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Modelo de agravo de instrumento comentado Para ilustrar e fixar os conceitos expostos neste tópico, propomos um problema a partir do qual será elaborado um agravo. Para uma melhor compreensão do tema, os comentários serão feitos no corpo da própria petição. A Creche Primeira Infância, mantida pela Associação dos Moradores do Bairro Pinheirinho, da Comarca de São José dos Campos, atende a população carente da região em que se situa. Em virtude do não pagamento das 3 (três) últimas faturas de consumo mensal, o fornecimento de água para a creche foi suspenso pela Companhia Bandeirante de Águas – CBA, concessionária local do serviço de abastecimento de água e esgoto. Buscando a reativação do fornecimento, a mantenedora ajuizou ação de rito ordinário com pedido de antecipação de tutela em face da CBA. Após a apresentação da contestação, o MM. Juízo da 1ª Vara Cível daquela comarca, acolhendo as alegações defensivas, houve por bem indeferir a tutela antecipada, sob o fundamento de que a prestação de serviço de abastecimento de água insere-se no bojo de uma relação de natureza contratual bilateral, razão pela qual se justifica a suspensão do fornecimento no caso de não pagamento das faturas mensais. QUESTÃO: Como advogado da autora, providencie a medida adequada para obter, de imediato, a reativação do fornecimento de água para a creche, considerando que a decisão denegatória da tutela antecipada foi publicada na imprensa oficial há 6 (seis) dias. EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO – SP1 1. Nos termos do art. 1.016, caput, o agravo de instrumento será interposto diretamente no Tribunal competente. ASSOCIAÇÃO DOS MORADORES DO BAIRRO PINHEIRINHO, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ n. (número), usuária do endereço eletrônico (e-mail), por seu representante legal (qualificação), com endereço em (endereço), na cidade de São José dos Campos,2 por seu advogado que esta subscreve, vem, respeitosamente, à presença de V. Exa., nos termos dos arts. 1.0153 e seguintes do CPC/2015, interpor o presente 2. Qualificação das partes e formulação inicial da peça de interposição: o agravo de instrumento, apesar de surgido de um processo cujas partes já estão devidamente constituídas, é interposto diretamente ao Tribunal competente, devendo, portanto, a peça de interposição conter a qualificação das partes. Atenção: no caso, a creche é mantida por tal associação e foi esta quem promoveu a ação para questionar o débito; é ela, portanto, a parte legitimada para o recurso. 3. É interessante indicar o fundamento legal da peça; para tanto, basta indicar o dispositivo principal e fazer mera menção aos seguintes. AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL4 4. Havendo pedido de tutela de urgência a ser realizado, este já deve constar do “nome” do recurso (art. 1.019, I, CPC – pedido de efeito suspensivo ou de antecipação de tutela da pretensão recursal). contra decisão5 que indeferiu pedido de liminar (tutela de urgência) proferida pelo R. Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de São José dos Campos, nos autos da ação autuada sob o n. (número), que move em face de COMPANHIA BANDEIRANTE DE ÁGUAS – CBA, pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ n. (número), usuária do endereço eletrônico (e-mail), com endereço em (endereço), pelas razões que acompanham a presente peça de interposição. 5. O agravo é interposto contra a decisão interlocutória e não exatamente contra a parte contrária. Esta só é denominada “agravada” por praxe. Requer seja deferida inaudita altera parte a tutela antecipada recursal pleiteada e após os regulares trâmites seja o agravo conhecido e integralmente provido. Justifica-se a interposição do presente recurso na modalidade de instrumento6 por se tratar de uma das hipóteses do rol do art. 1.015 – especificamente o inciso I (decisão acerca de tutela provisória) 6. É importante explicitar o cabimento do agravo de instrumento, com base em alguns dos incisos do art. 1.019 do CPC/2015. Em cumprimento ao art. 1.016, IV, informa a agravante nome e endereço dos advogados constantes do processo: Pelo agravante: Dr. (nome completo), com escritório em (endereço). Pelo agravado:7 Dr. (nome completo), com escritório em (endereço). 7. Deve-se considerar se o advogado do agravado já foi constituído nos autos. Se não, informar que “deixa de indicar seus dados em virtude de sua não integração à relação processual”. Com fulcro no art. 1.017, I e III, do CPC/2015, vem indicar as peças que instruem o presente recurso:8 8. Além de juntar as cópias das peças, é interessante especificar quais estão sendo juntadas (no Exame da OAB, tal conduta revela importante demonstração de conhecimento). a) peças obrigatórias (art. 1.017, I): 1 – petição inicial; 2 – decisão agravada; 2 – certidão da intimação da decisão agravada; 3 – procuração outorgada ao advogado da agravante; 4 – procuração outorgada ao advogado da agravada; Deixa a agravante de juntar a contestação porque ela ainda não foi apresentada nos autos de origem – informação prestada sob responsabilidade do advogado (art. 1.017, II)9 b) peças facultativas (art. 1.017, III);10 9. Esta previsão é inovação do CPC/2015. Se não for possível a juntada de alguma das cópias necessárias, deve o advogado expressamente esclarecer isso na petição de interposição do recurso. Cumpre destacar que não há necessidade de certidão ou declaração do Poder Judiciário, bastando que haja a declaração do advogado. 10. Deve o recorrente também indicar como peças facultativas aquelas que facilitam a compreensão dos termos do processo em 1º grau. 1 – PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO11 11. Se tiver havido alguma outra peça relevante – como um pedido de reconsideração que traga mais subsídios para tentar convencer o magistrado –, justifica-se também sua juntada como peça facultativa. Vale recordar que pedido de reconsideração não é recurso nem altera o prazo para recorrer; ainda assim, é por vezes utilizado no cotidiano forense (já que o juiz pode alterar sua decisão monocrática). Assim, estão sendo juntados todos os documentos para que o agravo seja conhecido. Caso V. Exa. entenda não serem eles suficientes, requer-se a intimação da agravante para que junte eventuais cópias adicionais (art. 1.017, § 3º).12 12. Trata-se de inovação do CPC/2015: se alguma cópia não é juntada (seja ela necessária ou facultativa), não deve haver a inadmissão do recurso de plano, mas, sim, oportunidade de correção da falha. Apenas se não for juntado o documento é que haverá o não conhecimento do recurso. Nos termos do art. 425, IV, do CPC/2015, as cópias das peças do processo são declaradas autênticas pelo advogado sob sua responsabilidade pessoal.13 13. Autenticação das peças: tal exigência consta no regramento do agravo? Não, o art. 1.017 só se refere a “cópias”. Mas a jurisprudência, em determinado momento, a exigia. A questão está superada considerando-se a possibilidade de o advogado declarar as cópias autênticas. De qualquer forma, especialmente em exames de OAB e concursos, é conveniente fazer menção a isso para mostrar conhecimento ao examinador. Informa, outrossim, que, em cumprimento ao art. 1.018 do CPC/2015,14 dentro do prazo legal de três dias, juntará aos autos do processo de origem cópia do presente recurso, da prova de sua interposição e do rol dos documentos que o instruem. 14. No CPC/1973, isso era obrigatório em todos os casos. No CPC/2015, só é fundamental essa juntada em casos de processo físico; sendo o processo eletrônico, trata-se de mera faculdade do agravante (art. 1.018, §§ 2º e 3º) . Informa ainda que, nos termos do art. 1.017, § 1º, do CPC/2015, recolheu os valores exigidos legalmente relativos às custas e ao porte de retorno, o que se comprova pelas guiasdevidamente quitadas que ora são juntadas aos autos.15 15. Trata-se de requisito de admissibilidade (preparo) que deve ser mencionado, onde houver. Sendo processo eletrônico, não haverá recolhimento do porte de remessa e retorno (art. 1.007, § 3º). Se a parte for beneficiária da justiça gratuita (e, no caso, considerando o narrado nos autos, seria possível isso), é interessante indicar que há a gratuidade e por isso não são recolhidas as custas (art. 1.007, § 1º). Termos em que pede deferimento. Cidade, data, assinatura, OAB (outra página)16 16. É praxe (mas não imprescindível) que se separe uma petição de interposição (apenas comunicando a interposição do recurso, com a menção aos principais aspectos formais, como assim se fez) e se apresentem as razões recursais na sequência. RAZÕES RECURSAIS Agravante: ASSOCIAÇÃO DOS MORADORES DO BAIRRO PINHEIRINHO Agravado: COMPANHIA BANDEIRANTE DE ÁGUAS – CBA Autos número: (número) Vara de Origem: (...) Vara Cível da Comarca de São José dos Campos Egrégio Tribunal Colenda Câmara Nobres Julgadores17 17. No preâmbulo das razões, é bom, para o atendimento do pressuposto da regularidade formal, que o advogado descreva dados básicos do processo em 1º grau (nome das partes, vara de origem e número do processo). Após essa breve introdução, é praxe fazer uma saudação aos julgadores; inicia-se mencionando o Tribunal, depois a Câmara, e finalmente os julgadores do recurso, indo do geral ao particular. Não se trata de algo obrigatório, mas é conveniente que assim se faça – especialmente em provas de OAB e concursos. I – DOS FATOS/BREVE SÍNTESE DA DEMANDA18 18. O recorrente deve narrar brevemente os fatos referentes ao caso concreto. Tratando-se de Exame de Ordem ou concurso público, em determinados problemas cuja narração é mais extensa, é possível elaborar um breve resumo da demanda. Por vezes, entretanto, as informações trazidas ao candidato se limitam ao objeto da decisão. Seja como for, o candidato não deve inventar nada e tal parte da petição pode ser resolvida em poucos parágrafos, até porque não será objeto de maior interesse por parte do examinador. A Creche Primeira Infância, mantida pela agravante, atende a população carente da região em que se situa. Em virtude do não pagamento das 3 (três) últimas faturas de consumo mensal, o fornecimento de água para a creche foi suspenso pela agravada, concessionária local do serviço de abastecimento de água e esgoto. Buscando a reativação do fornecimento, a ora agravante ajuizou ação pelo procedimento comum, com pedido de tutela de urgência (antecipação de tutela) em face da recorrida. Antes mesmo da apresentação da contestação, o MM. Juízo de origem houve por bem indeferir a tutela antecipada, sob o fundamento de que a prestação de serviço de abastecimento de água insere-se no bojo de uma relação de natureza contratual bilateral, razão pela qual se justifica a suspensão do fornecimento no caso de não pagamento das faturas mensais. Considerando a situação grave em que se encontra uma creche sem água, a agravante apresentou pedido de reconsideração (juntado como peça facultativa), provando a situação de risco à saúde de crianças, peça até o momento não apreciada. Tal r. decisão, todavia, não merece prevalecer, devendo ser integralmente reformada, pelas razões a seguir aduzidas. II – DAS RAZÕES19 DO INCONFORMISMO 19. Razões propriamente ditas: após a descrição da decisão recorrida, o advogado deverá demonstrar o erro do julgador de 1º grau. Para tanto, irá expor sua tese jurídica, confrontando- a com o entendimento do juiz que proferiu a decisão impugnada, valendo-se, sempre que possível, de apontamentos de doutrina e de jurisprudência. Para buscar os fundamentos, parta do próprio objeto da decisão: qual é o tema versado? Procure sua fundamentação na lei e nas obras jurídicas de que dispõe. 1) DA VIOLAÇÃO AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR Inicialmente, cabe configurar a relação estabelecida entre as partes como relação de consumo; afinal, as partes se subsumem nos conceitos previstos nos arts. 2º e 3º do CDC, sendo a agravante consumidora e a agravada fornecedora de serviços no mercado. A propósito, colacione-se o entendimento do Egrégio STJ: “É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que os serviços públicos prestados por concessionárias, como no caso dos autos, são regidos pelo Código de Defesa do Consumidor” (STJ, AgRg no AREsp 183.812/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 06-11-2012, DJe 12-11-2012). Importa ainda considerar a natureza dos serviços em questão: trata-se de serviço de abastecimento de água, de caráter essencial. A esse respeito, são claros os termos do art. 22 do CDC: “os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos” (grifos nossos). Pelo corte no abastecimento de água à creche mantida pela agravante, a agravada agiu ilegalmente, descumprindo tal dispositivo legal. Afinal, tratando-se de serviço público essencial, verifica-se a impossibilidade da suspensão do fornecimento.20 20. Merece destaque o fato de que a jurisprudência do STJ, no que tange ao fornecimento de energia elétrica, vem permitindo a suspensão do fornecimento por inadimplemento. Todavia, há julgados de posições minoritárias que podem ser invocados. Assim, não tem razão o douto juiz de 1º grau ao afirmar que “a prestação de serviço de abastecimento de água insere-se no bojo de uma relação de natureza contratual bilateral”, sendo justificada a cessação de fornecimento pelo não pagamento. O serviço é essencial, e a agravada tem o monopólio do fornecimento, o que desconfigura a alegada natureza de simples contrato bilateral alegada. Ademais, ainda que assim não fosse, a suspensão no fornecimento de água constitui prática indevida e ilegal de constrangimento ao consumidor com a qual não se coaduna o art. 42, caput, do CDC, segundo o qual, “na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça”. Ora, a suspensão do fornecimento de água por certo acarreta considerável constrangimento ao consumidor que não pode pagar, sendo prática repudiada por nossa legislação, como bem reconhecem doutrina e jurisprudência.21 21. Neste momento, para dar consistência à sua fundamentação, é interesse fazer citações de doutrina e de julgados a respeito. 2) DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL22 22. Tratando-se de medida excepcional a ser concedida pelo relator, é preciso desenvolver os requisitos do pedido formulado, levando em consideração a concessão de tutela de urgência no âmbito recursal (CPC/2015, art. 300. “probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo”). Como já houve exposição do direito aplicável, a explanação do recorrente está facilitada. Assim, a “probabilidade do direito” já deve ter sido exposta na fundamentação; o recorrente deve tão somente reforçar o que já foi antes apresentado. No caso do “perigo de dano” ou “risco ao resultado útil do processo”, é necessário desenvolver sua ocorrência, já que não terá havido ainda menção a isso na peça. É preciso atentar para as circunstâncias do caso concreto, expondo, de forma concreta, a urgência da atuação do relator. Dispõe o art. 1.019, I, do CPC/2015 que o relator pode deferir a antecipação de tutela, total ou parcial, da pretensão recursal. O art. 300 do CPC explicita os requisitos de concessão da tutela de urgência antecipada, a saber, (i) a probabilidade do direito e (ii) o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. No caso em hipótese, estão presentes ambos os requisitos, sendo de rigor tal concessão. A probabilidade dodireito está presente considerando as razões de reforma anteriormente expostas. Pode ser depreendida pelo regramento legal constante no CDC, que explicita que o serviço essencial é contínuo e não pode a agravada constranger a consumidora com a cessação do fornecimento. Ademais, há uma ação discutindo o débito; assim, há elementos que demonstram a plausibilidade da tese esposada pela agravante. No que tange ao perigo de dano, a necessidade de religar a água é urgente por ser vital para a higiene e saúde das crianças. Se não for restabelecido o fornecimento, a creche poderá precisar paralisar suas atividades, em claro prejuízo à comunidade local. Devidamente demonstrado o preenchimento dos requisitos legais, revela-se imperiosa a concessão da tutela antecipada pretendida, nos termos do art. 1.019, I, do CPC/2015, para determinar a imediata reativação do fornecimento de água à agravante. III – CONCLUSÃO E PEDIDO Por todo o exposto, a agravante requer que o recurso seja conhecido,23 que seja liminarmente deferida a antecipação de tutela da pretensão recursal24 para religar a água da creche,25 e que, após a apresentação de contrarrazões pela parte agravada, seja dado provimento integral26 ao recurso para reformar27 a decisão ora impugnada, confirmando a antecipação de tutela que se espera liminarmente deferida. 23. É preciso sempre considerar que o recurso deve passar pelo exame de admissibilidade (sendo este positivo, nesse caso é que se analisará o provimento). 24. Deve-se reiterar o pedido de tutela antecipada. 25. É sempre conveniente ser bem específico no pedido, deixando claro o que se pleiteia para facilitar a compreensão do examinador (em concursos e Exames de OAB) e do julgador (em casos concretos). 26. Deve-se pleitear que o recurso seja provido. Atenção, este é o termo correto; não se fala em “procedência”... 27. É importante indicar o que se pretende: no caso, a reforma. Se fosse o caso de anulação, esta deveria ser mencionada, pedindo a invalidação da decisão e a retomada regular do andamento do processo. Termos em que Pede deferimento. Cidade, data, assinatura, OAB
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