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1 EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS Laura Borges CONVULSÃO EM PEDIATRIA Introdução: Condição comum em pediatria: 6% dos pacientes terão ao menos uma crise convulsiva antes dos 15 anos de idade As crises podem ser rápidas ou prolongadas, isoladas ou repetidas Crise única pode ser o início de quadro de epilepsia (2 ou mais crises com intervalo maior que 24 horas) ou o único episódio na vida de uma pessoa Crises prolongadas, repetidas ou subentrantes necessitam de atendimento emergencial Definições: Epilepsia: condição crônica caracterizada pela presença de crises epilépticas recorrentes na ausência de eventos externos desencadeantes Crise epiléptica: evento neurofisiológico onde ocorre descarga elétrica anormal por um grupo de neurônios. Pode ocorrer espontaneamente ou desencadeado por eventos exógenos como febre, distúrbios hidroeletrolíticos ou quadro encefálico Convulsões: crises epilépticas com manifestações motoras. As crises sem manifestações motoras como as ausências e outras com sintomas visuais, auditivos, ou exclusivamente sensitivos são denominadas crises não convulsivas Estado de mau epiléptico (EME): evento definido como uma crise por mais de 30 minutos ou 2 ou mais crises sequenciais sem completo restabelecimento da consciência entre elas. Atualmente, tem sido considerado tempo menor uma vez que as crises que se prolongam por mais de 5-10 minutos geralmente evoluem para estado de mal epiléptico o EME refratário: duração maior que 60 minutos ou não responsivo aos tratamentos com doses adequadas de 2 anticonvulsivantes o EME super refratário: duração por 24 horas ou mais apesar de instituição de anestesia, incluindo casos que EME recorre na redução ou retirada da anestesia Crise febril: é definida como crise que ocorre entre 6 meses e 5 anos de idade em presença de hipertermia, sem evidência de infecção do SNC ou outra causa associada, desde que não tenha tido crise afebril anteriormente. Ocorre em 2-5% das crianças e é a causa mais comum de convulsão em crianças com idade menor que 5 anos. Pode ser: o Simples: generalizada e de curta duração – não ultrapassa 15 minutos. Evolução benigna e a recorrência, em geral, não leva a déficits cognitivos o Complexas: prolongadas e/ou focais e podem recorrer nas 24 horas seguintes Fisiopatologia: Nível sistêmico: o 30 minutos: estimulação simpática com aumento do fluxo sanguíneo cerebral e da pressão arterial, taquicardia, hiperglicemia, hipertermia, aumento da sudorese e secreção pulmonar seguidos de acidose respiratória e metabólica o Após 1 horas há falência dos mecanismos compensatórios com hipotensão, hipercalemia, hipoglicemia e piora da acidose. Nível neuronal: o Desequilíbrio entre impulsos excitatórios e inibitórios. Os receptores glutamatérgicos (excitatórios) aumentam o influxo de cálcio, promovendo disfunção do sistema mitocondrial, ativação intracelular de enzimas, produção de radicais livres e liberação de ácidos graxos o Neurônios lesados liberam neurotransmissores excitatórios, em especial, glutamato, retroalimentando o processo o Evolução do processo: receptores inibitórios (GABA) se internalizam e os excitatórios vão se exteriorizando, perpetuando o processo Os benzodiazepínicos atuam nos receptores GABA (inibitórios) então com o passar do processo vai diminuindo a ação dos BZD porque os receptores vão sendo internalizados. 2 EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS Laura Borges Quanto maior a demora para interromper o processo, menor será a eficácia dos medicamentos antiepilépticos e maior a probabilidade de evolução com desfecho desfavorável em relação a mortalidade e morbidade Principais causas de convulsão em pediatria: Agudas: o Infecções do SNC (meningites, meningoencefalites) o AVE o Trauma (shaking baby por exemplo) o Causas metabólicas o Intoxicação o Retirada abrupta de medicação antiepiléptica o Medicações: penicilina, lidocaína, aminofilina, n-acetilcisteina, metronidazol, opioides, teofilina, imipenem, isoniazida e outros antibióticos betalactâmicos Crônica: o Epilepsia Princípios do tratamento: Providenciar suporte básico de ressuscitação Administrar fármacos antiepilépticos para controle do episódio convulsivo Diagnosticar e tratar as causas-base Suporte básico de Ressuscitação: Assegurar via aérea patente em todos os momentos do atendimento – aspiração de secreções e posicionamento da cabeça e pescoço. Avaliar necessidade de via aérea artificial. Monitorizar saturação e fornecer oxigênio suplementar para todos os pacientes em convulsão. Suporte ventilatório se necessário Avaliar pulso, perfusão e obter acesso venoso para infusão de medicações – deverão ser iniciadas nas crises com duração maior que 5 minutos Tratamento farmacológico: 1. Medicamentos de primeira linha: Benzodiazepínicos (Midazolam, Diazepam e Lorazepam). Preferencialmente IV, porém é possível vias alternativas se acesso venoso não está disponível após 5 minutos do início do atendimento o Diazepam: 0,2 – 0,5mg/kg IV ou Via Retal. – Máximo 10mg. Pode ser feita dose adicional após 5 minutos (até 3x). 1 ampola tem 2ml = 10mg o Midazolam: 0,1 – 0,3mg/kg IV ou IM. 0,2 – 0,5mg/kg Via intranasal ou VO. - Máximo 10mg. Pode ser feita dose adicional após 5 minutos. 1 ampola tem 5mg o Lorazepam: 0,05 – 0,1mg/kg IV ou IM. Máximo 5mg A principal complicação dos BZD é a depressão respiratória Devido ação relativamente curta, caso não se saiba a causa da EME, deverão ser administrados medicamentos de segunda linha logo após o controle da crise. O midazolam nasal é superior em eficácia ao diazepam retal 2. Medicamentos de segunda linha: vão ser indicados para profilaxia de nova crise ou para tratamento da crise em caso refratário. o Fenitoína: 20-30mg/kg/dia diluído em soro fisiológico com velocidade máxima de infusão de 1mg/kg/min (administrar em 20-30 minutos). Dose adicional de 10mg/kg pode ser administrada após 15 minutos Não pode ser feito em bolus!! Indicado ainda nos casos de episódios convulsivos que não responderam aos medicamentos de primeira linha (no caso do Diazepam após 3 doses) o Fenobarbital: 20mg/kg com infusão de 2mg/kg/min. Dose adicional de 20mg/kg pode ser administrada após 15 minutos. 3 EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS Laura Borges Tem mecanismo de ação semelhante aos dos BZD (atua nos receptores gabaérgicos) e tem maior risco de comprometimento respiratório e cardiovascular Medicamento de eleição para recém-nascido (primeiros 28 dias) o Levetiracetam: 20-40mg/kg IV com infusão de 5mg/kg/min o Valproato de sódio: 30-40mg/kg IV com infusão de 5mg/kg/min 3. Medicamentos de terceira linha: não há consenso a respeito do melhor medicamento a ser usado. Deverão ser usados, preferencialmente, em ambiente de terapia intensiva com monitorização eletrográfica. Mais usados: o Midazolam em BIC 0,05 – 0,4mg/kg/hora. Tem início de ação rápida, mas com possibilidade de recorrência após a retirada o Tiopental: 3-5mg/kg em bolus e manutenção de 3-5mg/kg/hora o Propofol: 1-2mg/kg em bolus e manutenção de 2-10mg/kg/hora. Tem rápido início e término de ação A efetividade do controle da crise está diretamente relacionada à precocidade do tratamento. Considerar o uso de piridoxina em recém-nascidos com quadros refratários de etiologia não esclarecida (50- 400mg IV). Pode ser diagnóstica e terapêutica. Em casos de depressão respiratória ou intoxicação por BZD pode ser necessário o uso de medicação agonista como o Flumazenil (0,01 – 0,02mg/kg/dose a cada 1-2 minutos) até que haja melhora do nível de consciência - máximo de 1mg dose total acumulada Deve-se ficar atento ao EME não convulsivo – manutenção de alteração do nível de consciência, irresponsividade após cessarem os movimentos com ou sem sinais motores discretos– pode indicar necessidade de EEG e de continuidade do tratamento. Investigação da Crise: após estabilização da convulsão Anamnese: histórico de epilepsia, interrupção ou uso irregular de anticonvulsivantes, histórico recente de traumatismo cranioencefálico, suspeita ou quadro clínico sugestivo de distúrbio metabólico, infecção do SNC ou intoxicação medicamentosa Exame físico: observar nível de consciência, presença de déficits motores locais recentes, sinas de hipertensão intracraniana, traumatismo, presença de sinais meníngeos ou outras alterações de doenças infecciosas. Observar sinais de negligência ou maus-tratos. Solicitação de exames laboratoriais e de imagem dependem da idade, história e exame físico: o Hemograma, glicemia, eletrólitos e gasometria arterial o Duração maior que 30 minutos ou tempo impreciso: acrescentar TGO, TGP, amilase, ureia e creatinina o Punção lombar deve ser considerada nas convulsões febris em crianças abaixo de 1 ano quando os sinais de irritação meníngea não são facilmente perceptíveis e nas crianças maiores com sinais meníngeos o EEG: raramente indicado no atendimento de emergência o Exames de imagem preferencialmente tomografia emergencial estão indicados em suspeita de lesão estrutural aguda ou subaguda do SNC o Suspeita de intoxicação: exame toxicológico e em casos específicos, dosagem de nível de fármaco antiepiléptico Seguimento: Crise febril simples: não há necessidade de iniciar tratamento profilático. Individualizar o caso. No caso de optar pela profilaxia, pode ser usado Diazepam de forma descontínua ou fenobarbital abaixo de 2 anos e ácido valproico em maiores de 2 anos de forma contínua. Crise febril complexa: encaminhar para avaliação especializada Duas ou mais crises com intervalo de horas: manter em observação por 12-24 horas. Iniciar tratamento medicamentoso profilático e solicitar exames laboratoriais e de imagem para tentar definir a causa.
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