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WL-OO-Cursos-06-Direito do Trabalho-05-CAP01

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CAP01Capítulo IHISTÓRIA E CONCEITOS BÁSICOS1. Assim caminha a humanidade. 2. Introdução: 2.1 Conceito - 2.2Direito Público ou Privado? - 2.3 Fontes do Direito do Trabalho:2.3.1 Leis - 2.3.2 Sentenças normativas - 2.3.3 Convenções e acor-dos coletivos: 2.3.3.1 Dinâmica da convenção e do acordo coletivo -2.3.3.2 Contrato coletivo de trabalho - 2.3.4 Regulamento de empre-sa -2.3.5 Usos e costumes -2.3.6 Contrato de trabalho -2.3.7 Juris-prudência - 2.3.8 Doutrina - 2.3.9 Princípios gerais de Direito -2.3.10 Direito Comparado - 2.3.11 Analogia - 2.3.12 Eqüidade.
& 1. Assim caminha a humanidadeA história do trabalho humano é uma história de terror (1). Aprimeira civilização conhecida já era escravocrata, há mais de5.000 anos.Na língua dos antigos sumérios, a palavra "escravo" deriva-va do termo utilizado para designar os estrangeiros, denuncian-do a origem política deste flagelo.Ao senhor de escravos tudo era permitido: torturas, sevíciasdiversas, mutilações, amputações, suplícios e abusos de toda or-dem. O trabalho humano não tinha limite de horário ou esforço.A vida do escravo, mera mercadoria, dependia apenas do desejodo opressor.Na antigüidade não era incomum que os escravos fossementerrados vivos, junto com o cadáver de seu senhor, para servi-lo no além-túmulo.É verdade que a História revela rápidos lampejos de huma-nidade na sociedade opressora.
(1). A própria palavra "trabalho" tem origem em tripalium, do latim vul-gar, que era um instrumento de tortura composto de três paus. Trabalhar(tripaliare) nasceu com o significado de torturar ou fazer sofrer.
18 RESUMO DE DIREITO DO TRABALHOAristóteles (384-322 aC) contava que, em Creta (2.200 aC),os escravos gozavam dos mesmos direitos dos cidadãos comuns,com apenas duas restrições peculiares: não podiam portar armase estavam proibidos de fazer ginástica.Na Grécia clássica o trabalho braçal era desonroso e, por is-so, entregue aos escravos. Aqueles homens livres que desenvol-viam alguma atividade lucrativa eram tratados com desprezo,como negociantes (aqueles que negam o ócio).Também os gregos foram transformados em escravos (146aC). Em Roma (2) os escravos gregos se tornaram professores, filó-sofos e conselheiros de grande prestígio. Sem dúvida, a vinda dosgregos conquistados deu enorme impulso ao desenvolvimentocultural da civilização romana.Em determinado momento da História a escravidão deixouseu fundamento político para lastrear-se exclusivamente nos in-teresses econômicos.Famílias inteiras, aldeias, tribos, eram subjugadas e seqües-tradas para comercialização no infame mercado da escravidãohumana.Até hoje chegam notícias de casos isolados de escravidão nosrincões afastados da civilização.O prestígio da escravidão variou conforme a época.Durante o feudalismo imperou um sistema intermediário en-tre a escravidão e o trabalho livre.Era o regime da servidão, que vinculou o trabalhador rural àterra.Vítima de alguma adversidade e pela falta de outra opção desobrevivência, o homem livre se colocava sob a proteção de umproprietário agrícola, o senhor. O servo jurava-lhe lealdade e era
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CAP01obrigado a pagar-lhe um tributo, geralmente extorsivo.Recebia um pedaço de terra para explorar e se sustentar.Entretanto, grande parte do tempo era empregada no cultivonão remunerado das terras do senhor da gleba.
(2). Na Roma antiga o escravo fazia parte da família. Por uma necessidadereligiosa, o servo era integrado à família e iniciado em seu culto, através deuma cerimônia, na qual lhe derramavam água lustral sobre a cabeça e lhe erapermitido partilhar dos bolos e das frutas. Tinha a proteção dos deuses Lares eera enterrado na mesma sepultura da família (Fustel de Coulanges, A CidadeAntiga). Poderia até desempenhar o ato religioso em nome de seu senhor(atribuído a Catão), sendo que nos dias de festa era proibido forçar o escravo atrabalhar (Cícero, De legibus).
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Residia em casebres paupérrimos e sobrevivia muitas vezescom uma dieta exclusiva de tubérculos. (3)A condição de servo da gleba implicava submissão total e he-reditária. Os servos e suas famílias eram vendidos junto com aterra, como acessório.A partir do século XVI a servidão entra em declínio. A sub-missão dos feudos a um governo central, com a formação das na-ções, o surgimento do mercantilismo e a perda da importânciada terra como fonte de riqueza contribuíram para esse declínio,até sua total erradicação. (4)Surgem as primeiras vilas e cidades e, com elas, os artesãos.Esses profissionais orgulhosos foram se agrupando em cor-porações de ofício ou guildas. (5)Os mestres eram os donos das oficinas e únicos autorizadosa explorar economicamente determinada atividade profissional.As corporações eram dirigidas pelos mestres, que atuavam nadefesa exclusiva dos interesses da classe.Subordinado ao mestre estava o companheiro ou oficial, queera o trabalhador remunerado das oficinas. O acesso do compa-nheiro ao grau de mestre - e conseqüente possibilidade de traba-lhar por conta própria - dependia da prova da "obra-mestra". Ocandidato elaborava uma obra, de alto grau de dificuldade, e o re-sultado era julgado pelos mestres integrantes da corporação deofício. Nem é necessário dizer que a aprovação era exceção.Embora houvesse essa possibilidade remota de ascensão, oobjetivo principal das corporações era preservar o mercado detrabalho para os mestres e seus herdeiros.Havia também a classe dos aprendizes, formada por jovens en-tregues aos mestres por suas famílias, para que aprendessem o ofi-cio. Ao fim do aprendizado, transformavam-se em companheiros.As corporações impunham regras muito rígidas acerca desalários, preços, métodos de produção etc.
(3). Relata Wanda Jaú Pimentel que a alimentação dos servos consistiabasicamente de nabos, repolho, cebola e pão preto. Somente comiam carneuma vez por ano, na festa de São Martinho, no inverno, quando o gado eraabatido, por falta de pasto. Os instrumentos agrícolas empregados eram rudi-mentares, produzindo baixo rendimento da terra. As casas eram de argila epalha, quase desprovidas de móveis (História Antiga e Medieval, IBEP).(4). O último país a abolir este sistema foi a Rússia, por ordem do czar Ale-xandre II já no século XIX.(5). As corporações agregavam apenas os artesãos, enquanto as guildasabrigavam também comerciantes.
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Esta rigidez era um fator de estagnação e acabou inviabili-
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CAP01zando as corporações quando as cidades cresceram e surgiram asidéias capitalistas mercantilistas.A classe dos burgueses, pequenos comerciantes, embora te-nha adquirido grande importância, estava afastada do poder e an-siava por regras que assegurassem a livre economia de mercado.Aparece o germe da doutrina liberal, defendendo a liberdadeabsoluta da economia, evoluindo para a liberdade absoluta do ho-mem em todas as suas atividades.Adam Smith (1723-1790) formulou o embasamento econômi-co da nova escola, que poderia ser resumido na máxima laisserfaire, laisser passer (literalmente: "deixar fazer, deixar passar").O Estado deveria se afastar totalmente dos assuntos da vida eco-nômica, deixando que os particulares atuassem livremente. Asúnicas funções estatais seriam manter a ordem, administrar aJustiça e promover a defesa contra a guerra externa.Era o "óbvio e simples sistema da liberdade natural", nas pa-lavras do próprio Adam Smith.Jean-Jacques Rosseau, com o Contrato Social, de 1762, e oBarão de Montesquieu, com o seu Espírito das Leis, de 1748,completaram o arcabouço filosófico e político do liberalismoclássico.No fervilhar das novas idéias, em plena Revolução Francesa(1789), há um registro curioso: Jean-Paul Marat, principal líderdo movimento revolucionário e idealizador de uma federação ar-mada de trabalhadores livres, defendia a sobrevivência das cor-porações de oficio como única forma de manter o nível do apren-dizado profissional e da qualidade dos produtos e a dignidade dostrabalhadores.O tempo encarregou-se de demonstrar que Marat não esta-va completamente errado.Nos séculos XVIII e XIX vários fatores,em especial o avançotecnológico e a migração da mão-de-obra rural, contribuíram pa-ra que lentamente se instalasse a chamada "Revolução Indus-trial" na Inglaterra, transformando as oficinas dos artesãos emfábricas, com produção em larga escala.Inicia-se aqui um dos períodos mais negros da história dotrabalho. Sem dúvida.Num primeiro momento, a chegada das máquinas causougrande desemprego e revolta. Constam alguns movimentos de
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desempregados que promoveram a quebra de teares (6) e de outrosequipamentos.Com o rápido desenvolvimento das indústrias, a mão-de-obra foi sendo reabsorvida, mas em condições extremamente ad-versas para o trabalhador.Sendo grande a oferta de mão-de-obra e não havendo qual-quer controle estatal, os salários foram sendo fixados em níveiscada vez mais baixos, enquanto a jornada de trabalho era am-pliada para além dos limites do esgotamento físico humano.Por economia, utilizava-se a força de trabalho de crianças,com até 6 anos de idade, que eram submetidas a jornadas de 14ou 15 horas de trabalho. Havia a chamada "jornada de sol-a-sol":durava o trabalho enquanto houvesse luz.Alguns registros dão conta de que, com a chegada da ilumi-nação a gás (1805), a jornada de trabalho foi ampliada para até 18horas por dia.Não era incomum o empregador espancar brutalmente osempregados por mínimo erro ou atraso.Como contou em suas memórias, o aprendiz Robert Blincoeteve o couro cabeludo infectado de tanto sofrer golpes na cabeça.Mas muito pior foi o tratamento. Aplicaram-lhe um "curativo",
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CAP01derramando piche quente derretido sobre seu crânio. Quando 0piche esfriou, formando uma placa sólida, foi arrancado, levandojunto todos os cabelos.Relata-se o caso de um adolescente deformado de Bradfordque aos 15 anos tinha apenas 1,14m de altura. 0 aleijão decorriado fato de trabalhar na indústria têxtil 15 horas por dia com osjoelhos dobrados. (7)Os salários miseráveis não permitiam a morada condigna,nem a alimentação adequada.Em 1859 o Ilustrated Times publicou gravura retratandouma hospedaria que alugava caixões para dormir. Os "leitos"eram enfileirados lado a lado, para economia de espaço.É certo que grande parte dos trabalhadores morava na própriafábrica ou em cloacas imundas, alugadas. O salário era estabelecidoapenas para que não se morresse imediatamente de fome.
(6). A revolta Luddita, de 1812, que, na verdade, teve início com o espanca-mento de um aprendiz, mas derivou para a destruição das máquinas e das casasdos patrões, foi sufocada em 1813 com o enforcamento de 17 de seus líderes.(7). Os dois horrendos casos estão em "Força da iniciativa", em Históriaem Revista, Time-Life, p. 61.
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Com todas as tintas, os romances de Charles Dickens (1812-1870) retratam esta época vitoriana, onde a pobreza era tidacomo "vontade de Deus".Foi observado algum movimento de caridade nesse período,mas, no geral, a classe dominante e a classe média eram absoluta-mente insensíveis ao sofrimento do operário miserável. A opulên-cia de que desfrutavam e suas confortáveis residências contrasta-vam com o inacreditável quadro de degradação humana das ruas.Não sem motivo, surgem as idéias socialistas de RobertOwen ( de Charles Fourier (1772-1837) e de Karl1771-1858),Marx (1818-1883).Owen idealizou comunidades industriais, com melhores con-dições para os trabalhadores.Fourier bateu-se pelos "falanstérios", comunidades comple-tamente livres, onde todas as atividades, inclusive o amor, se de-senvolveriam naturalmente, conforme as inclinações indivi-duais de cada elemento. Desta forma, desapareceriam as dife-renças entre trabalho e prazer.Tanto Owen como Fourier esgotaram suas fortunas tentan-do implantar as comunidades ideais, sem qualquer sucesso.Marx imaginou uma república de operários, com a extinçãode todas as outras classes e do Estado, que perderia a sua função.Foi a inspiração para a Revolução Soviética Comunista de 1917,de crueldade ímpar.Ao mesmo tempo em que despontavam as teorias sociais,surgiam os movimentos sindicais operários, com inúmeras mor-tes, e a Igreja despertava para os problemas dos trabalhadoresdesvalidos, editando as encíclicas papais Rerum Nouarum, Qua-dragesimo Anno, Divini Redemptoris e Mater et Magistra.O Estado vai lentamente abandonando a doutrina do não-intervencionismo, são promulgadas as primeiras leis (8) de prote-ção ao trabalho e é criada a Organização Internacional do Traba-lho-OIT (1919).Nasce o Direito do Trabalho. (9)
(8). Constituição mexicana de 1917; Constituição da República de Weimarde 1919 na Alemanha; e Carta del Lavoro na Itália, em 1927.(9). O dia 1° de maio foi escolhido como Dia do Trabalho para homenagearos mortos no incidente de 1° de maio de 1889, em Chicago/EUA. Houve um
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CAP01confronto entre policiais e grevistas e alguém não identificado arremessouuma homba, matando manifestantes e policiais. Os oito líderes grevistas fo-ram presos, sendo sete condenados à pena de morte e um à prisão perpétua.
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As grandes conquistas trabalhistas do século XX tiveramcomo dínamo os movimentos sindicais e a implantação do socia-lismo em vários países.Instalou-se um sistema sindical livre. A jornada de trabalhofoi limitada, regulou-se a concessão de períodos de repouso e fo-ram estabelecidos limites de esforço.Estabeleceu-se valor para o salário mínimo c foram criadosalguns mecanismos protetivos da despedida arbitrária. Iniciou-se a instalação de uma previdência social, já com algum amparoao trabalhador, na doença e na velhice.Porém, com a queda do Muro de Berlim (10), em 10 de dezem-bro de 1989, e o desmantelamento do bloco soviético, o capital in-ternacional perdeu sua principal fonte de preocupações.Em decorrência direta disso, todo o sistema jurídico de pro-teção ao trabalho passou a sofrer imediato e violento ataque, emmovimento de retorno aos tempos do liberalismo.O neoliberalismo, como aponta o arguto Mozart Víctor Rus-somano, está em rota de desarticulação do Direito do Trabalho.De forma avassaladora, essa doutrina impõe a desregula-mentação e a flexibilização da legislação trabalhista, cuja con-quista custou mais de 50 séculos de sofrimento e muito sanguehumano derramado.
& 2. Introdução& 2.1 ConceitoDireito do Trabalho é o ramo da ciência jurídica que regula arelação de emprego e as situações conexas," bem como a aplica-ção das medidas de proteção ao trabalhador.
(10). A queda do Muro pode ter sido provocada por simples equívoco. No dia9, Günter Schabowski estava encarregado de transmitir pela TV a informaçãode que a Alemanha Oriental permitiria o trânsito limitado e controlado de ale-mães de um lado para outro do Muro. Era uma manobra tática para aliviar apressão política decorrente da retirada do apoio russo à Alemanha Oriental.Entretanto, Günter, nervoso, equivocou-se e disse que os portões seriamabertos "imediatamente, sem demora". O povo foi às ruas e, como a Porta deBrandenburg continuasse fechada, todos investiram contra a muralha sob osolhares atônitos e indecisos dos soldados orientais (cf. John Lewis Gaddis, da"U.S. News & World Report", in O Estado de S. Paulo, de 7.11.99, p. A-14).
(11). O Direito de Trabalho trata, além do trabalho subordinado típico,da situação dos domésticos, dos avulsos, dos temporários e dos pequenosempreiteiros.
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& 2.2 Direito Público ou Privado?Direito Público é o Direito composto, inteira ou predomi-nantemente, por normas de ordem pública.Ao contrário, no Direito Privado predominam as normas deordem privada.Normas de ordem pública são normas imperativas, de obri-gatoriedade inafastável. Normas de ordem privada são normas decaráter supletivo, que vigoram apenas enquanto a vontade dos inte-ressados não dispuser de modo diferente do previsto pelo legislador.O Direito do Trabalho tem origem nos Direitos Civil e Co-mercial, mais especificamente nas normas que regulam a loca-
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CAP01ção de serviços. Por causa desse berço e também pelo seu cunhocontratual, predomina o entendimento queo Direito do Traba-lho faz parte da família do Direito Privado.Mas outra ponderável corrente, forte no princípio da irre-nunciabilidade dos direitos trabalhistas, prega que se trata deDireito Público.Alguns autores preferem chamá-lo de Direito misto, já quecomposto tanto por normas de ordem pública como de ordem pri-vada. Entretanto, todos os ramos do Direito são mistos. Daí apouca utilidade dessa conceituação.Para Cesarino Júnior o Direito do Trabalho não seria Públi-co, nem Privado, mas, sim, um terceiro gênero: o Direito Social.No entender de Evaristo de Moraes Filho o Direito de Tra-balho seria unitário, oriundo da fusão do Direito Público com oPrivado.Na verdade, a antiga divisão do Direito em Público e Priva-do não se acomoda com o desenvolvimento da ciência e com osurgimento dos novos ramos do Direito. Daí esta dificuldade emdeterminar a natureza do Direito do Trabalho.
& 2.3 Fontes do Direito do TrabalhoFonte de Direito é tudo o que dá origem, que produz o Direito.As fontes materiais são os fatos sociais, políticos e econômi-cos que fazem nascer a regra jurídica. Ou seja, fonte material é oacontecimento que inspira o legislador a editar a lei.Fontes formais são justamente aquelas que têm a forma doDireito; que vestem a regra jurídica, conferindo-lhe o aspecto deDireito Positivo.
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As fontes formais podem ser diretas ou indiretas.São fontes formais diretas do Direito do Trabalho: a Consti-tuição, as leis em geral (incluindo decretos, portarias, regula-mentos, instruções etc.), os costumes, as sentenças normativas,os acordos e convenções coletivas, os regulamentos de empresae os contratos de trabalho.As fontes formais indiretas são a jurisprudência, a doutrina,os princípios gerais de Direito e o Direito Comparado.O art. 8º da Consolidação das Leis do Trabalho determinaque, na falta de disposições legais ou contratuais, as questõestrabalhistas serão decididas levando em conta a jurisprudência,a analogia, a eqüidade, os princípios e normas gerais de Direito,principalmente do Direito do Trabalho, e ainda de acordo com osusos e costumes e o Direito Comparado.Na verdade, como se verá adiante, a eqüidade e a analogiasão técnicas de integração, utilizadas apenas para suprir as even-tuais lacunas existentes no ordenamento jurídico.
& 2.3.1 LeisSomente a União tem competência para legislar acerca deDireito do Trabalho. Assim, somente a Constituição, a lei, o de-creto, a portaria e o regulamento federais podem tratar do tema.A principal lei que regula a matéria é a Consolidação dasLeis do Trabalho-CLT. (12)
& 2.3.2 Sentenças normativasSentenças normativas são decisões dos Tribunais do Traba-lho julgando dissídios coletivos.Se os sindicatos envolvidos se recusam à negociação ou à ar-bitragem, é facultado ajuizar dissídio coletivo, junto ao TribunalRegional do Trabalho. A decisão deste dissídio coletivo é dadapor sentença normativa.
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CAP01Esta sentença normativa estabelece normas e condições detrabalho para aquela categoria. Mas deve respeitar as disposi-ções convencionais e legais mínimas de proteção ao trabalho(art. 114, § 2°, da CF).
(12). Consolidação é a reunião sistematizada das leis já existentes; é dife-rente de Código, que é lei inteiramente nova. A nossa CLT é o DL 5.452, de1.5.1943.
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O procedimento é o seguinte: proposto o dissídio coletivopelo sindicato, é designada audiência para tentativa de acordo,dentro de 10 dias. Havendo acordo, este é homologado. Não ha-vendo, o processo é instruído, é oferecido parecer do MinistérioPúblico. O caso é submetido a julgamento (arts. 860 e ss.), emi-tindo-se uma sentença normativa.A sentença normativa atinge toda a categoria econômica en-volvida e respectivos empregados.
& 2.3.3 Convenções e acordos coletivosConvenções são ajustes firmados entre o sindicato dos em-pregados e o sindicato patronal. Os acordos coletivos são ajusta-dos entre sindicato dos empregados e uma ou mais empresas.Somente a convenção ou o acordo coletivos podem reduzirsalários (art. 7°, VI, da CF).As convenções e acordos coletivos têm efeito normativomuito semelhante à lei e afetam pessoas que não participaramdiretamente da negociação. Assim, as convenções atingem todosos trabalhadores e empresas integrantes da mesma categoria,dentro do território dos respectivos sindicatos. Já o acordo cole-tivo obriga o sindicato, a empresa e todos os seus empregados.Esgotado o prazo estipulado para vigência da convenção ouacordo, diverge a doutrina sobre a incorporação, ou não, de suascláusulas aos contratos de trabalho em andamento.Para alguns a incorporação se opera incondicionalmente,sempre. Para outros, findo o prazo, as cláusulas simplesmentedeixam de vigorar.Uma terceira corrente entende que são incorporadas ape-nas as regras de cunho normativo (versam sobre as condições detrabalho), mas dissolvem-se as de cunho obrigacional (envolvemexclusivamente as entidades contratantes, como, por exemplo, éo caso da obrigação de criar um curso profissionalizante).O exímio mestre Amauri Mascaro Nascimento anota que ascláusulas da convenção ou acordo podem ser ajustadas por prazocerto ou por tempo indeterminado. Desta maneira, se as entida-des contratantes cuidarem de regular o prazo de validade de cadacláusula, o problema da incorporação praticamente desaparece.2.3.3.1 Dinâmica da convenção e do acordo coletivo - 0 sin-dicato somente poderá celebrar a convenção ou o acordo se hou-
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ver autorização da Assembléia-Geral, especialmente convocadapara tal fim, exigindo-se quorum especial. (13)O pacto tem que ser formalizado por escrito, sem emendasou rasuras, em tantas vias quantos forem os contratantes. Emoito dias deve ser depositada uma via para registro e arquiva-mento no órgão do Ministério do Trabalho. Não é necessário ho-mologação. A convenção e o acordo passam a vigorar três diasapós a entrega desta via.O pacto vale pelo prazo que ficar ajustado, até o máximo dedois anos.
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CAP01A prorrogação, a revisão, a denúncia ou a revogação seguemo mesmo procedimento.Os sindicatos não podem se recusar à negociação coletivaquando convocados. Se houver recusa, o órgão do Ministério doTrabalho fará a convocação compulsória do sindicato. Se persis-tir a recusa, os interessados poderão instaurar dissídio coleti-vo. Mas nenhum dissídio de natureza econômica será admitidose não estiverem esgotadas as possibilidades de convenção ouacordo.
& 2.3.3.2 Contrato coletivo de trabalho O art. 611 da Consolidação das Leis do Trabalho foi editado originalmente com a expressão "contrato coletivo de trabalho" para designar a tradicio-nal convenção coletiva de trabalho. A novidade parece não teragradado, já que duas décadas depois (14) a redação foi modificada eo "contrato coletivo" voltou a se chamar convenção coletiva. Masalguns outros artigos continuaram referindo o contrato coletivo,como, por exemplo, os arts. 59, 91 e 462.Sem qualquer divergência, entendia-se que o contrato cole-tivo era sinônimo de convenção coletiva, como de fato é mesmo.
(13). CLT art. 612:"Os sindicatos s6 poderão celebrar Convenções ou Acordos Coletivosde Trabalho, por deliberação de Assembléia-Geral especialmente convocadapara esse fim, consoante o disposto nos respectivos Estatutos, dependendo avalidade da mesma do comparecimento e votação, em primeira convocação,de 2/3 (dois terços) dos associados da entidade, se se tratar de Convenção, edos interessados, no caso de Acordo, e, em segunda, de 1/3 (um terço) dosmesmos."Parágrafo único. O quorum de comparecimento e votação será de 1/8(um oitavo) dos associados em segunda convocação, nas entidades sindicaisque tenham mais de 5.000 (cinco mil) associados."
(140. DL 229/67.
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Desde 1990 surgiram referências (15) a um contrato coletivode trabalho, que teria significado algo diverso e que seria a solu-ção para vários problemas do país.É que o poder Executivo, por inspiração neoliberal, vem ten-tando fazer distinção entre convenções coletivas e contratos co-letivos detrabalho. (16)O objetivo é afastar a proteção da lei trabalhista tanto quan-to possível. As relações de emprego passariam a ser reguladasquase que exclusivamente pelos contratos, convenções e acordoscoletivos.Neste sentido, contrato coletivo de trabalho seria um pactocoletivo em nível superior, entre as confederações, centrais oufederações, abrangendo todos os trabalhadores do país, ou todosos trabalhadores de determinada categoria ou setor.O contrato coletivo seria muito mais amplo que a conven-ção, restrita apenas à negociação entre sindicatos.Mas, sem dúvida, será necessária a edição de norma de índo-le constitucional para definir exatamente o conteúdo, atribuir com-petências e regular esse novo contrato coletivo de trabalho.
& 2.3.4 Regulamento de empresaO empregador pode instituir um regulamento na empresa,disciplinando condições gerais de trabalho (promoções, prêmios,disciplina etc.). O regulamento passa a integrar o contrato detrabalho e vale para todos os empregados, presentes e futuros. 0início da vigência ocorre com a aceitação do regulamento pelos
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CAP01empregados, sendo que essa concordância pode ser tácita.Normalmente o regulamento é unilateral, mas nada impedea participação dos empregados na sua elaboração.
& 2.3.5 Usos e costumesCostume é a reiteração constante de uma conduta, na con-vicção de ser a mesma obrigatória; ou, em outras palavras, umaregra prática geral aceita como sendo Direito.0 costume pode se referir a uma única empresa, a toda umacategoria econômica ou até a todo o sistema trabalhista.
(15). A L 8.630/93 prevê algumas situações em que teria aplicação o con-trato coletivo no trabalho portuário. Entretanto, não define a expressão con-trato coletivo.(16). É o exato dizer do excelente Mozart Víctor Russomano (Comentáriosà CLT, 17° ed., v. II, p. 115).
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& 2.3.6 Contrato de trabalhoO contrato de trabalho é a principal fonte que informa as re-lações entre empregado e empregador. Será objeto de estudomais amplo logo adiante, no capítulo próprio.
& 2.3.7 JurisprudênciaJurisprudência é a interpretação da lei feita pelos juízes etribunais nas suas decisões. Após reiteradas decisões no mesmosentido, os tribunais emitem súmulas, com uma orientação ge-nérica para os casos da mesma natureza.
Com base no art. 902 da Consolidação das Leis do Trabalho,o Tribunal Superior do Trabalho emitia prejulgados, que vincu-lavam todos os juízes trabalhistas. Mas a Constituição de 1946não recepcionou aquele dispositivo e muitos o consideravam in-constitucional, como acabou declarando o Supremo Tribunal Fe-deral (LTr 41/1.033). Depois, a Lei 7.033/82 revogou expressa-mente aquele artigo.Os textos dos prejulgados foram, então, renumerados e re-ceberam o nome de súmulas. Em 1985 o Tribunal Superior doTrabalho resolveu que as súmulas passariam a se denominarenunciados. (17) Alguns autores continuam a utilizar o tradicionalnome de "súmula" para os enunciados do Tribunal Superior doTrabalho.Embora sirvam como excelente orientação (18), as súmulas edecisões dos tribunais superiores não vinculam o juiz. A únicaexceção é a decisão definitiva de mérito proferida pelo SupremoTribunal Federal na ação de constitucionalidade, que tem efeitoerga omnes e vincula todos os demais órgãos do Judiciário.Além das súmulas, os tribunais podem emitir precedentesnormativos, com a relação das matérias tratadas nos dissídioscoletivos e as respectivas soluções.Orientações jurisprudenciais são tendências, ainda não com-pletamente pacíficas, passíveis de se transformarem em súmu-las, via incidente ale uniformização de jurisprudência.
(17). Res. Administrativa 44I85, de 29.6.1985.(18). "Recorrer contra a súmula é o mesmo que ministrar remédio vencidoao doente: não faz efeito algum" (Álfio Amauri dos Santos, TRT-3° R., proc.POR-2.367/81, DJMG 26.5.1982, cit. por João de Lima Teixeira Filho, Institui-ções).
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CAP01& 2.3.8 DoutrinaÉ a interpretação da lei feita pelos estudiosos da matéria,em comentários, aulas, tratados, pareceres, monografias etc.Este livro, por exemplo, é doutrina, embora modesta.
& 2.3.9 Princípios gerais de DireitoSão critérios amplos de Direito, às vezes não escritos, exis-tentes em cada ramo e percebidos por indução. A Lei de Introdu-ção ao Código Civil (LICC) traz princípios gerais para todos os ra-mos do Direito. No Direito do Trabalho um princípio geral é aproteção do trabalhador. Na dúvida, portanto, deve o juiz traba-lhista decidir a favor do obreiro. Os princípios específicos de Di-reito do Trabalho serão tratados logo em seguida.
& 2.3.10 Direito ComparadoSão as leis e os costumes dos países estrangeiros que ser-vem de orientação para as decisões locais.
& 2.3.11 AnalogiaAnalogia é a aplicação, a um caso não previsto, de normaque rege hipótese semelhante. As regras do ferroviário em vigí-lia, por exemplo, podem servir como orientação para o emprega-do de sobreaviso, que utiliza bip.
& 2.3.12 EqüidadeEqüidade é a adaptação razoável da lei ao caso concreto (igual-dade, bom senso e moderação), ou a criação de uma solução pró-pria para uma hipótese em que a lei é omissa.
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