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ERROS INATOS DO METABOLISMO

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1 RAYSSA OLIVEIRA SANTOS - MEDICINA 
 
 
As perturbações metabólicas agudas são eventos relativamente frequentes na infância, e suas causas mais comuns são as infecções, a 
imaturidade e as disfunções ventilatórias e hidroeletrolíticas. Entretanto, num pequeno grupo de pacientes, elas são decorrentes de uma doença 
metabólica primária - como os erros inatos do metabolismo (EIM) dos ácidos graxos e orgânicos, dos aminoácidos e da amônia. 
Tais erros do metabolismo são considerados a causa das Doenças Metabólicas Hereditárias (DMH) em que a ausência de um produto esperado, 
acúmulo de substrato da etapa anterior a interrompida ou o surgimento de uma rota metabólica alternativa podem levar ao comprometimento 
dos processos celulares. Esse grupo de doenças representa cerca de 10% de todas as doenças genéticas. E ainda hoje, são tidos por muitos 
profissionais como casos extremamente raros de se deparar durante a prática clínica sendo, muitas vezes, a última hipótese diagnóstica. 
Como todos os EIM são individualmente raros e têm apresentações clínicas bastante inespecíficas, é comum o pediatra cogitá-los tardiamente. 
A demora no diagnóstico e tratamento dos EIM pode trazer danos irreparáveis ao sistema nervoso central da criança. Por outro lado, sabe-se 
que o esforço na detecção e a intervenção precoces em pacientes portadores de um EIM são recompensados por evoluções clínicas favoráveis 
e pela prevenção de novos afetados. 
Em grande parte, são doenças que afetam todo o organismo e podem se manifestar em qualquer faixa etária, fazendo com que médicos de 
diferentes especialidades devam atentar aos sinais e sintomas de um erro metabólico em qualquer paciente que, porventura, possa ser 
encaminhado aos seus cuidados. 
APRESENTAÇÃO CLÍNICA 
Tratando-se de alterações metabólicas bastante distintas, os Erros Inatos do Metabolismo possuem diversas classificações. No entanto, é 
conveniente descrever aquela estabelecida por Saudubray e Charpentier (1995)1 por se apresentar mais didática e de maior aplicação clínica. 
De acordo com essa classificação, os EIM dividem-se em duas categorias: 
a Categoria 1, engloba as alterações que afetam um único sistema 
orgânico ou apenas um órgão, como o sistema imunológico e os fatores 
de coagulação ou túbulos renais e eritrócitos; a Categoria 2, abrange um 
grupo de doenças cujo defeito bioquímico compromete uma via 
metabólica comum a diversos órgãos, como as doenças lisossomais, ou 
restrito a um órgão apenas, porém com manifestações humorais e 
sistêmicas, como a hiperamonemia nos defeitos do ciclo da uréia. 
Dessa forma, as doenças da Categoria 2 apresentam enorme diversidade 
clínica e acarretam grande dificuldade diagnóstica, diferenciando-se, 
ainda, neste aspecto das doenças da Categoria 1 nas quais os sintomas 
são uniformes e, portanto, o diagnóstico é facilitado. Respeitando a 
grande variabilidade de alterações da Categoria 2, as doenças 
metabólicas hereditárias que a compõem são divididas em três diferentes 
grupos conforme suas características fisiopatológicas e fenótipo clínico: 
 Grupo I: Distúrbios de síntese ou catabolismo de moléculas 
complexas; 
 Grupo II: Erros inatos do metabolismo intermediário que culminam 
em intoxicação aguda ou crônica; 
 Grupo III: Deficiência na produção ou utilização de energia. 
E R R O I N A T O D O 
 
2 RAYSSA OLIVEIRA SANTOS - MEDICINA 
Os distúrbios do grupo I apresentam sintomas permanentes que tendem a acentuar com o passar do tempo, como facies grosseira, dismorfias, 
visceromegalias, neurodegeneração, entre outros, respeitando a localização do acúmulo. 
As doenças metabólicas enquadradas no grupo II compreendem as aminoacidopatias, os defeitos dos ácidos orgânicos e do ciclo da uréia e as 
intolerâncias aos açúcares. Caracterizam-se por apresentarem intervalos livres de sintomas e relação evidente com o aporte alimentar. As 
manifestações levam, de maneira geral, à intoxicação aguda e recorrente ou crônica e progressiva. 
O grupo III inclui doenças cuja clínica é decorrente de alterações de produção e consumo energéticos. Em sua maioria, são provenientes de 
distúrbios do fígado, miocárdio, músculo e cérebro. Manifestam-se, comumente, através de hipoglicemia, hipotonia generalizada, miopatia, 
insuficiência cardíaca, retardo de crescimento e até morte súbita, entre outros sintomas. Exemplos desse grupo são as glicogenoses, 
hiperlacticemias congênitas, doenças mitocondriais da cadeia respiratória e defeitos na oxidação de ácidos graxos. 
As manifestações clínicas dos EIM costumam ser divididas, de um modo geral, em 4 grandes grupos: 
1) o dos sintomas agudos no período neonatal; 
2) o dos sintomas agudos e frequentemente intermitentes, de apresentação tardia (dos 29 dias de vida até a vida adulta); 
3) o dos quadros específicos que envolvem deterioração progressiva de determinado órgão ou sistema (doenças degenerativas cerebrais; 
hepatopatias progressivas; síndromes altamente específicas como a da homocistinúria; etc.); 
4) o dos quadros crônicos gerais e inespecíficos (retardo mental por acúmulo de substâncias tóxicas; retardo de crescimento por evitação 
alimentar de substâncias tóxicas) 
Os sintomas iniciais incluem recusa alimentar, vômitos, letargia e às vezes hipotonia marcada (Tabela 2). Eles parecem traduzir o que seria o 
correspondente à irritabilidade das fases iniciais de uma Encefalopatia Aguda e à aversão a algum componente da dieta que fosse precursor de 
substâncias tóxicas. A evolução destes sintomas costuma prosseguir, não obstante medidas terapêuticas gerais, para o coma, para as crises 
convulsivas e para as perturbações ventilatórias - desde a taquipnéia (por acidose metabólica ou por estímulo direto dos centros ventilatórios) 
até parada respiratória. Esta evolução seria o reflexo de uma continuada ação tóxica sobre o Sistema Nervoso Central, com aprofundamento dos 
efeitos lesivos sobre a córtex cerebral, sobre a substância reticular ascendente e sobre os centros respiratórios bulbares. 
Muitas crianças portadoras de um EIM de manifestação aguda parecem ser normais ao nascimento. Os sintomas poderão se iniciar desde as 
primeiras horas até as primeiras semanas de vida. Outras vezes podem ser adiados por meses até que um evento desencadeie o catabolismo 
(como febre, infecção, trauma etc.) ou até que uma modificação alimentar suplante equilíbrios bioquímicos até ali sustentados pela criança. 
Assim, essas doenças costumam ter variantes de apresentação neonatais agudas, infantis subagudas ou ainda intermitentes. 
Além do curso clínico do paciente, devemos ainda nos lembrar de que alguns dados gerais da história da família podem ajudar a identificar a 
criança portadora de um EIM de manifestação aguda. Como virtualmente todos os EIM em questão obedecem ao modelo recessivo de herança 
(seja autossômico, seja ligado ao X), a ocorrência de um irmão ou irmã previamente afetado por um quadro clínico semelhante deve ser 
considerada um “fator de risco” para o diagnóstico de um EIM. Pelas mesmas razões, a existência de consangüinidade entre os pais do paciente 
em investigação deve ser igualmente valorizada. 
 
Em resumo, podemos listar os seguintes critérios de identificação de crianças com risco de serem portadoras de um EIM de manifestação aguda: 
 Crianças que apresentem agudamente um quadro de deterioração geral do sensório; 
 Crianças nas quais se identifique uma modificação alimentar ou uma situação de catabolismo subjacente. 
 Crianças com história de recorrência familiar ou de consangüinidade entre os pais. 
Entretanto, existem alguns critérios e sinais que sem outra causa definida levam a pensar em uma Doença Metabólica Hereditária, quais sejam: 
A. Hipotonia, hipoglicemia, irritabilidade, acidose, distúrbio hidroeletrolítico, entre outros já citados; 
 
3 RAYSSA OLIVEIRA SANTOS - MEDICINA 
B. Crianças que, em associação aos citados acima, apresentem odores peculiares ou dismorfias; 
C.Perda de habilidades adquiridas anteriormente; 
D. História de recorrência familiar ou consangüinidade entre os pais 
Entre as DMH de manifestação em adultos estão as doenças cujo diagnóstico é realizado na infância e, desde que acompanhado de tratamento 
adequado, os pacientes atingem a idade adulta apenas com algumas complicações. 
A fenilcetonúria, por exemplo, tratada com dieta pobre em fenilalanina é importante mesmo na vida adulta no que se refere aos benefícios sobre 
as funções neuropsicológicas do paciente3 e, também, à saúde fetal durante a gravidez de mulheres com hiperfenilalaninemia5 . A manutenção 
da dieta pela mãe diminui a incidência no feto de retardo mental, microcefalia, defeitos congênitos do coração e retardo de crescimento intra-
uterino. 
Diagnosticar, rapidamente, é essencial para impedir o agravamento e a irreversibilidade dos sintomas, podendo representar a vida do paciente 
em alguns casos. Nesse contexto, vale destacar o papel fundamental da triagem neonatal que possibilitou grande avanço no conhecimento e 
tratamento de DHM a partir de sua detecção em fase pré-clínica, prevenindo o dano neurológico ou mesmo a morte que essas patologias podem 
ocasionar. 
Uma vez que amônia, aminoácidos e ácidos orgânicos são todos metabólitos de proteínas, as manifestações clínicas de seus acúmulos são 
tipicamente associadas ao início do aleitamento, ou às mudanças alimentares da criança mais velha, ou ainda, à sobrecarga protéica. 
Ao mesmo tempo deve ser iniciada a investigação bioquímica. Esta só será eficaz se as amostras de sangue (S) e de urina (U) forem colhidas 
antes de qualquer manejo terapêutico. 
1) Urina 
A presença de corpos cetônicos (cuja detecção é mais fácil na urina devido à sua 
alta depuração) indica que os ácidos graxos estão sendo desviados para seu 
aproveitamento energético. Ao mesmo tempo em que isso possa se dever à 
indisponibilidade momentânea de glicose às células (p. ex., na condição de 
jejum), a existência de cetonas circulantes é evidência de que não há bloqueio 
ao aproveitamento dos ácidos graxos; 
O teste denominado clinitest identifica açúcares redutores presentes na urina. 
Inespecífico em nefropatas, ele é essencial na identificação imediata das 
galactosemias, em que é positivo; 
O teste DNPH (dinitrofenilhidrazina), se disponível, pode ajudar a identificar casos 
de acúmulo de cetoacidos; 
O pH urinário ácido confirmará uma acidose metabólica causada por 
perturbações do metabolismo intermediário, enquanto que o pH normal ou 
alcalino deverá levantar a suspeita de acidose metabólica por espoliação de 
bicarbonato (p.ex. acidose tubular renal); 
As “amostras para congelamento imediato” (tanto de sangue como de urina) serão utilizadas em etapas subseqüentes da investigação, de acordo 
com os primeiros resultados. Por exemplo, a urina poderá ser encaminhada à cromatografia de ácidos orgânicos - um exame extremamente 
caro e sofisticado, que deve ser reservado para casos selecionados - se os exames iniciais sugerirem a possibilidade de uma acidemia orgânica. 
2) Sangue 
A indicação da gasometria arterial é evidente pois somente ela nos indicará com certeza a ocorrência de um consumo de HCO3, como acontece 
nas acidemias orgânicas. Vale lembrar que muitas vezes o pH está normalizado em função de uma alcalose respiratória compensatória 
(hiperventilação) e que por isso, isoladamente, não é informativo; 
 
4 RAYSSA OLIVEIRA SANTOS - MEDICINA 
hiperamonemia costuma resultar tanto dos EIM do ciclo da uréia como de diversas acidemias orgânicas, de algumas acidemias lácticas e de 
algumas aminoacidopatias. O mesmo vale para a elevação de lactato sérico e para a hipoglicemia. Portanto, a interpretação destes achados, em 
associação, é complexa, pois eles são comuns a diferentes patologias. 
A importância da avaliação dos aminoácidos é óbvia. Aqui a sugestão de realização inicial de cromatografias em camada delgada deve-se ao 
baixo custo e à disponibilidade delas no nosso meio. Em outros serviços, é possível que a cromatografia líquida de alta performance (HPLC) ou o 
analisador de aminoácidos sejam as técnicas de eleição. 
A interrupção da ingesta proteica é o primeiro passo no sentido de 
remoção de toxinas (aminoácidos, ácidos orgânicos e radicais 
nitrogenados – amônia). Se esta medida é mantida por poucos dias, não 
traz conseqüências danosas àquelas crianças em que os primeiros 
exames excluírem um erro inato; por outro lado, é salvadora nos doentes. 
Sugere-se que a ingesta de proteínas recomece no terceiro dia ou 
quando, em um bebê com hiperamonemia, esta cair para níveis inferiores 
a 80 mmoles/L1,8. Na hiperamonemia, pode ser necessário o uso 
coadjuvante de substâncias que induzam a excreção de produtos 
nitrogenados através de rotas metabólicas alternativas, como o 
benzoato de sódio e o fenilacetato de sódio. 
O estímulo ao anabolismo deve ser imediato. Como muitas vezes é 
aconselhável o NPO, inicia-se com uma solução de glicose a 10% e 
eletrólitos, numa taxa de 150 a 200 ml/kg/dia. Esta via será substituída 
pela nutrição enteral gradualmente. Além da oferta evidente de energia, 
esta medida promove hidratação e diurese forçada - o que poderá 
aumentar a excreção renal de compostos tóxicos acumulados. Medidas 
mais drásticas de estímulo ao anabolismo, como a glicoinsulinoterapia 
ou o uso de hormônio de crescimento, são reservadas aos quadros com 
diagnóstico específico da condição. 
Entre as outras manobras para a remoção de toxinas, merece destaque 
a diálise peritoneal e/ou exsangüíneotransfusão para o tratamento de 
emergência da hiperamonemia superior a 400mmoles/L. Nestes níveis, a 
amônia é um potente agente osmolar que se acumula na glia produzindo 
edema cerebral agudo e morte se não tratada a tempo. Após o 
reconhecimento da hiperamonemia, o pediatra deve instituir estas medidas nas primeiras horas de manejo. 
A introdução de cofatores justifica-se por eles serem constituídos de vitaminas sem efeito colateral maior, capazes de corrigir alguns EIM 
específicos que são, muitas vezes, aqueles com melhor prognóstico após a terapia1. O coquetel deve ser formado pelos itens abaixo: 
A. vitamina B1 – pode corrigir parcialmente uma deficiência de piruvato carboxilase (uma acidemia láctica) 
B. vitamina B2: pode corrigir certos casos de acidemia glutárica, tipo II 
C. biotina: corrige a deficiência de biotinidase, pode corrigir deficiências de holocarboxilase sintetase e pode ter boa resposta na 
deficiência de propionil-CoA carboxilase (acidemia propionica) 
D. carnitina: trata deficiências primárias de carnitina e, nos pacientes portadores de um EIM dos ácidos orgânicos, trata as deficiências 
secundárias deste transportador de ácidos graxos para dentro das mitocôndrias. Este último é um fenômeno relativamente comum e 
que complica substancialmente os quadros clínicos e bioquímicos das acidemias metilmalônica, propiônica, isovalérica, glutáricas (I 
e II), além da deficiência de b-cetotiolase e da deficiência de desidrogenases dos ácidos de cadeia média (EIM dos ácidos graxos). A 
reposição de carnitina, em todos estes casos, é obrigatória. 
E. vitamina B12: pode trazer melhora em algumas variantes de acidemia metilmalônica (em especial, a forma associada à homocistinúria); 
Deve também ser realizada uma prova terapêutica com piridoxina naqueles recém-nascidos e lactentes com crises convulsivas, especialmente 
se forem refratárias aos anticonvulsivantes tradicionais. Esta prova visa identificar as crianças portadoras de convulsões dependentes de 
 
5 RAYSSA OLIVEIRA SANTOS - MEDICINA 
vitamina B6. Ela pode ser feita com um registro eletroencefalográfico simultâneo à administração endovenosa de vitamina B6. Quando a prova 
é positiva, há uma melhora dos paroxismos segundos após a injeção. 
Com rotinas estabelecidas, em especial no que se refere ao primeiro momento, logo após a chegada do paciente ao hospital (tempos zero e um), 
acreditamosque um número cada vez maior de crianças gravemente enfermas receberá diagnósticos mais precisos e tratamentos mais eficazes. 
A implantação destas rotinas tem sido sugerida por diversos autores. É claro que o que propomos aqui é fruto da adaptação às nossas condições 
locais, mas acreditamos que nossa rotina possa ajudar ou ser adaptada a outros serviços pediátricos. 
Esperamos também que esta revisão contribua para afastar um dos mitos existentes entre os pediatras a respeito dos EIM: o de que seu 
diagnóstico requer o conhecimento aprofundado de inúmeras rotas do metabolismo intermediário e de suas interconexões. O nosso argumento 
é o de que é possível uma abordagem diagnóstica inicial fundamentada em poucos ensaios bioquímicos, dos quais o pediatra e o neonatologista 
disponham em centros de referência, para que sejam racionalmente utilizados em todas as crianças com suspeita de um EIM. 
A fenilcetonúria (FCU ou PKU), causada por deficiência de fenilalanina-hidroxilase (Figura 20.15), é 
o erro inato do metabolismo dos aminoácidos encontrado com mais frequência clinicamente 
(prevalência 1:15.000). Bioquimicamente, caracteriza-se por acúmulo de fenilalanina (e deficiência 
de tirosina). 
A hiperfenilalaninemia pode ser causada também por deficiência em qualquer uma das enzimas 
que sintetizam a coenzima BH4 ou na di-hidropteridina-redutase, que regenera BH4 a partir de BH2 
(Figura 20.16). Tais deficiências aumentam indiretamente as concentrações de fenilalanina, pois a 
fenilalanina-hidroxilase requer BH4 como coenzima. A BH4 é necessária também para a tirosina-
hidroxilase e para a triptofano-hidroxilase, que catalisam reações na síntese de 
neurotransmissores como as catecolaminas e a serotonina. 
A simples restrição de fenilalanina na dieta não reverte os efeitos sobre o sistema nervoso central 
(SNC) causados por deficiência nesses neurotransmissores. A terapia de reposição com BH4ou l-
DOPA e 5-hidroxitriptofano (produtos das reações catalisa das pelas enzimas afetadas, tirosina-
hidroxilase e triptofano-hidroxilase) melhora o quadro clínico nessas formas variantes de 
hiperfenilalaninemia, embora a resposta desses pacientes seja imprevisível. 
 
 
6 RAYSSA OLIVEIRA SANTOS - MEDICINA 
 
CARACTERÍSTICAS DA PKU C LÁSSICA 
FENILALANINA ELEVADA 
A fenilalanina está presente em concentrações elevadas nos tecidos, no plasma e na urina. Fenilactato, fenilacetato e fenilpiruvato, normalmente 
não produzidos em quantidades significativas na presença de fenilalanina-hidroxilase funcional, também se apresentam elevados na PKU (Figura 
20.17). Esses metabólitos dão à urina um odor de mofo característico (ou “de camundongo”). (Nota: a doença adquiriu seu nome devido à presença 
de uma fenilcetona [posteriormente identificada como fenilpiruvato] na urina.) 
SINTOMAS DO SNC 
Retardo mental, dificuldade para andar ou falar, 
convulsões, hiperatividade, tremor, microcefalia e 
retardo no crescimento são características da PKU. O 
paciente com PKU não tratada apresenta tipicamente 
sintomas de retardo mental ao atingir um ano de idade 
e raramente alcança um Ql maior que 50 (Figura 20.18). 
(Nota: essas manifestações clínicas são raramente 
observadas hoje em dia, como resultado dos programas 
de triagem neonatal.) 
HIPOPIGMENTAÇÃO 
Os pacientes com fenilcetonúria frequente mente apresentam deficiência na pigmentação (cabelo 
e pele claros, olhos azuis). A hidroxilação da tirosina pela tirosinase, o primeiro passo na formação 
do pigmento melanina, é inibida competitivamente pelos níveis elevados de fenilalanina presentes 
na PKU. 
TRIAGEM E D IAGNÓSTICO NEONATAL DA PKU 
O diagnóstico precoce da fenilcetonúria é importante, pois a doença é tratável por meio de dieta 
adequada. Devido à ausência de sintomas neonatais, testes laboratoriais para níveis elevados de 
fenilalanina no sangue são obrigatórios para a detecção. No entanto, o bebê com PKU 
frequentemente apresenta níveis sanguíneos normais de fenilalanina ao nascimento, pois a mãe depura os níveis aumentados de fenilalanina 
no sangue do feto afetado, através da placenta. Níveis normais de fenilalanina podem persistir até o recém-nascido ser exposto a 24 a 48 horas 
de alimentação com proteína. Assim, para evitar falsos negativos, os testes de triagem são normalmente realizados após esse período. Para 
recém- -nascidos com teste de triagem positivo, o diagnóstico é confirmado por meio da determinação quantitativa dos níveis de fenilalanina. 
 
 
 
7 RAYSSA OLIVEIRA SANTOS - MEDICINA 
D IAGNÓSTICO PRÉ-NATAL DA PKU 
A PKU clássica engloba uma família de doenças, causadas por uma entre 100 ou mais mutações diferentes no gene que codifica a fenilalanina-
hidroxilase (PAH). A frequência de uma determinada mutação varia entre as populações. Com frequência, a doença é duplamente heterozigota, 
ou seja, o gene PAH apresenta uma mutação diferente em cada alelo. Apesar dessa complexidade, o diagnóstico pré-natal é possível. 
DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL INDIRETO DE FENILCETONÚRIA 
O gene da fenilalanina-hidroxilase (PAH), deficiente na fenilcetonúria, está localizado no cromossomo 12. 
Ele abrange cerca de 90 kb de DNA genômico e contém 13 éxons, separados por íntrons (Figura 33.17). 
Mutações nesse gene geralmente não afetam diretamente nenhum sítio de reconhecimento de 
endonucleases de restrição. Para estabelecer um protocolo diagnóstico para essa doença genética, deve-
se analisar o DNA dos membros da família de um indivíduo afetado. A chave é identificar marcadores (RFLP) 
fortemente ligados ao traço da doença. Tão logo esses marcadores tenham sido identificados, a análise de 
RFLP pode ser utilizada para realizar o diagnóstico pré-natal. 
a. identificação do gene 
Pode-se determinar a presença de um gene mutante por meio da identificação de polimorfismos 
marcadores se duas condições são satisfeitas. Primeiro, se o polimorfismo é bastante ligado à mutação que 
causa a doença, o gene defeituoso pode ser rastreado pela detecção do RFLP. Por exemplo, se o DNA de 
uma família carregando um gene produtor de doença for examinado por meio da clivagem de restrição e 
da transferência de Southern, algumas vezes é possível encontrar um RFLP consistentemente associado 
ao gene produtor da doença (i. e., há uma ligação forte e são co-herdados). Nesse caso, é possível rastrear 
a herança do DNA produtor da doença em uma família sem o conhecimento da natureza do defeito genético 
ou a sua localização precisa no genoma. (Nota: o polimorfismo pode ser previamente conhecido em 
decorrência de estudo de outras famílias com a doença ou pode demonstrar ser exclusivo na família sob 
investigação.) Segundo, para doenças autossômicas recessivas, a presença de um indivíduo afetado na 
família auxiliaria no diagnóstico. Esse indivíduo apresentaria a mutação em ambos os cromossomos, 
permitindo a identificação do RFLP associado à doença genética. 
b. análise de RFLP 
A presença de genes PAH anormais pode ser demonstrada utilizando-se polimorfismos de DNA como 
marcadores para distinguir entre genes normais e genes mutantes. Por exemplo, a Figura 33.18 mostra o 
padrão típico, ob tido quando o DNA de leucócitos de uma família é clivado com enzima de restrição 
apropriada e submetido à eletroforese. As setas verticais representam os sítios de clivagem para a enzima de restrição utilizada. A presença de 
um sítio de polimorfismo cria um fragmento “b” no autorradiograma (após a hibridização com uma sonda PAH-DNAc marcada), ao passo que a 
ausência desse sítio fornece somente um fragmento “a”. A análise do indivíduo II-2 demonstra que o polimorfismo, conforme evidenciado pela 
presença do fragmento “b”, está associado ao gene mutante. 
Dessa forma, nessa família em particular, o aparecimento do fragmento “b” corresponde à presença de um sítio polimórfico que marca o gene 
PAH anormal. A ausência do fragmento “b” corresponde à presença do gene normal apenas. Na Figura 33.18, o exame do DNAfetal mostra que o 
feto herdou dois genes anormais de seus pais e, por isso, apresenta fenilcetonúria (PKU). 
c. o valor da triagem 
A triagem com base no DNA é útil não somente para determinar se um feto está afetado, mas também para detectar portadores do gene com a 
mutação. A PKU, como muitos outros erros inatos do metabolismo dos aminoácidos, é herdada na forma de traço autossômico recessivo. A 
identificação de heterozigotos pode ajudar no planejamento familiar futuro. 
 
 
8 RAYSSA OLIVEIRA SANTOS - MEDICINA 
 
TRATAMENTO DA PKU 
A maioria das proteínas naturais contém fenilalanina. Por isso, é impossível satisfazer as necessidades proteicas do organismo com uma dieta 
normal sem exceder os limites para a fenilalanina. Portanto, na PKU, a fenilalanina no sangue é mantida próxima aos limites normais utilizando-
se como alimento preparos de aminoácidos sintéticos com baixo conteúdo de fenilalanina, suplementados com alimentos naturais (como frutas, 
vegetais e certos cereais) seleciona dos por seu baixo conteúdo de fenilalanina. A quantidade é ajustada de acordo com a tolerância de cada 
indivíduo, medida pelos níveis sanguíneos de fenilalanina. Quanto mais cedo é iniciado o tratamento, mais completamente pode ser prevenido o 
dano neurológico. (Nota: o tratamento deve iniciar entre os primeiros sete a dez dias de vida para prevenir retardo mental.) Uma vez que a 
fenilalanina é um aminoácido essencial, um tratamento excessivamente zeloso, que resulte em níveis séricos de fenilalanina abaixo do normal, 
deve ser evitado, pois isso pode levar a retardo no crescimento e a sintomas neurológicos. 
Nos pacientes com PKU, como a tirosina não pode ser sintetizada a partir da fenilalanina, ela acaba 
se tornando um aminoácido essencial que deve ser fornecido na dieta. Uma descontinuidade na dieta 
com restrição de fenilalanina antes dos oito anos de idade está associada ao baixo desempenho em 
testes de Ql. Pacientes adultos com PKU apresentam deterioração em seus graus de Ql após 
interromperem a dieta (Figura 20.19). A restrição de fenilalanina durante toda a vida é, portanto, 
recomendada. (Nota: indivíduos com PKU são aconselhados a evitar o aspartame, um adoçante 
artificial que contém fenilalanina.) 
 
 
 
9 RAYSSA OLIVEIRA SANTOS - MEDICINA 
PKU MATERNA 
Quando mulheres com PKU que não estão sob dieta com restrição de fenilalanina engravidam, o bebê é afetado pela “síndrome da PKU materna”. 
Os altos níveis séricos de fenilalanina na mãe levam a microcefalia, retardo mental e anormalidades cardíacas congênitas no feto - a 
fenilalanina funciona então como uma substância teratogênica. Algumas dessas respostas do desenvolvimento a níveis altos de fenilalanina 
ocorrem durante os primeiros meses de gestação. Assim, o controle dietético da fenilalanina sanguínea deve iniciar antes da concepção e deve 
ser mantido durante toda a gestação. 
Os alimentos permitidos na alimentação de fenilcetonúricos contêm baixos teores de PHE (zero a 20mg PHE/100g de alimento); aqueles proibidos 
exibem alto teor de PHE (>200mg PHE/100g de alimento); e os com médio teor de PHE (10a 200mg PHE/100g do alimento) devem ser consumidos 
com cautela.(21) Segundo o guia dietético do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para PKU, os alimentos são classificados em grupos 
verde, amarelo e vermelho para aqueles permitidos, intermediários (alimentos com médio teor de PHE) e proibidos a pacientes com PKU, 
respectivamente(35) (Quadro 3). 
 
Apesar de altos níveis de PHE, o leite materno pode ser utilizado na alimentação de lactentes com PKU, ou seja, a PKU não contraindica o 
aleitamento materno. Dois estudos investigaram os efeitos do aleitamento materno no desenvolvimento de crianças com PKU. Um deles, realizado 
com 39 lactentes com PKU, com até 6 meses de idade, referiu que as crianças em uso de aleitamento materno apresentaram ingestão adequada 
de PHE e tirosina, além de maior adequação de ingestão proteica e energética. O outro avaliou dez lactentes com PKU em tratamento inicial com 
fórmula láctea, seguida do AM em demanda livre, em todas as mamadas. As mães foram orientadas da necessidade de controle rigoroso dos 
níveis de PHE em seus bebês com PKU, por meio de exames sanguíneos frequentes para prevenir efeitos deletérios para o sistema nervoso 
central e os reflexos deste no desenvolvimento infantil. Dos lactentes, 80% conseguiram manter limites seguros de PHE e desenvolvimento nos 
índices normais. O tempo de amamentação variou de 1 mês e 5 dias a 14 meses. Este estudo evidenciou a viabilidade da continuidade do 
aleitamento materno no tratamento de crianças com PKU, desde que os níveis de PHE sejam rigorosamente controlados. 
Pacientes com PKU podem apresentar deficiência de cálcio como resultado da ingestão inadequada de alimentos fonte de cálcio e pela baixa 
disponibilidade deste nutriente proporcionada pela dieta. O cálcio está associado à formação óssea, sendo relevante compreender a necessidade 
de sua suplementação em fenilcetonúricos, a fim de favorecer o desenvolvimento ósseo esperado.

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