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LIVRO O TEMPO NAO PARA


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"O tempo não para":
U m a a n á l i s e d o b r i n c a r d e o n t e m e
d e h o j e a p a r t i r d a m e m ó r i a l ú d i c a
d e i d o s o s d o m u n i c í p i o d e S ã o
S e b a s t i ã o d a B o a V i s t a
M a t h e u s F r a z ã o S a r a i v a
F a b i o J o s é A n t o n i o d a S i l v a
“O TEMPO NÃO PARA”
Uma análise do brincar de ontem e de hoje a partir da memória lúdica de
idosos do município de São Sebastião da Boa Vista
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Matheus Frazão Saraiva
Fabio José Antonio da Silva
“O TEMPO NÃO PARA”
 Uma análise do brincar de ontem e de hoje a partir da memória lúdica de
idosos do município de São Sebastião da Boa Vista
1ª Edição
Quipá Editora
2021
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© 2021 por Matheus Frazão Saraiva e Fabio José Antônio da Silva. Todos os direitos
reservados.
O conteúdo, bem como seus dados, forma, correção e confiabilidade são de exclusiva
responsabilidade dos autores. Devem ser atribuídos os devidos créditos autorais.
Sobre os autores:
Matheus Frazão Saraiva, Licenciatura Plena em Educação Física – ESAMAZ/AM,
Especialização em Educação Física Escolar - Faculdade Entre Rios/PI, Licenciatura Plena em
História - UFPA/PA
Fabio José Antônio da Silva, Licenciatura Plena em Educação Física – UEL/PR, Mestre em 
Educação – UFC/CE, Doutor em Educação Física – UEL/PR.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
S243
 
Esta obra foi publicada pela Quipá Editora em janeiro de 2021.
Saraiva, Matheus Frazão 
“O TEMPO NÃO PARA”: Uma análise do brincar de ontem e de hoje a
partir da memória lúdica de idosos do município de São Sebastião da Boa Vista /
Matheus Frazão Saraiva e Fabio José Antônio da Silva. ― Iguatu : Quipá
Editora, 2021.
53 p. : il.
ISBN 978-65-89091-22-6
1. Educação Física. 2. Brincar. 3. Memória Lúdica. I. Título.
CDD 790
/ DOI 10.36599/qped-ed1.073
Esta obra foi publicada pela Quipá Editora em julho de 2021.
www.quipaeditora.com.br / @quipaeditora
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SUMÁRIO
Considerações iniciais……………………………………………………………………….05
Capítulo 1 ……………………………………………………………………………………10
A infância e seus elementos culturais – uma breve aproximação
Capítulo 2 ……………………………………………………………………………………20
A Ilha do Marajó: seus aspetos geográficos e etno-cultural
Capítulo 3 ……………………………………………………………………………………27
A cultura popular e o avanço tecnológico
Capítulo 4 ……………………………………………………………………………………33
Memórias lúdicas: seus sentidos e significados
Considerações finais ………………………………………………………………………...40
Referências …………………………………………………………………………………..42
Apêndice ……………………………………………………………………………………..44
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CONSIDERAÇÕES INICIAIS
 
O presente trabalho aborda questões referentes ao jogo, brinquedos e brincadeiras
retratando a cultura popular através da memória de idosos, dando relevância a essas narrativas
para podemos resgatar e enriquecer o cenário lúdico, que aos poucos se torna supérfluo diante
do mundo tecnológico.
Ao observarmos o cotidiano das crianças marajoaras na contemporaneidade,
percebemos mudanças de comportamentos, hábitos, costumes e claro, nas brincadeiras e seus
brinquedos, pular corda, amarelinha, cantigas de roda entre outras que estão sendo
substituídos por videogames e computadores, decorrentes das influências dos avanços
tecnológicos, fazendo com que crianças substituam as ruas por espaços fechados, devido a
enorme urbanização nas cidades, com isso novos valores são atribuídos e causa também
mentalidades e atitudes que contribuem para uma falta de sociabilidade crescente.
Objetivando a compreensão das transformações a partir do crescimento urbano,
industrial e tecnológico. Percebemos, assim, que as sociedades estão em permanentes
modificações e o próprio conceito de brincar constituído historicamente se transforma diante
das mudanças e por isso precisamos fazer o resgate deste brincar, para mostrar a suma de tal
elemento para a vida da criança em relação aos aspectos do desenvolvimento motor, pois, ao
brincar a criança pula, salta, dança e cria, sendo este último o lado cognitivo no qual ela
pensa, imagina e também o fator afetivo responsável pela interação com o outro, socializando
ideias e movimentos. 
Para realizarmos este trabalho, seguimos as orientações da Resolução 196/96 do
Conselho Nacional de Saúde e encaminhamos ao Comitê de Ética em Pesquisa – CEP, o
projeto para a realização desta pesquisa que foi aprovado permitindo assim a efetivação deste
trabalho. Quando enviei ao CEP, o trabalho apresentava o seguinte título: Entre o
Tradicional e o Contemporâneo: Um estudo sobre as transformações nos brinquedos e
brincadeiras populares do município de São Sebastião da Boa Vista. Entretanto no decorrer da
pesquisa de campo encontramos na fala de um de nossos informantes uma frase que nos levou
a modificar o título, por acreditarmos que tal fala significa a representação do que estamos
tratando. Assim quando ouvimos “o tempo não para” decidimos que esta expressão
representaria a essência do trabalho e a trouxemos para o titulo. Como providência,
encaminhamos ao CEP uma carta informando a mudança de título do trabalho e que tal
mudança não compromete a realização do mesmo uma vez que seguimos exatamente o que
propomos no projeto.
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“O tempo não para”: uma análise do brincar de ontem e de hoje a partir da memória lúdica [...]
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No primeiro capitulo abordamos nesta pesquisa questões sobre a cultura infantil
fazendo uma breve aproximação deste assunto que nem sempre é estudado, porém muito
antiga, na qual defende a criança de suas obrigações, falando que devemos respeitar o mundo
e a fase pela qual ela passa: a infância. Tratando ainda da questão conceitual do jogo através
de clássicos autores que abordam tal assunto como suporte necessário para o lúdico na
infância. Passando pelo brinquedo e seus conceitos para mostrar a sua importância em relação
ao poder de imaginação que a criança pode alcançar de posse do mesmo. E por fim as
brincadeiras que proporcionam o prazer de brincar, a diversão sentida na infância. Sendo
todos estes elementos culturais infantis.
No segundo capitulo, destacamos um breve histórico da ilha do Marajó, conhecendo
seus aspectos geográficos, etno-culturais e todos os seus dezesseis municípios que o compõe,
centralizando nossa pesquisa em apenas um deles: São Sebastião da Boa Vista, onde
exploramos ao máximo seus aspectos histórico, sócio-cultural e topográfico, fazendo um
passeio narrativo detalhado da cidade para compreendermos tais transformações econômicas,
políticas e sociais que influenciaram os valores dessa sociedade.
No terceiro capitulo, se concretizou um debate sobre a cultura popular, ou seja, o
brincar tradicional de antes e suas vantagens ao prazer do lúdico da infância, com o
contemporâneo, o brincar de hoje, dos avanços tecnológicos, de seus malefícios e benefícios
ao brincar na infância. 
A análise dos dados coletados se apresenta no quarto capítulo deste trabalho que
intitulamos em busca dos sentidos e significados das memórias.
A partir de narrativas de idosos, este estudo vislumbra o resgate cultural das
brincadeiras e brinquedos populares tradicionais do município de São Sebastião da Boa Vista
– PA, um município pequeno e de uma população ribeirinha que predomina da cidade. O
município recebera o nome decorrente da bela visão que se obtém, tanto ao nascer, quanto ao
pôr-do-sol à frente da cidade. Sua população segundo dados do IBGE em 2008 (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística), estimulou uma população de 21.499 Boavistenses, para
uma Área de 1.632,218 km².
O presente estudo ganha importância à medida que nos possibilita perceber as
transformaçõeshistóricas e culturais ocorridas em um município da Ilha do Marajó/PA, no
momento em que consideramos como importante fator de estudo, a memória lúdica. 
 Ao observarmos o cotidiano das crianças marajoaras na contemporaneidade,
percebemos mesmo empiricamente, que há mudanças de comportamentos, hábitos e costumes
influenciados pelos avanços tecnológicos.
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“O tempo não para”: uma análise do brincar de ontem e de hoje a partir da memória lúdica [...]
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Tais mudanças podem estar contribuindo para um grau de insociabilidade, ou seja,
percebe-se não só em São Sebastião da Boa Vista, mas em outros municípios do arquipélago
do Marajó um processo de globalização em relação a costumes, hábitos, vestimentas e cultura.
 Nesse sentido, a influencia de outras culturas não é nova, vem desde a colonização
portuguesa no processo de catequização dos Índios, pois apesar de na colonialidade sermos
considerados livres, herdamos culturas da história européia, assim como nas tradições e
brincadeiras populares. Atualmente percebe-se que as crianças brincam cada vez menos de
“macaca1”, “pira-pega2”, “taco-lata3”, “cantigas de roda4”, “o rei mandou5”, “par lendas6” e
“trava-línguas7”, além de pouco ouvir ou falarmos dos mitos, contos e lendas da região.
É notável, que estas brincadeiras vêm sendo substituídas por brinquedos tecnológicos
como Vídeo Games, computadores com jogos em rede, enfim, uma série de invenções
tecnológicas que, dependendo da forma como é introduzida no cotidiano da criança, podem
ter efeitos danosos para a cultura de um lugar. Nesse contexto, percebemos que a sociedade se
encontra, em processo de “descostumização” e em constantes transformações, onde o próprio
processo de infância é constituído historicamente se transformando diante das mudanças da
sociedade industrializada.
A sociedade contemporânea vem passando por diferentes modificações, acreditamos
que isso se dá devido a fatores como: o aumento da violência nas cidades, o avanço
tecnológico, os jogos eletrônicos e a falta de tempo dos pais para brincarem com seus filhos. 
Sabemos que o mundo hoje entrou na era virtual, mas que no passado esse mundo era
um sonho. Hoje, a modernidade abrangeu uma grande parte de nossa sociedade, criando certa
dificuldade ao acesso a informações na maioria das pessoas, principalmente as da chamada
“3ª Idade” dentro deste conhecimento global.
Ao perceber tais modificações culturais, fomos à busca de saber até que ponto as
tradições culturais expressas nos jogos e brincadeiras do município de São Sebastião da Boa
Vista se mantém, e assim voltamos nosso olhar para aqueles que já viveram as brincadeiras do
passado e podem confrontá-las com as brincadeiras do presente: os idosos. 
Esse mundo maravilhoso dos sonhos e das grandes ilusões despertou meu interesse em
buscar inicialmente na literatura e posteriormente junto aos idosos as mudanças na forma e
1 Brincadeira Popular de cunho folclórico praticada comumente na rua por crianças.
2 Idem.
3 Idem.
4 Idem.
5 Idem.
6 São versinhos com temática infantil recitados em brincadeiras de crianças. Pois possuem uma rima fácil. 
7 São frases folclóricas criadas pelo povo com objetivo lúdico, pois, apresentam dificuldade na pronúncia.
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“O tempo não para”: uma análise do brincar de ontem e de hoje a partir da memória lúdica [...]
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significado das brincadeiras populares, bem como propiciar subsídios que possam auxiliar as
pessoas que queiram conhecer sobre a cultura lúdica, possibilitando a compreensão das
inúmeras transformações do brincar.
Trata-se de um interesse pelo estudo em, não apenas descobrir quais as transformações
percebidas dos brinquedos e brincadeiras, como também é de interesse da pesquisa, resgatar e
registrar a memória lúdica de idosos contribuindo para o fortalecimento da identidade cultural
do município. Nesse aspecto, esta investigação virá promover uma contribuição para a área da
Educação Física a partir do momento em que seu foco de atenção se dirige ao lúdico, aos
jogos, brinquedos e brincadeira para o município de São Sebastião da Boa Vista – Marajó –
PA, haja vista que contribuirá para o fortalecimento da identidade cultural da região.
Destarte, esta pesquisa partiu do seguinte problema: Quais as mudanças percebidas no
perfil das brincadeiras populares, a partir da memória lúdica dos idosos no município de São
Sebastião da Boa Vistam / PA?
Objetivou-se de forma geral com este estudo analisar a memória lúdica de idosos do
município de São Sebastião da Boa Vista sobre as mudanças no perfil das brincadeiras
populares do município. E, especificamente buscou-se identificar as mudanças no perfil das
brincadeiras populares de São Sebastião da Boa Vista/PA a partir da memória lúdica de idosos
do município; avaliar as transformações ocorridas nos brinquedos e brincadeiras populares do
município de São Sebastião da Boa Vista a luz das transformações culturais das sociedades
contemporâneas e analisar as diferenças de opiniões dos idosos em relação às mudanças
ocorridas no perfil das brincadeiras e jogos populares do Município de são Sebastião da Boa
Vista.
As necessidades deste estudo apontaram para uma abordagem qualitativa e uma
pesquisa de campo, Gil (2002) escreve que neste tipo de investigação estuda-se um único
grupo ou comunidade em termos de sua estrutura social, ou seja, ressaltando a interação entre
seus componentes. Com enfoque crítico dialético, pois, trata de apreender o fenômeno em seu
trajeto histórico e em suas inter-relações com outros fenômenos. Para este enfoque o homem
conhece para transformar e esse conhecimento tem sentido quando revela as alienações, as
opressões e as misérias da atual fase de desenvolvimento da humanidade; questiona
criticamente os determinantes econômicos, sociais e históricos e procura revelar as
contradições que potencializam a ação transformadora. O enfoque crítico dialético propõe
ainda, fazer análise histórico-crítica do cotidiano, discutir práticas, refletir trajetórias,
cartografar movimentos coletivos, discutir estratégias e propor mudanças.
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“O tempo não para”: uma análise do brincar de ontem e de hoje a partir da memória lúdica [...]
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A pesquisa foi realizada no município de São Sebastião da Boa Vista, um município
pequeno e de uma população ribeirinha que predomina da cidade e que pertence à
mesorregião do Marajó. 
Os resultados foram obtidos a partir da análise desenvolvida por Triviños (1987,
p.161), onde o processo de análise de conteúdo foi feito através de uma pré-análise
(organização do material), descrição analítica dos dados (codificação, classificação,
categorização), interpretação referencial (tratamento e reflexão). Assim tratamos a
categorização dos dados, tendo o referencial teórico como base inicial nos levando, portanto,
a reflexões a cerca da identidade cultural a partir da ludicidade presente na memória dos
entrevistados.
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CAPÍTULO 1
A INFÂNCIA E SEUS ELEMENTOS CULTURAIS – UMA BREVE APROXIMAÇÃO
A cultura infantil vem sendo investigada com bastante interesse por diversos
pesquisadores nos últimos tempos, apesar de ser foco recente de pesquisas é tão antiga quanto
a própria infância, principalmente se consideramos a criança como um ser social. Para
compreendermos melhor sobre os sentidos e significados deste termo, buscaremos
inicialmente a compreensão do termo infância para então caminharmos em direção aos
elementos culturais da infância, o brincar e a ludicidade.
A infância, tal qual conhecemos hoje, é considerada uma fase da vida repleta de
sentidos e significados, mas nem sempre foi assim, para compreendermos como seconstruiu
esse conceito de infância, passearemos um pouco pela história. 
Nascimento; Oliveira (2007), apud Brancher apontam que o conceito de infância surge
no século XVII, nas classes dominantes, a partir da observação dos movimentos de
dependência das crianças muito pequenas. O adulto passou, então, pouco a pouco a
preocupar-se com a criança, enquanto ser dependente e fraco. Fato este, que ligou esta etapa
da vida a idéia de proteção. Até o século XVII, a ciência desconhecia a infância, isto porque,
não havia lugar para as crianças nesta sociedade. Em função disso esse período era
caracterizado pela inexistência de uma expressão particular às crianças. Foi, então, a partir da
idéias de proteção, amparo, dependência, que surge a infância. As crianças, vistas apenas
como seres biológicos, necessitavam de grandes cuidados e, também, de uma rígida
disciplina, a fim de transformá-las em adultos socialmente aceitos (LEVIN, 1997, ÁRIES
1973, apud BRANCHER). 
Entretanto, este apontamento levantado por Áries em História Social da Criança e da
família vem sendo criticado por muitos outros autores que defendem que a infância sempre
existiu, mesmo em sociedades mais primitivas, é possível perceber a separação de atividades
de adultos e de crianças.
Percebemos assim que a infância assume diferentes formas e posturas de acordo com o
espaço social em que está inserida, esta análise nos leva a reflexão de que não há uma única
forma de se pensar e perceber a infância uma vez que ela assume forma diferente dependendo
da sociedade em que está inserida. Assim, a cultura infantil se apresenta como um entre os
diversos processos de integração do indivíduo aos padrões grupais. 
Quando se pretende formar seres criativos, críticos, e aptos para tomar decisões, um
dos requisitos que se apresenta para tal efeito é o enriquecimento do cotidiano infantil com a
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inserção de contos, lendas, brinquedos e brincadeiras, dados os fatos que sinalizam suas
contribuições. O mundo infantil não pode ser descrito ou investigado sem que se faça
referência ao brincar e, também aos objetos do brincar: os brinquedos. A sua presença é tão
constante em todas as culturas que deixa condições para se firmar um caráter biológico nesta
atividade.
A importância de brinquedos e brincadeiras para a criação da situação imaginária é
indiscutível e, sem duvida, muito saudável a criança. O imaginário só se desenvolve quando
se dispõe de experiências que se reorganizam. 
Assim, a riqueza de contos, lendas e o acervo de brincadeiras, constituirão o banco de
dados de imagens culturais utilizados nas situações interativas. Ao brincar a criança
movimenta-se em busca de parceria e na exploração de objetos comunica-se com seus pares
se expressa através de múltiplas linguagens, descobre regras e toma decisões.
No entanto, é perceptível demasiada preocupação por parte das instituições de ensino
no que tange ao desenvolvimento de habilidades, deixando questões pertinentes à infância,
muitas vezes, de lado. Dessa forma, nota-se a relevância do “resgate” da cultura infantil por
meio das brincadeiras tradicionais. Com tal intuito, destacando que a identificação da situação
se dá por diversos professores, muitos destes têm se comprometido na luta pela melhora das
condições de ensino, considerando que na visão que leva em conta o desenvolvimento infantil
integral, um ensino de qualidade compreende a infância e seus diversos aspectos, não apenas
o desenvolvimento motriz, por exemplo.
Atualmente, estes professores têm defendido a criação de brinquedotecas, e trabalham
objetivando difundi-las, o que parece estar surtindo efeito, ou seja, o número de brinquedoteca
vem aumentando e, consequentemente, a consciência dos envolvidos nestes projetos aflora.
Brincar é coisa seria. É mais do que uma atividade sem consequência para a criança.
Brincando, ela não apenas se diverte, mas recria e interpreta o mundo em que vive se
relaciona com este mundo. Brincando, a criança aprende. Por isso, cada vez mais os
educadores, que vêm se conscientizando, recomendam que os jogos e brincadeiras ocupem
um lugar de destaque no programa escolar.
Desta forma, a infância é repleta de manifestações lúdicas. Entretanto, nem sempre a
sociedade percebeu as crianças desta forma. Conforme Ariès (1973), no século XVII, as
crianças não possuíam espaço diferenciado, pois os espaços eram sempre compartilhados com
os adultos, ou seja, neste período a criança não se diferia do adulto, antes de sua
escolarização, estas e os adultos compartilhavam os mesmos ambientes e situações, fossem
eles em casa, no trabalho ou no lúdico. Não havia um sentimento de infância ou um amparo a
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tal fase de vida, isso fez com que por muito tempo crianças fossem vistas como “adultos em
miniaturas”.
Sendo assim, as manifestações infantis são provenientes de uma cultura própria e
subjetiva das crianças. Suas expressões, nas variadas linguagens, decorrem da relação com a
cultura que a cerca, ou seja, com os bens culturais, as chamadas “bagagens” e uma porção de
valores que a sociedade disponibiliza a elas.
Nesse sentido, esta fase de vida deve ser constituída por momentos lúdicos, culturais,
sociais e históricos, para que sejam de fato vivenciados prazerosamente e lembrados de
maneira que possam deixar saudades daquele tempo.
Segundo Rousseau a idéia é de que a criança deve aprender de forma prazerosa,
respeitando sua natureza e cada uma ao seu tempo:
A natureza quer que as crianças sejam crianças antes de serem homens. Se
quisermos perturbar essa ordem, produziremos frutos precoces, que não terão
maturação nem sabor e não tardarão em corromper-se; teremos jovens doutores e
crianças velhas. A infância tem maneiras de ver, de pensar, de sentir que lhes são
própria, nada menos sensato de querer substituí-las pelas nossas [...]. (ROUSSEAU,
apud BRANCHER 1981 p. 75). 
 Portanto, se faz necessário a presença da cultura infantil, pois nela a criança se molda,
constrói sua própria história lúdica, aprende a criar situações e resolvê-las. Então vemos a
relevância que esta fase de vida exprime em relação ao contexto lúdico.
Para Sarmento (apud SILVA, 1997) “a cultura da infância exprime a cultura da
sociedade onde esta inserida. Na brincadeira a criança transforma e amplia os conhecimentos
previamente adquiridos”.
Vemos então a importância, não só das brincadeiras, mas também de brinquedos para a
cultura infantil. Ao brincar a criança se movimenta, busca parcerias e aprende, pois, a mesma
se desenvolve pelas experiências e pela interação.
Dessa maneira quando se fala de cultura infantil, tornam-se indispensáveis
comentários sobre os jogos, brinquedos e brincadeiras. O lúdico. Uma vez que tais elementos
fazem parte desta fase de vida e que proporcionam alegria, aprendizagem de forma lúdica e
prazerosa.
Compreendendo o conceito de jogo
Assunto bastante complexo, por sua abrangência e por permear vários fatores: como
culturais e sociais. Tentaremos conceituar o jogo através de várias concepções de autores
importantes em nosso marco teórico.
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Definir o jogo é uma tarefa bastante árdua, pois percebemos vários contrapontos, mais
poderemos chegar a um denominador comum. Pode-se de certo modo associar primeiramente
o jogo a “subjetividade humana”, o mundo imaginário da criança, do adulto e do idoso.
Podemos falar ainda, que no jogo somos livres para fazer, pensar e falar como quisermose
com quem quisermos (amigo imaginário), ao jogar, o mundo real não se faz presente,
esquecemos de tudo que possa nos preocupar.
 Em relação a etimologia da palavra jogo, Mariotti (2003) nos aponta a origem da
palavra jogo dizendo que “a palavra jogo vem de jocum, palavra de origem latina que
significa brincadeira, burla. O jogo é, pois, o diferente do cotidiano, o diverso do estabelecido,
é criatividade mesma”. No jogo o ser humano pode criar e recriar, ele se faz presente na
personalidade de cada um.
Para auxiliar em relação à definição de jogo, Johan Huizinga (1997, p. 33) estimula a
definir o jogo da seguinte forma:
O jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, executada dentro de certos e
delimitados limites de tempo e de espaço, seguindo regras livremente consentidas,
todavia absolutamente obrigatórias. É uma atividade desligada de todo e qualquer
interesse material, não podendo por sua vez absorver algum lucro e vem
acompanhado de um sentimento de tensão e de felicidade e também de uma
consciência de ser diferente da vida cotidiana.
Assim, Huizinga esclarece que o jogo é uma atividade, cuja finalidade é brincar e
jogar em determinado local de forma a constituir regras que sejam de caráter subjetivo, ou
seja, podemos criar as regras sem seguir à risca caracteres desportivos. Porém, quando
criadas, devem ser obedecidas dentro do contexto do jogo, seguindo um propósito ou objetivo
com sensações emocionais.
Acrescentando a definição do jogo temos Caillois (1990, p. 26). 
Uma atividade livre e voluntária, fonte de alegria e divertimento. Nele o jogador se
entrega espontaneamente, de livre vontade e por exclusivo prazer, tendo a cada
instante a possibilidade de optar pelo retiro, silêncio, recolhimento, solidão ociosa
por uma atividade mais fecunda. O jogo é essencialmente uma ocupação separada
do resto da existência e é realizado em geral dentro de limites precisos de tempo e
lugar.
 Por fim, jogar é esquecer-se de tudo aquilo que é constitucionalizado ou dotado de
regras estabelecidas, jogar é usar a imaginação e ir além, ultrapassar dimensões e se livrar do
mundo real por alguns instantes e viver no mundo imaginário no qual se pode tudo.
Segundo Mariotti, (2003, p.138) Jogo “é o meio pelo qual a criança conhece seu corpo
e o revela para o mundo”, em um jogo qualquer, a criança pode optar por quem quer ser,
como pode se vestir, onde quer estar, com quem quer estar e o que quer ser, basta criar ou
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imaginar. É preciso transformar o presente, tanto a criança, quanto o adulto e/ou idoso são
capazes de transformar, de imaginar seu mundo como queira. 
 Através da sua subjetividade pode-se modificar o impossível em possível, o irreal no
real. Mariotti (2003, p.138) comenta que “o jogo é natural ao homem desde sua condição
animal. Permite-lhe elevar-se, satisfazer-se e aumentar sua estima”. Assim o jogo ou jogar
proporciona uma sensação de bem-estar, satisfação, lazer e alegria.
Aprofundando ainda mais o tema expõe-se que: “o jogo implica uma atividade natural
e espontânea na qual participam todos sem limites de idade, através da invenção, criação e
expressão” (MARIOTTI, 2003, p. 139).
Segundo tal concepção, o jogo virá a ser um momento de liberdade, na qual segundo o
autor se faz naturalmente e espontaneamente. É o momento em que temos liberdade de
expressão, de montar algo que não esteja vinculado à vida cotidiana, momento no qual não
existem crianças, adultos e idosos, mas, simplesmente jogadores, personagens ou vidas,
simplórias vidas sem compromisso com o mundo real. 
Desse modo o jogo, a brincadeira e os brinquedos são vitais, pois nos condicionam ao
desenvolvimento do corpo, do cognitivo e afetivo, propiciando o desenvolvimento da
espontaneidade, liberdade, capacidade criadora e habilidades motoras.
Em relação ao espaço do jogo Caillois (1990) diz “que em todos os casos, há um
monopólio do jogo e o mesmo é um universo restrito, protegido e fechado, é um espaço
verdadeiro e sincero”. 
Portanto, é nesse mundo que o jogo se faz presente, desenvolvendo idéias subjetivas
ao mundo criativo infantil. A criança burla situações impossíveis de se fazer no mundo real,
mas que pra ela faz todo sentido e a mesma consegue executar na sua criação, por isso se
torna um universo protegido. No seu mundo tudo é real ao seu parecer, a criança cria e
inventa.
Brinquedos: o meio de transporte ao mundo imaginário
Desde os tempos da antiguidade o brinquedo é utilizado para várias funções, porém se
fala muito em brinquedo, mas afinal o que é brinquedo? Indagações como estas são difíceis de
surgir, portanto nos reportamos através de várias concepções, tentaremos conceituar o
brinquedo de forma objetiva e clara.
De forma empírica, o brinquedo pode ser reconhecido como um objeto que serve para
ser usado como forma de brincar ou divertir em um determinado lugar e tempo, no qual
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qualquer ser humano pode comprá-lo ou fazê-lo inclusive manuseá-lo como desejar. Também
os brinquedos podem ser diferenciados sintetizando assim várias características, no mundo
real e no mundo imaginário.
O brinquedo é mais que um simples objeto, é um meio de transporte para a
imaginação, uma ação lúdica, dirigida e voltada prioritariamente para brincar, para o lazer e
geralmente vinculado ao universo infantil. Pois quando se fala em brinquedo associa-se
rapidamente à criança, não deixando de lado o adulto e o idoso, mas o foco maior, e uma das
influências que ajudam a reforçar esta visão é a tradição de culturas que ligam o brinquedo à
criança.
A partir desse contexto Oliveira, (1986 apud MARCELLINO, 2003, p.91) propõe que
o brinquedo “trata-se de um objeto, palpável, finito e materialmente construído, podendo-se
construir segundo formas variadas de criação, desde aquelas artesanais até as inteiramente
industrializadas”.
Segundo Kishimoto (2008) relata que “o brinquedo supõe uma relação intima com a
criança e uma determinação quanto ao seu uso, ou seja, a ausência de um sistema de regras
que organizam sua utilização”. Desse modo, se entende que o brinquedo é algo que se pode
construir de várias formas e com uma diversidade de materiais, até mesmo os que fazem parte
do nosso cotidiano mostrando que o brinquedo está em direta conexão com a criança, na qual
pode fazer uso do seu brinquedo da maneira como queira.
Através de uma forma dedutiva verifica-se que o brinquedo é algo que serve para
brincar, mas existem outras funções atribuídas ao mesmo. De modo literário, seguindo a
consulta ao dicionário Larousse (1982) observa-se o seguinte significado de brinquedo,
“Objeto destinado a divertir uma criança, suporte de brincadeira”. 
Logo, a expressão “divertir” nos leva a pensar no ato de brincar, então se conclui que o
brinquedo é um objeto ligado diretamente à criança, que tem como finalidade servir de
suporte ou meio para uma determinada brincadeira, podendo ser construído
diversificadamente até mesmo com a própria imaginação.
 
As brincadeiras no contexto lúdico
Outra questão a ser analisada são as brincadeiras, bastante utilizadas pelas crianças na
escola, na rua e dentro de casa e pelos adultos. Todavia primariamente pelas crianças, pois as
brincadeiras fazem parte do universo infantil. Então vejamos o que são as brincadeiras.
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Ao se tratar das brincadeiras, nos transportamos para a infância, onde as mesmas
predominavam com nomes de amarelinha, papagaio, pipa ou rabióla, a brincadeira de taco, as
de corridascomo pira-pega, as de pique - esconde, queimadas, bandeirinhas, pira-cola,
esconde-esconde peladas entre outras. Portanto, a brincadeira é a prática vivenciada pelo ser
humano com o intuito de se divertir, não importa o tipo da brincadeira, seja uma brincadeira
simplória ou sem significado, o importante é o brincar. Por outro lado a brincadeira também
prepara o universo infantil à vida real. Segundo Chateau (1987) a brincadeira prepara para a
vida séria, também se torna um aliado na aprendizagem infantil, no qual aqui é visto como
uma pré-realidade com objetivos a se realizarem no futuro, a brincadeira é um artifício pela
abstração: cozinhar pedras é uma conduta mais simples do que a da cozinha real, porém é
nessa conduta simplória que se vai formando e se constituindo uma futura cozinheira.
Nesse contexto, de forma literal recorremos a Larousse (1982) que conceitua
brincadeira como: “ação de brincar, divertimento. Gracejo, zombaria. Festinha entre amigos
ou parentes. Qualquer coisa que se faz por imprudência ou leviandade e que custa mais do que
se esperava: aquela brincadeira custou-me caro”.
 Dessa forma, a brincadeira basicamente significa ou refere-se ao ato de brincar, ao
prazer da diversão e como se desenrola seu comportamento dentro do seu contexto, tempo e
espaço.
A brincadeira contribui também para a vivência cultural infantil de seu meio social,
além de proporcionar o prazer e o divertimento de modo geral. Quando brinca, a criança
também pode realizar representações da vida cotidiana, como a superação de obstáculos em
uma brincadeira, fazendo com que ela pense e reflita como fará para superá-lo e dar
continuidade à atividade.
O brincar é uma situação favorável para a aprendizagem infantil, na qual a criança
desenvolve seu lado cognitivo sempre do mais simples ao mais complexo, justamente pelas
inúmeras situações do brincar, do interagir, do imaginar e com outros problemas de conteúdos
da escola.
Portanto, as brincadeiras exercem um papel fundamental durante a formação da
criança, pois brincadeira é a ação de brincar, de se divertir ao máximo, e com isso a criança
desenvolve sua criatividade e seu desenvolvimento motor.
 
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“O tempo não para”: uma análise do brincar de ontem e de hoje a partir da memória lúdica [...]
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A relação dos elementos lúdicos na infância
 
As relações entre os elementos da ludicidade estão presentes no universo infantil e
perduram por toda a vida humana, pois, são recursos lúdicos constitutivos da cultura do
homem. 
Por outro lado tanto Piaget (1975) como Winnicott (1975), comentam que as
concepções de jogo, brinquedo e brincadeira só se constituem ou se fazem presentes no
decorrer da vida diária do ser humano, através de suas vivências pessoais, pois é por meio da
subjetividade de cada um que são determinados e assimilados as maneiras para se entender o
jogo, o brinquedo e a brincadeira. Nesse sentido o ser humano nasce para aprender, pois é
de sua natureza ser curioso. Decorrente disso nasce ainda para descobrir e ao descobrir, o ser
humano absorve conhecimentos. 
 Desta maneira há evolução, pois todos os dias o ser humano procura, descobre e
aprende novidades, seja através do jogo, brinquedo ou brincadeira, ou por meio do contato
com pais ou culturas que o cercam. A criança descobre o mundo quando joga, brinca se
integra e conhece a si mesma. Por meio do brinquedo cria situações reais e irreais.
Ao mencionarmos a importância dos elementos lúdicos para a vida humana e a
diversão da criança, citamos Santos (1999) que dentre seus enfoques destaca que o brincar
tem-se revelado, entre outras coisas, como uma estratégia bastante favorável para a criança
aprender. Jogando também se aprende de forma prazerosa, parte-se do princípio de que toda
criança brinca, por conseguinte, através do brincar a criança atenda seus interesses e
necessidades subjetivas.
A partir do momento em que compreendemos que o brincar é dotado de toda a
liberdade e prazer, percebemos que o jogo, o brinquedo e a brincadeira produzem
experiências positivas que são registradas e nos indivíduos por toda a sua vida.
Em relação às brincadeiras as crianças reproduzem os seus conhecimentos já obtidos
antes, para criar personagens da sociedade em uma brincadeira, por exemplo, nas brincadeiras
de “casinha” a criança assume e distribui papéis como: pai, mãe e filho (a) que por sua vez se
fazem presentes na sociedade. Basta dizer que a criança possui o conhecimento através da
imitação, ou seja, são os espelhos de pessoas conhecidas e que fazem parte do seu mundo
diário.
Uma boneca permite à criança várias formas de brincadeiras, desde a manipulação
até a realização de brincadeiras como “mamãe e filhinha”. O brinquedo estimula a
representação, a expressão de imagens que evocam aspectos da realidade.
(KISHIMOTO, 2008, p. 18).
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Compreende-se que há uma ligação direta com relação às brincadeiras e a realidade do
mundo infantil. No que se refere ao brinquedo, é o meio pelo qual a criança se utiliza para
brincar, é uma relação entre a ação e o suporte, ou seja, o brinquedo é o meio que a criança
obtém para exercer suas atividades recreativas que no caso convém ressaltar são as
brincadeiras ou o ato de brincar.
O brinquedo tem seu papel na vida humana, uma vez que possibilita o
desenvolvimento de diversos aspectos dentre eles a criatividade, tornando o homem criativo e
reprodutor de conhecimentos da realidade, formador de opiniões e concepções.
O brinquedo expõe a fantasia da criança para certas realidades. Segundo Kishimoto
(2008, p. 18).
Admite-se que o brinquedo representa certas realidades. Uma representação é algo
presente no lugar de algo. Representar é corresponder a alguma coisa e permitir sua
evocação, mesmo em sua ausência. O brinquedo coloca a criança na presença de
reproduções: tudo o que existe no cotidiano, a natureza e as construções humanas.
Pode-se dizer que um dos objetivos do brinquedo é dar à criança um substituto dos
objetos reais, para que possa manipulá-los.
O brinquedo desperta na criança a imaginação não só do meio em que vive como
também criando o seu imaginário em relação à mídia.
Podemos observar na afirmação de Kishimoto (2008, p. 18).
Os brinquedos podem incorporar também um imaginário preexistente criado pelos
desenhos animados, seriados televisivos, mundo da ficção científica motores e
robôs, mundo encantado dos contos de fada, estórias de piratas, índios e bandidos.
Ao representar realidades imaginárias, os brinquedos expressam, preferencialmente,
personagens sob forma de bonecos, como manequins articulados ou super-heróis,
mistos de homens, máquinas e monstros.
É importante para a criança pensar, criar e se integrar. Kishimoto (2008, p. 19) também
comenta que “o brinquedo propõe um mundo imaginário da criança e do adulto, criador do
objeto lúdico”.
 A criança é um ser brincante, precisa de elementos para brincar, mesmo que não tenha
acesso a objetos do seu dia a dia como, carros, aviões entre outros, é a necessidade de brincar
na infância que o faz pensar e imaginar. Criando circunstância na qual pode enriquecer sua
brincadeira de forma a compreender vários casos que aumentam sua percepção e
conhecimento. 
A brincadeira é extremamente excitante. Compreende-se que é excitante não
primariamente porque os instintos se encontram envolvidos; isso está implícito. A
importância do brincar é sempre a precariedade do interjogo entre a realidade
psíquica pessoal e a experiência de controle dos objetos reais. (WINNICOTT, 1975,
p. 71).
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“O tempo não para”: uma análise do brincar de ontem e de hoje a partir da memória lúdica [...]
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A importância do brinquedocompete a despertar o interesse e a imaginação da criança.
Portanto, a atividade lúdica é de suma importância para o desenvolvimento do homem, pois a
mesma só brinca porque sente necessidade de diversão, é como se fosse uma necessidade
básica, como, por exemplo, é o caso da “alimentação”, assim é o brincar para a criança. Então
o jogo, o brinquedo e a brincadeira, além de fornecerem prazer e diversão, proporcionam
também vivências sociais de forma lúdica e prazerosa.
Enquanto elementos da cultura encontramos as manifestações do jogo, brinquedo e
brincadeira em diferentes forma de apresentação, conforme a região em que se manifestam
tomam nomes e formas diferentes. Outro fator que podemos considerar como determinante é
período em que são brincadas, pois os jogos, brinquedos e brincadeiras se transformam com o
tempo. Assim, a fim de reconhecermos o local onde posteriormente iremos discutir a memória
lúdica de idosos, passaremos a conhecer de onde nossos atores sociais estarão falando: o
município de São Sebastião da Boa Vista localizado na ilha do Marajó.
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CAPÍTULO 2
A ILHA DO MARAJÓ: SEUS ASPETOS GEOGRÁFICOS E ETNO-CULTURAL
A ilha de Marajó é uma ilha brasileira do estado do Pará, localizada na foz do rio
Amazonas no arquipélago do Marajó.
Vem ser questionada em 1665, por questões de disputas de posses e dívidas, a ilha foi
passada hereditariamente sendo a priori doada como capitania por Dom Afonso VI ao
secretário do Estado, Antonio de Souza Macedo e sucedendo ao seu filho Luis Gonçalo
Macedo (primeiro barão de Joanes), mas tarde ao neto (Antonio de Souza Macedo) e
finalmente ao herdeiro deste (Luis de Sousa Macedo) que perde o domínio sobre ela mediante
uma indenização (3000 cruzados). Em 1754, Marajó é reincorporada a coroa. 
Segundo o plano de desenvolvimento territorial sustentável do arquipélago do Marajó
(2007) a ilha do Marajó foi Descoberta pelo espanhol Vicente Pizón e batizada como Ilha
Grande de Joanes, a ilha recebeu neste mesmo ano o nome de Marajó, que em tupi significa
“barreira do mar”. O Arquipélago, formado por um conjunto de ilhas que constitui a maior
ilha fluvial do mundo, com 49.606 Km2, está integralmente situado no Estado do Pará e
constitui-se numa das mais ricas regiões do País em termos de recursos hídricos e biológicos. 
Apresenta superfície baixa e relativamente plana, onde se encontra os tesos (porções
de terras altas que normalmente não são inundadas pelas cheias), as baixas, as várzeas e os
igapós que quebram a extrema horizontalidade do terreno. As matas propriamente ditas são
formadas por árvores imensas e produtivas, entrelaçadas umas às outras por imensos cipós e
parasitas que as cobrem e tornam mais espessa a floresta. O rio Amazonas banha a maior parte
da ilha e, a sudoeste, a água barrenta dos seus braços confere um aspecto peculiar ao solo de
suas margens: a exuberante mata de igapó, cortada por inúmeros igarapés, paranás e furos, é o
cenário mágico da fauna regional. A leste, o Marajó é constituído de vastos campos mistos
onde predominam gramíneas e leguminosas.
A área do plano compreende 16 (dezesseis) municípios que compõem, segundo o
IBGE, a mesorregião do Marajó, com semelhanças geográficas, econômicas e sócio-culturais.
São eles: Afuá, Anajás, Bagre, Breves, Cachoeira do Arari, Chaves, Curralinho, Gurupá,
Melgaço, Muaná, Ponta de Pedras, Salvaterra, Santa Cruz do Arari, Portel, Soure e São
Sebastião da Boa Vista, onde realizaremos um breve levantamento da memória lúdica de
idosos para compreendermos melhor as transformações das brincadeiras e brinquedos
populares.
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Figura 1 - Arquipélago do Marajó 
São Sebastião da Boa Vista Histórico e Aspectos Sócioculturais
 Figura 2: Imagem da praça matriz de São Sebastião da Boa Vista
Fonte: www.naveneza.net
A origem do município vem dos tempos coloniais. O nome de São Sebastião da Boa
Vista foi dado por Mendonça Furtado, ao criar a freguesia de São Sebastião, o padroeiro da
cidade, já o termo Boa Vista, segundo Ferreira Pena, “pelo fenômeno de miragem que oferece
a vista do povoado dos que dele se aproximam”.
 Fonte: Diário de Bordo 2007, 2008 e 2009, PT –HNU apud http://geopara.blogspot.com/
(Adaptado pelo autor)
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No ano de 1758, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, presidente da então
concebida província, concedeu o predicado de freguesia, sob o nome de “São Sebastião da
Boa Vista”, que em seguida viera a perder tal categoria em época desconhecida, sendo
anexado à freguesia de São Francisco de Paula, pertencente ao município de Muaná.
Em 1868, no dia 23 de Outubro, voltou a possuir o título de freguesia de São Sebastião
da Boa Vista e em 05 de Abril de 1872, foi lhe concedida à categoria de vila, criando-se assim
o município, que foi instalado a 07 de janeiro do ano seguinte, sob a presidência de Posidônio
Rodrigues de Monfredo.
A lei de nº. 944, de 18 de agosto de 1879, suprimiu-lhe a categoria de vila, extinguindo
o Município que, no ano seguinte com a lei n.º 963, de 8 de março, foi restaurado e sua
reinstalação acontecendo em 7 de janeiro de 1881.
São Sebastião da Boa Vista continuou sofrendo pressões dos meios oficiais e, com a
lei n.º 1,084, de 6 de novembro de 1889, o houvesse restaurado, continuou, entretanto sem ter
sido instalado.
Somente em 1922, o município de São Sebastião da Boa Vista voltou a ter seu
território incorporado ao de Muaná, através da lei n.º 2,116, de 3 de novembro e, em 30 de
dezembro de 1943, com decreto n.º 4,505, o Município foi reinstalado. 
Quanto a parte cultural podemos dizer que o município tem de sobra, as manifestações
culturais existem em todos os aspectos a começar pela religiosa como a festividade de São
Sebastião cujo vem a ser Padroeiro da cidade, comemorado pela população no período de 10 a
20 de janeiro e o Círio de Nazaré, no segundo domingo de Outubro, levando muitas pessoas a
procissão que sai da capela da vila Cocal até a catedral de São Sebastião. 
O patrimônio cultural, antes pouco expressivo, só existia um único grupo organizado
de carimbó, cujo nome denominava-se “Grupo Sereia”, sofreu importantes alterações, com a
criação de novos grupos folclóricos como: o Grupo “Papa – Manga” e o Grupo de Artes e
Expressões Marajoaras “ARTEMAR”, além de outros, Bois-bumbás e cordões do Tucano e da
Garça, danças como o síria e a dança do açaí. 
São Sebastião da Boa Vista é regado de manifestações culturais, onde predominam
culturas populares ligadas ao folclore como: danças, músicas, cordéis, provérbios, cantigas de
roda, mais conhecidas pelos moradores como as famosas “Modinhas”. Lendas de Boto, Mãe-
do-mato, Matinha pereira que, segundo relatos através de história oral dos moradores mais
velhos vinha às madrugadas buscar “tabaco”, Mapinguari, superstições entre outros.
No artesanato local, os destaques maiores são para as peças confeccionadas em argila
e fibras em geral. A economia é pautada na pesca, no comércio e na extração, venda e
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industrialização do Açaí e do Palmito. A vegetação é representada por campos cerrados e
áreas de capoeiras, onde a cobertura primitiva foi removida para o cultivo de espécies de
subsistência e as margens dos cursos d’água são ocupadas pela grande abundância de
palmeiras de açaizeiros.
São Sebastião da Boa Vista é um município de ecossistema peculiar, com grande
número de rios, furos e ilhas, destacando-se osrios Pará e Pracuúba; furos Boa Vista e
Laranja, e as ilhas de Santo Antônio, Chaves e Coroca. Todos estes aspectos topográficos do
município lhe concedem o pseudônimo de a “Veneza do Marajó”, devido o município ser
cercado por igarapés, baías e furos que cortam a cidade.
 Figura 3 - Imagem aérea do Município.
Fonte: www.naveneza.net
O município pertence à mesorregião do Marajó e à microrregião furos de Breves,
fazendo limites ao Norte com Anajás; a Leste com Muaná; ao Sul com o município de
Limoeiro do Ajurú e a Leste com Breves e Curralinho, sendo todas essas ilhas pertencentes ao
Arquipélago do Marajó. Sua população segundo dados do IBGE estimados em 2004 era de
19. 114 habitantes, em 2008 o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística),
estimulou uma população de 21.499 Boa-vistenses, já em 2010 O IBGE calculou uma
população de 22.890 para uma Área de 1.632,218 km². Localiza-se a uma latitude 01º43'03"
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sul e a uma longitude 49º32'27" oeste, estando a uma altitude de 2 metros. Sua população
segundo o senso de 2010 é 22.758 habitantes. 
É uma localidade tipicamente marajoara, com um povo bastante hospitaleiro e alegre.
É nesse contexto, que abordaremos através da memória ou História Oral, dos moradores mais
velhos todos estes aspectos, possibilitando um olhar critico sobre as mudanças e permanências
nos mesmos, no qual estão inseridos brinquedos e brincadeiras, seguidas das influências do
mundo tecnológico no município de São Sebastião da Boa Vista. Compreendemos aqui a
suma importância dos velhos para tal pesquisa, uma vez que será nossa fonte primária para o
desenvolvimento da mesma e também servirá a dar maior importância a esse grupo social.
SÃO SEBASTIÃO DA BOA VISTA A “VENEZA DO MARAJÓ”
 
 Figura 4: Imagem de um dos rios que cortam a cidade.
Fonte: www.naveneza.net 
São Sebastião da Boa Vista, no sul da ilha de Marajó, às margens do rio Boa Vista,
encanta com suas paisagens tipicamente amazônica. A região é entrecortada por rios e
igarapés que se tornam um fascínio aparte aos que chegam ao município via transporte fluvial.
Serpenteando os rios em embarcações, é fácil presenciar uma floresta densa e fechada, porem
rica em diversas espécies da fauna e da flora, em alguns pontos alagados em outros secos,
propensos a produção de roçados que têm como seu principal criador uma população
ribeirinha que se instalou às margens desses rios.
O município de São Sebastião da Boa Vista encanta não só pela sua beleza típica de
cidade marajoara, mas por ser dividida em duas: a cidade velha e cidade nova, unidas pela
ponte Romeu Monfredo, construída sobre o furo (braço de um rio) de Santo Antônio. O furo,
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que nasce no rio Boa Vista e deságua no furo Urucuzal, é passagem permanente de
embarcações, o que faz com que São Sebastião da Boa Vista seja conhecida carinhosamente
como a “Veneza do Marajó”, numa alusão a cidade de Veneza , na Itália.
A cidade possui diversas ruas na sua maior parte concentradas na cidade velha. Dentre
as principais, destaque para as ruas Coronel Monfredo, 18 de novembro e Lidia Dorotéia
Tavares. Nestas podemos encontrar a Praça da Matriz, o Prédio da Prefeitura, Igrejas
Católicas e Evangélicas, Escolas e centros comerciais. Já na cidade nova, localizada do outro
lado do furo Santo Antonio, é onde se pode encontrar a Avenida das Acácias, a principal rua
dessa área. Nela se localizam o Hospital Municipal, Escolas, Correios, Delegacia, Fórum e
Universidades.
 Com uma área de 1.576,4 quilômetros quadrados, o município com aproximadamente
22 mil habitantes, tem uma população humilde e hospitaleira que, pela característica de cidade
pequena, estabelece uma relação de vizinhança entre as pessoas. Estas têm forte envolvimento
nas manifestações religiosas e da cultura popular.
As manifestações culturais e religiosas têm apelo forte no município. Somente grupos
folclóricos são pelo menos 15, que com suas danças, músicas e coreografias, traduzem e
divulgam a cultura local. Destaque para os Grupos “Artemar”, “Papa-manga”, “Boi-bumbá
Malhadinho”, “Boi-bumbá Estrela D’Alva”, quadrilhas “Me Beija” e “Essência Marajoara”. A
maioria desses grupos, já possuem um trabalho desenvolvido a bastante tempo junto aos
jovens da comunidade, tornado suas práticas culturais inovadoras e ao mesmo tempo
tradicionais. Elas são transmitidas de geração para geração a cada ano em que realizam suas
atividades culturais, pois incorporam novos brincantes. 
O artesanato também se diversifica com destaque para as peças confeccionadas a partir
do miriti, passando pela tala e fibra de jupati e à argila que ao chegando às mãos do caboclo
marajoara, esses materiais ganham formas, cores e riquíssimos detalhes, e se transformam em
chapéus, cestas e no que mais a criatividade permitir. 
As manifestações religiosas ganham espaço com o Círio de Nazaré, realizado em
outubro, e com a festividade de São Sebastião, de 10 a 20 de Janeiro. O santuário de São
Sebastião é originário da primeira igreja erguida em homenagem ao Santo. Ainda com relação
ao aspecto religioso, o município possui também uma forte presença das igrejas tidas como
“protestantes”. Igrejas como Assembléia de Deus, Igreja do Evangelho Quadrangular,
Adventistas, Testemunha de Jeová, entre outras e suas referidas congregações.
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 Figura 5: O lindo pôr-do-sol que enaltece as tarde da cidade. 
 Fonte: www.naveneza.net (Acesso em: 20/05/2011)
Assim é São Sebastião da Boa Vista, com seus encantos naturais, culturais e religiosos,
sempre conquista os que chegam. No entanto, não se pode vislumbrar-se com o belíssimo pôr-
do-sol pousando sobre o piscoso rio Boa Vista, sem ignorar os problemas que toda cidade,
quando submetida ao progresso e ao crescimento populacional, apresenta. Infelizmente o
município ainda possui problemas no saneamento, assistência à saúde e moradia. Fatores que
não são capazes de ofuscar o brilho e a riqueza de um povo humilde, trabalhador e detentor de
muita fé e esperança em dias melhores. 
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CAPÍTULO 3
A CULTURA POPULAR E O AVANÇO TECNOLÓGICO
 A cultura popular é uma série de práticas e concepções religiosas e estéticas tidas
como tradicionais, ou seja, suas manifestações estão ligadas ao folclore. Antônio Augusto
Arantes no livro O que é cultura popular (2007), concebe que esta forma de cultura está
ligada à “tradição”, relacionando-a aos traços restritamente ligados ao passado. A cultura,
apesar de ser uma espécie de produto significativo da atividade social do homem, se
transforma, agregando novos significados de acordo com o contexto social e histórico ao que
se tenta reconstituir. “(...) a cultura popular e os que a produzem não estão isolados dos
demais seguimentos da sociedade”. (2007).
A cultura popular vincula-se ao senso comum. Segundo Arantes (2007, p.14) “há
diferenças sociais entre um arquiteto e um mestre-de-obras”. Pois, de um lado existe o
científico (arquiteto) e do outro o empírico (mestre-de-obras), este por sua vez segue apenas
sua habilidade que foi constituída durante a vida ou por suas experiências. Então surge o
popular associado ao tradicional, que já mencionado posteriormente liga-se ao povo. Já para
Marilena Chauí em sua obra Conformismo e Resistência comenta que a palavra popular
deriva de povo e define “o Povocomo vontade universal e legislador soberano, unidade
jurídica dos cidadãos definida por lei”. A cultura do povo-popular é a daqueles que possuem
conhecimento esclarecido, que tiveram acesso a uma educação formal nas escolas. E a cultura
do povo-plebe é a daqueles que não possuem um saber formalmente produzido, ou seja, o
saber da escola. A partir deste conflito de concepções Chauí escreve:
A Cultura Popular: primitivismo: (isto é, a idéia de que a cultura popular é
primitivismo e preservação de tradições que, sem o povo, teriam sido perdidos),
comunitarismo (isto é, a criação popular nunca é individual, mas coletiva e anônima,
pois é a manifestação espontânea da Natureza e Espírito do Povo) e purismo (isto é,
o povo por excelência é povo pré-capital, que não foi contaminado pela vida urbana)
(CHAUÍ, 1986, p.19).
 
Portanto, a cultura popular não está ligada ao conhecimento científico, pelo contrário,
ela diz respeito ao conhecimento vulgar ou espontâneo, ao senso comum, aquela que é
compreendida e emana do povo, preservada e vivenciada pelo mesmo, se ligam as tradições
que automaticamente lembra o passado que tem papel importante e crucial neste estudo, pois,
analisar as brincadeiras e brinquedos antigos e suas transformações dizem respeito ás
tradições, costumes e aos idosos que já as vivenciaram.
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Pensar a “cultura popular” como sinônimo de “tradição” é reafirmar constantemente
a idéia de que a sua idade de ouro deu-se no passado. Em conseqüência disso, as
sucessivas modificações por que necessariamente passaram esses objetivos,
concepções e práticas não podem ser compreendidas, senão como deturpadoras ou
empobrecedoras. Aquilo que considera como tendo tido vigência plena no passado
só pode ser interpretado, no presente, como curiosidade. (ARANTES, 2007, p. 17).
Desse modo, a cultura popular associa-se ao presente, uma vez que o importante não é
apenas o objeto produzido, mas o próprio produtor, ou seja, o homem do povo que se faz
“presente” no seu tempo. Logo o popular será contemporâneo, porém ao seu tempo, lugar e
espaço. Fica claro que a cultura popular, neste contexto dar-se a qualquer manifestação
cultural e tem como essência o imaginário, que apresenta uma riqueza inestimável, um campo
bastante fértil no qual revelam sentimentos e segredos que desembocam e se desmancham em
lendas, mitos, contos, crendices, superstições, dança, arte, música, brinquedos e brincadeiras
populares, entre outras belezas que são feitas pelo povo, no qual o mesmo participa.
A cada dia o mundo dos brinquedos e brincadeiras vem perdendo o foco tanto da
sociedade, como das crianças da contemporaneidade. Devemos atentar para um suposto
motivo obvio que é a exacerbada produtividade de tecnologia decorrente de um mercado
totalmente capitalista, no qual, se tem por objetivo único a produção que é contextualizada
pelo conhecido termo da mais – valia, com isso há exploração da sociedade e
consequentemente o lucro, com isso a cultura popular, a tradição, o folclore, as brincadeiras e
o próprio lúdico estão sendo retirados do mundo infantil. 
Atualmente as crianças brincam de forma estática, ou seja, paradas com os olhos a
frisar a tela de um computador, no qual estão inseridos jogos da Internet, em rede, jogos de
pura violência que ensinam a atirar e matar, no qual brinquedos são armas de fogo e as
brincadeiras têm por finalidade matar ou burlar leis da sociedade. Com isso, se deixa em
segundo plano a criança, já que “a própria criança é movimento”, pois é este que acompanha
todo o desenvolvimento intelectual, afetivo e motor da mesma.
Outro ponto está no desinteresse muito grande dos pais ao comprarem presentes
industrializados, acreditando ser um instrumento tecnológico com maior utilidade, na vida dos
seus filhos, com isso o brinquedo da antiguidade passará a ter um significado em segundo
plano, se tornando supérfluo pela sociedade que não procura conhecer a importância do
mesmo na vida das crianças. 
Nesse contexto, a própria sociedade contemporânea adotou um padrão de poder
controlador, no qual afetou de tal maneira, que fez o homem transformar-se em um
especialista do consumismo. 
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Assim, a criança passa a desejar e se apossar de um brinquedo, mesmo que nem vá
usufruir deste, todavia por um forte incentivo da mídia, acaba adquirindo-o.
O brincar serve para obter prazer e não como meio de produção. A criança brinca
porque se sente bem, gosta, produz emoção e alegria. Desse modo não há vantagem em
comprar brinquedos tecnológicos, nos quais a mesma permanece estática, pois precisa se
movimentar, necessitando desenvolver seu lado motor, usando sua criatividade, seu pensar e
imaginar.
Cabe ressaltar que nossa sociedade está sendo domada pela produção.
Nossa sociedade, dominada que está pelo dogma da produtividade, é o túmulo da
criança e, por conseguinte, o fim do brinquedo, já que a expansão das coisas
produzidas e consumidas depende da repressão da energia humana dirigida à alegria.
Desta forma, o brincar implica numa critica radical a tal sociedade, e ainda numa
subversão de seus valores. (ALVES, 1986 apud GUIMARÃES E MATOS, 2003, p.
16).
O mundo capitalista está explicito e tende a crescer cada vez mais, porém é necessário
respeitar o tempo da criança, e ver que o brinquedo, não é apenas um objeto, mas sim uma
porta para o futuro de descobertas e aprendizagens para as crianças. É onde ela explora o
desconhecido através da sua curiosidade. Através do brincar também se integra ao mundo
social. 
Segundo Mariotti (2003, p. 147) “entre os seres humanos e os brinquedos surgem uma
comunicação de sentidos, sentimentos, sensações e efeitos. O individuo se integra a este
mundo simbólico”.
É importante ressaltar que outros fatores se fazem presentes e contribuem para a
decadência dos brinquedos e brincadeiras antigas. Mudanças no cotidiano das pessoas sempre
ocorrem, todavia, atualmente as modificações de costumes em relação aos brinquedos e
brincadeiras estão exacerbadas principalmente passadas de geração para geração, e alguns
fatores contribuem para estas mudanças na sociedade, como exemplo: antigamente os pais
não se preocupavam tanto em deixar seus filhos por muito tempo nas ruas, porém, hoje, a
violência aumenta a cada dia e trás medo aos moradores principalmente das grandes cidades,
que de certa forma, impedem que as crianças brinquem na rua.
Outro fator é a preconização dos pais em preparar as crianças para o mercado de
trabalho, atribuindo à mesma, cursos de Inglês, Informática e Cursos Profissionalizantes,
tirando por sua vez o tempo de brincar das crianças. O tempo minúsculo dos pais com os
filhos, de modo que os pais possuem a concepção de que o mais importante é que o filho
“tenha” o brinquedo, sem ao menos saber se o mesmo terá com quem brincar futuramente e
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também há a questão da minimização das famílias, implicando num maior individualismo das
crianças. Tudo isso vinculado às novas tecnologias que fazem com que os brinquedos e
brincadeiras percam seu encanto e cultura, fazendo com que a criança prefira ficar na frente
de um computador ou vídeo-game sozinho de forma estática.
A extinção dos brinquedos e brincadeiras populares
Atualmente a era digital está tomando conta do universo infantil, entretanto o mal uso
de computadores e jogos eletrônicos, vêm gerando alguns malefícios visíveis como o
sedentarismo e a obesidade. Os avanços tecnológicos são importantes como facilitadorese
auxiliadores em relação à busca pelo conhecimento, pelo saber, pela pesquisa, para questões
de estudo, porém nossas crianças, na maioria das vezes estão sendo mal orientadas quanto ao
uso destes recursos. Não queremos desqualificar os videogames e a Internet, pois na infância
a criança aprende o mundo através do que vê, logo, seu espelho são os adultos, mãe, pai, tio,
tia entre outros, devem tomar cuidado com atitudes e hábitos que possam influenciar atos na
infância.
Portanto deve-se respeitar a fase da infância, pois, nesta etapa do que a criança precisa
mesmo é de brincar e brincar muito, experimentar coisas novas, se movimentar, aprender e ser
feliz. Pois sabemos que o movimento é fundamental para o desenvolvimento humano uma vez
que promove o bom desempenho das capacidades motoras finas e grossas, que são acionadas
a todo o momento em nossas vidas. Então poderá ser por conta das brincadeiras, jogos e
brinquedos que a criança aprenderá movimentos, a conhecer o outro, a criar idéias e
compartilhá-las. Além de aumentar sua percepção, absorver coisas novas e até mesmo a
prender valores como: respeito para com o próximo, caráter entre outros.
O desenvolvimento específico de sua racionalidade e inteligência deverão acontecer
mais tarde, num momento mais adequado e propício para isso. Nesse momento, a
criança precisa de fantasia, espaço, liberdade e criatividade. Através desses
instrumentos, canalizados pelas brincadeiras, ela poderá se desenvolver de forma
integrada, crescendo intelectual, emocional e fisicamente, ao mesmo tempo
(REVISTA PRIMEIRA INFÂNCIA, 1998).
Assim a questão do brincar deve ser encarada como um procedimento natural da
infância, que traz consigo um leque de possibilidades na qual ajudará a criança em sua vida
quotidiana e futuramente adulta, coisa que não aconteceria com as diversões criadas nos
últimos tempos, justamente por causa do rápido desenvolvimento tecnológico.
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“O tempo não para”: uma análise do brincar de ontem e de hoje a partir da memória lúdica [...]
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Brincando de casinha, cuidando, limpando, exercendo sua capacidade de se dar,
meninos e meninas desenvolvem seu lado emocional; aprendem a sensação de ter
que proteger, cuidar e suprir as necessidades de uma casa. Sensações, sentimentos,
atitudes e percepções que seriam impossíveis de serem absorvidas diante da tela de
um computador, apertando botões sem parar [...] (REVISTA PRIMEIRA
INFÂNCIA, 1998).
Assim, através das brincadeiras, as crianças exercem certa preparação para uma vida
adulta tornando-se importante que elas tenham a possibilidade e o incentivo de imitarem
atividades humanas úteis e produtivas. São tarefas que sintetizam o mundo da infância se
levar em consideração o movimento, pois, ao invés de crianças só ficarem apertando botões
sem parar, além de ficarem sentadas, hipnotizadas na frente do computador. Fazendo tais
tarefas pelo menos estão se movimentando, deslocando objetos de um lado para o outro e
constituindo concepções e absorvendo-as. A criança sente a necessidade de movimenta-se é de
sua natureza exercê-la, ela cai, levanta, se machuca e chora, é inquieta e curiosa.
Por isso os brinquedos, jogos e brincadeiras populares devem estar presentes na
infância, elas possuem o poder para que haja movimento, diversão e alegria na vida infantil.
Todavia, o avanço da era digital é exacerbado e atinge o mundo infantil,
principalmente para a criança cujo brinquedo, “computador” é dado precocemente, para que
pais se sintam livres de seus filhos por horas. Por conta disto devemos nos atentar mais, em
ralação a tais fatores e proporcionar movimentação à infância. Podemos fazer isto através das
antigas brincadeiras, entre elas a macaca, pira pega, policia e ladrão e a bandeirinha que irão
auxiliar na aprendizagem do domínio corporal, além de serem divertidas e trazerem muita
alegria às crianças.
Sendo assim, fica clara a suma importância do papel que o brincar exerce na infância,
pois as brincadeiras estimulam a criança ao movimento, contudo devemos criar ciência que a
era da tecnologia já se faz presente no cotidiano infantil e temos que saber dosar este recurso
na vida da infância para que haja um equilíbrio sadio entre essas duas vertentes, pois assim,
evitaremos que uma se sobreponha a outra, todavia, especificamente nesta fase da vida
devemos saber da relevância que a ludicidade representa à infância, com isso evitaremos que
brinquedos e brincadeiras se tornem supérfluos ou ainda que sejam esquecidos em relação aos
jogos de computadores e videogames.
 
As lembranças como fator indulgente na construção da identidade cultural
 
As manifestações culturais do povo brasileiro são ricas e inúmeras. Seu registro, no
entanto, é escasso, fazendo com que a história de festa, danças e cantigas de roda, das
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“O tempo não para”: uma análise do brincar de ontem e de hoje a partir da memória lúdica [...]
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quadrinhas, versos e repentes sejam lembradas e assistidas, a partir das manifestações orais,
ocasionadas em que o tom de voz de pessoas mais velhas relata suas vivências e expressam
um campo vasto que abrange a cultura de um povo.
É importante ressaltar a relevância deste estudo com velhos, uma vez que foram deles
que coletamos informações retidas durante sua infância para que realizássemos esta pesquisa,
mostrando que por meio das lembranças dos velhos podemos constituir fases de descobertas e
de aprendizado, na qual o mesmo se torna um construtor do saber, um agente cultural, de
forma a contribuir para o conhecimento e o enriquecimento cultural e social do qual ele faz
parte.
O estudo e descrição das manifestações orais da cultura popular (cantigas de rodas,
histórias de fé e festa do povo brasileiro) precisam ser mais pesquisados para que haja maior
aquisição de conhecimento, por conseguinte a uma valorização das raízes culturais do povo e
realizando assim o processo de inclusão da classe de velhos.
Bosi (1994), em sua obra Memória e Sociedade busca valorizar a história social dos
velhos a partir das suas relações sociais, pois os consideram duplamente oprimidos pela
velhice e pela dependência social. Portanto, seu estudo permite dar voz a essa classe através
da história “vista de baixo”.
Diante dessa reflexão é que este trabalho se propõe a construir o processo de inclusão
a classe dos considerados velhos, com o intuito de valorizar as diversas manifestações
culturais desse povo como afirmativa social. Busca-se aqui também estimar a cultura como
identidade, nas rodas de ciranda ou qualquer outra manifestação de cunho cultural.
Trabalhando na construção do sujeito socialmente incluso, pois a busca do saber, integrado ao
resgate da cultura, através da identidade cultural, na aquisição do processo de inclusão, dos
velhos, pode possibilitar a ampliação da visão de mundo e valorizar a identidade cultural.
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CAPÍTULO 4
MEMÓRIAS LÚDICAS: SEUS SENTIDOS E SIGNIFICADOS
Em busca da compreensão a cerca das mudanças do perfil das brincadeiras populares
no município de São Sebastião da Boa Vista, analisaremos as falas dos informantes tendo por
base para as categorias de análise, o referencial teórico apresentado neste trabalho. Assim,
apresentamos cinco categorias que serão discutidas conforme o que obtivemos nas falas de
nossos informantes. São elas: Infância; Jogo, brinquedo e brincadeira; Diversão, prazer;
Espaço de brincar; Brincar contemporâneo.
A narrativa dos informantes descreve infância como um período muito feliz,
maravilhoso apesar de na maioria dos entrevistados ter sido um período marcado também por
muitas obrigações, trabalhos, tarefas realizadas com a família como relata a informante 1:
(...)nossas brincadeiras tinham um preço, tínhamos primeiro que limpar o pasto
(terreiro), queimar folhas secas de árvores, fazer lenha para queimar, encher o pote
(onde bebia água) tudo isso pra depois ganhar umas horas de brincadeira, ah! ia
esquecendo, ainda tinha as lições da escola.(informante 1)
O respeito pelos pais e mais velhos, também é uma lembrança muito forte da infância
dos entrevistados conforme podemos verificar nas falas abaixo:
Cada um dos filhos tinha uma tarefa, e ai daquele que não cumprisse, bastava um
olhar pra se entender que não estava gostando do que nós fazia. (...) íamos pra casa
com todo respeito e dedicação as pessoas idosas, tomávamos benção das pessoas
idosas (...) (informante 1)
Eu sempre falo pros meus filhos, que meus netos têm outra criação. Os pais de hoje
dão muita liberdade aos filhos, não existe disciplina nem ordem, obedecer passa
longe, os filhos fazem o que querem e os pais tem que fazer também o que eles
querem (Informante 3)
Um fato interessante relatado por todos os informantes é a confecção dos brinquedos,
pois na infância não tinham acesso a brinquedos industrializados, portanto valorizavam
bastante os construídos por eles mesmos ou por seus pais. Com estes brinquedos eles tinham
liberdade de manipular, fazer o que quisessem e isso se apresenta como um reforço positivo.
Hoje, os pais compram brinquedos prontos, caros e se os filhos os esbandalham
brigam, então não podia comprar se não quer que os filhos peguem. (informante 2)
Outro fator que percebemos recorrente nas falas é a questão da religiosidade. Todos
lembram momentos em que a religião esteve presente em suas infâncias;
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No mês de julho, tinha uma semana de novena pra Jesus Cristo, cada noite era de um
novenário, nós íamos de casa em casa rezar, isso era um lazer pra nós que ficava o
tempo todo em casa, antes de começar a ladainha (novena), nós íamos brincar de
roda, esconde-esconde, sapatinho branco, melancia, raminho destroncado, anelzinho
não diga nada a ninguém, essas novenas acontecia sempre em casas grandes, que
dava espaço pra nós brincar antes de rezar, porque depois que a reza começasse, não
se podia fazer nem um barulho que o cristo ralhava nós (dizia a mamãe).
(informante 1).
Depois das brincadeiras e o trabalho agente ia no culto da comunidade, rezar e
agradecer. Até hoje sou muito religioso, meus filhos e minha mulher também. Hoje,
agente percebe que não se vê mais crianças na igreja, tudo mudou, o mundo virou de
perna pro ar. (Informante 3)
Uma coisa que eu me lembro muito é às seis horas, que a minha mãe fazia era a
oração, todas às seis horas ela reunia toda família pra agradecer por aquele dia e
muitas nós fazíamos isso na frente do tendal que ficava bem na beira do rio e nós
agradecíamos pó que nós éramos muito felizes, porque nós tínhamos o rio, tínhamos
uma mata exuberante, nós tínhamos comida farta e saúde e por tudo isso nós
agradecíamos, eu tenho saudades, muita saudade desse tempo. A minha mãe, ela
fortaleceu em mim a fé (Informante 4)
Ao considerarmos a categoria jogo, brinquedos e brincadeiras, notamos nos relatos dos
entrevistados que a maioria das crianças construíam seus próprios brinquedos, se apropriando
dos recursos naturais da região, que as transportavam através de suas criatividades e
imaginações para um mundo de fantasia, como podemos observar no relato do informante 1.
Bem! Eu gostava de brincar com boneca de miriti, fruta de seringueira, bole-bole e
fazia pião de fruta de pitaíca (uma arvore) chamada de boi. Eu e minha irmã Zilda
meu irmão Djalma, fazia uma casinha no terreiro de casa e íamos brincar, fazíamos
cachimbo de barro, alguidar, panela, nossas colheres de caroço de umari (uma fruta),
mas nossas brincadeiras tinham um preço, tínhamos primeiro que limpar o pasto
(terreiro), queimar folhas secas de arvores, fazer lenha para queimar, encher o pote
(onde bebia água) tudo isso, pra depois ganhar umas horas de brincadeiras.
Outro depoimento interessante, que reforça como eram os brinquedos que as crianças
brincavam no passado é do informante 4:
(...) na minha infância, os brinquedos eram muito limitados, nós, eu nunca tive um
brinquedo comprado, mas minha mãe pra compensar fazia as bonecas de pano, fazia
de cabeça do cacho da bacaba, da cabeça do patauá, ai ela preparava uma saia,
adaptava e fazia então os nossos brinquedos, então todos eram feitos pela minha mãe
ou eram feitos pelo meu pai, (...)
No que se refere às brincadeiras percebemos que elas eram muito diversificadas como
podemos perceber na fala do informante 2:
 
Essa era a brincadeira que eu mais gostava, porque não era em casa, era numa casa
bonita, que dava pra espalhar o bole-bole na tabua, a minha era só buraco e as
bolinhas caiam todas pelo buraco. (...) Mas também gostava de pular na água muito
tempo, brincando de pira cola, ficava até de mão e pé engilhado (...)
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Outro tipo de brincadeira que observamos na fala dos entrevistados foi às populares
Cantigas de Roda, muito praticada naquela época pelas crianças:
(...) antes de começar a ladainha (novena), nós íamos brincar de roda, esconde-
esconde, sapatinho branco, melancia, raminho destroncado, anelzinho não diga nada
a ninguém, essas novenas acontecia sempre em casas grandes, que dava espaço pra
nós brincar antes de rezar, porque depois que a reza começasse, não se podia fazer
nem um barulho que o cristo ralhava nós (dizia a mamãe).
(...) era uma coisa assim, que eu tenho hoje muito na lembrança, ela se chamava
Fortaleza, era uma casa muito grande, mas tinha um salão e aquele salão dava pra
gente brincar de pata cega, sabe, de pular corda e muitas outras brincadeiras. Então,
como aquela “tome esse anelzinho não diga nada pra ninguém” e “passa esse
lencinho branco” né. Eu sempre gostei das brincadeiras cantadas, muito, muito
mesmo, algumas delas me tocavam, como por exemplo, aquela da “sinhá marreca,
que diz lá vem a sinhá marreca com seu saburá na mão” sabe! Uma música tão
bonita (...) “lá vem a sinhá marreca com seu saburá na mão dizem que vai vendendo
empadinha de camarão. Aí eu ficava preocupada com outra música que era o
sapatinho branco, porque geralmente elas arranjavam cada par pra casar com a gente
que dava raiva, toda vez que falavam assim, sapatinho branco, eu falava eu to fora
não queria brincar, mas eu gostava muito de dona chancha, “senhora dona chancha
coberta de ouro e prata descubra seu rosto que nós queremos ver”, ai era aquela
coisa, o pessoal cantava, “que anjos são esses que estão me arrodeando, de noite de
dia, pai nosso ave Maria”, ai lembrava Deus né, lembrava de ave Maria, lembrava de
tanta coisa né, eu gostava muito de dona chancha e de sinhá marreca.
Portando, observamos uma variedade de brinquedos e brincadeiras na fala dos
entrevistados, inclusive do informante 3, ressaltando as brincadeiras que os meninos mais
gostavam, construindo seus próprios brinquedos.
Então eu os meus amigos, alguns estão vivos outros não, agente ia pra debaixo da
ponte tirar Canarãna, para tirar a esponja de dentro e no cano vazio agente colocava
caroço de açaí, pra balar as pessoas. Tinha outra brincadeira que era de balar as
pessoas. Agente pegava uma forquilha tirada de um galho de árvore, amarrava uma
borracha de um lado e outro da forquilha e no meio dela colocava um pedaço de
couro, e ai, meu chapa, saia balando todo mundo, era uma guerra de baladeira. Eu
gostava de brincar também de peladas (sabe o que é?) era jogar bola de grade.
Juntava muitos meninos da mesma idade e cada grupo tinha sua vez de brincar. A
grade vencedora tinha direito de dar coque ou o chamado “samba” na cabeça de
todos os participantes.
 
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