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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL ERIKA RODRIGUES SILVA RESUMO POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL Rio de Janeiro 2018 1 - POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL A Política de Saúde no Brasil se configura de maneira diversa dependo do período político e situação econômica por que passa o país. Para que se entendam os marcos históricos, que se consolidaram as políticas de saúde e suas determinações, para a população em diferentes momentos, será feita uma análise dos governos desde 1930 quando o estado começa a intervir na saúde ate os dias atuais que se seguem com medidas neoliberais e retirada de direitos. A intervenção do Estado na saúde começa a ocorrer na década de 30 para mediar a relação entre as classes e controlar as reivindicações da classe trabalhadora, as ações do Estado eram pontuais com uma assistência médica baseada na filantropia. Segundo Braga (Braga e Paula, 1985:41-42) a saúde emerge como Questão Social no início do século XX, junto com a economia capitalista de exportação de café, tornando latente a necessidade do trabalho assalariado. A luta por saúde sempre foi uma pauta presente na reivindicação dos trabalhadores e a criação das Caixas de Aposentadorias ( CAPs) em 1923 com a lei Eloy Chaves e Institutos de Aposentadorias e Pensões ( IAPs) em 1930 foram uma estratégia do governo, para mediar o conflito entre a relação capital trabalho. Nem todas as categorias tinham acesso as CAPs e IAPs só determinadas categorias de trabalhadores tinham acesso a elas, isso dependia muito da importância da profissão para o Estado e da organização política dos trabalhadores na luta por implementação das CAPs em suas empresas. Os trabalhadores recebiam o benefício de acordo com as suas contribuições, para as CAPs e IAPs, os benefícios eram desde assistência médica-curativa e fornecimento de medicamentos; aposentadoria por tempo de serviço, velhice e invalidez, pensão para os dependentes e auxílio funeral. Devido ao processo de industrialização iniciado em 1930 o Estado passa a intervir mais ativamente na sociedade, e através de políticas sociais tenta conter a reivindicação dos trabalhadores. Na década de 30 a atuação do Estado em relação a política de saúde estava relacionada diretamente com a profissão do trabalhador sendo atrelada a previdência, a saúde pública não era universal e nem direito de todos. Segundo Bravo (2016) a política de saúde dos anos 30 a 40 adotou medidas pontuais como: Ênfase nas políticas sanitárias, Coordenação dos serviços estaduais de saúde dos estados de fraco poder político econômico, em 1937, pelo Departamento Nacional de Saúde; Interiorização das ações para as áreas de endemias rurais, a partir de 1937, em decorrência dos fluxos migratórios de mão-de-obra para as cidades, Criação de serviços de combate às endemias (Serviço Nacional de Febre Amarela,1937; Serviço de Malária do Nordeste, 1939; Serviço de Malária da Baixada Fluminense, 1940, financiados, os dois primeiros, pela Fundação Rockefeller – de origem norte- americana); Reorganização do Departamento Nacional de Saúde, em 1941, que incorporou vários serviços de combate às endemias e assumiu o controle da formação de técnicos em saúde pública. A consolidação da Política Nacional de Saúde iniciada na década de 30 aconteceu de 1945 a 1950. Houve a criação do Serviço Especial de Saúde ( SESP) durante a 2ª Guerra Mundial que contou com um financiamento através de convênio com o governo americano. Já no período que vai de 1945 a 1964 a política de saúde no Brasil enfrenta a dificuldade de controle de doenças infecciosas e causadas por parasitas o que ocasionou muitas mortes. A prática mercantilista da saúde começa a se configurar a partir dos anos 50 com a implementação das empresas privadas com redes de hospitais particulares que visavam o lucro e pressionavam para a privatização dos serviços médicos, e que só teve um aumento expressivo após 64. A configuração das políticas de saúde no período de 1964 a 1974 foi focada na assistência com grande repressão às categorias que reivindicavam melhorias nos serviços oferecidos. A política assistencial dessa época tinha como objetivos principais controlar os conflitos sociais, dar legitimidade ao governo ditatorial, alavancar a acumulação capitalista além de vigilância e controle social. Neste molde de retirada de direitos e onde havia uma regulação da vida social dos indivíduos, o setor da saúde assume características capitalistas e incorpora as tecnologias externas na saúde nacional. O setor privado ganha espaço com a ajuda do Estado principalmente na área de medicamentos e equipamentos médicos, o Estado usa a máquina para fortalecer o capital internacional através dessas indústrias. Rodriguez (1994) deixa claro que já havia estudos a partir da década de 70, falando sobre o modelo econômico adotado pelo país na época da ditadura que era um modelo de concentração de renda sem distribuição de serviços à população, isso acarretava um adoecimento maior da população. Foi uma época onde o governo privilegiava a iniciativa privada do que a pública deixando a população a margem sem direito a participação. Os estudos sobre a forma de administração do governo não chegavam a população devido a censura, só conseguiam algum acesso a esses estudos alguns técnicos e professores de universidades. Somente na metade da década de 70 que devido a pressões se começa uma inserção da |população na política e reorganização dos movimentos sociais. Na saúde se inicia o movimento sanitário que se utilizou dos estudos feitos anteriormente para falar da forma de administração do governo e seus efeitos na saúde da população, e de como o modelo de saúde utilizado até o momento não condizia com as necessidades da população. Esse movimento, além de denunciar começou a criar alternativas e propostas para a saúde. O movimento de reforma sanitária ganhou força e adesão de diversos atores sociais como: movimentos sociais, sindicatos, técnicos das instituições de saúde, população em geral, parlamentares etc. Assim em 1979 no I Simpósio Nacional de Política de Saúde realizado pela Comissão de Saúde da Câmara dos deputados o movimento representado pelo CEBES ( Centro Brasileiro de Estudos de Saúde) apresentou e discutiu pela primeira vez a proposta de reforma sanitária com a implementação de um sistema unificado de saúde. O movimento sanitária não conseguiu de implementar suas ideias logo, mas, devido a crise econômica e pressão social e passou a ser um parâmetro de um sistema de saúde democrático e igualitário, sendo usado pela população e profissionais para lutar pela saúde. Na década de 80 a sociedade brasileira passa por diversas modificações com o fim da ditadura mas, os avanços vivenciados nesta época não foram implementados em sua totalidade o que acarretou a falta de melhorias reais para a população, muitos projetos implementados nesta época não foram consolidados de forma correta. Com a redemocratização da sociedade vários atores entram em cena para intervir na sociedade como um todo. Na área da saúde vários grupos e entidades como o Centro Brasileiro de Estudos ( CEBES), movimento sanitários, movimento urbano , sociedade civil trazem a tona o discurso da saúde como direito de todos e dever do Estado, trazem a noção de reestruturação do modelo de saúde com a criação de um Sistema Unificado de Saúde. Segundo Rodriguez (1994) foi a partir da década de 80 que se criou uma possibilidade de mudança no sistema de saúde com pressão popular, onde já começava a se organizando na luta pela redemocratização do país. Foi na década de 80 que se inicia o processo de mudança do sistema de saúde sem qualidade, ineficiente e que não atendia as necessidades da população. Um fato importante foi a realização da 8ª Conferência Nacional de Saúde que foi realizada em março de 1986 em Brasília onde foi debatido temas como : A Saúde como direito, Reformulação doSistema Nacional de Saúde. A 8ª Conferência foi um marco, pois, teve a participação de vários segmentos da sociedade civil, a principal proposta foi a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) e a Reforma Sanitária. A Reforma Sanitária segundo Rodriguez(1994), é entendida como um conjunto de medidas que possibilitem uma qualidade de vida a população e consequentemente a saúde perpassa por essas medidas, isto é, ela está diretamente ligada a educação, saneamento, lazer, cultura, habitação, transporte e não apenas ausência de doenças.Nesse contexto a Reforma Sanitária entende que a saúde está diretamente ligada a outros aspectos da vida cotidiana da população usuária, não tem como ter saúde sem alimentação adequada, lugar digno para morar, acesso a cultura e lazer tudo está interligado. Podemos pensar então na noção de saúde como responsabilidade de todos os seguimentos da sociedade onde todos colaborem para que ela seja cada vez mais descentralizada, igualitária direito de todos e dever do Estado. A Reforma Sanitária trás a proposta do Sistema Único de Saúde, para que ela seja implementada na sua totalidade. Como o SUS é uma proposta da Reforma Sanitária, ele trouxe vários aspectos que visavam a melhoria do sistema de saúde no país. Como o SUS é um sistema ele é formado por várias instituições, são elas: União, Estado e Município, também entram o setor privado, que pode ser contratado ou ter um convênio com o setor público. O fato do SUS ser um sistema único, quer dizer que ele tem ser implementado e seguir os mesmos parâmetros em todo território Nacional. O SUS tem características principais , são elas : atender a todos sem distinção, e de graça, ou seja, mesmo que a pessoa tenha possibilidade de pagar ou não ela pode ser atendida no SUS, a pessoa não pode ter seu acesso negado por ter possibilidade ou não de pagar pelo serviço de saúde. O SUS deve atuar de maneira integral, essa atuação deve ser pautada no bem estar individual e coletivo da sociedade respeitando a dignidade da pessoa humana. As ações do SUS devem ser descentralizadas, ou seja, os municípios cuidam das ações na esfera municipal, as ações que englobam vários municípios ficam na esfera Estadual e as que englobam todo o território nacional ficam na esfera federal. O SUS deve ter no planejamento e implementação de suas ações racionalidade, que seria formular políticas e ações de acordo com a necessidade da população usuária, esse aspecto é muito importante, pois, nem sempre se pensa as ações de acordo com a necessidade da população, mas, sim visando lucro ou popularidade são ações verticalizadas formuladas de cima para baixa não atendendo as demandas dos usuários. O SUS deve ser eficaz e eficiente, ou seja, deve conseguir atender as demandas da população com qualidade e em tempo hábil, não desperdiçando recursos e os aplicando de acordo da necessidade da população, isto não vem ocorrendo nos dias atuais devido a má gestão do SUS, sua ineficiência e aplicação de recursos em ações que não garantem o bem estar da população usuária dos serviços. O SUS também deve ser democrático permitindo a participação da população, profissionais da área, instituições e usuários. Todos esses segmentos podem participar da decisão e formulação das políticas de saúde. A Reforma Sanitária, conseguiu implementar, grande parte das ações previstas no SUS na constituição de 1988, através de mobilizações, se conseguem ganhos significativo de suas pautas na área da saúde. A Constituição de 1988 trouxe como avanço aspectos relacionados à desigualdade social vivenciada pela população, mais precarizada ao longo dos anos.Como avanço conseguiu- se implementar: Direito universal a Saúde e o dever do Estado acabando com a utilização dos benefícios somente para segurados, as ações de saúde passaram a ser de responsabilidade pública e também seu controle, regulamentação e fiscalização, Constituição do Sistema Único de Saúde ( SUS) como falado anteriormente, com a integração de todos os serviços públicos com a participação da comunidade e de atendimento integral, participação do setor privado no setor de saúde somente de forma complementar, proibição da comercialização de sangue e seus derivados. Sendo assim, através do Movimento da Reforma Sanitária, o SUS foi incorporado quase em sua totalidade e para organizar o seu funcionamento se criou a LOS (Lei Orgânica da Saúde) de nº 8080 e nº 8081 que só foram aprovadas em 1990, já no Governo Collor. A lei demorou para ser aprovada devido a interesses de grupos contrários a sua aplicação, que queriam continuar com o antigo sistema que privilegiava o setor privado favorecendo o clientelismo e a corrupção. Foi efetivamente com o impeachment de Collor e posse de seu vice Itamar Franco que se avançou de forma a pôr em prática o que estava previsto na LOS, houve o decreto da norma nº1 de maio de 1993, que viabilizou a descentralização das ações e serviços de saúde, essa norma visava dar uma autonomia para Estados e Municípios em relação a aplicação dos recursos do SUS. Ainda em 1990, houve um grande avanço no nível federal com a reestruturação do SUS, e a extinção do INAMPS (Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social) que ainda controlava as ações e agia de forma verticalizada. O SUS não chegou a ser implementado em sua totalidade, e até os dias atuais vem sem sendo alvo de disputa entre os que querem um sistema público, universal e de qualidade alinhado com os fundamentos do SUS, e os que querem a privatização dos serviços públicos, estado mínimo, subsídio ao capital privado e mão de obra barata e sem qualificação. Atualmente o Estado intensifica suas ações dá início a política de ajustes neoliberais. Seguem se os ataques às políticas de Seguridade Social, o Estado passa sua responsabilidade de atuação para o setor privado e fica atuando somente como regulador e mediador. Com esses desmontes vividos tanto pela saúde como pela previdência a população fica cada vez mais precarizada sofrendo com a perda de direitos trabalhistas e sociais, a educação também e atacada tentando se implementar um sucateamento em escolas e principalmente em universidades públicas. Estes desmontes do setor público por parte do Estado neoliberal servem para justificar a privatização e gerar novas formas de obtenção de lucro para o capitalismo. Devido às medidas neoliberais iniciada nos anos 90, o SUS não foi implementado de forma satisfatória e também houve um descaso em relação à fiscalização das ações de saúde ampliando o sucateamento e descumprindo as propostas da Reforma Sanitária tornando a noção de saúde cadê vez mais privatista e de acesso de poucos. Nos dias atuais com a precarização dos serviços oferecidos pelo SUS, perdeu-se totalmente os parâmetros defendidos na reforma sanitária e implementados na constituição de 1988. A noção de saúde como direito, ações de cunho curativo e preventivo, descentralização da gestão, seja ela financeira ou administrativa, que não chegaram a ser implementadas em sua totalidade. No atual desgoverno de Temer as proposições implementadas na reforma sanitária estão quase extintas. Está havendo uma deterioração dos serviços públicos e privilegiamento do setor privado, onde o Estado cria medidas que beneficiem esses setores que acabam competindo com o público. Lima explica essa atuação do governo como: [...] desfinanciamento do Sistema Único de Saúde e de deterioração dos serviços públicos, observa-se a reconfiguração da relação público-privada. Por determinação da Constituição Federal e da Lei Orgânica da Saúde, as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos passam a ser privilegiadas em detrimento dos hospitais contratados, uma tendência que já vinha sendo operacionalizada desde os anos 1980 e se acentua ao longo da década de 1990. A assistência médica suplementar, isto é, o segmento de planos e seguros de saúde privados também começa a reestruturar e diversificar suas ações empresariais, ao mesmo tempoem que o Estado elabora políticas públicas de apoio a esse setor, que irão competir com as instituições públicas. Isso acontece, particularmente, nas políticas baseadas em deduções e subsídios fiscais, que, ao substituírem as relações diretas entre a previdência social e as empresas empregadoras, irão subsidiar, indiretamente, as empresas médicas,contribuindo para o aprofundamento e a cristalização da segmentação do sistema e dos provedores de serviços de acordo com o status socioeconômico das demandas. ( LIMA,2010,p.283). Neste atual governo de Temer a população vem passando por uma verdadeiro caos, tanto na saúde como na educação, e também na previdência e relações de trabalho. Hoje a área da saúde, e educação não receberá nenhum aumento de verba por 20 anos, as relações de trabalho foram flexibilizadas o que trará mais precarização para classe trabalhadora, a todo custo tentam votar a contra Reforma da Previdência o que levará a perda de direitos, quase que inviabilizando a possibilidade de aposentadoria . São medidas neoliberais que favorecem o capitalismo selvagem, que tenta alcançar novas áreas da vida social transformando serviços públicos que favorecem o bem estar social em mercadoria desvinculando a ideia de “ saúde como direito de todos e dever do Estado”( BRAVO,1999; BRAVO; MATOS,2001).
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