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SAPONINAS 1. Introdução As saponinas constituem um grupo de compostos praticamente onipresente nos vegetais. O termo saponina (do latim sapone = sabão) foi criado devido ao fato de que o primeiro composto dessa natureza foi isolado de uma planta chamada vulgarmente de saboeira (Saponaria officinalis), a qual historicamente, era utilizada como detergente doméstico. Esse termo generalizou-se depois para outros compostos com características idênticas. São caracterizadas principalmente pela sua capacidade de formar espuma abundante e estável. De forma geral, sua massa molecular é elevada, ficando entre 600 e 2000 Dalton. 2. Conceito Sob o ponto de vista químico, saponinas são heterosídeos que por hidrólise fornecem uma genina (aglicona) denominada genericamente sapogenina e uma ou mais unidades de carboidratos. São também conhecidas como glicosídeos saponínicos ou saponosídeos. 3. Classificação Quimicamente falando, as saponinas são classificadas de acordo com suas agliconas em saponinas esteroidais e saponinas triterpênicas. Podem ainda ser classificadas de acordo com o número de unidades de açúcares ligadas na aglicona, podendo ser monodesmosídicas ou bidesmosídicas. Na maioria das vezes esse açúcar se liga por uma ligação éter na hidroxila do carbono C-3, em outros casos como ligação éster. 3.1. Saponinas esteroidais As agliconas esteroidais possuem um esqueleto formado por 27 carbonos que geralmente compreendem 6 anéis. Este tipo de saponina pode ser subdividido em saponinas esteroidais neutras e saponinas esteroidais básicas. 3.1.1. Saponinas esteroidais neutras São subdivididas em dois tipos: furostânico ou pseudo-saponina (anel F aberto) e espirostano (anel F fechado). O tipo espirostano pode ainda ser subdividido em neosaponina (quando o grupo metila em C-25 encontra-se axial, isto é, para cima) e isosaponina (quando esse mesmo grupo metila está equatorial ou para baixo). 3.1.2. Saponinas esteroidais básicas 1 Essas saponinas são características de plantas do gênero Solanum (família Solanaceae). Possuem nitrogênio no anel F e são conhecidas por 2 tipos de estruturas: espirosolano (quando o nitrogênio é secundário e solanidano (quando o nitrogênio é terciário). Figura 1 – Saponinas esteroidais 3.2. Saponinas triterpênicas A grande maioria das saponinas triterpênicas apresenta um grupo carboxílico (COOH) na sua estrutura e consqëntemente são ácidas. Esse grupo carboxílico pode se encontrar reduzido a álcool ou até mesmo a metila. Essas saponinas podem ser divididas em 3 subgrupos principais: oleanano (β-amirina), ursano (α-amirina) e lupano (lupeol). As diferenças entre estes subgrupos pode ser vista a seguir. Existem ainda outros núcleos 2 que no entanto são raramente encontrados, por exemplo: friedelano, taraxastano e hopano. Fig. 2 – Saponinas triterpênicas Como pode ser observado pela figura acima, as saponinas triterpênicas da série lupano, diferem das demais pelo fato de seu anel E ser possuir apenas 5 membros. 4. Estrutura dos glicosídeos Os constituintes sacarídicos das saponinas são normalmente açúcares comuns: D-glicose, D-galactose, L-arabinose, L-rhamnose, D-xilose, D-fucose e pelo menos nas saponinas triterpênicas, ácido D-glucurônico. Apesar de ocorrerem monosídeos, é mais freqüente que a porção glicosídica da saponina consista de um ou dois oligosacarídeos unidos linearmente ou de forma ramificada, podendo conter de um a 10 monosacarídeos. As unidades de açucar podem ser ligadas à aglicona através de ligações éter ou éster. 3 4 Figura 3 – Algumas agliconas de saponinas mais comuns 5. Ocorrência e distribuição Saponinas esteroidais e triterpênicas apresentam diferentes padrões de distribuição no reino vegetal. 5.1. Saponinas esteroidais neutras Essas saponinas são encontradas quase que exclusivamente em monocotiledôneas, principalmente nas famílias Liliaceae, Dioscoreacae e Agavaceae. Os gêneros Smilax, Disocorea, Agave e Yuca são bastante ricos nessas saponinas. Em dicotiledôneas, a ocorrência de dessas saponinas é muito rara, tendo sido isoladas na família Scrophulariaceae, mais especificamente nos gêneros Digitalis e Trigonela. 5.2. Saponinas esteroidais básicas As saponinas esteroidais básicas ou alcaloidais são quase que uma exclusividade do gênero Solanum da família Solanaceae. 5.3. Saponinas triterpênicas Encontram-se distribuídas principalmente em dicotiledôneas, mais freqüentemente nas famílias Sapindaceae, Hippocastanaceae, Sapotaceae, Polygalaceae, Caryophylaceae, Primulaceae e Araliaceae. 6. Detecção A detecção de saponinas me vegetais é realizada a partir de suas propriedades químicas e fisicoquímicas. As saponinas reagem com ácidos 5 minerais, aldeídos aromáticos e sais de metais pesados, gerando compostos corados. Outras propriedades importantes na detecção de saponinas são a capacidade de reduzir a tensão superficial e a sua ação hemolítica. Vários testes foram concebidos com a finalidade de verificar a presença de saponinas nas plantas. Alguns destes testes são descritos a seguir. 6.1. Testes para saponinas 6.1.1. Índice de espuma Também chamado de “Índice afrosimétrico” – consiste em verificar qual a maior diluição, em volume, em relação a 1 g do farmacógeno, é capaz de formar um anel persistente de espuma de 1 cm de altura decorrido o espaço de tempo de 15 minutos depois da agitação. 6.1.2. Índice de hemólise Consiste em verificar qual a maior diluição, em volume, em relação a 1 g do farmacógeno, no qual se verificou a hemólise total dos eritrócitos presentes em uma porção diluída de sangue. 6.1.3. Índice ictiotóxico Consiste em verificar qual a maior diluição, em volume, em relação a 1 g do farmacógeno, é capaz de provocar a morte nos peixes em experimentação. 6.2. Testes para sapogeninas Após a realização de hidrólise ácida e procedimentos para a extração das sapogeninas, as seguintes reações são utilizadas para caracterização: 6.2.1. Reação de Liebermann-Buchard A alguns ml do extrato clorofórmico da amostra, adicionar anidrido acético e ácido sulfúrico concentrado. A formação de um anel rosa, azul ou verde, indica a presença de esteróides e/ou triterpenóides. 6.2.2. Reação de Salkowski A alguns ml do extrato clorofórmico da amostra, adicionar ácido sulfúrico concentrado. A aparição de coloração vermelha indica reação positiva para esteróides e triterpenos. 6.3. Testes para carboidratos 6 Após a reação de hidrólise e conseqüente extração do produto da reação com clorofórmio, sobrará uma fração aquosa onde deverão ter ficado as porções glicosídicas das sapogeninas. O teste abaixo comprova a presença dos mesmos nessa fração. 6.3.1. Reação com reativo de Fehling Após a hidrólise do extrato ou amostra em questão, tomar alguns ml da fração aquosa e adicionar 2 ml do reativo de Fehling A e B. Aquecer até a ebulição. A formação de um precipitado vermelho tijolo denota reação positiva. 7. Extração A extração e todas as operações das saponinas são muito delicadas. Estes compostos ocorrem quase sempre em quantidades substanciais, mas, freqüentemente em misturas complexas. Sua alta polaridade, sua relativa fragilidade, a as diminutas diferenças estruturais entre compostos de tão alto peso molecular, tornam seu isolamento na maioria das vezes um trabalho árduo para se obter um composto puro e intacto. Saponinas são solúveis em água, e por isso podem ser extraídas com água, geralmente na temperatura de ebulição. No entanto, o meio aquoso favorece a hidrólise dos bidesmosídeos, por isso, uma solução hidroalcoólica ou MeOH é preferível a simplesmente água. Como solventes muito polares extraem compostos demais, uma partição entre o extrato aquoso e n-butanol pode ser feita para extrair as saponinas. O n-butanol solubiliza as saponinas, que depois são precipitadas com a adição de éter etílico. 8. Isolamento O isolamento de saponinas baseia-se no uso de técnicas clássicas de cromatografia (Coluna, CLMP, CLAE...) em adsorventes convencionais (sílica gel, alumina...) e também em adsorventes funcionalizados(fase reversa), polímeros de alta porosidade (SEPHADEX) e em resinas. Mais freqüentemente, uma sucessão de separações cromatográficas em diferentes adsorventes pode ser necessária. O uso de técnicas cromatográficas mais sofisticadas como cromatografia líquida contra-corrente pode ser bastante útil. 9. Propriedades biológicas Saponinas tem forte atividade hemolítica. Essa ação é devida ao fato de que esses compostos interagem fortemente com os esteróis da mebrana 7 do heritrócito, causando o aumento de permeabilidade do mesmo e conseqüente perda de hemoglobina. Esse mesmo tipo de interação com a membrana, justifica sua atividade espermicida. É também digna de nota a atividade ictiotóxica das saponinas. O que explica o uso tradicional de plantas que contém saponinas para matar peixes. Pesquisas recentes dão conta do crescente interesse no estudo de plantas que produzem saponinas e que possuem atividade anti-helmíntica. Algumas saponinas demonstram também atividade contra os caramujos que são hospedeiros da schistosoma (Biomphlaria). 10. Uso na indústria farmacêutica Um dos principais usos das saponinas na indústria farmaêutica nos dias atuais é como material de partida para a hemi-síntese de hormônios esteroidais. Como exemplo clássico desse tipo de uso, pode ser visto abaixo o esquema de produção da testosterona a partir da diosgenina 8 Figura 4 – Hemi-síntese da testosterona partindo da diosgenina 11. Drogas vegetais clássicas Muitas das plantas usadas na medicina popular são grandes produtras de saponinas. Elas podem ser divididas em 2 grupos: 11.1. Drogas vegetais produtoras de saponinas triterpênicas Nome científico: Saponaria officinalis Família: Caryophylaceae 9 Nome vulgar: saboeira Parte usada: raiz Usos: Como expectorante, gargarejos e vermífugas Componentes: A raiz contém 4 a 5% de uma saponina que por hidrólise libera o ácido gipsogênico. Nome científico: Glycyrrhiza glabra L. Família: Leguminosae Nome vulgar: alcaçuz Parte usada: rizomas Usos: Expectorante, antiespasmódica, edulcorante. Componentes: Entre os vários componentes, destaca-se como principal uma saponina chamada glicirrizina, que por hidrólise libera o ácido glicirrízico. 11.2. Drogas vegetais produtoras de saponinas esteroidais Nome científico: Dioscorea composita Família: Dioscoriaceae 10 Nome vulgar: barbasco Parte usada: tubérculo Usos: Como matéria prima para a hemi-síntese de hormônios esteroidais. Componentes: O componente principal (10% de rendimento) é uma saponina chamada dioscina, que por hidrólise libera a diosgenina. Nome científico: Solanum paludosum Família: Solanaceae Nome vulgar: jurubeba Parte usada: frutos Usos: Como matéria prima para a hemi-síntese de hormônios esteroidais. Componentes: O principal componente é uma saponina chamada solanina que por hidrólise libera a solasodina. Referências bibliográficas Bruneton, J. (1995) em Pharmacognosy, Phytochemistry and Medicinal Plants Pgs 313-334. Intercept Ltd., London, England. Robbers, J.E., Speedie, M.K. & Tyler, V.E. (1996) em Pharmacognosy and Pharmacobiotechnology Pgs 139-142. Williams & Wilkins, Baltimore, USA. Schenkel, E.P., Gosman, G & Athayde, A.L. (2000) em Farmacognosia, da planta ao medicamento. (2a Ed.) Capítulo 24, Pgs 517-544. Editora da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC. 11
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