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INSUFICIÊNCIA CARDÍACA (IC) É uma síndrome clínica que resulta da redução estrutural ou funcional do enchimento ou do volume sanguíneo ejetado ventricular, causando os sintomas clínicas cardinais de dispneia e cansaço, além de edema e estertores. A doença arterial coronariana é a principal causa em homens e mulheres (60-75% dos casos). A hipertensão arterial contribui em 75% dos pacientes, assim como a diabetes melito. Ocorre principalmente em homens acima de 60 anos. ETIOLOGIA • Fração de ejeção reduzida (< 40%): ◦ Doença arterial coronariana (DAC): Infarto do miocárdio, Isquemia miocárdica. ◦ Sobrecarga pressórica crônica: Hipertensão arterial, Doença obstrutiva valvar. ◦ Sobrecarga volumétrica crônica: Doença valvar regurgitante, Shunt intracardíaco (esquerdo- direito), Shunt extracardíaco. ◦ Doença pulmonar crônica: Cor pulmonale (aumento e espessamento do ventrículo do lado direito do coração que resulta de um distúrbio pulmonar subjacente que causa hipertensão pulmonar), Alterações pulmonares vasculares. ◦ Miocardiopatia dilatada não isquêmica: Doenças familiares/genéticas, Doenças infiltrativas. ◦ Lesão induzida por tóxicos/fármacos, Doença metabólica, Viral. ◦ Doença de Chagas. ◦ Distúrbios da frequência e do ritmo: Bradiarritmias crônicas, Taquiarritmias crônicas. • Fração de ejeção preservada (> 40 a 50%) ◦ Hipertrofia patológica: Primária (miocardiopatias hipertróficas), Secundária (hipertensão arterial). ◦ Envelhecimento. ◦ Miocardiopatia restritiva: amiloidose, sarcoidose (infiltrativas), hemocromatose (armazenamento). ◦ Fibrose. ◦ Distúrbios endomiocárdico. • Estados de alto débito ◦ Doenças metabólicas (Tireotoxicose) e Distúrbios nutricionais (beribéri) ◦ Exigência de fluxo sanguíneo excessivo: Shunt arteriovenoso sistêmico, Anemia crônica. As principais causas são: isquêmica, chagásica, miocardite (viral), hipertensiva, alcoólica e idiopática. PROGNÓSTICO Cerca de 20-30% dos casos não possuem etiologia exata, sendo então os pacientes referidos como portadores de miocardiopatia dilatada não isquêmica ou idiopática. Estudos indicam que 30-40% dos pacientes morrem 1 ano após o diagnóstico e 60-70% em 5 anos. CLASSIFICAÇÃO • Insuficiência cardíaca tem que ter alteração estrutural • Sistólica: disfunção de contratilidade do ventrículo esquerdo (pressão de ejeção reduzida e, por algumas vezes intermediária) → B3: barulho do sangue que retorna batendo no sangue que sobrou. • Diastólica: ventrículo rígido → B4: associada à hipertensão - o diagnóstico só é fechado na presença de sintomas. • Podem estar concomitantes: por exemplo em hipertensão refratária, a diastólica pode evoluir para a sistólica. FISIOPATOLOGIA A IC é um distúrbio progressivo iniciado quando um evento-índice lesa o músculo cardíaco, resultando em perda da função dos miócitos cardíacos ou diminuição da capacidade do miocárdio de gerar força, impedindo que o coração se contraia normalmente. Diversos mecanismos compensatórios são ativados, como sistema nervoso adrenérgico, sistema renina-angiotensina-aldosterona e sistema das citocinas. Em curto prazo, esses sistemas são capazes de manter a capacidade da função cardiovascular dentro do limite da homeostase normal, mantendo o paciente assintomático. Entretanto, com o passar do tempo, esses mecanismos causam danos secundários em órgão-alvo do ventrículo, com agravamento do remodelamento ventricular e descompensação cardíaca. São mecanismos compensatórios a ativação do sistema renina-angiotensina- aldosterona e do sistema adrenérgico, responsáveis respectivamente por manter o DC com aumento na retenção de sal e água e o aumento da contratilidade miocárdica. Além disso, há ativação de uma família de moléculas vasodilatadoras compensatórias, peptídeos natriuréticos atrial e cerebral (ANP e BNP), prostaglandinas (PGE2 e PGI2) e óxido nítrico, os quais compensam a vasoconstrição vascular periférica excessiva. A diminuição do DC nos pacientes com IC produz uma “descarga” dos barorreceptores de alta pressão localizados em ventrículo esquerdo, seio carotídeo e arco aórtico. Essa descarga dos barorreceptores periféricos leva à perda do tônus parassimpático inibitório para o SNC, resultando em aumento generalizado no tônus simpático eferente e em liberação não osmótica de arginina vasopressina (AVP) pela hipófise. A AVP (hormônio antidiurético – ADH), vasoconstritor potente que aumenta a permeabilidade dos ductos coletores renais, leva à reabsorção de água. Esses sinais aferentes ao SNC ativam vias eferentes do sistema nervoso simpático que inervam o coração, os rins, a vasculatura periférica e os músculos esqueléticos. A estimulação simpática dos rins leva à liberação de renina, produzindo aumento nos níveis circulantes de angiotensina II e aldosterona. A ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona promove retenção de H20 e Na+, leva à vasoconstrição da vasculatura periférica, hipertrofia e morte celular de miócitos e fibrose miocárdica. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS • Fadiga: devido ao baixo débito cardíaco ou anemia. • Dispneia: nos primeiros estágios é observada apenas durante exercício, à medida que a doença evolui, passa a ser provocado por atividades cada vez menores ou em repouso. ▫ O mecanismo mais importante é a congestão pulmonar com acúmulo de líquido no interstício ou nos alvéolos, o que ativa receptores J justacapilares, estimulando a respiração rápida e superficial característica da dispneia cardíaca. ▫ Outros fatores: redução na complacência pulmonar, aumento da resistência nas vias respiratórias, fadiga dos músculos respiratórios ou diafragma e anemia. • Ortopneia: dispneia em posição deitada, em geral é uma manifestação mais tardia. ▫ Redistribuição do volume da circulação esplâncnica e dos membros inferiores para a circulação central quando o paciente permanece deitado, com aumento da pressão capilar pulmonar. • Dispneia Paroxística Noturna (DPN): tosses ou sibilos. Episódios agudos de dispneia e tosse que costumam ocorrer à noite, despertam o paciente 1-3 horas após deitar. ▫ Aumento da pressão nas artérias brônquicas, levando à compressão das vias respiratórias junto com edema intersticial pulmonar, o que produz aumento da resistência nas vias respiratórias. • Respiração de Cheyne-Stokes: respiração periódica ou cíclica, presente em 40% dos pacientes com IC avançada e em geral está associada à baixo DC. ▫ Causada pela redução da sensibilidade do centro respiratório à PCO2 arterial. Observa-se uma fase de apneia em que a PO2 arterial cai e a PCO2 arterial aumenta, estimulando o centro respiratório, resultando em hiperventilação e hipocapnia, seguidas de apneia recorrente. Costuma ser percebida como uma dispneia grave com suspensão transitória da respiração. • Edema Agudo de Pulmão • Outros sintomas: anorexia, náuseas e saciedade precoce, associadas à dor abdominal e plenitude, são queixas comuns. A congestão do fígado com estiramento de sua cápsula pode levar à dor em quadrante superior direito. Sintomas cerebrais como confusão, desorientação, distúrbios no sono e humor, observados em pacientes com IC grave. A noctúria é comum na IC. EXAME FÍSICO • Estado geral e sinais vitais: ▫ IC leve a moderada: paciente não aparenta desconforto em repouso, exceto deitado sem inclinação por alguns minutos. ▫ IC grave: paciente sentado ereto pode apresentar dificuldade respiratória ou impossibilidade de terminar uma frase por estar ofegante. PAS pode estar normal ou elevada na IC inicial, mas encontra-se reduzida nos casos avançados com disfunção VE grave. A pressão de pulso pode se mostrar reduzida, refletindo redução do volume sistólico. A taquicardia sinusal é um sinal inespecífico causado por aumento da atividade adrenérgica. A vasoconstrição periférica, que leva ao esfriamento das extremidadese cianose dos lábios e leitos ungueais, também é causada por atividade adrenérgica excessiva. • Veias jugulares: permite estimar o valor da pressão atrial direita. Com o paciente deitado e a cabeça inclinada a 45°, a pressão venosa jugular deve ser quantificada em centímetro de água (normal ≤ 8 cm), estimando-se a altura da coluna de sangue venoso acima do ângulo do esterno e adicionando 5 cm. Nos estágios iniciais da IC, a pressão venosa pode estar normal em repouso, mas elevar acima do normal com a pressão mantida (aproximadamente 15 segundos) sobre o abdome (refluxo abdominojugular positivo). A presença de onda v gigante indica regurgitação tricúspide. • Exame pulmonar: ruídos respiratórios adventícios (estertores ou crepitação) resultam de transudação de líquido do espaço intravascular para os alvéolos. Nos pacientes com edema pulmonar, os estertores podem ser amplamente auscultados em ambos os campos pulmonares, podem ser acompanhados de sibilos expiratórios (asma cardíaca). Derrame pleural causado por elevação da pressão capilar pleural que produz transudação para a cavidade pleural. • Exame cardiológico: frequentemente não acrescenta informações úteis acerca da gravidade da IC. Se houver cardiomegalia, o ictus cordis estará deslocado inferiormente para uma posição abaixo do 5º espaço intercostal ou lateralmente para a linha clavicular média. Em alguns pacientes, é possível ouvir e palpar uma 3ª bulha (B3) no ápice cardíaco. A presença de uma 4ª bulha (B4) não é um indicador específico de IC, mas geralmente está presente em pacientes com disfunção diastólica. Os sopros característicos de regurgitação mitral e tricúspide com frequência encontram-se presentes nos pacientes com IC avançada. • Abdome e membros: hepatomegalia dolorosa. Ascite, um sinal tardio, ocorre como consequência de aumento da pressão nas veias hepáticas e nas veias que drenam o peritônio. Icterícia, achado tardio, causada por disfunção hepática secundária à congestão do fígado e à hipoxemia hepatocelular, com aumento de bilirrubinas direta e indireta. O edema periférico ocorre predominantemente nos tornozelos e na região pré-tibial. Edema em membros inferiores, pode falar a favor de IC no lado direito. • Caquexia cardíaca: nos casos de IC crônica grave, pode haver perda evidente de peso e caquexia. DIAGNÓSTICO • Exames laboratoriais de rotina: hemograma completo, perfil dos eletrólitos, dosagens de ureia sanguínea, da creatinina sérica e das enzimas hepáticas, bem como análise de urina. Investigação de diabetes mellitus (glicemia em jejum ou teste de tolerância à glicose), dislipidemia (perfil lipídico em jejum) e disfunção tireoidiana (nível do hormônio estimulante da tireoide [TSH]). • Eletrocardiograma (ECG): recomenda-se a realização de ECG de 12 derivações. • Radiografia do tórax: fornece informações úteis acerca das dimensões e da forma do coração, assim como sobre o estado da vasculatura pulmonar. • Avaliação da função VE: o exame mais útil é o ecocardiograma bidimensional com Doppler, capaz de fornecer avaliação semiquantitativa das dimensões e função do VE, assim como presença ou ausência de anormalidades valvares ou na mobilidade da parede. A imagem por RM também fornece uma análise abrangente da anatomia e da função cardíacas, sendo atualmente considerado o padrão-ouro para a avaliação da massa e dos volumes VE. O indicador mais utilizado da função VE é a FE (volume sistólico dividido pelo volume diastólico final), no entanto, ela é influenciada por alterações na pós-carga e/ou na pré-carga. Quando a FE é normal (≥ 50%), a função sistólica em geral está preservada, e quando a FE está reduzida (< 30 a 40%), a contratilidade está reduzida. • Biomarcadores: peptídeo natriurético do tipo B (BNP), fragmento N-terminal do percursor do peptídeo natriurético cerebral (NT-pro-BNP), liberados do coração insuficiente. É útil para definir o prognóstico ou a gravidade da doença em caso de IC crônica. Além de ST-2 solúvel e galectina-3. Os critérios clínicos para o diagnóstico de IC são os Critérios de Framinghan, devendo ter 2 dos critérios maiores ou 1 maior e 2 critérios menores. TRATAMENTO Os objetivos do tratamento incluem redução dos sintomas, da progressão da doença, das taxas de hospitalização e da mortalidade. O tratamento farmacológico é feito com agentes que aliviam os sintomas (diuréticos) e aqueles que modificam o curso da doença (IECA, BRA, BB, antagonistas da aldosterona e hidralazina associada a nitratos). Terapias avançadas como dispositivos implantáveis e transplante cardíaco, podem ser necessárias em casos que não respondem ao tratamento clínico. Os diuréticos proporcionam rápido alívio dos sintomas de dispneia e congestão. Nos casos mais graves pode ser necessária associação de diurético de alça a um tiazídico para bloqueio sequencial do néfron. Agentes que modificam o curso da doença • Inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA): 1ª linha no tratamento de IC sistólica. Eficazes nas classes funcionais da IC de I a IV. Aliviam os sintomas, reduzem o tamanho ventricular e aumentam a FEVE. Reduzem hospitalizações, mortalidade e minimizam o risco de IAM. IECA Dose inicial (mg) Dose alvo (mg) Captopril 6,25 3x/dia 50 3x/dia Enalapril 2,5 2x/dia 10-20 2x/dia Lisinopril 2,5-5 1x/dia 20-40 1x/dia Trandolapril 0,5-1 1x/dia 4 1x/dia Fosinopril 5-10 1x/dia 40 1x/dia Perindopril 2 1x/dia 8-16 1x/dia Ramipril 1,25-2,5 1x/dia 10 1x/dia Quinapril 5 2x/dia 20 2x/dia • Bloqueadores dos receptores da angiotensina II (BRA): eficácia semelhante à dos IECAs, os quais constituem uma alternativa, principalmente nos casos de tosse por IECA. BRA Dose inicial (mg) Dose alvo (mg) Losartana 25-50 1x/dia 100-150 1x/dia Valsartana 40-80 2x/dia 320 2x/dia Candesartana 4-8 1x/dia 32 1x/dia • Betabloqueadores: agentes de 1ª linha com os IECAs para tratamento de pacientes com IC sistólica. O succinato de metoprolol, carvedilol e bisoprolol são eficazes na redução dos sintomas, taxas de hospitalização, progressão da doença e taxas de mortalidade. Uso indicado nas classes I a IV de IC. BETABLOQUEADORES Dose inicial (mg) Dose alvo (mg) Carvedilol 3,125 2x/dia 50 2x/dia Metoprolol 12,5-25 1x/dia 200 1x/dia Bisoprolol 1,25 1x/dia 10 1x/dia • Antagonistas da aldosterona: em pacientes com IC classe III e IV, junto com IECA, diurético e digoxina são eficazes na redução de sintomas, hospitalizações e mortalidade. Recomendados para pacientes em classe III e IV. Monitorar potássio sérico pelo risco de hiperpotassemia. ANTAGONISTA DA ALDOSTERONA Dose inicial (mg) Dose alvo (mg) Espironolactona 12,25 1x/dia 25-50 1x/dia Eplerenona 25 1x/dia 50 1x/dia • Associação de hidralazina e nitrato: eficazes em reduzir sintomas, hospitalizações e mortalidade em pacientes com IC. • Inibidor da neprililisina + BRA: Inibidor da neprilisina + BRA Dose inicial (mg) Dose alvo (mg) Sacubritil/Valsartana 24/26 2x/dia 97/103 2x/dia • Perfil B: ◦ Vasodilatação (vasodilatador) ◦ Furosemida (diurético) ◦ Betabloqueador ◦ IECA/BRA • Perfil C: interna na UTI □ Se pressão < 85 mmHg: ◦ Inotrópicos ◦ Vasoconstritores ◦ Betabloqueadores suspenso ◦ IECA suspenso □ Se pressão 85-110 mmHg: ◦ Vasodilatador ◦ Inotrópicos ◦ Furosemida ◦ Betabloqueador reduz ◦ IECA reduz • Perfil L ◦ Reposição de volume ◦ IECA/BRA suspenso ◦ Betabloqueador suspenso Causas de IC descompensada: má adesão ao tratamento, ingestão hídrica ou salina excessiva, infecções, uso de AINH, uso de álcool, isquemia miocárdica, TEP, dissecção de aorta, arritmia cardíaca, valvopatias, anemia, insuficiência renal, tireotoxicose, estresse físico ou emocional, drogas com inotropismo negativo (antiarrítmicos, BCCa), atividade reumática, gestação. Alvo terapêutico precoceem IC descompensada: diurese adequada (1L em 6h ou 1,5-2,5 ml/kg/h), ausência de ortopneia e esforço respiratório em 24h, ausência de dispneia aos mínimos esforços em 72h, SatO2 > 90% em AA, FC < 100 bpm, FR < 22 irpm, PAS 110 a 130 mmHg. REFERÊNCIAS Longo, DL et al. Harrison’s Principles of Internal Medicine. 19th ed. New York: McGraw-Hill, 2015. PERFIL HEMODINÂMICO (são instáveis) SINAIS DE CONGESTÃO Não Sim PERFUSÃO PERIFÉRICA ADEQUADA SIM Perfil A (quente e seco) Perfil B (quente e úmido) • Mais frequente NÃO Perfil L (frio e seco) Perfil C (frio e úmido) • Pior prognóstico
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