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Leve um e pague dois: 
 inusitadas conseqüências jurídicas da desvalorização monetária. 
Relato da revisão dos contratos de arrendamento mercantil indexados ao dólar*1 
 
 
 
 
 
 
 
*
 Este caso foi produzido no ano de 2007 por Maria Paula Bertran, mestre e doutoranda em Direito na Universidade de 
São Paulo, com a colaboração de André Rodrigues Corrêa, professor da DIREITO GV, e integra a segunda rodada de 
casos da “Casoteca Latino-americana de Direito e Política Pública” (www.direitogv.com.br/casoteca). 
O financiamento deste caso foi propiciado por acordo de cooperação técnica celebrado entre o Banco Interamericano de 
Desenvolvimento – BID e a Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas – FGV/EDESP. 
O projeto da Casoteca tem três objetivos: (i) fornecer um acervo de casos didáticos sobre direito e política pública na 
América Latina; (ii) estimular a produção contínua de novos casos por meio do financiamento de pesquisa empírica; 
(iii) provocar o debate sobre a aplicação do “método do caso” como uma proposta inovadora de ensino. Os casos 
consistem em relatos de situações-problema reais, produzidas a partir de investigação empírica e voltadas para o ensino. 
Evidentemente, não comportam uma única solução correta. 
A Casoteca permite uso aberto e gratuito de seu conteúdo, que é protegido por uma licença Creative Commons 
(Atribuição-Uso Não-Comercial-Compartilhamento pela mesma Licença 2.5 Brasil). A licença pode ser acessada 
através do link: http://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/2.5/br/. 
1
 A redação deste caso foi inspirada nas conclusões obtidas na dissertação de mestrado da autora, intitulada “Análise 
Economica como Critério Orientador da Decisão Judicial: Aplicações e Limites. Estudo a partir do caso de revisão dos 
contratos de arrendamento mercantil com paridade cambial”, defendida na Faculdade de Direito da Universidade de São 
Paulo, em outubro de 2006. Reforça-se nessa oportunidade os agradecimentos não só aos que foram imprescindíveis 
para aquele trabalho, como também aos que foram tão prestativos na empreitada de elaboração deste caso. Muito 
obrigada ao Professor Ronaldo Porto Macedo Jr., pela orientação no mestrado e na redação do caso, ao Professor André 
Correia e a Mário Schapiro, pela orientação da redação do caso, à Fundação Getúlio Vargas, à Fundação de Amparo à 
Pesquisa do Estado de S. Paulo - FAPESP e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior do 
Ministério da Educação – CAPES, (através da Bolsa de Excelência Acadêmica), aos executivos das firmas 
entrevistadas, ao Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de S. Paulo – IME/USP e ao Centro de 
Estatística Aplicada - CEA, através dos Professores de Estatística Clélia Maria de Castro Toloi, Sérgio Wechsler, 
Cláudia Monteiro Peixoto, Carlos Alberto de Bragança Pereira, Gilberto Alvarenga Paula, de Elaine Fischer Bosco, dos 
estatísticos Edilene Freire Nascimento Gomes, Karen Elisa do Vale Nogueira, Davi Kobayashi Colombo, Fernando 
Vieira Bonassi e Luis Gabriel Marques Reginato. Agradecimentos ainda a Henrique Vincetim Lisboa, aos Professores 
Décio Zylbersztajn, Celso Campilongo, José Eduardo Faria, Francisco Satiro e Diogo Coutinho. A João Frederico 
Bertran Wirth Chaibub, Alberto A. Muñoz, Leandro Varison, Christiane Leles, Christian Rosa e Catarina Barbieri. 
 
 
2 
REVISÃO DE JURISPRUDÊNCIA 
 
 
 
Em janeiro de 1999 a moeda nacional desvalorizou-se abruptamente em relação ao dólar, 
após alguns anos de estabilidade promovida pela instituição de intervenção estatal no controle do 
câmbio. Os contratos que previam reajuste acorde à variação cambial tiveram suas parcelas, em 
poucas semanas, quase duplicadas nos seus valores em reais. A reação dos contratantes de 
arrendamento mercantil2, destacadamente a dos consumidores que buscavam adquirir veículos de 
passeio, mas também de empresas e outras pessoas jurídicas, que adquiriam variados bens de 
produção, foi a de pleitear a revisão desses contratos. Formou-se, assim, tanto na história das 
negociações empresariais brasileiras, quanto na história da jurisprudência brasileira de revisão 
judicial de contratos, um de seus mais importantes e acalorados casos. 
 
1. RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA 
1.1 Os contratos de arrendamento mercantil 
 
O arrendamento mercantil é definido pela Lei 6.099, de 1974 como “o negócio jurídico 
realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na 
qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela 
arrendadora, segundo especificações da arrendatária, e para uso próprio desta”3. 
 
A doutrina o define como um contrato complexo. Congrega aspectos de locação e, 
facultativamente, aspectos de compra e venda. Seu funcionamento é basicamente o seguinte: uma 
empresa ou pessoa natural deseja utilizar determinado equipamento ou mesmo um imóvel. Uma 
empresa de arrendamento mercantil (no Brasil, necessariamente constituída como Sociedade 
Anônima ou atuante através de banco múltiplo com carteira de arrendamento mercantil, deve ainda 
receber tratamento de instituição financeira4), adquire tal bem. Não raro, ocorre que a arrendadora 
seja controlada pelo próprio fabricante dos bens. No caso de fabricante de veículos, por exemplo, 
 
2
 Nomenclatura brasileira para o termo inglês leasing. 
3
 Art. 1º, parágrafo único. 
4
 “sociedades de arrendamento mercantil devem adotar a forma jurídica de sociedades anônimas e a elas se aplicam, no 
que couber, as mesmas condições estabelecidas para o funcionamento de instituições financeiras na Lei 4.595, de 31 de 
dezembro de 1964” – Art. 4º. Da Resolução Banco Central 2.309/96. 
 
3 
dá-se à arrendadora o sugestivo apelido de “Bancos de Quatro Rodas”5. A arrendadora aluga o bem 
para o arrendatário por determinado prazo de tempo. Terminado o prazo de locação, ao arrendatário 
são dadas três opções: a) devolução do bem; b) renovação da locação; c) compra do bem pelo valor 
residual fixado no momento inicial do contrato.6 
 
Duas são as principais modalidades de arrendamento mercantil7. O arrendamento mercantil 
operacional (também chamado industrial ou renting) remonta no Brasil, segundo a doutrina, aos 
anos 19208, “quando indústrias norte-americanas alugavam seus produtos, a fim de assegurar o 
escoamento, e comprometendo-se a fornecer uma prestação de serviços de conservação das 
máquinas.”9 Nessa modalidade de arrendamento mercantil pode-se dizer que o “aluguel” é, em 
certo sentido, mais destacado que a “compra e venda”. Isso ocorre em função de algumas 
características marcantes do arrendamento mercantil operacional: o material poder ser “alugado” 
várias vezes a locatários diversos, a normal prestação de serviços de manutenção da coisa locada, a 
eleição de bens estandardizados, geralmente mantidos em estoque pelo locador e, principalmente, a 
prática de valores mensais que se aproximam de efetivos aluguéis, de modo que o valor de 
aquisição do bem, ao final do período locatício, se aproxima do valor de mercado daquele bem, sem 
significativos abatimentos devidos em função das parcelas de “aluguel” pagas. 
 
O arrendamento mercantil financeiro é a modalidade que mais nos interessa para o relato da 
revisão dos contratos. Nessa modalidade pode-se dizer que a “compra e venda” é mais importante 
que o “aluguel”. Isso faz com que o arrendamento mercantil financeiro seja visto, por vezes, como 
uma especial modalidade de financiamento. 
 
 
Resolução 2.309, de 28 de agosto de 1996 
 
5
 À época da crise dos contratos, havia muitas instituições desse gênero, como a Fiat Leasing S.A e o Banco Ford, por 
exemplo. Em função do processo de concentração das instituições bancárias pelo qual o Brasil passou nos últimos anos, 
muitos foram incorporados por conglomerados econômicos maiores. Subsistem, todavia,vários exemplos de 
instituições financeiras ligadas a fabricantes de bens de consumo e que contêm financeiras autorizadas a operar 
arrendamento mercantil, tais como o Banco IBM, o Banco Toyota, o Banco Honda ou Banco GM. 
6
 Cf. WALD, Arnold. A introdução do leasing no Brasil. RT, 415/10. 
7
 Para outras modalidades, entre as quais lease back, self leasing, societé de paille, lease purchase, operações 
sindicalizadas de leasing, ver FORTUNA, Eduardo. Mercado Financeiro – Produtos e Serviços. 16a. ed., 2006, p. 283 a 
290 e MANCUSO, Rodolfo de Camargo, Leasing, 4ª. Ed., São Paulo, RT, 2002, p. 60 a 75. 
8
 Para uma análise de como a prática negocial por vezes antecede sua regulamentação legal, ver Simpósio Nacional 
sobre Leasing, editado pelo Instituto de Organização Racional do Trabalho – IDORT, São Paulo, 1973, contendo as 
transcrições do evento realizado em tal ano e MANCUSO, Rodolfo Camargo. Leasing, 4ª. Ed., São Paulo, RT, 2002, 
Capítulo 5. 
9
 Revista Forense, 274/16, citado por MANCUSO, Rodolfo Camargo. Leasing, 4ª. Ed., São Paulo, RT, 2002, p. 55. 
 
4 
 
Art. 5º. Considera-se arrendamento mercantil financeiro a modalidade em que: 
I – as contraprestações e demais pagamentos previstos no contrato, devidos pela 
arrendatária, sejam normalmente suficientes para que a arrendadora recupere o custo do 
bem arrendado durante o prazo contratual da operação e, adicionalmente, obtenha um 
retorno sobre os recursos investidos; 
II – as despesas de manutenção, assistência técnica e serviços correlatos a operacionalidade 
do bem arrendado sejam de responsabilidade da arrendatária; 
III – o preço para exercício da opção de compra seja livremente pactuado, podendo ser, 
inclusive, o valor de mercado do bem arrendado. 
 
 Ao final do período de locação, o exercício do direito de aquisição de propriedade do bem 
deve ser manifestado com o depósito do chamado valor residual garantido (VRG), parcela que pode 
variar do preço de mercado do bem a um valor irrisório. Na grande maioria dos contratos de 
arrendamento mercantil de veículos cujas parcelas eram indexadas ao dólar, o VRG contratado era 
um real (R$ 1,00). 
 
O arrendamento mercantil foi originalmente criado e regulamentado para que os 
arrendatários fossem empresas. Em 198310 viabilizou-se sua adoção para pessoas naturais. Todavia, 
ainda que permitido havia mais de uma década, os contratantes pessoas naturais eram praticamente 
inexistentes até meados dos anos 9011. 
 
De fato, as maiores utilidades do arrendamento mercantil não eram para as pessoas naturais, 
mas para as pessoas jurídicas. As principais vantagens, de natureza contábil e tributária. 
Contabilmente, o prazo de operação é compatível com prazo de amortização econômica do bem. 
Com o arrendamento mercantil as corporações liberam capital de giro, pois não têm que despender 
à vista os valores para aquisição de seus bens de capital. Entre os aspectos tributários, apontam-se a 
economia do imposto de renda (através da dedução proporcionada pelo pagamento de aluguéis e da 
não imobilização de equipamento) e as vantagens de utilização de um mecanismo de financiamento 
sobre o qual não incide o genericamente chamado Imposto sobre Operações Financeiras - IOF. 
Existe ainda a possibilidade de atualização dos equipamentos, especialmente pertinente para os bens 
de rápida obsolescência, durante a vigência dos contratos, entre outros12. 
 
 
10
 Lei 7.132, de 12 de outubro de 1983. 
11
 Depoimento de Carlos Tafla, Diretor Executivo da Associação Brasileira de Empresas de Leasing - ABEL. 
12
 FORTUNA, Mercado Financeiro – Produtos e Serviço, op. cit., p. 281. 
 
5 
 
 
 
6 
 
IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES FINANCEIRAS 
 
 Sobre a nomenclatura do IOF pode-se dizer que existem em verdade cinco 
diferentes impostos, incidentes sobre as operações de crédito, câmbio, seguro, títulos 
mobiliários ou valores mobiliários. Sua finalidade é eminentemente extrafiscal, o que 
significa que o Estado se serve do tributo para outros fins, além de arrecadar recursos. 
No final dos anos 90 o IOF foi utilizado para reprimir o consumo no Brasil, em um dos 
esforços para fazer o Plano Real ter sucesso. 
 
 Por essas épocas Zé quis trocar seu carro por um modelo mais novo. Sua 
primeira reação foi quebrar o porquinho. Percebeu, porém, que suas economias de 
poupança não eram suficientes para viabilizar a compra. Procurou uma instituição 
financeira que lhe aprouvesse os recursos. Essa operação seria uma operação de 
crédito. Suas modalidades eram variadas: mútuo bancário, cheque especial, crédito 
direto ao consumidor, entre outros. 
 
 Sobre o crédito que Zé pretendia obter, (além dos juros que deveria pagar à 
instituição financeira), a União estipulou uma alíquota de IOF especialmente alta. Seu 
ânimo para trocar de carro recebeu um banho de água fria. Naquela mesma semana leu 
na banca de jornal uma notícia que trouxe novo ânimo para se despedir do carro velho. 
No dia seguinte, Zé fez um contrato de arrendamento mercantil. 
 
GAZETA MERCANTIL 
 
26 de agosto de 1999 
 
Leasing supera crediário nas vendas de veículos - 
aumento do IOF no crédito ao consumidor é 
causa da mudança 
 
 (...) Após reajuste, em maio último, do 
Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que 
passou de 6% para 15% e é cobrado nos 
financiamentos por Crédito Direto ao Consumidor 
(CDC), as vendas de automóveis pelo sistema de 
arrendamento mercantil (leasing), isento de IOF, 
aumentaram muito e, em alguns casos, já 
representam 70% dos negócios das 
concessionárias. (...) 
13
 
 
 
 
 
13
 Todos os excertos de jornais foram reproduzidos de FREITAS FILHO, Roberto. Cláusulas Gerais e Interferência nos 
Contratos: A Jurisprudência do STJ nos Contratos de Leasing. Tese de Doutoramento em Filosofia e Teoria Geral do 
Direito, defendida junto à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2006. 
 
7 
Desde a promulgação da Lei do Real (Lei n. 8.880, de 27 de maio de 1994), o arrendamento 
mercantil passou a ser um excelente negócio também para pessoas físicas. O principal fator (mas 
não o único, como visto) era a adoção da correção das parcelas pelo dólar. O dispositivo 
proporcionou até mesmo que, por vezes, as parcelas dos meses seguintes à vigência dos contratos 
fossem menores que as parcelas iniciais (em função, principalmente, de importações maiores que 
exportações e entrada de capitais especulativos, ao longo de todo o quadriênio 1994-1998).14 
 
 
14
 Para conhecer o preço do dólar em relação ao real diariamente, visite o sítio www.bancocentral.gov.br. 
 
8 
 
 
O Estado de São Paulo 
 
08 de setembro de 1997 
 
Leasing é opção barata para parcelar a compra de carro 
 
 Entre as opções de compra a prazo de carro, o leasing aparece 
como a mais barata. (...) Vantagem – para comparar as condições, 
veja este exemplo: na Davox, concessionária da Volkswagen, quem 
compra um Gol no valor de R$ 13 mil à vista, pelo leasing, em 24 
meses, com entrada de R$ 2,6 mil (20% do valor do bem), 
economizará R$ 1.992,00 durante esses dois anos. Nesse exemplo, a 
prestação mensal é de R$ 647,00 no leasing e de R$ 732,00 no CDC. 
Os juros pagos são menores no leasing, de 2.8% ao mês. No CDC, as 
taxas são de 3,5%. Segundo o vice-presidente-executivo da 
Associação Brasileira das Empresas de Leasing (ABEL), Rafael 
Cardoso, as taxas mensais costumam variar de 1,9% a 3% em 
contratos pré-fixados, e de 1,5% a 2%, nos atrelados ao dólar. 
 
 
EXAME 
 
06 de maio de 1998 
Edição 661 
 
Por que nove entre dez brasileiros que compram a prazo 
estão escolhendo o leasing em vez de uma operação de financiamento comum 
 
Chegou a hora de você escolher a forma de pagamento. Sua carteira não suportaia um 
desembolso à vista. O vendedor então diz: “O senhor não gostaria de fazer umleasing?”Se você ainda tinha alguma dúvida sobre a melhor decisão a tomar, não 
hesite. Diga rapidamente que sim. O leasing é hoje a melhor forma de financiamento 
do mercado. Não é à toa que 90% dos brasileiros que comprar carro a prazo estão 
fazendo a mesma coisa, segundo a Associação Nacional das Empresas Financeiras das 
Montadoras – ANEF. 
(...) 
O.k., o leasing está com tudo. Mas pergunte aos consumidores que compraram o seu 
carro pelo leasing se sabem explicar como esse sistema funciona. Muitos, certamente, 
vão engasgar para responder. 
(...) 
No Brasil ocorre o oposto [do que ocorre nos Estados Unidos e na Europa]. O leasing 
é muito similar a um financiamento comum. O que se faz normalmente é pegar o valor 
do veículo e dividir em parcelas iguais. O resíduo é diluído nas parcelas. 
(...) 
Muita gente acha que contrair uma dívida em dólar é algo muito perigoso. Mas 
pergunte se alguém que fez algum contrato nos últimos três anos indexado ao dólar se 
arrependeu. A resposta certamente será não. No último ano, a variação média do 
 
9 
dólar foi de apenas 7,41%, inferior à TR, de 9,76%, no mesmo período. ‘O leasing em 
dólar é muito mais interessante do que o indexado à TR’, diz Marco Bonomi, diretor 
da financeira do Unibanco. 
 
1.2 Contexto econômico de celebração e ruptura dos contratos 
 
Os doze meses que antecederam o Plano Real, iniciado em 1994, apresentaram uma taxa de 
inflação acumulada de 2.000%. Tal índice satisfatoriamente informa que as sucessivas tentativas de 
controle inflacionário que o antecederam (Plano Cruzado, em 1986; Bresser, em 1987; Verão, em 
1989; Collor I, em 1990 e Collor II, em 1991) não foram bem-sucedidas em seus propósitos. Ainda 
que enfrentando percalssos iniciais15, o Plano Real, diferentemente de seus antecessores, promoveu, 
em 1996, uma inflação anual de 9% e taxas posteriores que satisfaziam parâmetros igualmente 
razoáveis. 
 
Paralelamente ao êxito no controle da inflação, o Plano Real incorreu em falhas. A mais 
importante para a discussão do presente trabalho foi a excessiva aposta do câmbio como 
instrumento básico da política econômica. Com um aumento de importações associado a baixos 
índices de exportação, além do financiamento do endividamento externo, a superestimada 
apreciação cambial da moeda nacional não tardaria em mostrar seus efeitos, alguns anos depois da 
implementação do Plano Real16. Relatos dos dias de hoje mostram que a preocupação com o câmbio 
existira desde o início da implantação, ainda no segundo semestre de 199417. 
 
Entre 1994 e 1998 o mercado mundial passou por três importantes crises: México, ao final 
de 1994, com reflexos em mercados emergentes, principalmente no primeiro semestre de 1995; 
Sudeste Asiático (originalmente Tailândia e, a partir dela, na Coréia do Sul, Indonésia e Malásia), 
em 1997; e, finalmente, Rússia, em 1998. Depois de passar por ataques especulativos nessas três 
 
15
 “(...) a inflação mantinha certa resistência à queda, cabendo citar que, nos primeiros 12 meses do Plano Real (junho 
1994 - junho 1995) a variação dos preços medida pelo INPC [Índice Nacional de Preço ao Consumidor] foi de 33%”. 
GIAMBIAGI, Fábio. “Estabilização, Reformas e Desequilíbrios Macroeconômicos: Os Anos FHC”, in GIAMBIAGI, 
Fábio, VILLELA, André, CASTRO, Lavínia Barros e HERMANN, Jennifer (orgs.) Economia Brasileira 
Contemporânea (1945-2004), Rio de Janeiro, Elsevier, 2005, p. 168. 
16
 Idem. pp. 169 a171. 
17
 Segundo os relatos de Fernando Henrique Cardoso, então Presidente da República, já em dezembro de 1994 “(...) 
parecia claro que a taxa de câmbio a 82 centavos de real por dólar criaria problemas futuros para as exportações, 
encarecendo os produtos brasileiros. Mas interferir no câmbio quando o sistema financeiro internacional dava sinais de 
fadiga [crise do México] seria insensatez. Esse permanente pesadelo acompanhou o governo até janeiro de 1999, 
quando os mercados nos obrigaram a permitir a flutuação do câmbio.” Cf. A Arte da Política – A História que Vivi, p. 
339. 
 
10 
oportunidades, Fernando Henrique Cardoso tomava posse de seu segundo governo, em janeiro de 
1999. 
 
Pouco antes das eleições de 1998 era negociado acordo com o Fundo Monetário 
Internacional para obtenção de recursos que permitissem enfrentar o adverso quadro externo que se 
insinuava. O empréstimo foi obtido, sem que qualquer mudança na estrutura cambial fosse acordada 
com o Fundo. 
 
Ainda que os dilemas promovidos pela valorização da moeda nacional não passem 
desapercebidos pelos dirigentes da área econômica18, as controvérsias sobre como proceder a um 
ajuste eram muitas, como se pode comprovar pelos atritos políticos verificados dentro da própria 
equipe econômica, principalmente entre os pólos orientados pela manutenção das taxas de câmbio 
(Gustavo Franco) e pela tentativa de uma liberalização gradual, através de mecanismos que 
levassem à flutuação ao longo de todo o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (em um 
primeiro momento, Luíz Carlos e José Roberto Mendonça de Barros, André Lara-Resende e 
Francisco Lopes. Com o afastamento dos primeiros em função de demissão conjunta, 
primordialmente por Francisco Lopes, que se tornaria presidente do Banco Central). 
 
A necessidade de alteração do câmbio fora tomada. Sua feitura seria através da nomeada, à 
época, “diagonal endógena”. Ou, conforme nomeada pelo próprio Francisco Lopes “banda 
inteligente”19, que teria teto inicialmente fixado em R$ 1,32 e piso em R$ 1,20. A nova banda foi 
lançada no dia 13 de janeiro de 1999 e passou a vigorar imediatamente. Naquela terça-feira foram 
gastos um bilhão, novecentos e sessenta milhões de dólares, pelo Banco Central, de modo a 
proporcionar o fechamento do câmbio dentro da banda, em R$ 1,3193. No dia seguinte, o Banco 
Central gastou mais dois bilhões e oitocentos milhões de dólares para fazer com que a cotação 
estivesse no teto da banda. No terceiro dia, o Banco Central decidiu que não mais faria intervenções 
no mercado. Na sexta-feira o dólar fechou a R$ 1,4659, com uma valorização de 21% em relação ao 
dia 12 de janeiro, segunda-feira, último dia em que vigorou o sistema de câmbio fixo20. 
 
 
 
19
 Tratava-se, em verdade de uma “banda diagonal, cujos limites — teto e piso — são alterados juntos, de tempos em 
tempos, com movimentos previsíveis. Podem mudar na mesma proporção, o que deixa inalterado o intervalo entre piso 
e teto, ou podem mudar de forma irregular, com o teto se distanciando cada vez mais do piso” Idem. pp. 472 e 473. 
20
 Ibidem. pp. 476. 
 
11 
Nos dias que se seguiram, 21 e 22 de janeiro, o dólar fechou a R$ 1,70, através da reação 
dos mercados sobre o boato de que o Ministro da Fazenda, Pedro Malan, seria afastado. Em tais 
dias, ainda tentativas de soluções alternativas para o câmbio. Possíveis soluções seriam o 
fechamento do mercado em uma sexta-feira para discutir com o FMI as melhores medidas a serem 
adotadas, restaurar uma banda tradicional com teto mais alto, fixar o câmbio (como à época, o fez a 
Argentina) ou deixar o câmbio flutuar. A decisão do Presidente da República foi pela flutuação21. 
Em 29 de janeiro, com saques em massa promovidos pelo disseminado pavor de confisco de 
poupança e congelamento de preços, o dólar fechou a R$ 2,07. Desvalorizou-se a moeda nacional 
71% em 17 dias. Encerrava-se, assim, um ciclo de quatro anos de câmbio fixo e valorização 
artificial da moeda nacional22. 
 
Começavam, assim, os problemas dos consumidores que mantinham contratos de 
arrendamento mercantil de veículos com cláusula de reajuste das parcelas atreladas ao dólar e das 
empresas de arrendamento mercantil, devedoras de recursos captados no mercado internacional e 
que necessariamente deveriam ser pagos em moeda estrangeira. 
 
Variação do preço da moeda norte-americana, através de médias mensais23:21
 “Reiterei minha preocupação antiga: decidir antes que as reservas se esgotassem. A situação, no entanto, mudara. A 
fim de deter a sangria das reservas, tanto uma banda bem mais larga quanto a flutuação do câmbio me pareciam opções 
viáveis, embora envolvessem riscos. A opinião do BC era de permitir a flutuação, com o que concordei”. CARDOSO, A 
Arte da Política – A História que Vivi, op. cit. p. 413. 
22
 PRADO, A Real História do Real – Uma Radiografia da Moeda que Mudou o Brasil. Op. cit., p. 482. 
23
 Dados obtidos a partir das séries gratuitas disponíveis no sítio da FGVDADOS, da Fundação Getúlio Vargas. 
http://fgvdados.fgv.br/dsp_gratuitas.asp [30/06/2005] 
 
 
12 
Ano/Mês 
abr/05jun/04ago/03out/02dez/01fev/01abr/00jun/99ago/98out/97jan/97
4,0
3,5
3,0
2,5
2,0
1,5
1,0
 
 
1.3 Contexto normativo: Lei do Real e Código de Defesa do Consumidor 
 
 
A Lei n.º 8.880, de 27 de maio de 1994, é também conhecida com Lei do Real, por ter sido 
responsável pela instituição da Unidade Real de Valor – URV e das principais regras sobre o então 
novo programa de estabilização econômica. Além de instituir a nova moeda, a Lei do Real 
extinguiu a validade e eficácia de quaisquer contratos vinculados ao reajuste de variação cambial. 
Exceções foram admitidas apenas às previsões legais esparsas e aos contratos de arrendamento 
mercantil. Todavia, a exceção não era admitida a quaisquer contratos de arrendamento mercantil. 
Para que os contratos pudessem ter reajuste vinculado ao dólar eram necessárias duas condições: a) 
serem arrendadores e arrendatários residentes e domiciliados no Brasil e b) serem os recursos 
destinados aos contratos de arrendamento mercantil provenientes do exterior. 
 
Assim, somada à não incidência do IOF, a possibilidade de reajuste dos contratos a partir da 
variação cambial do dólar, critério muito favorável à época, foi imprescindível para o crescimento 
do mercado de arrendamento mercantil, não só entre pessoas jurídicas, mas principalmente entre 
pessoas naturais. 
 
O que era um dispositivo legal extremamente favorável ao arrendamento mercantil mostrou-
se, com a ruptura das bandas cambiais, um problema para o mercado. Os contratantes que em 
 
13 
janeiro de 1999 eram parte em contratos de arrendamento mercantil com cláusulas de reajuste 
vinculadas ao dólar viram-se, em apenas 17 dias, expostos a uma alteração de parcelas que excedia 
os 70%. E esse era apenas o começo da crise. 
 
A exceção criada pela Lei do Real para os contratos de arrendamento mercantil transformou-
se de benemérita a vilã na mesma velocidade em que se alterava o câmbio. A situação proporcionou 
considerável pânico nos galpões, fábricas e hangares em que se abrigavam bens de produção 
adquiridos por contratos com cláusula de reajuste ligada à variação cambial. Lares e garagens, nos 
quais se abrigavam veículos (bens precipuamente adquiridos pelo arrendamento mercantil por 
pessoas naturais) adquiridos também por arrendamento mercantil, vivenciavam correspondente 
sentimento. 
 
A solução para o problema (ao menos no ponto de vista dos arrendatários) passava pela 
revisão dos contratos. Suas argumentações pautar-se-iam em elementos variados. Falou-se da 
necessidade de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro das partes na obrigação. Muito se 
pensou também na necessidade de conformação de arranjos que desestimulassem a devolução em 
massa dos bens. Afinal, o que a arrendadora faria com seus depósitos repletos de máquinas e 
veículos devolvidos? Os arrendatários que não se serviam dos objetos dos contratos como bens de 
produção viam-se resguardados de maneira especial. Todos aqueles que se enquadrassem na 
condição de consumidores encontravam no Código de Defesa do Consumidor - CDC (Lei n.º 8.078, 
de 11 de setembro de 1990) previsão expressa de proteção. 
 
 
Código de Defesa do Consumidor 
 
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de 
produtos e serviços que: 
 IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em 
desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; 
 § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vontade que: 
 III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo 
do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. 
 
 
 
 
14 
A partir de 2003, com o início da vigência do novo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de 
janeiro de 2002) que substituiu o conjunto de normas de 1916, outros dispositivos legais muito 
provavelmente seriam invocados para orientar e justificar a revisão, pró-adquirente, dos contratos 
de arrendamento mercantil. 
 
Não havia, entre arrendadores e arrendatários, uma postura única para solução do problema. 
A decisão do contratante, tanto pessoa natural quanto pessoa jurídica, de adimplir o contrato nas 
condições originais, pleitear a revisão extrajudicial ou, por fim, a revisão judicial, estava 
grandemente associado ao tempo que faltava para o término do contrato. Quem tinha poucas 
parcelas para pagar, preferiu adimpli-las, (mesmo com a alta do dólar), pois o acréscimo não seria 
significativo em relação ao montante já investido no bem. Diferentemente, quem estava no início do 
contrato tinha mais estímulos para pleitear revisão ou mesmo para devolver o bem, haja vista que o 
valor estipulado pelo novo ajuste excederia em muito o valor de mercado do veículo. 
 
 Outras diferenças podem ser apontadas entre pessoas naturais e pessoas jurídicas quanto ao 
tratamento dado pelas arrendadoras. Um dos elementos percebidos nas entrevistas realizadas com 
executivos das empresas de arrendamento mercantil apontava o interesse de fazer com que os 
percalços desse episódio não interferissem no relacionamento e confiança conquistados de alguns 
clientes destacadamente importantes. A importância de um cliente é normalmente proporcional a 
seu volume de negócios. 
 
 
Conversa em um elegante escritório de instituição financeira 
 
MPB: Mas uma dúvida, que eu tenho que é se havia diferença de tratamento entre pessoa física 
e pessoa jurídica. 
 
Diretor Financeiro da XI$ Arrendamento Mercantil, subsidiária do Banco XI$: Sim, sim, pessoa 
jurídica são cliente mais fiéis, tem outros produtos no Banco, tem tratamento diferenciado. Aí a gente 
chamava o cliente pra negociar. Totalmente diferente. Nosso grande valor proporcional das carteiras, 
inclusive, estava concentrado nos clientes grandes. Transportadoras, Empresas de ônibus, grandes 
industriais, operações de corporate, enfim os grandes valores. Se você pegasse, ô, tinha problema de dez 
milhões de dólares. 
 
MPB: Hum, hum. 
 
Diretor Financeiro da XI$ Arrendamento Mercantil, subsidiária do Banco XI$: Se eu pegar em 
termos de valor, sete milhões, ou mais, estava concentrado em clientes corporate. Clientes grandes, 
clientes que até hoje fazem hedge, que querem operações em dólar. Só que a grande quantidade de 
clientes estava na pessoa física. Outros três ou quatros milhões que sobravam de um mesmo empréstimo 
externo, estavam pulverizados em milhares de contratos. 
 
15 
 
MPB: Sim... Em carrinhos? 
 
Diretor Financeiro da XI$ Arrendamento Mercantil, subsidiária do Banco XI$: Em carrinhos, 
pulverizados, aí... Esse era o maior desafio, por isso, que a gente, em uma ocasião, trouxe os operadores 
[de todo o Brasil] para cá [sede da instituição] [para conversarem sobre como procederem]. Esse de 
varejo, inclusive de pessoas jurídicas... ai, não consigo. Fizemos de tudo. Gerentes, diretores, até o 
Comitê Executivo do Banco, chamaram os clientes grandes e disseram: “Ó, escuta, precisamos negociar. 
Você não pode ficar sem pagar, né?” Esses tiveram acordos. Por vez, fizeram melhores. Outros até 
piores. Mas, normalmente, melhores que os das pessoas físicas. Tanto é que a gente tem quase mil 
contratos de pessoas físicas que estão em juízo ainda,né? Até hoje.24 
 
 
 
 
Para a revisão dos contratos de pessoas naturais, a maior parte dos entrevistados aponta não 
ter encontrado uma postura unívoca desde o início dos problemas, em janeiro de 1999, com a 
liberação do câmbio. Em menor número, a postura das arrendadoras foi de completa negação de 
uma solução alternativa ao encarecimento da prestação do arrendatário pessoa física. Tinham que os 
valores, mesmo que duplicados em real em tão pouco tempo, eram devidos. E ponto final. Ou, 
melhor, até que em contrário disponha uma sentença judicial. Sem dúvida, essas instituições foram 
as que contra si mais tiveram demandas. 
 
 
Fluxo de consciência do Antônio, 
 que “financiava” seu carrinho pelo tal do leasing, em março de 1999. 
 
 O negócio apertou quando a parcela dobrou. Ainda bem que a mãe tinha uma poupança. Deu 
pra pagar tudo sem ficar com o nome sujo na praça. UFA! Finalmente! Bem que meu primo disse que 
esse cara era mesmo um excelente advogado! Me descolou a tal da liminar! Isso quer dizer que eu não 
preciso pagar por enquanto, mas não significa dizer que não vou deixar de pagar no futuro. Entendi. 
Tudo bem, ao menos me dá um respiro. 
 
 
No grupo majoritário de instituições que se abriram para renegociar os contratos, as posturas 
não foram unívocas nem em relação ao comportamento de todas as instituições, nem em relação às 
diferentes táticas que adotaram, ao longo dos meses que se seguiram ao início de 1999. A postura 
da maioria das instituições financeiras em apoiar renegociações suscitou entre representantes das 
próprias arrendadoras, bem como em magistrados e outros juristas, a impressão de que a exigência 
legal de que os contratos de arrendamento mercantil só poderiam ter seu reajuste associado à 
 
24
 Entrevista realizada no primeiro semestre de 2005. 
 
16 
variação cambial se os recursos destinados a tais operações houvessem sido captados no exterior 
não havia sido cumprida. Afinal, mesmo que as arrendadoras não estivessem dispostas a terem 
todos os bens devolvidos por falta de adimplemento, elas deveriam ter tomado recursos que seriam 
repassados a seus credores internacionais também em dólar. Se não recuperassem dos consumidores 
o valor das parcelas corrigido pela alta do dólar, como saldariam suas dívidas vincendas? Nesse 
sentido, o depoimento do Diretor do Banco Z€, à época Diretor da Z€ Leasing S.A, financeira 
exclusiva dos veículos da montadora Z€: “No nosso caso, garanto: existia captação em dólar. 
Quando eu falo captação em dólar, explico que até poderia ser local a nossa captação, mas a gente 
captava de outro banco que nos repassava em dólar. E nós honramos todos os nossos 
compromissos. Nossa instituição não foi ao Judiciário para rever os empréstimos com nossos 
credores.” 
 
Uma primeira postura de muitas das arrendadoras foi feita imediatamente após janeiro e 
consistia em congelar parcelas, pré-fixando-as em um valor médio de dólar, por um breve período 
de tempo. Ainda nos dizeres do Diretor Financeiro da XI$: “A primeira etapa foi não repassar 
integralmente, no ato. Mantemos a prerrogativa do cliente de escolher passar ou não, aquela alta 
do dólar, numa parcela em um único mês. Então, a gente prefixou o dólar. Na época, a R$ 2,40, se 
não me engano. R$2,30 ou R$2,40, dependendo a época, Pré-fixar isso e apurar isso. Apurar essas 
diferenças e diluir pro final do contrato. Jogar pra frente, pra que não desse tanto impacto 
financeiro no bolso dos clientes, de pessoas físicas ou jurídicas, até então. Só que essa estratégia 
foi boa por dois ou três meses. Porque o dólar se mostrou em constância de alta, que não ia parar 
tão já. Essas diferenças que a gente negociava basicamente três parcelas, pré-fixava o dólar em 
três parcelas, a gente viu que, esses três meses não foram suficiente para conter alta dólar e o 
dólar continuou subindo, e essas diferenças acumularam ainda mais.” 
 
 
CONTRATOS DE LEASING EM DÓLAR – PESSOAS FÍSICAS 
COMUNICADO AO PÚBLICO 
 
 A ABEL – Associação Brasileira das Empresas de Leasing, representando suas 
associadas, vem a público esclarecer: 
 
 As Empresas de arrendamento mercantil (Leasing), na sua grande maioria, já 
vêm renegociando seus contratos, procurando adequar as parcelas à capacidade de 
pagamento de cada arrendatário oferecendo, entre outras, as alternativas abaixo: 
 
 
17 
 - congelamento das parcelas de janeiro, fevereiro, março e abril; 
 
 - transferências das diferenças oriundas deste congelamento para as parcelas restantes 
e/ou dos prazos dos contratos. 
 
 Assim, esta Associação, para preservar a legalidade, os direitos e as obrigações 
assumidos nos contratos, recomenda aos arrendatários que, antes de qualquer 
providência unilateral, procurem as sociedades arrendadoras para, dentro das normas 
que regulam o arrendamento mercantil, buscar, caso a caso, soluções conciliadoras e 
que atendam aos interesses das partes. 
 
(Comunicado divulgado em nosso site e nos principais jornais do País em 12.2.99)25 
 
Os entrevistados (representantes de empresas de arrendamento mercantil) que buscaram 
dialogar com os consumidores apontaram que cerca de 90% de seus contratos foram resolvidos 
amigavelmente. Mesmo os entrevistados que em um primeiro momento mostraram-se inflexíveis a 
qualquer tipo de negociação acabaram cedendo a posturas mais conciliatórias e buscando seus 
arrendatários. O uso de mala direta e anúncio em jornal foi muito profícuo para tal objetivo. 
Se o estabelecimento de uma taxa pré-fixada de dólar não era razoável para toda a crise 
cambial que se seguiu após janeiro de 1999, outras soluções foram negociadas26, ainda que com 
uma casuística muito maior, que não permitiu a estipulação de parâmetros tão bem definidos, 
através das entrevistas. 
Todavia, resta uma pergunta: os arrendatários que já se viam resguardados contra o aumento 
das parcelas através de liminares judiciais faziam parte dos 90% de contratantes que resolveram o 
problema através da autocomposição? Sim. Isso é possível ao imaginarmos que os contratantes, 
especialmente os consumidores pessoas naturais, poderiam ter variados estímulos para desistir de 
uma lide que, ao menos por hora, estavam ganhando. 
 
Fluxo de consciência do Antônio, em março de 2000. 
 
 Puxa, tá ficando caro esse advogado... A gente combinou uns milrréis pra acompanhar o 
processo, mas não imaginava que ia demorar tanto pra acabar. E essa lata velha agora! Estragou 
de novo. Precisava passar esse carrinho pra frente. Com o dinheiro, financiar um outro, mais novo. 
Vou conversar com o despachante pra saber se a papelada está em ordem. Vendo o velho esse mês 
 
25
 Reproduzido da compilação “Variação cambial nos contratos de arrendamento mercantil (leasing)”, Associação 
Brasileira das Empresas de Leasing – ABEL, São Paulo, s/d, p. 13. O logo da associação no rodapé do texto reproduz a 
diagramação original do documento. 
26
 Ver o Anexo do Termo de Ajustamento de Conduta firmado entre parte das arrendadoras e o Departamento de 
Proteção e Defesa do Consumidor, da Secretaria de Direito Econômico, do Ministério da Justiça. 
 
18 
e logo em seguida descolo outro carro, ao menos uns dois ou três anos mais novo. 
 
 
1.4 A escolha da revisão judicial 
 
A despeito da argumentação de que os problemas da enorme maioria dos contratos de 
arrendamento mercantil foi resolvida sem necessidade de intervenção do Poder Judiciário, é um erro 
imaginar que as demandas que foram para os juízos eram poucas. De maneira alguma. 
Especialmente entre as pessoas naturais que compraram veículos de passeio, servindo-se do 
arrendamento mercantil como uma mera forma de financiamento. Podemos estimar que no Brasil 
tenha havido algumas dezenas de milhares de ações. 
 
Ao lado das ações individuais, importante notar a importância das ações civis públicas. O 
mecanismo processualde defesa dos direitos individuais homogêneos foi responsável por grande 
parte do impacto que a revisão dos contratos de arrendamento mercantil provocou na história da 
jurisprudências brasileira. Podem ser citadas várias ações civis públicas, propostas por diferentes 
legitimados: pela Ordem dos Advogados do Brasil - Seção São Paulo27, pelo Movimento das Donas 
de Casa e Consumidores de Minas Gerais28e ainda pelos Ministérios Públicos do Estado de São 
Paulo29 e Santa Catarina30. 
 
Uma vez tomada a decisão de recorrer ao Poder Judiciário, três amplos cenários se tornaram 
possíveis: 
 
I - Entendimento, pelo magistrado, de que o arrendatário aceitara a cláusula de variação 
cambial e, desta forma, arcara com os riscos do negócio, nada sendo possível alegar em seu favor. 
Suas opções diante de tal decisão seriam apenas as de devolver o bem ou adimplir regularmente, 
com o acréscimo promovido pela alta do dólar, as parcelas restantes. 
 
 
 “Ação de Revisão Contratual - Arrendamento mercantil. Reajuste pela variação cambial - Procedência - Alegadas 
inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e inocorrência de onerosidade excessiva ou fato novo 
imprevisivel . Acolhimento . Observância da lei consumerista cabível, mas não autorizadora da substituição do 
indexador pretendida . Condição livremente pactuada . Inexistência de onerosidade excessiva, por ter o arrendatário 
assumido os riscos da opção feita e por estar a arrendante, também, obrigada a satisfazer seus credores externos na 
 
27
 Primeira Vara Federal de S. Paulo. Processo n. 1.999.61.00.004437-1 
28
 Vigésima Terceira Vara Cível de Belo Horizonte. Processo n. 024.99.005.622 
29RESP. 369744/SC Recurso especial número. 2001/0127597-7. Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar. 
30
 Ver decisão no anexo. 
 
19 
moeda forte - Variação cambial não configuradora, ademais, de fato imprevisível, por já ter ocorrido precedentemente 
no País e no exterior - Recurso provido. Embora seja verdade que na locação pura o entendimento dominante aponta 
no sentido da inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, envolvendo o arrendamento mercantil também 
uma promessa de venda e compra, mediante opção ao término do prazo pactuado, onde o preço corresponde ao valor 
residual, fica ele submetido às regras desse diploma, por estar havendo aquisição de bem por consumidor final. 
 Ainda que aplicável ao arrendamento mercantil o código consumerista, de todo desautorizado, mesmo sob seu 
manto, que se passe a encontrar nulidades em cláusulas contratuais livremente ajustadas, sem afronta aos preceitos 
legais, ou a pretender revisão de uma ou mais delas unicamente porque, em determinado momento, não mais convêm 
ao contratante, dito consumidor. Nem mencionado código permite modificar ajuste, mesmo em contrato de adesão, sob 
fundamento de onerosidade excessiva, porque havido, posteriormente, pelo contratante de menor poder econômico 
como desfavorável a ele em algum aspecto. 
 Se, ao momento de contratar, teve esse contratante como conveniente e oportuno aceitar a atualização das 
contraprestações segundo a variação cambial, optando por ela não obstante de maior risco, porém então de menor 
custo, descabido que pretenda alegar, agora, que se viu compelido por seu arrendador a tal. Se o fez foi por ter tido 
como adequada a seu negócio, naquele momento, podendo, em não sendo, ter recorrido a outras instituições 
financeiras ou a outra modalidade de indexador. Assumiu os riscos da contratação, tal como posta, havendo de 
cumprir aquilo que ficou pactuado.”31 
 
 
 
 II - Estabelecimento, pelo representante do Poder Judiciário, de que o risco do negócio era 
exclusivamente da empresa de arrendamento mercantil, de tal sorte que esta deveria arcar sozinha 
com os prejuízos advindos da alta da moeda norte-americana32. Nesse tipo de decisão os 
magistrados normalmente estabeleciam que um novo índice econômico, (mais usualmente o Índice 
Nacional de Preços ao Consumidor – INPC, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e 
Estatística – IBGE), deveria determinar os valores para a revisão das parcelas restantes para 
adimplemento dos contratos. Para as empresas de arrendamento mercantil restariam os prejuízos em 
relação a credores estrangeiros, os quais disponibilizaram elevados créditos, da ordem de milhões 
de dólares, às empresas de arrendamento mercantil, as quais, por sua vez, repartiam o montante em 
operações de varejo. Em função das entrevistas sabe-se que nenhuma empresa de arrendamento 
mercantil, necessariamente instituição financeiras, pleiteiou revisão de seus contratos de crédito 
internacionais. 
 
 
“Arrendamento mercantil - revisão contratual - reajuste das prestações atreladas à variação cambial - admissibilidade 
- incidência do código de defesa do consumidor. Risco que deve ser assumido pela arrendadora em captar recursos no 
 
31
 Segundo Tribunal de Alçada Cível de São Paulo. Apelação com revisão nº 603744-00/0. Relator: Desembargador 
Vieira de Moraes. 
32
 A sujeição dos prejuízos decorrentes da alta do dólar exclusivamente às empresas de arrendamento mercantil era não 
raro formalmente justificada com duas importantes argumentações. A primeira é a de que o valor residual garantido, 
elemento característico fundamental da operação de arrendamento mercantil, era ficto em uma série de contratos 
(através de sua diluição ao longo das parcelas ou de atribuição final de valor irrisório). Indevida, pois, a utilização de 
recursos provindos do exterior aplicada a contratos com indexação cambial, conforme disposto pela Lei 8.880/94 e 
sumulado pelo STJ através da Súmula 263 (posteriormente modificada pela súmula 293). A outra argumentação é a de 
que as instituições financeiras não conseguiriam provar que os recursos utilizados para viabilizar as operações de 
arrendamento mercantil de fato provieram de captações externas, condição também indispensável para a legalidade da 
prática de indexação cambial dos contratos, ainda conforme a Lei 8.880/94. 
 
20 
exterior, ao custo mais baixo, injetando-o no mercado interno. “A legislação consumerista, ao contrário da teoria da 
imprevisão, para que se possibilite a revisão de cláusulas contratuais, não exige a ocorrência de um fato imprevisto 
pelas partes, ou que seja extraordinário, bastando que, no curso do contrato de prestações continuadas (ou diferido), 
as obrigações do consumidor se tornem excessivamente onerosas (ad. 6°, V, do CDC), modificando o ambiente em que 
pactuada a avença. Ademais, o risco pela captação de recursos mais baratos no exterior, injetando-o no mercado 
interno, deve ser suportado pela arrendadora, em razão de ser exercida por essas instituições, precipuamente, a 
atividade financeira, sujeitando-se estas aos percalços da economia interna”33 
 
 
 
 
 
O QUE E UM ÍNDICE ECONÔMICO? 
 
 “Um índice de preços é, em termos econométricos, o que se chama de ‘número-índice’. Este 
é um conceito que ‘permite a comparação do nível geral de magnitude de um grupo de variáveis 
distintas, mas relacionadas, em duas ou mais situações’34. Um índice de preços fundamentalmente 
compara os preços de um determinado grupo de bens ao longo do tempo, focando-se em suas 
variações, de modo a apontar a inflação, deflação ou manutenção das médias para determinado 
grupo de produtos. Os procedimentos para determinação de um índice passam, primeiramente, 
pela determinação de uma cesta de produtos (bens ou serviços) que sejam representativos dos 
gastos de um determinado setor da economia ou mesmo de famílias. Se o objeto do índice é medir a 
variação dos preços médios das atividades de um pescador, por exemplo, a primeira tarefa será 
realizar estabelecer quais são os componentes que caracterizamsua atividade. Uma possível 
combinação envolveria alguns metros de cânhamo e outros tantos de rede; sal; combustível para 
motor ou manutenção de velas (se o pescador típico servir-se mais de barcos a motor que de 
barcos a vela, esse elemento deverá estar proporcionalmente representado na composição da 
cesta); alimentação durante a pesca e reserva de água doce, por exemplo. Uma vez estabelecida a 
cesta ou conjunto de bens cuja variação se pretende observar, passa-se à etapa de pesquisa desses 
preços. O terceiro passo será calcular o custo da cesta selecionada. Por fim, comparando os dados 
obtidos com o resultado do mês-base, obtém-se a relação entre tais resultados e, com isso, o 
índice35. 
 
Muito dificilmente alguém manteria uma estrutura cara e dispendiosa para acompanhar a 
variação dos preços dos pequenos pescadores, o que explicita o caráter meramente exemplificativo 
do exercício teórico acima. Todavia, diferentemente do que muitos possam achar, não existe um 
índice único de medição da variação dos preços. Há índices que medem exclusivamente os 
elementos que interferem na variação de custos da construção civil, outros que medem a variação 
do consumo de famílias com diferentes rendas, que medem a variação dos preços de aquisição nos 
atacadistas, do preço das obras públicas, do custo de mão-de-obra de montagem e manutenção 
industriais e do transporte rodoviário de carga, citando-se apenas os exemplos nacionais de 
tradição consolidada e realizados por instituições de grande notoriedade, como a Fundação 
Getúlio Vargas, a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, FIPE, associada à Universidade 
de São Paulo - USP e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE. 
 
33
 Segundo Tribunal de Alçada Cível de São Paulo. Apelação com revisão nº 641490-00/8. Relator: Desembargador 
Francisco Thomaz. 
 
34
 Cf. KARMEL, P.H. E POLASE. M. Estatística Geral Aplicada para Economistas. São Paulo, Atlas, 1974, p. 381 
35
 Cf. MANKIW, Gregory. Introdução à Economia, Rio de Janeiro, Campus, 2004. Recomenda-se especial atenção ao 
didático capítulo 23, intitulado “Calculando o custo de vida”. 
 
21 
 
 A eleição do INPC talvez não tenha sido uma escolha consciente da maioria dos 
magistrados e mesmo dos advogados. Todavia, foi uma escolha bastante adequada, pois é o índice 
que melhor reflete a situação do consumidor e com isso revela aumentos proporcionais aos de 
outros gastos de um consumidor médio, coerentes com o que o indivíduo pagará, mês a mês, a mais 
no supermercado, na escola dos filhos, no aluguel, entre outros.” 36 
 
 
 
III - Por fim, o terceiro entendimento era o de que nenhuma das decisões anteriormente 
apontadas seria adequada. O correto era dividir os ônus da desvalorização cambial, metade a 
metade, entre arrendante e arrendatário. Esse acabou sendo o conteúdo do voto do relator na decisão 
do Superior Tribunal de Justiça que pacificou37 a compreensão do colegiado sobre o caso. 
 
 
 
“A desvalorização do real em relação ao dólar, em face da cláusula de indexação, acarreta 
onerosidade excessiva para o devedor, mas, salvo melhor juízo, não traz qualquer benefício ao credor, que 
apenas repassa para o financiador externo os reais adicionalmente necessários para pagar os dólares 
originariamente contratados. É preciso que isso fique claro: não se pode suprimir a cláusula de variação 
cambial em relação ao consumidor, sem transferir os respectivos efeitos para o arrendador, que é, no 
particular, intermediário de recursos externos. Quid, tendo em vista o artigo 6º da Lei nº 8.880, de 1994, cujo 
teor ‘é nula de pleno direito a contratação de reajustes vinculados à variação cambial, exceto quando 
expressamente autorizado por lei federal e nos contratos de arrendamento mercantil celebrados entre pessoas 
físicas e domiciliadas no país, com base em captação de recursos provenientes do exterior’, aplicação da 
cláusula de reajuste vinculado à variação cambial parece ser de rigor, quando não se tratar de uma relação 
de consumo. Presente a relação de consumo — e tendo em vista o artigo 6º, inciso V, do Código de Defesa do 
Consumidor, que autoriza a revisão de cláusulas contratuais que se revelem excessivamente onerosas em 
razão de fatos supervenientes — pergunta-se: O risco próprio da cláusula de indexação cambial não excluiria 
a aplicação dessa norma legal? Se, a despeito da natureza da cláusula, o consumidor está protegido, qual a 
medida da onerosidade excessiva? O dimensionamento dessas questões exige que se esboce a conjuntura 
macroeconômica e como era percebida. As partes contavam com a estabilidade do real durante o prazo 
contratual. A longo prazo, sabia-se — a despeito da posição pública do Governo — que ela não subsistiria, 
porque comprometia nossa balança comercial. O papel governamental era esse mesmo, porque qualquer 
dúvida, a propósito, prejudicaria irremediavelmente a política econômica, toda atrelada à chamada âncora — 
o vocábulo diz tudo — cambial. A probabilidade de mudanças nesse âmbito, portanto, fazia parte do cenário, 
mas as partes quiseram, ambas, acreditar que teriam tempo de fazer um bom negócio. Cada qual, por isso, tem 
uma parcela de (ir)responsabilidade pela onerosidade que dele resultou, e nada mais razoável que a 
suportem. Tal é o regime legal, que protege o consumidor da onerosidade excessiva, sem prejuízo das bases 
do contrato. Se a onerosidade superveniente não pode ser afastada sem grave lesão à outra parte, impõe-se 
uma solução de eqüidade. O acórdão recorrido, data venia, errou ao aliviar o arrendador daquela parcela de 
 
36
 Excerto do artigo “Índices Econômicos e reajuste nos contratos de concessão: uma análise do setor elétrico”, in 
Revista de Direito Público da Economia – RDPE, n. 16, out./dez. 2006, pp. 130 e 131, de autoria da mesma autora deste 
relato de jurisprudência. 
37
 Muito se especula, especialmente entre advogados, sobre as idiossincrasias de determinados juízos ou cortes. 
Todavia, raríssimos são os levantamentos quantitativos sobre decisões judiciais, fazendo com que análises fragmentadas 
passem à história da jurisprudência como representativas de toda uma época. Isso se deu, como se verá, no caso de 
revisão dos contratos de arrendamento mercantil de veículos em função da alta do dólar em 1999. Grande parte do meio 
jurídico comenta que a decisão que solucionou o problema foi a decisão “meio a meio”, proferida pelo STJ, sem 
mencionar, porém, que mesmo o STJ viveu grandes embates antes de se firmar com tal posição. Para rico e minucioso 
trabalho de reconstrução dos vários votos proferidos pelo STJ antes da sentença “meio a meio”, ver FREITAS FILHO, 
Roberto. Cláusulas Gerais e Interferência nos Contratos: A Jurisprudência do STJ nos Contratos de Leasing, op. cit., 
nota de rodapé número 12. 
 
22 
onerosidade que poderia suportar, não excessiva, lesando gravemente o consumidor ao imputar-lhe 
integralmente os efeitos do fato superveniente”38 
 
 
 
O fato de uma decisão ser proferida por tribunal superior, todavia, muda as decisões que já 
foram dadas em primeira e segunda instâncias? Que problemas pessoas como Antônio teriam para 
tentar obter uma decisão como a do autor que conseguiu a decisão acima? Até que ponto a decisão 
final é representativa da decisão que a maioria das pessoas recebe? O que é preciso para que uma 
questão jurídica seja apreciada por um tribunal superior? 
 
Algumas dessas perguntas podem ser respondidas por uma informação muito interessante, 
colhida através da análise de centenas de decisões judiciais: de 481 decisões proferidas pelo 
Tribunal de Justiça de São Paulo, entre julgamentos de liminares e apelações,apenas 8 resolveram a 
questão da maneira como o STJ resolveu acima. Em termos percentuais, isso representa pouco mais 
de 2% dos casos. No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por sua vez, em 1.224 houve apenas 
1 decisão concorde o posicionamento do STJ. Um número insignificante. 
 
As tabelas abaixo mostram a variação do posicionamento jurídico entre o TJSP e o TJRS em 
relação ao caso de revisão dos contratos de arrendamento mercantil, tanto nas decisões liminares 
como nas sentenças39. Foram excluídas as decisões meio a meio, pois numericamente 
insignificantes. 
 
38
 Recurso Especial nº 473141. 
39
 Para outros estudos quantitativos sobre o Poder Judiciário brasileiro, ainda que com enfoques diversos, ver 
REZENDE, Christiane Leles. Pacta Sunt Servanda? O Caso dos Contratos de Soja Verde., projeto de doutoramento da 
Faculdade de Econômica, Administração e Contabilidade da Universidade de S. Paulo, FEA-USP, apresentado no 
seminário PENSA de 25 de abril de 2006, FERRÃO, Brisa; RIBEIRO, Ivan. Os Juízes Brasileiros Favorecem A Parte 
Mais Fraca ? X Latin American and Caribbean Law and Economics Conference, 2006. Disponível [on-line] em 
http://www.utdt.edu/~alacde/Papers/Paper16.pdf [29/06/2006]. 
 
 
23 
163
194
126
1
0
20
40
60
80
100
120
140
160
180
200
1 2
Favoráveis aos consumidores / Favoráveis às empresas
Decisões Liminares Proferidas em Segunda Instância
TJSP
TJRS
 
Ainda que sutilmente mais propensa à manutenção do dólar como índice de reajuste dos 
contratos, verifica-se razoável divisão da jurisprudência paulista. A jurisprudência gaúcha, por sua 
vez, foi quase unanimemente favorável à exclusão do dólar (e estabelecimento de outro índice, 
como visto, na maioria das vezes o INPC, do IBGE) para revisão das parcelas restantes dos 
contratos. 
 
 
24 
114
1017
70
11
0
200
400
600
800
1000
1200
1 2
Favoráveis aos consumidores / Favoráveis às empresas
Decisões Definitivas Proferidas em Segunda Instância
TJSP
TJRS
 
A manifestação dos Tribunais em caráter definitivo reproduziu as observações feitas em 
caráter liminar, mantendo-se o TJSP sutilmente mais favorável aos consumidores e à revisão dos 
contratos, ao passo que o TJRS mostrou-se favorável às empresas em cerca de apenas 1% dos 
casos. 
 
Estabelecido esse interessante panorama de três possíveis decisões judiciais, uma pergunta 
pode surgir ao leitor: afinal, como um juiz decide? 
 
A obtenção da decisão jurídica como simples operação silogística (em que a premissa maior 
é a norma, a premissa menor é o ato ou omissão e, como conclusão, apresenta-se a decisão) não 
representa concepção pacífica40, mostrando-se ainda mais limitada em um contexto de problemas de 
interpretação, inflação legislativa, lacunas normativas, antinomias e considerações 
principiológicas41. Diz-se mesmo, por vezes, que a obtenção da decisão judicial é em verdade muito 
melhor representada pelo procedimento inverso ao da operação silogística. Nela, o primeiro passo 
 
40
 “Já Aristóteles, afinal, notara que, se era fácil relativamente identificar a premissa maior – o princípio ético vinculante 
para o comportamento: a justiça a ser respeitada – era extremamente difícil justificar e aceitar que o conflito descrito na 
premissa menor (a ação x é injusta) constituísse um caso particular contido na generalidade da premissa maior. Ou seja, 
a aceitação geral de que a justiça deve ser feita não leva, por si, à premissa de que a ação x é injusta e, portanto, deve 
ser rejeitada. É preciso dizer o que é a justiça e provar que a ação x é um caso de ação injusta. Eis o problema da 
subsunção”. FERRAZ FILHO, Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito – Técnica, Decisão, Dominação. São 
Paulo Atlas, 1998, p. 315. 
41
 Ver, por exemplo, FARIA, José Eduardo. Justiça e Conflito – Os Juízes em Face dos Novos Movimentos Sociais, São 
Paulo, RT, 1992. 
 
25 
da atividade de decidir é determinar do conteúdo dispositivo. A conduta da premissa maior 
estabelece-se apenas em momento posterior, com a função de justificar o conteúdo da decisão42. Em 
função dos labirintos de normas e da interpretação sistemática, é quase sempre possível, com algum 
“malabarismo jurídico”, elaborar uma premissa maior de acordo com a (ou alguma) lei. 
 
Se correta a assunção de que o conteúdo da decisão por vezes precede a determinação da 
categoria jurídica em que o caso se deve subsumir, sobreleva-se em importância o estudo de quais 
possam ser os critérios que verdadeiramente orientam o juiz na atividade de decidir. Surge, assim, 
uma outra pergunta: Admitindo-se que um magistrado indispense certas operações lógicas para 
fundamentar as decisões que profere (ao menos para si próprio, independentemente dos elementos 
que aponte na redação da sentença), de que instrumentos se serve o magistrado para obter a solução 
de um caso? 
A Filosofia do Direito é o campo em que as respostas a essas perguntas podem ser melhor 
exploradas. Um dos pontos de vista (mas não o único e possivelmente não o predominante) pode 
ser visto no quadro abaixo: 
 
“Consoante os ensinamentos de Perelman e Tyteca43, argumentação opõe-se a 
demonstração. A teoria da demonstração funda-se na idéia de evidência, concebida como a força 
diante da qual todo pensamento do homem normal tem de ceder. Em conseqüência, no plano do 
raciocínio demonstrativo, toda prova seria redução à evidência, sendo que o evidente não teria 
necessidade de prova. Em contraposição, a teoria da argumentação desenvolve-se a partir da idéia 
de que nem toda prova é concebível como redução à evidencia, mas requer técnicas capazes de 
provocar ou acrescer a adesão dos espíritos às teses que se apresentam. A demonstração, nesse 
sentido, liga-se aos raciocínios lógico-formais, como os matemáticos, enquanto a argumentação, 
não pressupondo a construção de sistemas axiomatizáveis, com seus axiomas e regras de 
transformação, refere-se antes aos raciocínios persuasivos, como são os políticos e os jurídicos, cuja 
validade é restrita a auditórios particulares, não pretendendo adquirir a universidade da 
demonstração. 
 
Na mesma linha de pensamento, o jusfilósofo Theodor Viehweg44, ao versar o tema, entende 
a argumentação jurídica como uma forma típica de raciocínio. O raciocínio jurídico, para ele, tem 
um sentido argumentativo: raciocinar, juridicamente, é uma forma de argumentar. Argumentar 
significa, num sentido lato, fornecer motivos e razões dentro de uma forma específica. Captando o 
pensamento jurídico na sua operacionalidade, Viehweg assinala, pois, que a decisão jurídica 
aparece, neste sentido, como uma discussão racional, isto é, como um operar racional do discurso, 
 
42
 SICHES, L. Recasens. Tratado General de Filosofia del Derecho, Mexico, Porrua, 1959, citado por FERRAZ JR. 
Introdução ao Estudo do Direito – Técnica, Decisão, Dominação, op. cit. p. 316. 
43
 PERELMAN, Chaim, TYTECA, L. Albrechts. Traité de l’argumentation, Bruxelles, Université Libre de Bruxelles, 
1970. 
44
 Topik und Jurisprudenz. Munchen, Beck, 1974. 
45
 Introdução ao Estudo do Direito – Técnica, Decisão, Dominação, op. cit. p. 323. 
 
 
26 
cujo terreno imediato é um problema ou um conjunto deles. O pensamento jurídico de onde emerge 
a decisão deve ser, assim, entendido basicamente como ‘discussão de problemas’.”45 
 
 
 
Em termos muito casuísticos e não generalizantes, a análise de alguns acórdãos mostra 
alguns dos elementos que os juízes levam em consideração para decidir. Interessantes situações 
aquelas em que o autor da ação revisional pleiteava a eleição de índice menos oneroso que o dólar 
em função de sua hipossuficiência46 como consumidor, tendo como objeto da demanda, todavia, um 
veículo de alto luxo. Decisõesque desconsideravam o tipo de veículo objeto do contrato, porém, 
também eram muito comuns. 
 
“Arrendamento mercantil. Revisão de cláusula contratual. Indexação das prestações pelo dólar norte-
americano. Queda das bandas cambiais. Teoria da imprevisão e onerosidade excessiva. Inadmissibilidade. O art. 6° do 
Código de Defesa do Consumidor se aplica ao contrato de “leasing” no entanto, o propósito do legislador ao inserir 
esta cláusula legal, não seria, por óbvio, o de permitir fosse negada validade à Teoria Geral do Contrato. No caso, não 
se pode falar em imprevisibilidade de um contrato que tem por base de atualização a denominada variação cambial. 
Ora, variação cambial significa possibilidade de elevação ou diminuição da cotação de determinada moeda em face de 
outra. Historicamente, para nossa infelicidade, no Brasil, costumeiramente as variações tem se dado em sentido de 
baixa. Sintomaricamente somente quando a moeda estrangeira tem sua cotação elevada em face do Real é que o 
devedor reclama de sua incidência; quando o viés do dólar era de baixa, não havia qualquer discordância quanto à 
sua aplicação. Tampouco há que se falar no caso concreto em onerosidade excessiva. Nesse passo verifico que os autos 
dizem respeito à aquisição de veículo importado, zero quilômetro, marca MITSUBISHI, modelo L200 4x4, ano 1998 
Não cuidam, portanto, de um carro popular, ou mesmo daquele vendido à população em geral com o sugestivo apelo 
consumista de “semi-usado “. Quem adquire um carro importado, último tipo, tem pleno conhecimento de que seu 
preço tanto no mercado internacional quanto no nacional, tem seu valor atrelado à moeda norte-americana, e, por 
isso, presume-se ter condições de pagar o seu valor de mercado (vale dizer, o seu preço cotado em dólar norte-
americano). Em vista disto, não se revela razoável a presunção, ante as condições do negócio realizado pelo 
arrendatário, que estivesse ele impossibilitado de satisfazer as contraprestações atreladas ao dólar. Deveria o autor, 
portanto, ter demonstrado no que residiria a impossibilidade de cumprir aquilo que ajustara livremente no contrato. 
Do contrário, revela-se desprovido de razão qualquer pedido revisional. RECURSO PROVIDO”47 
 
Nos anos que se seguiram ao turbulento episódio de revisão dos contratos, foi consenso não 
só entre os entrevistados, mas na população em geral, que novos contratos de arrendamento 
 
46
 A hipossuficiência do consumidor se divide em hipossuficiência jurídica, técnica e econômica, para a maior parte da 
doutrina. O tema é de profundo interesse e a delimitação dos diferentes tipos de hipossuficiência abrangidos pela 
doutrina e jurisprudência do Brasil e do muno, palpitante. 
47
 Segundo Tribunal de Alçada Cível de São Paulo. Apelação com revisão nº680639-00/7. Relator: Desambargador 
Amorim Cantuária. No mesmo sentido, “Leasing com variação cambial – Teoria da imprevisão. Aumento repentino do 
dólar americano. Veículo Chevrolet Tigra ano 1998. Expio. Ribeiro da Silva vencido, por entender não se tratar de 
veículo popular. Agravo Improvido.” Segundo Tribunal de Alçada Cível de São Paulo. Agravo de Instrumento nº 
605780-00 /6 Relator: Desembargador Campos Petroni. Também: “Tenho entendido pela aplicação do Código de 
Defesa do Consumidor, art. 6o, nos casos de veículo popular, em que seus adquirentes acreditaram nas promessas do 
Real moeda forte em relação ao dólar norte-americano, e não atinaram para as conseqüências das cláusulas impressas 
em letras miúdas. Todavia, no caso dos autos trata-se de carro importado BMW, modelo 318TI, ano 1997, no valor de 
R$ 33.628,65”. Segundo Tribunal de Alçada Cível de São Paulo. Agravo de Instrumento n. 575.649-8, voto n. 3872. 
Relator: Ribeiro da Silva. Ver ainda Segunda Vara do Guarujá. Processo n.º 593/99 – Reintegração de Posse. Processo 
n.º 804/99 – Consignação em Pagamento. Juiz de Direito: Guilherme da Costa Manso Vasconcellos. 
 
 
27 
mercantil para pessoas naturais haviam “sumido” do mercado. Os entrevistados foram perguntados 
se a postura do Poder Judiciário teria sido a responsável por tal desaparecimento. O raciocínio que 
permeava a pergunta era o de que o estabelecimento judicial de índices menos onerosos ao 
consumidor, bem como a decisão “meio a meio”, representariam perdas para as empresas de 
arrendamento mercantil, pois através da intervenção estatal do Poder Judiciário os entes privados 
poderiam se sentir desestimulados a continuar atuando em um mercado de incerteza quanto ao 
retorno financeiro48. A análise econômica do direito, também chamada law and economics é a 
corrente doutrinária que estuda o impacto dos fenômenos jurídicos na economia, bem como a 
relação da economia com os institutos jurídicos. 
 
 Parte dos entrevistados respondeu positivamente à pergunta, afirmando que a postura do 
Poder Judiciário interferia na realização dos negócios. 
 
 
Diretor Jurídico do Banco ¥, ligado à montadora ¥: Eu acho que a gente tem tentado mostrar é que 
isso tudo pode gerar um impacto na economia do Estado. Porque obviamente eu acho que se vai 
olhar com mais cuidado pra que é que se financia. A gente tem uma taxa refletindo o risco. Então, 
ao mesmo tempo que fazendo acordos a gente incrementa a indústria, à medida em que a justiça 
também alberga esse tipo de ações você pode estar imaginando o efeito contrário: uma taxa que 
cubra o risco do local. Eu não tenho nada sobre [que comprove] isso, tá? Mas é uma conseqüência 
que é quase que natural. 
 
 
Essa postura não foi, porém, confirmada pela maior parte dos entrevistados. Na verdade, boa 
parte deles até mesmo se surpreendeu com a pergunta, estranhando que houvesse, no meio jurídico, 
quem apontasse a redução dos contratos de arrendamento mercantil como decorrência do negativo 
impacto das decisões do Poder Judiciário. Uma das apostas de diminuição dos contratos de 
arrendamento mercantil para pessoas naturais era a redução do IOF nos anos que se seguiram a 
1999, fazendo com que as vantagens do arrendamento mercantil em relação a outras formas de 
obtenção de crédito para aquisição de veículos não fossem mais tão significativas. 
 
 
48
 Para reconstruir o argumento da pergunta, ver o artigo ARIDA, Pérsio, BACHA, Edmar Lisboa e LARA-RESENDE, 
André. “Credit, Interest and jurisdictional uncertainty: Conjectures on the case of Brazil”, Rio de Janeiro, Instituto de 
Estudos Política Econômica, Casa das Garças, 2004. (Publicado também em Inflation Targeting, Debt, and the 
Brazilian Experience: 1999 to 2003, GIAVAZZI, GOLDFAJN E HERRERA (orgs.), Cambridge, MIT Press, 2005. 
 
28 
Estudo estatístico realizado através do Centro de Estatística Aplica do Instituto de 
Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo49 mostra que a impressão de alguns juristas 
de que o sumiço de novos contratos de arrendamento mercantil não teve qualquer relação com as 
decisões dadas pelo Poder Judiciário. Sua correlação existe mesmo é com a cotação do dólar. Isso 
mostra que uma utilização superficial dos instrumentos que a análise econômica do direito fornece 
pode gerar conclusões precipitadas extremamente errôneas50. 
 
O estudo da estatística pode ser uma excelente arma para que o jurista compreenda melhor 
seu ofício. Apenas para que se tenha uma idéia visual de como o comportamento de novos contratos 
de arrendamento mercantil se deu em relação a diferentes fatores que poderiam ter influído no 
mercado, dispomos abaixo a superposição de algumas séries temporais, duas a duas. Destaque-se, 
porém, que a mera análise inferencial não permite tirar conclusões mais profundas, pois os dados 
são aqui dispostos de maneira bruta, não tendo sequer sido feitas séries estacionárias51. 
 
Porcentagem de contratos de arrendamento mercantil realizados por pessoas naturais 
superposto ao número de decisões judiciais. 
 
 
49
 Para a análise estatísticacompleta que compara as séries temporais do volume de novos contratos com o IOF, o dólar 
e as decisões do TJSP, ver TOLOI, Clélia Maria de Castro; GOMES, Edilene Freire Nascimento e NOGUEIRA, Karen 
Elisa do Vale. Relatório de análise estatística sobre o projeto: “Evolução do número de contratos de leasing para 
veículos”. São Paulo, IME-USP, 2005. (RAE – CEA – 05P17). 
 
50
 Cf. BERTRAN, Maria Paula Costa. “Análise Econômica como Critério Orientador da Decisão Judicial: Aplicações e 
Limites. Estudo a partir do caso de revisão dos contratos de arrendamento mercantil com paridade cambial”, defendida 
na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, em outubro de 2006. Texto a ser publicado com o título 
provisório de Judiciário e Economia: algumas verdades e muitos mitos. Estudo a partir do caso de revisão dos 
contratos de arrendamento mercantil. No prelo. 
51
 As séries estacionárias são seqüências de subtrações que retiram os vieses de alta ou baixa de uma seqüência de 
números. Ao realizar tal procedimento pode-se efetivamente saber qual foi o comportamento do dado que se observa, 
sem ter impressões erradas, causadas pelos dados antecedentes ou subseqüentes. 
 
29
 
0 10 20 30 40 50
jun/97
dez/97
jun/98
dez/98
jun/99
dez/99
jun/00
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jun/01
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jun/02
dez/02
jun/03
dez/03
jun/04
dez/04
jun/05
% Contratos de leasing realizados 
por Pes. Fís. 
0 30 60 90 120
150
Número de Decisões Judiciais
 
 
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jan/03
jul/03
jan/04
jul/04
jan/05
jul/05
% Contratos de leasing realizados 
por Pes. Fís. 
0 1 2 3 4 5
Cotação Média do Dólar
 
 P
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52
 
 
 Por que tudo isso aconteceu? Por que o IOF se mostrou tão pouco influente no 
comportamento dos contratos? Por que o gráfico das decisões judiciais é um morro seguido um 
vale? O que é preciso saber para prestar consultoria jurídica a uma empresa de arrendamento 
mercantil? Quais deveriam ter sido as preocupações do legislador que tratou dessa matéria? Quais 
foram seus acertos? Quais foram suas falhas? Como a Argentina lidou com problema semelhante, à 
época do “corralito”? Quem pôde obter a decisão do STJ ganhou em relação aos que fizeram 
acordos53? Finalmente: como comprar um carro novo? 
 
 Que essas e muitas outras dúvidas advenham da leitura deste caso. 
 
Bons estudos!
 
52
 Gráfico extraídos de TOLOI, Clélia Maria de Castro; GOMES, Edilene Freire Nascimento e NOGUEIRA, Karen 
Elisa do Vale. Relatório de análise estatística sobre o projeto: “Evolução do número de contratos de leasing para 
veículos”. São Paulo, IME-USP, 2005. (RAE – CEA – 05P17). 
53
 Interessantíssimas pistas sobre isso podem ser encontradas em WECHSLER, Sérgio; KOBAYASHI, Davi; 
BONASSI, Fernando Vieira e REGINATO, Luis Gabriel Marques “Relatório de Análise Estatística sobre o projeto 
‘Análise Econômica do Direito aplicada a decisões judiciais: o caso dos contratos de arrendamento mercantil para 
compra de veículos com cláusulas de reajuste associadas ao dólar’.” São Paulo, IME-USP, 2005. (RAE – CEA – 
06P06). 
 
 
31 
 
ANEXO I 
 
Três foram as principais fontes para obtenção de dados para realização deste trabalho: i) 
entrevistas com representantes das empresas de arrendamento mercantil mais atingidas pela revisão 
dos contratos de arrendamento mercantil; ii) levantamento das decisões judiciais proferidas pelo 
Tribunal de Justiça de São Paulo - TJSP e pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - TJRS, ou 
compiladas por entidades privadas e revistas jurídicas, bem como mapeamento das várias decisões 
proferidas monocraticamente por ministros do STJ antes da postura final do Tribunal, que 
consolidou a posição “meio a meio”. 
 
A primeira fonte de dados contou com os depoimentos, guiados por roteiro de entrevista 
(Vide ANEXO I), dos representantes dos agentes do mercado de arrendamento mercantil. Foram 
entrevistadas oito instituições financeiras. Foram ainda entrevistados executivos das duas 
associações representativas do setor. O conteúdo das entrevistas foi orientado por um questionário, 
também anexo deste relato de jurisprudência, para fins didáticos e elucidativos de como fazer uma 
pesquisa de campo. O conteúdo das entrevistas distanciaram-se por vezes do roteiro, quer porque os 
agentes não tinham lembrança de detalhes perguntados (destacadamente sobre elementos 
quantitativos), quer porque suas percepções sobre o episódio extrapolavam qualquer previsão do 
roteiro. 
 
A segunda fonte de informações, ainda não concluída, é o levantamento de decisões 
judiciais. Tanto em caráter liminar como na análise de acórdãos, o levantamento jurisprudencial foi 
feito de maneira exaustiva no TJRS54. Do levantamento gaúcho foram obtidas mil duzentas e vinte e 
quatro (1224) decisões. No TJSP não há, diferentemente da primeira fonte, possibilidade de coleta 
exaustiva das decisões através de qualquer sistema (disponível na internet ou no próprio tribunal) de 
busca de jurisprudência por tema ou assunto55. 
 
A escolha da coleta de dados desses dois tribunais, especificamente, objetiva investigar 
eventuais diferenças de sensibilidade aos argumentos formadores da decisão, bem como de seu 
 
54
 Segundo informação constante do sítio do próprio TJRS. Do mesmo modo, investigações no Tribunal de Justiça de 
Minas Gerais – TJMG e no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – TJRJ são passíveis de serem feitas exaustivamente, 
pois todas as decisões (desde os anos 2000 e 1996, respectivamente) são dispostas na base de buscas. As informações 
foram prestadas por Verônica Paiva Leal (bibliotecária - TJMG) e Rita da Matta (técnica judiciária - TJRJ). 
55
 Informação fornecida por Maria Del Carmen Alvarez (escrevente-chefe – TJSP). 
 
32 
caráter dispositivo, dada a visão generalizada de ser o TJRS mais defensor dos interesses dos 
consumidores56 enquanto que o TJSP seria colegiado de maior conservadorismo. Com isso 
pretende-se mostrar que a reconstrução de jurisprudência de um caso importante, como o da revisão 
dos contratos de arrendamento mercantil, deve recuar no tempo e procurar a formação da decisão 
em primeiro e segunda instâncias, e não apenas na manifestação de uma Corte Superior. 
 
No TJSP os desembargadores escolhem quais decisões devem ser dispostas ao público 
através de acesso eletrônico e quais não deverão ser tornadas públicas através dos sistemas de busca 
de jurisprudência. Dado, portanto, o caráter enviesado da amostra disponível pela busca simples de 
jurisprudência, optou-se, no TJSP, por fazer uma busca pelo nome das partes dos processos (o 
acesso a tal recurso permite a análise da totalidade dos dados, exaustivamente, não passando por 
qualquer critério de seleção, como acontece com o acervo de consulta por tema ou palavra chave). 
Para a obtenção de um número adequado de ementas para ser submetido a análises estatísticas, 
foram pesquisadas todas as decisões de duas empresas de arrendamento mercantil (Fiat Leasing e 
Safra Leasing) e cerca de setenta por cento das ementas de uma terceira (BCN Arrendamento 
Mercantil S.A.), todas elas, à época, destacadamente atingidas pela revisão dos contratos. Das 
decisões analisadas, (aproximadamente cinco mil no total, sendo que desse montante,

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