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1 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 Infecção do trato urinário em Pediatria Infecção urinária → Fixação e proliferação de bactérias no trato urinário (que costuma ser estéril). Pode ser: Localizada ou acometer todo o trato urinário Baixa (cistite aguda – acometimento localizado na BEXIGA) ou alta (pielonefrite – quando há fixação bacteriana no PARÊNQUIMA RENAL) A ITU é uma das infecções mais frequentes na pediatria, sendo a infecção bacteriana mais frequente entre os lactentes, principalmente nos primeiros meses de vida. Os fatores que mais influenciam a sua incidência são idade e gênero. Classificação: Pielonefrite Cistite aguda Bacteriúria assintomática Saber a classificação das ITU é importante devido ao risco de cicatriz renal que alguns de seus episódios podem causar, pois eles precisam de um tratamento mais agressivo. Essa doença pode evoluir com complicações a longo prazo (doença renal crônica terminal, hipertensão e complicações durante a gravidez). Isso faz com que o diagnóstico precoce e a identificação dos fatores de risco sejam essenciais, principalmente em lactentes. EPIDEMIOLOGIA Está entre as doenças bacterianas com maior morbidade na infância, principalmente em lactentes, ocorrendo nos primeiros 11 anos de vida pelo menos um episódio sintomático de ITU em 3% das meninas e 1,1% dos meninos. Maior incidência no 1º ano de vida (estimada em cerca de 1,4%, principalmente nos meninos); após essa idade, há brusca queda de incidência entre os meninos, mas mantendo-se alta nas meninas até os 6 anos de idade. Alta taxa de recorrência → 30% das meninas apresentam um novo episódio dentro do 1º ano após o episódio inicial, 50% em 5 anos e algumas recidiva em série; nos meninos a recidiva é mais rara, variando em torno de 15 a 20% e sendo raras após o 1º ano de vida. Estudos mostram que, em serviço de urgência, lactentes com febre acima de 38,5°C de origem não determinada apresentam uma prevalência global de ITU de cerca de 3,5%. − Fatores que elevam esse percentual diagnóstico: dor à palpação da região abdominal ou suprapúbica (13%), cor branca (10%), história prévia de ITU (9%), urina com mau cheiro (9%), meninos não circuncisados (8%), lactente toxemiado (6%), sexo feminino (4%) e febre acima de 39°C (4%) A incidência de pielonefrite é maior em crianças menores de um ano e diminui gradativamente quando se aproxima da idade escolar podendo, porém, ocorrer em qualquer idade. ETIOLOGIA Escherichia coli → Enterobactéria; mais comum Pseudomonas aeruginosa → Bacilo gram-negativo não entérico; mais encontrado em infecções graves, pacientes imunossuprimidos e com obstrução urinária Enterobacter Klebsiella Streptococcus do grupo B → Pouco frequente; pode ser encontrado na urina de RNs Enterococcus spp. → Gram-positivos; mais frequente em lactentes Staphylococcus aureus → Gram-positivos; raramente causam ITU, mas, quando presentes, indicam contaminação por cateterismo vesical ou por via hematogênica Proteus mirabilis → Mais frequente em meninos < 1 ano não circuncisados; coloniza a glande e o meato uretral Mais frequentes em neonatos 2 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 Staphylococcus coagulase-negativo → Presente em infecção pós-cateterismo vesical e em infecções hospitalares Staphylococcus saprophyticus → Gram-positivos; mais frequente em adolescentes do sexo feminino sexualmente ativas Candida spp. → Pacientes imunossuprimidos, hospitalizados e/ou com cateterismo vesical prolongado Adenovírus → Associado à cistite hemorrágica FATORES DE RISCO Malformação do trato urinário Disfunções vesicais Constipação intestinal Uso indiscriminado de antibióticos → Altera a microbiota intestinal normal Ausência de aleitamento materno Sexo feminino → Uretra mais curta Fimose Vulvovaginites Grupo sanguíneo P1/Lewis secretor − Grupo sanguíneo P: antígenos presentes nos eritrócitos; apresenta uma expressão variável durante o desenvolvimento fetal, diminuindo com a IG, por isso é fracamente expresso ao nascimento, mas tem sua expressão completa aos 7 anos − Sistema Lewis: não é produzido pelos eritrócitos e nem é integrado na estrutura membranas; os antígenos são produzidos pelas células teciduais e secretados nos fluidos corporais (secreções e plasma) e, posteriormente, adsorvidos à membrana dos eritrócitos Deficiência de IgA secretora ITU materna ao nascimento ATENÇÃO! Estes quadros podem evoluir para PIELONEFRITE: FATORES DE DEFESA Esvaziamento vesical Peristalse da uretra Fatores de proteção da mucosa Proteína de Tamm-Horsfall (THP) → Produzida exclusivamente nos rins; uma das suas funções é a de interagir com o sistema imunológico, logo, tem papel de defesa contra os agentes causadores das ITUs Atividade antibacteriana da urina FISIOPATOLOGIA Depende da VIRULÊNCIA BACTERIANA e dos FATORES PREDISPONENTES DO HOSPEDEIRO. VIRULÊNCIA BACTERIANA E. COLI PILI/FÍMBRIAS P/S/TIPO 1: são “pelinhos” que servem para se aderir as células uroepiteliais e impedir que, conforme exista o fluxo urinário, a bactéria seja levada junto com a urina, facilitando, assim, sua ascensão ao trato urinário por mecanismos de contracorrente por aderirem ao epitélio tanto da bexiga como do trato urinário superior. Essas fímbrias P se ligam a proteínas de membrana das células uroepiteliais, possibilitando que a bactéria seja internalizada por essas células, formando colônias de bactérias intracelulares. FLAGELOS: dão mobilidade a bactéria. ANTÍGENOS DO POLISSACARÍDEO CAPSULAR: responsáveis por evadir as defesas do hospedeiro. FATOR 1 NEUTRALIZANTE CITOTÓXICO: substância responsável por destruir neutrófilos. SIDERÓFILOS: proteínas de alta afinidade por ferro e, assim, captam ferro para que a bactéria possa sobreviver. HEMOLISINA: proteína responsável por fazer poros na membrana celular, permitindo, a entrada da bactéria. As enterobactérias têm uma maior capacidade de se aderirem aos tecidos uroepiteliais. A bactéria segue ascendente (pode ser por causa do tipo da fímbria ser mais 3 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 aderente; presença de refluxo vesicoureteral ou estase da urina, principalmente devido ao comportamento retentivo das meninas) e se fixa nos cálices e pirâmides, dificultando a filtração dos néfrons, acumulando urina e desencadeando reações inflamatórias. Essas reações inflamatórias podem acabar lesionando o rim e formar a cicatriz renal. PROTEUS MIRABILIS Produz UREASE, uma enzima responsável pela produção de amônia a partir de ureia. Esse aumento de amônia resulta na alcalinização da urina que acaba favorecendo a precipitação de fosfato, carbonato e magnésio. Essa precipitação resulta na formação de cristais e pedras de estruvita que contêm bactérias em seu interior e promove a estase urinária, favorecendo, assim, uma maior proliferação bacteriana. Além disso, essas pedras permitem uma maior persistência da bactéria na urina. FATORES PREDISPONENTES DO HOSPEDEIRO IDADE < 1 ano, principalmente os < 3 meses do sexo masculino com fimose. SEXO FEMININO, devido ao menor comprimento da uretra e a maior proximidade do orifício uretral com o ânus RAÇA BRANCA AUSÊNCIA DE CIRCUNSIÇÃO CONSTIPAÇÃO INTESTINAL, pois dificulta o completo esvaziamento da bexiga, restando um resíduo miccional que acaba favorecendo a proliferação de bactérias ATIVIDADE SEXUAL ANORMALIDADES FUNCIONAIS DO TRATO URINÁRIO, como por exemplo, bexiga neurogênica e disfunções miccionais MÁ FORMAÇÃO DO TRATO URINÁRIO: − OBSTRUTIVAS → Favorecem o acúmulo de urina (obstrução de junçãopieloureteral, de junção ureterovesical, válvula de uretra posterior) − REFLUXO VESICO-URETRAL → Muito relacionada com a pielonefrite QUADRO CLÍNICO Apresentação varia de acordo com: Grupo etário Localização Estado nutricional Alterações anatômicas do trato urinário Número de infecções anteriores Intervalo de tempo do último episódio infeccioso O quadro clínico pode variar de febre isolada ou alterações do hábito miccional até pielonefrite aguda, podendo culminar em urossepse (*especialmente em lactentes) NEONATO Infecção adquirida por VIA HEMATOGÊNICA ou por MALFORMAÇÃO DO TRATO URINÁRIO. Podem evoluir para sepse com ou sem meningite. Sintomas mais frequentes: Febre Apatia Hipotonia Cianose Ausência de ganho ponderal Recusa alimentar Icterícia Sintomas neurológicos Apresenta-se geralmente como um quadro séptico, com manifestações inespecíficas, como ganho de peso insuficiente, anorexia, vômitos, dificuldade de sucção, irritabilidade, hipoatividade, convulsões, pele acinzentada e hipotermia. Também pode se apresentar com um quadro menos agudo, predominando recusa alimentar, vômitos ocasionais, palidez cutânea e icterícia. → Alta probabilidade de bacteremia, sugerindo via hematogênica de disseminação bacteriana, com alta frequência de mortalidade (cerca de 10%) devido à disseminação do processo infeccioso LACTENTE Febre → Principal manifestação, sendo muitas vezes o ÚNICO sinal de ITU − Pode ser o sintoma mais importante de pielonefrite aguda Pode ocorrer: Hiporexia Vômitos Dor abdominal Perda ou ausência de ganho de peso Irritabilidade Urina com odor fétido → RARAMENTE HÁ SINAIS E SINTOMAS LIGADOS AO TRATO URINÁRIO como polaciúria, gotejamento 4 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 urinário, disúria, urina com odor fétido e dor abdominal ou lombar PRÉ-ESCOLARE E ESCOLAR Febre → Mais frequentemente associado aos sintomas urinários (polaciúria, gotejamento urinário, disúria, urina com odor fétido e dor abdominal ou lombar) Se paciente com maior acometimento do estado geral, adinamia, calafrios, dor abdominal e nos flancos → Pensar em PIELONEFRITE AGUDA Sintomas como enurese, urgência, polaciúria, disúria, incontinência e/ou retenção urinária com urina fétida e turva podem corresponder a um quadro de CISTITE Obs: Febre, disúria, urgência miccional, sinal de Giordano positivo e tenesmo urinário são os SINTOMAS CLÁSSICOS DE ITU → Ocorrem a partir dos 5 anos. Obs: A presença de DISÚRIA NEM SEMPRE CORRESPONDE A UM QUADRO DE ITU, podendo ser determinada por BALANOPOSTITE e VULVOVAGINITE → APRESENTAM SINAIS E SINTOMAS RELACIONADOS AO TRATO URINÁRIO ADOLESCENTES Disúria, polaciúria e dor à micção → Mais comum Pode haver: Urgência miccional Hematúria Febre Adolescentes do sexo feminino e mulheres jovens → Pode-se encontrar a “síndrome de disúria-frequência”, com sensação de queimação ao urinar, desconforto suprapúbico e frequência urinária aumentada. Alguns desses casos são acompanhados de bacteriúria significativa. Obs: O início da atividade sexual nas adolescentes pode ser acompanhado de surtos de ITU. DIAGNÓSTICO Clínico + laboratorial CLÍNICO Exame físico completo, incluindo o crescimento ponderoestatural e o neuropsicomotor Percussão lombar (punho-percussão) pode evidenciar forte reação dolorosa → GIORDANO POSITIVO Palpação abdominal nas lojas renais pode evidenciar aumento do volume renal → HIDRONEFROSE A persistência de bexiga palpável após micção sugere processo obstrutivo ou disfunção do trato urinário inferior Observar o jato urinário para avaliar a continuidade, volume e força de expulsão − Se alteração do jato urinário, pode-se pensar em obstrução baixa – Disfunção do trato urinário inferior em ambos os sexos ou válvula de uretra posterior nos meninos Exame da genitália externa − Avaliação da aparência e localização do meato uretral, hímen e sinequia de pequenos lábios nas meninas; e estreitamentos do prepúcio que impedem a exposição do meato uretral nos meninos *Sinequia = Aderência Perda constante de urina (observada durante o exame físico) sugere URETER ECTÓPICO LEMBRAR → PRESENÇA DE VULVOVAGINITE OU BALANOPOSTITE PODE ALTERAR OS EXAMES DE URINA – LABORATÓRIO FALSO-POSITIVO DE ITU LABORATORIAL URIANÁLISE → SUMÁRIO DE URINA COM COLETA DE UROCULTURA Coleta adequada da urina Se paciente com controle miccional: − Limpeza da genitália com água e sabão (antissépticos são contraindicados) Se paciente sem controle miccional: − Saco coletor → Cuidados de higiene, perfeita adaptação do adesivo no contorno da genitália e trocas a cada 30 minutos até se obter amostra satisfatória. O uso do saco coletor não é muito recomendado pois ele apresenta um alto percentual de falsos- positivos devido a contaminação pela microbiota periuretral. − Punção suprapúbica (PSP) → Método invasivo – muito seguro quando guiado por USG; indicada quando a coleta por saco coletor for 5 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 duvidosa (diarreia aguda, dermatite perineal, vulvovaginites e balanopostites) − Cateterismo vesical → Método invasivo – pode provocar ITU se falha técnica e é mais desconfortável para o paciente; não deve ser utilizado de rotina porque a urina é eliminada espontaneamente INTERPRETRAÇÃO DOS RESULTADOS Contagem de UNIDADES FORMADORAS DE COLÔNIAS (UFC) Presença de PIÓCITOS BACTERIOSCOPIA COM COLORAÇÃO GRAM em gota de urina não centrifugada Outros achados importantes: Baixa densidade urinária → Distúrbio da concentração urinária; presente na pielonefrite por causa da disfunção tubular temporária pH alcalino → Infecção por Proteus Albumina transitória → Fase febril ou pielonefrite Hematúria microscópica → 20-30% dos casos de cistite aguda e pielonefrite Nitrito (conversão do nitrato urinário em nitrito) → Infecção por bactérias Gram-negativas − A sensibilidade do teste do nitrito é baixa em lactentes por causa da alta frequência de micções PIÚRIA Presença de 5 ou mais piócitos por campo microscópico sob grande aumento (4003), ou > 10.000 piócitos/mL Obs: Presença de cilindros piocitários → Sugere PIELONEFRITE Outras condições podem apresentar piúria ou leucocitúria sem significar ITU: desidratação grave, inflamação de estruturas contíguas (como na apendicite), injúria química do trato urinário e glomerulonefrites; tuberculose renal também apresenta frequentemente piúria, porém com cultura negativa nos meios tradicionais de cultivo. BACTERIÚRIA Presença de uma ou mais bactérias (bastonetes Gram-negativos) em gota de urina não centrifugada corada pelo Gram correlaciona-se fortemente com BACTERIÚRIA SIGNIFICATIVA demonstrada pela urocultura Exame de baixo custo e amplamente disponível IDENTIFICAÇÃO E CONTAGEM DE BACTÉRIAS PELA UROCULTURA DIAGNÓSTICO DE ITU é CONFIRMADO pela BACTERIÚRIA SIGNIFICATIVA → Presença na urina de um número ≥ 100.000 UFC de UMA ÚNICA BACTÉRIA Achado < 10.000 UFC é considerado NEGATIVO, e Entre 10.000 e 100.000 UFC, um EXAME DUVIDOSO, devendo ser repetido A identificação de DUAS OU MAIS CEPAS DE BACTÉRIAS DIFERENTES em uma mesma amostra sugere CONTAMINAÇÃO DURANTE A COLETA OU NO PROCESSAMENTO DO EXAME O número de UFC/ mL considerado significativo é variável de acordo com o método de coleta adotado Figura 1 Valores recomendados como diagnóstico de ITU A sensibilidade do método da urocultura é superior a 95% na presença do mesmo microrganismo em 3 culturas de urina obtidas por jato médio Quando há sintomas clínicos e piúria, as uroculturas repetidas com valores entre 50.000 e 100.000UFC/mL de um mesmo microrganismo são fortemente sugestivas de ITU 6 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 Quadros clínicos associados a uroculturas com valores abaixo de 100.000 UFC/mL, às vezes, podem decorrer de hidratação excessiva, fluxo urinário aumentado ou antibioticoterapia empírica prévia Obs: A maioria dos episódios de ITU é causada por bacilos Gram-negativos aeróbicos (enterobactérias): → Escherichia, Klebsiella, Enterobacter, Citrobacter, Proteus, Serratia e outros menos frequentes → Escherichia coli – Mais frequentemente identificado, sendo o agente etiológico em cerca de 80 a 90% dos casos no PRIMEIRO SURTO DE ITU → Proteus são encontradas aproximadamente em 30% dos meninos com CISTITE, e Staphylococcus saprophyticus, em uma proporção similar em adolescentes de ambos os sexos → Pacientes com OBSTRUÇÃO DO TRATO URINÁRIO, BEXIGA NEUROGÊNIA e LITÍASE RENAL, as bactérias mais comumente envolvidas são: Proteus, Pseudomonas, Enterococus, Staphylococcus aureus, Staphylococcus epidermidis e, com menor frequência, a Escherichia coli ATENÇÃO! Outros exames laboratoriais, como hemograma e PCR, podem estar normais ou com alterações indicativas de uma infecção bacteriana aguda, principalmente em crianças de idade mais baixa A presença de leucocitose e PCR elevada sugere PIELONEFRITE AGUDA Função renal com dosagem de ureia e creatinina – Elevação sugere comprometimento importante do parênquima renal BACTERIÚRIA ASSINTOMÁTICA Presença de bacteriúria significativa em crianças SEM NENHUMA SINTOMATOLOGIA RELACIONADA À INFECÇÃO URINÁRIA ACHADO OCASIONAL ou em CONTROLE DE CRIANÇAS COM HISTÓRIA PRÉVIA DE ITU Prevalência maior em meninas (1 a 2%) do que em meninos (0,03%) BACTERIÚRIA ASSINTOMÁTICA = 3 uroculturas consecutivas com bacteriúria significativa em um período de 3 dias a 2 semanas Pode ser transitória ou persistente − Bacteriúria assintomática transitória → 95% das meninas apresentam normalização dos exames em 12 meses, sem qualquer tratamento; geralmente desaparece em dias ou semanas e dificilmente recidiva − Bacteriúria assintomática persistente → Tende a permanecer por anos seguidos; comumente encontrada em crianças portadoras de meningomielocele, bexiga neurogênica e que necessitem de cateterismo vesical de repetição As crianças com bacteriúria assintomáticas NÃO DEVEM SER TRATADAS, pois podem desenvolver ITU sintomática e, muitas vezes, com germes de virulência maior IMAGEM Os exames de imagem são os mesmos utilizados na avaliação morfofuncional do trato urinário, que estarão explicados em um tópico abaixo. A investigação por imagem está indicada APÓS O 1º EPISÓDIO BEM DOCUMENTADO DE INFECÇÃO URINÁRIA, em QUALQUER IDADE e para AMBOS OS SEXOS, sendo justificado pela frequente associação de ITU a anomalias do trato urinário, principalmente o RVU e os processos obstrutivos. TRATAMENTO Objetivo: 1. Reconhecimento dos pacientes com alto risco de lesão renal 2. Alívio de sintomas 3. Erradicar o agente infeccioso → Antibioticoterapia 4. Prevenção de recorrências 5. Prevenção da doença renal progressiva – Identificação de alterações anatômicas e/ou funcionais do trato urinário, além de fatores predisponentes de lesão do parênquima As cicatrizes renais podem evoluir para hipertensão arterial sistêmica (10-30% dos casos) e para doença renal em estágio final (10-20% dos casos). O seu surgimento é 7 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 propiciado por: retardo no início do tratamento, ITU recorrente, RVU e malformações no trato urinário. O uso de antibiótico oral é muito efetivo na maior parte dos casos. Normalmente, o tratamento inicial com antibióticos é empírico, observando-se a idade e o estado geral do paciente. QUANDO CONSIDERAR HOSPITALIZAÇÃO? Crianças < 5 anos com suspeita de sepse Não aceitação oral do antibiótico Comprometimento do estado geral Vômito/desidratação Grupos de maior risco para evolução grave − < 3 meses − Imunodeprimidos − Pacientes com doenças urinárias prévias (ex: litíase renal) Sinais de pielonefrite O TEMPO MÉDIO DE DURAÇÃO DO TRATAMENTO deve ser de 10 DIAS, admitindo-se variação entre 7 e 14 dias, nunca devendo ser inferior a 7 dias, sendo preferível um tratamento por 10 dias contínuos. Normalmente, a urina volta a ficar estéril 24h depois do início do tratamento. Assim, a persistência de crescimento bacteriano na urina pode indicar resistência bacteriana ou uma anormalidade grave no trato urinário. Conhecer os patógenos mais associados a cada faixa etária é importante na escolha do antibiótico a ser usado para o tratamento. Ainda, existem outras medidas não medicamentosas que podem ser usadas para ajudar no tratamento da ITU: Avaliar o padrão miccional e orientar que seja feita a micção em dois tempos, para diminuir o resíduo pós-miccional Tratamento de parasitose intestinal e Vulvovaginites Controle e tratamento da constipação intestinal Aporte hídrico adequado Orientação quanto ao ritmo miccional (↑número de micções) e à higienização do trato urinário Evitar uso de anti-inflamatórios não esteroides para o controle da febre e da dor, a fim de evitar lesões renais ALÍVIO DOS SINTOMAS Analgésicos e antitérmicos → Dor e febre Antiespasmódicos → Se disúria intensa Quanto mais nova for a criança, maior deve ser a preocupação em se detectar precocemente os sinais ou sintomas de choque séptico ou hipovolêmico. Podem ser observadas manifestações sistêmicas, como vômitos associados com distúrbios hidreletrolíticos ou acidobásicos. A reidratação deve ser prontamente instituída, por via oral ou, se necessário, parenteral. ANTIBIOTICOTERAPIA Deve ser INICIADA IMEDIATAMENTE APÓS COLETA DA URINA → Retardo para iniciar aumenta o risco de lesão renal. Se: Crianças > 3 meses, sem sinais de toxemia, com estado geral preservado, hidratadas e capazes de ingestão oral → TRATAMENTO AMBULATORIAL Crianças com febre alta, toxemiadas, desidratadas e vômitos persistentes → INTERNAMENTO HOSPITALAR Recém nascidos e lactentes jovens → INTERNAMENTO HOSPITALAR (independentemente da sintomatologia são considerados portadores de ITU complicada ou potencialmente grave) ESCOLHA DO ANTIBIÓTICO BASEADA NA PREVALÊNCIA CONHECIDA DOS AGENTES BACTERIANOS Bactéria mais frequente → E. COLI, seguida das outras enterobactérias Deve-se escolher um antibiótico de: − Espectro adequado − Não nefrotóxico − Boa eliminação renal − Administração oral CEFALOSPORINAS DE 1ª GERAÇÃO (1ª ESCOLHA) ou SULFAMETOXAZOL + TRIMETOPRIM ou NITROFURANTOÍNA são os mais utilizados − Nitrofurantoína em dose bactericida não é bem tolerada − A associação sulfametoxazol + trimetoprima tem apresentado queda da eficácia no Brasil nos últimos anos 8 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 Indicativos de BOA RESPOSTA AO TRATAMENTO: → MELHORA DO ESTADO GERAL + DESAPARECIMENTO DA FEBRE em 48 a 72 horas Caso não haja resposta clínica nesse período, deve-se avaliar a urocultura para modificação terapêutica. Para as crianças com grave acometimento do estado geral, lactentes, com vômitos, desidratados e com distúrbios metabólicos, é necessário iniciar o TRATAMENTO PARENTERAL até as condições clínicas possibilitarem a troca para a medicação oral. Nesse caso, as opções são as CEFALOSPORINAS DE 3ª GERAÇÃO (ceftriaxona ou ceftazidima) ou os AMINOGLICOSÍDEOS (gentamicina ou amicacina). INFECÇÃO POR PSEUDOMONAS SP Casos mais raros Pacientes portadores de alterações graves do trato urinário ou naqueles em uso de cateterismo vesical limpo Quando necessário, o tratamento com quinolonas geralmenteé eficaz; outra opção é a utilização de cefalosporinas combinadas inicialmente com um aminoglicosídeo Pseudomonas sp pode surgir em culturas urinárias sem significar ITU Em geral, as infecções urinárias pela Pseudomonas mostram SINAIS DE GRAVIDADE, indicando acometimento sistêmico RECÉM-NASCIDOS Início do tratamento → antibiótico endovenoso; após urocultura negativa e melhora clínica → antibiótico via oral Devem ser abordados de maneira específica − O uso dos antimicrobianos em recém-nascidos segue orientação diferente daquela dos outros grupos etários − Deve-se iniciar o TRATAMENTO EMPÍRICO RECOMENDADO PRA SEPSE PRECOCE e, com a associação de PENICILINA ou AMPICILINA COM AMINOGLICOSÍDEO (para evitar sepsemia por estreptococo do grupo B) − Naqueles em que as bactérias isoladas forem Staphylococcus ou Enterococcus, usar vancomicina associada a aminoglicosídeo − As cefalosporinas de 3ª geração serão usadas conforme a identificação do germe e sua sensibilidade TRATAMENTO PROFILÁTICO Depois de completado o tratamento e no decorrer da investigação de possíveis alterações do trato urinário, a criança deve ser MANTIDA EM PROFILAXIA com BAIXAS DOSES DE ANTIBIÓTICO OU QUIMIOTERÁPICO, iniciada imediatamente após o término do tratamento erradicador. Objetivo → Prevenção de recidivas de ITU, eliminando um dos principais fatores associados a lesões adquiridas do parênquima renal Indicações: − Durante investigação do trato urinário após o primeiro episódio de ITU − Quando há diagnóstico de anomalias obstrutivas do trato urinário até a realização da correção cirúrgica − Na presença de refluxo vesicoureteral (RVU) de graus III a V − Nas crianças que apresentem recidivas frequentes da ITU, mesmo com estudo morfofuncional do trato urinário dentro da normalidade → Nesses casos, deve ser utilizada por período de 6 a 12 meses, podendo, quando necessário prolongar-se o tempo de uso Dentre os fármacos, o de melhor eficácia e maior segurança é a NITROFURANTOÍNA, apesar da possibilidade de 9 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 intolerância gástrica, principalmente no início do tratamento. Outra droga usada é a associação SULFAMETOXAZOL + TRIMETOPRIM. As cefalosporinas de 1ª geração são usadas no período de recém-nascido até 60 dias de vida, quando deverão ser substituídas pela nitrofurantoína ou por sulfametoxazol + trimetoprim. Obs: Nos últimos anos, vários pesquisadores têm demonstrado que a profilaxia pode não prevenir a recidiva de ITU nem o surgimento de novas lesões cicatriciais do parênquima. Essas observações mudaram a conduta vigente e atualmente a quimioprofilaxia não é empregada nos casos de RVU de graus leves. AVALIAÇÃO MORFOFUNCIONAL DO TRATO URINÁRIO A principal condição de defesa do trato urinário contra invasão, fixação e multiplicação bacteriana é o LIVRE FLUXO DA URINA, desde o parênquima renal até a micção. Principais objetivos: Detectar condições predisponentes da infecção e recidivas Avaliar presença de lesão renal e estabelecer conduta de prevenção ao surgimento/agravamento de lesões renais Não existe método de avaliação do TU completo, então, os exames devem ser associados. ULTRASSONOGRAFIA Método seguro, não invasivo, sem efeitos colaterais, baixo custo; operador-dependente* Capacidade de rastreamento do TRATO URINÁRIO SUPERIOR E INFERIOR + AVALIAÇÃO DAS VIAS DE DRENAGEM E DA MICÇÃO Pode ser realizado na FASE AGUDA da doença EXAME DE ESCOLHA PARA INICIAR A INVESTIGAÇÃO Indicado para qualquer faixa etária Avaliação do volume e tamanho renal, espessura e características do parênquima renal, diâmetro anteroposterior (AP) da pelve, diferenciação corticomedular etc., e espessura da parede vesical, resíduo pré e pós-miccional, morfologia dos ureteres, crescimento do parênquima renal, anomalias de posição e localização renais, presença de hidronefrose, cálculos e abscesso Para completar a US, pode-se incluir a investigação funcional da bexiga e a dinâmica da micção, com estudo das repercussões na fase de enchimento e esvaziamento vesical – Permite demonstrar sinais sugestivos de obstrução, anomalias congênitas dos rins/TU e disfunções vesicais; mas tem baixa sensibilidade da detecção do RVU Também possibilita determinar a capacidade vesical, a presença de contrações do detrusor e de perdas urinárias associadas, além de quantificar o resíduo pós-miccional É útil para o acompanhamento das crianças com bexiga neurogênica ou instabilidade vesical por causas diversas URETROCISTOGRAFIA MICCIONAL (UCM) Método invasivo; requer preparo emocional da criança Indicada para pacientes com até 5 anos; pacientes maiores de 5 anos só devem realizar a UCM em casos de suspeita de malformação do trato urinário ou distúrbio miccional Método que MELHOR DEFINE A MORFOLOGIA DO TU INFERIOR, com avaliação da uretra, bexiga e ureteres (quando há RVU) Avalia uretra e bexiga − Permite identificar anomalias na forma e espessura da parede vesical (divertículos, ureteroceles) e da uretra (estenoses ou válvula de uretra posterior – VUP), além de RVU (com grau de acometimento + se é primário ou secundário) A UCM deve ser realizada em pacientes com urocultura negativa (para evitar disseminação da infecção), e em uso de antibioticoprofilaxia para evitar recidiva da ITU após o exame UROGRAFIA EXCRETORA (UE) Indicação restrita a situações especiais como algumas malformações complexas com possibilidade de abordagem cirúrgica Apresenta riscos com o uso de contraste iodado, carga elevada de radiação e requer preparo do paciente Deve ser evitada na doença renal crônica, em pacientes com alergia aos contrastes iodados e nos recém-nascidos e lactentes muito jovens 10 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 RESSONÂNCIA MAGNÉTICA E ANGIORRESSONÂNCIA DOS VASOS RENAIS Grande acurácia para identificação da anatomia do trato urinário e estudo dos vasos renais, principalmente na identificação de vasos anômalos que fazem compressão ureteral Tem como inconveniente a sedação naquelas crianças que não colaboram (maioria), não estar disponível na maioria das cidades brasileiras e ter custo elevado CINTILOGRAFIA RENAL ESTÁTICA COM ÁCIDO DIMERCAP-TOSSUCCÍNICO (DMSA) Ácido dietilenotriaminopentacético (DTPA) ligado ao 99mTc, que sofre filtração e excreção renal, permitindo a aquisição de imagens sequenciais, desde a sua captação pelos rins até sua eliminação para a bexiga. Usado para avaliar o parênquima renal funcionante e a função quantitativa, tanto relativa quanto absoluta, de cada rim. Esse exame consegue detectar as alterações renais DURANTE A PIELONEFRITE AGUDA, que desaparecem com cerca de 4-6 semanas. Depois desse período, podem ser detectadas as CICATRIZES RENAIS. É o exame padrão ouro para detecção da cicatriz renal. Indicado para (1) todos os lactentes com ITU febril, (2) crianças que apresentaram quadro clínico de pielonefrite (mesmo se USG de rins e vias urinárias normal) e (3) pacientes com RVU. OUTROS EXAMES DE MEDICINA NUCLEAR Cintilografia renal dinâmica → Ácido dietilenotriaminopentacético (DTPA) ligado ao 99mTc. Avalia se o sistema excretor está pérvio, diferenciando processos obstrutivos funcionais dos anatômicos. Por isso, está indicada nos casos de ITU associada à hidronefrose; e contraindicada na presença de RVU. Cistografia radioisotópica direta → Avaliação da presença do RVU. Doses mais baixas de radiação; logo, entretanto, não fornece dados anatômicos da bexiga, da uretra e da coluna lombossacral, além de não permitir a avaliação dos graus do RVU. É útil no acompanhamento da evolução do RVU quando necessário ou quando os pacientes.apresentam alergia ao composto iodado. Também está indicada quando existe forte suspeita de RVU e a UCM não o evidenciou, o que pode ocorrer em até 20% dos casos. SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA – INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO PROGNÓSTICO Relacionado a fatores como: Idade de apresentação Presença ou não de cicatrizes renais Malformações Atraso no diagnóstico e instituição de terapêutica DIRETRIZES PARA INVESTIGAÇÃO DE ITU NA PEDIATRIA Não há consenso. Conduta na Unidade de Nefrologia Pediátrica (UNP) do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HG-UFMG). As crianças são estratificadas de acordo com a idade, tendo como ponto de corte 2 anos, pois há maior chance de se detectar as anomalias do trato urinário em lactentes. Nas crianças menores de 2 anos de idade, realizam-se US do trato urinário e UCM. Na presença de alterações, procede-se à complementação da propedêutica com exames cintilográficos (cintilografia estática e/ou dinâmica), cuja indicação dependerá da anomalia detectada. Nos casos de RVU, deve ser avaliada a presença de dano renal pela cintilografia estática. Nos achados de hidronefrose e/ou na suspeita de obstruções do trato urinário, a cintilografia dinâmica auxilia na diferenciação entre obstrução funcional ou anatômica. https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/2016/12/Nefrologia-Infeccao-Trato-Urinario.pdf https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/2016/12/Nefrologia-Infeccao-Trato-Urinario.pdf 11 Aula 01 – Pediatria – Camila Carneiro Leão Cavalcanti 2021.2 Nas crianças maiores de 2 anos de idade, em ambos os sexos, realiza-se inicialmente US do trato urinário. Quando a US estiver alterada, adicionam-se, na propedêutica, a UCM e os exames cintilográficos, conforme descrito. Nos casos de ITU recidivante ainda sem investigação de imagens, deve-se realizar US, UCM e cintilografia renal estática, caso ainda não tenham sido realizados. A UE, a ressonância magnética (RM), a urodinâmica e as endoscopias urológicas ficam reservadas para casos especiais. Nos últimos anos, foram apresentadas várias novas propostas de investigação da criança com ITU. Apesar das controvérsias, algumas evidências são claras e há uma tendência em reduzir quantitativamente a propedêutica de imagens para esses pacientes. Há a necessidade de identificar o grupo de crianças de alto risco para a presença de ITU associada a anomalias congênitas dos rins e do trato urinário. Esse grupo deverá se submeter a propedêutica de imagens mais extensiva e invasiva. É importante que a abordagem dessas crianças e adolescentes seja centrada na avaliação clínica periódica, objetivando-se o seu desenvolvimento global adequado e a prevenção das recidivas de ITU. REFLUXO VESICOURETERAL RVU PRIMÁRIO Anormalidade estrutural da junção ureterovesical (curto segmento submucoso do ureter), permitindo ascensão da urina da bexiga até os ureteres e os rins. Classificado em 5 graus: leve (I e II), moderado (III) e grave (IV e V). Os pacientes podem ser classificados em três grupos quanto às chances de pior evolução, ou seja, do risco do desenvolvimento de cicatrizes renais, persistência do refluxo, surgimento de hipertensão arterial ou evolução para perda progressiva da função renal. Baixo risco Médio risco Alto risco Graus de RVU leve (I e II) uni ou bilateral Grau III uni ou bilateral Grau IV unilateral Graus IV bilateral Grau V uni ou bilateral Sem cicatrizes renais Sem síndrome de disfunção de eliminação Presença de lesão definitiva (lesão localizada) Sintomatologia de disfunção das eliminações leve (disfunção ausente/leve) Lesão renal moderada ou grave Rim único Síndrome de disfunção das eliminações. Lactentes → Maior o risco de pielonefrites com lesões do parênquima que evoluem com cicatrização
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