36 UNIDADE I O fato mais notório no que tange à propriedade da terra é sua concentração. Segundo Fernandes5, a partir dos dados do Atlas Fundiário Brasileiro (1996) e do II Plano Nacional de Reforma Agrária (2003), constata-se que a estrutura fundiária continua concentrada: • Em 1992, havia 245 milhões de ha (74%) distribuídos em propriedades com mais de 200ha. • Havia, no mesmo ano, 86 milhões de ha (26%) distribuídos em propriedades com menos de 200ha. • No ano de 2003, havia 297 milhões de ha (71%) distribuídos em propriedades com mais de 200ha. • Havia 123 milhões de ha (29%) distribuídos em propriedades com menos de 200ha na segunda situação. • Houve um pequeno aumento das propriedades até 200ha, o que não modifica a realidade da concentração fundiária no país. A tabela a seguir está disponível no site – Atlas da Questão Agrária, a saber: <http://www2.fct.unesp.br/nera/atlas/estrutura_fundiaria.htm>. Acesso em: 30 out. 2011. Evolução da estrutura fundiária – 1992-2003 5 Dados apresentados na Agenda do MST, no ano de 2006. E d u ca çã o n o C a m p o 37 UNIDADE I Na tabela você pode constatar o número de imóveis, na primeira coluna, e depois a área em ha desses imóveis. Faça a leitura da tabela e verifique o que é concentração da terra. Note que no Brasil existem 14.027 propriedades com tamanho igual ou acima de 2000 hectares, consideradas grandes propriedades. Observe que propriedades com menos de 200 hectares são 1.270.881. Você percebe o que é concentração da terra? Poucas pessoas têm muita terra e muitas pessoas têm pouca terra. Dados numéricos possibilitam a reflexão tanto sobre o direito à propriedade -não concedido a todos, pois depende do poder de compra de cada pessoa - quanto sobre o direito fundamental à educação, como descrito na CF/1988 e na Declaração Universal dos Direitos Fundamentais (1948). Paralelamente ao questionamento sobre a concentração da terra, é importante verificarmos que o Brasil possui características rurais, embora a grande maioria da população esteja “amontoada” nos centros urbanos. O pesquisador Veiga (2003, p.56) mostra que 57% desta população fazem parte da rede urbana, sendo 34% em 12 aglomerações metropolitanas (a exemplo de Rio de Janeiro, São Paulo), 13% em 37 aglomerações não metropolitanas (são as grandes cidades, mas que ainda não se juntaram com aquelas localizadas ao seu entorno) e 10% em 77 centros urbanos que não pertencem a aglomerações (cidades de porte médio). O autor afirma que esses 57% da população vivem em 455 municípios. As sedes dos outros 4.485 municípios do país teriam características rurais e nelas vivem 30% da população brasileira. Portanto, para o autor, o Brasil é menos urbano do que se imagina: “Qualquer pessoa que conheça um município de pequeno ou médio porte localizado fora de aglomerações poderá confirmar que sua economia é essencialmente alicerçada na utilização direta de recursos naturais”. (VEIGA, 2003, p. 56). Esse debate é importante porque faz com que o educador comece a repensar a sua própria realidade. Verifique a localidade onde você mora. Ela tem quantos habitantes? Quais são suas características econômicas? Como está organizada a área rural? Existe um grupo de grandes propriedades e outro de pequenas propriedades, sítios, chácaras, assentamentos? Verifique as festividades da sua localidade. Será que elas têm origem em U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 38 UNIDADE I práticas assentadas no trabalho no campo? Veja se o agronegócio está presente em sua região. Há grandes plantações de cana, soja, trigo, milho etc.? Há mecanização? Há emprego, desemprego, pobreza? E as estradas, como são? Certamente você se defrontará com dois projetos: um que faz avançar o agronegócio, em nome do desenvolvimento econômico; e outro que faz valer as lutas e demandas dos povos do campo, por permanência e trabalho na terra. Pense nisso! Os dados alertam para uma análise crítica frente às teses anunciadas algumas décadas atrás que apontavam o campo fadado ao êxodo. Neste sentido, cabe destacar a avaliação feita por Duarte (2003, p.24), que expressa a análise dos Movimentos Sociais do Campo: Vivemos um longo período de hegemonia das teses que afirmavam a extinção do campo enquanto espaço social significativo ao desenvolvimento da sociedade, condição que não deixava muitas possibilidades para pensar esta realidade. Quebrando a linearidade e o absolutismo destes enfoques, no linear do século, dois indicadores do IBGE (censo 1998) restabelecem perspectivas distintas das tidas como seguras. O primeiro deles aponta para o fato de que o crescimento da população das cidades brasileiras é vegetativo, mostrando uma desaceleração significativa do êxodo campo/cidade pelo esgotamento do modelo de industrialização. O segundo indicador, mais surpreendente, é de que a população do campo teve crescimento relativo, permitindo projeções inversas às tradicionais para as próximas décadas, crescimento esse provocado pelo retorno em busca de trabalho e sossego, mas, principalmente, pelas lutas da Reforma Agrária. Assim, o censo mostra que o campo está com 35,5 milhões de pessoas, quando aquelas projeções dos anos 80 afirmavam que estaríamos com aproximadamente 12 milhões. Diante dessa realidade, os povos do campo vêm lutando pela efetivação da educação nas suas localidades. Uma educação que valorize as particularidades do campo, sem deixar de aprofundar os conhecimentos universais necessários à formação humana. A luta pela terra desdobra-se em luta por direitos sociais e humanos fundamentais, a exemplo da educação, saúde e trabalho. O direito à educação é assegurado na CF/1988, no entanto nem sempre se efetiva. É um direito que está na lei, mas que nem sempre é exercido. E d u ca çã o n o C a m p o 39 UNIDADE I De agora em diante você estudará a constituição do movimento nacional da educação do campo, cujo intuito é colocar em evidência os desafios dos povos do campo quanto à sua escolarização e quanto a um projeto para o Brasil. Na figura 5, você constata uma passagem da mística desenvolvida durante a I Conferência Nacional: Por uma Educação do Campo, realizada em 1998. Observe bem e verá que há um cartaz, à sua esquerda, que foi capa de livros, estampa em camisetas e cartazes, como símbolo da luta pela educação do campo. O MST tinha um lema nos anos de 1990 que era “Ocupar, produzir e resistir também na educação”. Esse lema foi gerado no fortalecimento da luta poreducação dentro do próprio movimento social. Figura 5 – Mística. I Conferência Nacional Por uma Educação Básica do Campo. Fotogra- fia: Maria Antônia de Souza, 1998. Você chegou ao final do estudo da Unidade I. É hora de elaborar reflexões sobre o que foi discutido até aqui. Pergunte-se sobre: U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 40 UNIDADE I 1) Quais as características da sociedade brasileira no século XIX e XX? Certa- mente, você encontrará dados que o(a) levarão a pensar sobre a sociedade agrária e sobre o início da industrialização. Também se recordará do ruralismo pedagógico. 2) O que mudou em meados do século XX? Aqui você relembrará a elabora- ção das Leis Orgânicas da década de 1940. 3) Quais os marcos legais da educação rural? Você retomará as principais leis da educação, dentre elas: 4.024/61; 5.692/71 e 9.394/96. Poderá pensar se elas trouxeram contribuições para a organização das escolas do campo. 4) Quais os principais desafios postos à sociedade brasileira no contexto da educação rural? Você poderá retomar elementos discutidos a partir dos dados es- tatísticos. 5) Por fim, você terá condições de fazer uma relação entre as características da propriedade da terra no Brasil e os motivos que levaram os governantes ao abandono da educação rural. E d u ca çã o n o C a m p o 41 UNIDADE I Na Unidade I você estudou sobre a realidade do campo no Brasil, com especial ênfase sobre a propriedade e a concentração da terra. Você leu e reconheceu os diversos fatores que levaram à migração dos trabalhadores do campo em direção às cidades. Verificou a existência de movimentos sociais populares na sociedade brasileira e as suas lutas pela efetivação dos direitos humanos fundamentais. A educação rural tem que ser entendida no contexto da ideologia do capitalismo agrário, que prevê o desenvolvimento rural mediante o avanço do agronegócio – produção em grande escala e com caráter de monocultura. Nesse cenário, a educação rural é desenvolvida pela lógica da urbanização na sociedade. Entretanto, como você estudou, diversos autores têm mostrado que o Brasil é marcadamente rural. Existem grandes centros urbanos que constituem verdadeiros “amontoados urbanos”, entretanto, a grande maioria dos municípios é marcada por relações econômicas e culturais assentadas na agricultura, especialmente a familiar. É no contexto das lutas de trabalhadores que emerge a então denominada educação do campo, que você terá oportunidade de estudar mais adiante. Reuniões foram realizadas no ano de 2009 com a finalidade de definir a função e caráter do Comitê, aprovado em dezembro de 2010. O estado do Paraná conta também com uma Articulação Estadual dos Povos do Campo, a exemplo do que acontece no país, com a Articulação Nacional. Vale dizer que a principal parceira dos povos do campo na organização da educação do campo tem sido as universidades estaduais e federais. Neste livro falta espaço para descrever tantas experiências, mas você pode consultar o site do MEC, buscar SECADI e verificar a área da Educação do Campo. Busque saber se no seu estado há um site específico do governo sobre o assunto. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l 42 UNIDADE I No estado do Paraná, há uma coordenação estadual de educação do campo, criada em 2003, cuja denominação revista na gestão governamental iniciada em 2011, passou a ser Coordenação Escolar da Educação do Campo. E, há também uma página na web que traz as publicações, documentos e iniciativas relacionadas à educação do campo do próprio estado. Informe-se. Na presente seção, você constatou que a emergência do movimento nacional da educação do campo se deve aos espaços públicos – encontros e conferências – realizados a partir de 1997. Verificou também que a mobilização dos povos do campo conta com o apoio de diversas entidades e que a luta é pela efetivação do direito humano e social à educação. Identificou vários problemas existentes nas escolas localizadas no campo e percebeu que todos eles são questionados pelo movimento nacional da educação do campo. Constatou ainda que a educação do campo é mais do que luta por escola, trata-se de confrontar o projeto do capitalismo agrário com o projeto de um Brasil sustentável e viável à classe trabalhadora, tanto da cidade quanto do campo. Na seção 2, você identificará os marcos legais da educação do campo. Mãos à obra! U N ID A D E IIA EMERGÊNCIA DO MOVIMENTO NACIONAL DA EDUCAÇÃO DO CAMPO ObjetivOs De aPRenDiZaGem Conhecer o Movimento Nacional da Educação do Campo Identificar o que caracteriza a educação do campo Verificar a existência de diversos povos do campo no Brasil ROteiRO De estUDOs SEÇÃO 1 – A emergência da educação do campo como Movimento Nacional SEÇÃO 2 – Marcos legais da educação do campo SEÇÃO 3 – Diversidade entre os povos do campo: desafios à educação U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE II 44 PARA INÍCIO DE CONVERSA Figura 6 – Conferência Nacional Por uma Educação Básica do Campo, Luziânia (GO). Fotografia: Maria Antônia de Souza, 1998. Você deve estar se perguntando sobre o que é o Movimento Nacional da Educação do Campo. Observe a figura 6. Você vê um aglomerado de pessoas assistindo palestras em um dos espaços de realização da I Conferência Nacional: Por uma Educação Básica do Campo, ocorrida no ano de 1998, no município de Luziânia, estado de Goiás. A promoção ficou por conta de cinco entidades, a saber: Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef); Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e Universidade de Brasília (UnB). O que essa Conferência, que reuniu gente de todo o Brasil, movimentos do campo, educadores, educandos, entre tantos outros, tem a ver com a educação do campo? Ela sinaliza a origem do que Antonio Munarim tem denominado de “construção do movimento nacional da educação do campo”. Importante você se perguntar sobre o que move as pessoas na organização de um movimento. Nesta unidade, você verificará 45 UNIDADE II E d u ca çã o n o C a m p o que a não efetivação dos direitos sociais e dos direitos humanos é um dos aspectos que leva à organização das pessoas. Constatará que há um conjunto de lutas, demandas e experiências educacionais que valoriza os povos do campo, pois é por eles organizado. Trata-se, de agora em diante, de voltar a atenção para a educação do campo. Você leu na Unidade I sobre a concentração da terra, sobre as condições precárias das escolas públicas no campo, sobre a baixa escolaridade da população do campo e constatou que o Brasil é um país que possui a maioria dos municípios com características rurais. Então, são esses fatores, junto com o ideal de construção de outro Brasil, justo, sem concentração de renda, que provocaram a organização das pessoas e dos coletivos de trabalhadores do campo à luta por uma educação que não se resume somente à luta por escola pública e por conteúdos articulados com a cultura e vida do campo. É uma luta que encampa um projeto popular para o Brasil, em que a educação escolar e a educação não escolar são fundamentais para o processo de transformação social. Miguel Arroyo (1999, p. 8-9), na apresentação do primeiro volume da Coleção Por uma Educação Básica do Campo, assim se pronuncia sobre a conferência: Os educadores e educadoras presentes não são ingênuos, sabem dos gravíssimos problemas da educação que tentam reverter (...) As experiências trazidas à conferência mostram que há, no campo, tanta ou mais transgressão do que nas escolas urbanas, que há consciência da possibilidade de construir outra proposta pedagógica, outra educação de jovens e adultos, de formar outro profissional. Para o autor, “A educação do campo cresceu,afirma-se no movimento de renovação pedagógica brasileira”. (p.9). Em meio aos debates, conferências e oficinas realizadas durante a Conferência Nacional, foi sendo fortalecido o conceito de Educação do Campo. E, a partir dessa conferência, foram elaboradas coletâneas1, 1 Até o momento, foram organizados sete volumes da Coleção Por uma Educação Básica do Campo, a saber: 1. Por uma Educação Básica do Campo (1999); 2. A Educação Básica e o movimento social do campo (1999); 3. Projeto popular e escola do campo (2000); 4. Edu- cação do Campo: identidade e políticas públicas (2002); 5. Por uma Educação do Campo: contribuições para a construção de um projeto de Educação do Campo (2004); 6. Prelo (2008); 7. Educação do Campo: campo – políticas públicas – educação (2008). Atualmen- te, a SECAD/MEC tem potencializado a publicação de diversos materiais sobre Educação U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE II 46 versando sobre o assunto, que veio relatar o processo de sua construção e fortalecer a demanda por políticas públicas. Essa produção bibliográfica sobre a Educação do Campo tem sido recorrentemente citada nas pesquisas atuais sobre Educação e no MST, demonstrando que o arcabouço teórico de muitas teses e dissertações é oriundo de trabalhos gerados no movimento social. Na Unidade II deste livro você constatará o que é a educação do campo e como se formou o movimento nacional a ela referente, a partir da conferência de 1998. A figura 6 tem o intuito de remeter o seu pensamento para a organização dos povos do campo e da educação. Afinal, a Conferência reuniu os interessados numa sociedade diferente, onde não haja concentração da terra e onde a educação possa fortalecer a emancipação humana. Como escreveu o educador Paulo Freire em inúmeros dos seus livros, é a educação que contribuiu para a libertação do ser humano. Espero que ao chegar ao final da Unidade você tenha condições de responder às seguintes indagações: 1) O que é o movimento nacional da educação do campo? 2) O que é educação do campo e como tem sido o seu processo de construção? 3) Por que é importante estudar a educação do campo se o país conta com apenas 18% da população no campo? 4) Por que é importante para o profissional da educação inteirar-se do debate sobre políticas e práticas da educação do campo? do Campo. Ver em específico o Caderno Temático 2 – Educação do Campo: diferenças mudando paradigmas. 81f, publicado em 2007. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/ secad/arquivos/pdf/educacaocampo.pdf>. Acesso em: 20 out. 2009. 47 UNIDADE II E d u ca çã o n o C a m p o SEÇÃO 1 A EMERGÊNCIA DA EDUCAÇÃO DO CAMPO COMO MOVIMENTO NACIONAL Para compreender o surgimento de um movimento organizado é fundamental termos em conta algumas perguntas de natureza metodológica, a saber: 1) Como se deu a organização do grupo? 2) Quais são os principais motivos da organização? 3) Quais articulações e parcerias são feitas durante o processo de organização e de continuidade da luta? 4) Quais são as demandas e proposições feitas pelo povo organizado? 5) Quais são as conquistas e os desafios? Esses são alguns elementos propostos por Gohn (1997) para a análise de movimentos sociais. Vamos trabalhar esses cinco elementos, de modo que fique claro o que é e como surgiu a luta por educação do campo. Tendo em vista que na Unidade I você estudou as características da educação rural e a legislação educacional até os anos de 1990, daqui em diante a ênfase será em fatos que ocorreram a partir de 1980, e que foram fundamentais para a emergência do movimento nacional da educação do campo. Na década de 1980, conjuntura em que a migração campo-cidade, embora continuasse, já havia invertido a realidade populacional brasileira, muitas iniciativas políticas interferiram na então denominada educação rural. Será a partir da década de 1980 que um fenômeno político impactará no estudo das crianças e jovens em idade escolar - muitas escolas públicas rurais (estaduais e municipais) foram fechadas sob a alegação de que o número de alunos não era suficiente para a manutenção das turmas e classes escolares. Houve o início de um processo denominado de nucleação ou consolidação de escolas rurais. Ou seja, as escolas que eram isoladas e unidocentes foram fechadas e em algumas localidades foram instaladas essas escolas nucleadas ou consolidadas. Essas localidades, que eram distritos, vilas, sedes de bairros rurais etc., foram selecionadas para serem as sedes ou núcleos escolares. Elas receberiam os alunos de diversos lugares do município, transportados por veículo municipal. U n iv e rs id a d e A b e rt a d o B ra si l UNIDADE II 48 Foi assim que entrou em cena a polêmica do transporte escolar rural, que nos dias atuais merece estudos, especialmente no que tange ao financiamento da educação, às condições de transporte dos alunos e condições de trabalho dos professores. No início de cada ano escolar, ainda hoje é comum noticiários sobre o transporte escolar, em algumas localidades, desde suas condições precárias até sua interrupção por falta de verba, tanto para alunos quanto para o deslocamento dos professores. Observe se na sua região há escola rural e como é feito o deslocamento dos alunos. Você percebe que essas são algumas características e problemáticas que marcam a educação escolar dos povos do campo? Por que será então que surge um movimento que questiona essa educação e as políticas públicas? O que consta efetivamente é que a partir de 1980 ficou bem nítido o processo de nucleação – organização de uma unidade escolar numa comunidade rural que fosse central/nuclear em relação às demais. Ocorre que nem todas as regiões do Brasil tiveram a organização das escolas em núcleos. Muitas foram fechadas e não havia transporte escolar. Os jovens foram os principais afetados, pois, para ter acesso ao ensino de 2º grau (atual Ensino Médio), era necessário dirigir-se à escola da cidade. Com isso, processos de exclusão escolar marcaram a vida da população do campo na década de 1980. Lembre-se de que geralmente os movimentos e lutas sociais surgem para questionar processos de exclusão social. Se por um lado, o acontecimento da década de 1980 que impulsionou a luta por educação do campo foi o fechamento das escolas, por outro lado, a organização do MST era fortalecida nessa mesma época, em função da criação do Setor de Educação, responsável pelo debate sobre a escola, formação de professores, conteúdos escolares etc. Tenha curiosidade, acesse o endereço eletrônico1 do MST e verifique toda a produção do respectivo movimento, em especial a destinada à educação escolar. A política de fechamento de escolas rurais, empreendida em vários estados e municípios brasileiros, gerou uma campanha articulada pelo MST. Veja a notícia2 sobre a luta contra o fechamento de escolas rurais, elaborada por Luiz Felipe Albuquerque do MST, com o tema Fechamento de escolas do campo é retrocesso. 1 Disponível em: <http://www.mst.org.br>. 2 A notícia e a entrevista podem ser encontradas no seguinte endereço: <http://www.mst. org.br/Fechamentos-de-escolas-do-campo-e-umretrocesso-afirma-erivan-hilario-mst>. Acesso em: 30 out. 2011. 49 UNIDADE II E d u ca çã o n o C a m p o Mais de 24 mil escolas no campo brasileiro foram fechadas no meio rural desde 2002. O fechamento dessas escolas demonstra o drástico problema na vida educacional no Brasil, especialmente no meio rural. Após décadas de lutas por conquistas no âmbito educacional, cujas reivindicações foram atendidas em parte - o que permitiu a consolidação da pauta – o fechamento das escolas vão no sentido contrário do que parecia cristalizado. Nesse quadro, o MST lançou a Campanha Nacional contra o Fechamento de Escolas do Campo, que pretende fazer o debate sobre a educação do campo com o conjunto da sociedade,
Compartilhar