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Definição Hepatite crônica é definida por necroinflamação hepática crônica e pode ser decorrente de diversas causas, incluindo vírus hepatotrópicos, autoimunidade, álcool e doenças metabólicas. A infecção crônica pelos vírus da hepatite é, de longe, a causa principal de hepatite crônica em todo o mundo, com mais de 500 milhões de indivíduos cronicamente infectados com o vírus da hepatite B (HBV) ou com o vírus da hepatite C (HCV). As hepatites virais crônicas B e C são a principal causa de cirrose e de carcinoma hepatocelular em todo o mundo e representam mais de 1 milhão de mortes por ano. A infecção crônica pelo HBV pode estar associada à infecção pelo vírus da hepatite D (HDV). O vírus da hepatite A não causa hepatite crônica. O vírus da hepatite E (HEV) não provoca hepatite crônica, exceto raramente em pacientes que se submetem a transplante de fígado. Manifestações clínicas Os sintomas clínicos da hepatite crônica viral e da hepatite autoimune são tipicamente inespecíficos, e muitos pacientes não têm sintomas. Fadiga, distúrbios do sono e dor no hipocôndrio direito podem estar presentes. Muitas vezes o diagnóstico é feito quando anormalidades hepáticas são identificadas por exames de sangue durante uma avaliação de saúde de rotina ou para apreciação de um problema não relacionado ao fígado ou no momento da doação voluntária de sangue. Sintomas mais avançados incluem falta de apetite, náuseas, perda de peso, fraqueza muscular, prurido, urina escura e icterícia. Os pacientes podem evoluir para cirrose plenamente estabelecida, com as suas manifestações clínicas típicas. Se a cirrose estiver presente, fraqueza, perda de peso, aumento do volume abdominal, edema, facilidade de aparecimento de equimoses, hemorragia gastrointestinal e encefalopatia hepática com confusão mental podem ocorrer. Outros achados podem incluir aranhas vasculares, eritema palmar, ascite, edema e escoriações da pele. Diagnóstico Os níveis de alanina aminotransferase (ALT) e aspartato aminotransferase (AST) são geralmente de 2 a 5 vezes o limite superior do normal. O nível de ALT é geralmente maior do que o nível de AST, mas ambos podem ser normais na doença leve ou inativa ou 10 a 25 vezes o limite superior do normal durante as exacerbações agudas. Testes biológicos podem estabelecer o diagnóstico específico (Tabela 151-1). Níveis de fosfatase alcalina e γ-glutamil transpeptidase estão em geral minimamente elevados, a menos que a cirrose se encontre presente. Níveis séricos de bilirrubinas e de albumina e do tempo de protrombina são normais, a menos que a doença seja grave ou avançada. Os níveis séricos de imunoglobulinas estão levemente elevados ou normais na hepatite viral crônica, mas podem estar muitos elevados na hepatite autoimune. Resultados que sugerem a presença de fibrose avançada são contagem de plaquetas abaixo de 160.000, níveis de AST mais elevados do que os níveis de ALT, elevação das bilirrubinas séricas, diminuição da albumina sérica, prolongamento do tempo de protrombina, elevação dos níveis de α-fetoproteína e presença de fator reumatoide ou altos níveis de globulinas. O exame ultrassonográfico do fígado pode determinar a textura e o tamanho do fígado e do baço, excluir massas hepáticas, e avaliar a vesícula biliar, vias biliares intra-hepáticas e fluxo venoso portal. A tomografia computadorizada e a ressonância magnética do fígado são úteis se uma massa ou outra anormalidade for evidenciada pela ultrassonografia. A elastografia hepática pode estimar a rigidez do fígado como um marcador de fibrose. A biópsia hepática é geralmente decisiva para o diagnóstico e para definir o estádio da doença. A necrose hepatocelular é tipicamente por degeneração eosinofílica ou por degeneração baloniforme difusa em todo o parênquima, maior exuberante na região periportal, com distribuição irregular ou em saca-bocados. A fibrose também começa tipicamente nas regiões periportais e pode ligar áreas portais adjacentes ou áreas portais e centrais (fibrose em ponte), pode distorcer a arquitetura hepática e levar à cirrose e à hipertensão portal. O grau histológico de hepatite crônica pode ser determinado mediante combinação de pontuações para necrose e inflamação periportal, necrose e inflamação lobulares, e inflamação portal. Recentemente, métodos baseados em exame ultrassonográfico ou marcadores sorológicos revelaram-se precisos para a avaliação da doença leve e cirrose, mas eles são menos precisos para a identificação de inflamação moderada a grave, exceto em pacientes com hepatite C crônica. Pacientes com suspeita de hepatite crônica viral ou hepatite autoimune devem ser avaliados com cuidado para doença hepática gordurosa alcoólica e não alcoólica ou induzida por fármacos, doenças hepáticas metabólicas, cada qual podendo coexistir com a hepatite viral. A biópsia hepática pode excluir outros diagnósticos que podem confundir com a hepatite crônica, incluindo doença hepática gordurosa alcoólica e não alcoólica, doença hepática induzida por fármacos, colangite esclerosante, sobrecarga de ferro e doença venoclusiva. Tratamento e Prognóstico A infecção crônica pelo HBV não é curável, mas geralmente pode ser controlada por medicamentos antivirais adequados. Infecção por HCV é curável, mas menos de 50% dos pacientes que têm acesso à terapia são curados. A hepatite autoimune responde à imunossupressão com corticosteroides e azatioprina. Epidemiologia Mais de 350 milhões de indivíduos, ou 8,5% da população mundial, são portadores crônicos do HBV. Dois bilhões de pessoas, ou uma pessoa a cada três, estiveram em contato com esse vírus. O HBV é a principal causa de câncer primário de fígado (carcinoma hepatocelular, Capítulo 202) em todo o mundo, com cerca de 350.000 novos casos atribuíveis ao HBV a cada ano. O carcinoma hepatocelular é mais provável na presença de cirrose subjacente, mas o HBV tem propriedades oncogênicas por si mesmo, e o carcinoma hepatocelular pode ocorrer em pacientes com HBV não cirróticos. Fisiopatologia O HBV não é um vírus citopático. Em vez disso, a lesão do fígado na hepatite B crônica é uma consequência da resposta imune local na fase de imunoeliminação. Em particular, a lesão do fígado está relacionada a células T citotóxicas que reconhecem e eliminam hepatócitos infectados que expressam antígenos do HBV em sua superfície e com a produção local de citocinas. A inflamação crônica desencadeia fibrogênese pela ativação de células estreladas hepáticas. A proteína X do HBV pode também ativar diretamente a fibrogênese. Como resultado, muitos pacientes com hepatite B crônica têm fibrose progressiva, podendo evoluir para cirrose. A taxa de cronicidade após uma infecção aguda por HBV é de mais de 95% entre os pacientes infectados no momento do nascimento. Esse risco diminui com a idade em que ocorre a infecção e é inferior a 5% em adultos. A infecção crônica pelo HBV é definida pelo estado do portador do HBsAg por mais de 6 meses após o episódio agudo. Os portadores crônicos de HBsAg tipicamente evoluem em três fases: imunotolerância, imunoeliminação e inativa. A fase de imunotolerância é geralmente curta, se a infecção ocorreu durante a idade adulta, mas ela persiste por anos a décadas em pacientes infectados ao nascimento ou durante a primeira infância. Na fase imunotolerante, a resposta imune do hospedeiro “tolera” a infecção pelo HBV e não causa inflamação do fígado ou destruição dos hepatócitos. A fase de imunotolerância é caracterizada pela presença do antígeno e (HBeAg), níveis muito elevados do HBV DNA no sangue, níveis normais de aminotransferases e nenhuma ou mínima atividade inflamatória à biópsia hepática. A fase de imunoeliminação é caracterizada por uma resposta imune ativa que provoca lesões necroinflamatórias e desencadeia fibrogênese hepática e fibrose progressiva. Os níveis de ALT e AST estão aumentados, mas os níveisdo HBV DNA são mais baixos do que durante a fase de imunotolerância e frequentemente flutuam. A fase de imunoeliminação tem duração variável, desde poucas semanas a várias décadas. O HBeAg, quando presente, define a hepatite B crônica, HBeAg positivo, que pode ser clareado, tornando o paciente positivo para o anti-HBe, o que é definido como a soroconversão HBe. O HBeAg pode estar ausente, enquanto anticorpos anti-HBe estão presentes, o que define hepatite B crônica, HBeAg negativo. Os pacientes com hepatite B crônica HBeAg positivo são infectados com vírus do tipo selvagem e secretam a proteína HBe. Os pacientes com hepatite B crônica HBeAg negativo são infectados com vírus com mutação pré-core, que não produzem a proteína HBe, porque eles têm um códon de parada no gene pré-C, e/ou com vírus com mutação no promotor core, que produzem consideravelmente menor quantidade de proteína HBe. A fase inativa de portador do HBsAg é o resultado da eliminação imune bem-sucedida o que leva a soroconversão do HBe. Os níveis de ALT e AST são normais, o HBV DNA é indetectável ou em níveis muito baixos, e pacientes sem cirrose preexistente podem ter histologia do fígado normal. Manifestações clínicas A hepatite B crônica é geralmente assintomática. O sintoma mais comum é a fadiga, mas distúrbios do sono, dificuldade de concentração e dor no hipocôndrio direito são frequentemente observados. A hepatite crônica B é caracterizada biologicamente por elevados níveis de aminotransferases e os níveis de ALT podem variar substancialmente durante a fase de imunoeliminação. Colestase moderada, com níveis discretamente elevados de fosfatase alcalina e de γ-glutamil transpeptidase, pode também estar presente, especialmente em pacientes com cirrose. A hepatite crônica B HBeAg negativo é geralmente mais grave do que a variedade HBeAg positivo. A incidência de soroconversão HBe espontânea entre os pacientes HBeAg positivo é de 8% a 12% ao ano, quando eles estão na fase de imunoeliminação. Após a soroconversão HBe frequentemente se observa elevação transitória da ALT. Alguns pacientes evoluem para o estado de portador do HBsAg inativo, enquanto outros evoluem para forma de hepatite crônica B HBeAg- negativo, com níveis elevados de ALT e quantificação do DNA do HBV superior a 2.000UI/mL. A incidência anual de cirrose varia de 2% a 10% em pacientes com infecção crônica pelo HBV, com uma incidência cumulativa de cerca de 20% em 5 anos. O risco de cirrose é de 2 a 4 vezes maior em pacientes HBeAg negativo em comparação a HBeAg positivo, provavelmente porque eles são mais velhos e têm doença mais grave no momento do diagnóstico. A incidência anual de carcinoma hepatocelular em pacientes com hepatite crônica B varia de 1%, em pacientes sem cirrose, a 2% a 8% em pacientes cirróticos, com taxas mais altas ocorrendo em pacientes mais velhos. Pacientes com cirrose e/ou carcinoma hepatocelular têm os sinais típicos associados a essas condições. Raramente, a infecção crônica pelo HBV está associada a manifestações extra-hepáticas, incluindo glomerulonefrite, mais frequentemente em crianças, e poliarterite nodosa, principalmente em adultos. Diagnóstico Marcadores sorológicos utilizados para diagnosticar a hepatite B crônica (Tabela 151-2) incluem HBsAg, anti-HBs, anti-HBc total e anti-HBc IgM, HBeAg e anti-HBe. Os marcadores moleculares incluem DNA do HBV e as substituições de resistência do HBV; ensaios com a reação em cadeia da polimerase (PCR) em tempo real são a melhor maneira de detectar e quantificar o HBV DNA. A infecção crônica pelo HBV é definida pela persistência do HBsAg no soro por mais de 6 meses após o episódio agudo. A maioria dos indivíduos com anti-HBc isolado não apresenta viremia. No entanto, alguns indivíduos com teste positivo para anticorpos o anti-HBc, mas não para o HBsAg ou anti- HBs, podem ser virêmicos, nesses casos, as substituições de aminoácidos na sequência de HBsAg do vírus tornam o HBsAg indetectável com os imunensaios enzimáticos atuais. Outros indivíduos podem ter baixo nível de replicação do HBV em seus fígados que o DNA do HBV não é detectável no sangue (hepatite B “oculta”). Os níveis séricos ou plasmáticos da ALT e do HBV DNA são importantes marcadores de gravidade e prognóstico. A avaliação da gravidade, incluindo o grau de necroinflamação e o estádio de fibrose, baseia-se nas alterações histológicas encontradas na biópsia do fígado (Fig. 151-1). Avaliação não invasiva por meio de marcadores sorológicos ou por elastografia hepática transitória pode discriminar cirrose de hepatite discreta e fibrose leve. Embora eles não sejam suficientemente precisos para estádios intermediários, esses métodos no futuro provavelmente irão substituir a biópsia hepática na avaliação da gravidade pré-tratamento da hepatite B crônica em muitos pacientes. Prevenção e Tratamento Os pacientes com hepatite B crônica devem ser vacinados contra a hepatite A, abster-se do álcool e evitar terapias imunossupressoras, a menos que sejam absolutamente necessárias. Pacientes infectados com o HBV, pacientes que necessitam de corticoides ou quimioterapia para outras condições devem receber lamivudina 100 mg por dia como profilaxia contra a reativação da hepatite B. Os objetivos da terapia são suprimir a replicação do HBV, reduzir a atividade inflamatória histológica da hepatite crônica e diminuir o risco de cirrose e carcinoma hepatocelular. A infecção pelo HBV não pode ser completamente erradicada por causa da persistência do DNA circular covalentemente fechado (cccDNA) nos núcleos dos hepatócitos infectados. Como resultado, a terapia visa reduzir os níveis de DNA do HBV, de preferência, abaixo do limite de detecção dos ensaios de PCR em tempo real (10 a 15 UI/mL), para garantir um grau de supressão viral que conduza à remissão bioquímica, melhora histológica e prevenção de complicações. Existem dois tipos diferentes de fármacos para o tratamento de hepatite B crônica; o interferon-α (IFN-α) peguilado e os análogos de nucleosídeos/nucleotídeos. O IFN-α 2a peguilado, administrado por via subcutânea na dose de 180 μg 1 vez por semana durante 48 semanas, melhora vários marcadores de infecção pelo HBV em ambos os grupos de pacientes HBeAg positivo e HBeAg negativo. IFN-α 2b peguilado (1,5 μg/kg) é muito semelhante ao IFN-α 2a e é usado por muitos hepatologistas, embora não esteja atualmente aprovado para o tratamento do HBV. Os efeitos colaterais mais frequentes de IFN-α são os sintomas gripais após as injeções, fadiga, anorexia, perda de peso e alopecia. Os efeitos colaterais mais preocupantes são neutropenia, trombocitopenia, ansiedade, irritabilidade, depressão e até mesmo ideação suicida. Análogos de nucleosídeos (lamivudina, telbivudina e entecavir) requerem fosforilação tripla para serem ativos, enquanto análogos de nucleotídeos (adefovir e tenofovir) só precisam de duas fosforilações. Esses fármacos s são administradas oralmente 1 vez ao dia nas seguintes dosagens: 100 mg de lamivudina, 600 mg detelbivudina, 0,5 mg de entecavir, 10 mg de adefovir (administrado como o pró-fármaco adefovir dipivoxil), e 300 mg de tenofovir (administrado como o pró-fármaco fumarato de disoproxilo de tenofovir). Todos têm benefícios a curto prazo em vários marcadores da infecção pelo HBV em pacientes HBeAg positivo e HBeAg negativo. O entecavir e o tenofovir são dois dos inibidores mais potentes da replicação do HBV, 3-5 e eles são menos suscetíveis de selecionar variantes resistentes do HBV. Esses fármacos são geralmente bem tolerados. No entanto, o adefovir é nefrotóxico em doses mais elevadas do que aquelas utilizadas para o tratamento do HBV; piora da função renal e diminuição da densidade mineral óssea são raramente vistas com tenofovir; miopatia é uma complicação rara da telbivudina, e neuropatia periférica foi observada quando a telbivudina foi utilizada comIFN-α peguilado. Os pacientes devem ser considerados para tratamento quando os níveis do DNA do HBV são maiores do que 2.000UI/mL e/ou os níveis de ALT no soro são anormais e se a biópsia do fígado mostrar necroinflamação ativa moderada a grave e/ou fibrose. Para indicar o tratamento também deve-se levar em conta o estado do paciente, a idade e a disponibilidade de antivirais nos serviços de saúde. Pacientes em fase de imunotolerância e aqueles com hepatite leve na biópsia hepática não devem ser tratados, mas acompanhar os níveis de ALT e do DNA do HBV é obrigatório. Pacientes com cirrose compensada e DNA do HBV detectável podem ser considerados para o tratamento mesmo se os níveis de ALT forem normais e/ou níveis do DNA do HBV estiverem abaixo de 2.000 UI/mL. Pacientes com cirrose descompensada necessitam de tratamento antiviral urgente. Duas estratégias de tratamento podem ser consideradas: um curso de 48 semanas de tratamento com IFN-α peguilado ou com análogos de nucleosídeos/nucleotídeos a longo prazo. Estudos estão em curso para avaliar se a utilização combinada das duas abordagens melhoraria a taxa de resposta virológica sustentada. O IFN-α peguilhado pode proporcionar resposta virológica sustentada, definida como soroconversão HBe sustentada (clareamento do HBeAg, com a detecção de anticorpos anti-HBe) e um nível de HBV DNA que permanece abaixo de 2.000 UI/mL após um curso de 48 semanas de tratamento. Todavia, aumento dos níveis de ALT pode ser observado no momento da perda do HBeAg em pacientes nos quais o tratamento é bem-sucedido. O tratamento com IFN-α peguilado deve ser reservado para pacientes com melhor chance de resposta virológica sustentada, por exemplo, pacientes com HBeAg positivo, com níveis basais elevados de ALT (mais de três vezes o limite superior do normal) e níveis de DNA do HBV abaixo de 2.106 UI/mL. A terapia com IFN-α peguilado está contraindicada em pacientes com cirrose avançada e em pacientes imunossuprimidos. Os pacientes infectados com os genótipos A e B do HBV geralmente respondem melhor à terapia com IFN-α do que os pacientes infectados com genótipos C e D, mas o valor preditivo para resposta terapêutica para o genótipo do HBV é fraca. Os pacientes que não conseguem atingir uma resposta virológica sustentada após um ciclo de IFN-α peguilado são candidatos a terapia com análogos de nucleosídeos/nucleotídeos. Tratamento a longo prazo com análogos de nucleosídeos/nucleotídeos está indicado na maioria dos pacientes com hepatite B crônica. Tenofovir ou entecavir, que são os fármacos mais potentes e com um perfil de resistência ótimo, são recomendados como primeira linha. O DNA do HBV deve ser suprimido a níveis indetectáveis (< 10 a 15 UI/mL) por meio de ensaios de PCR em tempo real. Se os níveis de DNA do HBV são reduzidos, mas ainda detectáveis em um paciente aderente ao tratamento, outro agente pode ser adicionado, contudo, a segurança do uso combinado a longo prazo de tenofovir e entecavir é desconhecida. Quando pacientes HBeAg positivo soroconvertem para negativo ou pacientes HBeAg negativo perdem o HBsAg, o tratamento deve ser continuado por um período adicional de 6 a 12 meses. Em todos os outros casos, o tratamento deve ser continuado por toda a vida, e a adesão é particularmente importante. Aumentos do nível do DNA de HBV de 1 Log ou mais acima do ponto do mais baixo nível (virologic breakthroughs) em pacientes aderentes são decorrentes da resistência do HBV a medicamentos antivirais administradas. Os níveis do DNA do HBV na maioria das vezes aumentam e retornam aos níveis basais, e esse fenômeno é geralmente seguido, algumas semanas mais tarde, por uma elevação dos níveis de ALT, que poderiam estar previamente normais. As taxas cumulativas de resistência em pacientes recém-tratados são de 70% em 5 anos para a lamivudina, 17% em 2 anos para a telbivudina, 1,2% em 6 anos para o entecavir, 29% em 5 anos para adefovir, e 0% em 2 anos para tenofovir. Esses números ilustram a alta barreira genética contra a resistência do entecavir e tenofovir. Em um paciente que desenvolve resistência a qualquer um dos análogos de nucleosídeos/nucleotídeos disponíveis, a adição de um segundo medicamento sem resistência cruzada é a única estratégia eficaz, embora a segurança a longo prazo de algumas dessas combinações não seja conhecida. Em pacientes com resistência à lamivudina, à telbivudina, ou ao entecavir, o tenofovir deve ser adicionado. Em pacientes com resistência ao adefovir deve ser efetuada a troca para o tenofovir, e também administrada a lamivudina ou telbivudina ou entecavir. Pacientes que desenvolveram resistência ao tenofovir devem ser tratados com a adição de qualquer um desses outros três medicamentos. A combinação de tenofovir e emtricitabina, análogo de nucleosídeo semelhante a lamivudina, em único comprimido (aprovada para o HIV, mas não para a terapia do HBV) é também opção válida em casos de resistência a qualquer uma desses medicamentos. Em pacientes com cirrose, a terapia com análogos de nucleosídeos/nucleotídeos é a única opção, porque o IFN-α peguilado está contraindicado se a cirrose é descompensada. Como a resistência nessa população pode ser fatal, alguns especialistas recomendam o tratamento com dois medicamentos potentes sem resistência cruzada. Naqueles com doença descompensada, o tratamento antiviral eficaz estabiliza, na maioria das vezes, a condição do paciente e também pode retardar ou evitar a necessidade de transplante do fígado. Se o transplante é necessário, a administração pós-transplante de imunoglobulina hiperimune (anti-HBV) em combinação com análogos de nucleosídeos/nucleotídeos potentes impedem recorrência do HBV na maioria dos casos. Prognóstico Cada ano, cerca de 0,5% dos portadores inativos de HBsAg perdem espontaneamente o HBsAg, e a maioria deles desenvolve anti-HBs. Reativações são possíveis em portadores inativos do VHB, especialmente se ele se tornam imunossuprimidos, como durante a quimioterapia ou com a administração de corticosteroides. Reativações do HBV muitas vezes evoluem para formas subfulminantes ou fulminantes. O risco de cirrose em hepatite B crônica é de 2% a 10% por ano e está significativamente associada a níveis mais altos do DNA do HBV, idosos, consumo de álcool, coinfecção com outros vírus hepatotrópicos, e coinfecção com o HIV. A incidência cumulativa de descompensação do fígado é de cerca de 15% a 20% em 5 anos em pacientes com cirrose compensada. As complicações da cirrose, incluindo o carcinoma hepatocelular, estão entre as principais causas de mortalidade em pacientes infectados pelo HBV, e a incidência anual de morte é de cerca de 3% a 4%. A probabilidade de se desenvolver carcinoma hepatocelular é de cerca de 1% ao ano em pacientes sem cirrose e de 2% a 8% por ano em cirróticos, e está significativamente associada a níveis elevados de DNA do HBV, sexo masculino, idosos, reversão do status anti-HBe positivo para HBeAg positivo, coinfecção com outros vírus hepatotrópicos. Os portadores do HBV com risco de carcinoma hepatocelular devem ser acompanhados a cada 6 a 12 meses, de preferência com exame ultrassonográfico do abdome e níveis séricos de α-fetoproteína. Epidemiologia e Fisiopatologia Estima-se que o HCV, que está presente em todos os continentes, cause infecção crônica em aproximadamente 170 milhões de indivíduos, ou 3% da população do mundo. A infecção aguda pelo HCV evolui para formas crônicas em 50% a 80% dos casos. Mesmo pacientes que espontaneamente se curam e mantêm anticorpos anti-HCV detectáveis não estão protegidos contra a reinfecção. A persistência da infecção está relacionada a resposta alterada qualitativa e quantitativamente de células T auxiliares CD4+ e de linfócitos T citotóxicos que falham em erradicar a infecção. A plasticidade dos genomas virais é responsável pela coexistência de populações viraisestreitamente relacionadas, mas geneticamente diferentes, em equilíbrio no ambiente replicativo do paciente. Essa diversidade genética permite que populações virais variantes continuamente geradas sejam selecionadas por mudanças oportunas no ambiente de replicação. A infecção pelo HCV é responsável por lesões necroinflamatórias de gravidade variável, por vezes associadas à esteatose, que é o acúmulo de triglicérides nos hepatócitos. O HCV não é um vírus citopático. A lesão hepática na hepatite C crônica está relacionada à ação de efetores imunes que reconhecem e eliminam os hepatócitos infectados que expressam antígenos do HCV em sua superfície. A inflamação crônica desencadeia fibrogênese mediante ativação de células estreladas hepáticas. A fibrose progride em taxas não lineares, que são geralmente mais rápidas em pacientes mais idosos, no sexo masculino, e na presença de ingestão crônica de álcool, coinfecções virais ou imunossupressão. A gravidade da hepatite crônica é independente do nível de RNA e do genótipo do HCV. Essa inflamação crônica e a progressão da fibrose predispõem os doentes à cirrose e ao carcinoma hepatocelular. Manifestações clínicas A hepatite C aguda é mais frequentemente assintomática e, portanto, não diagnosticada. O sintoma mais comum associado à infecção crônica pelo VHC é a fadiga, mas pode permanecer inaparente durante anos. Os níveis de ALT estão geralmente moderadamente elevados e flutuam, mas podem permanecer normais por semanas a meses, apesar de hepatite se mostrar ativa na biópsia hepática. Colestase moderada pode estar presente em pacientes com cirrose. Os pacientes com cirrose e/ou carcinoma hepatocelular têm sinais típicos associados a essas condições. O HCV é a principal causa de crioglobulinemia mista dos tipos II III. Os baixos níveis de crioglobulinas circulantes, que contêm o RNA do HCV, anticorpos anti- HCV, fator reumatoide, e baixos níveis de complemento, podem ser encontrados em 50% a 70% dos casos, enquanto fator reumatoide elevado em até 70% dos casos. Menos de 1% dos pacientes infectados pelo HCV desenvolve sintomas de vasculite crioglobulinêmica incluindo fadiga, mialgias, artralgias, rash (púrpura, urticária e vasculite leucocitoclástica), neuropatia e glomerulonefrite membranoproliferativa. A crioglobulinemia pode ser grave e evoluir com insuficiência renal ou neuropatias graves, e a crioglobulinemia de evolução prolongada tem sido associada a linfomas não Hodgkin de células B. Baixos títulos de anticorpo antimúsculo liso podem ser encontrados em pacientes infectados com HCV, mas eles não têm qualquer significado clínico. Tem sido relatado que o HCV pode desencadear sintomas da porfíria cutânea tardia, e uma associação com o líquen plano também tem sido sugerida. Diagnóstico A infecção crônica pelo HCV é definida pela persistência do RNA do HCV por mais de 6 meses. Em pacientes com sinais clínicos e/ou bioquímicos de doença hepática crônica, a hepatite C é diagnosticada pela presença simultânea de anticorpos anti-HCV e do RNA do HCV. A detecção de replicação do HCV na ausência de anticorpos anti-HCV é observada quase exclusivamente em pacientes que estão profundamente imunossuprimidos, em hemodiálise ou agamaglobulinêmicos. O nível de replicação do HCV não se correlaciona com a gravidade da doença do fígado ou com o risco de progressão para a cirrose ou carcinoma hepatocelular. O genótipo do HCV, que tem importantes implicações terapêuticas, deve ser determinado. Anticorpos anti-HCV IgM, encontrados em cerca de 50% dos pacientes com hepatite crônica, não têm qualquer significado. Exames de laboratório frequentemente revelam níveis elevados de fator reumatoide monoclonal e de crioglobulinas. Tratamento A infecção crônica pelo HCV é curável. O objetivo da terapia é alcançar uma resposta virológica sustentada, definida pela não detecção do RNA do HCV após 24 semanas do fim da terapia utilizando um ensaio sensível de detecção do RNA do HCV com limite inferior de 50 UI/mL ou menos. A decisão de tratar a hepatite C crônica depende de uma avaliação mais precisa da gravidade da doença hepática, da presença de contraindicações absolutas ou relativas à terapia, e da disposição do paciente em ser tratado. A decisão de tratar o paciente geralmente requer uma biópsia do fígado, mas os marcadores sorológicos de fibrose hepática e/ou fibrogênese e a elastografia hepática transitória foram validados em grandes séries de pacientes com hepatite C crônica. Em pacientes sem indicação de tratamento ou com contraindicações para serem tratados, avaliações repetidas dos níveis de aminotransferases são recomendadas periodicamente. Avaliação da inflamação e da fibrose hepática por biópsia ou por testes sorológicos não invasivos ou por exame ultrassonográfico do abdome está indicada em pacientes com níveis de aminotransferases persistente ou intermitentemente elevados. O tratamento-padrão atual da hepatite C crônica é a combinação de ribavirina (0,75 a 1,5 g/dia por via oral) quer com IFN peguilado α-2a (180 μg por via subcutânea 1 vez/semana) quer com o IFN peguilado α-2b (1,5 μg/kg por via subcutânea 1 vez/semana). Os efeitos secundários mais comuns do IFN-α são sintomas do tipo gripal (que podem ser prevenidos por acetaminofeno), neutropenia, trombocitopenia, irritabilidade, dificuldade de concentração, distúrbios da memória, tireoidite, queda de cabelo, distúrbios do sono e perda de peso. O principal efeito colateral da ribavirina é a anemia hemolítica. Como resultado desses efeitos secundários, a modificação da dose é frequentemente necessária durante a terapia. A ribavirina deve ser reduzida em valores aproximados de 200 mg em pacientes com anemia grave. Para efeitos colaterais induzidos pelo IFN peguilado α-2a, a dose deve ser diminuída em etapas, de 180 para 135 e depois para 90 μg/semana, e de 1,5 para 1,0 e depois para 0,5 μg/kg/semana para IFN peguilado α 2b. As principais contraindicações à terapia com IFN-α peguilado e ribavirina são doença hepática descompensada, insuficiência renal, imunossupressão importante, transplante de órgão sólido que não o de fígado, citopenias, doença psiquiátrica grave e consumo de drogas. A ribavirina está também contraindicada em pacientes com anemia, doença coronariana ou cerebrovascular significativa, ou insuficiência renal. Em função de a ribavirina ser teratogênica, é essencial que seja instituída uma contracepção adequada durante a terapia de homens e mulheres e, por pelo menos, 6 meses após a interrupção do tratamento. Em pacientes para os quais a terapia é considerada apropriada, o genótipo do HCV orienta o tratamento e sua duração (Fig. 151-2). Os pacientes infectados com HCV genótipo 1 requerem 48 semanas de tratamento e uma dose de ribavirina mais alta baseada no peso corporal (1,0 a 1,4 g/dia). O tratamento deve ser adaptado para a resposta virológica real usando um ensaio sensível, como um PCR em tempo real. O nível do RNA do HCV deve ser medido antes da terapia, na 4ª e na 12ª semanas após o início. A falta de resposta virológica (nenhuma alteração ou a diminuição do RNA do HCV em menos de 2 log10 na 12ª semana) indica que o paciente tem praticamente nenhuma chance de alcançar resposta virológica sustentada e o tratamento deve ser interrompido. Em contrapartida, o tratamento deve ser mantido se tal declínio no nível do RNA do HCV for observado na 12ª semana. Os pacientes que conseguem uma resposta virológica rápida (RNA do VHC indetectável na 4ª semana) podem interromper a terapia na semana 24, se o nível basal do RNA do HCV nível for abaixo de 400.000 UI/mL. Os pacientes que não conseguiram atingir uma resposta virológica completa (ou seja, a carga viral é ainda detectável) na 4ª semana, mas o fizeram na 12ª semana devem ser tratados por 48 semanas, quando podem parar o tratamento. É geralmente aceito que pacientes com respostavirológica lenta (a quantificação do RNA do HCV diminui em mais de 2 log10, mas ainda é detectável na semana 12) devem ser tratados por 72 semanas, pois a terapia prolongada reduz significativamente a incidência de recaída após o tratamento. Os pacientes infectados com os genótipos 2 e 3 do HCV devem ser tratados por 24 semanas, mas com uma dose de ribavirina de 0,8 g/dia. Pacientes que respondem ao tratamento com RNA do HCV indetectável, mas recaída após a suspensão da terapia, deveriam ser tratados novamente, agora por 48 semanas com dose de ribavirina mais alta baseada no peso corporal (1,0 a 1,4g/dia). Os pacientes infectados com genótipos 4, 5 e 6 requerem tratamento de 48 semanas e dose de ribavirina baseado no peso corporal (1,0 a 1,4 g/dia). As mesmas abordagens para monitoramento e ajuste da dose utilizadas para o genótipo 1 provavelmente se aplicam a esses genótipos, mas eles não foram validados em coortes suficientemente grande de pacientes. Atualmente, cerca de 40% a 50% dos pacientes infectados com genótipos 1 e 4 e 80% dos pacientes infectados com genótipos 2 e 3 alcançam resposta virológica sustentada com a combinação padrão de IFN-α peguilado e ribavirina; as taxas de resposta para os genótipos 5 e 6 são desconhecidas. Os preditores de resposta virológica sustentada são carga viral basal do RNA do HCV inferior a 800.000 UI/mL, ausência de fibrose importante ou cirrose, jovens, sexo feminino, brancos, presença do genótipo CC do polimorfismo de base única no gene da IL28B. No entanto, a falta desses fatores preditivos positivos não deve ser usada para negar o tratamento. Terapia de manutenção de longo prazo com uma dose baixa de IFN-α peguilado não é benéfica, exceto, talvez, em uma pequena proporção de pacientes cujos níveis do RNA do HCV permanecem muito baixos ou indetectáveis na vigência do tratamento. Os resultados do tratamento com IFN-α peguilado e ribavirina podem ser melhorados mediante redução do peso corporal e da resistência à insulina. A eritropoietina pode controlar a anemia induzida pela ribavirina e minimizar a redução da dose desse medicamento. O fator estimulante de colônias de granulócitos pode ser utilizado para reverter a neutropenia grave induzida pelo IFN. O manejo adequado da ansiedade, dos distúrbios do sono e da depressão também é importante. O retratamento de pacientes que não atingiram uma resposta virológica sustentada com a mesma dose de IFN-α peguilado e de ribavirina atinge taxas de resposta virológica sustentada de cerca de 10% a 15%; o retratamento com doses mais elevadas pode ser tentado com monitoramento cuidadoso e atenção aos efeitos colaterais. Novos fármacos para tratar o HCV testados em ensaios clínicos incluem novos IFNs, alternativas à ribavirina, e fármacos antivirais de ação direta que têm como alvo várias funções do ciclo de vida do HCV. O uso do telaprevir 750 mg,3 vezes por dia,ou de boceprevir 800 mg 3 vezes por dia, em combinação com as doses preconizadas de IFN-α peguilado e de ribavirina, resultou em taxas de resposta virológica sustentada de 70% em pacientes nunca tratados infectados com genótipo 1 do HCV e em cerca de 50% dos pacientes que não responderam a um primeiro curso de terapia com os dois fármacos-padrão. Entretanto, o telaprevir frequentemente causa rash cutâneo e prurido, e o boceprevir pode agravar a anemia relacionada a ribavirina. Além disso, esses fármacos têm pouca ou nenhuma eficácia para os genótipos 3 e 4. Do mesmo modo, a adição de boceprevir à terapia-padrão aumenta a resposta viral tanto em doentes nunca tratados 9 quanto naqueles previamente tratados 10 com o genótipo 1. Em pacientes em estádio final de doença hepática, o transplante hepático é a única opção. Todavia, o enxerto é infectado em 100% dos pacientes que são virêmicos no momento do procedimento. O tratamento com IFN-α peguilhado e ribavirina é difícil no cenário pós-transplante e produz resultados inferiores. Prognóstico O clareamento espontâneo do VHC em pacientes com hepatite C crônica é excepcional. Os níveis de RNA do VHC não têm valor prognóstico na hepatite C crônica. Estima-se que 20% dos pacientes com hepatite C crônica desenvolvem cirrose e isso ocorre, em média, 20 anos após o início da infecção. A cirrose permanece compensada por muitos anos na maioria dos pacientes, mas a descompensação ocorre a uma taxa anual de 2% a 5% em pacientes cirróticos. Depois da primeira descompensação, a taxa de mortalidade relacionada à hipertensão portal, a insuficiência hepatocelular e o carcinoma hepatocelular é de 10% ao ano, com taxa de sobrevida de 50% em 5 anos. O risco de morte aumenta com o avanço da idade, sexo masculino, e a gravidade da cirrose. O carcinoma hepatocelular é raro em pacientes com hepatite C crônica sem cirrose. Em pacientes com cirrose, a incidência de carcinoma hepatocelular é de 2% a 4% por ano, mais frequentemente em pacientes com cirrose compensada. O HC após é a causa mais comum dessa neoplasia na maioria dos países industrializados. O acompanhamento a longo prazo demonstra que o HCV não retorna em mais de 99% dos pacientes que obtiveram resposta virológica sustentada, mesmo naqueles que são imunodeprimidos ou que recebem quimioterapia. Entretanto, a doença hepática pode continuar a evoluir, mesmo após a infecção ter sido erradicada. Além disso, os pacientes com hepatite C crônica devem se abster de álcool e, a menos que haja outras contraindicações, devem ser vacinados contra as hepatites A e B. Epidemiologia A infecção pelo HDV ocorre apenas em portadores do HBsAg. Somente cerca de 2% dos pacientes coinfectados de forma aguda com HDV e HBV desenvolvem hepatite D crônica. Em portadores crônicos do HBV com superinfecção pelo HDV, no entanto, 90% dos pacientes tornam-se portadores crônicos do HDV. Manifestações clínicas A hepatite D crônica é geralmente grave, com mais de 80% dos pacientes desenvolvendo cirrose. Em comparação a pacientes que têm apenas hepatite B crônica, os pacientes com infecção crônica por ambos, HBV e HDV, têm probabilidade três vezes maior de desenvolver carcinoma hepatocelular e são duas vezes mais propensos a morrer. Diagnóstico Os marcadores de infecção pelo HD após devem ser procurados pelo menos uma vez em cada portador crônico do HBsAg. Ambos os anticorpos anti-HDV total e anti-HDV IgM permanecem em altos níveis na infecção crônica pelo HDV, e o RNA do HDV está presente. Embora todos os portadores crônicos pelo HDV sejam também portadores crônicos do HBsAg, eles geralmente têm níveis baixos ou indetectáveis do DNA do HBV, porque o HDV inibe a replicação do HBV. Tratamento e Prevenção Doses elevadas (9 milhões de unidades 3 vezes por semana durante 1 ano) de IFN-α convencional não peguilado resulta na normalização sustentada dos níveis de ALT após 24 semanas do final da terapia em aproximadamente 50% dos casos, por vezes, por até 20 anos. Alguns pacientes eliminam o RNA do HDV e, finalmente, o HBsAg. O IFN-α 2b peguilado, 1,5 μg/kg 1 vez por semana por 12 meses, fornece uma resposta virológica sustentada em 20% a 40% dos casos. Embora não haja consenso, a maioria dos especialistas recomenda atualmente 1 ano de IFN-α peguilado como tratamento de primeira linha da infecção pelo HDV crônica. A infecção crônica pelo HDV é mais bem evitada prevenindo-se contra a infecção primária pelo HBV, porque os indivíduos que estão protegidos contra o HBV não se infectam com o HDV. Em portadores crônicos do HBsAg, a higiene-padrão e precauções comportamentais devem ser praticadas para evitar a superinfecção com o HDV. Uma vez que a infecção aguda pelo HDV ocorre, nenhuma estratégia de prevenção secundária é bem-sucedida. Embora se pensasse que a infecção pelo HEV fosse autolimitada, ela pode persistir e causar inflamação hepática em receptores de transplante de órgãos sólidos que abrigam o RNA do HEVno sangue e no fígado, tanto a partir de um vírus latente reativado pela imunossupressão quanto por vírus transmitido no momento do transplante. Todos os casos de infecção crônica foram documentados em pacientes imunossuprimidos. Manifestações clínicas e diagnóstico A hepatite E crônica ocorre após o transplante. O diagnóstico é baseado na detecção de anticorpos anti-HEV IgM, mas faltam sensibilidade e especificidade aos testes disponíveis. O RNA do HEV também pode ser detectado no sangue ou nas fezes, onde a sua presença é transitória. Os receptores de órgãos sólidos transplantados com hepatite E crônica mantêm repetidamente reatividade dos anticorpos anti-HEV e do RNA do HEV no sangue. Tratamento e Prevenção Não há tratamento validado da infecção crônica pelo HEV. Se os candidatos para transplante ou terapias imunossupressoras devem ser vacinados para prevenir a infecção crônica pelo HEV ainda precisa ser determinado. A hepatite autoimune é um distúrbio inflamatório crônico do fígado, caracterizado pela presença de autoanticorpos no soro, níveis séricos elevados de imunoglobulinas, e uma frequente associação com outras doenças autoimunes. Epidemiologia e Fisiopatologia A hepatite autoimune apresenta-se tipicamente entre as idades de 15 e 25 anos ou entre as idades de 45 e 60 anos, e é mais comum em mulheres. Juntamente com a cirrose biliar primária e esclerosante primária colangite, a hepatite autoimune é uma das três principais doenças hepáticas autoimunes. Acredita-se que a hepatite autoimune seja causada por reações autoimunes contra hepatócitos normais em pessoas geneticamente predispostas ou em pessoas expostas a agentes não identificados desencadeantes de um processo autoimune contra antígenos do fígado. Associações são vistas com o antígeno leucocitário humano (HLA) de classe I B8 e de classe II DR3 e DR52a. Em asiáticos, a hepatite autoimune está associada ao HLA DR4. Manifestações clínicas e Diagnóstico A hepatite autoimune tende a ser mais grave em seu início do que as hepatites crônicas B ou C, e progride para a fase final da doença hepática se não for tratada com imunossupressão. Embora seja ocasionalmente detectada por elevados níveis séricos de aminotransferases em uma avaliação de saúde de rotina, a maioria dos pacientes apresenta fadiga e icterícia. As elevações nos níveis de bilirrubina ou de fosfatase alcalina indicam doença mais grave ou avançada. Os pacientes tipicamente têm elevações importantes nos níveis séricos de gamaglobulinas, especificamente nos níveis de imunoglobulina G, bem como de autoanticorpos dirigidos a constituintes celulares não órgão-específicos. A hepatite autoimune tipo 1 (clássica) é caracterizada pela presença de anticorpos antinuclear, antimúsculo liso com títulos ≥1:80 (>1:20 em crianças), antiactina e de anticorpos antirreceptores de asialoglicoproteína. A hepatite autoimune tipo 2 é caracterizada por elevações similares de anticorpo antimicrossoma de fígado-rim tipo 1 e anticorpo anticitosol hepático tipo 1,usualmente sem anticorpos antinucleares ou antimúsculo liso. A biópsia hepática mostra alterações que são típicas de todos os tipos de hepatite crônica, exceto pelo exuberante infiltrado de células plasmáticas e pela presença de hepatócitos em rosetas. Tratamento e Prognóstico Os sintomas clínicos e as alterações dos exames hepáticos relacionados à hepatite autoimune geralmente melhoram rapidamente após a administração de prednisona, geralmente na dose de 20 a 30 mg/dia, com diminuição nos níveis séricos de aminotransferases para valores normais ou quase normais em 1 a 3 meses. Doses maiores podem ser necessárias em pacientes com doença mais grave. A ausência de resposta bioquímica ou clínica deve levar a uma reavaliação do diagnóstico. A azatioprina na dose de 50 a 100 mg/dia pode ser associada à prednisona desde o início ou adicionada posteriormente para reduzir os efeitos colaterais dos esteroides a longo prazo. As doses de manutenção, que são geralmente necessárias indefinidamente, são 5 a 10 mg/dia de prednisona com 50 a 150mg/dia de azatioprina. Às vezes os pacientes podem ser mantidos com azatioprina (2 mg/kg/dia) em monoterapia. Depois de 3 anos ou mais de remissão, a terapia pode ser cuidadosamente retirada, mas exacerbações graves e mesmo fatais podem ocorrer semanas a meses mais tarde. O prognóstico está geralmente relacionado à fase histológica da doença. Os pacientes que inicialmente responderam a terapia podem permanecer controlados por muitos anos e os que evoluem para fase final da doença hepática necessitam de transplante de fígado. OBS: Doença hepática crônica criptogênica Doença hepática crônica criptogênica refere-se à hepatite crônica ou à cirrose de causa desconhecida, após a exclusão de hepatite B, C, D e E; hepatite autoimune; esteatohepatite, doença hepática alcoólica, hepatite induzida por fármacos e doenças hepáticas metabólicas e hereditárias. Os exames para excluir essas condições incluem os níveis séricos de α1- antitripsina, de ferro e de ceruloplasmina e, se necessário, as concentrações de cobre na urina e no fígado. Nas suas fases mais avançadas, a esteato-hepatite pode estar associada a pouca ou nenhuma gordura nos hepatócitos.
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