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Tí tu lo d a pa rt e | P AR TE 1 CAPÍTULO 22 Países em desenvolvimento: crescimento, crise e reforma obJetivos de aPrendizaGem Após a leitura deste capítulo, você será capaz de: ■ Descrever a distribuição de renda mundial persistentemente desigual e as evidências de suas causas. ■ Resumir as principais características econômicas dos países em desenvolvimento. ■ Explicar a posição dos países em desenvolvimento no mercado de capitais mundial e o problema de inadimplência pelos solicitadores de empréstimos dos países em desenvolvimento. ■ Recontar a história recente das crises financeiras dos países em desenvolvimento. ■ Discutir as medidas propostas para ampliar os ganhos dos países mais pobres a partir da partici‑ pação no mercado de capitais mundial. Até agora, estudamos as interações macroeconômicas entre economias de mercados indus‑ trializados, como as dos Estados Unidos e a Europa Ocidental. Dotados com capital e mão de obra especializada, esses países politicamente estáveis geram níveis altos de renda para seus residentes. E seus mercados, comparados com aqueles de alguns países mais pobres, há muito são relativamente livres do controle governamental direto. Contudo, diversas vezes desde os anos 1980, os problemas macroeconômicos dos países em desenvolvimento do mundo têm estado na dianteira das preocupações sobre a estabilidade de toda a economia internacional. Durante as décadas seguintes à Segunda Guerra Mundial, o comércio entre as nações em desenvolvimento e as industrializadas expandiu ‑se, assim como as transações financeiras de países em desenvolvimento com países mais ricos. Por sua vez, relações mais intensas entre os dois grupos de economias têm tornado cada grupo mais dependente da saúde econômica do outro do que antes. Eventos em países em desenvolvimento, portanto, têm um impacto significativo no bem ‑estar e nas políticas das economias mais avançadas. Desde os anos 1960, alguns países que já foram pobres aumentaram sensivelmente seu padrão de vida, enquanto outros ficaram ainda mais atrás do mundo industrial. Ao compreender essas experiên‑ cias de desenvolvimento contrastante, tiramos lições políticas importantes que podem estimular o crescimento em todos os países. Este capítulo estuda os problemas macroeconômicos de países em desenvolvimento e as reper‑ cussões desses problemas no mundo desenvolvido. Embora as reflexões da macroeconomia inter‑ nacional que obtivemos nos capítulos anteriores também se apliquem aos países em desenvolvi‑ mento, os problemas distintivos que aqueles países enfrentaram na luta para alcançar as economias ricas tornam necessária uma discussão separada. Além disso, os baixos níveis de renda das áreas em desenvolvimento tornam as tribulações macroeconômicas ainda mais dolorosas do que nas econo‑ mias desenvolvidas, com consequências que podem ameaçar a coesão política e social. Renda, bem -estar e crescimento na economia mundial A pobreza é o problema básico que os países em desenvolvimento enfrentam, e escapar dela é seu grande desafio político e econômico. Em comparação com as economias industrializa‑ das, a maioria dos países em desenvolvimento é pobre nos fatores de produção essenciais para a indústria moderna: capital e mão de obra espe‑ cializada. A escassez relativa desses fatores con‑ tribui para os níveis baixos de renda per capita e frequentemente impede os países em desenvol‑ vimento de alcançar as economias de escala a M22_KRUGXXXX_C22.indd 523 1/29/15 6:23 PM 524 Economia internacional partir das quais muitas nações mais ricas se beneficiam. Mas o fator escassez é geralmente um sintoma de pro‑ blemas mais profundos. A instabilidade política, os direitos de propriedade instáveis e as políticas econômi‑ cas malconduzidas têm desencorajado com frequência o investimento em capitais e habilidades, e também redu‑ zem a eficiência econômica de outras maneiras. A distância entre rico e pobre As economias mundiais podem ser divididas em quatro categorias principais de acordo com seus níveis de renda per capita anual: economias de renda baixa (incluindo Afe‑ ganistão, Bangladesh, Nepal, Camboja e Haiti, junto com partes da África subsaariana); economias de renda média (incluindo China, Índia, Paquistão, Filipinas, Indonésia, diversos países do Oriente Médio, muitos da América Latina e do Caribe, muitos países ex ‑soviéticos e a maior parte dos demais países da África); países de renda média superior (incluindo os países remanescentes da América Latina, um punhado de países da África, diversos do Caribe, Turquia, Malásia, Polônia, Letônia, Lituânia e Rússia); e economias de alta renda (incluindo as economias de mercado industrial rico; os demais países do Caribe; um punhado de ex ‑países em desenvolvimento excepcional‑ mente afortunados, como Israel, Coreia e Singapura; os países ricos em petróleo, como Kuwait e Arábia Saudita; e alguns países do Leste Europeu bem ‑sucedidos na tran‑ sição, como as Repúblicas Tcheca e Eslovaca, Hungria e Estônia). As primeiras duas categorias consistem princi‑ palmente de países em um estágio de retrocesso de desen‑ volvimento relativo às economias industriais, enquanto as últimas duas abrangem a maioria das economias de mer‑ cado emergente (bem como as economias industriais, natu‑ ralmente). A Tabela 22.1 mostra os níveis médios de renda anual per capita para esses grupos de países em 2011, junto com outro indicador de bem ‑estar econômico, a expecta‑ tiva média de vida ao nascer. A Tabela 22.1 ilustra as disparidades agudas nos níveis de renda internacional na segunda década do século XXI. A renda per capita nacional média nas economias mais ricas é 69 vezes a média dos países em desenvolvimento mais pobres! Mesmo os países de renda média superior têm somente cerca de um sexto da renda per capita do grupo industrial. Os valores de expectativa de vida geral‑ mente refletem as diferenças internacionais nos níveis de renda. A expectativa de vida média cai à medida que a pobreza relativa aumenta.1 A distância da renda mundial tem diminuído com o passar do tempo? Explicar as diferenças de renda entre os vários países é um dos objetivos mais antigos da economia. Não é por acaso que o clássico livro de 1776 de Adam Smith era inti‑ tulado A riqueza das nações. Desde pelo menos um século antes de Smith, os economistas tinham procurado não somente explicar por que as rendas dos países diferiam em um determinado momento, mas também solucionar o mais desafiante quebra ‑cabeças de por que alguns países tornam ‑se ricos enquanto outros estagnam. O debate sobre as melhores políticas para promover o crescimento econô‑ mico tem sido ferrenho, conforme veremos neste capítulo. Tanto a profundidade do enigma do crescimento eco‑ nômico quanto o prêmio por achar políticas de cresci‑ mento amigáveis são ilustrados na Tabela 22.2, que mos‑ tra taxas de crescimento de produção per capita de diversos grupos de países entre 1960 e 2010. (Esses dados de produ‑ ção reais têm sido corrigidos para responder por abando‑ nos de paridade de poder de compra.) Durante esse pe río‑ do, os Estados Unidos cresceram muito a taxa per capita anual de 2% a 2,5% que muitos economistas diriam ser o máximo em longo prazo para uma economia madura. Os países industriais que eram mais prósperos em 1960 em geral cresciam a taxas mutuamente compa‑ ráveis. Como resultado, suas diferenças de renda em comparação com os Estados Unidos mudaram relati‑ vamente pouco. No entanto, os países industrializados mais pobres de 1960 frequentemente cresceram muito mais depressa do que os Estados Unidos na média e, como um resultado, sua renda per capita tendeu a alcan‑ çar a dos Estados Unidos. Por exemplo, a Irlanda, que era 48% mais pobre do que os Estados Unidos em 1960, estava menos de 1% mais pobre em 2010 – tendo assim virtualmente eliminado a diferença de renda anterior. O processo de evolução da Irlanda ilustra a tendência para as diferençasentre os padrões de vida de vários paí‑ tAbelA 22.1 Indicadores de bem ‑estar econômico em quatro grupos de países, 2011 Grupo de renda PIB per capita (dólares norte americanos 2011) Expectativa de vida (anos)* Baixa renda 635 57 Renda média inferior 2.298 66 Renda média superior 7.239 72 Alta renda 43.718 80 * Média simples de expectativas de vida de homens e mulheres Fonte: Banco Mundial. 1 O Capítulo 16 mostrou que uma comparação internacional das rendas em dólar revela níveis de bem ‑estar relativos imprecisamen‑ te, porque os níveis de preço dos países mensurados em uma moeda comum (aqui, dólares norte ‑americanos) em geral diferem. O Ban‑ co Mundial fornece valores de renda nacionais que foram ajustados para levar em conta desvios da paridade do poder de compra (PPC). Esses números reduzem muito, mas não eliminam, as disparidades na Tabela 22.1. A Tabela 22.1 relata algumas rendas ajustadas à PPC. M22_KRUGXXXX_C22.indd 524 1/29/15 6:23 PM 525Capítulo 22 Países em desenvolvimento: crescimento, crise e reforma ses industriais diminuírem durante o pós ‑guerra. A teo‑ ria por trás dessa convergência observada nas rendas per capita é enganosamente simples. Se o comércio é livre, se o capital pode se movimentar para países que oferecem os retornos mais elevados, e se o próprio conhecimento atravessa as fronteiras políticas, e portanto esses países sempre têm acesso às tecnologias de produção de ponta, então não existe motivo para as diferenças de renda inter‑ nacional persistirem para sempre. Algumas distâncias persistem na realidade em vir‑ tude das diferenças políticas entre os países industriais; contudo, as forças de convergência precedentes parecem ser fortes o bastante para manter a renda dos países industriais praticamente no mesmo padrão. Lembre ‑se também que as diferenças na produção per capita supe‑ ram as diferenças na produção por trabalhador empre‑ gado, porque a maioria dos países industriais tem taxas de desemprego mais elevadas e taxas de participação da força de trabalho menores do que os Estados Unidos. Apesar de uma teoria de convergência simples ser atrativa, nenhuma tendência clara para as rendas per capita convergirem caracteriza o mundo como um todo, conforme mostra o restante da Tabela 22.2. Nessa tabela vemos discrepâncias enormes nas taxas de crescimento tAbelA 22.2 Produção per capita em países selecionados, 1960–2010 (dólares norte‑americanos em 2005) Produção per capita País 1960 2010 19602010 Taxa média de crescimento anual (porcentagem por ano) Industrializado em 1960 Canadá 12.946 35.810 2,1 Espanha 6.008 25.797 3,0 Estados Unidos 15.136 41.858 2,1 França 9.396 29.145 2,3 Irlanda 7.807 41.558 3,4 Itália 7.924 27.227 2,5 Japão 4.404 31.815 4,0 Reino Unido 11.884 32.034 2,0 Suécia 11.710 33.627 2,1 África Nigéria 1.442 1.923 0,6 Quênia 978 1.287 0,5 Senegal 1.567 1.480 –0,1 Zimbábue 3.847 3.959 0,1 América Latina Argentina 6.585 12.862 1,3 Brasil 2.354 8.750 2,7 Chile 3.915 12.871 2,4 Colômbia 2.814 7.430 2,0 México 5.033 12.189 1,8 Paraguai 1.990 4.666 1,7 Peru 3.939 7.466 1,3 Venezuela 7.307 9.762 0,6 Ásia China 405 8.727 6,3 Coreia do Sul 1.610 28.702 5,9 Hong Kong 4.518 44.070 4,7 Índia 734 3.413 3,1 Malásia 1.624 11.863 4,1 Singapura 3.170 42.360 5,3 Tailândia 772 8.467 4,9 Taiwan 2.061 32.865 5,7 Nota: Os dados foram retirados da Penn World Table, Versão 8.0, e utilizam taxas de câmbio PPC para comparar as rendas nacionais. Para uma descrição, ver o site Penn World Table, Versão 8.0, disponível em <http://www.rug.nl/research/ggdc/data/penn ‑world ‑table>. Acesso em: 8 dez. 2014. M22_KRUGXXXX_C22.indd 525 1/29/15 6:23 PM 526 Economia internacional em longo prazo entre os diferentes grupos de países regionais, mas sem uma tendência geral para os paí‑ ses mais pobres crescerem mais rapidamente. Diversos países da África subsaariana, embora na base da escala de renda mundial, cresceram (na maioria dos anos pós‑ ‑guerra) em taxas bem abaixo daquelas dos principais países industriais.2 O crescimento também foi relativa‑ mente lento na América Latina, onde apenas alguns paí‑ ses (em especial Brasil e Chile) superaram a taxa de cres‑ cimento médio dos Estados Unidos apesar dos níveis de renda inferiores. Em contraste, os países do Leste Asiático tenderam a crescer a taxas bem acima daquelas do mundo indus‑ trializado, conforme a teoria da convergência preveria. A Coreia do Sul, com um nível de renda próxima ao do Senegal em 1960, tinha crescido cerca 6% ao ano (em termos per capita) desde então, e em 1997 foi classifi‑ cada como um país em desenvolvimento com uma renda alta pelo Banco Mundial. A taxa de crescimento médio anual de 5,3% de Singapura promoveu o país ao sta‑ tus de renda alta. Alguns países do Leste Europeu que viviam sob o regime soviético até 1989 também passa‑ ram rapidamente aos padrões de renda superior. Um país que pode conseguir até uma taxa de cresci‑ mento anual de 3% verá sua renda per capita real dobrar a cada geração. Mas, com taxas de crescimento obser‑ vadas nos países do Leste Asiático como Hong Kong, Singapura, Coreia do Sul e Taiwan, a taxa per capita real aumenta cinco vezes a cada geração! O que explica os padrões de crescimento muito diver‑ gentes em longo prazo na Tabela 22.2? A resposta está nas características econômicas e políticas dos países em desenvolvimento e os modos como eles têm mudado durante o tempo em resposta tanto aos eventos mundiais quanto às pressões internas. As características estruturais dos países em desenvolvimento também têm ajudado a determinar seu sucesso em alcançar objetivos macroeco‑ nômicos fundamentais além do crescimento rápido, como inflação baixa, índice de desemprego baixo e estabilidade do setor financeiro. Características estruturais dos países em desenvolvimento Os países em desenvolvimento diferem amplamente entre si, e nenhuma relação simples de características “típicas” descreveria com precisão todos eles. No iní‑ cio dos anos 1960, esses países eram muito mais pare‑ cidos uns com os outros em suas abordagens políticas comercial e macroeconômica e em outras intervenções governamentais na economia. Então as coisas começa‑ ram a mudar. Os países do Leste Asiático abandonaram a industrialização em substituição às importações, ado‑ tando em seu lugar uma estratégia de desenvolvimento orientada para a exportação. Essa estratégia mostrou‑ ‑se muito bem ‑sucedida. Mais tarde, países na Amé‑ rica Latina também reduziram as barreiras comerciais enquanto ao mesmo tempo tentaram controlar o papel do governo na economia, reduzir a inflação cronica‑ mente alta e, em muitos casos, abrir o capital bancário para transações particulares. Esses esforços no início tiveram resultados díspares, mas estão frutificando mais. Pontanto, embora muitos países em desenvolvimento tenham reformado suas economias para se aproximar das estruturas das economias industriais bem ‑sucedidas, o processo permanece incompleto, e muitos deles tendem a apresentar pelo menos uma das seguintes características: 1. Existe uma história de controle governamental direto e extenso da economia, incluindo restrições no comér‑ cio internacional, propriedade ou controle governa‑ mental de grandes empresas industriais, controle go‑ vernamental direto de transações financeiras internas e um nível alto de consumo governamental com um compartilhamento do PNB. Os países em desenvolvi‑ mento diferem amplamente entre si quanto ao grau em que o papel do governo na economia tem sido re‑ duzido nessas várias áreas durante as últimas décadas. 2. Existe uma história de inflação alta. Em muitos paí‑ ses, o governo foi incapaz de pagar por seus gastos intensos e pelas perdas dos empreendimentos estatais por meio de taxas isoladas. A evasão de taxas foi ram‑ pante, e a maior parte da atividade econômica foi diri‑ gida de forma oculta, de modo que provou ‑se sermais fácil simplesmente imprimir dinheiro. Senhoriagem é o nome que os economistas dão aos recursos reais que um governo ganha quando imprime dinheiro que ele gasta em mercadorias e serviços. Quando seus go‑ vernos estiveram expandindo a emissão de dinheiro continuamente para extrair altos níveis de senhoria‑ gem, os países em desenvolvimento experimentaram inflação e mesmo hiperinflação. (Ver, por exemplo, a discussão sobre inflação e crescimento da emissão de dinheiro na América Latina no Capítulo 15.) 3. Onde os mercados financeiros domésticos têm sido liberalizados, instituições de crédito fracas costu‑ mam ser abundantes. Os bancos frequentemente emprestam fundos que pediram emprestados para financiar projetos pobres ou muito arriscados. Os 2 Por outro lado, outros países na África subsaariana alcançaram agora o status de renda média superior. Botsuana, no sul da África, alcançou esse status mais cedo. O país apresentou uma taxa média de crescimen‑ to per capita bem acima de 5% ao ano nas três décadas após 1960. M22_KRUGXXXX_C22.indd 526 1/29/15 6:23 PM 527Capítulo 22 Países em desenvolvimento: crescimento, crise e reforma empréstimos podem ser feitos na base de conexões pessoais em vez de retornos prospectivos, e as salva‑ guardas do governo contra a fragilidade financeira, como a supervisão bancária (Capítulo 20), tendem a ser ineficazes pela incompetência, inexperiência e fraude evidente. Embora o comércio público em quotas de ações tenha se desenvolvido em muitos mercados emergentes, costuma ser mais difícil para os acionistas descobrirem, nos países em desenvol‑ vimento, como o dinheiro da empresa está sendo gasto ou como controlar os gestores da empresa. O esquema legal para solucionar a posse de ativos em casos de falência também é tipicamente fraco. Não obstante a instabilidade recente em mercados finan‑ ceiros de países desenvolvidos, ainda é verdade que, por comparação, os mercados financeiros de países em desenvolvimento permanecem menos eficazes para dirigir as economias em direção a seus usos em investimentos mais eficientes. Como resultado, tais países permanecem ainda mais propensos à crise. 4. Nos locais em que as taxas de câmbio não são atre‑ ladas (como na China), elas tendem a ser dirigidas mais fortemente por governos de países em desen‑ volvimento. As medidas governamentais para limi‑ tar a flexibilidade da taxa de câmbio refletem tanto o desejo de manter a inflação sob controle quanto o medo de que as taxas de câmbio flutuantes este‑ jam sujeitas a uma volatilidade enorme nos merca‑ dos relativamente escassos de moedas de países em desenvolvimento. Existe um histórico de alocação de câmbio estrangeiro mediante decretos governamen‑ tais em vez de pelo mercado, uma prática (chamada controle de câmbio) que alguns países em desenvol‑ vimento ainda mantêm. A maior parte desses países tem tentado, em particular, controlar os movimentos de capitais limitando as transações de câmbio estran‑ geiras em conexão com o comércio em ações. Mais recentemente, contudo, muitos mercados emergentes abriram suas contas de capital. 5. Recursos naturais ou commodities agrícolas com‑ põem uma parcela importante das exportações para muitos países em desenvolvimento – por exemplo, o petróleo russo, a madeira da Malásia, o ouro sul‑ ‑africano e o café colombiano. 6. Tentativas de contornar controles governamentais, taxas e regulamentações têm ajudado a tornar as prá‑ ticas de corrupção, como suborno e extorsão, um meio de vida em muitos — se não na maioria — dos países em desenvolvimento. Muito embora o desenvolvimento da atividade econômica oculta tenha em muitos exem‑ plos ajudado a eficiência econômica ao restabelecer um grau de alocação de recursos baseado no mercado, no fim das contas fica claro, com base nos dados, que cor‑ rupção e pobreza andam de mãos dadas. Para uma grande amostra de países em desenvolvi‑ mento e industriais, a Figura 22.1 mostra a forte rela‑ ção positiva entre a produção per capita real anual e um índice inverso de corrupção — variando de 1 (mais cor‑ rupto) a 10 (o mais limpo) — publicado pela organiza‑ ção Transparência Internacional.3 Diversos fatores subjazem essa forte relação positiva. As regulamentações governamentais que promovem cor rupção também prejudicam a prosperidade econô‑ mica. Estudos estatísticos detectaram que a corrupção por si só tende a ter efeitos líquidos negativos sobre a eficiên cia econômica e o crescimento.4 Por fim, países mais pobres não têm os recursos para conter a corrup‑ ção efetivamente, e a pobreza em si gera uma vontade maior de burlar as regras. Muitas das grandes características que hoje ainda definem os países em desenvolvimento tomaram forma nos anos 1930 e podem ser seguidas até a Grande Depres‑ são (Capítulo 19). A maior parte dos países em desenvol‑ vimento experimentou controles diretos sobre o comér‑ cio e pagamentos para conservar as reservas de câmbio estrangeiras e salvaguardar o emprego doméstico. Con‑ frontados a uma ruptura maciça do sistema de mer‑ cado mundial, países industriais e em desenvolvimento permitiram igualmente que seus governos assumissem funções diretas crescentes no emprego e na produção. Muitas vezes, os governos reorganizavam mercados de trabalho, estabeleciam controle estrito sobre os mercados financeiros, controlavam preços e nacionalizavam indús‑ trias chave. Contudo, a tendência em direção ao controle 3 De acordo com os rankings de 2011 da Transparência Internacional, o país menos corrupto no mundo era a Nova Zelândia (com um es‑ core alto de 9,5), e o mais corrupto era o Afeganistão (com um escore minúsculo de 1,5). O escore dos Estados Unidos era 7,1. Para dados detalhados e um panorama geral da economia da corrupção, veja: Vito Tanzi. “Corruption around the World”. International Monetary Fund Staff Papers, v. 45, p. 559–594, dez. 1998. 4 Existem, naturalmente, evidências anedóticas abundantes sobre as ineficiências econômicas associadas com a corrupção. Considere a seguinte descrição de 1999 dos negócios no Brasil, que tinha um escore de 3,8 pela Transparência Internacional 2011: A corrupção vai bem além dos vendedores de rua em suas bar‑ racas. Quase toda atividade econômica possível está sujeita a al‑ guma forma de extorsão oficial. As grandes empresas brasileiras costumam concordar em pagar subornos, mas as multinacionais geralmente se recusam e preferem pagar multas. O dinheiro — pago nos níveis municipal, estadual e federal — é dividido entre burocratas e seus padrinhos políticos. Eles têm certeza de que é impossível cooperar completamente com todas as minúcias das leis, regulamentos, decretos e diretivas do Brasil. Os subornos e multas são parte do “Custo Brasil”, termo que resume a multidão de despesas que inflam o custo de conduzir negócios no Brasil. Veja: “Death, Decay in São Paulo May Stir Reformist Zeal”. Finan‑ cial Times, 20/21 mar. 1999, p. 4. M22_KRUGXXXX_C22.indd 527 1/29/15 6:23 PM 528 Economia internacional governamental da economia mostrou ‑se mais persistente nos países em desenvolvimento, onde as instituições polí‑ ticas permitiam que as empresas com interesses financei‑ ros no status quo perpetuassem essa situação. Excluídos dos fornecedores tradicionais das fábricas durante a Segunda Guerra Mundial, os países em desen‑ volvimento encorajavam novas indústrias manufaturei‑ ras de sua propriedade. A pressão política para proteger essas indústrias foi um fator por trás da popularidade da industrialização em substituição às importações nas primeiras décadas pós ‑guerra. Além disso, as áreas colo‑ niais que se tornaram independentes após a guerra acre‑ ditavam que poderiam alcançar os níveis de renda de seus antigos governantes somente por meio de urbaniza‑ ção e industrialização rápidas e dirigidas pelo governo. Por fim, os países em desenvolvimento líderes temiam que seus esforços para escapar da pobreza seriam amea‑ çados se continuassem a se especializarem exportações de commodities primárias, como café, cobre e trigo. Nos anos 1950, alguns economistas influentes afirmaram que os países em desenvolvimento sofreriam continuamente os termos de declínio do comércio, a menos que usassem a política comercial para movimentar recursos para fora das exportações primárias e em direção a substitutos de importação. Essas previsões se provaram erradas, mas influenciaram as políticas dos países em desenvolvi‑ mento nas primeiras décadas pós ‑guerra. Empréstimo e dívida de países em desenvolvimento Uma característica adicional dos países em desen‑ volvimento é crucial para compreender seus problemas macroeconômicos: muitos têm dependido muito dos influxos financeiros do exterior para o investimento doméstico. Antes da Primeira Guerra Mundial e no período até a Grande Depressão, esses países (incluindo os Estados Unidos na maior parte do século XIX) rece‑ beram grandes influxos financeiros de terras mais ricas. A Grã ‑Bretanha foi o maior emprestador internacional, mas a França, a Alemanha e outras forças europeias contribuíram igualmente para financiar o desenvolvi‑ mento industrial em alguns países então em desenvol‑ vimento (como Argentina, Austrália, Canadá e os Esta‑ dos Unidos) e para a extração de recursos naturais ou agricultura de plantação em outros (como Brasil, Peru, Quênia e Indonésia). Nas décadas seguintes à Segunda Guerra Mundial, muitas economias em desenvolvimento requisitaram no‑ vamente as economias de países mais ricos e construíram uma dívida substancial para o resto do mundo (cerca de sete trilhões de dólares em termos brutos no final de 2013). A dívida dos países em desenvolvimento estava no centro de diversas crises de empréstimo internacional FIGURA 22.1 Corrupção e produção per capita EUA 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 0 10.000 20.000 30.000 40.000 50.000 60.000 70.000 80.000 90.000 Produção per capita anual em 2011 (2005 dólares americanos) Índice inverso de corrupção (menos corrupto = 10) Nota: A figura mostra os valores de 2011 de um índice (inverso) de corrupção e valores de 2011 de PPP ‑produção per capita real ajustada, mensurada em dólares americanos de 2005 (a quantidade que um dólar poderia comprar nos Estados Unidos em 2005). A linha reta representa uma melhor previsão estatística do nível de corrupção do país baseando em sua produção per capita real. Fonte: Transparência Internacional, Índice de Percepção de Corrupção; Banco Mundial, Indicadores de Desenvolvimento Mundiais. A corrupção tende a aumentar à medida que a produção per capita real diminui. M22_KRUGXXXX_C22.indd 528 1/29/15 6:23 PM 529Capítulo 22 Países em desenvolvimento: crescimento, crise e reforma que preocuparam legisladores da política econômica no mundo inteiro, começando no início dos anos 1980. A economia de influxos financeiros para países em desenvolvimento Conforme afirmado, muitos países em desenvolvi‑ mento receberam influxos financeiros extensos do exte‑ rior e hoje têm dívidas substanciais com os estrangeiros. A Tabela 22.3 mostra o padrão de empréstimos desde 1973 pelos países em desenvolvimento não produtores de petróleo (ver a segunda coluna de dados). Conforme você pode ver, esses países eram solicitadores de emprés‑ timos constantes até o último momento do século XX (deixando de lado os principais exportadores de petró‑ leo, que têm grandes excedentes quando o preço mun‑ dial do petróleo está alto). Que fatores causaram influ‑ xos financeiros ao mundo em desenvolvimento, e por que o padrão aparentemente mudou por volta do início do século XXI? Lembre ‑se da equação (analisada no Capítulo 13) que relaciona a poupança nacional, S, o investimento doméstico, I, e o balanço de conta ‑corrente, CC : S – I = CC. Se a poupança nacional tiver pouco inves‑ timento doméstico, a diferença é igual ao déficit de conta ‑corrente. Em virtude da pobreza e de instituições financeiras pobres, a poupança nacional é quase sempre baixa em países em desenvolvimento. Entretanto, como esses países têm relativamente pouco capital, as opor‑ tunidades para introduzir ou expandir lucrativamente a fábrica e os equipamentos podem ser abundantes. Tais oportunidades justificam um alto nível de investimen‑ tos. Ao ter um déficit em sua conta ‑corrente, um país pode obter recursos externos para investir, mesmo que seu nível de poupança doméstica seja baixo. Contudo, um déficit em conta ‑corrente implica que o país está contraindo empréstimos no estrangeiro. Em troca de ser capaz de importar mais mercadorias estrangeiras hoje do que suas exportações atuais podem pagar, o país deve prometer efetuar no futuro o pagamento dos juros e do principal nos empréstimos ou dos dividendos em ações em empresas vendidas para estrangeiros. Desse modo, os países em desenvolvimento que con‑ traem empréstimos poderiam ser explicados pelos incen‑ tivos para o comércio intertemporal examinados no Capí‑ tulo 6. Os países com baixa renda geram pouca poupança própria para tomar vantagens de todas as suas oportuni‑ dades de investimentos lucráveis. Em países com capital alto, por outro lado, muitas oportunidades de investi‑ mento produtivas já têm sido exploradas, mas os níveis de poupança são relativamente elevados. No entanto, os poupadores em países desenvolvidos podem ganhar taxas mais altas de retorno ao emprestar para investi‑ mentos de finanças no mundo em desenvolvimento. Observe que, quando os países em desenvolvimento tomam emprestado para realizar investimentos produ‑ tivos que eles não seriam capazes de realizar de outro modo, tanto eles quanto os emprestadores adquirem ganhos do comércio. Os devedores ganham porque podem consolidar seus capitais sociais apesar da pou‑ pança nacional limitada. Os credores lucram ao mesmo tempo porque obtêm retornos mais altos em suas pou‑ panças do que ganhariam domesticamente. Embora as razões descritas forneçam uma explicação para a dívida e os déficits externos dos países em desen‑ volvimento, isso não significa que todos os empréstimos de países desenvolvidos para países em desenvolvimento sejam justificados. Empréstimos com investimentos finan‑ ceiros sem lucros — por exemplo, shopping ‑centers enor‑ mes que nunca são ocupados — ou importações de mer‑ cadorias de consumo podem resultar em dívidas que os devedores não podem pagar. Além disso, as políticas governamentais equivocadas, que reduzem artificial‑ mente as taxas de poupança nacional, podem levar a empréstimos estrangeiros excessivos. A queda de 1982‑ 1989 no nível de empréstimos de países em desenvolvi‑ mento evidente na Tabela 22.3 está associada com as dificuldades que alguns países mais pobres tiveram em honrar seus pagamentos aos credores. Um progresso surpreendente iniciado por volta de 2000 foi que países em desenvolvimento (incluindo muitos que não eram exportadores de petróleo) tiveram superávits, uma contrapartida de déficits “de países mais tAbelA 22.3 Balanços de contas ‑correntes cumulativas dos principais exportadores de petróleo, outros países em desenvolvimento e países desenvolvidos, 1973‑2012 (bilhões de dólares) Principais exportadores de petróleo Outros países em desenvolvimento Países avançados 1973–1981 252,9 –246,1 –183,8 1982–1989 –64,6 –143,3 –426,6 1990–1998 –58,2 –522,7 –105,9 1999–2012 3.445,9 1.766,1 –5.576,6 Fonte: Fundo Monetário Internacional, International Financial Statistics. Contas ‑correntes globais geralmente não somam zero por causa de erros, de omissões e da exclusão de alguns países em alguns períodos. M22_KRUGXXXX_C22.indd 529 1/29/15 6:23 PM 530 Economia internacional ricos” (principalmente o dos Estados Unidos). Contra‑ riamente ao que a teoria econômica simples preveria, o capital estava fluindo colina acima, dos países mais pobres para os mais ricos. Mencionamos esse padrão de desequilíbrio global no Capítulo 19, e aprofundaremos o fenômeno mais adiante neste capítulo. Uma razão para esses excedentesera o forte desejo dos países em desenvolvimento de acumular reservas internacionais, conforme discutiremos no quadro “Por que os países em desenvolvimento acumularam níveis tão altos de reser‑ vas internacionais?”. O problema da inadimplência Ganhos potenciais de contrair e conceder emprésti‑ mos internacionais não ocorrerão a menos que os cre‑ dores estejam confiantes de que serão pagos. Conforme observamos no Capítulo 21, um empréstimo é conside‑ rado em inadimplência quando o devedor, sem a concor‑ dância do credor, deixa de pagar o esquema de acordo com o contrato de empréstimo. Tanto a instabilidade social quanto política, bem como as fraquezas frequen‑ tes em suas finanças públicas e instituições financeiras, tornam muito mais arriscado emprestar para países em desenvolvimento do que para países industriais. E, de fato, a história dos fluxos financeiros para os países em desenvolvimento é repleta de crises financeiras e contra‑ tos de empréstimo inadimplentes: 1. No início do século XIX, diversos estados dos Estados Unidos ficaram inadimplentes em emprés‑ timos europeus que eles tinham feito para finan‑ ciar a construção de infraestrutura, como canais de navegação. 2. Durante todo o século XIX, os países da América Latina tiveram problemas de pagamento. Isso foi especialmente verdadeiro para a Argentina, que gerou uma crise financeira global em 1890 (a Crise do banco Baring) quando ela provou ser incapaz de cumprir suas obrigações. 3. Em 1917, o novo governo comunista da Rússia não reconheceu as dívidas estrangeiras que tinham sido contraídas por governantes anteriores. Os comunis‑ tas fecharam a economia soviética para o restante do mundo e embarcaram em um programa de desenvolvi‑ mento econômico centralizado que era com frequên‑ cia forçado ditatorialmente. 4. Durante a Grande Depressão dos anos 1930, a ati‑ vidade econômica mundial entrou em colapso e os países em desenvolvimento se encontraram fechados aos mercados de exportação dos países industriais por um muro de proteção (veja o Capítulo 19). Como resultado, quase todos os países em desenvolvimento ficaram inadimplentes com suas dívidas externas, e o fluxo financeiro particular para os países em desen‑ volvimento minguou por quatro décadas. Diversos países europeus ficaram inadimplentes com suas dí‑ vidas da Primeira Guerra Mundial para com os go‑ vernos aliados, principalmente os Estados Unidos. 5. Muitos países em desenvolvimento ficaram inadim‑ plentes (ou reescalonaram suas dívidas estrangeiras) nas décadas recentes. Por exemplo, em 2005, após ex‑ tensas negociações, a maior parte dos credores parti‑ culares da Argentina concordou em aceitar somente cerca de um terço dos valores contratuais de seus cré‑ ditos no país. A grande contração da produção e do emprego de um país ocorre invariavelmente após uma súbita parada na qual o país perde de súbito o acesso a todos os recursos de fundos estrangeiros (ver Capítulo 19). Em um nível muito básico, a necessidade dessas contrações pode ser vista na equação da conta ‑corrente, S – I = CC. Imagine que um país tem um déficit de conta ‑corrente que é 5% de seu PNB inicial, quando subitamente emprestadores estrangeiros ficam temerosos e cortam todos os novos empréstimos. Uma vez que sua ação força o balanço de conta ‑corrente a ser pelo menos zero CC ≥ 0), a equação S – I = CC nos diz que por meio de alguma combinação de uma queda no investimento ou um aumento na pou‑ pança, S – I deve imediatamente subir até pelo menos 5%. A queda aguda necessária para agregar demanda necessa‑ riamente deprime muito a demanda do país. Mesmo que inicialmente não esteja em vias de inadimplência — ima‑ gine que os emprestadores estrangeiros estavam original‑ mente preocupados com um súbito pânico irracional —, a contração súbita na demanda que o país sofreria tornaria a inadimplência uma possibilidade real. De fato, as coisas provavelmente podem ficar bem pio‑ res para o país do que o exemplo precedente sugere. Os credores estrangeiros não só bloqueiam novos em présti‑ mos se temerem a inadimplência, mas naturalmente tam‑ bém tentarão conseguir tanto mais dinheiro de fora do país quanto possível exigindo o pagamento integral de quaisquer empréstimos para que o principal possa ser exi‑ gido em curto prazo (por exemplo, depósitos bancários de curto prazo líquidos). Quando o país em desenvolvi‑ mento paga o principal da dívida, ele está aumentando a riqueza estrangeira líquida. Para gerar o item de conta‑ ‑corrente positiva correspondente (ver Capítulo 13), o país deve de alguma forma aumentar suas exportações líqui‑ das. Desse modo, em uma crise de parada súbita, o país não só terá que conseguir uma conta ‑corrente de zero, mas também será, na verdade, obrigado a conseguir um excedente (CC > 0). Quanto maior for a dívida externa M22_KRUGXXXX_C22.indd 530 1/29/15 6:23 PM 531Capítulo 22 Países em desenvolvimento: crescimento, crise e reforma do país em curto prazo — a dívida cujo principal pode ser demandado pelos credores — maior será o aumento nas economias ou na compressão do investimento que será necessário para evitar uma inadimplência. Você já deve ter observado que as paradas súbitas em países em desenvolvimento e crises de inadimplência podem ser dirigidas por um mecanismo de autopreenchimento análogo àqueles atrás do balanço de autopreenchimento das crises das balanças de pagamentos (Capítulo 18), corridas bancárias (Capítulo 20), e aos problemas de dívidas soberanas na área do euro (Capítulo 21). De fato, a lógica subjacente é a mesma. Além disso, as cri‑ ses de inadimplência em países em desenvolvimento são propensas a serem acompanhadas pelo balanço de crises de pagamentos (quando a taxa de câmbio é atrelada) e corridas bancárias. Um balanço da crise de pagamen‑ tos ocorre porque as reservas de câmbio estrangeiro ofi‑ ciais do país podem ser os únicos meios prontos que ele tem para pagar dívidas estrangeiras em curto prazo. Por meio da depleção de suas reservas oficiais, o governo pode proteger a demanda agregada reduzindo o tama‑ nho do excedente de conta ‑corrente necessário para pre‑ encher as demandas para o pagamento dos credores.5 Mas a perda de suas reservas deixa o governo incapaz de atrelar a taxa de câmbio por mais tempo. Ao mesmo tempo, os bancos têm problemas quando os depositan‑ tes domésticos e estrangeiros, temendo a depreciação da moeda e as consequências de inadimplências, retiram fundos e compram reservas estrangeiras na esperança de pagar dívidas de moeda estrangeira ou enviar riqueza com segurança para o exterior. Já que os bancos estão frequentemente fracos para começar, as retiradas em larga escala logo os pressionam à falência. Por fim, um impacto negativo sobre as finanças públicas pode com‑ pletar o doom loop. Se o governo precisa contrair mais dívidas como um resultado de enfraquecimento dos bancos, então seu próprio crédito está enfraquecido, o que ocasiona custos mais altos de empréstimos e uma chance maior de uma inadimplência soberana. Como cada uma dessas crises “trigêmeas” reforça as demais, uma crise financeira de um país em desenvolvi‑ mento tem uma probabilidade de ser grave, de ter efeitos negativos disseminados pela economia e de formar uma bola de neve muito rapidamente. A origem imediata desse colapso econômico disseminado pode ser a conta financeira (como na parada súbita), o mercado de câm‑ bio estrangeiro ou o sistema bancário, dependendo da situação específica do país. Quando um governo se torna inadimplente com suas obrigações, o evento é chamado de inadimplência sobe‑ rana. Uma situação conceitualmente diferente ocorre quando um grande número de mutuários domésticos particulares não pode pagar suas dívidas aos estran‑ geiros. Contudo, na prática, em países em desenvolvi‑ mento os dois tipos de inadimplência caminham juntos. O governo pode envolver o setor privado assumindo suas dívidas estrangeiras, desse modo esperando evi‑ tar o colapsoeconômico disseminado. Além disso, um governo com problemas pode provocar inadimplências ao limitar o acesso dos residentes domésticos a suas reservas de câmbio externas atuais. Essa ação torna ‑o muito mais difícil de pagar as dívidas de moeda estran‑ geira. Em outro caso, o governo torna ‑se intimamente envolvido nas negociações subsequentes com os credo‑ res estrangeiros. As crises de inadimplência eram raras nas primeiras três décadas após a Segunda Guerra Mundial: a emissão de dívidas pelos países em desenvolvimento era limitada, e os credores geralmente eram agências internacionais oficiais ou governamentais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. No entano, à medida que o fluxo livre de capital global particular se expandiu após os primeiros anos da década de 1970, cri‑ ses de inadimplência importantes ocorreram repetida‑ mente (conforme veremos), levando muitos a questionar a estabilidade do mercado de capital mundial.6 Formas alternativas de influxo financeiro Quando um país em desenvolvimento apresenta um déficit de conta ‑corrente, ele está vendendo ativos para estrangeiros para financiar a diferença entre seu gasto e sua renda. Embora tenhamos agrupado essas vendas de ativos sob o termo amplo empréstimo, os influxos finan‑ 5 Esteja certo de ter entendido por que isso é assim. Se necessário, reveja os conceitos de contabilidade de economia aberta do Ca‑ pítulo 13. Para uma análise estatística das características de crise monetária, bancária e de inadimplência, veja: Pierre ‑Olivier Gou‑ rinchas e Maurice Obstfeld. “Stories of the Twentieth Century for the Twenty ‑First”. American Economic Journal: Macroeconomics, v. 4, p. 226–265, jan. 2012. 6 Sobre a história da inadimplência durante o meio da década de 1980, veja: Peter H. Lindert e Peter J. Morton. “How Sovereign Debt Has Worked”. In: Jeffrey D. Sachs (Ed.). Developing Country Debt and Economic Performance, v. 1. Chicago: University of Chi‑ cago Press, 1989. Um bom panorama dos influxos de capitais priva‑ dos para os países em desenvolvimento durante o mesmo período é dado por Eliana A. Cardoso e Rudiger Dornbusch. “Foreign Pri‑ vate Capital Inflows”. In: Hollis Chenery e T. N. Srinivasan (Eds.). Handbook of Development Economics, v. 2. Amsterdam: Elsevier Science Publishers, 1989. Um panorama mais recente da crise de inadimplência é encontrado em Atish Ghosh et al., IMF ‑Supported Programs in Capital Account Crises, Occasional Paper 210. Wa‑ shington, D.C.: International Monetary Fund, 2002. Para uma pesquisa histórica abrangente, veja: Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff, This Time Is Different: Eight Centuries of Financial Folly. Princeton, NJ: Princeton University Press, 2009. Reinhart e Rogoff documentam que, para os países em desenvolvimento, as crises de inadimplência podem ocorrer em níveis comparativamente baixos de dívida externa em relação à produção. M22_KRUGXXXX_C22.indd 531 1/29/15 6:23 PM 532 Economia internacional ceiros que financiam os déficits dos países em desen‑ volvimento (e, de fato, qualquer déficit do país) podem adquirir diversas formas. Tipos diferentes de influxos financeiros predominaram em diferentes períodos histó‑ ricos. Como surgem obrigações diferentes a empresta‑ dores, um entendimento da cena macroeconômica nos países em desenvolvimento necessita de uma análise cui‑ dadosa de cinco canais maiores pelos quais esses países têm financiado seus déficits externos. 1. Financiamento de títulos. Países em desenvolvimento algumas vezes venderam títulos para cidadãos es‑ trangeiros particulares para financiar seus déficits. O financiamento de títulos foi dominante no período até 1914 e nos anos entre as guerras mundiais (1918‑ 1939). Essa modalidade ganhou popularidade nova‑ mente após 1990, à medida que os países em desen‑ volvimento tentaram liberalizar e modernizar seus mercados financeiros. 2. Financiamento bancário. Entre o início da década de 1970 e o final da de 1980, os países em desenvolvi‑ mento contraíram extensamente empréstimos de bancos comerciais nas economias desenvolvidas. Em 1970, quase um quarto das finanças externas dos paí‑ ses em desenvolvimento foi fornecido por bancos. Em 1981, os bancos forneceram uma quantidade de finanças quase igual ao déficit de conta ‑corrente agregada dos países em desenvolvimento não produ‑ tores de petróleo, mas nos anos 1990 a importância do empréstimo bancário diminuiu. 3. Empréstimo oficial. Os países em desenvolvimento algumas vezes contraem empréstimos de agências estrangeiras oficiais, como o Banco Mundial ou o Banco de Desenvolvimento Interamericano. Tais em‑ préstimos podem ser feitos sob uma base “concessio‑ nal”, ou seja, a taxas de juros abaixo dos níveis do mercado, ou sob uma base do mercado, que permite que o credor ganhe a taxa de mercado de retorno. No período pós ‑Segunda Guerra Mundial, os fluxos de empréstimos oficiais para as nações em desenvol‑ vimento encolheram em relação ao total de fluxos, mas continuaram a ser dominantes em alguns paí‑ ses, por exemplo, muitos daqueles situados na África subsaariana. 4. Investimento direto externo. No investimento direto externo, uma empresa de propriedade de residentes estrangeiros adquire ou expande uma empresa ou fábrica subsidiária localizada no país em desenvolvi‑ mento onde há uma filial (Capítulo 8). Um emprés‑ timo da IBM para sua fábrica filial no México, por exemplo, seria um investimento direto pelos Estados Unidos no México. A transação entraria na balança de contas de pagamentos do México como uma venda de ativos financeiros (e na balança de contas de pagamentos dos Estados Unidos como uma aqui‑ sição de ativos financeiros iguais). Desde a Segunda Guerra Mundial, o investimento direto externo tem sido uma fonte consistentemente importante de capi‑ tal dos países em desenvolvimento. 5. Investimento em portfólio em propriedade de empre‑ sas. Desde o início da década de 1990, investidores em países desenvolvidos têm mostrado um apetite maior em comprar quotas de ações em empresas de países em desenvolvimento. A tendência tem sido reforçada por muitos esforços de países em desen‑ volvimento na privatização — ou seja, vender para proprietários particulares grandes empreendimen‑ tos de propriedade do estado — em áreas chaves, como eletricidade, telecomunicações e petróleo. Nos Estados Unidos, diversas empresas de investimento oferecem fundos mútuos especializados em ações de mercados emergentes. Os cinco tipos de financiamentos descritos podem ser classificados em duas categorias: financiamento de dívidas e financiamento de patrimônio (Capítulo 20). Títulos, bancos e finanças oficiais são todas formas de financiamento de dívidas. Nesse caso, o devedor deve pagar o valor facial do empréstimo mais juros, indepen‑ dentemente de suas próprias circunstâncias econômicas. Investimento direto e compra de portfólio de quotas de ações são, por outro lado, formas de financiamento de patrimônio. Proprietários estrangeiros de um investi‑ mento direto, por exemplo, têm uma posse de uma par‑ cela de retorno líquido do investimento, não uma posse para um fluxo fixo de pagamentos em dinheiro. Desse modo, eventos econômicos adversos no país hospedeiro resultam em uma queda automática nos ganhos de inves‑ timentos diretos e nos dividendos pagos a estrangeiros. A distinção entre financiamento de dívida e financia‑ mento de patrimônio é útil para analisar como os paga‑ mentos de países em desenvolvimento aos estrangeiros ajustam ‑se aos eventos imprevisíveis, como recessões ou termos de mudanças comerciais. Quando os passivos de um país estão na forma de dívida, seus pagamentos pro‑ gramados aos credores não caem, mesmo se sua renda real cair. Pode então se tornar muito penoso para o país continuar a honrar suas obrigações externas — o suficiente para levar o país à inadimplência. A vida fre‑ quentemente é mais fácil, contudo, com o financiamento de patrimônio. No caso de patrimônio,uma queda da renda doméstica reduz automaticamente os ganhos dos acionistas estrangeiros, sem violar qualquer acordo do empréstimo. Ao adquirir patrimônio, os estrangei‑ M22_KRUGXXXX_C22.indd 532 1/29/15 6:23 PM 533Capítulo 22 Países em desenvolvimento: crescimento, crise e reforma ros concordaram efetivamente em compartilhar tanto os tempos ruins quanto os tempos bons da economia. Portanto, o financiamento de patrimônio, em vez do financiamento de dívidas dos seus investimentos, deixa um país em desenvolvimento muito menos vulnerável ao risco de uma crise de dívida externa. O problema do “pecado original” Quando os países em desenvolvimento incorrem em dívidas aos estrangeiros, elas muitas vezes são expressas em termos da moeda estrangeira principal — o dólar norte ‑americano, o euro ou o iene. Essa prática não é sem‑ pre uma questão de escolha. Em geral, os credores de paí‑ ses mais ricos, temendo a desvalorização extrema e a infla‑ ção que ocorreram tantas vezes no passado, insistem para que os países mais pobres prometam pagar nas moedas dos credores. Se as dívidas soberanas fossem denominadas em moedas nacionais, em vez de estrangeiras — em outras palavras, se o contrato de empréstimo fosse uma promessa de pagar os credores estrangeiros com moeda nacional —, então, os governos de países em desenvolvimento pode‑ riam simplesmente imprimir suas próprias moedas para pagar seus credores. Os governos nunca precisariam ter um padrão, embora criando inflação eles pudessem redu‑ zir o valor real das suas obrigações. Em contraste, com os países em desenvolvimento, os países mais ricos contraem empréstimos quase sempre em termos de suas próprias moedas. Assim, os Esta‑ dos Unidos emprestam dólares de estrangeiros, a Grã‑ ‑Bretanha contrai empréstimos em libras esterlinas, o Japão toma emprestados ienes e a Suíça pede empresta‑ dos francos suíços. Para esses países mais ricos, a capacidade de deno‑ minar suas dívidas externas em suas próprias moedas, mantendo ativos externos denominados em moeda estrangeira, é uma vantagem considerável — mesmo apesar da liberdade que isso dá para o governo pagar na moeda que pode imprimir. Por exemplo, suponha que uma queda na demanda mundial por produtos dos Esta‑ dos Unidos levem a uma depreciação do dólar. Vimos no Capítulo 19 como tal depreciação pode amortecer a produção e o emprego nos Estados Unidos. O portfó‑ lio norte ‑americano de ativos e passivos estrangeiros, na verdade, produz mais uma vantagem de amortecimento: como na maior parte, os ativos dos Estados Unidos são denominados em moeda estrangeira, o valor em dólar desses ativos sobe quando o dólar desvaloriza em relação às moedas estrangeiras. Ao mesmo tempo, como os pas‑ sivos estrangeiros dos Estados Unidos são predominan‑ temente (cerca de 95%) em dólares, seu valor em dólar sobe muito pouco. Então uma queda na demanda mun‑ dial por bens norte ‑americanos leva à transferência subs‑ tancial de riqueza de estrangeiros para os Estados Uni‑ dos — um tipo de pagamento de seguro internacional. Para os países pobres que devem contrair emprésti‑ mos em uma moeda estrangeira principal, uma queda na demanda por exportação tem o efeito oposto. Como os países mais pobres tendem a ser devedores líquidos nas principais moedas estrangeiras, uma depreciação da moeda doméstica causa a transferência de riqueza para estrangeiros, elevando o valor da moeda nacional da dívida externa líquida. Isso equivale a seguro negativo! Um país que pode contrair empréstimos no estrangeiro em sua própria moeda consegue reduzir os recursos reais que deve aos estrangeiros, sem desencadear uma morató‑ ria, simplesmente por desvalorizar sua moeda. Um país em desenvolvimento forçado a contrair empréstimos em moeda estrangeira não tem essa opção e pode reduzir o que deve aos estrangeiros apenas por meio de alguma forma de moratória imediata.7 Os economistas Barry Eichengreen, da Universidade da Califórnia, em Berkeley, e Ricardo Hausmann, da Universidade de Harvard, cunharam o termo pecado ori ginal para descrever a incapacidade dos países em desen‑ volvimento para contrair empréstimos em suas próprias moedas.8 Na opinião desses economistas, a incapacidade dos países pobres é um problema estrutural causado prin‑ cipalmente por características de mercado de capitais global — como o potencial de diversificação adicional limitado que a moeda de um país pequeno fornece aos credores dos países ricos, que já possuem todas as princi‑ pais moedas em suas carteiras. Outros economistas acre‑ ditam que o “pecado” dos países em desenvolvimento não é particularmente “original”, mas em vez disso deriva de sua própria história de políticas econômicas impruden‑ tes. O debate está longe de se acalmar, mas seja qual for a verdade, é evidente que, por causa do pecado original, o financiamento da dívida nos mercados internacionais é mais problemático para as economias em desenvolvi‑ mento do que para as desenvolvidas. Um fenômeno relacionado, mas distinto, é a grande escala de empréstimos privados, internos, em dólares ou outras moedas estrangeiras principais em muitos países 7 Como vimos no Capítulo 21, o governo da Grécia deixou de pagar sua dívida em 2012, a primeira moratória por um país de renda alta desde a década de 1940. Alguns outros países da zona do euro poderiam ficar inadimplentes no futuro. No entanto, os países da zona do euro enfrentam uma restrição exclusiva em comparação com outros países de renda alta. Como a política monetária é con‑ trolada pelo BCE, um único governo da zona do euro não pode optar por desvalorizar suas dívidas legalmente mediante a desvalo‑ rização da moeda nacional. 8 Veja seu artigo: “Exchange Rates and Financial Fragility”. In: New Challenges for Monetary Policy. Kansas City, MO: Federal Reserve Bank of Kansas City, 1999, p. 329–368. M22_KRUGXXXX_C22.indd 533 1/29/15 6:23 PM 534 Economia internacional em desenvolvimento. Como resultado, os devedores de moeda estrangeira podem encontrar ‑se em dificuldades quando a moeda nacional deprecia.9 A crise da dívida da década de 1980 Em 1981‑1983, a economia mundial sofreu uma recessão intensa. Assim como a Grande Depressão tornou difícil para os países em desenvolvimento fazer pagamentos de seus empréstimos estrangeiros — cau‑ sando rapidamente um padrão quase universal — a grande recessão dos anos 1980 também provocou uma crise sobre a dívida dos países em desenvolvimento. O Capítulo 19 descreveu como a Reserva Federal dos Estados Unidos em 1979 adotou uma dura política anti ‑inflação que aumentou as taxas de juros do dólar e ajudou a empurrar a economia mundial na recessão de 1981. A queda na demanda agregada dos países indus‑ triais teve um impacto negativo direto sobre os países em desenvolvimento, é claro, mas três outros mecanis‑ mos também foram importantes. Como o mundo em desenvolvimento tinha dívidas extensas denominadas em dólar com taxa ajustável (pecado original em ação), houve um aumento imediato e espetacular da carga de juros que os países devedores tinham que arcar. O pro‑ blema foi ampliado pela valorização acentuada do dólar no mercado cambial, que elevou substancialmente o valor real dos encargos da dívida em dólar. Por fim, o preço das commodities entrou em colapso, deprimindo os termos de comércio de muitas economias pobres. A crise começou em agosto de 1982, quando o México anunciou que seu banco central tinha ficado sem reservas externas e que não poderia mais atender os pagamentos de sua dívida externa. Vendo semelhanças potenciais entre o México e outros grandes devedores latino ‑americanos, como Argentina, Brasil e Chile, os bancos de países industrializados — os maiores credo‑ res privados para a América Latina no momento — se esforçavam para reduzir seus riscos ao cortar novos cré‑ ditos e exigir o reembolso de empréstimos anteriores. Os resultados foram uma incapacidade generalizada dos países em desenvolvimentopara cumprir obriga‑ ções de dívida anterior e um movimento rápido para uma moratória quase generalizada. A América Latina foi, talvez, mais duramente atingida, mas também foram atingidos os países do bloco soviético, como a Polônia, que tinha contraído empréstimos de bancos europeus. Os países africanos, cujas dívidas na maioria eram com agências oficiais, como o FMI e o Banco Mundial, tam‑ bém ficaram inadimplentes. A maioria dos países da Ásia Oriental foi capaz de manter o crescimento econômico e evitar o reescalonamento da dívida (isto é, a ampliação dos pagamentos, prometendo pagar juros adicionais no futuro). No entanto, no final de 1986, mais de 40 países tinham encontrado graves problemas de financiamento externo. O crescimento diminuíra drasticamente (ou tinha revertido) em grande parte do mundo em desenvol‑ vimento, e os empréstimos a esses países caíram drastica‑ mente. De início, os países industrializados, com envolvi‑ mento pesado pelo FMI, tentaram persuadir os grandes bancos a continuar a emprestar, argumentando que uma resposta coordenada do empréstimo era a melhor garantia de que dívidas anteriores seriam reembolsadas. Os formuladores de políticas nos países industrializados temiam que conglomerados bancários gigantes como o Citicorp e o Bank of America, que tinham empréstimos significativos na América Latina, fossem à falência no caso de uma moratória generalizada, arrastando para baixo o sistema financeiro mundial com eles.10 (Como você pode ver, houve mais de uma quase tragédia no caminho até a crise financeira de 2007‑2009!) Mas a crise não acabou até 1989, quando os Estados Unidos, temendo a instabilidade política ao sul, insistiram em que os bancos norte ‑americanos dessem alguma forma de alívio da dívida para os países em desenvolvimento devedores. Em 1990, os bancos concordaram em reduzir a dívida do México em 12% e, dentro de um ano, acordos de redução também tinham sido negociados por Filipi‑ nas, Costa Rica, Venezuela, Uruguai e Níger. Quando a Argentina e o Brasil chegaram a acordos preliminares com seus credores em 1992, foi como se a crise da dívida da década de 1980 tivesse enfim sido resolvida, mas só depois de anos de estagnação econômica. Reformas, afluxos de capital e o retorno da crise O início dos anos 1990 viu uma renovação de fluxos de capital privados para os países em desenvolvimento, incluindo alguns da América Latina altamente endivi‑ dados no centro da crise de dívida da década anterior. 9 Para uma reflexão sobre os motivos da denominação passiva em mo‑ eda estrangeira, consulte o artigo de Rajan e Tokatlidis em Leituras adicionais. Quando a moeda é o dólar norte ‑americano, o fenômeno é chamado de dolarização. Cada vez mais, alguns dos governos das economias dos mercados emergentes mais prósperos foram capazes de emitir títulos em moedas domésticas nos mercados de títulos domésticos, com alguma demanda de investidores estrangeiros (no‑ tadamente fundos mútuos). Esse desenvolvimento tem contribuído para atenuar um pouco o problema do pecado original. 10 Em 1981, os empréstimos de países em desenvolvimento dos oito maiores bancos dos Estados Unidos ascenderam a 264% de seu ca‑ pital, então as perdas de 50% dos empréstimos os teriam tornado insolventes. Consulte a tabela 5.1a em Federal Deposit Insurance Corporation. History of the 80s: Lessons for the Future. Volume I: An Examination of the Banking Crises of the 1980s and Early 1990s. Washington: FDIC, 1997. M22_KRUGXXXX_C22.indd 534 1/29/15 6:23 PM 535Capítulo 22 Países em desenvolvimento: crescimento, crise e reforma Conforme mostra a Tabela 22.3, o nível de empréstimos externos dos países em desenvolvimento não produtores de petróleo como um grupo se expandiu muito. As baixas taxas de juros nos Estados Unidos no início dos anos 1990 certamente forneceram um ímpeto inicial para esses fluxos de capital renovados. Talvez mais impor‑ tante, contudo, eram os grandes esforços nas economias receptoras para estabilizar a inflação, um movimento que exigia que o governo limitasse seus papéis na economia e aumentasse os retornos dos impostos. Ao mesmo tempo, os governos procuravam diminuir as barreiras comer‑ ciais, para desregulamentar a mão de obra e os merca‑ dos de produtos e para melhorar a eficiência dos merca‑ dos financeiros. A privatização disseminada serviu tanto para a meta microeconômica, de estimular a eficiência e a competição, quanto para a meta macroeconômica, de eliminar a necessidade de o governo cobrir as perdas de empresas estatais mal administradas e protegidas. O que por fim empurrou os países a realizar grandes reformas apesar dos interesses políticos que lutavam a favor do status quo? Um fator foi a própria crise de dívi‑ das de 1980, que resultou naquilo que muitos analistas denominaram de uma “década perdida” do crescimento da América Latina. Muitos dos legisladores relativa‑ mente jovens que subiram ao poder na América Latina, à medida que a crise de dívida terminava, eram econo‑ mistas bem formados que acreditavam que as políti‑ cas econômicas e instituições mal direcionadas tinham levado à crise e piorado seus efeitos. Apesar de ser mais pobre do que a América Latina tão recentemente, em 1960, o Leste Asiático agora era mais rico. Reformas econômicas recentes tomaram formas di‑ ferentes nos países da América Latina, e alguns tiveram um progresso significativo. Aqui nós contrastamos os aspectos macroeconômicos das abordagens realizadas em quatro grandes países que fizeram tentativas de refor‑ mas amplas (embora não igualmente bem ‑sucedidas). Argentina A Argentina esteve sob regime militar entre 1976 e 1983, mas a economia continuou sendo proble‑ mática mesmo após o retorno da democracia. Após anos marcados por crise bancária, instabilidade fiscal, e mesmo hiperinflação, o país por fim passou por uma reforma ins‑ titucional radical no início dos anos 1990. As tarifas de importação foram reduzidas, os gastos do governo sofre‑ ram cortes, as principais companhias estatais, incluindo a linha aérea nacional, foram privatizadas, e as reformas fiscais levaram a maiores rendimentos governamentais. O componente mais ousado do programa da Argen‑ tina, contudo, foi a nova Lei da Conversibilidade de abril de 1991, tornando a moeda da Argentina comple‑ tamente conversível em dólares norte ‑americanos em uma taxa fixa de exatamente um peso por dólar. A Lei da Conversibilidade também exigiu que a base mone‑ tária fosse lastreada por ouro ou moeda estrangeira, assim em um único golpe ela reduziu abruptamente a capacidade de o banco central financiar os déficits do governo mediante a criação constante de dinheiro. A Lei da Conversibilidade representou uma versão extrema da abordagem baseada na taxa de câmbio para reduzir a inflação que tinha sido tentada muitas vezes no passado, mas previsivelmente terminara em uma crise monetária. A lei monetária de 1991 exigindo 100% de respaldo do câmbio externo para a base monetária tornou a Argen‑ tina um exemplo de um conselho monetário, no qual a base monetária é respaldada inteiramente por moeda estrangeira e o banco central, desse modo, detém os ati‑ vos domésticos. Dessa vez, a abordagem funcionou por quase uma década. Apoiada por reformas financeiras e econômicas genuínas, o plano da Argentina teve um efeito drástico sobre a inflação que permaneceu baixa após cair de 800% em 1990 para bem menos de 5% até 1995. Contudo, a inflação continuada nos primeiros anos do plano de conversibilidade, apesar de uma taxa de câmbio fixa, implicou uma grande valorização real do peso, cerca de 30% de 1990 até 1995. A valoriza‑ ção real levou ao desemprego e a um déficit de conta‑ ‑corrente ‑crescente. Na metade da década de 1990, o processo de valo‑ rização real do peso terminou, mas o desemprego con‑ tinuou alto pela rigidez nos mercados de mão de obra. Embora até 1997 a economia estivesse crescendo rapi‑ damente, o crescimento subsequente tornou‑se negativo e o déficit do governo mais uma vez saiu do controle. À medida que a economia mundial escorregava para a recessão em 2001, o crédito externo da Argentina ia minguando. O país tornou ‑se inadimplente de seus débitos externos em dezembro de 2001 e abandonou o atrelamento peso/dólar em janeiro de 2002. O peso depreciou rapidamente e a inflação elevou ‑se mais uma vez. A produção argentina caiu para cerca de 11% em 2002, embora o crescimento tenha retornado em 2003, quando a inflação caiu. No momento da redação deste capítulo, a Argentina está tentando negociar um acordo com seus credores estrangeiros que permitirá que ela seja readmitida nos mercados de capital internacionais como tomadora de empréstimos. Brasil Como a Argentina, o Brasil sofreu inflação galo‑ pante na década de 1980, bem como múltiplas tentativas malsucedidas na estabilização acompanhada por refor‑ mas da moeda. Contudo, o país levou muito tempo para M22_KRUGXXXX_C22.indd 535 1/29/15 6:23 PM 536 Economia internacional conseguir ter a inflação sob controle e abordou sua desin‑ flação menos sistematicamente do que os argentinos.11 Em 1994, o governo brasileiro introduziu uma nova moeda, o real, atrelada ao dólar. À custa de falências bancárias disseminadas, o Brasil defendeu a nova taxa de câmbio com taxas de juros altas em 1995, então mudou para uma indexação do tipo crawlingpeg fixa crescente em face da valorização real substancial. A inflação caiu de uma taxa anual de 2.669% (em 1994) para menos de 10% em 1997. Contudo, o crescimento econômico continuou sendo pouco expressivo. Embora o governo do Brasil tenha realizado uma redução nas barreiras de importação, pri‑ vatização e arrocho fiscal, o progresso global do país na reforma econômica foi muito mais lento do que no caso da Argentina, e o déficit fiscal do governo permaneceu inquietantemente elevado. Uma boa parte do problema era a taxa de juros muito alta que o governo tinha que pagar em sua dívida, uma taxa que refletiu ceticismo nos mercados de que a valorização limitada do real em rela‑ ção ao dólar poderia ser mantida. Por fim, em janeiro de 1999, o Brasil desvalorizou o real em 8% e então permitiu que ele flutuasse. Muito rapidamente, o real perdeu 40% de seu valor perante o dólar. A recessão seguiu à medida que o governo lutava para impedir que a moeda seguisse em queda livre. Mas a recessão mostrou ter vida curta, a inflação não decolou e (como as instituições financeiras do Brasil tinham evi‑ tado fazer empréstimos pesados em dólares), o colapso do setor financeiro foi evitado. O Brasil elegeu um presi‑ dente populista, Luiz Inácio Lula da Silva, em outubro de 2002, mas as políticas de mercado que ele por fim (e inesperadamente) adotou preservaram o acesso do país aos mercados de crédito internacional. O crescimento econômico tem sido saudável e o país tornou ‑se uma força no mundo emergente. Um fator fundamental no sucesso tem sido suas fortes exportações de commodi‑ ties, principalmente para a China. Chile Tendo aprendido as lições do profundo desem‑ prego e colapso financeiro no início da década de 1980, o Chile implementou reformas mais consistentes mais tarde na década. De modo muito importante, o país instituiu um ambiente regulatório rígido para as insti‑ tuições financeiras domésticas e removeu uma garan‑ tia explícita de resgate que tinha ajudado a agravar a crise anterior da dívida do Chile. Um tipo de indexação crawling ‑peg do regime de taxa de câmbio foi usado para derrubar a inflação gradualmente, mas o sistema foi operado com flexibilidade para evitar a extrema valorização real. O banco central chileno tornou‑ ‑se independente das autoridades fiscais em 1990 (no mesmo ano em que um governo democrático substi‑ tuiu o regime militar do General Pinochet). Essa ação solidificou ainda mais o compromisso de não financiar déficits orçamentários ao ordenar ao banco central para imprimir dinheiro.12 Outra política nova exigia que todos os fluxos de capital (exceto compras de patrimônio) fossem acom‑ panhados de um depósito não remunerado de um ano, igual a 30% da transação. Como a duração limitava ‑se ao depósito solicitado, a penalidade caía desproporcio‑ nalmente em afluxos de curto prazo, aqueles mais pro‑ pensos a ser retirados por investidores estrangeiros em uma crise. Uma motivação para o imposto de influxo de capital implícito era limitar a valorização real da moeda. O outro era reduzir o risco de que uma retirada súbita de fundos estrangeiros de curto prazo pudesse provocar uma crise financeira. Há controvérsias consi‑ deráveis entre os economistas se as barreiras de influxo de capital chileno tiveram sucesso em seus objetivos, embora seja difícil crer que elas tenham provocado muito prejuízo.13 As políticas do Chile valeram a pena. Entre 1991 e 1997, o país desfrutou de taxas de crescimento do PIB em média de mais de 8% ao ano. Ao mesmo tempo, a inflação caiu de 26% ao ano em 1990 para apenas 6% em 1997. O Chile tem sido avaliado não só como o país menos cor‑ rupto da América Latina, mas também como menos corrupto do que vários membros da União Europeia e do que os Estados Unidos. México O México introduziu um programa de reforma e estabilização ampla em 1987, combinando uma redu‑ ção agressiva da dívida e dos déficits públicos com as diretrizes de direcionamento e salários ‑preços de taxa de câmbio negociadas com os representantes da indústria e 11 Para um relato, consulte Rudiger Dornbusch. “Brazil’s Incomplete Stabilization and Reform”. Brookings Papers on Economic Activity, v. 1, p. 367–404, 1997. 12 Para uma visão geral dos aspectos da abordagem chilena da refor‑ ma econômica, veja: Barry P. Bosworth, Rudiger Dornbusch e Raúl Labán (Eds.). The Chilean Economy: Policy Lessons and Challenges. Washington, D.C.: Brookings Institution, 1994. Um relato clássico dos problemas financeiros chilenos no início da década de 1980 é encontrado em Carlos F. Díaz ‑Alejandro. “Goodbye Financial Re‑ pression, Hello Financial Crash”. Journal of Development Economi‑ cs, v. 19, p. 1–24, set./out. 1985. Esse artigo é altamente recomenda‑ do, já que os problemas discutidos por Díaz ‑Alejandro revelaram ‑se pertinentes muito além do contexto específico do Chile. 13 Para uma discussão, ver Capítulo 5 do livro de Kenen incluído nas Leituras adicionais deste capítulo. Veja também Kevin Cowan e José de Gregorio. “International Borrowing, Capital Controls, and the Exchange Rate: Lessons from Chile”. In: Sebastian Edwards (Ed.). Capital Controls and Capital Flows in Emerging Economies. Chicago: University of Chicago Press, 2007, p. 241–296. M22_KRUGXXXX_C22.indd 536 1/29/15 6:23 PM 537Capítulo 22 Países em desenvolvimento: crescimento, crise e reforma dos sindicatos de trabalhadores.14 No mesmo ano, o país assumiu um compromisso significativo com o livre comér‑ cio, unindo ‑se ao GATT. (O México posteriormente se juntou à Organização para Cooperação e Desenvolvi‑ mento Econômico e, em 1994, aderiu ao Acordo de Livre Comércio da América do Norte.) O México fixou a taxa de câmbio do seu peso em relação ao dólar dos Estados Unidos no final de 1987, mudou para uma indexação crawling no início de 1989 e para uma faixa crawling no final de 1991. O governo manteve um nível limite máximo possível de valorização do peso, mas anunciou a cada ano após 1991 um limite gradualmente crescente na extensão permitida de depre‑ ciação da moeda. Assim, foi autorizado que o intervalo de flutuação da taxa de câmbio possível aumentasse ao longo do tempo. Apesar dessa flexibilidade potencial, as autoridades mexicanas mantiveram a taxa de câmbio perto de seu teto de valorização. O peso, portanto, nitidamente subiu de preço em termos reais, e surgiu um grande déficit da conta ‑corrente. Em 1994, as reservas de divisas do país caíram para níveis muito baixos. A agitação civil, uma transição presidencial iminente e temores de desvalori‑ zação contribuírampara essa queda. Outro fator impor‑ tante por trás do vazamento de reserva estrangeira, no entanto, foi uma extensão contínua de créditos do governo aos bancos que sofriam perdas com emprésti‑ mos. O México privatizara rapidamente suas margens sem salvaguardas regulatórias adequadas, e também tinha aberto sua conta de capital, dando assim aos bancos acesso gratuito aos fundos estrangeiros. Como os bancos estavam confiantes de que seriam socorridos pelo governo se tivessem problemas, o risco moral era desenfreado. Na esperança de estimular o crescimento e reduzir um déficit em conta ‑corrente que até então era quase 8% do PIB, o novo governo do México, que assumiu em dezembro de 1994, desvalorizou o peso 15% além do limite de depreciação prometido um ano antes. A indexação de moeda desvalorizada foi imediatamente atacada por especuladores, e o governo recuou para uma flutuação. Os investidores estrangeiros em pânico empurraram o peso para baixo precipitadamente, e em pouco tempo o México tornou ‑se incapaz de contrair empréstimos exceto a juros de penalização. Como em 1982, o risco de inadimplência apareceu novamente. O país só evitou o desastre com a ajuda de um emprés‑ timo de emergência de US$ 50 bilhões, orquestrado pelo Tesouro dos Estados Unidos e o FMI. A inflação, que caíra de 159% em 1987 para apenas 7% em 1994, subiu enquanto o peso depreciou. A produ‑ ção nacional do México recuou mais de 6% em 1995. O desemprego mais do que duplicou em meio a cortes fis‑ cais agudos, taxas de juros nas alturas e uma crise ban‑ cária generalizada. Contudo, a contração durou apenas um ano. Em 1996, a inflação estava caindo e a econo‑ mia se recuperava com o peso continuando a flutuar. O México recuperou o acesso aos mercados de capitais privados e reembolsou o Tesouro dos Estados Unidos antes do previsto. Uma grande conquista foi expandir suas instituições democráticas e afastar ‑se do regime de partido único virtual que caracterizara grande parte da história do país do século XX. Leste Asiático: sucesso e crise No início de 1997, os países da Ásia Oriental eram a inveja do mundo em desenvolvimento. Suas taxas de crescimento rápido iam levá ‑los até a escala de desen‑ volvimento, colocando vários deles a um passo do status de países desenvolvidos (que vários alcançaram agora). Então eles foram afetados por uma crise financeira desastrosa. A velocidade com que o sucesso econômico do Leste Asiático se transformou em caos econômico foi um choque intenso para a maioria dos observadores. O revés provocou uma crise mais ampla que envolveu paí‑ ses tão distantes como a Rússia e o Brasil. Nesta seção, analisamos a experiência do Leste Asiático. As lições, como veremos, reforçam aquelas da América Latina. O milagre econômico do leste asiático Como vimos na Tabela 22.2, a Coreia do Sul era uma nação extremamente pobre na década de 1960, com uma pequena indústria e aparentemente poucas perspectivas econômicas. Em 1963, no entanto, o país lançou uma série de reformas econômicas inovadoras, mudando da estratégia de desenvolvimento de substituição de impor‑ tações voltada para o mercado interno para uma estraté‑ gia que enfatizava as exportações. E o país começou uma ascensão econômica notável. Durante os 50 anos seguin‑ tes, a Coreia do Sul aumentou seu PIB real per capita em cerca de 16 vezes — mais do que o aumento que os Estados Unidos alcançaram ao longo do século passado. Ainda mais notável foi que a Coreia do Sul não estava sozinha. Sua ascensão econômica foi paralela à de várias outras economias do Leste Asiático. Na primeira onda, foram Hong Kong, Taiwan e Singapura que começaram a crescer rapidamente na década de 1960. No decorrer das 14 As ideias subjacentes à abordagem mexicana são explicadas por um de seus arquitetos, Pedro Aspe Armella, um economista formado no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, que foi ministro das finanças no período 1988‑1994. Consulte seu livro Economic Trans‑ formation the Mexican Way. Cambridge, MA: MIT Press, 1993. Consulte também Nora Lustig, Mexico: The Remaking of an Eco‑ nomy. Washington, D.C.: Brookings Institution, 1992. M22_KRUGXXXX_C22.indd 537 1/29/15 6:23 PM 538 Economia internacional décadas de 1970 e 1980, o clube das economias asiáticas de crescimento rápido expandiu ‑se para incluir Malásia, Tailândia, Indonésia, e — impressionantemente — China, a nação mais populosa do mundo. Pela primeira vez desde a ascensão do Japão como potência industrial no fim do século XIX, uma parte substancial do mundo parecia fazer a transição do Terceiro para o Primeiro Mundo. Ainda há uma controvérsia considerável sobre as razões desse “milagre econômico”. No início de 1990, estava na moda entre alguns comentaristas atribuir o crescimento da Ásia a um sistema asiático comum de cooperação de negócios ‑governo e política industrial. No entanto, mesmo um olhar superficial para as econo‑ mias envolvidas torna dúbia a afirmação de um sistema comum. As economias de crescimento alto incluem regi‑ mes como o da Coreia do Sul, onde o governo tomou um papel ativo na alocação de capital entre as indústrias. Mas também incluíam regimes como os de Hong Kong e Taiwan, onde esse tipo de política industrial estava em grande parte ausente. Algumas economias, como as de Taiwan e Singapura, dependiam fortemente da cria‑ ção de subsidiárias locais de empresas multinacionais. Outras, como Coreia do Sul e Hong Kong, dependiam principalmente de empresários nacionais. Por que os Países em desenvolvimento acumularam níveis tão altos de reservas internacionais? Os países em desenvolvimento enfrentando crises acham que suas reservas internacionais alcançavam níveis muito baixos. Um país que está fixando sua taxa de câmbio pode ter pouca escolha, além de dei‑ xar sua moeda depreciar uma vez que suas reservas foram esgotadas. Um país sem reservas de câmbio estrangeiras líquidas pode não ter qualquer meio para pagar os credores que tinham estendido previamente os empréstimos de moeda em curto prazo. Como na corrida bancária, o mercado teme que a depreciação ou a inadimplência potencial possa ser autorrealizada. Se a confiança do mercado falhar, as reservas rapida‑ mente desaparecerão e nenhum novo empréstimo de estrangeiros será possível. O esmagamento da liqui‑ dez resultante pode tornar impossível para um país cumprir suas obrigações externas remanescentes. Esse tipo de mecanismo de “corrida bancária” tem estado no centro de muitas crises de países em desenvolvimento, incluindo a crise econômica de 1997‑1998 da Ásia, que discutiremos a seguir. Após a crise da Ásia, que afetou diversos países em todo o mundo, diversos economistas sugeriram que os países em desenvolvimento tomem o problema em suas próprias mãos. Como o crédito externo tende a minguar precisamente quando ele é mais necessário, os países poderiam proteger ‑se melhor a si próprios acumulando grandes quantidades de dinheiro vivo — dólares, euros e outras moedas estrangeiras ampla‑ mente aceitas. Quando os países tinham pouco envolvimento com os mercados de capital mundiais (como durante os anos 1950 e início dos anos 1960), a adequação das reservas era julgada geralmente pela referência à probabilidade que os ganhos com exportação podiam ficar temporariamente aquém das necessidades de importação. Mas nas finanças globalizadas do mundo de hoje, o volume de reservas necessário para deter uma crise pode ser de magnitude maior. Conforme o economista Martin Feldstein de Harvard coloca: “O meio mais direto para um país alcançar liquidez é acu‑ mular quantidades substanciais de reservas externas líquidas (...) [Um] governo não deveria julgar a ade‑ quação de suas reservas em relação aos valores de importações. Uma meta de reservas comum de, diga‑ mos, seis meses de importações ignora o fato de que as crises monetárias são sobre fluxos de capital, não sobre financiamento de comércio. O que importa é o valor das reservas
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