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Capitalismo, Marxismo e Crise

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CAPITALISMO E MARXISMO 
 
As relações sociais entre os homens no capitalismo são reguladas pelo 
valor de troca antes do que pelo valor de uso das mercadorias e serviços que 
eles produzem. Em síntese, as necessidades humanas encontram-se na 
dependência direta do poder de compra das pessoas no mercado. 
A satisfação das necessidades humanas apresenta-se como resultado 
secundário da produção e do lucro mediado pelo sistema de trocas. É o capital 
e os bens, não o homem e a vida, que se encontram no centro da atividade 
econômica no sistema capitalista. 
O processo de desenvolvimento do capitalismo acirra a dupla 
contradição presente na sua base de reprodução. Primeiramente, a contradição 
estabelecida entre a crescente produtividade do trabalho social, por um lado, e 
seu o uso repressivo e destrutivo, por outro. Em segundo lugar, a contradição 
estabelecida entre o caráter social da produção e a apropriação privada dos 
excedentes. 
O capitalismo somente pode resolver essa contradição temporariamente, 
de forma a aumentar o seu caráter repressivo e destrutivo por meio do 
desperdício, do luxo e da destruição das forças produtivas. A corrida 
competitiva pelo armamento, pela produção e pelo lucro proporcionam um 
elevado grau de concentração do poder econômico - via 
centralização/concentração oligopolista e financeira do capital. A expansão 
econômica agressiva para o exterior, os conflitos regionais criados e/ou 
incentivados e as disputas por 
 
 Organização de trabalhadores alemães emigrados e sediada em 
Londres. 
Influência continental entre os países de capitalismo central, tendem a 
formar ciclos recorrentes de dependência, de guerras e de depressões. 
 Segundo Marx, o ciclo de reprodução do capital carrega a possibilidade 
histórica de ser interrompido pelo mundo do trabalho em aliança com outros 
setores populares. Isto porque as classes do mundo do trabalho suportam o 
 
 
 
peso da exploração econômica, o que as tende de levar à perspectiva da 
transformação social, de forma a assumir o controle do aparato produtivo e a 
desencadear a superação das contradições básicas do sistema capitalista de 
produção. Por um lado, liquidando com o sistema social de produção, mas de 
controle e apropriação privados e, por outro, libertar o desenvolvimento das 
forças produtivas e estabelecer a integração entre o desenvolvimento das 
forças produtivas e as necessidades humanas. 
 
Capitalismo e Crise 
 
Marx e os intelectuais críticos do capitalismo que se referenciam no 
marxismo clássico concebem o ‘fenômeno’ crise em função do capital, tema 
fundamental para a reflexão social e econômica no âmbito do capitalismo. 
Portanto, em termos do marxismo clássico, a abordagem do fenômeno crise 
deve partir, necessariamente, da negatividade constitutiva do capital. 
O capital constitui o fundamento do processo da reiteração e expansão 
das suas próprias condições de existência. Cumprida a etapa da acumulação 
primitiva de capital, o capital se materializa nos meios de produção que se 
coloca à frente da força de trabalho como algo estranho e com poder de obrigá-
lo a produzir; e na própria força de trabalho, adquirida pelo capitalista no 
mercado e integrada ao capital como capital variável. Enquanto materialização 
da riqueza social e enquanto proprietário das faculdades do produtor, o capital 
constitui-se, em um determinado sentido, no ‘sujeito’ que transforma a 
produção e a circulação das mercadorias em meios para a sua reprodução 
expansiva. Assim, todas as formas econômicas, das atividades econômicas em 
sentido restrito às formas de organização (tecnológica e organizacional) do 
trabalho, são simples mediadoras da referida expansão (Coggiola (Coord.), 
1996, p. 291-302). 
O movimento do capital engendra uma contradição. Para recriar o 
fundamento da sua valorização o capital necessita, concomitantemente, de 
criar e subordinar a força de trabalho e encontrá-la como seu oposto no 
 
 
 
mercado e no processo de produção. Dessa forma, reduzindo o trabalho à 
condição de mercadoria poderá absorvê-lo como capital variável. 
Por outro lado, a partir desta transformação o capital busca valorizar-se 
crescentemente, o que leva ao progressivo predomínio do capital constante em 
relação ao capital variável. Dito de outra forma, o domínio do trabalho vivo pelo 
morto (capital), com o progressivo predomínio do capital constante em relação 
ao capital variável (como uma tendência à negação do trabalho vivo pelo 
morto), constitui-se na manifestação da contradição, visto que é o trabalho a 
fonte do valor e, portanto, do próprio capital. 
No plano das relações econômicas este ‘sujeito’ se expressa por meio 
dos capitalistas individualmente e enquanto grupo social. Cada capitalista em 
particular deve se confrontar com o trabalhador para que possa obter a mais-
valia (fundamento oculto do capitalismo, ao mesmo tempo sua força propulsora 
e fonte da sua reprodução expansiva). Neste sentido, aumentar a duração e a 
intensidade do trabalho e, acima de tudo, a sua produtividade é a garantia da 
sua extração (e, possivelmente, expansão). O capitalista deve se confrontar 
também com os demais capitalistas para preservar suas taxas de lucratividade 
e assegurar mercados. Para tanto, ele deve necessariamente baixar os seus 
custos de produção. 
Como ‘sujeito’ da autovalorização, que confronta consigo mesmo e com 
a sua negação, o capital subordina a produção e a circulação de mercadorias 
como fases do processo pelo qual ele se acumula e reproduz. Fases estas que, 
se reproduzindo sob uma relativa autonomização e sob o impulso desmedido 
de autovalorização, não se determinam pelo consumo e necessidades sociais. 
A economia capitalista, apoiada na sua intrínseca anarquia em termos 
da produção, da circulação e da produção/circulação, concorre para crises 
recorrentes (Marx, 1984, v. I, p. 26). 
O fato da determinação do que, como e quando produzir residir no 
âmbito de cada unidade de produção e destas competirem entre si, inviabiliza 
processos de crescimento equilibrado entre e inter departamentos e setores 
econômicos. Indicadores de mercado como preços, custos e juros, que sob 
certas condições estimulam a expansão mais ou menos rápida da acumulação, 
 
 
 
não podem revelar barreiras como os limites de demanda ou de insumos 
básicos no mercado. Dessa forma, normalmente a uma fase de expansão 
sucede uma fase de desaceleração da expansão, que pode ser um decréscimo 
de ritmo da expansão, uma recessão, ou ainda uma depressão, condicionada 
pelo grau da intensidade da fase expansiva precedente, pelos desequilíbrios 
estruturais, pela mobilidade do Estado enquanto agente produtivo, pelas 
formas assumidas pela luta de classes, entre outras variantes. 
Na esfera da circulação do capital, a crise aparece de modo privilegiado 
como paralisia 
Do movimento de compras e vendas entre os departamentos 
econômicos. Os departamentos econômicos, que idealmente precisam produzir 
conforme as necessidades um do outro, de fato determinam sua produção de 
acordo com o impulso de valorização dos seus próprios capitais; visam seus 
lucros, sem considerar ex ante que o mesmo tem que se realizar por meio da 
venda do seu produto aos outros departamentos econômicos (Singer, 1989, p. 
17-20). 
Na fase de expansão, o sistema dispõe de reservas da fase precedente 
de desaceleração como excedente de mão-de-obra, capacidade produtiva 
ociosa, matéria-prima estocada, terra improdutiva, às quais se agrega a 
‘poupança’ pública e privada como pedra de toque da retomada da expansão. 
A nova expansão pode ter início a partir de setores produtivos que possuem 
grande repercussão na estrutura de reprodução material da sociedade. A 
indústria da construçãocivil, por exemplo, capaz de provocar, por meio da sua 
rápida expansão, uma demanda importante para o Departamento I, como 
canos, máquinas, cimento, vidros, azulejos etc; para o Departamento II, como 
tecidos e alimentos, decorrentes do maior volume de emprego e, 
possivelmente, de salários dos trabalhadores empregados neste setor; e para o 
Departamento III, como eletrodomésticos, carros etc, consumidos por 
capitalistas, gestores intermediários da produção e trabalhadores em geral. 
Uma onda de expansão iniciada em alguns setores tende, por um efeito 
cascata, a estender-se sobre todos os demais setores e departamentos 
econômicos. 
 
 
 
Quando as reservas precedentes à fase de expansão esgotam-se, 
quando uma expansão reiterativa da produção dá lugar à acumulação real, os 
problemas começam a ser gerados. Os capitais, procurando os investimentos 
de retorno maior, mais rápido e mais seguro, tendem a se concentrar em 
determinados setores e ramos de atividades, em detrimento de outros. 
‘Gargalos’ gerados em setores e ramos de atividades que exigem 
investimentos de grande monta e de retorno a longo prazo (como as atividades 
do Departamento I) podem não mobilizar os capitais necessários para a sua 
expansão. 
A mobilização dos capitais pode não ser o bastante para conter a 
interrupção precoce de uma fase de expansão real, visto que o tempo de 
ampliação e/ou montagem de novas unidades produtivas, especialmente em se 
tratando do Departamento I, é sempre de médio a longo prazo. A escassez e 
elevação de preços decorrentes podem transformar seus produtos em 
mercadorias proibitivas a diversas empresas, desencadear falências, elevar 
custos gerais de toda a estrutura produtiva, provocar ciclos de inflação e 
retomar as grandes taxas de desemprego. 
A mobilização e adequado investimento da poupança social em 
atividades do 
Departamento I, materializada em uma satisfatória ampliação da sua 
produção, pode acarretar uma carência de recursos nos Departamentos II e III, 
formadores da sua demanda. Além disso, a sua própria acumulação e dos seus 
agentes financeiros pode ser comprimida pela pressão de custos que exerce 
sobre os demais. De uma forma, ou de outra, a crise e os seus sintomas 
tendem a reaparecer. Em outras palavras, em uma economia de mercado a 
cada ‘gargalo’ superado em um dado período outros se formam. 
Na esfera da produção mais ampla (que engloba como etapas a da 
circulação e a da produção imediata de mercadorias pelo capital), a crise 
econômica capitalista se expressa de forma mais completa e complexa. É 
nesta esfera que a negação do trabalho vivo pelo morto (capital) se manifesta 
na tendência ao crescimento proporcional do valor do capital constante em 
 
 
 
relação ao capital variável, levando à queda da taxa média de lucro mesmo 
com um possível aumento da taxa de mais-valia. 
Para conservar/ampliar a taxa de mais-valia extraída e conservar/baixar 
custos de produção, o capitalista recorre ao aumento de capital fixo. O 
crescimento do capital fixo em relação ao trabalho - tecnologização da 
produção - é o principal meio para aumentar a produtividade do trabalho, e o 
crescimento do capital fixo em relação ao produto - a capitalização da produção 
- é o principal meio para reduzir os custos unitários de produção. 
O crescimento do capital fixo por produto unitário é o elemento mais 
importante para se obter economias de escala. As empresas sob economias de 
escala viabilizam o crescimento do volume de matérias-primas processadas 
por trabalhador. Como resultado, tanto as matérias-primas como a produção de 
mercadorias tendem a aumentar por unidade de trabalho. Concomitantemente, 
o maior volume de capital fixo por produto unitário implica maior despesa de 
depreciação do referido capital e maiores custos de materiais auxiliares 
(eletricidade, combustível, instalações prediais etc) por produto unitário. 
Conforme indicou Bottomore, 
 
(...) para métodos mais avançados, a maior capitalização (capital 
adiantado por produto unitário) implica maiores custos unitários não relativos a 
trabalho (capital constante unitário C), enquanto a maior produtividade implica 
menores custos unitários com o trabalho (capital variável unitário V). No salto, o 
custo unitário de produção C+V deve declinar, de modo que o último deve mais 
do que compensar o primeiro. Sob condições 
 
Trabalhado por Marx) em Departamento II, produtor de bens de 
consumo corrente e Departamento III, produtor de bens de consumo duráveis. 
Adotaremos o esquema desenvolvido por Kalecki. 
Técnicas determinadas, no momento em que os limites do conhecimento 
e da tecnologia existentes forem alcançados, o aumento subsequente no 
investimento por produto unitário provocaria reduções cada vez menores nos 
custos unitários de produção (Bottomore, 1988, p. 372). 
 
 
 
 
A consequência principal desta dinâmica é que os métodos mais 
avançados tendem a proporcionar menor custo unitário de produção em 
detrimento da taxa de lucro (que tende a cair). Ainda que os salários e a 
intensidade e duração da jornada de trabalho se conserve, o aumento da 
composição orgânica do capital (capital constante suplantando crescentemente 
o capital variável na composição do capital) tende a elevar-se mais 
rapidamente do que a taxa de mais-valia, determinando a queda da taxa geral 
de lucro. 
Em que pese todo este quadro, a concorrência capitalista empurra os 
capitalistas a adotarem a capitalização (ou tecnologização) da produção. 
Aqueles que primeiramente adotam os ‘novos’ métodos de capital mais 
intensivo, ao reduzir custos podem reduzir também seus preços abocanhando 
parte do mercado junto aos seus concorrentes. Podem também manter por um 
determinado período uma acumulação relativamente elevada para os padrões 
gerais da ‘nova’ realidade da acumulação. Aqueles capitalistas que lhes 
seguem na aplicação dos referidos métodos não dispõe desta acumulação 
relativamente elevada, visto que se recoloca uma nova guerra de preços, 
reduzindo a acumulação. Aqueles capitalistas que não conseguem aplicar os 
novos métodos vão à falência ou restringem-se a um papel econômico 
periférico e quase tão-somente reiterativo. 
Para o capitalista individual que primeiramente adota estes métodos de 
capital intensivo, o menor custo unitário obtido permite reduzir preços e 
expandir-se a expensas de seus concorrentes, compensando sua menor taxa 
de lucro (por unidade produzida), por meio de uma fatia maior do mercado. 
Aqueles que adotam os referidos métodos tardiamente e/ou estão sujeitos a 
pressões financeiras, estão sujeitos, ao mesmo tampouco, a uma taxa de lucro 
ainda menor e a uma acumulação igualmente menor no conjunto do ciclo 
econômico. 
No sistema como um todo, o resultado é a queda da taxa média de 
lucro. Este resultado determina um desestímulo crescente à acumulação, ou 
 
 
 
seja, da realização de novos investimentos, tendo em vista a 
manutenção/ampliação da massa de lucros. 
A estagnação da massa total de lucro, enquanto uma ‘onda longa’ no 
sistema, tende a conduzir, em um certo momento, a uma crise geral do 
sistema. Conforma-se, portanto, a tendência secular de queda da taxa média 
de lucro (processo ao longo do qual ‘ondas longas’ de crise e de acumulação 
necessariamente ocorrem). 
A tendência de queda da taxa média de lucro convive com contra 
tendências neutralizadoras (Coggiola (Coord.), 1996, p. 194-195; Bottomore, 
1988, p. 371-373; Sweezy, 1976, p. 125-128). A contenção salarial; a 
intensificação do processo de exploração da força de trabalho; a eliminação de 
conquistas trabalhistas; a recriação de formas de exploração e dominação 
extra econômica (escravidão, servidão, etc); a geração de capital constante 
maisbarato por meio de uma determinada tecnologia disponível; a migração de 
empresas para espaços socioeconômicos e territoriais com força de trabalho e 
recursos naturais mais baratos; o desenvolvimento de novos métodos de 
gestão da produção que alcançam maior racionalização da produção e 
intensidade do trabalho; a terceirização de fases da atividade produtiva 
barateando custos de serviços e produtos; a importação de bens de consumo 
para assalariados e meios de produção mais baratos; o desenvolvimento de 
indústrias complementares nas quais a composição orgânica de capital fosse 
relativamente baixa, entre outros processos, podem contribuir para a elevação 
da taxa de lucro, aumentando a taxa de exploração e/ou baixando a 
composição orgânica do capital. Tais processos são tão importantes para o 
capitalista individual como para o sistema como um todo. 
Os referidos processos (entre outros) podem compor um processo mais 
amplo, qual seja, a reestruturação produtiva. Enquanto tal será, 
necessariamente, um mecanismo voltado para assegurar, de um lado, o 
avanço das forças produtivas, e, de outro, a re-subordinação do trabalho ao 
capital com novos métodos organizativos/administrativos que esvaziem o 
potencial de resistência dos trabalhadores. 
 
 
 
A reconstituição e/ou ampliação do exército industrial de reserva nos 
quadros da crise possui uma importância particular enquanto uma contra 
tendência à tendência de queda da taxa média de lucro. A perda de estímulo 
para novos investimentos e a destruição de forças produtivas (falências, 
concordatas, desvalorização e/ou destruição dos excedentes etc) provocados 
pela crise, proporciona um ambiente extremamente favorável para a diminuição 
dos salários e para a queda das condições de trabalho graças à super-oferta 
da força de trabalho. Tal processo diminui o custo do trabalho no âmbito dos 
custos da produção e é um importante fator de ampliação das taxas de 
extração de mais-valia. 
Destacamos também enquanto contra-tendência à tendência de queda 
da taxa média de lucro o papel que o Estado passa a cumprir a partir da crise 
de 1929. A conversão do fundo público em fundo de financiamento da 
acumulação, a possibilidade de mobilizar capitais especulativos e canalizá-los 
para a produção, por meio da emissão de títulos, a transformação do Estado 
em agente produtivo que pode determinar sob certas conjunturas o perfil da 
conjuntura ou período econômico e/ou abrir mão dos seus ganhos em benefício 
da iniciativa privada, o desenvolvimento de pesquisas tecnológicas e científicas 
para o capital, a condição de grande comprador e impulsionador/contratador de 
obras públicas, entre outras condições e atribuições, edifica o Estado como 
uma instituição anti-crise e de contra tendência à queda da taxa média de 
lucro. 
É necessário reconhecermos, ainda, que a crise, enquanto realidade do 
sistema capitalista e independentemente de ser mais ou menos destrutiva, será 
parte constitutiva do processo de concentração e centralização de capitais 
(Coggiola (Coord.), 1996, p. 303-315). O referido processo, em termos 
econômicos globais de cada país (não de cada empresa enquanto unidade 
produtiva), apresenta uma fase em que predomina a concentração e outra em 
que predomina a centralização de capitais. Na fase da concentração de 
capitais - precedida por uma fase de centralização de capitais e desencadeada 
por uma nova etapa de competição oligopolista e monopolista e/ou pela 
atuação de governos por meio da manipulação de políticas econômicas - as 
 
 
 
reservas de capitais acumulados por parte das empresas e presentes na órbita 
financeira são aplicados na ampliação quantitativa e/ou qualitativa das 
empresas, verticalizando e/ou horizontalizando os espaços de atuação dos 
seus capitais. Nesta fase, o crescimento das despesas ocorre passo a passo 
com o aumento das receitas. 
A rigidez relativa entre a estrutura de custos e o nível das receitas 
determina uma instabilidade para as empresas que necessitam contar com 
provisão financeira - com exceção dos oligopólios e uma parte dos monopólios, 
a maioria das empresas necessitam da referida provisão, obtida junto ao 
sistema financeiro. As empresas não monopolistas ou monopolistas sem 
suporte de autofinanciamento somente dispõem de duas alternativas: ingressar 
na fase da concentração de capitais (sob pena de reduzir suas receitas em 
relação às demais empresas) ou amargar uma gradual marginalização no 
mercado. 
Desencadeado o processo, conforma-se a tendência à homogeneização 
das taxas de retorno imposto pelos oligopólios e monopólios, com grandes 
consequências econômicas. As empresas que não efetuam despesas, embora 
com taxas de retorno superiores à taxas de retorno média imposto pelos 
oligopólios e monopólios possuem receitas infinitamente inferiores. Aquelas 
empresas monopolistas ou não que recorreram intensamente aos empréstimos 
junto ao sistema financeiro também apresentam uma receita inferior aos 
oligopólios e monopólios que se autofinanciaram. No curso do processo da 
concentração de capital - no qual ocorre a reprodução ampliada do capital, ou 
seja, expansão que ultrapassa a pura e simples reiteração econômica - o 
impacto desencadeado pela nova taxa de retorno e os custos financeiros de 
muitas empresas será a falência e consequente incorporação daquelas 
despreparadas para a competição nos termos ditados pelas maiores e mais 
capitalizadas. Em consequência, diminui o número de empresas e intensifica o 
controle dos oligopólios e monopólios sobre o mercado. 
Consumado o processo tem início novamente a fase de centralização de 
capitais, ou 
 
 
 
Seja, de capital líquido na forma de lucros das empresas diretamente 
produtivas que ampliam suas receitas - oligopólios e monopólios - ou empresas 
financeiras que partilham dos lucros das empresas que recorrem a 
financiamentos - bancos, bolsas de valores etc. A nova massa de capitais não 
diretamente aplicado, ou reserva de poupança, começa a ser recomposto 
preparando as condições para uma nova fase de concentração de capitais. 
A crise, independentemente da sua extensão e natureza, cumpre 
sempre um importante papel na reprodução ampliada do capital, qual seja, o de 
destruir para construir em novas bases. A crise (incompatibilidade entre 
produção e consumo; interrupção do fluxo de compras e vendas ou de 
pagamentos; desproporcionalidade e desequilíbrio entre os departamentos 
econômicos em que se divide o capital social; queda da taxa média de lucro; 
sobre-a cumulação; desvalorização do capital existente e contradições 
inerentes à dinâmica de concentração e centralização de capitais) será, 
portanto, fruto da contradição constitutiva do capital. 
As crises não levam a um colapso econômico final capaz de destruir 
completamente e de uma só vez o sistema. Para Marx, o fim das crises 
somente pode advir do trabalhador, que tomando consciência de si mesmo e 
das relações sociais que o envolvem, edifica-se como o sujeito real e 
verdadeiro da produção (dominando o sujeito abstrato, representado pelo 
capital). O capitalismo, cuja essência é a (relação de) contradição inscrita na 
sua própria origem, desaparece com a eliminação da referida contradição; o 
que equivale reconhecer que a crise no capitalismo somente seria superada 
por meio da superação do próprio sistema. 
A concepção de crise em Marx, conforme identificamos, não pode ser 
separada da dinâmica do capital e, nem tampouco, a superação definitiva da 
crise no capitalismo fora da superação do próprio capitalismo. Neste ponto 
reside a unidade dialética da concepção marxista acerca do capital e da crise. 
As teorias que se encontram foram desta concepção (incluindo aquelas que se 
reivindicam da teoria econômica de Marx), de forma explícita ou não, 
conformam-se enquanto teorias (ou metodologias) para o capital. 
 
 
 
Em nossa perspectiva, cadaprocesso de crise no capitalismo compõe 
uma teia específica de articulação destes elementos `estruturais´ identificados 
por Marx. A crise, portanto, deve ser compreendida enquanto crise das 
relações capitalistas de produção e que, como tal, pode encontrar, como 
obstáculos conjunturais à sua reprodução, realidades econômico-sociais e/ou 
institucionais. 
Os obstáculos à reprodução capitalista poderão inviabilizar ou imprimir 
um curso particular ao desenvolvimento capitalista. A forma e o sentido da 
superação destes obstáculos serão, necessariamente, uma consequência da 
interferência das classes, movimentos, grupos sociais e partidos políticos, em 
uma dada conjuntura nacional e internacional e sob uma determinada 
correlação de forças, em nível das superestruturas sociais. 
Postas estas considerações gerais, é necessário que superemos alguns 
equívocos quanto ao entendimento do conceito crise no sistema capitalista. 
Primeiramente, é necessário que se compreenda que a crise não é algo 
anormal ao sistema capitalista. Ela compõe a essência do referido sistema e é 
necessária à sua própria reprodução. 
Em segundo lugar, compreender que cada crise possui a sua 
especificidade. Uma crise poderá ser induzida ou não pelo poder público, como 
também ser mais ou menos duradoura. 
Em terceiro lugar, devemos distinguir as crises em função do grau e 
profundidade da sua repercussão. Neste sentido, as crises podem ser de 
repercussões mais imediatas e de curto prazo, que decorrem de flutuação dos 
indicadores econômicos e da reacomodarão produtiva das atividades 
econômicas; de repercussão mais ampla, que podem findar/criar novos ciclos 
expansivos no âmbito de um padrão de acumulação e financiamento; e, 
finalmente, de repercussão muito ampla, que caracterizam o esgotamento de 
um padrão de acumulação e financiamento capitalista. 
Em quarto lugar, devemos reconhecer que a crise no capitalismo não 
possui causalidades puramente econômicas e que estas podem não se 
encontrar entre os fatores mais importantes na deflagração de uma crise 
econômica. O que implica orientarmo-nos por uma perspectiva de totalidade, 
 
 
 
ou seja, localizar fatores sociais, políticos, econômicos e ideológicos que 
concorram para uma crise, bem como hierarquizá-los segundo a sua 
importância na conjuntura. 
Em quinto lugar, a crise provoca, inexoravelmente, uma estagnação ou 
acumulação restrita de capital em termos econômicos globais. Comumente 
ocorre, paralelamente a este processo, a transferência de mais-valia e rendas 
para os grupos monopolísticos e oligopolísticos assegurando-lhes elevadíssima 
acumulação. 
Em sexto lugar, uma crise econômica pode estar criando condições 
sociais, políticas, econômicas e ideológicas para uma nova fase de 
acumulação do capital. Neste sentido, a destruição desencadeada pela crise 
pode ser um pressuposto para uma nova construção (ou expansão das 
relações capitalistas de produção). 
 
Capitalismo e Experiências ‘Pós-Revolucionárias 
 
As contradições emergidas do capitalismo e indicadas por Marx dão 
conta de evoluir 
Para processos revolucionários no século XIX e, principalmente, no 
século XX. Alguns destes processos são derrotados, a exemplo da Comuna de 
Paris de 1871, outros nos legam as experiências ‘pós-revolucionárias’, a 
exemplo do leste da Europa e da China. 
As experiências ‘pós-revolucionários’ denominadas ‘socialismos reais’ 
não logram realizar a utopia socialista. O burocratismo, as relações autoritárias 
de poder, a corrida armamentista, o desequilíbrio do desenvolvimento do 
processo produtivo, o atraso técnico científico comparado aos centros 
dominantes do capitalismo, são demonstrações inequívocas da deturpação e 
desvirtuamento das sociedades ‘pós-revolucionárias’. 
E trivial - senão conservador - fixarmos apenas nas condições objetivas 
para explicar os ‘desvios’ e ‘insuficiências’ dos processos de construção do 
socialismo nas sociedades ‘pós revolucionárias’. É necessário salientarmos a 
distância estabelecida entre essas experiências históricas e a utopia socialista, 
 
 
 
especialmente a violentarão das práxis da transformação social pela ação das 
vanguardas políticas. Em outra palavra, é menos importante compreender a 
superioridade Tecnos-científica dos centros imperialistas quando comparado 
com a identificação dos obstáculos que as estruturas de poder construídas nas 
experiências ‘pós revolucionárias’ acarretam no sentido da incompetência, 
acomodamento, desilusão e desperdícios, tendo em vista a compreensão da 
crise das referidas experiências. 
A transição do capitalismo para o socialismo somente poderá assegurar 
a superação da propriedade e do controle privado dos meios de produção se 
tal processo encontrar-se integrados coerentemente com o caráter social da 
produção e basear-se em uma hegemonia do mundo do trabalho. A 
contradição dialética entre a intervenção direta do mundo do trabalho (expresso 
no conceito ‘controle social da produção’) e os centros de poder externo ao 
mundo do trabalho (expresso na nova estrutura de poder construída) deve ser 
superado pela gestão direta da produção já nos primeiros ‘momentos’ da 
transição para o socialismo. Dessa forma, poderá ser possível libertar e 
harmonizar o desenvolvimento das forças produtivas com as necessidades da 
sociedade humana. Nada disto ocorre nas sociedades ‘pós-revolucionárias’ do 
século XX. 
A práxis política de transformação social deve superar qualquer prática 
política sectária e golpista, de forma a orientar-se pela ética e pela autonomia 
do movimento. O sentido estratégico das práxis pode significar a realização da 
utopia socialista ou a sua negação, a transição para o socialismo ou a crise de 
definição e de perspectivas em sociedades ‘pós revolucionárias’. 
 
Capitalismo e Conflito social 
 
O papel transformador do mundo do trabalho e a transição para o 
socialismo sofrem uma crise para algumas análises marxistas sobre 
sociedades capitalistas de intermediário e de elevado grau de desenvolvimento 
das forças produtivas. Para situarmos o debate necessitamos identificar alguns 
aspectos da sociedade capitalista do final do século XIX e do século XX. 
 
 
 
Marx previa um conteúdo revolucionário e permanente do capitalismo no 
plano do desenvolvimento das suas forças produtivas. Para Marx, o capitalismo 
removeria a camisa-de-força sob a qual as forças produtivas encontraram-se 
submetidas nas sociedades pré-capitalistas e as conduziria de tal forma que as 
contradições, no que concerne às relações capitalistas de produção, 
estabeleceriam um período revolucionário de transição para o socialismo. A 
tendência de proletarização crescente de amplas camadas da sociedade e a 
internacionalização do espaço e política revolucionária haveriam de se 
constituir em uma consequência dialética do processo. 
Essas previsões de Marx não se confirmam plenamente. No seu 
processo de desenvolvimento o capitalismo mundaniza-se definitivamente, 
estende os seus tentáculos sobre todas as esferas da vida social e alcança o 
estágio de capitalismo monopolista de Estado. Mas nesse processo (e como 
reação a estratégia socialista) produz-se um conjunto de iniciativas e 
instrumentos no sentido de garrotear a contradição fundamental capital versus 
trabalho, de forma a buscar a subordinação do desenvolvimento das forças 
produtivas às relações capitalistas de produção. 
No plano técnico e científico o desenvolvimento das forças produtivas 
encontra-se deprimidas por que estão vinculadas necessariamente ao 
desperdício e ao luxo elevado e irrestrito. Grandes somas de excedentes são 
transferidas para financiar e manter a indústria da guerra; indústrias 
locomotivas do sistema, como a de automotores, produtoras de veículos de 
luxo e de decrescente duração, secundarizam a produção de meios de trabalho 
produtivo e de transporte de massa; informáticae eletrônica, sob os limites das 
relações capitalistas de produção, canalizam-se muito mais para área de 
distribuição, serviços e pesquisas, do que para os processos de produção 
propriamente ditos, e assim por diante. 
A sociedade norte-americana, locomotiva do capitalismo e paraíso do 
‘modus vivendi’ burguês ocidental é paradigmática. Os elevados graus de 
desenvolvimento das suas forças produtivas expressam esse conteúdo 
repressivo e destrutivo, por meio do luxo e desperdício nacionais, financiados 
graças a um sucateamento do sistema produtivo e pauperização social da 
 
 
 
periferia do mundo capitalista (América latina, África, etc) e pela ‘justificação’ 
social de parcelas da população da própria sociedade norte-americana. O 
‘irracionalismo econômico’ atinge o seu clímax e dramaticidade no próprio 
déficit público anual dos Estados Unidos, no momento superior a um terço da 
dívida externa fixa do chamado ‘terceiro mundo’. 
No plano político o desenvolvimento das forças produtivas encontra-se 
deprimido, primeiramente, pela institucionalização das lutas sociais. As 
reformas eleitorais e trabalhistas conduzidas na Alemanha no final do século 
XIX por Otto von Bismarck e posteriormente exportadas para outros países são 
capazes, respectivamente, de integrar/subordinar a ação política da esquerda 
ao campo institucional e de lançar as bases das progressivas reformas sociais 
e de seguridade social que redundaria mais tarde no Estado do bem-estar 
social. A carência de uma política econômica coerente com estas reformas e a 
necessidade de controlar a instabilidade depressiva e as crises termina por 
proporcionar a teoria keynesiana de regulação econômica. 
A revolução produtivista proporcionada pelos métodos fordista e 
taylorista de gestão produtiva integra estas mudanças institucionais. A divisão 
técnica do trabalho realizado por estes métodos assegura a ampliação da 
produção sem que para tanto tenha que assegurar um trabalhador com ampla 
consistência intelectual e motivado pelo trabalho coletivo. Combinadamente, o 
fordismo, o taylorismo e, a partir das últimas décadas, o toyotismo advoga nos 
países de capitalismo central a produção em massa e consumo em massa, 
nela incluído os trabalhadores. 
Amplia-se progressivamente a partir do final do século XIX as reservas 
sociais e políticas da hegemonia burguesa. O capitalismo encontra um meio de 
integrar, sob determinados limites, as expectativas individuais de consumo e 
conforto das pessoas em geral e dos trabalhadores em particular com a 
necessidade de reprodução material dele mesmo. Este processo, consolidado 
nas décadas de 50 e de 60 na forma dos chamados anos dourados do 
capitalismo, provavelmente teria ocorrido antes não fosse as duas grandes 
guerras mundiais. 
 
 
 
No plano da formação da consciência o desenvolvimento das forças 
produtivas encontra-se reprimido devido a manipulação científica das 
necessidades, dos desejos, das satisfações, dos prazeres. Esta manipulação 
representa um reforço complementar à unificação e integração da sociedade. 
Surgida da combinação entre a mídia eletrônica e a psicologia comportamental 
- manipuladas cientificamente - ela opera em nível da publicidade, da indústria 
da diversão, etc, de forma a gerar o nó górdio entre a superestrutura político 
ideológica e a base do processo produtivo. Esse padrão ‘americanista’ da 
sociedade de trocas, emergido da concepção liberal do trabalho e da reificação 
do mercado, tem funcionado como um importante para-choque das 
contradições e conflitos sociais. 
A razão crítica transformadora, que se apresenta como algo irresistível 
para os marxistas do final século XIX e início do século XX, dá lugar à uma 
razão crítica instrumental, fruto da coisificação humana na sociedade de trocas. 
A perspectiva do desenvolvimento da consciência ‘em si’ para a consciência 
‘para si’ - transformadora e internacionalista - não se realiza na sociedade da 
Revolução de Outubro. Na Europa Ocidental, após as tentativas 
revolucionárias das primeiras décadas, podemos mesmo concluir ter ocorrido 
um refluxo da consciência ‘em si’ para a consciência ‘corporativa’. 
O capitalismo monopolista de Estado - proveniente da fusão das 
instituições e órgãos públicos com os núcleos dirigentes dos monopólios e 
oligopólios - consegue reprimir o desenvolvimento da contradição estabelecida 
entre as forças produtivas e a relação de produção capitalistas por meio da 
combinação entre a planificação econômica e aparelhos públicos e privados de 
hegemonia. A concepção marxista da passagem do capitalismo para o 
socialismo passa a conviver, a partir de então, com abalos emergidos da nova 
configuração do capitalismo. 
Ao construir novas reservas políticas e ideológicas a classe dominante 
não perde de vista o terreno nacional como a base fundamental para a 
realização do seu domínio. Os países de economia central buscam garantir 
índices de bem-estar para parcelas substanciais das suas populações, visando 
promover altos níveis de estabilidade política e o tempo e espaço necessário 
 
 
 
para fortalecer sua hegemonia ideológica. O capital oligopolista e financeiro 
internacional compreende que a coesão interna dos países de capitalismo 
central é fundamental para manutenção do domínio do capital em plano 
mundial. 
Nos países de capitalismo periférico a ‘pauperização progressiva’ é real 
para amplos setores. Contudo, os aparelhos de hegemonia, a militarização do 
Estado, os recursos da política tradicional, as constituições de segmentos 
sociais médios privilegiados, entre outros elementos, constituem-se em 
amortecedores das contradições sociais, isto é, convertem em mecanismos de 
contenção do desenvolvimento da luta de classes na perspectiva da 
transformação social. 
O capitalismo não pode conter ad eterno a contradição fundamental 
estabelecida entre as forças produtivas e as relações de produção. A 
subordinação das forças produtivas às relações de produção pode estar sendo 
abalada por meio da globalização da economia, do acirramento da 
competitividade, da reestruturação produtiva, da desregulamentação 
econômica, da demolição e/ou minimização do Estado do bem-estar social em 
diversos países, da desregulamentação do mercado de trabalho, entre outros 
processos, em curso a partir dos anos 70 na Europa Ocidental e Japão e anos 
80 e 90 do século XX no restante do mundo. As crises econômicas periódicas, 
o acirramento da disputa de hegemonia entre os blocos imperialista, a elevação 
do movimento operário internacional, a luta pela garantia das conquistas 
conduzidas pelo ‘socialismo real’ no leste da Europa, são exemplos de 
processos que expressam luta de classe e que são capazes de proporcionar 
acirramentos da contradição fundamental. 
Em que pese o contexto histórico favorável para o desenvolvimento do 
capitalismo no início do século XXI, não há como não reconhecer que ele sofre 
derrotas importantes. O movimento antiglobalização, a internacionalização da 
luta pelo socialismo, os limites da ação imperialista no mundo muçulmano, etc, 
evidenciam, por um lado, processos históricos que não podem simplesmente 
ser removidos pelo capitalismo e, por outro, as condições básicas e 
fundamentais destes conflitos não possuem solução no seu interior. 
 
 
 
 
O Marxismo Reprimido 
 
A dinâmica de reprodução ampliada do capital e as novas configurações 
sociais, políticas, econômicas e ideológicas do desenvolvimento capitalista 
proporciona um ambiente que pode desencadear a superação de alguns 
conceitos e categorias do marxismo. Na verdade, uma previsão feita pelo 
próprio marxismo. Todavia, a crítica a conceitos e categorias marxistas está 
dando lugar a crítica ao método e a própria práxis política da transformação 
social. 
Os maiores adversários do marxismo emergem, não raramente, por 
dentro dele próprio. O revisionismo de Bernstein,Kautsky ou Mach, que 
buscam criticar o núcleo central das estruturas de análise que compõem o 
método e filosofia, são exemplos desta realidade. Os ideólogos da Teologia da 
Libertação reivindicam o ‘método marxista’ destituído da sua filosofia. Na 
verdade, propõem um retorno à um paraíso perdido: o hegelianismo de 
esquerda. Para os magos da ‘nova esquerda’, o marxismo é superado 
enquanto doutrina e filosofia revolucionária, restando um referencial - junto a 
outros - para interpretação e crítica do capitalismo. O marxismo - como 
momento das práxis revolucionárias -, é dispensado, em função de um 
ecletismo metodológico e humanista neo-idealista. A ala esquerda da 
socialdemocracia (e aliados), questionam para além do método. Conceitos 
universais como: luta de classes, ruptura, revolução, entre outros, para esses 
setores fazem parte do grande sistema mitológico representado pelo ‘marxismo 
revolucionário’. Conforme Lukács, 
 
A função do marxismo ortodoxo - superar o revisionismo e o utopismo - 
não é a liquidação, de uma vez por todas, de falsas tendências, mas sim uma 
luta incessantemente renovada contra a influência corruptora de formas do 
pensamento burguês sobre o pensamento do proletariado. 
Manter o ‘alvo final’ ou a ‘essência’ do proletariado isentos das 
distorções do materialismo vulgar, significa a compreensão da realidade, a 
 
 
 
atividade crítica prática, a superação da dualidade utópica do sujeito e do 
objeto, da teoria e das práxis 
 
Esse quadro emerge de um duplo processo. De um lado, a crise das 
experiências ‘pós-revolucionárias’ expressa, principalmente, por meio das 
burocracias autoritárias, das contradições nacionais e do atraso técnico e 
científico dessas sociedades. De outro lado, pela enorme capacidade 
repressiva desenvolvida pelo capitalismo junto às suas contradições básicas e 
fundamentais. A crise das sociedades ‘pós-revolucionárias’ e os novos 
obstáculos à luta pelo socialismo nos países periféricos e, principalmente, 
centrais do capitalismo, gera uma perplexidade no movimento socialista, de 
forma a expressar concepções revisionistas. Recriadas tendo como referência 
a socialdemocracia européia e desenvolvidas em novas e diversas formas, 
estas concepções estão quase sempre preocupadas com as ‘antinomias do 
marxismo’. 
Os críticos do marxismo ‘ortodoxo’ ampliam a sua influência, 
principalmente por meio da academia. O marxismo universitário desloca o 
centro de reflexão do movimento social e da luta de classes, como determina a 
melhor tradição marxista, para a academia. 
E como tal reivindica a separação da dialética do materialismo; da 
interpretação da realidade da articulação à perspectiva do mundo do trabalho; 
e do mundo do trabalho da transformação social. Esta é sempre o centro da 
ação política, teórica e filosófica de inspiração pequeno-burguesa contra o 
marxismo clássico. Não mais se estabelece uma relação dialética entre sujeito 
e objeto; quem conhece, conhece para si e para a academia e não para a 
classe. O conhecimento reflui para o plano da especulação e da ‘objetividade’ 
científica. 
Em certa medida, o marxismo universitário expressa o próprio processo 
de cooptação ideológica desenvolvido pela hegemonia burguesa, de forma a 
reduzir o marxismo a um método, concepção e teoria especulativa 
 
 
 
 
O marxismo ortodoxo refere-se ao seu método. Implica na convicção 
científica de que com o marxismo dialético encontrou-se o método correto de 
investigação e de que este só pode ser desenvolvido, aperfeiçoado e 
aprofundado no sentido indicado por seus fundadores; mais ainda: implica na 
convicção de que todas as tentativas de ‘superar’ ou ‘melhorar’ este método 
conduziram e necessariamente deveriam fazê-lo – a sua trivializarão, 
transformando-o num ecletismo 
 
A denominada crise do ‘marxismo’ surge da incompreensão, em uma 
perspectiva histórica, da contradição formada entre o desenvolvimento 
crescente das forças produtivas e os obstáculos representados pelas relações 
de produção. Contradição esta relegada pelos novos revisionistas de sempre. 
Marx indica na obra Para a Crítica da Economia Política (1858) as tendências 
econômico-tecnológicas internas ao desenvolvimento capitalista e que 
proporcionariam a sua tendencial dissolução: (Marx, 19.., p...). 
 
A medida que a grande indústria se desenvolve, a criação de riqueza 
real depende menos do tempo de trabalho e da quantidade de trabalho 
empregado e mais da potência dos instrumentos colocados em operação 
durante o tempo de trabalho. Esses instrumentos e a sua poderosa eficácia 
não são proporcionais ao tempo de trabalho imediato requerido pela produção; 
sua eficácia depende antes do nível científico adquirido e do progresso 
tecnológico, ou seja, da aplicação da ciência a produção. – O trabalho humano 
não mais aparece então encerrado no processo de produção; é antes o homem 
que é ligado a esse processo apenas como supervisor e regulador. Ele está 
fora do processo de produção, ao invés de ser o seu agente principal... nessa 
transformação, a base da produção e da riqueza não é mais o trabalho 
imediato realizado pelo homem, nem o seu tempo de trabalho, mas a 
apropriação de sua produtividade universal (poder criador), isto é, de seu 
conhecimento e de seu domínio da natureza através de sua existência social; 
em suma, do desenvolvimento do indivíduo social (das muitas capacidades). O 
furto do tempo de trabalho de um outro homem, sobre o qual se funda ainda 
 
 
 
hoje a riqueza social, aparece então como uma base bastante miserável, em 
comparação com a nova base criada pela grande indústria. Tão logo o trabalho 
humano, em sua forma imediata, deixe de ser a grande fonte de riqueza, o 
tempo de trabalho deixará de ser e de um modo necessário – a medida da 
riqueza; e o valor de troca deixará de ser a medida do valor de uso. O sobre 
trabalho da Massa (da população) cessará de ser a condição para o 
desenvolvimento da riqueza social, e a situação privilegiada de alguns deixará 
de ser a condição para o desenvolvimento das faculdades intelectuais 
universais do homem. Então, cai o modo de produção baseado sobre o valor 
de troca 
 
O colapso do capitalismo em Marx está ligado a tendência de crescente 
automação fruto da enorme centralização/concentração do capital, no qual o 
produtor estaria cada vez mais livre do processo de produção. O produtor 
poderia, desta forma, desenvolver a crítica radical da sociedade capitalista e 
burguesa e construir a consciência de classe ‘em si’ e a consciência de classe 
‘para si’, de forma a compreender o sentido ‘pré-histórico’ da apropriação 
privada dos frutos do trabalho e apreender a necessidade de remover a 
contradição em favor do desenvolvimento humanizado das forças produtivas. A 
modernidade do capitalismo tem evidenciado a tendência, mas 
contraditoriamente, tem desenvolvido instrumentos para reprimi-la. 
Objetivamente, o revisionismo enfraquece o marxismo como teoria da 
crítica radical e priva o próprio método das práxis da perspectiva da 
transformação social. Por não compreender esta dinâmica do processo 
histórico, o resultado tem sido um retorno ao tipo de orientação política que 
majoritariamente grassa no Partido Socialdemocrata Alemão, sob a direção de 
Kautsky e Bernstein. A estratégia gradualista para o socialismo no plano da 
tática política é orientada por uma política institucional-parlamentar, respaldado 
por um movimento sindical reivindicativo-imediatista. Em nível da ciência priva 
o trabalho científico do seu sentido de classe e transformador, de forma a 
reduzir-se a um conhecimento ‘objetivo’. Em outras palavras, reduz o marxismo 
a uma manifestação ‘positivista’ de esquerda. 
 
 
 
Libertar o marxismo do revisionismo ocupa grande importância nas 
práxis voltadas para a transformação social. A exemplo de Lukács e da Escola 
de Frankfurt é necessário quesejamos ‘ortodoxos’ na defesa da sua essência, 
o método. Combinadamente, é necessário desenvolver uma estratégia político-
cultural mediada por uma camada de intelectuais orgânicos de classe, capazes 
de proporcionar a construção de um movimento social amplo e radical o 
bastante para efetuar a crítica ao capitalismo e dirigir a construção da 
consciência de classe ‘em si’ e ‘para si’. Enfim, articular uma intervenção ao 
nível da infra e superestrutura social, informado por uma nova concepção de 
mundo, social-revolucionária, que permita a conformação de um novo bloco 
histórico capaz de remover os obstáculos criados pelo capitalismo para o 
avanço do processo histórico. 
 
Construir a Autonomia do Marxismo 
 
Até a década de 30 do século XX partidos comunistas, a exemplo do 
italiano, exercem uma influência criativa no desenvolvimento do marxismo. O 
marxismo se articula à prática social e deste processo resultam transformações 
que o enriquecem. 
Posteriormente, sob a influência dos conflitos estabelecidos entre a II e a 
III Internacionais e, principalmente, por causa da relação burocrática, autoritária 
e acrítica estabelecida entre a III Internacional e os partidos comunistas e 
destes para com seus militantes, grande parte da atividade teórica marxista 
acaba por se transferir para as universidades e se desvincular da prática 
política. Como consequência emergem novas concepções acerca do marxismo 
e que não raramente divergia do pensamento original de Marx e Engels. 
O desvirtuamento do marxismo encontra a partir de então um campo 
fértil. Isto porque o acadêmico não leva muitas vezes em conta as 
consequências práticas do seu pensamento, de forma a desautorizar um 
aspecto central do marxismo, qual seja, articular criativamente a teoria e a 
prática. O marxismo universitário haveria de enriquecer e, ao mesmo tempo, 
 
 
 
desviar o curso do marxismo. Superar o marxismo universitário é um passo 
importante no sentido do resgate das práxis transformadoras. 
Outra iniciativa importante é libertar o marxismo da camisa de força 
representado pelo leninismo. O conceito ‘leninismo’ não possui um sentido de 
‘universalidade’ na perspectiva de umas práxis transformadoras. Formado no 
período da III Internacional a partir da necessidade de desenvolver uma 
organização partidária para a luta da transformação social em um contexto 
caracterizado por uma profunda repressão política, tal conceito prolonga-se 
para uma determinada concepção da internacional, do Estado soviético e de 
direções partidárias, cujas únicas interpretações válidas passam a ser aquelas 
emergidas da estrutura partidária. 
O ‘marxismo’ enquanto teoria leninista da revolução e amalgamado na 
política do partido perde a sua flexibilidade e autonomia como método de 
análise perante as práticas de partido. Não é casual a crise de elaboração ao 
nível da teoria e filosofia marxista ao longo do período, na medida em que um 
aspecto essencial à teoria crítica, qual seja, a liberdade de interrogação, 
encontra-se condicionado a estrutura orgânica do partido, a sua prática social, 
a sua concepção e o seu programa. 
Libertar o marxismo do leninismo não significa o retorno a um marxismo 
contemplativo. A superação do leninismo poderá proporcionar espaços para a 
reafirmação do método de análise marxista, condição necessária para a 
construção de uma teoria critica superior do capitalismo, para a construção de 
novos instrumentos de luta do mundo do trabalho e para a derrota estratégica 
do social-reformismo. A articulação destas diversas frentes de intervenção 
política do marxismo deve partir da sua própria crítica e convergir no 
reconhecimento da realidade nacional, de forma a identificar o novo estágio do 
capitalismo e suas contradições básicas; apreender a superestrutura vigente, 
em especial os modernos aparelhos privados e públicos de hegemonia; e 
compreender a estrutura de classes e a diversidade de expressões políticas e 
ideológicas que dela emergem. 
O marxismo há de ser ‘militante’. Deve contribuir para o aprofundamento 
da crítica das experiências ‘pós-revolucionárias’ e para a compreensão dos 
 
 
 
processos sociais que reprime o desenvolvimento das forças produtivas, em 
especial a formação da consciência de classe, tendo em vista supera-los. 
Combinadamente, deve buscar contribuir para a construção de referenciais 
gerais para o enfrentamento com capital em sua dimensão global. 
 
 
 DIALÉTICA E HISTÓRIA 
 
Marx, por meio do diálogo crítico com os pensadores que o precedem e 
do compromisso com o mundo do trabalho, confecciona um novo método de 
análise. Método este que proporciona uma nova concepção de homem e de 
sociedade, uma interpretação dialética da história e uma crítica da economia 
política. 
 
 Sociedade e Totalidade em Marx 
 
Identificar o método de análise de Marx nos impõe, de início, expor o seu 
conceito de “sociedade”. Para Marx, a sociedade, articulada por meio de uma 
formação social concreta e específica, seria produto do desenvolvimento 
individual e da ação recíproca dos homens, tenham eles consciência disso ou 
não. Entretanto, não poderiam eleger a formação social em que se encontram 
nem tampouco arbitrar livremente sobre suas forças produtivas. A formação 
social e as forças produtivas seriam o resultado, respectivamente, das lutas 
sociais e da ação sobre a natureza conduzidos por parte dos homens que os 
precederam. 
A sociedade se conformaria em um todo complexo e interdependente, 
sujeita a múltiplas determinações. A um determinado nível do desenvolvimento 
das forças produtivas, corresponderia um determinado desenvolvimento da 
produção, do comércio e do consumo. Um determinado nível do 
desenvolvimento da produção, do comércio e do consumo, corresponderia a 
um determinado desenvolvimento das formas de organização social – 
organização da família, das classes sociais etc. Um determinado nível de 
 
 
 
desenvolvimento das formas de organização social, corresponderia a um 
determinado Estado. Um determinado desenvolvimento das forças produtivas e 
das relações de produção, corresponderia a determinadas expressões 
ideológico-culturais (Marx e Engels, 1952, p. 414-424). 
A sociedade, articulada por meio de uma formação social concreta e 
específica, encontrar-se-ia em constante movimento. Portanto, qualquer 
formação social seria sempre transitória e histórica. 
Este conceito de “sociedade” é uma construção proporcionada pelo 
método dialético e compõe a concepção materialista da história. A 
compreensão das sociedades de classes, por exemplo, não pode ocorrer, 
portanto, abstraindo a gênese da sociedade, o modo como ela é produzida e o 
modo como ela opera em função da sua própria gênese. 
 
 
 
 
 O Método Dialético 
 
Marx busca, em diversas oportunidades, distinguir o método dialético de 
Hegel do seu próprio método dialético. Uma destas oportunidades surge por 
meio do posfácio da segunda edição de O Capital para o alemão (Marx, 1988, 
p. 21-27). 
Para Hegel, segundo Marx, o processo do pensamento, identificado com 
a Ideia (ou Razão Absoluta), transformar-se-ia no sujeito, no demiurgo do real, 
do material; todo o real seria apenas uma materialização externa da Ideia. O 
movimento do real, do material seria, por assim dizer, uma realidade derivada, 
visto que seu fundamento e determinação se daria na Ideia. O homem 
histórico, portanto, seria apenas um instrumento do qual se valeria a Ideia para 
se desenvolver. 
Para Marx, a ideia não pré-existiria ao real, ao material. A ideia seria o 
próprio real transposto e traduzido no pensamento do homem. Marx excluía o 
 
 
 
sublime do existente, do real, contrapondo a dialética mistificada de Hegel à 
dialética calcada no real. 
Essa leitura dialética e materialista da relação entre ideia e real 
determinaria o método de análise de Marx, de modo que este partiria sempreda investigação preliminar do real e do concreto. Não do real e do concreto 
idealizado, como poderia sugerir o termo “população”, quando abstraído das 
suas classes sociais, das relações de produção sobre as quais se apoia etc, 
que, segundo Marx, somente poderia permitir atingir abstrações frágeis e 
progressivamente mais simples. Mas do real e do concreto enquanto uma rica 
totalidade de determinações e diversas relações. (Marx, 1982, p. 14). 
(...) o concreto aparece no pensamento como o processo da síntese, 
como resultado, não como ponto de partida, ainda que seja o ponto de partida 
efetivo e, portanto, o ponto de partida também da intuição e da representação. 
No primeiro método, a representação plena volatiliza-se em determinações 
abstratas, no segundo, as determinações abstratas conduzem à reprodução do 
concreto por meio do pensamento. Por isso é que Hegel caiu na ilusão de 
conceber o real como resultado do pensamento que se sintetiza em si, se 
aprofunda em si, e se move por si mesmo; enquanto que o método que 
consiste em elevar-se do abstrato ao concreto não é senão a maneira de 
proceder do pensamento para se apropriar do concreto, para reproduzi-lo como 
concreto pensado. Mas este não é de modo nenhum o processo da gênese do 
próprio concreto 
Partir do real e do concreto permitiria, segundo Marx, apreender 
dinâmicas e formular conceitos, enquanto expressão de múltiplas 
determinações do real captado e (re) construído no pensamento. Para Marx, 
expressaria “o curso do pensamento abstrato que se eleva do mais simples ao 
complexo” – e que corresponderia, efetivamente, ao próprio processo histórico 
(Marx, 1982, p. 15). Encerrado esse momento retornar-se-ia ao real, mas agora 
enquanto real reconstruído e conhecido. 
O real se apresentaria enquanto um fluxo permanente de movimento e 
de contradição. Movimento e contradição seriam dados objetivos do real, visto 
que emergiriam das próprias bases sobre as quais historicamente se 
 
 
 
configuraria o real. Portanto, independentemente da própria compreensão da 
ideia de movimento e de contradição (ou das representações construídas no 
âmbito do pensamento, tendo em vista expressá-las), elas percorreriam o 
pensamento e a prática do homem. 
Movimento e contradição expressar-se-iam em um período ou etapa 
histórica dominado por um modo de produção. Esse, por sua vez, se 
manifestaria por de formações sociais concretas e específicas. O modo de 
produção, bem como as formações sociais concretas e específicas, seriam 
estruturas sociais historicamente determinadas. 
Marx concebe o real (a sociedade concreta em seu movimento e sob 
contradições) como um processo histórico. Esse real estaria regido por 
dinâmicas históricas. Não dinâmicas gerais, a-históricas que, emergidas de leis 
naturais, regeriam para todo o sempre o real, mas dinâmicas específicas a 
cada período ou etapa histórica e que se expressariam por meio de modos de 
produção e de formações sociais concretas e específicas. Essas dinâmicas 
regeriam o movimento social, por um lado, como um processo, em grande 
medida, independente da vontade, consciência e intenção dos homens; mas, 
por outro, capazes, ao mesmo tempo, de determinar concretamente à vontade, 
a consciência e as intenções dos homens como agentes sociais diferenciados. 
Esgotado historicamente um modo de produção, novas dinâmicas se 
conformariam ao longo do processo de surgimento de um novo modo de 
produção. Assim, por exemplo, as dinâmicas que regulamentariam o comércio, 
a população, as moedas, no mundo medieval ocidental, não poderiam ser 
transpostas para compreender o comércio, a população e a moeda, no mundo 
capitalista ocidental. Categorias que encerram sentidos genéricos, como 
comércio, por exemplo, deveriam, por sua vez, ser investigadas dentro da 
especificidade que assumiriam em cada modo de produção. 
O positivismo, as leis naturais e sociais seriam idênticas. Já para Marx, 
as “leis” ou dinâmicas sociais seriam históricas e transitórias, expressando 
movimentos passíveis de transformação pela ação humana, não possuindo um 
sentido de exatidão matemática, mas de coerência geral determinada pelo todo 
interdependente dos elementos que compõe a sociedade. 
 
 
 
Para Marx, o fundamental na pesquisa científica seria, portanto, 
descobrir as dinâmicas que regeriam e modificariam os fenômenos estudados. 
Dinâmicas que atuariam nas condições e interesses materiais, inclusive no 
âmbito do próprio pensamento. Assim, a crítica do próprio pensamento, ideia, 
cultura, da sociedade moderna, somente poderia surgir do real, do material que 
o determina e não do pensamento refletindo diretamente sobre si mesmo. É da 
sua base material, o real, desvendado pela pesquisa, que o pensamento 
poderia autocriticar-se e desalinhar-se. Assim, o pensamento, a ideia, a cultura, 
em princípio fora de ‘lugar’, poderiam ser colocadas em seus devidos ‘lugares’. 
Marx cuida de distinguir, ainda, o método da pesquisa do método de 
exposição. Para Marx, “a pesquisa tem de captar detalhadamente a matéria, 
analisar as suas várias formas de evolução e rastrear sua conexão íntima. Só 
depois de concluído esse trabalho é que se pode expor adequadamente o 
movimento real” (Marx, 1988, p. 26). 
Marx dá exemplo concreto desta prática científica no estudo da 
economia política. Anteriormente à confecção da obra O Capital, Marx conduz 
estudos amplos e profundos sobre a mercadoria, o valor, a mais-valia, a 
reprodução (simples e ampliada) do capital, o dinheiro, entre outros temas, 
como podemos confirmar nos esquemas de estudo pessoal que tomam a forma 
das obras Para a Crítica da Economia Política e Teorias da Mais-Valia. Elas 
culminam, por meio do método dialético, na apreensão das dinâmicas que 
regem o capitalismo e que podem proporcionar condições sociais capazes de 
modificá-lo. 
A conquista do conhecimento do real e a sua exposição ordenada no 
plano do pensamento, podem criar a ilusão de uma construção a priori, de 
esquemas dedutivos. Mera ilusão, se pensarmos que uma obra, quando 
finalizada, nada mais é do que fruto de intensa pesquisa e exposição articulada 
por meio de uma coerência discursiva interna. 
Marx, conforme observamos, apresenta o seu método dialético dentro de 
uma configuração racional, empírica e materialista. Movimenta suas pesquisas 
do particular para o geral e vice-versa, busca apreender dinâmicas e formular 
conceitos por meio de estudos comparados dos fenômenos sociais, esforça 
 
 
 
para demonstrar a coesão entre o que anda nas ‘cabeças’ e as bases materiais 
sobre as quais se localizam os ‘pés’ e coloca a temporalidade dos fenômenos 
sociais no centro do seu pensamento. 
 
 A Concepção Materialista da História 
 
Os debates sobre a destruição furtiva e o parcelamento da propriedade 
do solo, em curso na Província Renana, desperta em Marx uma preocupação 
com os chamados “interesses materiais” (Marx e Engels, 1983, Volume 1, p. 
300 e 301). O recolhimento de lenha por parte de um camponês em uma 
propriedade, considerada furto pela Dieta Renana, conduz Marx à tomada de 
consciência de que o direito protegia a propriedade. Esse processo ocorre na 
sua experiência como redator da Gazeta Renana, entre os anos de 1842-43. 
Em 1844, por meio dos Anais Franco-Alemães, as investigações 
desembocam na conclusão “(...) de que tanto as relações jurídicas como as 
formas de Estado não podem ser compreendidas por si mesmas nem pela 
chamada evolução geral do espírito humano (...)”. Segundo Marx, elas “(...) se 
baseiam, pelo contrário, nas condições materiais de vida (...)”. Ainda segundo 
Marx, “(...) a anatomia da sociedade civil precisa ser procurada na economia 
política” (Marx e Engels, 1983, Volume 1, p. 301). 
A continuidadedos seus estudos permite a Marx concluir que “(...) na 
produção social da sua vida, os homens contraem determinadas relações 
necessárias e independentes da sua vontade, relações de produção que 
correspondem a uma determinada fase de desenvolvimento das suas forças 
produtivas materiais” (Marx e Engels, 1983, Volume 1, p. 301). 
As relações de produção seriam as relações concretas que os homens 
estabeleceriam em uma determinada sociedade, tendo em vista a produção e 
reprodução dos indivíduos, das classes sociais e da sociedade. As relações de 
produção se expressariam na forma de propriedade, na forma de produção e 
distribuição dos excedentes sociais e na forma de organização das relações de 
trabalho entre as classes sociais. As relações de produção condicionariam 
profundamente as relações sociais em geral. 
 
 
 
As relações de produção encontrar-se-iam correlacionadas no seu 
desenvolvimento com as forças produtivas, que seriam os recursos 
tecnológicos, o conhecimento científico, as estruturas de produção rural e 
urbana, o nível de consciência social etc. Para Marx, não seria possível forças 
produtivas desenvolvidas, a exemplo do nível conquistado no capitalismo, 
coexistindo com relações de produção ‘atrasadas’ historicamente se 
comparadas a estas, a exemplo das relações de produção feudais. Portanto, 
relações de produção e forças produtivas determinar-se-iam no 
desenvolvimento da sociedade humana. 
As relações de produção e as forças produtivas, em suas relações 
concretas e socialmente estabelecidas, formariam a estrutura (ou base) 
econômica da sociedade. Sobre a estrutura “(...) se levanta a superestrutura 
jurídica e política e à qual correspondem determinadas formas de consciência 
social” (Marx, 1983, Volume 1, p. 301). 
Marx concebe uma interação e uma interdependência profunda entre a 
estrutura, responsável pela produção e reprodução da vida material, e a 
superestrutura, responsável pela produção e reprodução da vida política e 
espiritual. A relação dialética que Marx estabelece entre estrutura e 
superestrutura não exclui a ontologia. Neste ponto, Marx é categórico quando 
afirma que “(...) não é a consciência do homem que determina o seu ser, mas, 
pelo contrário, o seu ser social é que determina a sua consciência” (Marx, 
1983, Volume 1, p. 301). 
Dito de outra forma, Marx não reconhece nas leis, nas formas do Estado, 
nas expressões subjetivas dos indivíduos, segmentos e classes sociais uma 
autonomia e independência da estrutura, ou seja, das condições materiais de 
existência da sociedade. Para Marx, a compreensão das superestruturas exige, 
necessariamente, um movimento de investigação que parta da estrutura.

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