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ANA KAROLYNE MONTEIRO 1 DOENÇA HIPERTENSIVA ESPECÍFICA DA GESTAÇÃO Definição Doença Hipertensiva Específica da Gravidez (DHEG) é um termo genérico que se refere à hipertensão que se desenvolve durante a segunda metade da gravidez, decorrente das alterações ocorridas na invasão trofoblástica. Assim, a DHEG deve ser entendido como um termo amplo, que engloba condições distintas, como pré-eclâmpsia e eclâmpsia etc. Os distúrbios hipertensivos da gestação são a maior causa de morte materna no Brasil (cerca de 35% dos casos), principalmente em mulheres da raça negra. Eles se associam a um índice de cesariana de 39%. Complicam aproximadamente 12 a 22% das gestações, enquanto a pré-eclâmpsia ocorre em cerca de 3 a 14% de todas as gestações. As formas leves representam 75% dos casos. Cerca de 10% dos casos ocorrem antes da 34a semana de gestação. Classificação A nomenclatura atual é baseada em um consenso proposto em 2000, que é aceito pela Sociedade Internacional de Hipertensão na Gravidez. Com base nesses textos, a hipertensão na gravidez é dividida em cinco classes: (1) Pré-eclâmpsia; (2) Eclâmpsia; (3) Hipertensão crônica de qualquer etiologia; (4) Hipertensão crônica com pré-eclâmpsia sobreposta (ou superajuntada); (5) Hipertensão gestacional ou transitória. Pré-Eclâmpsia Se refere ao aparecimento de hipertensão e proteinúria após 20 semanas de gestação em gestante previamente normotensa. É uma desordem multissistêmica, idiopática, específica da gravidez humana e do puerpério. Mais precisamente, trata-se de um distúrbio placentário, uma vez que já foi descrita em situações em que há apenas tecido trofoblástico, mas não fetal (gravidez molar completa). Etiologia permaneça ainda desconhecida. Fatores de Risco: -Primiparidade -Gravidez múltipla -Doença vascular -hipertensiva crônica -Diabetes mellitus -Doença renal crônica -Doenças do colágeno -Trombofilias -Obesidade -Gestação molar -Hidropsia fetal -Extremos da vida reprodutiva (> 35 anos ou adolescente) -Pré-eclâmpsia em gestação anterior -História familiar de DHEG -Raça negra -Longo intervalo interpartal -Síndrome antifosfolipídeo -Troca de parceiro e nova gravidez Hipertensão e proteinúria caracterizam o quadro clássico da pré-eclâmpsia. Estas manifestações aparecem na segunda metade da gestação (a partir de 20 semanas), sendo mais frequentes no terceiro trimestre. Atualmente, o edema não faz mais parte dos critérios diagnósticos da síndrome. Define-se hipertensão durante a gravidez como a pressão arterial sistólica ≥ 140 ou pressão diastólica ≥ 90 mmHg constatada pelo 5º ruído de Korotkoff com a paciente em repouso, sentada, no braço, com ANA KAROLYNE MONTEIRO 2 o mesmo ao nível do coração e com duas medidas espaçadas por, pelo menos, quatro horas, não devendo ser espaçadas por mais de sete dias. Também pode ser aferida em decúbito lateral esquerdo para evitar a compressão da veia cava, especialmente em gestações avançadas. Proteinúria é definida como a presença de 300 mg ou mais de proteína em urina de 24h; ≥ 1+ em amostra isolada de urina (geralmente tardia em relação à hipertensão), o que equivale a 30 mg/dl em amostra urinária única; ou relação proteinúria/creatinúria em amostra urinária > 0,3. O ACOG, em 2013, publicou uma nova diretriz para diagnóstico de pré-eclâmpsia que inclui pacientes com novo quadro hipertensivo mas sem proteinúria, desde que seja encontrado um dos seguintes achados: - Trombocitopenia (< 100.000/mm3 ); - Alteração da função hepática (elevação de transaminases duas vezes o valor normal); - Piora da função renal (creatinina > 1,1 mg/dl ou duplicação do valor normal, na ausência de outras doenças renais); - Edema agudo de pulmão; - Sintomas visuais ou cerebrais. Fisiopatologia Existem quatro teorias: -Teoria da Placentação Anormal A placenta desenvolve-se primariamente de células chamadas trofoblastos, que se diferenciam inicialmente em dois tipos: o citotrofoblasto, que é o precursor de todos os trofoblastos, e o sinciciotrofoblasto, que é o responsável pela invasão da decídua e das artérias espiraladas. A invasão destas artérias pelo sincício leva a um alargamento do diâmetro do vaso de quatro a seis vezes; o resultado é um aumento do fluxo sanguíneo, que desenvolverá feto e placenta. Na pré-eclâmpsia, a invasão trofoblástica e o remodelamento subsequente das artérias espiraladas (principalmente na segunda onda) é deficiente, resultando em diâmetros 40% menores que na gravidez normal. -Teoria da Má Adaptação É baseada numa resposta imune materna deficiente aos antígenos paternos, que parece ser regulada pelo sistema HLA. Quando há atuação deficiente deste sistema, há uma adaptação inadequada ao tecido placentário. -Teoria do Estresse Oxidativo Cita a hipoxemia placentária como a responsável pela geração de radicais livres derivados do oxigênio; estes últimos ganham a circulação e levam a danos endoteliais. A mobilização de ácidos graxos das reservas adiposas (relacionados a um aumento discreto do catabolismo durante a gestação) parece diminuir a eficácia da albumina plasmática como protetora dos tecidos contra a agressão pelos radicais livres. -Teoria da Suscetibilidade Genética A pré-eclâmpsia é mais observada em mulheres com história familiar, em gêmeas e na raça negra, o que nos faz considerar um possível fator genético implicado. Vários são os genes estudados, sendo que os mais promissores são os envolvidos na placentação e no remodelamento vascular; outros genes possivelmente implicados incluem o da mutação de Leiden, que torna o fator V mais resistente à inativação pela proteína C (o 6169A), o gene do Angiotensinogênio (AGI) e o gene EPHX. Este último regula a produção da epóxido hidrolase, que é uma enzima microssomal hepática envolvida no metabolismo das toxinas. ANA KAROLYNE MONTEIRO 3 Repercussões Sistêmicas Eclâmpsia É a ocorrência de crises convulsivas, seguidas ou não de coma, em uma paciente com pré-eclâmpsia, descartando-se outras causas. São geralmente do tipo tonicoclônicas generalizadas e podem aparecer antes, durante ou após o parto, sendo mais raras após 48h de puerpério, embora possam ocorrer até o 10º dia. Algumas pacientes evoluem para o coma sem apresentar antes convulsão (“eclâmpsia branca” ou “eclampsia sine eclampsia”). Pode ter como causas o vasoespasmo cerebral com isquemia local, encefalopatia hipertensiva, edema vasogênico e dano endotelial. Geralmente, as convulsões são: -autolimitadas -durando de dois a três minutos -precedidas de sinais como cefaléia - alterações visuais, -epigastralgia -dor no quadrante superior direito do abdome São indistinguíveis eletroencefalograficamente de outras convulsões tonicoclônicas. Em exames de ressonância nuclear magnética o achado mais comum é o de edema cerebral; na necropsia, hemorragia intracraniana e petéquias podem ser observadas. Hipertensão Gestacional (ou Transitória) Hipertensão, geralmente leve, que se desenvolve na parte final da gestação, sem a presença de proteinúria ou de outros sinais de pré-eclâmpsia. A pressão retorna aos níveis normais dentro das primeiras 12 semanas de puerpério e recorre em 80% dos casos nas gestações subsequentes. É um diagnóstico basicamente retrospectivo. O termo hipertensão gestacional utilizado durante a gestação deve ser entendido como um termo provisório, uma vez que as pacientes que se apresentam hipertensas na ausência de proteinúria podem representar, em verdade, pacientes que evoluirão com pré-eclâmpsia (cerca de 15 a 25% das pacientes inicialmente classificadas como hipertensão gestacional desenvolvem proteinúria), pacientes hipertensas crônicas que não foram reconhecidasna primeira metade da gestação ou pacientes com hipertensão transitória (pré-eclâmpsia não se desenvolve e os níveis tensionais se normalizam até a 12ª semana). Hipertensão Agravada pela Gravidez (pré-eclâmpsia sobreposta) A hipertensão essencial crônica preexistente se agrava em algumas gestantes, caracteristicamente após 24 semanas. Esta elevação dos níveis tensionais pode ser acompanhada de proteinúria (pré-eclâmpsia sobreposta), o que piora muito o prognóstico maternofetal. Doença Vascular Hipertensiva Crônica (DVHC) ANA KAROLYNE MONTEIRO 4 A hipertensão crônica na gravidez é definida como um estado hipertensivo (PA ≥ 140 x 90 mmHg) presente antes do início da gestação ou diagnosticado antes de 20 semanas. Esta condição não está associada a edema e proteinúria (salvo se já houver dano renal antes da gravidez) e persiste decorridas 12 semanas de pós- parto. A pressão arterial sofre queda durante a gravidez, decorrente do relaxamento vascular fisiológico, especialmente após 16 semanas; o que pode tornar normal uma PA antes elevada, comprometendo o diagnóstico de hipertensão crônica. Diagnóstico 1- Pré-Eclâmpsia 1.1 - Diagnóstico O diagnóstico de pré-eclâmpsia tem como base o aparecimento de hipertensão e proteinúria -Hipertensão: É o sinal clínico mais frequente da síndrome. Definimos hipertensão durante a gravidez como a pressão arterial maior ou igual a 140 x 90 mmHg. Proteinúria de 24 horas: presença de 300 mg ou mais de proteína em urina de 24h. Exame mais acurado para quantificação da proteinúria. Inicia-se a coleta ao despertar da paciente. Nesse momento, a primeira micção é descartada e a hora exata anotada. A seguir, todas as micções são coletadas e a última micção deve ser realizada no mesmo horário da primeira micção descartada. Proteína em fita: 1+ ou 2+ em duas amostras quaisquer colhidas com um intervalo mínimo de quatro horas. O diagnóstico através do encontro de proteinúria de 1+ ou 2+ é discutível na literatura e não se correlaciona adequadamente com os valores da proteinúria de 24 horas, embora alguns autores refiram que 1+ seja compatível com valores maiores que 300 mg em 24 horas, 2+ com valores maiores que 2 g e 3+ com valores superiores a 5 g em 24 horas. Dosagem em amostra isolada: 30 mg/dl ou mais em amostra urinária isolada se associa a níveis superiores a 300 mg/24 horas. Entretanto, esta informação não é valorizada por todos os autores. Só deve ser utilizada se não houver condições de se coletar urina de 24h e deve ser confirmada pela repetição da dosagem. Relação proteína/creatinina urinária: pode ser utilizada numa amostra isolada de urina, minimizando erros de coleta e laboratoriais e economiza tempo para os resultados. Valores maiores ou iguais a 0,3 se associam significativamente com proteinúria > 300 mg/24 horas. Classificação Pré-Eclâmpsia Leve Um aumento súbito e exagerado do peso costuma ser o primeiro sinal do desenvolvimento da pré eclâmpsia. O ganho ponderal que excede 1 kg em uma semana ou 3 kg em um mês deve ser considerado anormal e sinal de alerta para o desenvolvimento da toxemia. Pré-Eclâmpsia Grave Iminência de Eclâmpsia São indicativos de iminênciada primeira convulsão eclâmptica: (1) distúrbios cerebrais, como cefaleia (frontoccipital e pouco responsiva a analgésicos), Critérios diagnósticos para Pré-Eclâmpsia PA ≥ 140 x 90 mmHg Proteinúria ≥ 300 mg/24h Edema generalizado Não é essencial ANA KAROLYNE MONTEIRO 5 torpor e obnubilação; (2) distúrbios visuais como turvação da visão, escotomas, diplopia e amaurose; (3) dor epigástrica (dor em barra de Chaussier) ou no quadrante superior direito, causada por isquemia hepática ou distensão da cápsula do órgão devido a edema ou hemorragia; e (4) reflexos tendinosos profundos exaltados. Síndrome HELLP Este epônimo foi criado por Weinstein em 1982 e significa Hemolisys, Elevated Liver enzimes e Low Platelets, do inglês Hemólise, Aumento de Transaminases e Trombocitopenia. Eclâmpsia Caracteriza-se pela presença de convulsõestonicoclônicas em uma paciente com pré- eclâmpsia.
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