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Expansão Cafeeira e Origens da Indústria no Brasil - Sérgio Silva

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Expansão Cafeeira e Origens da Indústria no Brasil
Sérgio Silva
1. Introdução.
	O avanço extremamente rápido da economia cafeeira por sobre os altiplanos paulistas, deslocando o centro econômico da nação para a província de São Paulo, teve como significação tornar aquela produção o centro dinâmico da gestação capitalista no Brasil: na medida em que substituiu o regime servil pela mão-de-obra assalariada, mecanizou parte da produção, determinou a construção de uma malha ferroviária e esteve imbricado com o desenvolvimento comercial e financeiro do país, o café o inauguraria uma nova etapa econômica no Brasil. 
	
2. Plantações.
	O regime de assalariamento dos imigrantes e a divisão de rendas conforme a produtividade do trabalhador são aspectos extremamente originais na economia brasileiro, até então fundamentada quase que exclusivamente no regime servil, demonstrando a inserção do país nos moldes capitalistas. O posterior desenvolvimento destas bases capitalistas liberará mão-de-obra do próprio país: desenvolvido mais fortemente o capitalismo, os laços de coronelismo de outras regiões são afrouxados (idéia relacionada à perspectiva furtadiana de que havia disponibilidade de força de trabalho nacional, mas que esta não era utilizada devido à ligação destes roceiros nacionais com proprietários locais em típicas relações coronelistas) e tendo uma malha ferroviária pela qual se deslocar, a partir de 1920 serão observados grandes fluxo migratórios no interior do próprio Brasil. 
	Outro reflexo desta modernização da economia brasileira, rumo ao capitalismo, pode ser evidenciada na mobilidade da mão-de-obra. Diferentemente dos cativos, os imigrantes podiam revogar os contratos que assinavam, de modo que, não raro, ao fim das colheitas havia uma grande tendência destes a abandonarem as fazendas, seja em busca de melhor emprego, seja rumo às cidades, seja em busca de terras próprias. 
	O segundo aspecto que evidencia o caráter economicamente modernizador da economia cafeeira é a mecanização. Apesar desta ser empregada apenas na fase de beneficiamento, as secadeiras mecânicas e os classificadores a vapor tiveram reflexos importantes sobre toda a produção do café: os grãos assim beneficiados aumentavam sua qualidade, o que se refletia em preços até 10% acima dos preços internacionais, o processo de produção era acelerado e a mecanização facilitava a economia de mão-de-obra, fator certamente mais escasso na expansão cafeeira. Um reflexo social fundamental deste processo de mecanização foi o de que a classe fundiária, ou seja, a burguesia agrícola, passava a controlar também capital de caráter industrial, de modo que a economia do café ia além da propriedade fundiária. 
	Por fim, um terceiro elemento que evidencia a modernização da economia via café é dado pelas estradas de ferro, sem as quais teria sido impossível avançar a fronteira agrícola para dar ao café o vulto que este efetivamente obteve. A primeira delas foi inaugurada em 1859 pela iniciativa governamental: pela Sociedade de Estradas de Ferro Pedro II os preços de transporte do café caíram em mais de seis vezes. Em 1858, a São Paulo Railway Co. Ltd. Era organizada na Inglaterra para interligar os altiplanos paulistas à capital e ao porto de Santos. 
	A expansão da malha ferroviária tomaria rumos ainda mais significativos com a participação direta dos fazendeiros paulistas. A Companhia Paulista, a Sorocabana e a Mogiana foram todos empreendimentos levados a cabo principalmente com o capital dos cafeicultores. Assim, mais que o serviço de transporte, estes grandes cafeicultores obtinham nas estradas de ferro um negócio em si, o que pode ser evidenciado pela alta lucratividade das três companhias e pela extensão de suas malhas ao longo de todo o estado de São Paulo. 
	
3. Capital Cafeeiro. 
	Pela processo de expansão da economia cafeeira que foi evidenciado acima, fica evidente que as atividades dos grandes cafeicultores paulistas iam muito além da simples produção agrícola. “A natureza capitalistas destas transformações e o desenvolvimento do capitalismo que tem por base a economia cafeeira não pode ser determinada unicamente ao nível das plantações”. Gradualmente, os cafeicultores afastam-se das tarefas de produção, nomeando administradores para suas fazendas, e mudam-se para a capital paulista, de onde passam a concentrar-se mais nos negócios do café, como sua comercialização, exportação, gestão junto ao governo etc., através da criação de casas comerciais, casas de exportação, instituições financeiras diversas etc. 
	Em paralelo ao que afirma Celso Furtado ao comparar as economias cafeeira e açucareira, o autor explicita que os homens ligados ao café desenvolvem atividades comerciais e políticas, estando envolvidos em toda a cadeia de produção e comercialização do produto. 
	Assim, o capital cafeeiro tinha aspectos diversos: era capital agrícola, capital industrial, capital bancário e capital comercial. No entanto, era como capital comercial que prevalecia: como o capitalismo ainda não se desenvolvera profundamente no país, a forma mercantil tinha de ser historicamente a prevalente naquele momento; além disso, estando o país ainda muito ligado ao setor externo, não é de se admirar que o comércio internacional tornasse o caráter comercial do capital cafeeiro o predominante. O autor, então, evidencia duas classes burguesas ligadas aos interesses do café: a dos grandes burgueses do café, que tinham atividades tanto junto à produção agrícola quanto o controle sobre o capital comercial (eram proprietários de casas comerciais, centros de exportação, bancos, instituições financeiras diversas etc.), e a dos médio burgueses do café, que controlavam apenas a propriedade fundiária, sendo beneficiados pelos grandes burgueses, mas não influindo sobre as decisões destes. 
	
4. Desenvolvimento da Economia cafeeira no início do século XX. 
	Em 1882, o café apresenta seus primeiros problemas de superprodução; é neste ano que, pela primeira vez, a oferta supera a demanda no mercado internacional. A situação, no entanto, tornar-se-ia crítica pela primeira vez em 1893, com a crise econômica que perpassa os EUA, principal demandante do café brasileiro, e faz com que os preços despenquem. 
	Neste momento, a política fortemente inflacionária do governo republicano gera uma desvalorização da moeda nacional que faz com que as perdas dos cafeicultores sejam amenizadas. No entanto, esta desvalorização gera uma pressão muito forte sobre toda a sociedade, já que as importações ficam muito encarecidas e o governo não tem como controlar o pagamento da dívida pública. Assim, quando uma política de estabilização é posta em prática pelo governo, de modo que a dívida externa possa ser arrolada junto à casa Rothschild, os cafeicultores sentem mais profundamente o problema. 
	A produção, no entanto, não recua: na verdade, em 1902 o Brasil seria responsável por 82% do total do café exportado no mundo. Os estoques multiplicam-se rapidamente e a situação da crise cafeeira é posta como o problema mais premente a ser solucionado. 
	Em 1906, o Conselho de Taubaté estabelece uma estratégia de gestão de política econômica para valorizar o café: o Estado passaria a comprar os excedentes para reequilibrar oferta e demanda, tais compras seriam feitas com financiamento junto a bancos internacionais e seriam pagas com tributação sobre o café posteriormente exportado, além disso, seria desencorajada a continuação da expansão cafeeira. 
	Como o governo central estivesse temeroso de levar a cabo tal política e como a constituição de 1889 garantira grande autonomia aos Estados, São Paulo decide levar adiante a política. O governo central, no entanto, não tardaria a seguir-lhe o exemplo. 
	Agora, grande quantidade de capital estrangeiro foi empregada no processo de desenvolvimento da economia cafeeira. 
	O capitalismo, portanto, se consolidava ainda mais firmemente: “na medida em que assegurou a continuação da acumulação na economia cafeeira, que era o núcleo do desenvolvimento capitalista no Brasil,a valorização teve como resultado principal o prosseguimento do desenvolvimento capitalista”. Sob esta perspectiva, a valorização não significou a tentativa dos cafeicultores de adiar o fim da cafeicultura frente ao desenvolvimento do capitalismo no Brasil, pelo contrário, foi apenas a partir desta política de estímulo ao café que se pôde continuar o desenvolvimento capitalista nacional: “a valorização e a economia cafeeira em geral não podem ser considerados como um obstáculo ao desenvolvimento do capitalismo no brasil. Bem ao contrário, eles estão na base desse desenvolvimento”. 
5. A questão da terra e da abundância de terras. 
	A maneira pela qual se deu a expansão territorial da produção cafeeira reflete também o caráter capitalista de que estava imbuído o processo. Em sua marcha para o oeste, o cafeicultor pioneiro podia deparar-se com terras em duas situações jurídicas: já com proprietários ou devolutas. Aos proprietários originais das terras, cabia vendê-las aos cafeicultores ou integrar-se à produção cafeeira. No entanto, à medida que a produção se interiorizava, as terras devolutas, que em muitos casos estavam longe de serem desocupadas ou inabitadas, eram incorporadas pelos cafeicultores sem qualquer dificuldade, já que estes se embasavam na própria lei que caracterizava aquele tipo de terra como devoluta. 
	Assim, era o grande capital que se apropriava das terras consideradas amplamente disponíveis. A valorização fundiária decorrente da expansão cafeeira fazia com que as terras se tornassem indisponíveis aos trabalhadores, os quais eram “libertados” deste meio de produção para servirem ao grande capital, detentor não apenas do capital agrícola, como também, já vimos, dos capitais financeiro, industrial e comercial. 
	Além disso, à medida que o café se expandia para o oeste, a terra tornava-se simples instrumento de especulação fundiária, característica típica de uma economia que se direciona ao capitalismo. 
	 Em conclusão, o autor afirma que a disponibilidade relativa de terras no Brasil permitiu que a expansão da economia caracterizadamente capitalista do café se expandisse rapidamente. É importante salientar, porém, que a abundância de fatores tradicionais, como a terra, não explica a formação do capitalismo nessas regiões que hoje têm um caráter de subdesenvolvimento econômico; pelo contrário, o capitalismo só pôde se desenvolver nessas áreas porque a nível internacional a produção capitalista se consolidara de tal maneira que a divisão internacional do trabalho gerava a possibilidade de terras afastadas serem incluídas no modo de produção capitalista sem que nelas ainda se tivessem desenvolvido as características que marcaram o desenvolvimento de tal modo de produção alhures.

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