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O Dualismo Mente - Corpo: Implicações Para a Prática da Atividade Física (Lucas Vieira Dutra)

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O Dualismo Mente-
Corpo: 
Implicações Para a 
Prática da 
Atividade Física 
Lucas Vieira Dutra 
 
CopyMarket.com O Dualismo Mente-Corpo: Implicações Para a Prática da Atividade Física Lucas Vieira Dultra 
 
 
 
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Todos os direitos reservados. 
Nenhuma parte desta publicação poderá ser 
Reproduzida sem a autorização da Editora. 
Título: O Dualismo Mente-Corpo: Implicações 
Para a Prática da Atividade Física 
Autor: Lucas Vieira Dutra 
Editora: CopyMarket.com, 2000 
 
 
 
 
O DUALISMO MENTE-CORPO: IMPLICAÇÕES 
PARA A PRÁTICA DA ATIVIDADE FÍSICA 
 
 
 
 
 
 
LUCAS VIEIRA DUTRA 
 
 
 
ORIENTADOR: Maria Eunice Quilici Gonzales 
 
Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências do 
Campus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, 
como parte dos requisitos para obtenção do título de 
Mestre em Ciências da Motricidade (Área de Motricidade 
Humana). 
 
 
 
 
 
 
RIO CLARO 
Estado de São Paulo - Brasil 
Setembro 1.996 
CopyMarket.com O Dualismo Mente-Corpo: Implicações Para a Prática da Atividade Física Lucas Vieira Dutra i 
 
 
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Título: O Dualismo Mente-Corpo: Implicações 
Para a Prática da Atividade Física 
Autor: Lucas Vieira Dutra 
Editora: CopyMarket.com, 2000 
 
Oferecimento e Agradecimento 
Lucas Vieira Dutra 
 
 
 
 
 
Ofereço este trabalho aos meus pais e irmãos pelo incentivo e apoio e aos meus filhos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
 
Observando este trabalho, lembro-me de muitas pessoas que contribuíram para que viesse à luz. Não 
vou declinar os nomes por receio de deixar de reconhecer alguém de direito. Meus pais, amigos e colegas do 
curso, todos a sua maneira auxiliaram na manufatura do texto, mesmo sem o saberem. Também os funcionários 
da Universidade Estadual Paulista, em especial as moças do Departamento de Pós-Graduação, sempre gentis e 
solícitas. Os Professores do Curso de Educação Física, muitos dos quais, entre as aulas e nas discussões que 
mantivemos, influenciaram a direção que o trabalho adquiriu. O maior agradecimento vai para a amiga e 
orientadora Maria Eunice, cuja influência em minha formação vai muito além do que se intenta num 
adestramento acadêmico. As suas qualidades profissionais, notadamente a honestidade e o rigor, ombreiam em 
excelência as suas pessoais, o que reconheço deixaram marcas perenes em meu espírito. Obrigado! 
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reproduzida sem a autorização da Editora. 
Título: O Dualismo Mente-Corpo: Implicações 
Para a Prática da Atividade Física 
Autor: Lucas Vieira Dultra 
Editora: CopyMarket.com, 2000 
 
Sumário 
Lucas Vieira Dutra 
 
 
 
AGRADECIMENTOS ........................................................................................................................................... i 
SUMÁRIO ................................................................................................................................................................... ii 
RESUMO .................................................................................................................................................................... iii 
ABSTRACT ................................................................................................................................................................ iv 
INTRODUÇÃO........................................................................................................................................................ 01 
PARTE I - As Raízes Histórico-Filosóficas do Problema da Relação Mente-Corpo........................................ 09 
Capítulo 1. O Problema Da Relação Mente-Corpo nos Gregos Clássicos.......................................................... 09 
Capítulo 2 . O Dualismo Cartesiano........................................................................................................................... 13 
PARTE II - O Problema da Relação Mente Corpo na Visão Filosófica-Científica Contemporânea............. 18 
Capítulo 3 . Crítica ao cartesianismo: Gilbert Ryle................................................................................................... 18 
Capítulo 4 . Materialismo, Funcionalismo e Ciência Cognitiva............................................................................. 26 
PARTE III - O Problema da Relação Mente-Corpo na Prática da Atividade Física..................................... 36 
Capítulo 5. Dualismo e a Prática da Atividade Física.............................................................................................. 36 
CONCLUSÃO............................................................................................................................................................. 52 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................................................ 54 
 
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CopyMarket.com 
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Título: O Dualismo Mente-Corpo: Implicações 
Para a Prática da Atividade Física 
Autor: Lucas Vieira Dutra 
Editora: CopyMarket.com, 2000 
 
Resumo 
Lucas Vieira Dutra 
 
 
 
 
 
O assunto desta dissertação é o problema da relação entre Corpo e Mente, bem como algumas de suas 
implicações para a atividade física humana. Discutimos inicialmente em que consiste este problema, tentando 
identificar alguns de seus componentes, em especial, as conceituações do que seria 'mente' e 'corpo' e a relação 
entre eles. 
Investigando as raízes filosóficas subjacentes a este debate, consideramos, na antigüidade, as 
contribuições das tradições: Idealista, representada pelo trabalho de Parmênides e Platão e Monista e Dualista, 
através de Heráclito e Aristóteles. 
A seguir, verificamos, na modernidade, os reflexos destas tradições, através das concepções dualistas e 
materialistas dos estados mentais. 
Como principal representante da visão dualista do problema mente-corpo, consideramos o raciocínio de 
René Descartes nas obras Meditações e As paixões da Alma. O posicionamento cartesiano ainda possui muitos 
defensores, apesar das dificuldades apontadas pelos seus críticos. 
O trabalho de um crítico de Descartes, o filósofo inglês Gilbert Ryle, é discutido em relação ao que 
pretende apontar de equívocos lingüísticos no raciocínio cartesiano. Neste tipo de erro residiria, segundo Ryle, 
grande parte da fragilidade lógica da visão dualista. 
Outro posicionamento que identifica certas dificuldades na visão dualista seria o Materialismo. 
Discutimos neste âmbito algumas contribuições para o debate materialismo/dualismo, oriúndas do 
eliminativismo, do materialismo reducionista e do Funcionalismo. Analisamos também a incorporação da 
abordagem funcionalista ao programa da Ciência Cognitiva, durante as décadas de 70 e 80. 
Em seguida, discutimos as implicações da visão dualista para a prática da atividade física, através da 
análise do trabalho de alguns teóricos de Educação Física. Estes estudos versam sobre vários aspectos, tais como: 
saúde, "fitness" e a necessidade de considerar o fenômeno do movimento humano de uma perspectiva mais 
holista, integradora dos vários aspectos do Homem que foram se compartimentalizando ao longo dos séculos.Terminamos a dissertação sugerindo que a análise do componente lingüístico pode exercer um papel 
importante, no estudo do problema da relação mente-corpo. Este aspecto da linguagem parece estar subjacente 
nas discussões tanto teóricas quanto práticas e muitas vezes implicam em equívocos que dificultam o debate, 
levando a obstáculos trabalhosos de parte a parte. 
 
CopyMarket.com O Dualismo Mente-Corpo: Implicações Para A Prática Da Atividade Física Lucas Vieira Dutra iv 
 
 
CopyMarket.com 
Todos os direitos reservados. 
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reproduzida sem a autorização da Editora. 
Título: O Dualismo Mente-Corpo: Implicações 
Para A Prática Da Atividade Física 
Autor: Lucas Vieira Dutra 
Editora: CopyMarket.com, 2000 
 
Abstract 
Lucas Vieira Dutra 
 
 
 
 
 
 
 
This thesis deals with the Mind-Body Problem (MBP), and its implications to studies of human 
physical activity. For centuries, this MBP has been the subject of attention of a great number of 
thinkers in many fields, but in spite of this, we do not have consensus about this matter. In others 
words, this problem remains unsolved. 
 
As a matter of fact, the MBP embraces many others problems, mainly the correct definitions of 
what is 'body' and 'mind', and the relationships between them. Additional obstacles prevents, on the 
one hand, an understanding of human being as a whole, sometimes determinating a partial conception 
of them as a quasi-perfect aggregate of parts forming a self-contained, independent physical unit. On 
the other hand, humans can be viewed as an expression of an aggregate of two or even three different 
substances, one necessarily 'spiritual' or mental. 
 
The present work introduces some of the traditional theories on the MBP and analyses the 
influences they led in this field nowadays. Implications of these views to some aspects of human 
physical activities are discussed, and the possibility of linguistic errors in the mantenance of the dualistic 
view is considered. 
 
 
 
 
KEY WORDS: Categorical mistake, Dualism, Functionalism, Human physical activity, 
Materialism, Mind-body problem. 
 
CopyMarket.com O Dualismo Mente-Corpo: Implicações Para a Prática da Atividade Física Lucas Vieira Dutra 
 
 
1
 
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Título: O Dualismo Mente-Corpo: Implicações 
Para a Prática da Atividade Física 
Autor: Lucas Vieira Dutra 
Editora: CopyMarket.com, 2000 
Introdução 
Lucas Vieira Dutra 
 
Um dos temas mais apaixonantes com que a Humanidade sempre conviveu, desde a Antigüidade, foi o 
do relacionamento entre a Mente e o Corpo. Neste final de século, com o grande progresso científico, este 
mistério adquiriu contornos ainda mais desafiadores. Quanto mais explicações são propostas para elucidar a 
natureza do "mental", muitas vezes confundido e/ou associado com "alma" e "espírito" e sua relação com o 
corpo, tantas mais perguntas surgem. 
A mente sempre foi considerada um enigma, constituindo um objeto de estudo, principalmente de 
filósofos e psicólogos. Contudo, ultimamente, ela passou a ser também matéria de textos e programas 
apresentados normalmente ao grande público, principalmente através dos meios impressos de comunicação (1). 
Apesar de seu 'difícil' acesso, os fenômenos mentais se reduzem, para a Ciência, a estados cerebrais. O 
cérebro constituiria a fonte de onde poderiam surgir, assim que avançassem as pesquisas, as descobertas sobre a 
natureza do fenômeno mental. Para os materialistas, não existe a dificuldade platônica de explicar os 
acontecimentos da mente entendidos como "invisíveis", i.e., acontecimentos que ocorrem mas ninguém tem 
acesso, além do próprio sujeito que os possui. 
Das pesquisas do efeito de drogas no cérebro e das doenças neurológicas, novas descobertas acerca 
do que seria a mente vêm dando suporte à concepção materialista do mental. Diversos periódicos de 
divulgação institucional também abordam o tema. O informe publicitário oficial da Associação Paulista de 
Medicina, distribuído através dos jornais de grande circulação, em sua edição de 30 de outubro de 1.992, traz 
em seu Editorial a aceitação da interação entre mente e corpo, citando que fatores emocionais influenciam 
"praticamente todas as doenças" (p. 01). 
Se o grande público pode ter acesso, atualmente, a uma massa de informações muito extensa sobre o 
assunto, originada das mais inesperadas fontes, mais premente se faz à Ciência discutir alguns aspectos da relação 
mente-corpo. Em especial, os profissionais envolvidos com a atividade física esportiva ou recreativa poderiam, 
assim julgamos, incluir em seu programa de trabalho a consideração de tais temas, pelas implicações práticas e de 
pesquisa que suscita. Por exemplo, na discussão sobre se Educação Física constitui um tema científico ou uma 
disciplina acadêmica, o assunto da relação entre mente e corpo tem o seu lugar (2). 
Santin (1.990) sugere a necessidade de se discutir as relações entre o corpo e a mente para a constituição 
de um saber apropriado, no bojo da Educação Física. Subordinar, quer o corpo, quer a mente, um ao outro em 
termos de importância, vai dificultar o reconhecimento da harmonia e beleza que ao final deve presidir as 
considerações sobre o ser humano. Isto porque parece que o Homem é um todo, não obstante dividirem-no 
para fins didáticos e de pesquisa e a ênfase num ou noutro aspecto vai influenciar a compreensão dos demais. 
Na mesma linha de pensamento, Cunha (1.988) identifica a tendência antiga de se dualizar o ser humano 
no ato de estudá-lo, o que leva, em sua opinião, a incorreções pelas parcialidades que emergem. Continuando seu 
raciocínio, o autor considera a Educação Física como pré-ciência da Ciência da Motricidade Humana, 
constatando ser aquela "tão somente uma tradição disciplinar, não uma autonomia disciplinar" (idem, p. 06). O 
que parece estar implícito nesta discussão é o relacionamento entre a mente e o corpo, visto que, segundo 
Cunha, falta à Educação Física o que a Ciência da Motricidade Humana procura abarcar: o correto balanço entre 
o que a primeira tradicionalmente estudou e o que se concebe necessário acrescentar em conhecimento sobre o 
Homem como um todo (Cunha, 1.986 ; Cunha, 1.991). 
A partir dos comentários acima, onde ressaltamos a importância do tema da relação mente-corpo em geral 
e no contexto da atividade física em particular, iremos discuti-lo sob uma perspectiva teórica de cunho filosófico. 
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2
Aparentemente, todo campo de atividade que se relacione diretamente com vidas humanas pode se 
beneficiar em considerar o estudo de seus pressupostos filosóficos. Muitas questões consideradas de modo 
isolado, compartimentalizado, induzem a raciocínios no mínimo incompletos, quando não ilusórios ou 
equivocados. Há que se fiar nos procedimentos já consagrados de reflexão sistemática que nos garantam margem 
aceitável de rigor e plausibilidade nas indicações dos caminhos escolhidos e nas conclusões. 
O presente trabalho pode ser entendido como um esforço para esclarecer conceitos relativos à 
concepção de corpo e mente. Como os conceitos só podem ser compreendidos com relação a redes de outros 
conceitos, julgamos oportuno discuti-los, bem como a relação entre eles, dentro do contexto da atividade física. 
Antes de delimitar os caminhos específicos por onde desenvolveremos nossa pesquisa, faremos uma breve 
introdução geral aos conceitos de corpo e mente, que serão discutidos em detalhe no decorrer do nosso trabalho. 
Iremos identificar adiante algumas caracterizações destes e de outros conceitos associados ao corpo, àmente e à relação entre estas duas instâncias, baseados principalmente na obra de Churchland (1.984). 
O conceito de corpo 
Nomeamos "corpo", no discurso do senso comum, às coisas que ocupam lugar no espaço (que possuem 
extensão), que nos rodeiam e que percebemos sensorialmente. Já nas várias abordagens científico-filosóficas, 
para que possamos compreender e raciocinar sobre este conceito, procuramos identificar e descrever-lhe os 
atributos distinguíveis. Desde a Antigüidade isto já se intentava. Por exemplo, Lucrécio (1.973), discípulo de 
Epicuro, salientava que "quanto aos corpos, basta o senso comum para lhes afirmar a existência; se não 
pusermos esta crença como fundamento sólido, não haverá, quando tratarmos de assuntos mais obscuros, nada 
em que nos apoiemos para estabelecer pelo raciocínio o que quer que seja" (p. 44, linha 420). 
Um outro exemplo é a caracterização de Voltaire (1.752/1.978a) que identifica dois aspectos denotativos 
essenciais dos corpos: a extensão e a solidez. Sugere ainda a divisibilidade, quando pergunta: "De que se faz um corpo? 
De várias partes, e estas tais partes dividem-se noutras partes. E o que são estas últimas partes? Ainda e sempre 
corpos..."(p. 129-130). No entanto, em outro trabalho, (Voltaire, 1.734/1.978b) ao criticar uma idéia de Pascal, o 
mesmo alerta que "...não conhecemos o espírito nem o corpo; não temos idéia alguma de um e temos idéias muito 
imperfeitas do outro. Portanto, não podemos saber quais são seus limites (Vigésima Quinta Carta, LVI, p. 57). 
A ênfase na extensão, solidez e divisibilidade está também presente em Locke (1.706/1.973) que 
identifica, na sua obra "Ensaios sobre o entendimento humano", vários aspectos importantes para a consideração 
dos corpos. Diz ele, principalmente nos capítulos XIV (p. 195), XVI (p. 199) e XVII (p. 201), que todos os 
corpos compartilham as características de terem uma extensão mensurável ou atribuída, o que leva à noção de 
quantificação e também o aspecto de ocuparem um espaço delimitado. A extensão implica aos corpos se 
justaporem uns aos outros, posto que não se interpenetram (cap. IV, p. 174) e condiciona as suas partes 
extraporem-se num todo configurável (cap. XIII, p. 192, 193). Pode-se ainda conjeturar outros aspectos sobre os 
corpos, tais como a mutabilidade e a diversidade 
Entre todas as qualidades mencionadas acima, uma vai assumir importância fundamental no exame dos 
corpos: o aspecto da animação da matéria. O corpo, o ente corpóreo, é uma partícula do cosmo material. Alguns 
corpos apresentam a capacidade de locomoção, assimilação, crescimento e reprodução, próprios dos organismos 
vivos. Tais corpos, além de possuir em si as leis dos processos meramente físico-eletro-químicos, passam a 
subordinar-se também às leis que presidem a vida orgânica. Podemos, segundo Jolivet (1.979, p. 116) caracterizar 
a vida, descrevendo-a, em sua manifestação, pelo movimento espontâneo e imanente, ou seja, por um 
movimento que o ser vivo produz por si mesmo. 
O movimento não é sempre comunicado ao ser vivo mecanicamente, de fora, como no caso do 
movimento de uma pedra, mas pode resultar de desejos, intenções, crenças, inerentes ao ser vivo (estas noções 
serão discutidas no decorrer deste trabalho). 
De particular relevância para o Homem é uma região do corpo denominado encéfalo (3) que, em seus 
vários estados, segundo os materialistas, caracteriza a atividade mental. Nas discussões sobre a existência do que 
se denomina "mente" inevitavelmente se divisa o tema do corpo humano em geral e do encéfalo em particular. 
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3
Afinal, parece que as mentes "habitam"(4) os corpos, em especial numa parte circunscrita ao tecido 
nervoso nomeado cérebro(5). Sabemos disso principalmente pelos efeitos que se demonstra na vida mental 
quando o cérebro sofre a ação de traumatismos, intoxicação por drogas, doenças(6), etc. 
Segundo Churchland (1.984, p. 121), o sistema nervoso foi desenvolvido a partir de uma necessidade 
requerida pelos organismos multicelulares, de modo a facultar maior longevidade do indivíduo (o todo 
organizado tem a melhor expectativa de duração do que as partes que o compõem, além de ter melhor resposta à 
ação de predadores) e propiciar melhor capacidade reprodutiva. As várias partes especializadas de um organismo 
necessitam um sistema de comunicação entre células e órgãos que seja muito mais confiável e rápida do que a 
comunicação química. 
Através de informações obtidas do estudo dos registros de fósseis, do estudo do desenvolvimento do 
sistema nervoso em embriões e do estudo da biologia dos organismos simples, consegue-se reconstruir a história 
evolucionária dos sistemas nervosos. Esta história evolucionária leva-nos a crer que, de dois conjuntos básicos e 
distintos (física e funcionalmente) de fibras nervosas, evoluíram os organismos em direção a sistemas altamente 
especializados de controle de comportamento e de movimento, dentro de um ambiente de objetos que também 
se movimentam. 
O responsável em grande parte por este fenômeno é o neurôneo, uma célula alongada transmissora de 
impulsos, processadora de "inputs" recebidos via sinapses de outras células. Estes neurônios interconectam-se 
intensamente e adensam-se no tecido denominado córtex cerebral. Este nada mais é do que a superfície exterior de 
cada hemisfério cerebral composta de um largo tecido celular, dobrado sobre si mesmo como um papel amassado, 
"enrugado como uma noz" (Rose, 1.984, p. 25) de modo a maximizar a área total existente dentro do crânio. 
O cérebro gerencia, através dos neurônios sensoriais, as atividades do ambiente fora do mesmo, mas ao 
realizar este trabalho gerencia também muitos aspectos de suas próprias operações. O cérebro tem uma rede 
extensa de "pontes" entre suas partes, o que se revela crucial para o seu funcionamento. A plasticidade das 
atividades de processamento de informações que o cérebro exibe fundamenta-se, em grande parte, na sua 
capacidade de dirigir atenção a aspectos prioritários, orientando seus recursos na consecução destes objetivos 
(Churchland, 1.984, p. 137). 
Por meio de sua neuroarquitetura, o cérebro monitora os comportamentos corporais. Através de 
estudos dos distúrbios cognitivos produzidos por lesões em diferentes regiões do cérebro, infere-se que existe 
estreita correlação entre o que ocorre na matéria neural e o que se verifica no exame dos estados mentais 
(Churchland, 1.984, p. 142). O tecido nervoso pode ser danificado via uma infinidade de causas: objetos externos 
adentrando o crânio; danos pela pressão dos fluídos ou pelo crescimento de tumor; pode definhar pela perda de 
suprimento de nutrientes e oxigênio ou ainda degenerar por doença ou problemas geriátricos. Sabemos de 
distúrbios ocasionados por mal funcionamento bioquímico no nível dos neurotransmissores, hormônios 
facilitadores (ou inibidores) da transmissão de impulsos nervosos na sinapse. 
Dependendo da localização da lesão cerebral ocasionada por quaisquer das causas acima declinadas, 
impedimentos na capacidade psicológica vão ocorrer para aquele que sofreu a lesão, variando enormemente na 
sua extensão e especificidade. Através da análise de cadáveres bem como de dados de outras técnicas 
diagnósticas, neurologistas e neuropsicólogos encontraram inúmeros correlatos neurais de distúrbios cognitivos e 
comportamentais, possibilitando a construção de um mapa funcional que ilustre o funcionamento de um cérebro 
normal. Estes dados, associados com um detalhamento da neuroarquitetura e da microatividade das áreas 
relevantes do cérebro, permitem nos levar a um entendimento do modo de funcionamento de algumas de nossas 
capacidades cognitivas, ainda que de forma limitada. 
Por outro lado, não se deve esperar que as neurociências irão descobrir inteiramente, um dia,um tipo 
unificado e simples de atividade neural que explique o fenômeno da inteligência consciente (Churchland, 1.984, 
p. 144). Aparentemente, esta abrange muito mais situações do que as que possamos descrever com o 
funcionamento das partes do cérebro, no ato de processar informações. Contudo, dadas as inegáveis correlações 
entre alterações no cérebro e estados alterados de consciência, autores como Churchland pretendem explicar o 
funcionamento do sistema cognitivo, estabelecendo-se uma identificação entre mente e cérebro (posição 
materialista reducionista). 
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4
Segundo o Materialismo reducionista (ou Teoria da Identidade) os estados mentais são estados do 
cérebro. Cada tipo de estado ou processo mental é idêntico a um tipo de processo ou estado físico, dentro do 
cérebro ou sistema nervoso central (Churchland, 1.984, p. 26). Na visão de alguns estudiosos da teoria da 
identidade, temos uma identidade universal em que um tipo específico de estado físico corresponde sempre a um 
mesmo tipo de estado mental. Por outro lado, outros teóricos asseveram que diferentes sistemas físicos podem, 
por constituirem estados físicos diferentes, estar relacionados a um mesmo estado mental. No primeiro caso, 
temos a tradicional teoria 'type-type' da identidade, no segundo caso, a chamada teoria 'token-token' da 
identidade. Tanto no posionamento 'type' como no posicionamento 'token', temos uma identidade e não uma 
mera correlação entre estados cerebrais e estados mentais. Observa-se uma área onde não se distingue mais a 
mente do corpo e vice-versa. Contudo, muita crítica tem sido desenvolvida, principalmente para o 
posicionamento 'token', posto que, paradoxalmente, a partir desta perspectiva, o estudo do cérebro não permite 
uma explicação da mente. Frente a este paradoxo, alguns materialistas radicais, entendidos como eliminativistas, 
esclarecem que o problema ocorre visto adotarem-se os termos da psicologia do senso comum, fortemente 
impregnada, segundo nossa concepção de termos mentalistas. 
Vemos, a partir destes últimos parágrafos, como a conceituação de corpo humano parece incorporar, 
sob certas abordagens, aspectos que poderiam ser catalogados sob a rubrica de "mente". Está longe de ser 
claramente demarcada a fronteira que delimita as instâncias do que pode ser entendido como 'corpo' e 'mente'. 
Contudo, vários tipos de problema têm sido formulados para o estudo desta correlação e a seguir vamos 
introduzir alguns deles. 
O conceito de mente 
O Problema Mente-Corpo (ver Quadro 1) pode ser dividido em três sub-problemas, com o intento de 
delinear um possível relacionamento que a mente mantém com o corpo humano. Para termos uma aproximação 
adequada desta questão, devemos estabelecer outro questionamento, além da já abordada "O que é o corpo 
humano?". A questão complementar que se interpõe justamente é "O que é a mente?". 
 
 
RELAÇÃO MENTE-CORPO 
 
 
 
MENTE CORPO 
 
Quadro 1 - Representação diagramática dos componentes do Problema da Relação Mente-Corpo 
Iremos basear nossa explanação nos argumentos de Campbell (1.971), Priest (1.991), Searle (1.984) e 
Armstrong (1.983), elencando o que os mesmos discutem sobre o que seja a mente. Falaremos sobre 
individualidade, pensamento, consciência e intencionalidade. 
Uma primeira questão a estabelecer é se a mente (se a entendemos relacionada com o corpo) seria uma coisa, 
uma substância, um algo. Assume-se que pessoas adultas saudáveis possuem uma (e uma só) mente. Contudo, isto 
não prova que a mente exista, no mesmo sentido em que dizemos, no caso de alguém que tem diabetes, apresentando 
sintomas específicos efetivamente averiguados, que o diabetes existe. Campbell (1.971, p. 5) coloca que a sugestão de 
considerar-se a mente como uma 'coisa' está aberta a questionamentos, mas que este questionar-se afeta somente o 
modo de se colocar o problema, e não o problema em si, que permanece. O autor indica que nova luz pode ser 
enfocada na questão ao se assumir a mente como algo, como uma coisa, facultando auferir em que consiste as 
características mentais do homem e as relações que mantêm com as suas características físicas. 
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5
Outro aspecto que surge é o da individualidade. Ainda que haja discordância do que seja a mente, 
considera-se que um adulto possui uma mente individual. Mesmo que outros problemas apareçam, do tipo: 
"pode uma mente ser compartilhada com outra?" (como, ao que parece, na telepatia), fica a questão de como 
minha mente se relaciona com meu corpo, como sua mente se relaciona com seu corpo. 
A Mente parece ser o elemento principal que diferencia o Homem dos outros objetos que aí estão, como 
plantas e pedras (há controvérsias sobre a existência ou não de mente nos animais). Entretanto, no discurso do 
senso comum, as pessoas seriam diferentes dos demais seres vivos, devido à existência da mente e esta retrataria, 
identificaria justamente esta diferença. Isto porque o Homem faz muitas coisas que as pedras, carvão e a maioria 
dos animais em conjunto não realizam. Falar de mente, segundo Campbell (1.971, p. 3), é falar de atividades 
auto-organizadas que distinguem o Homem de pedras, de carvão, de cadáveres, etc. 
Priest (1.991, p. 210) julga que se considerar algo como mente é dizer que o mesmo tem capacidade de pensar. 
Para ele, ter a capacidade de pensar é logicamente necessário e suficiente para ser uma mente. O autor, compartilhando a 
teoria materialista, coloca ainda que a mente é o cérebro e que esta constatação é uma verdade empírica e contingente, 
não uma verdade a priori e necessária. Seria empírica no sentido que é verificada por experiência, como quando uma 
parte do cérebro de alguém é danificada e ocorrem danos em sua capacidade de pensar. Considera a mente uma parte do 
corpo, visto ser o cérebro, e remete o problema mente-corpo à investigação de como se processa o relacionamento do 
pensamento com o cérebro e o relacionamento entre a consciência e o cérebro. 
Um outro tópico sempre associado ao tema da mente é a noção de consciência. A consciência é a 
primeira de quatro características mentais com que Searle (1.984) inicia suas ponderações sobre a dificuldade em 
se tratar o problema mente-corpo. Diz o autor, à pagina 20, que é um fato evidente que o Mundo contém 
estados e eventos mentais conscientes, apesar de ser difícil ver como meros sistemas físicos, podem ter 
consciência. Ele se pergunta: 'como o cérebro cinzento e branco dentro do crânio pode ser consciente?'. A 
consciência seria, em sua concepção, o fato central da existência especificamente humana. Sem ela, outros 
aspectos também especificamente humanos de nossa vida (linguagem, amor, humor), seriam impossíveis. 
Uma segunda característica da mente seria a intencionalidade (Searle, 1.984, p. 21), pela qual nossos 
estados mentais, nas palavras do autor, "se dirigem a, ou são acerca de, ou se referem a, ou são (oriúndos) de 
objectos e estados de coisas do mundo diferentes deles mesmos". A questão da intencionalidade guarda 
semelhança com a questão da consciência, no sentido de que, como meu cérebro poderia ser acerca de alguma 
coisa? Como poderia se referir a algo? 
Uma terceira característica da mente seria a subjetividade dos estados mentais. Exemplificando, digo 
que posso sentir minha dor, mas você não. Somos cônscios de nós mesmos e de nossos estados mentais, 
enquanto distintos dos estados mentais e da individualidade dos demais. Como se compatibiliza a realidade dos 
fenômenos mentais subjetivos com a concepção científica da realidade objetiva do cérebro? 
A quarta característica apontada por Searle (1.984, p. 22) seria a causação mental. Se nossospensamentos 
e sentimentos são verdadeiramente mentais, como podem afetar causalmente algo de físico? Como pode, indaga o 
autor, algo que é mental originar uma diferença física?(idem, ibidem). O conceito de causação mental permanece 
ainda bastante polêmico dentro dos estudos do mental. Ele será retomado no decorrer deste trabalho. 
Após esta breve introdução aos conceitos de corpo e mente, passaremos agora a delimitar os objetivos e 
o caminho que desenvolvemos na pesquisa realizada nesta tese. 
Objetivos e tema do trabalho 
Iremos adiante identificar nosso itinerário de análise do problema da relação mente-corpo, expondo os 
assuntos que serão debatidos. Nossa pretensão não é discutir filosofia, mas analisar um assunto que permeia qualquer 
esforço de explicação das conquistas na Ciência, relacionadas à atividade física e ao Homem como um todo. 
Conforme mencionado, nosso tema de trabalho gira em torno da análise do problema mente-corpo, 
visto sob uma perspectiva teórico-filosófica que visa averiguar as implicações das diferentes abordagens deste 
problema para a prática da atividade física. 
Na parte I, composta por dois capítulos, iremos analisar as raízes histórico-filosóficas do problema 
mente-corpo. No capítulo I, discutiremos estas raízes nos gregos clássicos. No capítulo II, consideraremos o 
problema da relação mente-corpo na tradição cartesiana. 
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Mais especificamente, estudaremos no capítulo I dentro dos gregos clássicos, como as tradições de 
Parmênides e Heráclito deram lugar, através respectivamente de Platão e de Aristóteles, à formação de duas 
concepções de Homem que ainda encontram eco nos dias de hoje. No capítulo II, discutiremos a contribuição 
de René Descartes para a discussão do problema mente-corpo, analisando as obras Meditações e As Paixões da 
Alma. Temos representado em Descartes o primeiro esforço racional, sistemático, elaborado com sentido de 
dotar o dualismo entre o físico e o mental com um embasamento criterioso. A influência destas obras para a 
Ciência e a Filosofia, no tocante ao problema mente-corpo em geral, faz necessário inserirmos esta discussão 
antes de introduzirmos outros aspectos. 
Na parte II, composta de dois capítulos, discutiremos o problema da relação mente-corpo na visão 
filosófico-científica contemporânea. Através do capítulo III, analisaremos algumas críticas ao trabalho de 
Descartes. Nas seções I, II e III deste capítulo, discutiremos a obra de Gilbert Ryle The Concept of Mind (1949), 
onde é apresentada uma análise crítica do dualismo cartesiano. 
No capítulo IV apresentaremos a posição do Materialismo, do Funcionalismo e da Ciência Cognitiva 
sobre o problema mente-corpo. Discutiremos as seguintes questões: (a) podem os processos mentais serem 
entendidos como processos cerebrais, e (b) as hipóteses materialistas concernentes ao problema da relação 
mente-corpo possuem efetivamente um status científico? 
Na parte III, iremos refletir sobre o problema da relação mente-corpo na atividade física, em duas 
etapas. No capítulo V, analisaremos inicialmente questões sobre a mudança da imagem tradicional do Homem e 
sobre a influência dualista na prática da atividade física. Prosseguindo, discutiremos os conceitos de 'fitness' e 
saúde e as contribuições das abordagens orientais de atividade física, para o alargamento da visão ocidental em 
torno das tendências futuras para a prática da atividade física. 
Finalmente, na Conclusão, faremos um balanço das questões anteriormente discutidas, e analisaremos 
alguns de nossos achados. 
Metodologia empregada 
O termo "método científico" é utilizado normalmente para descrever um conjunto de procedimentos 
racionais, sistematicamente empregados na busca e justificação do conhecimento. 
A nossa empreitada aqui é discutir como utilizar um método de modo a clarificar nossos argumentos, 
tornando possível a obtenção do conhecimento sobre o problema da relação mente-corpo. Com tal objetivo 
iremos introduzir brevemente os raciocínios subjacentes aos métodos dedutivo, indutivo e abdutivo (ou 
retrodutivo), baseando-nos principalmente em Peirce (1.974) e Beveridge (1.981). Segundo este último, as 
principais etapas do método científico podem ser assim resumidas: 
"(a) Reconhecimento e formulação do problema; 
 (b) Coleta de dados relevantes; 
 (c) Definição de uma hipótese por indução, indicando as relações causais ou padrões significativos dos dados; 
 (d) Deduções a partir da hipótese e comprovação de sua exatidão pela experimentação ou com a coleta de 
mais dados; e 
 (e) Raciocínio de que se os resultados forem coerentes com a dedução a hipótese ficará fortalecida, mas não 
comprovada". (Beveridge, 1.981, p. 56-57) 
Estas etapas, aparentemente simples, envolvem inúmeras dificuldades lógicas e práticas, as quais não 
serão objetos de análise neste trabalho. Vamos antes, nos concentrar em alguns elementos dos tipos de raciocínio 
acima mencionados, de modo a colocarmos posteriormente o método que utilizamos em nosso trabalho. 
Peirce (1.974), discutindo as etapas do raciocínio científico, indaga "Qual é a utilidade do pensamento?" 
(par. 159, p. 50) e passa a explicar, respondendo a sua própria pergunta, três tipos de raciocínio, o dedutivo, o 
indutivo e o abdutivo. 
No raciocínio dedutivo, descobre-se uma verdade a partir de outras já conhecidas. "Na dedução, 
partimos de um estado de coisas hipotético definido abstratamente por certas características"(idem, ibidem). A 
inferência é válida se e somente se observamos uma estreita relação entre a informação contida nas premissas e a 
informação contida na conclusão. 
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Nas palavras de Peirce, "a dedução envolve apenas as conseqüências necessárias de uma pura hipótese" 
(idem, p. 52), não podendo por isso dar origem a nada de novo (ver também Vargas, 1.985, p. 35)( ). Neste tipo 
de raciocínio o nexo lógico é o preponderante, não sendo tão relevante para o desenvolvimento do trabalho uma 
ligação das premissas com o mundo real. Por exemplo, no raciocínio: 
Todos os homens são mortais 
Sócrates é homem 
Sócrates é mortal 
todos os elementos para se chegar à conclusão estavam presentes nas premissas. 
Diferentemente, no raciocínio indutivo procura-se, principalmente através da experiência, a 
correspondência das idéias com o que existe na realidade. "Um experimento...é uma pergunta posta à 
Natureza...(e)...baseia-se numa suposição"(Peirce, 1974, p. 52). Segundo Peirce, "A indução determina o valor de 
uma quantidade. Acompanha uma teoria e mede o grau de concordância desta teoria com os fatos. Não poderá 
nunca dar origem a uma nova idéia"(idem, p. 47). No raciocínio indutivo, se as premissas são verdadeiras, 
dizemos que a sua conclusão é, provavelmente, verdadeira. Exemplificando, se após inspecionarmos milhares de 
feijões em um saco constatarmos que, sem exceção, todos são brancos, diremos que todos os feijões daquele 
saco são brancos. No entanto, bastará a constatação da presença de um feijão preto naquele saco para ser 
necessário reformar o que até então se supunha verdadeiro. 
Segundo Peirce (1.974), para apreender ou compreender os fenômenos, só o raciocínio abdutivo pode 
funcionar como método (p. 52). Para ele, este raciocínio consiste em estudar os fatos e inventar uma teoria para 
explicá-los (idem, p. 47); é o processo para formar hipóteses explicativas. É a única operação lógica a introduzir 
idéias novas (idem, p. 52). 
O raciocínio abdutivo tem originado muitas das idéias da ciência. Em termos práticos, parte-se da análise 
da hipótese que se julga temporariamente verdadeira, extraindo-se as conseqüências de uma tal suposição. Em 
outras palavras, testamosnossa suposição ou conjetura, explorando suas conseqüências, ainda que não possamos 
demonstrar totalmente a validade de nossa suposição inicial. 
Gonzales (1.984) discute o que Hanson (1.963) cita sobre a descoberta do neutrino, como exemplo de 
ocorrência do raciocínio abdutivo: 
"Essa descoberta ocorreu com a detecção de partículas beta que, ao serem 
emitidas de uma fonte radioativa de desintegração espontânea, diferente-mente 
das partículas alfa, apresentavam camadas, e portanto, energia cobrindo um 
amplo espectro. Mas este fato conflitava com o princípio aceito de conservação 
de energia pois, se a fonte radioativa era homogênea, e todas as partículas 
possuem as mesmas propriedades, então, o fato de que algumas teriam mais 
energia que outras levava a crer que "nessas outras" a energia não estava sendo 
conservada. Diante desta anomalia, cogitou-se a hipótese de que, se as partículas 
beta fossem sempre emitidas com alguma outra partícula (neutrino) ainda não 
detectada (possuindo carga neutra e algumas outras propriedades relevantes), 
então cada par de partículas emitidas (beta mais neutrino) teria uma energia igual 
à de qualquer outro par de partículas". (Gonzales, 1.984, p. 53) 
Gonzales sugere que, na abdução, um aspecto essencial é que a mente procura restabelecer a harmonia na 
visão do mundo, quando constata que alguma anomalia ocorreu. Assim, partimos sempre da constatação de um 
problema ou de alguma anormalidade. As hipóteses sugeridas vem no sentido de restaurar a quebra da suposta 
harmonia, reintroduzindo uma visão coerente do fenômeno a ser explicado. 
Comparando os três tipos de raciocínio, Peirce (1.974, p. 52) assevera: "Dedução prova que algo deve 
ser; Indução mostra que algo atualmente é operatório; Abdução faz uma mera sugestão de que algo pode ser". 
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Em nossa dissertação, iremos utilizar o método abdutivo na atividade de pesquisa, intentando 
compatibilizá-la com as demais atividades acadêmicas. Temos um problema, qual seja, como se processa a 
relação entre a mente e o corpo e as implicações desta relação para a atividade física. Partimos da hipótese de que 
o vocabulário subjacente ao discurso utilizado pela tradição, escola ou visão teórica, influencia tanto os achados 
de sua própria discussão, como problematiza o debate com outras tendências ou posicionamentos acerca do 
problema mente-corpo. 
O método abdutivo irá nos auxiliar nesta empreitada visto possuir o mérito de permitir mantermo-nos, 
inicialmente, distanciados desta ou daquela posição acerca do tema da tese. Num assunto como este, seríamos 
tentados a adotar um ou outro posicionamento como ponto de partida. A nossa estratégia consiste em partir 
apenas de uma intuição, no sentido comum de se possuir uma vaga idéia do problema e explorar as 
conseqüências desta intuição. 
Notas 
(1) O Jornal "O Estado de São Paulo", no caderno GERAL de 10 de fevereiro de 1.993, à p. 10 reproduziu texto 
do jornalista Andrew Pollack, do The New York Times, relatando, entre outros fatos, que "computador poderá 
ser controlado pela mente". Nesta linha de apelo tecnológico, o Caderno de Ciência do jornal "Folha de São 
Paulo" do dia 04 de novembro de 1.992, à p. 1-12 (artigo da Redação) relatou que "televisão modifica a estrutura 
da mente". Eminentes personalidades, utilizando principalmente tais veículos de comunicação, emitem opinião 
sobre o assunto, tentando veicular o tema as suas áreas. O cineasta Ruy Guerra assinou matéria no jornal "O 
Estado de São Paulo", denominado "Da mulher, da alma, do índio e do negro", no caderno 2, à p. D-3 (31 de 
Outubro de 1.993) e perguntou "algum dia aos animais lhes vai ser reconhecida a existência da alma?". O 
renomado consultor de empresas Gutenberg de Macêdo relata em seu artigo "Administração clássica está 
condenada", publicado no caderno de empresas do jornal "O Estado de São Paulo" à p. L-1, de 16 de setembro 
de 1.993 que "não existe a divisão corpo-mente; o ser humano é uma unidade". No Jornal Folha de São Paulo, o 
Caderno MAIS! de 24 de março de 1.996 trouxe vários artigos sobre o problema da relação mente-corpo, com 
variados tópicos. Até nas revistas femininas 'curiosos' perpetram reportagens divulgando o tema. A jornalista 
Cristina Ribeiro Nabuco retrata no artigo "Corpo e Mente - como as emoções interferem na nossa saúde" 
(Revista CLÁUDIA, Ed. Abril, numero 11, novembro de 1.989, p.44) opiniões de médicos, psicólogos e 
terapeutas associando diversos aspectos intrigantes do papel da mente na sua relação com o corpo. Até em 
revistas pacifistas encontram-se artigos razoávelmente interessantes. Para uma discussão sobre medicina 
alternativa, ver artigo do Dr. L. Terry Chapell (Fellowship, March/April, 1.995) e a sessão de cartas, in 
Fellowship, September/October, 1.995, p.22-24. 
(2) Em nosso trabalho, procuraremos evitar o uso do termo 'Educação Física', dada a sua carga teórica. Contudo, 
quando for empregada por autores específicos, a utilizaremos. Teixeira (1.993), por exemplo, relata que a expressão 
'Educação Física', como nomenclatura, seria ambígua e imprecisa, e sugere originar-se esta imprecisão, entre outros 
aspectos, da atividade de formação do profissional baseada também em exercícios ginásticos, destinados ao 
adestramento do corpo, envolvendo atividades motoras. Este contexto nos parece remeter a questões ligadas à 
relação presumida da mente com o corpo. 
(3) Encéfalo seria a parte do Sistema Nervoso Central contida na cavidade craniana, abrangendo o cérebro, o 
cerebelo, pedúnculos, a protuberância e o bulbo raquiano. 
(4) Conforme veremos nos capítulos posteriores, a noção de mente "habitando" um corpo ou identificando-se 
com ele é objeto de grande controvérsia entre dualistas e monistas. 
(5) Cérebro seria a porção do encéfalo que ocupa dentro da luz craniana toda a parte anterior e superior. 
(6) Em um livro dirigido ao grande público, Crook (1.986) discute os efeitos da presença do fungo Candida 
Albicans no funcionamento do organismo humano de um modo geral e sobre o funcionamento mental em 
particular. Um grande elenco de sintomas orgânicos, tais como prostração, debilidade física, depressão e apatia 
são associados ao grau de infestação do fungo no indivíduo. 
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Todos os direitos reservados. 
Nenhuma parte desta publicação poderá ser 
reproduzida sem a autorização da Editora. 
Título: O Dualismo Mente-Corpo: Implicações 
Para a Prática da Atividade Física 
Autor: Lucas Vieira Dutra 
Editora: CopyMarket.com, 2000 
As Raízes Histórico–Filosóficas do Problema 
da Relação Mente-Corpo 
Lucas Vieira Dutra 
 
 
"Alma, não procure a vida imortal, mas esgote o reino do que é possível." 
Píndaro (518-438 a.C) 
 
1. O Problema da Relação Mente-Corpo nos Gregos Clássicos 
Introdução 
Ao nos defrontarmos com o tema da relação existente entre mente e corpo, vemos que as suas raízes 
históricas remontam aos Gregos clássicos e a sua discussão contou, já naquela época, com inúmeras 
contribuições principalmente por parte dos filósofos. Iremos alinhavar aqui as principais correntes filosóficas que 
influenciaram as considerações modernas sobre o que veio a ser denominado problema mente-corpo, sem a 
pretensão, no entanto, de desenvolver uma análise detalhadamente filosófica. O intuito é, por um lado, 
argumentar que, a rigor, os temas estudados hoje em dia já foram colocados, de modo muito aproximado, desde 
os tempos antigos. Por outro lado, levantar o itinerário seguido pelos nossos predecessores pode em muito nos 
auxiliar na discussão dos recentes posicionamentos acerca do problema mente-corpo. 
Inicialmente, na seção I, averiguaremos,com base na obra de Lombardo (1.987), duas tradições 
históricas antagônicas no estudo da relação mente-corpo: a dos Idealistas, na linha de Pitágoras e Parmênides e a 
tradição dos Materialistas, que tem como representantes Tales, Empédocles, Demócrito e Heráclito. 
A seguir, na seção II, veremos como se originaram as posições de Platão e Aristóteles a partir destas 
tradições e também que os posicionamentos posteriores sobre o problema mente-corpo se situam num ou 
noutro ponto entre estes dois pensadores. Iremos concluir o capítulo, indicando que os modernos 
posicionamentos sobre a relação entre a mente e corpo como que retratam ou se superpõem, em graus variados, 
a partir dos posicionamentos discutidos já pelos principais pensadores da Grécia Clássica. 
Seção I - As tradições Idealista e Materialista. 
Como hoje em dia, os gregos clássicos também tentavam encontrar o entendimento adequado de seu 
meio, de seu mundo, e em tal empreitada encontravam muitas dificuldades (Vita, 1.964). Visando estruturar uma 
metodologia que facultasse a descrição e a compreensão dos aspectos essenciais da realidade, os pensadores 
gregos privilegiavam certos aspectos essenciais da mesma, em detrimento de outros, de acordo com cada 
tradição. Um destes aspectos era o caráter da mudança, do movimento. 
Para Parmênides (515 - 445AC, apud Lombardo, 1.987) a Realidade era fixa e imutável e definida como 
o mundo do ser. O conhecimento verdadeiro pertenceria ao reino eterno do ser unificado e imutável, alcançado 
primordialmente pela Razão (por isso Parmênides é considerado um racionalista); ele julgava que os sentidos nos 
iludem e que somente o que é pensado através da razão existe. Este pensador grego estabeleceu que o mundo 
transitório de particularidades pode revelar somente aparências e o que seria real deveria ser eterno e unificado 
(Lombardo, 1.987, p. 14). 
Parmênides nega a realidade do movimento com base na Lei da Identidade, segundo a qual toda coisa é 
igual a ela mesma (A = A). O movimento, se admitido como existente, levar-nos-ia a aceitar uma contradição, pois 
ele modificaria a realidade, o ser, apresentando, no mesmo fenômeno, o não-ser (Jennings-White, 1.977, p. 6). 
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Alguns autores consideram esta Lei como uma outra forma do princípio de não-contradição, que se baseia no 
conceito do ser e na incompatibilidade do ser com o não-ser. Do ente (isto é, de alguma coisa que possui o ser), diz 
Parmênides, aquilo que é, enquanto é, não pode deixar de ser. Generalizando esta idéia, ele conclui que nada pode ser e 
não-ser ao mesmo tempo ou seja, o ser é, o não-ser não é. O movimento, que faria do "ser" o "não-ser", não existe. 
No outro extremo, Heráclito (535 - 480AC, apud Lombardo, 1.987) entendeu a realidade como sendo 
um fluxo, dando primazia à mudança como seu aspecto essencial: a realidade era concebida por ele como um 
mundo do vir-a-ser, tudo está em perpétuo fluir (Copleston, 1.962). O conhecimento viria do Logos, que seria a 
forma ou ritmo das oscilações temporais. 
Em oposição a Parmênides, Heráclito privilegiava a observação como ferramenta para se auferir os dados da 
realidade, por isso é considerado um empiricista. Para Heráclito, os sentidos tendem a enganar, a não ser quando a razão 
é capaz de penetrar além da superfície das aparências. Deste pensador identificar-se-á a influência que redundou no 
pensamento de Aristóteles, que veremos adiante. Consideremos antes, na seção II, a contribuição de Platão. 
Seção II - Platão e Aristóteles. 
Platão (427 - 347AC, apud Goldschmidt, 1.970) irá inaugurar a tradição dicotômica, ao intentar harmonizar 
e sintetizar as duas tradições divergentes entre si, a idealista e a materialista. Apesar de receber influência dos dois 
sistemas de pensamento, sendo um racionalista terá maior envolvimento com a tradição de Parmênides. Arístocles 
(nome original de Platão) julga que as essências são imutáveis e concebe o Cosmos, em sua Teoria da Linha 
Dividida, como sendo composto de dois mundos: o Mundo do Ser e o Mundo do Vir-A-Ser (ver Quadro 2). 
 
 
Mundo do Ser: das formas, conceitos e idéias eternas 
__________________________________________________ 
Mundo do Vir-A-Ser: dos particulares transitórios, das aparências 
 
Quadro 2 - A Teoria Platônica da Linha Dividida (Adaptado de Rintala, 1.991, p. 262. 
 
O mundo acima da linha era considerado fixo, imutável, sendo que teríamos conhecimento deste através 
do trabalho da mente, da razão. Esta nos possibilitaria alcançar o mundo da verdade e da Realidade última, 
permitindo-nos penetrar até as idéias inteligíveis, formas exemplares ou unidades objetivas eternas, não sensíveis. 
Estas existem fora e acima das coisas sensíveis e conferem seu verdadeiro sentido ao mundo e à vida. O mundo 
inteligível é composto de idéias matemáticas (círculos, triângulos) e de idéias "anipotéticas" (prudência, justiça, 
beleza) que constituem em si uma ordem harmoniosa. 
O mundo abaixo da linha, no modelo platônico, seria aquele onde os humanos vivem, o mundo das 
aparências onde se sucedem as gerações e onde existe corrupção. Este mundo está situado entre o ser e o não-
ser; é fonte de ilusões e a sua realidade é aparente, pois o homem só encontra o princípio de sua existência no 
mundo verdadeiro das idéias inteligíveis, arquétipos dos quais os objetos sensíveis não passam de cópias 
imperfeitas. Tudo aqui neste mundo do "dia-a-dia" teria sua identidade, através da imitação das formas do 
mundo do ser (Prado Jr, 1.981). Nós, os viventes, teríamos opiniões e crenças sobre este mundo do vir-a-ser, que 
é um mundo sensível, alcançado pelos sentidos do corpo. 
Neste sentido, vemos um sistema dualista onde Platão contrapõe a permanência (eternidade) e a mudança, 
num momento e, noutro, os universais (ordem, constância, homogeneidade) e os particulares (variação, indivíduo, 
heterogeneidade). Este pensador grego vai oferecer uma explicação para a relação do conhecedor com o mundo físico, 
combinando uma dimensão física-sensorial (mundo temporal) com uma dimensão mental-conceitual (formas eternas). 
No entanto, o conhecimento certo só existiria no nível dos universais: a ordem somente poderia ser conhecida através 
da razão, pois ordem enquanto tal pertenceria ao reino das idéias e não ao mundo dos sentidos. 
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Como o Homem superaria o mundo das aparências e alcançaria o conhecimento das Idéias? Na sua obra 
Fedro, Platão explica a queda da alma humana que, após ter vivido no mundo acima da linha, adentra no mundo 
abaixo da linha, via união com um corpo. Mergulhado neste mundo ilusório, através da arte do diálogo e da 
discussão, ou dialética, a alma vai se permitir elevar acima destes objetos múltiplos e mutáveis para o mundo 
inteligível das idéias. O homem deve se libertar do corpo e tentar viver de acordo com a vida do espírito, cuja 
natureza é a do ser imortal. Através do personagem Sócrates, Platão nos comunica ser o corpo um obstáculo 
para a alma (Rintala, 1.991, p. 263), mesmo uma prisão (Goldschmidt, 1.970). 
Platão separa a mente e o corpo e, portanto, os objetos da mente daqueles do mundo material. Esta 
preponderância da razão sobre os objetos sensíveis caracteriza o "realismo platônico", como distinto do aristotélico(1). 
Aristóteles (384 - 322AC, apud Vita, 1.964) era um dos alunos mais ilustres de Platão, mas optou 
metologicamente por ser um empiricista, na tradição de Heráclito. Aristóteles fundamenta suas doutrinas numa 
discussão exaustiva, prudente e histórico-crítica de seus predecessores, os pré-socráticos e especialmente Platão. 
Ele julgava que a verdade do conhecimento humano repousa não num mundo ideal transcendente, separadodos 
objetos da experiência, mas nas suas formas, que constituem o correlato real das idéias da mente humana. Este 
notável pensador grego(2) julgava que os objetos da realidade eram conhecidos através da percepção, 
privilegiando o corpo, rejeitando assim o dualismo ontológico da teoria platônica do homem: pensar e perceber 
são capacidades do corpo, sendo resultado de diferentes disposições da matéria. 
Segundo a perspectiva aristotélica, conhecimento é obtido através da experiência e deriva do que é sentido ou 
percebido e não do transcendente ou do sobrenatural per se. Na formação e desenvolvimento do conhecimento humano 
vão cooperar, para Aristóteles, a experiência sensível e a abstração do entendimento. Para Platão, conforme indicamos 
anteriormente, somente através de algo eterno as coisas eternas poderiam ser conhecidas (Lombardo, 1.987, p. 31). 
Um elemento importante na filosofia aristotélica é a noção de Psiché. Aristóteles concebe que todos os 
seres vivos tem psiché, que determinaria a forma dos seres viventes na Natureza. A forma do corpo é a psiché ; é 
o que identificaria o organismo como vivo. A matéria do corpo está constituída de suas partes, no entanto, 
Aristóteles não vai reduzir a forma vivente às suas partes, visto que o princípio de organização entre as partes do 
corpo é de cooperação da ação (ou processos). Aqui nesta consideração o movimento seria fundamental. 
Schopenhauer (1.991, p. 19) cita um pensamento de Aristóteles : "a vida existe no movimento e tem nele a 
essência do seu ser", ressaltando assim, a importância vital do movimento no pensamento aristotélico. 
Aristóteles distingue logicamente a mente que conhece (o sujeito) do objeto, mas sustenta que, segundo 
Lombardo (1.987, p. 5), na realidade os dois seriam inseparáveis, denotando uma interdependência funcional 
entre eles. A mente não seria separada do corpo: os processos psicológicos estão integrados, visto que o corpo é 
organizado em termos de atividades interdependentemente co-operativas. 
Esta perspectiva vai inaugurar a tradição Funcionalista (no sentido de ter função - ver nesta monografia 
o 'Funcionalismo', no capítulo IV), segundo a qual a Natureza envolve telos (propósito, fim) e que a explicação 
científica envolve o entendimento deste telos. No nível humano, Aristóteles amplia suas considerações, 
estabelecendo que a psiché caracterizaria o poder de chegar aos fins. Ainda que Aristóteles não faça referência 
explícita ao conceito de 'mente', o mesmo aponta para os aspectos da psiché que nos faz acreditar que a psiché, 
ou a "forma" do corpo, no caso específico do ser humano, constituiria a mente, que não seria entendida como 
uma segunda substância. Aqui vemos que Aristóteles não era materialista reducionista, nem idealista, mas 
sustentava que a ordem e a mudança estavam unidos: ordem, direção e universalidade podem ser encontrados 
através do fluxo, da mudança percebível de particulares. 
Para explicar a mudança, Aristóteles ensina a pesquisar quatro tipos de causas, resumidas em Lombardo 1.987, p.34-35): 
a) causa formal, que diz respeito àquilo que está mudando; representa a idéia, modelo ou paradigma ao qual o 
objeto corresponde. 
b) causa material, que diz respeito àquilo do que é feito esta mudança; aquilo (matéria) do que algo surge ou da 
qual o objeto é feito. 
c) causa eficiente, que diz respeito ao agente através do qual ocorre a mudança; o princípio da mudança, e 
d) causa final (telos), que diz respeito ao fim para o qual a mudança concorre; aquilo em vista do que o objeto 
existe, ou apresentação de um fenômeno como meio de um fim; em outras palavras, a realidade para o qual 
algo tende a ser. 
 
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Vamos dar um primeiro exemplo, tentando explicitar o fato de que, para Aristóteles, na produção de 
algo existe o concurso destas várias causas e estas podem ser consideradas como os diversos modos nos quais se 
manifestam as substâncias, enquanto substâncias. Consideremos uma flor: a causa formal seria a idéia de uma 
flor específica, a causa material seria a semente da qual se originaria a flor, a causa eficiente seria a deposição da 
semente em solo propício e a adequada irrigação da mesma, e a causa final a utilização da flor já desenvolvida, 
seja para embelezamento, produção de droga, etc. 
O Homem é submetido a mudanças e vai realizar em si mesmo atributos, qualidades que nele a princípio 
eram apenas virtuais: entre o ser e o não-ser existe, para Aristóteles, um estado intermédio, o poder-ser, ou 
potência. A matéria seria aquilo que passa da potência ao ato, sendo colocada em forma e a forma (psiché) é o 
princípio que, como vimos, organiza a matéria e proporciona seu sentido. 
A matéria é uma das causas (causa material), distinguida por Aristóteles para explicar a constituição de 
um ser. Citando outro exemplo, em uma estatueta, o barro, a argila, constituiria a causa material da mesma; a 
causa formal corresponderia àquilo que dá a cada coisa sua forma determinada, por exemplo, a idéia do escultor, 
do artista, no estabelecimento de uma obra de arte específica; a causa eficiente seria o antecedente imediato que 
provoca a mudança (espatuladas na argila pela mão do artista) e a causa final seria o objetivo visado na obra 
exemplificada (o ganho, o amor pela arte). 
Em resumo, vemos que o dualismo platônico estabelecia um Cosmos composto de dois mundos, o 
Mundo do Ser e o Mundo do Vir-A-Ser. No primeiro mundo, que só seria alcançado pelo Homem através da 
Razão, as essências seriam imutáveis, as formas, conceitos e idéias eram eternas. No outro mundo, o Homem 
somente auferia aparências e ilusões. O corpo aqui é visto como uma prisão para a sua alma imortal. Aristóteles 
vai rejeitar o dualismo platônico, elegendo o corpo como instrumento para o conhecimento dos objetos da 
realidade: o Homem percebe e pensa e assim pode conhecer pela experiência, não necessariamente só do 
transcendente, do sobrenatural.(3) 
Tendo delineado este panorama das tradições antigas procuraremos argumentar, em defesa da hipótese, 
que modernamente grande parte de posicionamentos sobre o problema mente-corpo se revelam como 
retratando ou se calcando, em maior ou menor grau, aspectos já discutidos anteriormente pelos diversos 
pensadores gregos. Dentro da ruptura que se observa do platonismo em relação ao aristotelismo, os teóricos 
posteriores fundamentaram suas considerações, relevando mais este ou aquele aspecto, segundo o grau de 
criatividade ou exigências acadêmicas da época. 
No capítulo seguinte, iremos discutir a influência do trabalho de René Descartes para o tema do 
dualismo na relação entre a mente e o corpo. 
NOTAS 
(1) Este sistema de pensamento vai exercer sua influência na cultura ocidental até o século XI quando Aristóteles 
passa a ter precedência, ainda que restrita ao círculo de intelectuais da época (Santin, 1.990, p. 51). Ver 
também "Realism", in Hocking (1.939) e Ewing (1.951, 1.957). 
(2) A Antigüidade atribuía a ele a elaboração de quatrocentas obras, das quais chegaram até nós quarenta e sete 
mais ou menos completas e fragmentos de aproximadamente cem outras. Para uma visão da notável 
contribuição aristotélica para a Ciência, ver a obra de Ferguson (1.972). Duas obras fornecem um quadro 
acessível do aristotelismo: Adler (1.978), e Veatch (1.974). Outras obras, todas nomeadas "Aristotle", podem 
ser consultadas: Laeger (1.948), Mure (1.964), Randall (1.960) e Ross (1.955). 
(3) Para averiguar as diferanças básicas entre as filosofias de Platão e Aristóteles, os seguintes autores podem ser 
de utilidade: O'Connor (1.974), Cresswell (1.971) e Feibleman (1.973). Por outro lado, existem semelhanças 
de igual modo interessantíssimas. Por exemplo, in Feibleman (op. cit.) lemos: 
"Looking back on the philosophies of Plato andAristotle (...) we can 
see an important resemblance. Both had the highest ambition: they tried to 
construct systems of ideas more general than any other, metaphysical 
systems large enough to be all-inclusive. They differed on many minor 
points and even on some major ones, but not on the size of the problem. 
(...) 
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The second way in which the philosophies of Plato and Aristotle had 
an important resemblance is that neither man was absolutely sure of his 
own position. Both proceeded gropingly, exploring their ground and 
making proposals which they themselves would not have been surprised 
to see wrong..." (Feibleman, 1.973, p. 63-64) 
 
 
2. O Dualismo Cartesiano 
Introdução 
Neste capítulo, iremos expor o raciocínio de Descartes, analisando as obras Meditações (1.641, 1.973) e 
As Paixões da Alma (1.649, 1.973), tomando como itinerário básico as sugestões do prefácio de Costa (in 
Descartes, 1.637) e a introdução de Granger (in Descartes, 1.973b). Na Seção I vamos analisar sucintamente 
como Descartes erigiu o arcabouço filosófico básico de seu sistema. Na Seção II, averiguando a sexta Meditação, 
discutiremos mais detidamente como Descartes estabeleceu a distinção entre a alma e o corpo. 
Seção I - O ideal cartesiano das verdades indubitáveis. 
Pela primeira vez na História, a distinção mente-corpo foi tornada sistemática em sua linguagem por 
Descartes, cientista, matemático e filósofo francês, nascido em La Haye, em 1.596. Ele preocupava-se muito com 
as deficiências e incertezas daquilo que considerava objeto de seu conhecimento, tendo isto manifestado em 
muitas passagens de seus trabalhos (Discurso do Método, p. 49/50, 78/79, e a apresentação das Meditações). 
Visando minorar esta situação, Descartes tentou fundamentar seu sistema filosófico em algumas verdades 
que ele julgara indubitáveis, com especial objetivo de estabelecer os alicerces da Ciência (Meditação primeira, p. 93, 
96) e deduzindo delas grande variedade de conseqüências de longo alcance. Na Meditação segunda empenha-se em 
demonstrar que a proposição "penso, logo existo", não é passível de dúvida. Esta proposição será sempre 
verdadeira enquanto perdurar o ato de pensar. Desta afirmativa básica, Descartes estabelecerá conclusões sobre (a) 
a existência de Deus (Meditação terceira), (b) sobre a natureza e a existência de objetos materiais (Meditação 
quinta), e (c) sobre o dualismo entre o físico e o mental (Meditações segunda e sexta). 
Não é nosso intuito analisar a obra filosófica de Descartes, mas situar como ele delimitou o problema mente-
corpo, realizado no plano metafísico(1). Iremos identificar como Descartes erigiu o arcabouço que sustenta suas conclusões. 
Descartes procura fundamentar o seu estudo filosófico sobre o conhecimento humano nas idéias claras 
e distintas, isto é, aquelas que podem ser reconhecidas através da intuição (Discurso do Método, p. 51); vai 
verificar se os fundamentos donde ele parte, para averiguar a verdade, são "bastante sólidos" (idem, p. 84/85). 
Como estratégia metodológica, Descartes começa por rejeitar, como falso, tudo aquilo acerca da qual pudesse 
imaginar a menor dúvida (Meditação primeira, par. 10 a 12, p. 95/97). 
Descartes propõe o duvidar exageradamente como método: é a dúvida hiperbólica, sistemática e 
generalizada. Esta dúvida metódica é diferente da dúvida dos cépticos (no Discurso do Método, à p. 79 ele diz 
claramente "Não que nisto imitasse os cépticos que apenas duvidam por duvidar...") pois Descartes duvida 
intencionalmente para se chegar à verdade: esta dúvida é provisória, como se vê na Meditação primeira (par. 11, 
p. 96). A dúvida dos cépticos é definitiva; a dúvida cartesiana seria ainda diferente da dúvida vulgar, posto que é 
entabulada não pela experiência, mas por uma decisão metodológica(2). 
Descartes rejeita, com sua dúvida metódica, o que os sentidos nos dão a conhecer, visto que já que uma ou 
algumas vezes nos enganaram, podem muitas outras nos enganarem. É o argumento do erro dos sentidos, que 
constitui o primeiro grau de dúvida. Neste âmbito, o corpo, através dos órgãos dos sentidos, tem importância, 
ainda que negativa, para a obtenção do conhecimento, pois, como no caso das ilusões de óptica, o que julgamos 
conhecer pode revelar-se falso. No entanto, este argumento é insuficiente para nos fazer duvidar 
sistematicamente de nossas percepções sensíveis. 
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Descartes rejeita ainda, em sua linha de raciocínio, muitos outros fatos que poderiam ser reais mas que, 
por aparecerem muitas vezes em sonhos, levam-no a crer que inexistam indícios concludentes por onde se possa 
distinguir nitidamente a vigília do sono (Meditação primeira, par. 5, p. 94). Ainda, nesta primeira Meditação (par. 
12), Descartes acrescenta a suposição de um Gênio Maligno ou malicioso, que teria prazer em nos levar a 
considerar as coisas de modo diverso do que elas são(3). 
No entanto, quando aparentemente a dúvida hiperbólica atinge seu ponto culminante, chegando 
Descartes até a duvidar das verdades das proposições matemáticas, o mesmo vislumbra que, por mais que se 
engane, não se engana com o fato de que deve existir um sujeito a ser enganado, enquanto sujeito que duvida. 
Este fato a dúvida não atinge e o Gênio Maligno nada pode fazer (Meditação segunda, par. 4, p. 100). Esta ficção 
do Gênio Maligno, que Descartes imagina a fim de conduzir seu raciocínio, equivale a supor a existência de um 
deus mau que faz com que as pessoas se enganem o tempo todo (viabilizando, justificando assim a dúvida 
hiperbólica). No entanto, este Gênio Maligno não vai resistir à constatação cartesiana de que, enquanto sujeito 
que duvida, existe um sujeito a ser enganado. Surge então uma certeza "penso, logo existo" (cogito, ergo sum) 
que é sólida e indubitável e se evidencia com este primeiro princípio que a razão estabelece: à medida em que 
pensamos, existimos. Em outras palavras , só se apreende a existência pelo pensamento: é o primeiro princípio 
que podemos afirmar antes de podermos estar seguros de qualquer outro. O sujeito existente (não-psicológico) é 
o sujeito do conhecimento, aquele que duvida, que pensa, ou seja, possui a res cogitans. 
Cabe aqui perguntarmos porque o Cógito não seria, para Descartes, suficiente para erigir a Ciência como 
ele desejava. Como vemos na Segunda Meditação, o Cógito estaria ligado à existência momentânea do ato de 
pensar, dependendo de um contexto específico, algo "local", a saber, o ato de pensar (enquanto penso, existo). 
Falta aí a universalidade, que é a base da Ciência, a esta certeza. 
Seguindo com o seu método de análise, Descartes estabelece, neste momento do seu raciocínio, a existência 
de uma substância que, em essência ou natureza, não é outra coisa senão pensamento. Temos aqui a existência de uma 
alma, independente de qualquer substância material, a qual Descartes julga ser inteiramente distinta do corpo e, até, 
que é mais fácil de se conhecer que o corpo (Meditação segunda, par. 18, p. 106 , e Discurso do Método, p. 88). 
Mas como saber firmemente da existência desta substância (pensamento)? O principal critério de 
verdade presente no sistema cartesiano é estabelecido pelas idéias claras e distintas (Meditação terceira, par. 2, p. 
107 e 108). A existência do Cógito é o primeiro sinal da evidência, no sentido da clareza e distinção da idéia, que 
são os característicos da verdade. No entanto, para garantir a universalidade do Cógito, que até então fôra 
caracterizada apenas no ato "local" de pensar, Descartes vai precisar de uma base segura, sólida. Ele vai encontrar 
esta base na idéia de Deus. Mas em sua intenção de provar a existência de Deus (ou, como dissemos,para 
estabelecer uma base firme para a Ciência - Meditação primeira, final do par. 10, p. 96) tem Descartes obstáculos 
a remover em sua argumentação, como por exemplo, o estatuto epistemológico da dúvida. 
Descartes acredita ser a dúvida uma imperfeição: "... pois via claramente que era maior perfeição o 
conhecer que o duvidar...(Discurso do Método, p. 89)" ; "...a dúvida, e outras coisas semelhantes não podiam existir 
em Deus...(idem, p. 91)". Os nossos sentidos também não nos dão perfeição, como vemos Descartes argumentar 
na Meditação primeira (par. 3, p. 93 e 94). Tanto os sentidos interiores quanto os exteriores nos levam ao erro e 
também quando se sonha pode-se julgar estar na mais "verossímil realidade" (Meditação sexta, p. 141). Mas, 
pergunta Descartes, de onde viria então a perfeição? Decerto não do Homem, que é imperfeito (Meditação sexta, 
par. 30, final), nem do nada, que seria manifestadamente impossível. Conclui Descartes que a idéia de perfeição foi-
nos posta por uma natureza mais perfeita, ou seja, por Deus. A existência de Deus vem de algo além da razão: da 
intuição. Na Meditação terceira lemos: 
"26. Esta mesma idéia ( de Deus ) é também mui clara e distinta porque tudo 
o que o meu espírito concebe clara e distintamente de real e de verdadeiro, e 
que contém em si alguma perfeição, está contido e encerrado inteiramente 
nesta idéia. 
27. E isto não deixa de ser verdadeiro, ainda que eu não compreenda o 
infinito, ... pois é da natureza do infinito que minha natureza, que é finita e 
limitada, não possa compreendê-lo; ...". (Descartes, 1.641, 1.973, p. 116) 
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A idéia de perfeição, portanto, vem de Deus. Descartes concebe pela razão a existência de Deus, em 
cujas provas de existência subjaz a idéia de perfeição. Ainda que Descartes não o diga, não seria necessariamente 
o Deus religioso; o deus que Descartes busca é o deus da razão, que irá garantir a universalidade das idéias. 
Descartes, provando a existência divina, pode voltar agora seu pensamento para considerar as coisas 
acerca das quais duvidara anteriormente. Ele julga agora, com a certeza das idéias claras e distintas, poder 
discernir adequadamente o certo do errado, o falso do verdadeiro, grande preocupação em toda a sua obra, 
conforme se depreende na Meditação quarta e ressaltada também no Discurso do Método: "...sendo a atividade 
do pensamento pela qual se crê uma coisa, diferente daquela pela qual se conhece que se crê, elas andam muitas 
vezes uma sem a outra" (p. 72). 
Dentre os fatos que Descartes doravante vai analisar, um deles é o estabelecimento da distinção entre o corpo e 
o espírito e, neste sentido, vai inaugurar a moderna discussão do problema mente-corpo. Veremos em seguida como ele 
analisou esta questão. 
Seção II - Sobre a distinção cartesiana entre a alma e o corpo. 
Vamos nessa seção discutir como Descartes(1.641/1.973) distingue, em especial na Sexta Meditação, a 
mente(4) do corpo. Ele possuía inúmeras razões pelas quais desenvolveria a tese da incorporeidade da mente, 
como por exemplo a existência da linguagem(5), mas embasou fundamentalmente o dualismo no Cógito. Vamos, 
inicialmente, identificar o roteiro básico seguido nas Meditações, discutindo então a sexta meditação, onde se 
encontra a distinção entre alma e corpo, apesar do autor admitir que as duas são conjugadas de modo tão estreito 
que compõem como que uma só coisa. Nesta seção iremos nos basear, principalmente, nos esclarecimentos 
sobre termos e conceitos cartesianos, contidos na obra de Cottingham (1.995). 
Conforme mencionamos anteriormente, Descartes na segunda Meditação chega a um ponto de certeza, 
com o conhecimento indubitável quanto à sua própria existência, através do Cógito e prossegue examinando a 
natureza da "coisa pensante", argumentando que a mente pode ser melhor conhecida do que o corpo. 
Na terceira Meditação, Descartes apresenta a regra geral, segundo a qual tudo o que muito clara e 
distintamente percebemos é verdadeiro (p. 107, fim par. 2) e infere a existência de Deus, explicando deste modo 
a presença desta idéia (de Deus, um ser perfeito e infinito) em sua mente (que é finita e imperfeita). Na quarta 
Meditação Descartes examina a relação entre o intelecto e a vontade e estabelece que nossos erros nascem do fato da 
vontade ser muito mais ampla e extensa do que o entendimento, não sendo contida dentro dos mesmos limites. No 
entanto, apresenta uma fórmula para se evitar o erro: abster-se de formular um juízo sobre uma coisa, quando não a 
conceber com suficiente clareza e distinção (p. 128, inicio par. 13). O erro redunda do mau uso do livre arbítrio, visto 
que "a luz natural nos ensina que o conhecimento deve sempre preceder a determinação da vontade (idem, ibidem)". 
A matéria vai ter sua natureza explicada como extensão na quinta Meditação (p. 131, par. 3 e 4), juntamente com a 
apresentação de um segundo argumento para a existência de Deus, fundamentada na idéia de que a existência não 
pode estar separada da essência de um ser de suprema perfeição (p. 132 e 133, par. 7; p. 134, par. 9). 
Na sexta Meditação a existência do mundo externo é restabelecida, bem como apresentada a 
argumentação de que a natureza da mente é por completo diferente da do corpo, sendo mesmo duas substâncias 
inteiramente distintas, não obstante a mente estar jungida de forma íntima com o corpo. 
Segundo Cottingham (op. cit.), existem três classes principais de problemas decorrentes da explicação 
cartesiana, sobre o problema da relação mente-corpo. O primeiro grupo envolve a validade de seus argumentos 
para a efetiva diferenciação entre corpo e mente; o segundo agregado compreende compatibilizar a natureza 
destas substâncias distintas com o fato das mesmas exibirem uma conjugação muito estreita. A terceira classe de 
problemas compreende a análise da estrutura da explicação cartesiana para esta união entre mente e corpo, em 
particular a natureza dos fenômenos psicofísicos decorrentes. 
A primeira classe de problemas envolve as bases que efetivamente sustentam a diferenciação entre a mente e 
o corpo. Na segunda Meditação, exercitando a dúvida metódica, Descartes se pergunta "o que poderá ser 
considerado verdadeiro (p. 99, fim par. 30)", e chega à questão "Eu então, pelo menos, não serei alguma coisa? 
(ibidem, par. 4)". Respondendo à questão, ele coloca que "nada sou, pois, falando precisamente, senão uma coisa 
que pensa, isto é, um espírito, um entendimento, ou uma razão...(ibidem, p. 102, par. 7)". 
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Logo adiante (no par. 9, p. 103), a definição de pensamento é ampliada no sentido de incluir, além da 
atividade intelectual, atividade volicional: "Mas o que sou eu, portanto? Uma coisa que pensa. Que é uma coisa 
que pensa? É uma coisa que duvida, que concebe, que afirma, que nega, que quer, que não quer, que imagina 
também e que sente". 
Descartes classifica sob o rótulo de "pensamento" as atividades intelectuais e volitivas e conecta-as como 
pertencentes a uma substância que é inteiramente separada do corpo: 
"...já que, de um lado, tenho uma idéia clara e distinta de mim mesmo, na medida 
em que sou apenas uma coisa pensante e inextensa, e que, de outro, tenho uma 
idéia distinta do corpo, na medida em que é apenas uma coisa extensa e que não 
pensa, é certo que este eu, isto é, minha alma, pela qual eu sou o que eu sou, é 
inteira e verdadeiramente distinta de meu corpo, e que ela pode ser ou existir sem 
ele". (Descartes, 1641/1973, p. 142, fim do par. 17) 
A indivisibilidade do espírito é também mencionada no par. 33 desta sexta Meditação (p. 147), bem como certos 
aspectos corpóreos que manifestadamente sustentam, dentro do arcabouço

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