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1 May Freitas (Saúde da Mulher) SOFRIMENTO FETAL SOFRIMENTO FETAL AGUDO REF: REZENDE Sofrimento fetal agudo é o que ocorre durante o parto, em contraposição ao sofrimento fetal crônico, próprio da gestação complicada por insuficiência placentária. A asfixia é condição resultante do comprometimento da troca de gases que, quando persistente, leva a progressiva hipoxemia/hipercapnia e estado de acidose metabólica. Durante o parto vaginal, as contrações maternas causam redução temporária na troca de gases. Após a contração há recuperação fetal, seguida por perfusão normal até que ocorra nova contração. Se esses mecanismos fisiológicos compensatórios forem sobrepujados, estabelece-se a acidemia hipóxica. Se houver acidemia hipóxica de grau e duração suficientes, espera-se lesão cerebral com consequentes sequelas neurológicas nos bebês sobreviventes, outros danos orgânicos e morte intraparto ou neonatal. FISIOPATOLOGIA As trocas metabólicas existentes entre o sangue materno e o fetal, realizadas na placenta, são indispensáveis para manter a homeoestase do concepto. Qualquer fator que subitamente interfira nessas trocas, levando o feto a estado transitório, ou permanente, de carência de oxigênio, será causa do sofrimento fetal agudo. A redução nas trocas maternofetais do tipo agudo é própria do parto em que a asfixia decorre da insuficiência nas circulações uteroplacentária ou fetoplacentária. INSUFICIÊNCIA UTEROPLACENTÁRIA AGUDA O fluxo de sangue materno que chega aos espaços intervilosos, pelos vasos uteroplacentários, depende, fundamentalmente, da relação entre 2 fatores: ➢ Pressão arterial média materna: a força que impulsiona o sangue ➢ Resistência encontrada pelo sangue nos vasos uteroplacentários: elemento inversamente proporcional ao calibre desses vasos, que por sua vez depende do tônus vasomotor intrínseco e das contrações uterinas que comprimem, extrinsecamente, os vasos nutridores da placenta, quando atravessam o miométrio, ou seja, da pressão intramiometrial. A insuficiência uteroplacentária aguda, responsável pela hipoxia fetal no parto, deve-se à redução excessiva do afluxo de sangue materno, que supre os espaços intervilosos, e é determinada pela hiperatividade uterina ou pela hipotensão materna: A. Hipersistolia uterina. Em cada contração a pressão intramiometrial ultrapassa, de muito, o valor da pressão arterial média materna (e mesmo da pressão sistólica), pelo que o decréscimo circulatório uteroplacentário é mais acentuado e de maior duração do que se as contrações tivessem intensidade normal. B. Taquissistolia uterina. A elevada frequência das contrações encurta os intervalos entre elas e reduz o tempo de que dispõe o sangue para circular. C. Hipertonia uterina. Exerce compressão persistente sobre os vasos sanguíneos, que se mantém entre as contrações, e dessa forma reduz acentuadamente o gasto de sangue pela placenta. D. Hipotensão materna. A hipotensão arterial materna diminui a força que impulsiona o sangue pelos vasos uteroplacentários e permite maior compressão desses vasos e da aorta, pelo miométrio, reduzindo também o afluxo de sangue à placenta. Entretanto, se a hipotensão arterial for determinada por vasodilatação arteriolar, que inclui o território uteroplacentário, pode suceder que a diminuição da resistência vascular compense a queda da pressão arterial; nessa eventualidade, o afluxo de sangue uteroplacentário não estará reduzido, apesar da hipotensão arterial. 2 May Freitas (Saúde da Mulher) INSUFICIÊNCIA FETOPLACENTÁRIA AGUDA A circulação fetoplacentária é veiculada pelo cordão umbilical, outro elemento fundamental na realização das trocas metabólicas entre a mãe e o concepto. Certos aspectos patológicos do cordão representados, principalmente, pelas circulares, prolapsos, procidências, nós, além da oligoidramnia que atua na ausência de patologia funicular, predispõem ou motivam a compressão dos vasos umbilicais quando da contração uterina, o que constitui obstáculo ao trânsito sanguíneo fetoplacentário. FATORES REGULADORES DA FREQUÊNCIA CARDÍACA FETAL A análise da frequência cardíaca fetal (FCF) é o meio principal pelo qual o feto é avaliado, se adequada a oxigenação. A FCF, assim como a do adulto, está subordinada à atividade intrínseca do marca- passo cardíaco – nódulo sinoatrial – localizado no átrio direito, que, por ser o local de atividade contrátil mais rápida do órgão, controla o seu ritmo. O segundo local mais rápido do coração é o restante do átrio e, por último, o ventrículo. Muitos fatores fisiológicos modulam a frequência intrínseca do coração: o sistema nervoso parassimpático e o simpático. Diversos outros elementos neles atuam, como quimiorreceptores e barorreceptores, além da regulação hormonal exercida pela epinefrina e pela norepinefrina, produzidas em situações de estresse, e da sua influência múltipla no sistema cardiovascular. MECANISMOS DEFENSIVOS FETAIS Basicamente, são de 2 tipos os mecanismos defensivos fetais: alterações cardiovasculares e alterações metabólicas. A. Alterações Cardiovasculares: Importantes aspectos cardiovasculares ocorrem durante a hipoxia (ou asfixia) para preservar a oxigenação de certos órgãos nobres ou “prioritários”: 1. Há vasodilatação seletiva do cérebro, coração, suprarrenal e vasoconstrição de outros, do que resulta acréscimo de fluxo de sangue nos primeiros e diminuição nos restantes; a placenta mantém o 3 May Freitas (Saúde da Mulher) seu fluxo de sangue na hipoxia aguda. O rendimento cardíaco total permanece estável em níveis moderados de hipoxia, mas diminui em graus acentuados. A FCF é taquicárdica, de modo a aumentar o intercâmbio metabólico entre a mãe e o concepto. a. Por meio da centralização, que favorece órgãos vitais como o cérebro e o coração, o feto reduz o consumo total de oxigênio e a glicólise anaeróbia. Isso lhe permite sobreviver por períodos moderados (até 30 min) de carência de oxigênio sem descompensação do coração e lesão cerebral. 2. O consumo de oxigênio se reduz a 50% do normal e, nessas condições, pode permanecer o feto durante cerca de 45 min sem lesões irreversíveis. 3. Em consequência da acentuada redução do fluxo de oxigênio a diversos órgãos nesses leitos vasculares, entra em jogo a respiração anaeróbia, via vicariante de liberação de energia, na ausência de O2. Se persistir a carência de O2, o processo de respiração anaeróbia, além de liberar pouca energia, leva à acidose metabólica, devido ao acúmulo de radicais ácidoS. Assim, quando há queda na oxigenação fetal, qualquer deterioração ocorre em uma sequência lógica que progride da hipoxia, a qual, se grave e de duração suficiente, pode levar à acidose metabólica. a. Dependendo da gravidade e da duração da acidose, pode ocorrer lesão tecidual e orgânica e, finalmente, morte. !!! Na vigência das contrações uterinas, interrompidas as trocas metabólicas, ocorrem diminuições da FCF (dips ou desacelerações) que poupam o gasto energético armazenado no miocárdio sob a forma de glicogênio. Com o progredir da hipoxia fetal se superpõe o acúmulo de gás carbônico, impondo componente respiratório à acidose. É esse tipo de acidose, além da hipoxia e da hipercapnia, que vai constituir o “substrato bioquímico” do sofrimento fetal agudo. ETIOLOGIA Hiperatividade uterina: especialmente a consequente à administração intempestiva e imprudente de ocitócicos. Ou pode ser espontânea, encontrada no parto obstruído, no descolamento prematuro da placenta, na toxemia, na polidramnia e no período expulsivo prolongado Hipotensão materna: provocada pela anestesia de condução (raque, peridural etc.), hemorragias, decúbito dorsal (compressão da veia cava inferior e da aorta). Entretanto, o Doppler mostra que a anestesia peridural, durante o trabalho de parto, melhora o fluxo placentário, desde que não ocorra hipotensão materna CIR: tá no final doresumo. 4 May Freitas (Saúde da Mulher) Patologia funicular (circulares, nós, procidências e prolapsos): sem subordinação a qualquer dos acidentes anteriormente enumerados, o cordão umbilical pode ser comprimido durante o parto (especialmente após a ruptura das membranas), levando ao sofrimento fetal agudo Parto prolongado: ocasiona, eventualmente, acidose metabólica materna que acaba por comprometer o concepto. DIAGNÓSTICO O diagnóstico do sofrimento fetal intraparto é feito por meio da cardiotocografia (CTG), da microanálise do sangue fetal e da clínica. CARDIOTOCOGRAFIA (CTG) A técnica tá na parta de Nanay ♥♥ As alterações da FCF são categorizadas em basais, periódicas e episódicas. As alterações periódicas são decorrentes das contrações uterinas, e as episódicas não estão associadas à atividade contrátil. A descrição completa do traçado cardiotocográfico envolve os seguintes parâmetros: contrações uterinas, FCF basal, variabilidade (da FCF basal), acelerações e desacelerações. O número de contrações uterinas é avaliado em “janelas” de 10 min e obtida a média para 30 min. Considera-se como normal a presença de até 5 contrações a cada 10 min e como taquissistolia a presença de mais de 5 contrações em 10 min; a taquissistolia deve também ser classificada de acordo com a presença ou ausência de desacelerações da FCF. Em suma, os padrões da FCF são definidos pelas características da linha de base, variabilidade, acelerações e desacelerações. → Alterações Basais 1. FCF basal: A linha de base na qual estão inscritas as variações tacométricas é denominada FCF basal. Seus limites normais situam-se entre 110 e 160 bpm. A FCF basal anormal é denominada bradicardia quando < 110 bpm e taquicardia quando > 160 bpm. 2. Variabilidade ou oscilação: A variabilidade (da FCF basal) é determinada em janelas de 10 min, visualmente levando em conta as flutuações da FCF basal em bpm e classificadas em: • Ausente: amplitude não detectada • Mínima: amplitude ≤ 5 bpm • Moderada: amplitude entre 6 e 25 bpm • Acentuada: amplitude > 25 bpm. A variabilidade moderada indica ausência de acidemia metabólica fetal. A variabilidade mínima ou ausente isoladamente não é indicativo confiável de hipoxemia ou acidemia metabólica. → Alterações Periódicas/episódicas 1. Aceleração: As acelerações são subidas transitórias da FCF ocasionadas pelo movimento fetal (MF) ou por sua estimulação e pela contratilidade uterina. Representam uma resposta do concepto sadio ao estímulo e ao estresse. A aceleração é aumento súbito da FCF de amplitude ≤ 15 bpm e duração ≥ 15 s. Antes de 32 semanas de gestação, a aceleração é definida como aumento ≥ 10 bpm e duração ≥ 10 s. Nos casos em que o traçado da CTG não registrar acelerações, ao menos uma, no período de 20 a 40 min, deverá ser ultimada estimulação fetal intraparto mediante o teste de estimulação do escalpo. O teste pode ser realizado pela estimulação digital do couro cabeludo ou com pinça de Allis. Após essa manobra de estimulação fetal, espera-se que ocorra aceleração da FCF nos próximos 20 min. Esse sinal 5 May Freitas (Saúde da Mulher) singelo reflete alta sensibilidade quanto à ausência de acidose fetal, atestando a boa vitabilidade do concepto. 2. Dips ou desacelerações: Constituem quedas temporárias da FCF e podem ser classificados em tardio, precoce e variável (ou umbilical), de acordo com características específicas. a. Os dips precoces têm o seu início, máximo de queda e recuperação à linha de base coincidindo, respectivamente, com o começo, pico e fim da contração. A FCF basal associada situa-se nos limites da normalidade. Decorre do estímulo vagal consequente à compressão da cabeça fetal. Sua produção está grandemente facilitada pela ruptura da bolsa das águas e pela insinuação da apresentação na pelve, eis que é privativo da parto, particularmente na sua fase final. Por definição, existe na ausência de complicações do cordão umbilical (circulares, nós, prolapsos etc.). b. O dip tardio, ao contrário, tem princípio, máximo de queda e recuperação retardados, respectivamente, em relação ao início, pico e fim da contração uterina. O padrão tacométrico mantém-se igualmente uniforme e a FCF, pelo geral, taquicárdica. Para a caracterização da desaceleração tardia, é importante também analisar o tempo de recuperação (maior de 15s) medido entre o fim da contração uterina e o ponto em que o dip retornou à linha de base. Os dips tardios estão associados à estase de sangue interviloso, daí o seu achado na asfixia fetal por insuficiência uteroplacentária aguda. A metrossístole é a responsável pela produção dos dips tardios ao reduzir os teores de oxigênio fetal abaixo de determinado nível crítico. c. Nos dips variáveis, a forma da desaceleração não reflete a da contração uterina e as quedas variam de aspecto no correr do traçado. É a queda do dip subitânea, associada à compressão funicular, daí serem chamados também dips umbilicais. São fatores predisponentes ao seu aparecimento: circulares do cordão (em torno do pescoço, membros, tronco), ruptura das membranas, oligoidramnia, prolapso, nó, brevidade ou inserção velamentosa do cordão e parto pélvico. O intervalo e o tempo de recuperação são variáveis, o que origina desacelerações precoces ou tardias. i. Os dips umbilicais de curta duração (até 30s) têm, na sua gênese, apenas o estímulo vagal, ii. Os dips umbilicais longa duração (mais de 30s), além do fator nervoso, necessitam, para o seu aparecimento, componente hipoxiante. !!! As desacelerações são classificadas como recorrentes se acontecerem em 50% ou mais das contrações em uma janela de 20 min. Os padrões tacométricos que precedem a morte fetal merecem ser descritos – bradicardia profunda terminal e oscilação lisa (“silenciosa”). As alterações transitórias (dips tardios, umbilicais ou espontâneos graves) não são constantes. → Constituem indicações para a realização da CTG intraparto: Gestação de alto risco maternofetal, indução eletiva ou aceleração do trabalho de parto, parto pré- termo, parto gemelar, desenvolvimento de fatores de risco maternofetais intraparto, taquicardia, bradicardia ou desaceleração à ausculta clínica. Diretrizes para a interpretação e a classificação dos traçados da FCF no parto monitorado, assim como a conduta a ser tomada: ➢ Reafirmada a nomenclatura da FCF basal, variabilidade, aceleração e desaceleração 6 May Freitas (Saúde da Mulher) ➢ A atividade uterina normal definida como de até 5 contrações/10 min em uma janela de 30 min. Taquissistolia definida como > 5 contrações/10 min, em uma janela de 30 min, e deve ser referida a presença ou ausência de desacelerações da frequência cardíaca fetal ➢ Sistema de classificação dos traçados de FCF intraparto em 3 categorias hierarquizadas: categoria I (normal), categoria II (indeterminada) e categoria III (anormal) ➢ Medidas de reanimação intrauterina levando em conta os traçados da FCF 7 May Freitas (Saúde da Mulher) ➢ Conduta a ser instituída de acordo com as 3 categorias da FCF MICROANÁLISE DO SANGUE FETAL O exame está praticamente em desuso. A microgota, obtida por meio de incisão praticada na apresentação fetal, permite diagnosticar as alterações metabólicas caracterizadas por hipoxia, hipercapnia e acidose. É contraindicado em pacientes com história familiar de hemofilia, suspeita de anomalia de coagulação fetal (ex., trombocitopenia), apresentação de face ou infecção materna (HIV, hepatites virais, herpes ou suspeita de corioamnionite). ➢ Nos casos de pH ≥ 7,25, a microanálise deve ser repetida se persistir o traçado cardiotográfico anormal. 8 May Freitas (Saúde da Mulher) ➢ Entre 7,21 e 7,24, pode-se repetir a microanálise ou ultimar-se o parto no caso de queda importante do pH. ➢ Caso o pH seja ≥ 7,20, a gestação deverá ser interrompida, o parto deverá serimediato. CLÍNICA → Ausculta Representa o principal parâmetro clínico a ser empregado a fim de despistar o sofrimento fetal intraparto. Deve ser realizada, no período de dilatação, a cada 30 min, em pacientes de baixo risco, e a cada 15 min naquelas de alto risco. No período expulsivo esses intervalos serão, respectivamente, de 15 e 5 min. Nos casos de anestesia de condução, recomenda-se que a auscultação clínica seja realizada com maior frequência, a cada 5 min, devido ao risco iminente de hipotensão arterial e diminuição da perfusão uteroplacentária. A ausculta é feita após o fim da contração por prazo de 30 a 60 s. “Bradicardia” persistente (dip tardio ou umbilical) ocorre quando a FCF for menor de 110 bpm durante ao menos 10 min, sinalando sofrimento fetal agudo, bem como os casos de “taquicardia”, estando a FCF acima de 160 bpm nas mesmas condições. → Mecônio Associado a alterações patológicas da FCF em fetos em apresentação cefálica, é sinal de sofrimento fetal. → Síndrome de Aspiração de Mecônio (SAM) Outrora relacionada à asfixia fetal intraparto, hoje sabemos decorrer de outros fatores antenatais: asfixia crônica e infecções congênitas. PROGNÓSTICO 9 May Freitas (Saúde da Mulher) Consenso de paralisia cerebral. (Adaptada de Miller, 2011.) Jonhson et al. (2014), ao contrário do que enfatiza a literatura, referem que 54% (0,6:1.000) das encefalopatias isquêmicas hipóxicas neonatais, em recém-nascidos de > 34 semanas, são atribuídas à asfixia no parto, uma vez que estavam associadas a padrões anormais da CTG e bioquímica do sangue da artéria umbilical compatível com acidemia metabólica fetal. Vale ressaltar que a CTG realizada na admissão era normal, o que prova que os padrões tacométricos anormais se desenvolveram no parto. Vintzileos & Smulian (2016), em Editorial, enfatizam a necessidade de avaliar a progressão dos padrões da FCF longitudinalmente para diagnosticar o grau de hipoxia fetal intraparto e a intervenção oportuna. !!! Esses estudos são o Rezende que traz. TRATAMENTO Pode ser dividido em profilaxia, tratamento durante o parto e reanimação do recém-nascido. →Profilaxia • Não romper artificialmente as membranas ovulares; • Não acelerar o parto que progride normalmente; • Só utilizar a ocitocina quando a evolução do parto se detém ou se retarda por motivo de deficiência na contratilidade uterina; • Não induzir o parto eletivamente; • Se houver indicação médica para a indução do parto, convém utilizar a menor dose de ocitócico capaz de fazê-lo iniciar e progredir; • Monitorar todos os partos induzidos; • Monitorar todos os partos em gestação de alto-risco. → Tratamento durante o parto Medidas de reanimação intrauterina durante o parto direcionadas a resolver o problema fisiopatológico do sofrimento fetal agudo: oxigenação materna, hidratação intravenosa, reposicionamento materno, descontinuação da ocitocina (especialmente na taquissistolia uterina, > 5 contrações/10 min), administração de tocolítico (terbutalina subcutânea, 0,25 mg), amnioinfusão, elevação da apresentação fetal. 10 May Freitas (Saúde da Mulher) !!! Os objetivos da reanimação intrauterina são reverter qualquer hipoxia que possa levar à deterioração adicional ou pelo menos evitar períodos de padrões tacométricos indeterminados ou anormais que possam causar preocupação desnecessária a médicos e pacientes, levando a operações desnecessárias, ganhar tempo e otimizar o estado fetal na preparação para o parto operatório. → Reanimação do RN Aproximadamente 10% dos recém-nascidos necessitam de alguma assistência ao nascimento, mas apenas 1% exige reanimação cardiovascular avançada. Fatores são responsáveis pelo recém-nascido apneico, que não respira logo após o nascimento: Depressão dos centros respiratórios por asfixia de qualquer causa; Drogas administradas à mãe (narcóticos, anestésicos); Imaturidade fetal (centros respiratórios e musculatura torácica); Obstrução da via respiratória superior; Pneumotórax, entre outros. SOFRIMENTO FETAL CRÔNICO REF: WILLIAMS São usados como sinônimos para essa condição as expressões: insuficiência placentária e insuficiência uteroplacentária. Na diminuição progressiva da perfusão placentária, o comprometimento fetal se faz de forma lenta, revelando mais claramente seus mecanismos compensatórios, os quais podem manter o feto vivo por longos períodos, apesar de baixos teores de oxigênio. Essas alterações são mais frequentes em mulheres que já apresentam algum tipo de morbidade capaz de deteriorar a função ou fluxo placentário. Dessa forma, é imperativo que nas gestações de alto risco se mantenha uma vigilância materna e fetal intensa. PLACENTA NORMAL Ao final da gravidez, a placenta "normal" pesa 4 70 g, é redonda ou oval, com um diâmetro de 22 cm, e tem espessura central de 2,5 cm. Ela é composta por disco placentário, membranas extraplacentárias e cordão umbilical com três vasos. A superfície materna é formada pala placa basal, que é dividida por sulcos em porções denominadas cotilédones. Esses sulcos marcam o local dos septos internos que se estendem até o espaço interviloso. A superfície fetal é a placa coriônica em que se insere o cordão umbilical, normalmente no centro. Os grandes vasos fetais que se originam dos vasos do cordão se espalham e ramificam, cruzando a placa coriônica antes de penetrarem no vilo do parênquima placentário. Em seu trajeto, as artérias fetais quase invariavelmente cruzam sobre veias. A placa coriônica e seus vasos são cobertos pelo âmnio delgado, facilmente destacado da peça após o nascimento. Na ultrassonografia, a placenta normal é homogênea, tem espessura entre 2 e 4 cm, encontra-se apoiada no miométrio e apresenta indentação para o interior do saco amniótico. Muitas lesões placentárias podem ser identificadas a olho nu ou por exame ultrassonográfico, mas muitas também requerem exame histopatológico para esclarecimento. ANORMALIDADES DA PLACENTA → Tamanho e forma As placentas raramente podem se formar como discos independentes de tamanho quase igual. Trata- se da placenta bilobada, também conhecida como placenta bipartida ou dupla. Nessas placentas, o cordão insere-se entre os dois lobos placentários. A placenta contendo três ou mais lobos é rara e é denominada multilobada. Contudo, com maior frequência, é possível o desenvolvimento de um ou mais lobos acessórios. Esses lobos possuem vasos que cursam atravessando as membranas. Se esses vasos cobrirem o colo uterino criando a chamada vasa prévia, 11 May Freitas (Saúde da Mulher) podem causar hemorragia fetal perigosa se houver laceração. O lobo acessório também pode ficar retido no útero após o nascimento e causar atonia uterina com hemorragia pós-parto. Define-se que há placentomegalia quando a espessura está acima de 40 mm, o que em geral ocorre em razão de aumento acentuado das vilosidades. Tal aumento pode ser secundário a diabetes ou anemia grave da mãe, ou a hidropsia ou infecção fetal por sífilis, toxoplasmose ou citomegalovírus. → Placentação extracorial A placa coriônica deixa de se estender à periferia, o que a torna menor do que a placa basal. Do ponto de vista clínico, a maioria das gestações com placenta. extracorial tem evolução normal. → Placenta acreta, increta e percreta Essas anormalidades placentárias clinicamente importantes ocorrem quando o trofoblasto invade o miométrio em profundidade variável causando adesão anormal. São muito mais prováveis em casos de placenta prévia ou implantada sobre incisão ou perfuração uterinas anteriores. → Distúrbios circulatórios (*Esse que tem interesse pro sofrimento fetal crônico) Esses distúrbios são síndromes clinicamente importantes e, na maioria dos casos, a placenta é o órgão-alvo da doença materna. Do ponto de vista funcional, os distúrbios da perfusão placentária podem ser assim agrupados: (1)aqueles nos quais há prejuízo do fluxo de sangue materno para o espaço interviloso ou em seu interior; (2) aqueles nos quais o fluxo de sangue fetal para as vilosidades é afetado. Essas lesões com frequência são identificadas na placenta normal e madura. Embora elas possam reduzir o limite máximo de fluxo sanguíneo placentário, a reserva funcional da placenta evita que haja danos na maioria dos casos. Entretanto, se forem extensivas, essas lesões podem limitar gravemente o crescimento fetal. As lesões placentárias causadoras de problemas de perfusão com frequência são identificadas a olho nu ou no exame ultrassonográfico, enquanto as lesões menores são identificadas apenas com exame microscópico. Impedimento ao fluxo sanguíneo materno → Depósito subcoriônico de fibrina Esses depósitos são causados por atraso no fluxo sanguíneo materno pelo espaço interviloso, com subsequente depósito de fibrina. A estase sanguínea ocorre especificamente na região subcoriônica, e as lesões que se desenvolvem costumam ser visualizadas como placas brancas ou amarelas firmes sobre a superfície fetal. → Depósito fibrinoide periviloso A estase do sangue materno ao redor de um vilo específico resulta em depósito de fibrina, que pode levar à redução da oxigenação do vilo e à necrose do sinciciotrofoblasto. Dentro de certos limites, esses pequenos nódulos placentários amarelos ou brancos, visíveis a olho nu, s,ão considerados normais com o envelhecimento da placenta. → Infarto do soalho materno da placenta Esta variante extrema de depósito fibrinoide periviloso é uma camada densa no interior da placa basal placentária, erroneamente denominada infarto. A lesão possui superfície espessa, branca, firme e corrugada que impede o fluxo sanguíneo materno normal no espaço interviloso. Essas lesões estão associadas à restrição ao crescimento fetal, ao aborto, ao parto prematuro e à natimortalidade → Trombo interviloso Trata-se de coleção de sangue materno coagulado em geral encontrada no espaço interviloso, misturado com sangue fetal em razão de ruptura em um vilo. Macroscopicamente, essas coleções redondas ou ovais têm tamanho variado, podendo chegar a vários centímetros.Os trombos intervilosos são comuns e normalmente não estão associados a sequelas fetais. Como é possível haver comunicação entre as circulações materna e fetal, essas lesões podem causar elevação nos níveis séricos maternos de alfa- fetoproteína. → Infarto 12 May Freitas (Saúde da Mulher) As vilosidades coriônicas recebem oxigênio unicamente da circulação materna com suprimento feito pelo espaço interviloso. Qualquer doença uteroplacentária que reduza ou obstrua esse suprimento pode resultar em infarto de vilos específicos. Trata-se de lesões comuns nas placentas maduras e que são benignas quando ocorrem em pequeno número. Contudo,se forem numerosas, é possível haver insuficiência placentária. Quando os infartos são amplos, com localização central e distribuição aleatória, podem estar associados à pré-eclâmpsia ou ao anticoagulante lúpico. → Hematoma A unidade materno-placentária pode desenvolver diversos tipos de hematoma, São eles: (1) hematoma retroplacentário - entre a placenta e sua decídua adjacente; (2) hematoma marginal - entre o cório e a decídua na periferia da placenta - conhecido na prática como hemorragia subcoriônica; (3) trombose subcorial – também conhecida como mola de Breus - ao longo do teto do espaço interviloso e abaixo da placa coriônica; e (4) hematoma subamniótico - com origem em vaso fetal e encontrado abaixo do âmnio, mas acima da placa coriônica. A maioria dos hematomas subcoriais visíveis à ultrassonografia é bastante pequena e sem importância clínica. As grandes coleções retroplacentárias, marginais e subcoriônicas têm sido associadas a maiores taxas de abortos, descolamento de placenta, restrição ao crescimento fetal, ao parto prematuro e à placenta aderente. Impedimento ao fluxo sanguíneo fetal → Vasculopatia trombólica fetal O sangue fetal desoxigenado flui das duas artérias umbilicais para artérias localizadas no interior da placa coriônica, os quais se dividem enviando ramos que cruzam a superfície placentária. Tais artérias finalmente chegam a vilos específicos, e sua trombose causará obstrução do fluxo sanguíneo fetal. Distal à obstrução, as porções afetadas do vilo infartam e deixam de ser funcionais. Nas placentas normais maduras, encontram-se trombos em número limitado, o que pode se tornar clinicamente significante quando há infarto de muitos vilos. → Hematoma subamniótico Esses hematomas localizam-se entre a placenta e o âmnio. Na maioria das vezes, ocorrem como episódios agudos durante o terceiro estágio do trabalho de parto quando a tração do cordão produz rompimento de um vaso próximo à sua inserção. Lesões crônicas podem causar hemorragia materno-fetal ou restrição ao crescimento fetal. Além disso, os hematomas podem ser confundidos com outras massas placentárias potencialmente perigosas, como o corioangioma. Na maioria dos casos, o estudo com Doppler revelará ausência de fluxo sanguíneo interno, o que permite diferenciar hematomas de outras massas placentárias. CRESCIMENTO INTRAUTERINO RESTRITO (CIUR) REF: REZENDE CIR será definido para fetos com peso estimado inferior ao 10o porcentil para a idade. Pequeno para a idade gestacional (PIG) corresponde ao recém-nascido com peso abaixo do 10o porcentil para a idade gestacional. Recém-nascido de baixo peso é aquele que nasce com peso inferior a 2.500 g, mas que não necessariamente é PIG. Quando um feto não atinge o seu potencial genético de crescimento pode-se dizer que ocorreu a restrição do crescimento fetal (RCF), intercorrência obstétrica que afeta de 3% a 10% das gestações. risco é ainda mais elevado quando esses casos não são identificados durante o pré-natal. morbidade perinatal é cerca de cinco vezes maior para os recém-nascidos (RNs) afetados pela RCF, com maiores taxas de hipoglicemia, hipocalcemia, policitemia, hemorragia pulmonar, hipotermia, aspiração meconial e prejuízo no desenvolvimento psicomotor. 13 May Freitas (Saúde da Mulher) CLASSIFICAÇÃO O padrão simétrico é caracterizado por pequenas dimensões de cabeça e abdome e indica insulto intrínseco,precoce, comprometendo o crescimento fetal, sendo determinado por anomalias estruturais e cromossomiais, infecções, drogas ilícitas e álcool. O crescimento é simétrico porque ocorreu no momento em que o feto se desenvolvia por divisão celular. O CIR assimétrico, por sua vez, é consequente a fatores extrínsecos, frequentemente à disponibilidade inadequada de substratos para o metabolismo fetal. Nesse padrão, a cabeça tem dimensões preservadas, mas o abdome está reduzido pelo menor tamanho do fígado e pela escassez de tecido adiposo abdominal. Mais comumente, o distúrbio que limita o aporte de substratos para o feto é a insuficiência placentária por doença vascular materna responsável pela perfusão uteroplacentária deficiente. ETIOLOGIA Outras causas: nutrição materna, doença vascular, trombofilia. DIAGNÓSTICO Investigação e conduta nos casos de PIG/CIR: → Historia: Todas as mulheres na primeira consulta pré-natal devem ser avaliadas para fatores de risco de CIR. Aquelas com fatores de risco maiores devem ser referidas para a mensuração seriada da CA e a realização do Doppler da artéria umbilical, a partir de 20 a 24 semanas. Alguns fatores de risco são: Idade materna maior que 40 anos, baixo ganho de peso materno, tabagismo, uso de cocaína, hipertensão crônica, diabetes com complicação vascular, história de CIUR. → Medida do fundo do útero: Medida do fundo do útero (entre 24 e 38 semanas) se aproxima da idade gestacional e é utilizada para rastrear o crescimento fetal menor que o 10o porcentil. A medida do fundo do útero deve ser realizada a cada visita pré-natal a partir de 20 a 24 semanas.→ Biometria Fetal: No CIR simétrico, a circunferência cefálica (CC), a CA e o comprimento do fêmur (CF) estão todos reduzidos. No CIR assimétrico, a CC continua a crescer apropriadamente para a idade gestacional, enquanto a CA e o CF não a acompanham. Essa assimetria torna-se pronunciada após 28 semanas. Quando indicada a avaliação seriada do crescimento fetal, essas medidas devem ser feitas em intervalos de 3 semanas. 14 May Freitas (Saúde da Mulher) → Doppler de artéria Uterina: Pacientes com Doppler anormal das artérias uterinas entre 20 e 24 semanas (definido como índice de resistência [RI] > 0,58, índice de pulsatilidade [PI] > 1,45 ou incisura bilateral) devem ser referidas para avaliação seriada sonográfica do crescimento fetal pela CA e do seu bem-estar pelo Doppler da artéria umbilical, a partir de 20 a 24 semanas. → Diagnóstico de CIR fetal: Se o diagnóstico do CIR for precoce, especialmente se o Doppler de artéria uterina e o volume do líquido amniótico forem normais, estarão indicados a ultrassonografia morfológica e o cariótipo fetal, particularmente em casos de anomalia estrutural, assim como o rastreamento de infecção congênita para CMV e toxoplasmose [sorologia materna e reação em cadeia da polimerase (PCR) no líquido amniótico] → Dosagem do fator de crescimento placentário: Todas O fator de crescimento placentário (PlGF) é um biomarcador produzido pela placenta, mais especificamente pelo sinciciotrofoblasto (Benton et al., 2012). Na gravidez normal, os níveis de PlGF elevam-se até o fim do 2o trimestre, depois gradualmente decrescem até o parto. O teste é considerado positivo quando o valor do PlGF está abaixo do limite de detecção do ensaio (< 12 pg/mℓ), caracterizando o CIR placentário → Novo paradigma: O diagnóstico do CIR placentário é hoje realizado na ultrassonografia de 2o trimestre (20 a 24 semanas) pela avaliação da medida da CA e pelo Doppler da artéria uterina, especialmente em casos de fundo do útero discordante e/ou mulheres com história de risco para CIR. Presentes CA < 10º porcentil e/ou Doppler da artéria uterina anormal estaria caracterizado o CIR placentário precoce. Ausentes essas alterações, a CA será novamente avaliada com 32 a 36 semanas e se < 10o porcentil, estaríamos frente ao CIR placentário tardio. AVALIAÇÃO ANTEPARTO Excluindo-se os casos de aneuploidias, anomalias estruturais e infecção fetal, o restante dos fetos com CIR, dito placentário, existe em estado de privação leve/moderada crônica de oxigênio e de substratos, que pode resultar em hipoxia anteparto, intraparto e neonatal, encefalopatia isquêmica, aspiração de mecônio, policitemia, hipoglicemia e outras anormalidades metabólicas. Em consequência, torna-se imperativo otimizar a época da interrupção, evitar a hipoxia durante o parto e providenciar cuidados imediatos neonatais. A cardiotocografia (CTG) e o volume do líquido amniótico (vLA) não são bons procedimentos para avaliar o feto com CIR; Oligoidrâmnio isolado (maior bolsão < 2 cm) não é critério para a interrupção da gravidez. Nesse contexto, apenas a CTG computadorizada por meio do estudo das microscilações é capaz de se correlacionar à acidemia fetal. Todavia, trata-se de um sinal tardio que só se evidencia após as alterações velocimétricas do Doppler. O Doppler é o método de eleição para avaliar a vitabilidade fetal no CIR. As alterações no Doppler podem ser divididas em precoces (artéria umbilical, artéria cerebral média [ACM]) e tardias (ducto venoso, veia umbilical), e elas estão espaçadas por muitos dias. A utilização de uma combinação de vasos arteriais e venosos é capaz de demonstrar o grau da insuficiência placentária, o nível de redistribuição da circulação fetal (centralização) e o comprometimento da função cardíaca. !!! Doppler da artéria umbilical é o procedimento de eleição para avaliar a insuficiência placentária no CIR. 15 May Freitas (Saúde da Mulher) TRATAMENTO Trabalhos mostraram que a profilaxia com ácido acetilsalicílico em baixa dose utilizada entre 8 e 16 semanas foi capaz de reduzir a incidência de CIR em 50%, a de parto pré-termo em 60% e a mortalidade perinatal em 60%. Conduta obstétrica. O melhor método para interromper a gestação com CIR é a operação cesariana. Quando não houver sofrimento fetal, é permitido o parto vaginal, desde que sempre monitorado. Durante o parto, 50% dos fetos com CIR exibem traçados cardiotocográficos anormais, especialmente desacelerações umbilicais. Não se aconselha a indução no alto risco. REFERNCIAS CUNNINGHAM, F. G.; LEVENO, K. J.; BLOOM, S.L. Placentação, embriogênese e desenvolvimento fetal. In: CUNNINGHAM, F. G.; LEVENO, K. J.; BLOOM, S.L. Obstetrícia de Williams. Porto Alegre: ARTMED LTDA., 24ª ed., 2014, p. 80-127. MONTENEGRO, C. A. B.; REZENDE FILHO, J. Crescimento Intrauterino Restrito. In: MONTENEGRO, C. A. B.; REZENDE FILHO, J. Rezende obstetrícia - 13. ed. - Rio de Janeiro : Guanabara Koogan, 2017. p. 725-735. MONTENEGRO, C. A. B.; REZENDE FILHO, J. Sofrimento Fetal Agudo. In: MONTENEGRO, C. A. B.; REZENDE FILHO, J. Rezende obstetrícia - 13. ed. - Rio de Janeiro : Guanabara Koogan, 2017. p. 1360- 1372.
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