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1 Victória Veiga – Medicina UNIFACS INTRODUÇÃO É a arritmia sustentada mais frequente e uma das principais causas de internações. É uma arritmia supraventricular em que não há sístole atrial, por completa desorganização na atividade elétrica atrial. Está frequentemente associada as doenças estruturas cardíacas. Sua prevalência aumenta com a idade, sendo a média de idade dos pacientes com FA 75 anos e em sua maioria do sexo masculino. É caracterizada no ECG por: → FC entre 90 e 170 bpm; → Irregularidade no intervalo RR; → Ausência de onda P ou qualquer atividade elétrica atrial regular; → QRS estreito (exceto em caso de bloqueio de ramo associado). → Substituição por um tremor de alta frequência nas linhas de base. FISIOPATOLOGIA Os mecanismos responsáveis pela FA não são completamente conhecidos, mas acredita-se que 2 sejam os mais associados: 1) Atividade automática rápida com origem em áreas de transição entre o tecido muscular atrial e das veias pulmonares, sensíveis ao aumento do tônus autonômico que age como iniciador e sustentador da arritmia. 2) Múltiplas áreas com reentrada anatômica, envolvendo fatores de fibrose, ou funcional originando vários pequenos circuitos de reentrada. OBS: Após o início da FA, os átrios sofrem alterações nas estruturas eletrofisiológica e anatômica, com encurtamento dos períodos refratários, aumento das áreas de fibrose e diminuição da complacência atrial, levando a mais crises de FA (FA ORIGINA FA). A FA reduz a capacidade de contração atrial no final da diástole, possibilitando estase sanguínea que é um grande fator de risco para formação de coágulos, aumentando, assim, o risco para insuficiência cardíaca, AVE, e aumenta consideravelmente o risco de morte em pacientes com IC prévia. É a principal fonte emboligênica de origem cardíaca, podendo causar isquemia em qualquer lugar da circulação sistêmica. Em resumo: A fisiopatologia da FA é multifatorial, sendo os principais responsáveis: alterações atriais anatômicas (dilatação e fibrose) secundárias às cardiopatias, remodelamento eletroanatômico secundário à própria FA, gatilhos locais (descargas rápidas das veias pulmonares*). Tais alterações geram múltiplos microcircuitos de reentrada, o que resulta na estimulação atrial caótica por inúmeros focos ectópicos. *O isolamento das veias pulmonares é eficaz para a eliminação da FA paroxística. FATORES DE RISCO É uma arritmia de indivíduos cardiopatas, idosos ou hipertireoideos. Idosos com HAS formam o grupo etiológico mais comum. A maioria geralmente possui hipertrofia ventricular esquerda ou alguma outra forma de doença cárdica estrutural. Cardiopatias isquêmicas, doença valvar mitral, cardiomiopatia hipertrófica, cardiopatia dilatada, CIA e anomalia de Ebstein fazem parte do grupo de risco para desenvolvimento de FA. O IAM pode cursar com FA, sendo a isquemia atrial e o estiramento atrial, decorrentes da disfunção de VE são fatores patogênicos. Como causas menos comuns estão as cardiomiopatias restritivas como amioloidose, pericardite constritiva e tumores cardíacos. O hipertireoidismo é encontrado como causa nos casos de FA de início recente e mecanismo envolvido deve-se ao aumento do tônus adrenérgico sobre o miocárdio. E é a causa corrigível mais comum. A apneia obstrutiva do sono aumenta o risco de FA e tem como mecanismo hipoxia, aumento do tônus autonômico e hipertensão. A dilatação atrial e o aumento de fatores inflamatórios sistêmicos são responsáveis pela relação entre obesidade e Fibrilação Atrial 2 Victória Veiga – Medicina UNIFACS FA. A obesidade também está associada ao aumento dos depósitos de gordura epicárdica o que leva a uma condução lenta ou anisotrópica causada pela infiltração de adipócitos no musculo atrial. Pode ter causas temporárias sendo a mais comum a ingestão de álcool (“holiday heart syndrome”). TIPOS CLÍNICOS FIBRILAÇÃO ATRIAL PAROXÍSTICA A arritmia dura menos de 7 dias, geralmente menos de 24h, e é autolimitada – resolve espontaneamente. Pode ser recorrente, ou seja, 2 ou mais episódios (FA paroxística recorrente). Aproximadamente 25% dos pacientes com FA paroxística tem FA vagotônica, durante a qual a FA é iniciada no cenário de tônus vagal alto, geralmente à noite, quando o paciente está relaxando ou durante o sono. A FA adrenérgica ocorre em aproximadamente 10% a 15% dos pacientes com FA paroxística no cenário de tônus simpático alto, como durante o esforço. A maioria dos pacientes possuem forma mista, sem padrão consistente de início. FIBRILAÇÃO ATRIAL PERSISTENTE Dura mais de 7 dias, mantendo-se indefinidamente, caso o paciente não seja cardiovertido. Pode recidivar após cardioversão (FA persistente recorrente). FIBRILAÇÃO ATRIAL PERMANENTE É aquela que persiste por mais de um ano ou refratária à cardioversão. É o tipo mais comum. OBS: A FA persistente pode evoluir para uma FA permanente. FIBRILAÇÃO ATRIAL ISOLADA Refere-se à FA que ocorre em pacientes com menos de 60 anos que não apresentam hipertensão ou qualquer evidência de doença cardíaca estrutural. Apresentam menor risco de complicações tromboembólicas, eliminando a necessidade de anticoagulação. Os pacientes também podem ser mais propensos a ter causas familiares ou genéticas. Além disso, a ausência de doença cardíaca estrutural permite o uso seguro de drogas de controle de ritmo. QUADRO CLÍNICO Uma parcela significativa dos casos é assintomática, sendo a arritmia percebida no exame físico e confirmada pelo ECG. Em alguns casos há piora hemodinâmica, precipitando sintomas como palpitações, dispneia, desconforto torácico, sudorese, tontura, fadiga e urgência miccional/poliúria. Essa piora hemodinâmica deve-se à própria taquicardia (reduzindo o tempo de enchimento ventricular e aumentando o consumo de oxigênio pelo miocárdio) e pela perda da contração atrial, reduzindo o enchimento diastólico do ventrículo e o DC. O esvaziamento atrial provoca aumento no AE, piorando congestão pulmonar. Pode ser a primeira manifestação de um evento tromboembólico* ou piora da IC. *Como os átrios perdem sua contração rítmica, o sangue sofre estase no interior das câmaras, predispondo a formação de trombos aderidos a parede atrial. Esse trombo pode se soltar e ir até a circulação, podendo ocluir um vaso arterial. O SNC é o local mais acometido – AVE isquêmico embólico. No exame físico, tem-se um ritmo cardíaco irregularmente irregular e perda de onda A no pulso venoso. A FC contada no precórdio é maior que a contada no pulso radial = dissociação pulso-precórdio. Podem ser encontradas pulsações venosas jugulares irregulares e intensidade variável do primeiro som cardíaco. ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO Utiliza-se o escore de CHA2DS2-VASc onde considera-se alto risco caso a pontuação seja maior ou igual a 2. Ele é 3 Victória Veiga – Medicina UNIFACS usado para tomar a decisão de coagular ou não o paciente. Sendo pontuação zero – sem indicação para terapia antitrombótica. Pontuação 1 – Terapia antitrombótica pode ser instituída, levando-se em conta o risco de sangramento. Pontuação maior ou igual a 2 – Indicação de anticoagulação. Para a avaliação de risco de acidente hemorrágico utiliza-se o escore de HAS-BLED, sendo pontuação > 3 indica elevado risco de sangramento, mas não significa que tenham contraindicação a anticoagulação. TRATAMENTO Na emergência, os pacientes com FA geralmente são aqueles de início recente (<48 horas) ou FA permanente que apresenta piora no quadro clínico. O tripé da atuação no tto da FA é: redução da FC, controle do ritmo (cardioversão) e anticoagulação. Se o paciente está instável, ou seja, apresentar um choque circulatório, congestão pulmonar e/ou isquemia miocárdica além da FAhá necessidade imediata de cardioversão, sem anticoagulação prévia. Já em paciente estáveis, ou seja, não há critérios de instabilidade, não tem necessidade de cardioversão imediata. CONTROLE DA FREQUÊNCIA CARDÍACA Buscando o controle da resposta ventricular. Utiliza-se drogas inibidoras do nó AV. A diminuição da FC pode melhorar os sintomas da arritmia e mesmo no paciente assintomático ela evita o surgimento de taquicardiomiopatia (Meta FC < 110 bpm em repouso). BETA BLOQUEADORES São as drogas de escolha da resposta ventricular. Ao bloquearem o efeito adrenérgico sobre o nó AV, reduzem a condução e aumentam a refratariedade das fibras. São preferidos nos pacientes coronariopatas e hipertireoideos. São usados Metoprolol e Esmolol. ANTAGONISTAS DE CANAIS DE CÁLCIO NÃO DIIDROPIRIDINICOS Agem bloqueando os canais de cálcio das fibras nodais, reduzindo a velocidade de condução e aumentando o período refratário. São contraindicados em pacientes hipotensos ou bradiarritimicos. São preferidos em pacientes com pneumopatia obstrutiva crônica e em asmáticos. As drogas usadas são Diltiazem e Verapamil. DIGITÁLICOS Além de inibirem o nó AV, agem melhorando a contatilidade miocárdica. Tem como desvantagem o início e pico de ação tardio. São utilizadas Deslanosídeo e Digoxina. OBS: Se não houver resposta adequada com apenas uma droga, pode-se associar dois medicamentos de classes diferentes. As associações mais utilizadas são: Digoxina + betabloqueador; Digoxina + diltiazem. CONTROLE DO RITMO Quando se opta pelo “controle do ritmo”, nos deparamos com um sério problema: se a FA tiver > 48h de duração, o risco de acidente cardioembólico (o trombo pode se despreender e ganhar a circulação sistêmica) após retorno do ritmo sinusal é grande. 4 Victória Veiga – Medicina UNIFACS Para converter com segurança um paciente com FA > 48h ou que tenha uma duração desconhecida, deve-se realizar um ecocardiograma transesofágico. Na ausência de trombos, o paciente pode ser cardiovertido logo em seguida. Porém, na presença de trombo, o paciente deve ser anticoagulado por 3-4 semanas antes da cardioversão. OBS: Se não for possível realizar um eco transesofágico, a conduta é assumir que existe trombo, anticoagulando por 3-4 semanas antes de cardioverter. Após a cardioversão de uma FA com > 48h ou duração desconhecida, o paciente deve permanecer anticoagulado. Se o risco cardioembólico for baixo, a anticoagulação poderá ser suspensa após quatro semanas. Isso se dá pois após 48h em ritmo de FA, se houver cardioversão o miocárdio atrial estará “atordoado”, o que significa que ele não recupera de imediato sua contração efetiva. Assim, formam-se bolsões de estase sanguínea atrial com alto risco de formação de trombos – os quais perduram até a melhora do “atordoamento” (que dura em média quatro semanas). Se o risco for alto, ela deverá ser mantida indefinidamente, mesmo que o coração volte a bater em ritmo sinusal. A cardioversão elétrica (CVE) sincronizada direta é um modo rápido e efetivo de converter o ritmo de FA para o ritmo sinusal. Geralmente usa-se sedação com midazolam ou propofol. Na cardioversão farmacológica, a drogas mais empregadas na prática atual são: ibutilida, amiodarona, dofetilida, propafenona, flecainida e sotalol. *Com exceção da ibutilida, as demais podem ser utilizadas também na profilaxia das recidivas. A dronedarona (análoga da amiodarona) também pode ser usada nessa situação. A amiodarona é a droga de escolha para profilaxia, por ter seu efeito preventivo superior as outras drogas. ANTICOAGULAÇÃO Depende de uma avaliação formal de risco cardioembólico – utiliza-se o escore de CHA2DS2-VASc. OBS: Se o risco cardioembólico for alto (FA “valvar”, CHA2DS2-VASC ≥ 2), a anticoagulação está indicada para o resto da vida do paciente, mesmo que ele retorne ao ritmo sinusal. A contração fibrilatória dos átrios é ineficaz em ejetar o sangue, dessa forma, a estase sanguínea nos átrios de um paciente com FA propicia a formação de trombos. A terapia antitrombótica diária para prevenir eventos tromboembólicos é apropriada para todos os pacientes em tratamento de FA recorrente, seja persistente ou paroxística. Na emergência, um fator importante em relação à decisão de anticoagular é o tempo da arritmia: o Se FA > 48 horas, recomenda-se pelo menos três semanas de anticoagulação após cardioversão. o Se FA < 48 horas, avalia-se o risco usando o escore CHA2DS2-VASc. No ambulatório, para pacientes com FA persistente ou paroxística, e um escore CHA2DS2-VASc de 0 em homens ou 1 em mulheres, é razoável omitir a terapia anticoagulante. Já para pacientes com FA e escore CHA2DS2-VASc de 1 em homens e 2 em mulheres, pode-se considerar a prescrição de um anticoagulante oral para reduzir o risco de AVC tromboembólico. Em pacientes com FA e um escore CHA2DS2-VASc elevado, de 2 ou maior em homens ou 3 ou maior em mulheres, são recomendados anticoagulantes orais. ANTICOAGULANTES ORAIS Os anticoagulantes orais diretos (DOACs): Dabigatrana, rivaroxabana, apixabana, edoxabana são a droga de primeira escolha. 5 Victória Veiga – Medicina UNIFACS São contraindicados em portadores de doença renal crônica, FA valvar e em pacientes que estão em uso de Varfarina com RNI controlado. ANTICOAGULAÇÃO COM ANTAGONISTA DE VITAMINA K A principal droga é a Varfarina. Age inibindo o ciclo de conversão da vitamina K, dessa forma, impede a ação biológica dos fatores de coagulação vitamina K-dependentes. A dose é ajustada para manter o RNI entre 2 e 3. Recomenda-se que o risco de acidente hemorrágico induzido por anticoagulantes também seja levado em consideração no momento de prescrever ou não esses medicamentos. Utiliza-se o escore HAS-BLED. No entanto, mesmo que exista um risco elevado de sangramento (pontuação > 3), não está contraindicado a anticoagulação! ABLAÇÃO DA FA Se as estratégias de “controle do ritmo” e “controle da frequência cardíaca” falharem, isto é, se o paciente não atingir as metas preconizadas, ou, se mesmo atingindo tais metas ele continuar bastante sintomático, define-se a existência de uma FA “refratária”. Cerca de 90% dos pacientes com FA refratária possuem focos extrassistólicos no miocárdio próximo às veias pulmonares, que funcionam como deflagradores de fibrilação atrial. O objetivo da ablação por cateter da fibrilação atrial é prevenir que correntes elétricas indesejáveis saiam das veias pulmonares e propaguem-se aos átrios, faz-se então um isolamento das veias pulmonares. A ablação de tais foco consegue prevenir a recidiva da FA na maioria das vezes. Uma vez que os sinais elétricos anormais que causam a FA ou os batimentos irregulares são identificados nas veias pulmonares, o cateter de ablação por radiofrequência (RF) leva a energia de RF para o tecido do coração identificado, bloqueando, assim, as vias elétricas anormais. Isso impede que sinais elétricos anormais, como os da fibrilação atrial, sejam propagados. A principal complicação é a estenose de veias pulmonares.
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