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64 Unidade II Unidade II 3 DIREITO PRIVADO E APLICAÇÃO À SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Depois de termos estudado os fundamentos de direito e os principais aportes do direito constitucional, vamos conhecer, nesta unidade, o direito privado em suas duas abordagens: direito civil e direito empresarial. Direito constitucional é direito público porque regula a forma como o Estado, seus poderes e agentes vão se relacionar entre si e com os particulares, com as pessoas privadas. Direito privado é, como vimos, a área do direito que regula a relação entre os particulares, seja quando eles se relacionam como pessoas naturais, seja quando se organizam em pessoas jurídicas de direito civil ou de direito empresarial, como veremos. Todos os conceitos e princípios tratados aqui se aplicam à segurança da informação e são essenciais para que o gestor dessa área conheça as leis, os contratos, a responsabilidade civil e a vida empresarial, temas que estarão sempre ligados ao trabalho dos gestores de segurança da informação e cuja normatização será essencial para tomadas de decisão com segurança e precisão. 3.1 Direito civil: histórico e conceito Direito civil é a área do direito que regula a atividade das pessoas em sua vida comum desde o nascimento até depois de sua morte, passando por todas as etapas que vivemos, como o casamento, a separação, os contratos, os atos ilícitos, que geram responsabilidade por danos causados, entre tantos fatos e atos cotidianos que praticamos ao longo de nossas vidas. O direito civil é muito antigo e necessário para normatizar a vida das pessoas na sociedade. Sempre atendeu aos objetivos das pessoas de proteger – pela lei e por instrumentos reconhecidos como legais, como os contratos – valores que a sociedade preservava, como o casamento, a filiação, a propriedade, a destinação dos bens após a morte de seu proprietário, entre outros aspectos considerados relevantes. Certamente, o avanço decisivo que o direito civil conheceu se deve às revoluções burguesas ocorridas na Inglaterra, nos Estados Unidos e na França nos séculos XVII e XVIII. Os burgueses desejavam maior estabilidade em suas relações comerciais e familiares, e isso significava, principalmente, impedir que o Estado interferisse nessas relações entre as pessoas. Um dos mais importantes textos de lei civil é o Código Francês de 1804, conhecido como Código Napoleão, que foi redigido a mando do imperador francês. Ele tinha por objetivo tornar-se o estatuto primordial das relações privadas, das relações estabelecidas entre as pessoas. Outro texto legislativo 65 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO importante é o Código Civil alemão, conhecido como Livro de Direito Burguês, que entrou em vigor em 1896 e vigora até hoje. Esses dois textos de lei – francês e alemão – influenciaram o primeiro Código Civil brasileiro de 1916, que vigorou até 2002, quando, então, foi substituído por um novo código que está em vigor até hoje. O atual código trata dos seguintes temas: • Parte geral: são reguladas a pessoa natural, a pessoa jurídica, o domicílio, os bens, os fatos jurídicos, os atos jurídicos lícitos e ilícitos, os institutos da prescrição e da decadência e as provas. • Parte especial: são tratadas as áreas de direito das obrigações, direito da empresa, direito das coisas, direito de família e direito das sucessões. Há ainda um último item para disposições finais e transitórias. Nosso objetivo neste estudo é fornecer os principais pontos da vida privada regulados pelo Código Civil brasileiro, para que esse conhecimento possa ser utilizado na vida profissional dos gestores de segurança da informação. Alguns temas são essenciais. Vamos a eles. 3.2 Pessoa natural Pessoa natural é o mesmo que pessoa física, enquanto pessoa jurídica é uma criação do direito, ou seja, é aquela formada por um grupo de pessoas físicas ou jurídicas para atender a um objetivo predeterminado. As pessoas naturais ou físicas são um fim em si mesmo, ou seja, valem pelo simples fato de existirem; as pessoas jurídicas, no entanto, são instrumentos organizados para atender a uma finalidade específica que seus criadores desejam. Assim, os sócios de uma empresa quase sempre são pessoas naturais ou físicas, e a sociedade empresarial que eles organizam é uma pessoa jurídica. O Código Civil brasileiro, no artigo 2º, determina que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida e ressalta que a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Personalidade jurídica é a capacidade de adquirir direitos e deveres e assumir obrigações. Para a pessoa natural ou pessoa física, essa personalidade tem início no momento do nascimento com vida, embora desde a concepção sejam protegidos pela lei os direitos do nascituro, que é o feto, a vida que foi gerada, mas que ainda não nasceu. Existem grandes debates científicos sobre o momento em que a vida realmente tem início, e isso pode gerar, na prática, algumas dúvidas para a aplicação da lei. No geral, a proteção ao nascituro se traduz pela proteção da mãe, que pode, por exemplo, requerer, perante o poder judiciário, o direito à pensão alimentícia para a fase da gravidez caso ela não seja casada com o pai e não tenha condições objetivas de se manter. 66 Unidade II Leia a notícia a seguir sobre uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2017: Alimentos g ravídicos Em 2017, a Terceira Turma estabeleceu que os alimentos gravídicos – destinados à gestante para cobertura das despesas no período compreendido entre a gravidez e o parto – devem ser automaticamente convertidos em pensão alimentícia em favor do recém-nascido, independentemente de pedido expresso ou de pronunciamento judicial. Essa conversão é válida até que haja eventual decisão em sentido contrário, em ação de revisão da pensão ou mesmo em processo em que se discuta a própria paternidade. O entendimento do colegiado foi aplicado em julgamento de recurso no qual o suposto pai defendeu a impossibilidade jurídica de pedido de execução de alimentos gravídicos, já que, com o nascimento da criança, teria sido extinta a obrigação alimentar decorrente da gestação. Segundo ele, as parcelas da pensão também deveriam ser suspensas até que houvesse o efetivo reconhecimento da paternidade (o número do processo não é divulgado em razão de segredo judicial) (STJ, 2019b). O feto ou nascituro é uma expectativa de vida humana, um ser humano ainda em formação, razão pela qual a lei o trata como um ser com expectativa de direito. Esses direitos só serão adquiridos se o nascimento ocorrer com vida, quando, então, se aplicará o artigo 2º do Código Civil, que determina que a personalidade civil começa do nascimento com vida. A pessoa natural ou física que adquire personalidade civil adquire capacidade para ser um sujeito de direitos e deveres e para contrair obrigações, como assinar um contrato. Porém, nem todos possuem a mesma capacidade civil, porque o Código Civil, em seus artigos 3º e 4º, distingue os absolutamente incapazes dos relativamente incapazes, estabelecendo para estes uma situação diversa daquela destinada aos capazes. Absolutamente incapazes de exercer os atos da vida civil são: • Os menores de dezesseis (16) anos. • Os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos. • Os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir a sua vontade. Nesse caso, a lei permite que os absolutamente incapazes sejam representados por pessoas capazes, quase sempre seus pais, tutores ou curadores. 67 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Relativamente incapazes de exercer os atos da vida civil são: • Os maiores de dezesseis (16) anos e menores de dezoito (18). • Os ébrios habituais, os viciados em tóxicos e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido. • Os excepcionais sem desenvolvimento mental completo. • Os pródigos. No caso dos relativamente incapazes,eles serão assistidos por uma pessoa capaz nos atos da vida civil que praticarem. A assistência significa verificar se os atos praticados estão em conformidade com a lei, se foram corretamente compreendidos pelo relativamente incapaz. Quase sempre quem exerce esse papel são os pais, tutores ou curadores. A partir dos 18 anos, a pessoa fica totalmente habilitada para praticar os atos da vida civil, como contratar, casar, herdar, ou ser responsabilizada por danos decorrentes de atos ilícitos praticados. É, portanto, totalmente capaz, salvo se lhe sobrevier uma situação que a torne relativamente ou totalmente incapaz, como doença que provoque demência, vício de drogas ou acidente que cause estado vegetativo. Nesses casos, deverá ser caracterizada judicialmente a incapacidade, relativa ou absoluta, e designada uma pessoa para se incumbir das responsabilidades, como receber indenização de seguro, verba de aposentadoria ou pensão, entre outras. É muito importante que, ao formalizar um contrato ou estabelecer uma sociedade comercial, ou, ainda, realizar qualquer outro ato da vida negocial ou civil, seja verificado se a pessoa que está contratando ou negociando é uma pessoa capaz para os atos da vida civil, tem condições legais de realizar aquele ato, porque o artigo 104 do Código Civil determina que a validade do negócio jurídico requer agente capaz. Em outras palavras, um contrato realizado com menor de 16 anos sem representante ou com menor entre 16 e 18 anos sem assistência poderá ser considerado um negócio nulo ou anulável e causar prejuízos materiais para as partes que o praticaram. A existência da pessoa natural termina com a morte. O Código Civil criou o conceito de morte presumida. Ela pode ocorrer nas hipóteses do artigo 7º quando: • for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida – por exemplo, alguém que comprovadamente embarcou em um avião que caiu em pleno oceano sem que tenha sido localizado nenhum sobrevivente nem os corpos dos passageiros; • alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra. Esgotadas as buscas e averiguações, será requerida em juízo a declaração de morte presumida, e a sentença judicial fixará a data provável do falecimento para produzir efeito em todos os atos da vida civil praticados pela pessoa natural que será considerada morta. 68 Unidade II Na hipótese de simples desaparecimento da pessoa natural de seu domicílio sem dar notícias, sem que dela se tenha notícias e, ainda, sem deixar representante ou procurador, determina o artigo 22 do Código Civil que deverão ser requeridas em juízo, por qualquer interessado ou pelo Ministério Público, a declaração de ausência e a nomeação de um curador, que será a pessoa responsável pelos direitos, deveres e obrigações do desaparecido. Infelizmente, essa situação é muito mais comum do que possamos imaginar. Em 2018, segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, foram contabilizados 82.094 casos de desaparecimento de pessoas naturais no Brasil. Há indicativos de que esse número possa ser subestimado, porque muitas pessoas não sabem que devem registrar o desaparecimento de seus familiares, em especial quando eles são adultos. Saiba mais Consulte o artigo a seguir do portal do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) para saber mais detalhes sobre pessoas desaparecidas no Brasil: CICV. Pessoas desaparecidas no Brasil: o trabalho do CICV. 27 fev. 2020. Disponível em: https://www.icrc.org/pt/pessoasdesaparecidas-brasil?_ga=2. 191460970.1513063959.1589973173-759620272.1589973173. Acesso em: 6 jul. 2020. 3.3 Pessoa jurídica Pessoa jurídica é um ente criado pelo direito, é uma pessoa coletiva e, exatamente por isso, fictícia ou abstrata, como a ela se referem muitos estudiosos. É formada pela união de pessoas naturais ou jurídicas, que constituem outra pessoa jurídica, com direitos, deveres e obrigações próprias distintas das de seus formadores. Anderson Schreiber afirma: Pessoa jurídica é o ente a que a ordem jurídica atribui personalidade distinta daquela de seus membros ou instituidores, sendo o termo personalidade aí compreendido na sua acepção de aptidão para ser titular de direitos e obrigações. Trata-se, nas palavras de Rubens Limongi França, da “união moral de pessoas reunidas com o objetivo de alcançar um fim comum e reconhecida pelo ordenamento como sujeito de direito”. [...] A pessoa jurídica, também chamada pessoa ideal ou coletiva, tem personalidade autônoma, distinta e independente da personalidade de seus membros. Toda utilidade da pessoa jurídica reside, de fato, na distinção entre o seu patrimônio e o patrimônio de seus integrantes, que, em regra, não respondem pelas obrigações contraídas pelo ente moral (SCHREIBER, 2018b, p. 155). 69 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Pessoas jurídicas são constituídas por sócios ou associados, que poderão ser, por sua vez, pessoas naturais ou outras pessoas jurídicas, mas suas personalidades são independentes da pessoa jurídica que constituem. Exemplo: quando Pedro e José são sócios da Borracharia Mirante da Colina, estamos diante de duas pessoas naturais – Pedro e José – que constituíram uma pessoa jurídica – Borracharia Mirante da Colina –, e as pessoas naturais e a jurídica não se confundem em seus direitos e obrigações. As dívidas assumidas pelas pessoas naturais serão de responsabilidade delas, isoladamente; e as dívidas assumidas pela pessoa jurídica serão de responsabilidade dela, sem afetar o patrimônio pessoal de seus sócios, salvo em raríssimas situações, que denominamos de desconsideração da personalidade jurídica e que trataremos adiante. Lembrete No Brasil, a lei classifica as pessoas em naturais, que é o mesmo que pessoas físicas, e em pessoas jurídicas, que são empresas ou sociedades civis. Assim, podemos representar a pessoa jurídica da seguinte forma: Pessoa jurídica Sócios ou associados Sócios ou associados Sócios ou associados Figura 7 No direito brasileiro, as pessoas jurídicas podem ser classificadas como de direito público ou de direito privado. Neste estudo, interessam-nos as pessoas jurídicas de direito privado, que, por sua vez, são divididas pelo artigo 44 do Código Civil (BRASIL, 2002) em: • Associações. • Sociedades. • Fundações. • Organizações religiosas. 70 Unidade II • Partidos políticos. • Empresas individuais de responsabilidade limitada, conhecidas pela sigla Eireli, criadas pela Lei n. 12.441, de 2011 (BRASIL, 2011). As associações, fundações, organizações religiosas e os partidos políticos não têm fins lucrativos. Já as sociedades e as empresas individuais de responsabilidade limitada são criadas com finalidade de lucro, para desenvolvimento de atividades que gerem resultados para os sócios ou para o empreendedor individual. Trataremos dos diferentes tipos de sociedades empresariais e também das empresas individuais de responsabilidade limitada mais à frente. 3.4 Direitos da personalidade Os direitos da personalidade são tratados no Código Civil brasileiro a partir do artigo 11 e se estendem até o artigo 21. Entretanto, não é apenas o Código Civil que protege os direitos da personalidade, uma vez que a Constituição Federal brasileira, como vimos, em seus artigos 1º e 5º, principalmente, protege a dignidade da pessoa humana e impede a violabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Além disso, o Brasil é signatário da Declaração Universal dos Direitos do Homem da Organização das Nações Unidas (ONU), que, logo em seu artigo 1º, determina que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade” (ONU, 2018). Esses textos de lei atuam de forma concatenada a fim de que os melhores resultados sejam obtidos para a proteção da dignidade da pessoa humana, em especialno que concerne à vida, à intimidade, à vida privada, à honra, à imagem etc., tanto no âmbito das relações públicas quanto das relações privadas. Por isso, compete ao Estado agir de forma a respeitar esses direitos para cada pessoa, assim como compete aos particulares agirem entre si de forma a não violar esses direitos uns em relação aos outros. Os direitos da personalidade têm tanta relevância que são protegidos no plano nacional e internacional e nas relações públicas e privadas. Não há nenhum espaço para desrespeitar os direitos da personalidade, porque haverá sanções legais para isso. A relação de direitos da personalidade está expressa na Constituição Federal e no Código Civil e, de forma resumida, pode ser apresentada como: • Direito à vida. • Direito à dignidade humana. 71 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO • Direito à integridade física e psíquica. • Direito à cidadania. • Direito à igualdade. • Direito à liberdade – de locomoção, de pensamento, de expressão e de associação – e direito à livre iniciativa, ou seja, à constituição de pessoa jurídica com finalidade de atividade empresarial para obtenção de lucro. • Direito à igualdade. • Direito à segurança. • Direito ao meio ambiente equilibrado. • Direito à propriedade. • Direito a ser submetido a um processo judicial justo, com respeito à ampla defesa, ao princípio do contraditório e à realização de provas. Esse rol de direitos não é taxativo; pelo contrário, pode ser acrescido de muitos outros direitos à medida que a sociedade se modifica e estabelece novos valores que deseja que sejam protegidos pelo direito. No âmbito das relações privadas, ou seja, aquelas estabelecidas entre as pessoas naturais ou jurídicas sem a participação direta do Estado, a proteção da dignidade da pessoa humana é tratada como direito da personalidade, e os principais direitos elencados no Código Civil são: • Direito à imagem. • Direito à inviolabilidade da vida privada. • Direito ao nome. • Direito ao próprio corpo. Antes de conhecermos os detalhes da proteção legal a esses direitos, vamos entender as características dos direitos da personalidade, que são muito importantes para aqueles que estudam segurança da informação. De várias formas diferentes, a falta de segurança no tratamento e compartilhamento de informações poderá afetar a imagem, a vida privada, o nome e o corpo de uma pessoa, causando-lhe danos expressivos que deverão ser indenizados por aquele que for apontado comprovadamente como o causador dos danos. 72 Unidade II Rubens Limongi França conceitua direitos da personalidade como aqueles “cujo objeto são os diversos aspectos da própria pessoa do sujeito, bem assim da sua projeção essencial no modo exterior” (FRANÇA, 1996, p. 1.031). Segundo o autor, esses aspectos se encontram nas dimensões físicas, intelectuais e morais de cada pessoa. Os direitos da personalidade são indispensáveis para a garantia da dignidade e da integridade da pessoa humana, exatamente porque se localizam nas suas três dimensões essenciais, como bem relacionou o professor Limongi França. O que o direito faz tanto na Constituição Federal quanto no Código Civil é reconhecer e proteger a existência desses direitos. Não há atribuição de direitos, pois eles são da essência da existência humana digna e íntegra. Por essa razão, as principais características dos direitos da personalidade são, na lição do professor Anderson Schreiber: Em breve síntese, é possível reconhecer os seguintes atributos aos direitos da personalidade: (i) extrapatrimonialidade: são direitos cuja função é proteger a condição humana, em seus mais genuínos aspectos e manifestações, não sendo, portanto, suscetíveis de avaliação econômica, configurando situações jurídicas subjetivas existenciais; (ii) generalidade: sendo a dignidade valor reconhecido a todas as pessoas, a todos são assegurados os direitos voltados a promove-la; (iii) caráter absoluto: sua observância se impõe a toda a coletividade (erga omnes); (iv) não taxatividade: a ausência de previsão no Código Civil não impede que outras manifestações da personalidade humana sejam consideradas merecedoras de tutela, por força da aplicação direta do art. 1º, III, da Constituição Federal (como os direitos à identidade pessoal, à integridade psíquica e à diferença, por exemplo), característica por vezes referida como “elasticidade”; (v) imprescritibilidade: podem ser exercitados a qualquer tempo, independentemente do decurso de longos prazos sem invoca-los; (vi) inalienabilidade, indisponibilidade e intransmissibilidade: como manifestações essenciais da condição humana, os direitos da personalidade não podem ser alienados ou transmitidos a outrem, quer por ato entre vivos, quer em virtude da morte de seu titular, justificando a referência da doutrina a uma “titularidade orgânica”, uma vez que as situações existenciais encontram sua razão de ser na realização do interesse do titular, sendo dele indissociável (SCHREIBER, 2018b, p. 133). Repare que as características dos direitos da personalidade são semelhantes às características dos direitos fundamentais que estudamos. De fato, reconhecer a alguém o direito à imagem, à honra ou à privacidade não permite que essa pessoa aliene (venda) esse direito nem que disponha dele em benefício de outra pessoa – aceitar deixar de ter o direito à honra para que o filho o tenha, por exemplo, não é admissível na sociedade em que vivemos, porque o direito à honra é para todos. Também não é aceito aplicar o direito à privacidade apenas a pessoas com mais de 30 anos sem respeitar a característica da generalidade, que se trata de um direito que se aplica a todas as pessoas independentemente de gênero, estado civil, profissão, idade ou qualquer outra característica pessoal. 73 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Essas características não são difíceis de serem compreendidas; basta que pensemos nesses direitos na vida cotidiana. Vamos perceber que desejamos que sejam aplicados em nossas vidas e na vida de todos aqueles com os quais temos algum tipo de relacionamento. Aliás, vamos perceber que, quando uma sociedade respeita integralmente esses direitos, ela vive melhor, com maior harmonia e segurança. O artigo 11 do Código Civil determina claramente que “os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária” (BRASIL, 2002), ressalvado os casos previstos em lei. Assim, pode haver limitação ao direito de imagem, por exemplo, como acontece com artistas e atletas que negociam a divulgação de sua imagem para venda de produtos ou serviços, mas em caráter voluntário e temporal, por um período de tempo estabelecido em contrato, e não em caráter permanente. É nesse sentido que a lei pode limitar, quando há consonância com a vontade do sujeito que é titular do direito de imagem. Dois pontos merecem especial reflexão a respeito das características dos direitos da personalidade: a extrapatrimonialidade e a não taxatividade. Extrapatrimonialidade significa que os direitos não possuem valor patrimonial; porém, quando houver ofensa comprovada a um desses direitos, caberá o pedido de indenização por danos extrapatrimoniais, ou seja, por dano moral, que é uma forma econômica de compensação pela dor, pela humilhação, pelo desgosto ou pela tristeza decorrentes da agressão sofrida. Suponha que uma família acabou de perder o esposo e pai de filhos menores que era jogador de futebol profissional em um grande time do país. Ao se referir à morte do jogador vítima de um acidente de trânsito, um jornalista afirmou que se tratava de uma coisa positiva, porque ele não vinha tendo bom desempenho no time, havia perdido gols importantes e, tendo morrido, seria mais fácil substituí-lo por outro que tivesse melhor participação nas partidas. Não satisfeito, o jornalista afirmou, ainda, que as más atuações eram resultado de sua vida de pouca responsabilidade,sem dedicação aos treinos e à vida profissional. Todas as afirmações foram desprovidas de provas, um simples juízo de valores do jornalista. Evidentemente, trata-se de um comportamento incompatível com as boas regras do jornalismo, mas, além disso, de uma opinião que desrespeitou a dor que a família estava sentindo naquele momento, bem como a imagem do jogador, que foi abalada no âmbito pessoal e profissional. A família tem todo o direito de exigir uma indenização por danos morais, mas isso não significa que se está atribuindo um valor patrimonial à imagem e à honra do falecido; apenas que, pela via material, busca-se uma compensação pelo ato praticado que violou o direito de personalidade. Isso acontece, também, quando são publicadas fotos da vida privada de alguém sem consentimento e para obtenção de valores materiais, como a venda de um produto; ou a foto é de uma situação vexatória, como uma briga ou discussão de trânsito em que as pessoas se alteraram e discutiram, utilizando palavras de baixo calão, e, mais tarde, as filmagens são exibidas sem consentimento e sem caráter jornalístico. Em todas essas situações, é possível discutir a caracterização de danos morais e, se ficarem provados, o direito de ser paga indenização em valor a ser arbitrado pelo judiciário, consideradas as circunstâncias específicas de cada caso concreto. 74 Unidade II Assim, não se pode confundir extrapatrimonialidade com impossibilidade de reparação do dano decorrente da ofensa ao direito de personalidade, principalmente porque, como veremos mais detalhadamente à frente, o dano moral é um tipo de dano extrapatrimonial. Quanto à não taxatividade, é importante destacar que os direitos da personalidade atualmente protegidos pela legislação brasileira poderão ser acrescidos de outros, que surgirão como decorrência natural das mudanças da sociedade brasileira, dos novos valores que ela vai incorporar com o passar dos tempos. Assim, as mudanças que estão ocorrendo e que caracterizam a sociedade contemporânea como sociedade de informação vão permitir o surgimento de outros direitos da personalidade a serem protegidos, que serão incorporados automaticamente, sem que haja necessidade de expressa modificação da lei. E por que isso vai ocorrer? Porque a proteção da pessoa já está consolidada no ordenamento jurídico brasileiro, assim como também já está consolidado o caráter não taxativo. Por isso, diante de uma situação que nunca havia sido suscitada anteriormente, o poder judiciário não vai precisar de um texto de lei, porque terá princípios e julgados para servir de fundamentação para a decisão do caso concreto. A área de segurança da informação precisará estar sempre atenta à necessidade de evoluir, sem desrespeitar os direitos da personalidade, mesmo quando não estejam expressamente consignados no texto de lei. Esse cuidado será de especial relevância no tratamento e compartilhamento de dados pessoais, de modo a não permitir que acessos ou vazamentos indevidos viabilizem danos à personalidade das pessoas envolvidas e, consequentemente, acabem por gerar o dever de indenizar por parte da empresa responsável pela segurança da informação. O Código Civil garante, no artigo 16, que toda pessoa tem direito ao nome, compreendidos o prenome e o sobrenome. O nome civil é a principal forma de identificação de uma pessoa, porque ele consta em seus documentos pessoais e em todos os instrumentos necessários para sua identificação. Poderão ser modificados por decisão judicial os nomes pejorativos ou que tenham sido grafados de forma equivocada; também nos casos em que um prenome feminino é atribuído a um homem ou vice-versa. Lembrete Todos têm direito à proteção da dignidade da pessoa humana, como nos garante a Constituição Federal. Na atualidade, duas novas situações referentes a nome surgiram na sociedade brasileira: a dos transexuais que realizam cirurgia para mudança de gênero e querem adequar seu nome civil à nova situação; e daqueles que não realizaram cirurgia de adequação sexual, mas optaram por adotar uma conduta compatível com o sexo não biológico e desejam que o nome social também seja adequado à nova conduta. 75 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Leia a matéria a seguir: Decisões garantem respeito à identidade de gênero de pessoas trans O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem assumido papel de vanguarda nessa área, com um histórico de decisões permitindo a mudança do registro civil por pessoas trans desde, pelo menos, 2009. No entanto, foi somente em maio de 2017 que o STJ firmou o entendimento de que o direito dos transexuais à retificação da certidão de nascimento em relação ao nome e ao sexo não poderia ser condicionado à realização de cirurgia de adequação sexual, também chamada de transgenitalização (o número do processo não é divulgado em razão de segredo judicial). [...] Pela decisão do STJ, a alteração do sexo constante no registro civil deve ser feita no assentamento de nascimento original, proibida a inclusão, ainda que sigilosa, da expressão “transexual”, do sexo biológico ou dos motivos das modificações registrais. [...] O entendimento de que é possível a alteração do registro civil sem realização de cirurgia foi firmado pela Quarta Turma do STJ, que acolheu pedido de modificação de prenome e de sexo registral de transexual que apresentou avaliação psicológica pericial para demonstrar identificação social como mulher. Para o colegiado, o direito dos transexuais à retificação do registro não pode ser condicionado à realização de cirurgia, a qual muitas vezes se mostra inviável por razões médicas ou financeiras. O relator, ministro Luis Felipe Salomão, destacou que os transexuais, via de regra, vivem em desconexão psíquico-emocional com o seu sexo biológico e buscam formas de adequação. Ele lembrou que, apesar da existência de princípios como a imutabilidade do registro, a Lei de Registros Públicos prevê a possibilidade de alteração do nome que cause situação vexatória ou de degradação social, a exemplo das denominações que destoem da aparência física do indivíduo. Na hipótese específica dos transexuais, o ministro Salomão entendeu que a simples modificação de nome não seria suficiente para a concretização do princípio da dignidade da pessoa humana. Para o relator, foi necessária uma evolução da jurisprudência para alcançar também os transexuais não operados, de forma a trazer “a máxima efetividade ao princípio 76 Unidade II constitucional da promoção da dignidade da pessoa humana, cláusula geral de tutela dos direitos existenciais inerentes à personalidade, a qual, hodiernamente, é concebida como valor fundamental do ordenamento jurídico, o que implica o dever inarredável de respeito às diferenças”. Tudo em cartório Ainda não existe no Brasil uma norma legal que regulamente a alteração do registro civil por pessoas trans. Até recentemente, para mudar a certidão de nascimento, era preciso mover uma ação judicial. Porém, em junho de 2018, em convergência com as decisões tomadas pelo STJ e mais recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (ADI 4.275), o então corregedor nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, publicou o Provimento 73, que dispõe sobre a averbação da alteração do prenome e do gênero nos assentos de nascimento e casamento de transgêneros. Ficou estabelecido que homens e mulheres trans, maiores de 18 anos, podem pedir a alteração do registro civil, adequando-o à identidade de gênero autopercebida, independentemente de autorização judicial prévia ou comprovação de cirurgia de adequação sexual. O pedido de retificação registral de sexo e de mudança do prenome e da imagem registrados na documentação pessoal pode ser feito diretamente nos cartórios de registro civil, não sendo necessária a presença de advogados ou defensores públicos. Fonte: STJ (2019a). Em 2016, o Decreto n. 8.727 (BRASIL, 2016), que dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidadede gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, havia definido: • Nome social: designação pela qual a pessoa travesti ou transexual se identifica e é socialmente reconhecida. • Identidade de gênero: dimensão da identidade de uma pessoa, que diz respeito à forma como ela se relaciona com as representações de masculinidade e feminilidade e como isso se traduz em sua prática social, sem guardar relação necessária com o sexo atribuído no nascimento. Esse é um bom exemplo da não taxatividade dos direitos da personalidade. Esses direitos eram impensáveis há 30 anos e, na atualidade, por força dos valores que a sociedade adota, são compatíveis com decisões do mais alto tribunal privado brasileiro, que é o STJ. 77 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Saiba mais Para conhecer a organização do poder judiciário brasileiro e de todos os tribunais existentes, leia: STF. Sistema Judiciário Brasileiro: organização e competências. Brasília, 17 jan. 2011. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/ verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=169462. Acesso em: 6 jul. 2020. Os artigos 17 e 18 do Código Civil determinam expressamente que o nome de uma pessoa não pode ser utilizado por outra em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, mesmo quando não haja intenção difamatória. E, sem autorização, não se pode utilizar o nome de outra pessoa em propaganda comercial. Essas duas determinações da lei são muito importantes para todos aqueles que operam com segurança da informação, porque é muito comum ter acesso ao nome de muitas pessoas, mas não há como utilizá-los sem autorização expressa caracterizada por assinatura em documento com finalidade específica. O artigo 19 do Código Civil protege o pseudônimo adotado por uma pessoa para exercer atividades lícitas. Ele terá a mesma proteção que se dá ao nome. Pseudônimo não é o mesmo que apelido; é um nome diferente do nome que consta do registro civil de pessoa natural (certidão de nascimento), mas que é utilizado por uma pessoa sem finalidade ilícita, ou seja, para lesar a boa-fé de outra pessoa ou de uma comunidade. O pseudônimo é utilizado em atividades profissionais ou intelectuais, como livros, e cria um autor fictício, para que não se possa identificar o verdadeiro autor. Porém, não há intenção de enganar ou lesar, apenas ocultar o autor verdadeiro, que tem seus motivos pessoais para isso. Vamos supor que um membro do poder judiciário ou um conhecido representante de uma igreja queira escrever um texto literário com passagens eróticas e não deseja que seu verdadeiro nome seja exposto a comentários. Ele poderá exercer sua criatividade por meio de um pseudônimo sem nenhum inconveniente. O artigo 20 do Código Civil também trata de um tema bastante relevante para a área de segurança da informação: a proteção da integridade moral das pessoas. Determina a lei civil que, salvo se autorizadas ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão de palavras ou a publicação e a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou quando se destinarem a fins comerciais. Caso a pessoa já tenha falecido, a proteção de sua integridade moral poderá ser exigida por seu cônjuge, por ascendentes ou descendentes. A respeito desse artigo de lei, o professor Nestor Duarte afirma: 78 Unidade II O direito à integridade moral abarca, dentre outros, os aspectos referentes à intimidade, ao segredo e à imagem. A observância desses direitos é sempre exigível e sua violação acarretará indenização se atingir a honra ou se tiver objetivos comerciais. Pode, todavia, a pessoa autorizar que sua imagem ou fatos que, de ordinário, devem ficar na intimidade venham a público, autorização essa que, dado o caráter irrenunciável dos direitos da personalidade, é sempre revogável (DUARTE, 2011, p. 40). Assim, quando uma pessoa autorizar a publicação de dados referentes à sua intimidade, aos seus segredos ou mesmo à sua imagem, deverá assinar um termo de autorização que expressamente contenha as circunstâncias para as quais ela autoriza, ou seja, nunca se pode deduzir que a autorização seja permanente ou para circunstâncias diversas, salvo se isso estiver pactuado em contrato. Se um artista ou atleta profissional autoriza o uso de sua imagem para um canal de televisão ou clube de futebol, nesse instrumento contratual devem constar a data de início da autorização, o tempo de duração do contrato e quais as situações em que a imagem poderá ser exibida. Se o artista autorizou a exibição da imagem em uma telenovela ou em um programa de auditório, por exemplo, a imagem não poderá ser utilizada para fazer publicidade de um produto ou de outro programa da mesma emissora. A mesma premissa se aplica ao atleta que cede seu direito de imagem para exibição em canais de televisão durante um certo período de tempo ou por prazo indeterminado, tudo a depender do que tiver sido pactuado pelas partes em contrato. Se o artista ou o atleta profissional entender que não autoriza mais a exibição da imagem, poderá revogar a autorização, mas não antes do período de término do contrato, salvo se efetuar o pagamento das multas aplicáveis nessa hipótese. Como já mencionado, ninguém possui direitos absolutos. Todos os direitos são relativos ao fato de vivermos em sociedade e com o dever de obedecer às regras que regulam a vida em sociedade. Assim, se uma pessoa de livre e espontânea vontade assina um contrato por meio do qual autoriza outras pessoas a utilizarem sua imagem, se esse contrato tem um período de tempo de vigência, isso deve ser rigorosamente obedecido, não sendo dado à parte que cedeu a imagem arrepender-se e pretender que o contrato seja suspenso sem apresentar forte motivação para isso, sob pena de prejudicar a atividade empresarial daqueles que pagaram para ter o direito de utilizar a imagem. Por fim, o artigo 21 do Código Civil determina que a vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar o ato contrário a essa norma. A determinação legal é bastante clara no sentido de que não cabe, em nenhuma hipótese, a violação da vida privada de uma pessoa, a invasão a um círculo de privacidade que a pessoa tem direito de proteger de todas as outras e que somente com sua autorização expressa poderá se tornar público. A lei determina que o poder judiciário definirá, a pedido do interessado ou de quem o represente legalmente, quando necessário, as providências necessárias para que o ato contrário à privacidade seja impedido ou cesse imediatamente. 79 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Imagine a situação de uma pessoa que sofre um acidente de trânsito e fica seriamente machucada. Ela tem direito de não ter seu corpo exibido em nenhum órgão de informação, sem que isso represente uma ameaça à liberdade de imprensa. Os órgãos da imprensa digital, impressa ou televisiva, poderão noticiar o acidente e até exibir imagens dos veículos envolvidos na colisão, mas não poderão exibir os detalhes das lesões sofridas pelas pessoas que forem vítimas do acidente. É direito de cada pessoa decidir o quanto deseja ou permite que seja exposto de sua privacidade. Por isso, quando se trata de expor a intimidade de alguém em qualquer dimensão, inclusive sua casa, propriedades, parentes ou qualquer outro elemento da privacidade de uma pessoa, é importante possuir autorização expressa para evitar que surjam controvérsias que acabem por gerar pedido judicial para impedimento do ato e para indenização por danos decorrentes da exibição não autorizada. Cada pessoa tem direito de determinar os limites de sua privacidade e exigir quesejam respeitados por todos. Para quem atua com segurança da informação como atividade profissional, o conhecimento sobre direitos da personalidade, em especial o direito à privacidade, é fundamental para gerir com eficiência as atividades e adotar medidas preventivas de litígios. O direito à privacidade tem sido bastante discutido na sociedade contemporânea, porque, muitas vezes, são as próprias pessoas que rompem os limites da proteção à privacidade ao utilizar de forma descuidada as redes sociais, expondo fotos que podem gerar comentários ou opiniões pejorativas ou que sejam negativas para a imagem daquela pessoa. O assunto ainda é novo para o mundo jurídico. Por isso, é recomendável ficar sempre atento às decisões dos tribunais que, corriqueiramente, são noticiadas em portais de notícias na internet. Saiba mais O documentário a seguir pode nos ajudar a compreender melhor o que significa a privacidade no mundo contemporâneo: PRIVACIDADE hackeada. Diretores: Karim Amer e Jehane Noujaim. EUA: 2019. 114 minutos. 3.5 Contratos 3.5.1 Histórico e definição Não é exagero afirmar que os contratos são quase tão antigos quanto os homens. Aliás, a vida em sociedade, segundo estudos da ciência política, deve-se a um contrato que os homens concordaram em fazer, o contrato social, que é também o nome de uma das mais importantes obras do filósofo Jean-Jacques Rousseau (ROUSSEAU, 2017), segundo o qual todos abririam mão de parte de sua liberdade para viver em sociedade, obedecendo a deveres, mas com a garantia de direitos e, consequentemente, de segurança. 80 Unidade II Esse contrato fictício – o contrato social – é representado pelo corpo de normas jurídicas que regem a vida em sociedade e que todos nós, gostando ou não, comprometemo-nos a cumprir desde o momento em que nascemos, sob pena de sofrermos sanções. Contratar é, portanto, uma atividade muito antiga e interligada com as atividades da vida humana no ambiente social. Os contratos são tratados no direito privado brasileiro – civil e empresarial – com especial atenção, porque se constituem em uma das formas mais utilizadas para a realização de negócios, sejam aqueles sem fins lucrativos, como a compra de uma casa para que a família tenha sua moradia, sejam aqueles com finalidade lucrativa, como os contratos de prestação de serviços ou de fornecimento de bens para a indústria ou o comércio. Para todos aqueles que atuam em gestão, conhecer os aspectos dos contratos é importante para facilitar as análises e escolhas; mas, para quem atua na área de segurança da informação, os contratos são verdadeiramente essenciais, porque eles são um instrumento necessário para delimitar o serviço que será prestado, seus objetivos e sua forma de realização. Além disso, a existência de um contrato bem feito garante que as informações foram coletadas e tratadas com absoluta consonância de propósitos entre as partes contratantes, assegurando que não existam motivos para conflitos entre elas. A parte especial do Código Civil brasileiro inicia com o direito das obrigações, e uma das modalidades de obrigações são exatamente os contratos, tratados a partir do artigo 421 do texto legal. O professor Flávio Tartuce conceitua: O contrato é um ato jurídico bilateral, dependente de pelo menos duas declarações de vontade, cujo objetivo é a criação, a alteração ou até mesmo a extinção de direitos e deveres de conteúdo patrimonial. Os contratos são, em suma, todos os tipos de convenções ou estipulações que possam ser criadas pelo acordo de vontades e por outros fatores acessórios. Dentro desse contexto, o contrato é um ato jurídico em sentido amplo, em que há o elemento norteador da vontade humana que pretende um objetivo de cunho patrimonial (ato jurígeno); constitui um negócio jurídico por excelência. Para existir um contrato, seu objeto ou conteúdo deve ser lícito, não podendo contrariar o ordenamento jurídico, a boa-fé, a sua função social e econômica e os bons costumes. [...] em uma visão clássica ou moderna, o contrato pode ser conceituado como um negócio jurídico bilateral ou plurilateral que visa à criação, modificação ou extinção de direitos e deveres com conteúdo patrimonial (TARTUCE, 2019, p. 1). Como o Código Civil brasileiro não definiu contratos, a doutrina, como fonte do direito, cuidou de fazer isso por intermédio de vários estudiosos do tema. Essa definição de Flávio Tartuce é uma contribuição didática e objetiva para a compreensão dos contratos. 81 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO O doutrinador Washington de Barros Monteiro define contrato como “o acordo de vontades que tem por fim criar, modificar ou extinguir um direito” (MONTEIRO, 2003, p. 5). Vamos imaginar que Pedro faz um contrato de compra e venda, por meio do qual transfere a propriedade de sua casa para João, mediante o pagamento de quantia no valor de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais). Ao receber o pagamento e dar a quitação, Pedro terá também que entregar o imóvel, e isso cria para João um direito que ele não tinha, ou seja, de ter a propriedade do imóvel que comprou e pagou. Ao mesmo tempo, o contrato extingue para Pedro o direito de propriedade, pois, após receber o pagamento, ele não poderá mais exercer esse direito. E se João, após comprar o imóvel residencial, resolver alugar para Paulo? Nesse caso, será feito um contrato de locação que vai modificar a relação de João com o imóvel, porque ele continuará sendo o proprietário, porém não poderá mais utilizar o imóvel, ou seja, não poderá ter a posse direta do bem, já que esse direito foi transferido para Paulo, que agora é o locatário do imóvel. 3.5.2 Classificação A classificação dos contratos cumpre o objetivo didático de permitir que conheçamos os diversos tipos possíveis de contrato. Em regra, cada doutrinador de direito civil pode escolher ou organizar a classificação que desejar, desde que justifique os itens que a compõem. Por essa razão, é possível encontrar classificações diferentes, mas, em geral, os autores classificam os contratos da seguinte forma: • Quanto aos direitos e deveres das partes: — Contratos unilaterais: são aqueles em que apenas um dos contratantes assume deveres perante o outro, como o contrato de doação, em que apenas o doador do bem assume dever perante o donatário (pessoa que recebe o bem que foi doado). — Contratos bilaterais: são aqueles em que os contratantes assumem deveres um em relação ao outro e têm direitos um em relação ao outro. Por exemplo, o contrato de compra e venda, em que o comprador assume o dever de pagar o valor do objeto do contrato, e o vendedor assume o dever de entregar o objeto. Ao mesmo tempo, o comprador assume o direito de receber o imóvel para utilizar, e o vendedor assume o direito de receber o valor em dinheiro referente à transação. — Contratos plurilaterais: são aqueles que envolvem várias pessoas, e todos assumem direitos e deveres na mesma proporção. É o caso do contrato social de constituição de uma empresa, em que todos os sócios assumem deveres para a consecução da atividade empresarial e têm direitos sobre os resultados que a sociedade empresarial obtiver, inclusive sobre o patrimônio dela em caso de dissolução da sociedade. • Quanto ao impacto patrimonial para as partes: — Contratos onerosos: são aqueles dos quais surgem vantagens para ambas as partes, mas também deveres de caráter econômico. Aqui também a compra e venda é o melhor exemplo, porque ambas as partes terão ganhos (dinheiro e imóvel), mas igualmente terão dispêndio 82 Unidade II (pagar em dinheiro e entregar o imóvel de seu patrimônio). Os contratos onerosos quase sempre são bilaterais. — Contratos gratuitos: são aqueles que geram vantagens econômicas para apenas uma das partes contratantes, e a outra somente tem deveres. Novamente, aqui, o exemplo da doação é aplicável, porque o donatário não tem dever, apenas o direito de receber o bem doado; o doador, por sua vez, é o único que tem obrigação(entregar o bem doado) e mudança no patrimônio (ficará sem o bem doado). Os contratos gratuitos quase sempre são unilaterais. • Quanto ao momento de aperfeiçoamento dos contratos: — Contratos consensuais: são aqueles em que o negócio se aperfeiçoa pela simples manifestação da vontade das partes, expressa quase sempre com a assinatura do contrato. Exemplo: o contrato de locação, que se considera perfeito no momento que as partes assinam o termo que define o bem alugado, o prazo de locação, o valor e a forma de pagamento. — Contratos reais: aqueles que apenas se concretizam com a entrega da coisa objeto do contrato. Exemplo: o contrato de depósito, que somente se realiza quando o valor é depositado na conta corrente do devedor. A partir do depósito, o devedor terá o dever de efetuar o pagamento do valor em conformidade com o que tiver sido definido no contrato, mas, até receber o depósito, o devedor não tinha obrigação alguma derivada do contrato. • Quanto aos riscos assumidos: — Contratos comutativos: nestes contratos, as prestações são certas, determinadas, não há o fator risco, e as partes sabem quais são seus deveres e direitos. — Contratos aleatórios: são contratos nos quais o dever assumido por uma das partes é incerto, não se sabe se vai ou não ocorrer. Álea significa risco, e, nesses casos, o contrato envolve uma possibilidade de risco que pode ocorrer ou não. Exemplo: no contrato de seguro de automóvel, o segurador só terá que despender valores de indenização caso ocorra o risco, que pode ser de colisão, incêndio, furto ou roubo do veículo. Para o segurado, o dever de pagar o valor do seguro existe independentemente de ocorrer ou não o risco; para o segurador, só haverá a obrigação de pagar se o risco ocorrer. • Quanto à negociação entre as partes: — Contratos paritários: são aqueles cujas cláusulas são negociadas entre as partes. Exemplo: contrato de prestação de serviços de informática. — Contratos de adesão: são aqueles em que uma parte redige um contrato padrão, que deverá ser aceito ou recusado integralmente pela parte contratante, a qual não terá direito a modificar cláusulas já existentes. Exemplo: contrato de prestação de serviços de TV por assinatura ou de fornecimento de sinal para internet. 83 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Essas são algumas classificações possíveis para contratos. Existem outras que também podem ser utilizadas, a depender das escolhas do estudioso sobre o tema. 3.5.3 Princípios Assim como a classificação, podem ser estudados diferentes princípios aplicáveis aos contratos. Em geral, os doutrinadores consideram que os princípios mais importantes aplicados aos contratos são: • Princípio da autonomia privada: as partes têm liberdade para contratar, embora, como sabemos, a liberdade para quem vive em sociedade, como nós, é sempre relativa e deve respeitar os limites do interesse público. Apesar desse limite, a vontade das partes é um elemento essencial dos contratos, tanto para definir o objeto quanto as pessoas que contratam. • Princípio da função social do contrato: decorre do princípio constitucional da função social da propriedade e significa que, no contrato, as partes deverão estar em uma relação equilibrada, de respeito à igualdade existente entre elas e com justiça contratual. Em outras palavras, os contratos não podem ser instrumentos para prejudicar pessoas, porque isso seria negativo para toda a sociedade. A função social consiste em respeitar, no contrato, os valores sociais que uma sociedade preserva e cultiva como representação ética. • Princípio da boa-fé objetiva: significa que as partes devem agir, no contrato, umas em relação às outras com veracidade, transparência, colaboração mútua, ou, em uma palavra, devem ser honestas. • Princípio da obrigatoriedade: em latim, esse princípio é expresso pelas palavras pacta sunt servanda, muito conhecido entre os estudiosos de direito. Representa que o contrato se torna obrigatório para as partes ou, mais comumente, como se repete, o contrato faz lei entre as partes. Essa obrigatoriedade do cumprimento torna os contratos instrumentos confiáveis, mas é preciso ponderar que só haverá obrigatoriedade se estiver presente o equilíbrio nas relações contratuais. Se um contrato expressar relação desequilibrada, em que apenas a parte economicamente mais forte tem benefícios, ele não será obrigatório para a parte mais vulnerável, que poderá requerer que o contrato seja revisto nas cláusulas que criaram o desequilíbrio. • Princípio da relatividade dos efeitos contratuais: os contratos geram efeitos apenas para as partes contratantes, e ninguém pode firmar um contrato para criar obrigações para outras pessoas que não estão assinando aquele contrato. Por outro lado, é possível estabelecer contratos que gerem benefícios para terceiros que não constam na relação contratual, como acontece, corriqueiramente, nos contratos de seguro de vida firmados entre um segurado e um segurador e cujo pagamento da indenização será feito para terceiro em caso de morte do segurado. 3.5.4 Extinção dos contratos Os contratos se extinguem por diferentes motivos. O primeiro deles com certeza é o cumprimento integral, quando as partes não possuem mais nenhuma vinculação uma com a outra. Por exemplo: no contrato de compra e venda, quando as partes efetuam o pagamento e entregam o bem objeto 84 Unidade II do contrato, não há mais nada para ser feito, e o contrato se extingue de forma normal, por ter sido encerrado seu ciclo de existência. No entanto, existem pelo menos mais três bons motivos para a extinção dos contratos, que são: • Resolução: quando ocorre o descumprimento de cláusula contratual e a permanência se torna impossível, como acontece na falta de pagamento do contrato de locação ou do contrato de prestação de serviços com pagamentos mensais. • Resilição: é o mesmo que distrato entre as partes que não desejam mais continuar contratando. • Extinção por morte: tem especial relevância nos contratos em que a pessoa contratada tem especial importância; por isso, são chamados de contratos personalíssimos. Por exemplo: a pessoa contrata um advogado que foi muito bem indicado para aquele tipo de serviço que terá que ser realizado, e, se ele vem a falecer durante o período de contratação, a parte contratante não tem interesse em prosseguir com outro advogado do mesmo escritório, porque confiava somente naquele profissional. O contrato será extinto, e o contratante poderá procurar outro profissional de sua preferência para dar continuidade ao serviço. Se o contrato não for personalíssimo, a morte pode não impactar, porque os sucessores do falecido tomam seu lugar no polo contratual, como acontece nos contratos de locação, em que os sucessores legitimados passam a receber os valores do pagamento de aluguéis e o contrato não precisa ser extinto. 3.5.5 Contratos e segurança da informação Na atividade empresarial de segurança da informação, é comum que as partes firmem contratos umas com as outras, principalmente para contratação de serviços, para compra de equipamentos e de sistemas de informação e segurança, entre outras razões. Os contratos é que vão definir os direitos e deveres das partes contratantes e, por isso, devem ser redigidos com clareza, objetividade e atenção adequadas para que atendam corretamente à vontade das partes. Contratos de prestação de serviços, de locação ou compra de equipamentos e sistemas são contratos bilaterais que fixarão direitos e deveres para ambas as partes contratantes, sejam elas pessoas naturais, sejam jurídicas. Por maior que seja a necessidade de contratar ou a pressa de colocar a prestação de serviços para funcionar, ou os equipamentos e sistemas em operação, é essencial para a segurança da atividade que os contratos sejam bem redigidos, lidos e relidos várias vezes, para que todos tenham completa compreensão de suas cláusulas e, consequentemente, dos direitos e deveres que estão assumindona relação contratual. Solucionar conflitos contratuais no poder judiciário é sempre demorado, oneroso e desgastante para as partes. Por isso, despender um pouco mais de tempo na redação, análise e compreensão dos contratos é sempre preferível. 85 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Também é fortemente recomendável que as partes estejam acompanhadas por um profissional da área de direito com experiência em contratos, que conheça as atividades de segurança da informação, que redija cláusulas estritamente em conformidade com a vontade das partes e, principalmente, que tenha a confiança dos contratantes. São cuidados que, no momento da contratação, podem parecer excessivos, mas que, ao longo do tempo de vigência do contrato, vão mostrar sua importância, principalmente se as cláusulas estiverem claramente redigidas e evitarem conflitos entre os contratantes. 3.6 Responsabilidade civil A responsabilidade civil é um dos temas mais atuais do Código Civil brasileiro e é recorrente quando se trata de segurança de informação, porque é sabido que atos praticados nessa atividade podem gerar danos de grandes proporções para empresas e pessoas naturais. Vamos imaginar que, por falta de segurança no sistema de informação, uma empresa é vítima de sequestro de dados e fica durante vários dias impossibilitada de trabalhar, como pode acontecer com uma farmácia ou uma padaria. De fato, os produtos têm um código de barras com o preço que é lido no caixa, o estoque também é controlado pelo sistema, e até o horário de entrada e saída do pessoal, é controlado por ponto eletrônico. Sem a operação do sistema, não é possível abrir o estabelecimento para que ele possa funcionar. Se ficar constatada que a falha no sistema é decorrente da prestação de serviços, por falta de cumprimento de qualquer um dos deveres que eram inerentes a essa atividade, o prestador de serviços deverá indenizar os danos, tanto patrimoniais quanto extrapatrimoniais. A responsabilidade civil é decorrente da falta de cumprimento de uma obrigação contratual ou legal, cuja consequência é a produção de um dano que deverá ser indenizado por aquele que não cumpriu a obrigação ou deixou de cumpri-la de forma adequada. Obrigação e responsabilidade caminham juntas. Por isso, o professor Sérgio Cavalieri Filho ensina: Obrigação é sempre um dever jurídico originário; responsabilidade é um dever jurídico sucessivo, consequente à violação do primeiro. [...] em toda a obrigação há um dever jurídico originário, enquanto na responsabilidade há um dever jurídico sucessivo. Daí a feliz imagem de Larenz ao dizer que “ a responsabilidade é a sombra da obrigação”. Assim como não há sombra sem corpo físico, também não há responsabilidade sem a correspondente obrigação. Sempre que quisermos saber quem é o responsável teremos que identificar aquele a quem a lei imputou a obrigação, porque ninguém poderá ser responsabilizado por nada sem ter violado o dever jurídico preexistente. [...] 86 Unidade II Sem violação de um dever jurídico preexistente, portanto, não há que se falar em responsabilidade em qualquer modalidade, porque esta é um dever sucessivo daquele decorrente (CAVALIERI, 2015, p. 16). O dever jurídico que gera a responsabilidade pode ser decorrente do cumprimento de um contrato ou de uma lei. Em ambos os casos, o não cumprimento da obrigação vai gerar danos e, consequentemente, o dever de indenizar, que caberá àquele que era o responsável pelo cumprimento da obrigação. Imagine que o empregado está trafegando pela rua com o carro da empresa e colide contra um poste de energia elétrica, provocando a interrupção da energia naquele quarteirão. O acidente ocorreu porque o condutor do veículo estava em alta velocidade, muito acima do que era permitido no local, não teve tempo de frear quando passou em uma lombada e perdeu a direção, vindo a colidir com o poste, que caiu em consequência do impacto e interrompeu a energia elétrica em toda a quadra. O bairro tem forte presença de empresas como restaurantes, consultórios médicos, padarias, bares, escritórios, e todos ficaram sem energia elétrica por muitas horas, até que a empresa fornecedora conseguisse erguer o poste e restabelecer o fornecimento. Qual era a obrigação do condutor do veículo? A obrigação legal de trafegar na via em velocidade permitida e com atenção. Descumprida essa obrigação, ocorreu um acidente que causou danos de monta. Por isso, caberá ao condutor o dever de indenizar os danos decorrentes de seu ato de descumprimento da obrigação legal de guiar de forma segura e prudente. E a empresa proprietária do veículo tem responsabilidade? A pergunta que devemos fazer é: a empresa tinha alguma obrigação a cumprir? A resposta é positiva. A obrigação da empresa era entregar o veículo a um motorista habilitado e comprometido com o cumprimento correto das regras de trânsito. O artigo 186 do Código Civil determina expressamente que: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar prejuízo a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito” (BRASIL, 2002). No artigo 927, que inaugura o título da Responsabilidade Civil no Código Civil, está determinado que: Art. 927 – Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para direitos de outrem (BRASIL, 2002). Esses dois artigos contêm muitas informações importantes e precisam ser analisados detalhadamente. Em primeiro lugar, vamos compreender o que é um ato ilícito, como aquele definido no artigo 186. 87 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Na suscinta definição de Silvio de Salvo Venosa, “o ato ilícito traduz-se em um comportamento voluntário que transgride um dever” (VENOSA, 2013, p. 22). Assim, o ato ilícito é praticado a partir da vontade do agente ou de sua omissão igualmente voluntária, mas nem sempre se pode afirmar que tenha sido doloso, ou seja, com a intenção de obter o resultado danoso. Culpa, também na explicação clara de Venosa, é “a inobservância de um dever que o agende devia conhecer e observar. Não podemos afastar da noção de culpa o conceito de dever” (VENOSA, 2013, p. 23). E Cavalieri Filho define a culpa “como conduta voluntária, contrária ao dever de cuidado imposto pelo Direito, com a produção de um evento danoso involuntário, porém previsto ou imprevisível” (CAVALIERI, 2015, p. 39). Com esses conceitos, já é mais fácil entender em quais situações agimos com culpa. Retomemos o exemplo do funcionário que guiava o veículo da empresa em velocidade superior à permitida no local e colidiu com o poste, provocando a interrupção do fornecimento de energia elétrica em toda a área. Observe que a conduta esperada de um motorista era trafegar em velocidade permitida naquela rua e com atenção a tudo que pudesse causar um problema, como a existência de uma lombada, um pedestre desatento, um cachorro correndo ou uma criança que escapasse dos cuidados dos pais. Esses cuidados são o mínimo que se espera de um motorista diligente, que conduz seu veículo com respeito às normas de trânsito e com responsabilidade. O resultado obtido com a conduta – derrubar o poste e interromper o fornecimento de energia elétrica – não era pretendido pelo condutor do veículo, mas, de forma voluntária, ele decidiu imprimir velocidade excessiva, guiar de forma desatenta e, portanto, correr o risco de causar um dano, como de fato causou. A vontade do agente está no ato ilícito praticado ou em uma omissão, mas não no resultado que não era intencionado. Para que se caracterize a culpa, é preciso que o ato ou a omissão seja voluntária, e não o resultado. E, para que se caracterize o dolo, é preciso que o ato seja voluntário e o resultado desejadopelo agente que pratica o ato. É o caso típico do homicídio em que o agente, por sua livre vontade, toma em suas mãos a arma e atira contra a pessoa que deseja matar. Esse é um ato doloso. O ato culposo tem o elemento de vontade para a prática do ato ilícito, porém o resultado danoso não é desejado. O ato culposo, como vimos no artigo 186, caracteriza-se pela ação ou pela omissão. A omissão pode ser voluntária? Sim, sempre é. Imagine que o responsável por uma área de segurança da informação tem o dever de checar informações no sistema operacional de um cliente a cada duas horas, especialmente para verificar se os pagamentos que a empresa tem que realizar estão sendo normalmente realizados. O funcionário se omite na verificação porque prefere ficar jogando no seu celular e deixa de realizar a verificação durante um período de seis horas. Quando retorna à verificação, detecta que houve um problema no sistema e, exatamente há cinco horas, nenhum pagamento é feito. Isso gerou uma pane no sistema, o que vai provocar perdas financeiras significativas, porque os pagamentos atrasados vão gerar incidência de multa e de juros. A omissão do funcionário foi voluntária; 88 Unidade II ele deixou de monitorar o sistema, como era seu dever, embora em nenhum momento ele pretendesse, com essa omissão, gerar qualquer tipo de dano para o cliente. Podemos resumir da forma a seguir: Responsabilidade civil Culpa Ato de vontade ilícito sem intenção de causar dano Omissão ilícita sem intenção de causar dano Dolo Ato ilícito com intenção de causar dano Figura 8 Embora não tenha essa intenção, a ação ou omissão ilícita culposa pode causar dano, e, como consequência, haverá responsabilidade de indenizar os danos comprovadamente decorrentes. O ato doloso sempre contém a vontade de causar danos e, assim, gera o dever de indenizar os danos causados. A culpa pode ser classificada em culpa contratual ou extracontratual. Ambas as modalidades são relevantes para a área de segurança da informação, porque podem ocorrer no cotidiano das práticas de serviços desse setor. A culpa contratual é aquela que decorre da falta de cumprimento dos deveres contraídos em decorrência de um contrato pactuado entre partes. Por exemplo: um contrato de prestação de serviços que obriga o prestador a comparecer duas vezes por semana para fazer a manutenção em equipamentos de tecnologia da informação do contratante. Por negligência, o prestador de serviços deixa de comparecer para realizar as tarefas de manutenção, e, em decorrência disso (nexo de causalidade), o equipamento tem um superaquecimento e fica danificado. Quem é o responsável? Quem deve pagar pela reparação dos danos, inclusive adquirindo um novo equipamento no caso de não ser possível consertar aquele que teve problemas? O prestador de serviços, que não cumpriu os deveres assumidos no contrato firmado com o cliente. A culpa extracontratual é aquela que decorre de atos praticados no cotidiano da vida em sociedade e que pode surgir de: um acidente de trânsito; uma conduta imprudente no condomínio (lançar um objeto pela janela e machucar um pessoa ou danificar um veículo que está estacionado); um ato praticado no trabalho (atingir um colega com uma ferramenta que escapou de suas mãos ou derrubar café quente em um equipamento eletrônico, que deixa de funcionar em razão disso); ou seja, a responsabilidade extracontratual decorre dos fatos corriqueiros da vida em sociedade. 89 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO Em qualquer hipótese, haverá a obrigação de indenizar. É o que se pode concluir da leitura do artigo 927 do Código Civil. O professor Anderson Schreiber, ao analisar o artigo 186 do Código Civil, ensina: Ato ilícito é o ato humano voluntário (ação ou omissão) que, violando a ordem jurídica, causa dano a outrem. O ato ilícito pode, assim, ser decomposto em três elementos, a saber: a) conduta culposa (culpa ou dolo) do agente; b) dano; e, c) nexo de causalidade entre a conduta culposa e o dano (SCHREIBER, 2019, p. 113). Estudamos, então, a culpa ou o dolo empregados para o ato danoso. Agora, vamos compreender esses dois novos elementos: o dano e o nexo de causalidade. Nexo de causalidade, segundo o professor Schreiber, é: [...] o elemento que liga a conduta culposa do agente ao dano sofrido pela vítima. Para que surja o dever de indenizar, é preciso que o dano verificado consista em uma consequência da ação ou omissão do agente” (SCHREIBER, 2019, p. 113). Assim, para que se caracterize o dever de indenizar, é preciso que, entre a conduta e o dano, exista um elo, um vínculo ou um nexo de causalidade. Ato culposo Nexo de causalidade Dano+ = Figura 9 Nessa situação representada pela figura anterior, estamos diante do conceito de responsabilidade civil subjetiva, aquela na qual é preciso que a vítima prove que houve um ato culposo, um dano (material e/ou moral) e o nexo de causalidade, ou seja, o vínculo entre o ato e o dano. É o que ocorre na maior parte das vezes quando sofremos algum tipo de dano decorrente do ato ilícito praticado por outra pessoa. Tratamos de ir atrás de provas – testemunhais, periciais ou documentais – por meio das quais possamos demonstrar a conduta culposa, os danos dela decorrentes e como estes são decorrentes da conduta (nexo de causalidade). Por exemplo: você compra um celular e coloca para carregar na tomada, exatamente como determina o manual do proprietário. Alguns minutos depois, a bateria do celular explode, provoca fagulhas, que chegam na colcha da cama, e rapidamente o fogo se alastra para todo o quarto. Desse fato, resultam 90 Unidade II prejuízos materiais e morais, porque você e sua família levaram um grande susto com toda essa situação provocada pela explosão da bateria do celular. Você reúne provas para demonstrar que seus prejuízos decorreram da explosão da bateria do celular, que, por ação ou omissão do fabricante, tinha um defeito. Cabe à vítima ou às vítimas do ato que provoca o dano provar que tudo aconteceu e qual a extensão dos danos que resultaram. Existem casos, no entanto, em que essa prova é bem difícil, e a evolução do direito acabou por adotar a responsabilidade objetiva, como nos ensina Cavalieri: Foi no campo dos acidentes de trabalho que a noção de culpa, como fundamento da responsabilidade, revelou-se primeiramente insuficiente. Na medida em que a produção passou a ser mecanizada, aumentou vertiginosamente o número de acidentes, não só em razão do despreparo dos operários, mas, também, e principalmente, pelo empirismo das máquinas então utilizadas, expondo os trabalhadores a grandes riscos. O operário ficava desamparado diante da dificuldade – não raro impossibilidade – de provar a culpa do patrão. A injustiça que esse desamparo representava estava a exigir uma revisão do fundamento da responsabilidade civil. Algo idêntico ocorreu com os transportes coletivos, principalmente trens, na medida em que foram surgindo. Os acidentes multiplicaram-se, deixando as vítimas em situação de desvantagem. Como iriam provar a culpa do transportador por um acidente ocorrido há centenas de quilômetros de casa, em condições desconhecidas para vítimas ou seus familiares? Logo os jurista perceberam que a teoria subjetiva não era mais suficiente para atender a essa transformação social (que vinha ocorrendo a partir da segunda metade do século XIX); constataram que, se a vítima tivesse que provar a culpa do causador do dano, em numerosíssimos casos ficaria sem indenização, ao desamparo, dando causa a outros problemas sociais, porquanto, para quem vive de seu trabalho, o acidente corporal significa a miséria, impondo-se organizar a reparação (CAVALIERI, 2015, p. 214). De fato, o mundo da produção industrial e, atualmente, da sociedade de informação tecnológica e de inovação provocou uma sensível e necessária mudança nas relações de responsabilidade. Vivemos o que Ulrich Beck denominou de sociedade de risco, na qual a produçãode produtos e serviços destinados ao mercado de consumo, assim como os meios de transporte, os medicamentos, os alimentos e a própria organização da sociedade, representam continuamente algum tipo de risco para a humanidade (BECK, 2011). O direito criou várias teorias para explicar esse momento da vida em sociedade, entre elas a teoria do risco, a teoria do risco proveito (aquele que tira proveito da atividade danosa deve indenizar), a teoria do risco profissional (dever de indenizar de quem obriga outrem a trabalhar com risco), a teoria do risco criado (aquele que em razão de sua atividade ou profissão cria um risco deve arcar com os danos 91 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO consequentes) e a teoria do risco integral (todos os danos diretos e indiretos que tenham relação com o risco devem ser indenizados). Se, por um lado, essas teorias e sua aplicabilidade aos casos concretos têm sido discutidas intensamente entre os juristas, por outro lado, a responsabilidade objetiva ganhou mais espaço para a aplicação no Código Civil de 2002 e, na atualidade, já é aplicada pelo poder judiciário com muito mais frequência do que no passado. É Cavalieri, novamente, quem nos ensina: Risco é perigo, é probabilidade de dano, importando, isso, dizer que aquele que exerce uma atividade perigosa deve-lhe assumir os riscos e reparar o dano dela decorrente. A doutrina do risco pode ser, então, assim resumida: todo prejuízo deve ser atribuído ao seu autor e reparado por quem o causou, independentemente de ter ou não agido com culpa. Resolve-se o problema na relação de causalidade, dispensável qualquer juízo de valor sobre a culpa do responsável, que é aquele que materialmente causou o dano. Na responsabilidade objetiva é irrelevante o nexo psicológico entre o fato ou a atividade e a vontade de quem a pratica, bem como o juízo de censura moral ou de aprovação da conduta (CAVALIERI, 2015, p. 215). Os artigos 931 e 932 do Código Civil caracterizam com perfeição as hipóteses de responsabilidade objetiva ou responsabilidade sem culpa, como também é chamada. Veja a seguir: Art. 931 – Ressalvados os casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação. Art. 932 – São também responsáveis pela reparação civil: I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; II – o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições; III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele; IV – os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos; V – os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia (BRASIL, 2002). 92 Unidade II E o artigo 933 determina: “As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelo ato praticado pelos terceiros ali referidos” (BRASIL, 2002). São hipóteses legais claras de responsabilidade objetiva, ou seja, a responsabilidade decorre do simples fato de ser empresário individual ou empresa que coloque produtos no mercado (art. 931) ou do fato de ser um dos responsáveis por terceiros (incisos I, II, III e IV do art. 932). A hipótese do inciso IV é bem mais específica, embora possa ser aplicável a empresários quando adquirem para revenda ou utilização o produto de crime (máquinas e equipamentos furtados, roubados ou contrabandeados). O artigo 932 (BRASIL, 2002) caracteriza a responsabilidade civil por fato de terceiro e a considera objetiva, ou seja, não há que se discutir a existência ou não do elemento culpa, mas simplesmente a relação do causador (filho, tutelado ou curatelado, empregado ou hóspede) com o responsável, para que se materialize o dever de indenizar. É preciso ressaltar que as duas modalidades de responsabilidade, subjetiva (aquela em que é preciso demonstrar a culpa por ação ou omissão voluntária) e objetiva (na qual não se discute o elemento culpa), não prescindem do elemento nexo de causalidade. Assim, em todos os casos concretos, será preciso provar que, entre o fato e o dano, existe um elo, um liame, denominado nexo de causalidade. Figura 10 O nexo de causalidade é, na definição de Cavalieri: Não basta, portanto, que o agente tenha praticado uma conduta ilícita; tampouco que a vítima tenha sofrido um dano. É preciso que esse dano tenha sido causado pela conduta ilícita do agente, que exista entre ambos uma necessária relação de causa e efeito. Em síntese, é necessário que o ato ilícito seja a causa do dano, que o prejuízo sofrido pela vítima seja resultado desse ato, sem o que a responsabilidade não correrá a cargo do autor material do fato. Daí a relevância do chamado nexo causal. Cuida-se, 93 LEIS, POLÍTICAS E NORMAS DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO então, de saber quando um determinado resultado é imputável ao agente; que relação deve existir entre o dano e o fato para que este, sob a ótica do Direito, possa ser considerado causa daquele (CAVALIERI, 2015, p. 66). Vamos analisar esse conceito à luz dos exemplos que vimos anteriormente. No primeiro caso, o empregado guiava o veículo com velocidade acima do limite permitido para o local, passou em uma lombada, perdeu a direção do veículo e colidiu com um posto. O poste veio abaixo e derrubou toda a transmissão de energia elétrica na área, provocando a paralisação da atividade empresarial ali instalada. Há nexo de causalidade entre a conduta do agente (motorista) e os danos das empresas (paralisação da atividade por falta de energia elétrica)? No segundo caso, o empregado da empresa de segurança da informação tinha que monitorar o processo de pagamento do sistema de um cliente a cada duas horas, mas deixou de fazê-lo porque estava distraído com um jogo do seu celular. Deixou de monitorar o fluxo e não percebeu que havia um problema, o que fez com que os pagamentos deixassem de ser feitos e o sistema paralisasse por completo, gerando atraso de pagamento e incidência de juros e multa. Há nexo de causalidade entre o fato (falta de atenção no monitoramento) e os danos (atraso nos pagamentos)? A resposta é sim para os dois casos apresentados. É bastante evidente que o nexo de causalidade existe e que os fatos foram os únicos responsáveis pelos danos decorrentes. Não seria assim se, no primeiro exemplo, o poste tivesse caído em decorrência da trepidação do solo em razão do carro haver passado no local em alta velocidade. O condutor teria praticado um ilícito, mas sem responsabilidade pela queda do poste, porque o choque não teria ocorrido. Também não seria assim se, no segundo exemplo, um lote de pagamentos não tivesse sido feito porque o funcionário do cliente não lançou esses pagamentos no sistema. O fato de o sistema ter tido problema e paralisado não seria o responsável por esses pagamentos não realizados, porque esses pagamentos não haviam sido lançados. Assim, o nexo de causalidade precisa ser analisado em todos os casos concretos de responsabilidade civil, para que esteja claro que foi aquele fato determinado (culpa ou dolo por ação ou omissão) que causou os danos (materiais ou morais) que precisam ser indenizados. O outro elemento que precisamos analisar é o dano. Silvio de Salvo Venosa ensina: Somente haverá possibilidade de indenização se o ato ilícito ocasionar dano. [...] O dano ou interesse deve ser atual e certo; não sendo indenizáveis, a princípio, danos hipotéticos. Sem dano ou sem interesse violado, patrimonial ou moral, não se corporifica a indenização. A materialização do dano ocorre com a definição do efetivo prejuízo suportado pela vítima (VENOSA, 2013, p. 28). O Código Civil brasileiro, no artigo 944, determina que a indenização se mede
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