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Tuberculose extrapulmonar (1)

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TUBERCULOSE EXTRAPULMONAR 
 
TB PLEURAL 
E a forma mais comum de tuberculose extrapulmonar em nosso meio. 
O mecanismo mais frequente da TB pleural (ou pleurite tuberculosa) é a ruptura de um 
pequeno foco primário de localização subpleural. Poucos bacilos atingem o espaço pleural, 
desencadeando uma reação imunológica de hipersensibilidade granulomatosa, levando à 
inflamação das pleuras visceral e parietal, com a produção de exsudato. A maioria dos 
pacientes é adulta jovem e manifesta os sintomas cerca de 1-3 meses após se infectar pelo 
BK. 
O quadro clínico pode ser agudo ou subagudo, sendo composto por febre, dor pleurítica e 
tosse seca. A dispnéia pode ocorrer nos casos de derrames volumosos que se instalaram mais 
rapidamente. O derrame é caracteristicamente unilateral e de moderada intensidade. 
 
O diagnóstico deve ser pesquisado pela toracocentese, que revela um líquido amarelo-citrino, 
turvo ou raramente serossanguinolento (< 10% dos casos), cujo exame laboratorial confere 
com um exsudato, com densidade > 1.020, proteína > 2,5-3g/dl, apresentando uma 
celularidade alta (1.000-6.000 leucócitos/mm), com predomínio de mononucleares (linfócitos), 
exceto nos primeiros 15 dias de instalação (polimorfonucleares). Todo derrame exsudativo com 
celularidade elevada e predomínio de mononucleares (mais especificamente linfócitos) deve ter 
como um de seus principais diagnósticos diferenciais a TB pleural. 
Outras características do líquido pleural tuberculoso: glicose baixa, porém raramente chegando 
a níveis inferiores a 20mg/dl (média: 40-80 mg pH normal (7,30-7,40), ausência de eosinófilos e 
menos de 5% de células mesoteliais (frequentemente encontradas no derrame neoplásico). 
Apesar de não ser por natureza um exame confirmatório, a dosagem da ADA (adenosina 
deaminase) é um dos parâmetros de maior acurácia diagnóstica. Considerando o ponto de 
corte 60 U/ml, observa-se uma especificidade de 96%. A sensibilidade torna-se alta baixando-
se o ponto de corte para 40 U/ml. Em resumo, uma ADA> 60 U/ml é bastante sugestiva do 
diagnóstico, enquanto que uma ADA < 40U/ml torna-o bastante improvável (na prática, a 
maioria dos serviços utiliza o corte de 40U/ ml para a ADA). A dosagem do gama-interferon, 
utilizando um ponto de corte de 3,7, possui uma acurácia ainda maior que a ADA (95% versus 
90%). 
A positividade da baciloscopia (B.A.A.R.) é baixa: 10%. A cultura para BK só é positiva em 25-
30% dos casos. Portanto, não devemos esperar a bacteriologia para a confirmação 
diagnóstica, dado o seu baixo rendimento... O exame padrão-ouro para a confirmação 
diagnóstica é a biópsia pleural com avaliação do histopatológico e da cultura para BK do 
fragmento de tecido macerado. O cirurgião que biopsiar a pleura não deve esquecer de colocar 
um fragmento no formol (para histopatologia) e outro no soro fisiológico (para bacteriologia). O 
granuloma caseoso é encontrado em 75% dos casos. 
SAIBA MAIS... 
Mesmo na ausência de imagem radiológica de tuberculose pulmonar, cerca de 50% dos 
pacientes com a forma pleural da tuberculose apresentam positividade na cultura de escarro. 
Sendo assim, este pode ser um método auxiliar em casos de difícil diagnóstico. 
O tratamento 
O uso do corticóide (prednisona) pode acelerar a melhora, mas não há uma indicação formal 
para o seu uso, já que os estudos não demonstraram um benefício a médio e longo prazos. 
É curioso destacar que a TB pleural primária é muitas vezes autolimitada - ela acaba 
melhorando espontaneamente após 2-4 meses, mas a falta do tratamento específico permite 
uma evolução mais tarde para TB pulmonar crônica pós-primária em 65% dos casos. 
Não devemos confundir a TB pleural típica com o empiema tuberculoso. Este último é 
decorrente da rotura de uma 'caverna tuberculosa' para o espaço pleural, levando a instalação 
de uma fístula broncopleural, hidropneumotórax e grande quantidade de bacilos no espaço 
pleural. O tórax destes pacientes deve ser precocemente drenado, para evitar maiores 
sequelas. 
 
TB MILIAR 
É a forma disseminada da tuberculose, que ocorre quando o organismo não consegue oferecer 
resistência adequada à micobactéria. As crianças < 2 anos, os desnutridos, os idosos 
debilitados e os pacientes imunodeprimidos (SIDA/AIDS, uso de imunossupressores) são os 
indivíduos mais propensos a desenvolver esta forma de tuberculose. 
Os focos de disseminação linfo-hematogênica da primoinfecção, ao invés de serem contidos 
precocemente pelas defesas do organismo, evoluem para a formação de múltiplas pequenas 
lesões granulomatosas contendo bacilos em proliferação. A disseminação pode se manifestar 
nos seguintes órgãos ou tecidos: interstício pulmonar, fígado, baço, serosas, linfonodos 
periféricos e internos, pele, testículo, etc. 
O termo miliar inicialmente foi dado devido ao aspecto dos pulmões na necrópsia, que 
continham pequenos nódulos difusos, semelhante a sementes de milliet, uma espécie de 
gramínea. A radiografia de tórax pode revelar o padrão miliar em 90-95% dos casos.
 
Apesar de não ser patognomônico de tuberculose (pode ocorrer na pneumonia por varicela, 
histoplasmose, sarcoidose, silicose, metástases pulmonares difusas), um quadro sistêmico 
associado a esta imagem radiológica indica TB miliar até se prove o contrário. 
Existem três formas clínicas de TB miliar: 
(1) Forma aguda clássica 
(2) Forma críptica 
(3) Tuberculose não reativa disseminada 
A forma aguda clássica é a mais facilmente reconhecida. Caracteriza-se pelo início agudo/sub-
agudo de febre alta, adinamia, prostração ("toxemia'') e envolvimento multissistêmico. Os 
órgãos mais acometidos são: pulmão (tosse seca, dispnéia, taquipnéia), pleura (derrame 
pleural, uni ou bilateral), sistema reticuloendotelial (adenomegalia cervical, axilar e/ou 
intratorácica, hepatomegalia, esplenomegalia) e sistema nervoso central (meningite, 
meningoencefalite). A meningite se manifesta em 30% dos casos, com os sintomas clássicos 
de cefaléia e rigidez de nuca. A infiltração hepática provoca o aumento das enzimas, 
especialmente a fosfatase alcalina e, em segundo lugar, as transaminases e o LDH. Pode 
haver hiperbilirrubinemia e icterícia. O quadro hematológico na maioria das vezes revela 
apenas anemia normocítica normocrômica (anemia de doença crônica) e leucocitose 
neutrofílica. O comprometimento da medula óssea pode levar à reação leucemóide, 
trombocitose reativa ou à pancitopenia. 
O diagnóstico deve ser buscado a princípio pelo exame bacteriológico de vários materiais 
(escarro, aspirado gástrico, urina, aspirado ganglionar, líquido pleural e ascítico, hemocultura 
para BK). O escarro tem a baciloscopia positiva em 30-35% dos casos. 
O tratamento deve ser iniciado prontamente, mesmo com as baciloscopias negativas. A 
confirmação deve, no entanto, ser buscada através do exame histopatológico - procurando-se o 
granuloma caseoso. O local escolhido costuma ser o próprio pulmão. A broncofibroscopia com 
biópsia transbronquica revela o granuloma em 70-75% dos casos. A biópsia hepática confirma 
o diagnóstico em 70-80% dos casos e o aspirado de medula óssea, em 20-50% dos casos. 
Uma prova terapêutica positiva às vezes é o único critério considerado para se completar o 
esquema RIP 
As outras duas formas de TB miliar são menos frequentes (ou menos diagnosticadas). A TB 
miliar “críptica” caracteriza-se por um quadro bem arrastado, levando à perda ponderal 
progressiva e uma febre de origem obscura. O radiograma pode mostrar padrão miliar apenas 
no estágio mais avançado da doença. Este tipo de TB é mais comum nos idosos ou pacientes 
debilitados. Frequentemente leva ao óbito antes de ser diagnosticado. A forma não reativa ou 
anérgica deve ser lembrada especialmente nos pacientes com imunodepressão grave (ex.: 
SIDA) AIDS). Em vez de formar o granuloma, os tecidos infectados contêm uma grande 
quantidade de bacilos em focos de microabscessos neutrofílicos. Pequenosabscessos podem 
ser visualizados no fígado e no baço nos exames de imagem. Neste grupo de pacientes, 
culturas de vários tecidos, inclusive sangue, podem estar positivas em até 60% dos casos. 
 
TB MENÍNGEA 
A meningoencefalite é a forma mais comum de acometimento do SNC da tuberculose. O 
tuberculoma e o abscesso cerebral tuberculoso são formas comuns de apresentação. A 
aplicação rotineira da vacina BCG é uma importante estratégia visando reduzir o número de 
casos de TB meníngea em crianças pequenas - a faixa etária mais propensa. O fato de a 
criança ter sido vacinada não deve excluir a possibilidade de TB meníngea, pois um estudo 
nacional demonstrou que 54% das crianças com este diagnóstico possuem a cicatriz vacinal. 
A TB meníngea (ou meningoencefalite tuberculosa) é uma das formas mais graves de TB, com 
um alto potencial de morbimortalidade. 
Na criança, a TB meníngea é uma forma de tuberculose primária, podendo ou não estar 
associada à TB miliar. É frequente a história de contato com bacilíferos. Durante a 
disseminação linfo-hematogênica da primoinfecção, o bacilo se assenta em múltiplos focos 
subependimários. O epêndima é a camada de células que reveste internamente o sistema de 
ventrículos cerebrais e o canal medular. Nas crianças suscetíveis, estes focos continuam se 
proliferando, formando-se granulomas que expelem bacilos para o espaço subaracnóide. O 
efeito antigênico das proteínas do bacilo promove uma intensa reação inflamatória por 
fenômeno de hipersensibilidade. No adulto, provavelmente a maioria dos casos é pós-primária - 
decorrente da reativação dos focos subependimários previamente instalados na primoinfecção 
ocorrida há muitos anos. O restante da patogênese é semelhante ao que foi descrito acima na 
criança. 
O processo não termina aí... O intenso estímulo inflamatório provoca uma aracnoidite 
proliferativa, formando um exsudato espesso que se concentra na base do crânio e suas 
cisternas, comprimindo a origem de nervos cranianos e provocando vasculite dos vasos de 
pequeno e médio calibre que por ali passam. Os vasos com a parede inflamada trombosam, 
causando infartos cerebrais ou encefálicos, os principais responsáveis pelas seqüelas motoras 
da doença. As estruturas mais afetadas por esses infartos vasculares são: gânglios da base, 
córtex cerebral, ponte e cerebelo. 
Uma outra complicação que ocorre em 85% das crianças e em 50% dos adultos é a 
hidrocefalia comunicante. O exsudato espesso obstrui a passagem de líquor pelas cisternas ou 
a sua drenagem nas granulações aracnóides do sistema de seios venosos do encéfalo. A 
hidrocefalia aguda pode contribuir para o aumento da pressão intracraniana (hidrocefalia 
hiperbárica). 
 
O quadro clínico caracteriza-se por três fases evolutivas: 
FASE I - Pródromo (2-3 semanas) 
Febre, mal-estar, irritabilidade ou apatia (no caso da criança), inapetência, sintomas 
respiratórios. 
FASE II - Meníngea 
Febre + cefaléia persistente + sinais meníngeos Alterações de pares cranianos, hemiparesia, 
desorientação. 
FASE III - Fase avançada 
Torpor, coma, crise convulsiva Hemiplegia, coreoatetose 
 
O ideal é que o diagnóstico seja feito na fase II (meníngea), já que na fase I fica muito difícil a 
suspeição de uma meningite. Embora o quadro geralmente seja de instalação subaguda 
(semanas), é possível que se apresente como manifestação aguda, assemelhando-se à 
meningite bacteriana ou viral. A TB meníngea pode também se manifestar como uma 
encefalite, caracterizada por cefaléia, queda do nível de consciência e convulsões, com pouco 
ou nenhum sinal meníngeo. 
QUADRO DE CONCEITOS 
A TB meníngea é a causa mais comum de meningite (ou meningoencefalite) subaguda em 
nosso meio, devendo fazer o diagnóstico diferencial com outras causas de meningite subaguda 
(sífilis, criptococo, sarcoidose, linfoma, brucelose) e com quadros 'arrastados' de meningite 
bacteriana. A regra é: suspeitou - tratou; enquanto se busca chegar ao diagnóstico, o 
tratamento já deve ser iniciado. 
Entre as complicações clássicas da TB meníngea, podemos citar: 
- Compressão de pares cranianos (ordem decrescente de frequência: VI, III, IV, VII e 
VIII). 
- Hidrocefalia hiperbárica, levando à hipertensão intracraniana e ao papiledema. 
- Vasculite cerebral com Infartos, levando a déficits focais ou movimentos involuntários 
(ex.: coreoatetose). 
- Hiponatremia, por SIADH (ocorre em 45% dos casos, contribuindo para o quadro de 
torpor/ coma/convulsões). 
- Tuberculomas, que podem se manifestar como lesões expansivas. 
O diagnóstico deve ser inicialmente presuntivo, analisando-se os primeiros exames: 
(1) radiografia de tórax 
(2) TC de crânio contrastada 
(3) exame do líquor. 
A radiografia de tórax pode demonstrar alterações compatíveis com TB pulmonar primária em 
até 60% das crianças e com TB pós-primária ou cicatricial em até 45% dos adultos. 
A TC de crânio revela hidrocefalia em 85% das crianças e em 50% dos adultos, sendo um dado 
bastante sugestivo de TB meníngea, especialmente quando associada à hipercaptação da 
meninge basal, infartos cerebrais e/ou tuberculomas. Esses três últimos achados são 
detectados, respectivamente, em 40%, 15-30% e 5-10% dos casos. 
O exame do líquor é um componente essencial da avaliação diagnóstica. Como é o líquor da 
TB meníngea? O que chama atenção é um líquor com acentuada hiperproteinorraquia 
(proteína na faixa entre 100-500 mg/dl), pleocitose mononuclear (linfocítica), com uma 
celularidade entre 100-500/mm?, e uma hipoglicorraquia (glicose < 45 mg/dl em 80% dos 
casos). Em cerca de 20% dos casos, nota-se uma pleocitose com predomínio de PMN 
(neutrofílica), especialmente nos primeiros dias de doença. No paciente com SIDA/AIDS e TB 
meníngea, não há uma redução da proteinorraquia nem da pleocitose, ao contrário do que 
acontece na meningite criptocócica. 
A ADA (adenosina deaminase) liquórica teve alguns bons resultados em ensaios diagnósticos. 
Considerando-se o ponto de corte entre 5-10 U/ml, a acurácia diagnóstica atinge 90% (acima 
de 10 U/ml é sugestivo e abaixo de 5 U/ml fala contra). 
Bacteriologia do Líquor: a baciloscopia (BAAR) do líquor raramente é positiva pelo 
processamento convencional do material. A cultura do líquor para BK é positiva em 50-60% dos 
casos, porém o seu resultado é demorado. 
O tratamento da TB meníngea deve ser feito com o esquema RIP por 9 meses, com as doses 
de rifampicina e isoniazida aumentadas e acrescentando-se o corticóide (prednisona 1-
2mg/Kg/dia ou 30 mg/dia) por 2-4 meses.

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