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1 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV OBJETIVOS 1) Analisar a dengue, considerando conceito, etiologia, epidemiologia, transmissão, quadro clínico, prognóstico, diagnóstico e tratamento. 2) Diferenciar os tipos de manifestação da dengue 3) Justificar os diagnósticos diferenciais entre zika, dengue e Chikungunya 4) Relacionar o impacto do zika vírus na epidemia de microcefalia REFERÊNCIAS • MARTINS, Milton A.; et al. Clínica Médica. 2ª ed. Vol. 7. Barueri – SP: Manole, 2016. • Ministério da Saúde. Chikungunya: manejo clínico. 1ª ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2017. • Ministério da Saúde. Dengue: Diagnóstico e Manejo Clínico. 5ª ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2016. • Ministério da Saúde. Vírus Zika no Brasil: a resposta do SUS. 1ª ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2017 • DIAS, L. B. A.; ALMEIDA, S. C.; HAES, T. M.; MOTA, L. M.; RORIZ-FILHO, J. S. Dengue: transmissão, aspectos clínicos, diagnóstico e tratamento. Medicina (Ribeirão Preto), [S. l.], v. 43, n. 2, p. 143-152, 2010. CONCEITO É uma doença infecciosa febril aguda, que pode se apresentar de forma benigna ou grave, dependendo de alguns fatores, entre eles: o vírus envolvido, infecção anterior pelo vírus da dengue e fatores individuais como doenças crônicas (diabetes, asma brônquica, anemia falciforme). A dengue é uma doença única, dinâmica e sistêmica. Isso significa que a doença pode evoluir para remissão dos sintomas, ou pode agravar-se exigindo constante reavaliação e observação, para que as intervenções sejam oportunas e que os óbitos não ocorram. EPIDEMIOLOGIA A dengue é um dos principais problemas de saúde pública no mundo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que ocorram anualmente cerca de 50 milhões de casos. Desse total, cerca de 550 mil necessitam de hospitalização e pelo menos 20 mil morrem em consequência da doença. No Brasil, a primeira epidemia documentada clínica e laboratorialmente ocorreu em 1981-1982, em Boa Vista (RR), causada pelos sorotipos 1 e 4. TRANSMISSÃO A dengue é uma arboviros (doença transmitida por inseto), do gênero flavivírus, que é transmitida pelo mosquito Aedes aegypti e possui 4 sorotipos bem estabelecidos: DENV-1, DENV-2, DENV-3 e o DENV-4, sendo que em termos de virulência, o 2 é o que mais se destaca, seguido pelo 3, depois o 4 e, por último, o sorotipo 1 (então para organizar isso: 2 > 3 > 4 > 1). O mosquito não é o causador da doença, ele é apenas o vetor dela, ou seja, não é ele quem produz o vírus, ele apenas o transmite. O Aedes é um mosquito que se alimenta do néctar e da seiva das plantas, no entanto, quando grávida, as fêmeas desenvolvem o hábito da hematofagia (alimentação com sangue) pois só assim elas conseguem alguns nutrientes específicos para o desenvolvimento dos seus ovos. A partir daí, se ela picar uma pessoa que seja portadora do vírus da Dengue, ela irá se infectar e Problema 05: Dengue, Chikungunya e Zika 2 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV apesar desse vírus não causar nenhuma doença no mosquito, ele consegue ser transmitido nas próximas picadas que ela der e é justamente esse processo que favorece a transmissão da doença. Associado a isso, existem 2 características desse mosquito que favorecem muito a disseminação da dengue que são: 1. Ciclo holometábolo Está relacionado ao processo de metamorfose: então o mosquito põe ovos que depois originam as larvas, que vão formar as pulpas e essas, então, evoluem para os mosquitos em si. E por que isso favorece a disseminação da doença? Porque esses ovos são muito resistentes! A princípio eles só são depositados em águas limpas e paradas, mas os estudos mostram que eles conseguem sobreviver em latência por até 450 dias em desidratação, mas dentro desse período, se ele for exposto água, ele terá a capacidade de retomar seu processo evolutivo e dar origem a novos mosquitos. Para se ter uma noção do impacto dessa característica na disseminação da Dengue: os mosquitos só conseguem voar por até 100-200m de distância dos seus ovos, então se acredita que a principal forma de disseminação da Dengue entre as regiões seja por meio das viagens de pessoas infectadas, associada ao transporte passivo dos ovos, já que eles conseguem resistir por bastante tempo e em situações adversas. Obs: Em média, cada mosquito vive em torno de 30 dias e a fêmea chega a colocar entre 150 e 200 ovos. Se forem postos por uma fêmea contaminada pelo vírus da dengue, ao completarem seu ciclo evolutivo, transmitirão a doença. Estudos demonstram que, uma vez infectada, a fêmea transmitirá o vírus por toda a vida, havendo a possibilidade de, pelo menos, parte de suas descendentes já nascerem portadoras do vírus. 2. Discordância gonotrófica Está relacionado com o processo evolutivo do Aedes, que passou para se adaptar à vida urbana. O que acontece é o seguinte: esse mosquito tem hábitos diurnos e isso é uma desvantagem porque é um período em que as pessoas estão mais ativas e, portanto, mais propensas a matar mosquitos do que se elas estivessem sendo picadas à noite. Por conta disso, o Aedes adquiriu maior agilidade com suas asas e desenvolveu a habilidade de sugar menos sangue, mas de mais pessoas, em vez de tentar sugar tudo de uma só - o que facilitaria que fossem mortos, como acontece com os pernilongos de hábitos noturnos. Dessa forma, além de haver um aumento na sua sobrevida, o Aedes também acabou tendo contato com mais indivíduos, o que também favorece a transmissão da Dengue. FISIOPATOLOGIA Assim que o paciente é contaminado pelo mosquito, o vírus penetra na corrente sanguínea e nesse primeiro momento ele vai se deslocar preferencialmente para 3 locais: -Monócitos; -Linfonodos; - Musculatura Esquelética Os vírus da dengue entram nas células de vertebrados por endocitose e fagocitose e sofrem replicação no citoplasma celular, após um período de latência de 12 a 16 horas. Nos lisossomos, ocorre tradução do RNA para que sejam produzidas proteínas virais e, daí, a maturação dos vírions irá ocorrer dentro de organelas como o Complexo de Golgi ou o Retículo Endoplasmático, o que permitirá a liberação dos mesmos novamente na corrente sanguínea após um determinado período. É nesse momento que o vírus irá se disseminar por todo o corpo do paciente estimulando a produção de citocinas pró-inflamatórias - como a TNF-a e IL-6, especialmente - e iniciando a fase sintomática da doença, sendo que uma das estruturas mais afetadas pela inflamação é a parede vascular, o que acaba aumentando a permeabilidade dela e, com isso, pode desencadear hemorragias ou a perda de plasma para terceiro espaço. 3 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV FATORES DE RISCO Porquê de algumas pessoas desenvolverem a Dengue de forma leve e outras apresentam quadros mais graves? Vírus: existe a hipótese de que determinados genótipos do vírus seriam mais virulentos e, assim, infectariam maior número de células propiciando proliferação viral em alta escala e aumento da viremia, o que resultaria em ativação mais potente do sistema imunológico e resposta inflamatória intensa, permitindo o desenvolvimento de formas mais graves da doença. Essa hipótese pode ser reforçada pelo fato de que a maior parte dos casos de febre hemorrágica da dengue observados nas Américas ter sido associado ao sorotipo DEN-2.Ela também pode explicar os casos isolados de febre hemorrágica da dengue que ocorrem durante infecção primária, que provavelmente são consequência de infecção por cepas mais virulentas. Infecção primária x infecção secundária: O risco de doença grave na infecção secundáriaé maior do que na infecção primária. Isso ocorre porque na infecção primária o paciente produz anticorpos que são neutralizantes para o sorotipo específico dessa infecção (imunidade homóloga) e que vão permanecer por toda a vida. Porém, esses anticorpos vão conferir proteção contra os outros sorotipos (imunidade heteróloga) por apenas alguns meses (três a seis meses). Depois desse período, se o paciente for infectado por sorotipo de vírus diferente daquele que ocasionou a infecção primária, esses anticorpos ligam-se ao vírus, mas não conseguem neutralizá-lo. Conforme defendido por Halsted em sua teoria, essa ligação do anticorpo sub neutralizante acaba facilitando, por meio de mecanismo de opsonização, a entrada do vírus na célula, fazendo com que uma quantidade maior de vírus ganhe o interior dos fagócitos. Idade: O risco de febre hemorrágica da dengue diminui com o aumento da idade, principalmente após os 11 anos. Em regiões endêmicas, o maior risco de FHD ocorre entre 6 e 12 meses de idade. Isso porque durante a gestação, se a mulher já tiver sido infectada pelo vírus da dengue, ela passa para o feto, por via transplacentária, anticorpos IgG anti- dengue. Entretanto, como esses anticorpos foram adquiridos de forma passiva, a tendência é que após o nascimento da criança eles vão declinando até chegar a níveis sub neutralizantes. Então, caso essa criança seja infectada pelo vírus da dengue, mesmo que seja com o mesmo sorotipo que infectou sua mãe e mesmo na infecção primária, ela poderá ter FHD. Estado Nutricional: Estudo feito com crianças tailandesas mostrou que a FHD é mais frequente em crianças eutróficas do que em crianças desnutridas. Isso pode estar relacionado à supressão da imunidade celular na desnutrição. Fatores Genéticos: Estudo realizado em Cuba mostrou que a FHD ocorre mais em brancos do que em negros, levantando a suspeita de que fatores genéticos, que ainda não estão bem esclarecidos, também estejam envolvidos na determinação da gravidade da doença. Vírus penetra na corrente sanguínea Migram em direção aos monócitos, linfonodos e musculatura esquelética Entram nas células por endocitose e fagocitose Tradução do RNA no lisossomo Produção de proteínas virais Maturação dos vírions no Complexo de Golgi ou o Retículo Endoplasmático Liberação na corrente sanguínea Produção de citocinas pró- inflamatórias 4 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV QUADRO CLÍNICO A infecção pelo vírus dengue pode ser assintomática ou sintomática. Quando sintomática, causa uma doença sistêmica e dinâmica de amplo espectro clínico, variando desde formas pouco sintomáticas até quadros graves, podendo evoluir para o óbito. Três fases clínicas podem ocorrer: febril, crítica e de recuperação. FASE FEBRIL A primeira manifestação é a febre que tem duração de dois a sete dias, geralmente alta (39ºC a 40ºC), de início abrupto, associada à cefaleia, à adinamia, às mialgias, às artralgias e a dor retroorbitária. As mialgias são parcialmente correlacionadas à multiplicação dos vírus no tecido muscular. Além disso, o paciente também pode ter náuseas e vômitos, anorexia, diarreia e exantema, sendo que com relação a esses dois últimos sintomas vale destacar que: a) Diarreia: costuma ser pouco volumosa, com fezes pastosas e numa frequência de 3-4x ao dia, o que facilita na hora de diferenciar dos quadros de gastroenterites; b) Exantema: está presente em cerca de 50% dos casos e na maioria das vezes se apresenta no padrão máculo-papular, afetando todo o corpo do paciente (face, tronco, MMSS, MMII, mãos e pés). Após a fase febril, grande parte dos pacientes recupera-se gradativamente com melhora do estado geral e retorno do apetite FASE CRÍTICA Esta fase pode estar presente em alguns pacientes, podendo evoluir para as formas graves e, por esta razão, medidas diferenciadas de manejo clínico e observação devem ser adotadas imediatamente. Caracteriza por uma melhora da febre entre o 3º e o 7º dia de doença, associada ao desenvolvimento de sinais de alarme, os quais são: Sinais de alarme na dengue Dor abdominal intensa (referida ou à palpação) e contínua. Vômitos persistentes. Acúmulo de líquidos (ascite, derrame pleural, derrame pericárdico). Hipotensão postural e/ou lipotimia. Hepatomegalia maior do que 2 cm abaixo do rebordo costal. Sangramento de mucosa. Letargia e/ou irritabilidade. Aumento progressivo do hematócrito A maioria dos sinais de alarme é resultante do aumento da permeabilidade vascular e a presença de um desses sinais indica que o paciente está deteriorando e tem uma chance maior de evoluir com complicações da doença, sendo a principal: choque. Dengue grave As formas graves da doença podem manifestar-se com extravasamento de plasma, levando ao choque ou acúmulo de líquidos com desconforto respiratório, sangramento grave ou sinais de disfunção orgânica como o coração, os pulmões, os rins, o fígado e o sistema nervoso central (SNC). O quadro clínico é semelhante ao observado no comprometimento desses órgãos por outras causas. Derrame pleural e ascite podem ser clinicamente detectáveis, em função da intensidade do extravasamento e da quantidade excessiva de fluidos infundidos. Choque 5 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV O choque ocorre quando um volume crítico de plasma é perdido através do extravasamento, o que geralmente ocorre entre o 4° e 5° dia (com intervalo entre 3 a 7 dias) de doença, geralmente precedido por sinais de alarme. O período de extravasamento plasmático e choque leva de 24 a 48 horas, costumando evoluir ao óbito em um intervalo de 12 a 24 horas ou a sua recuperação rápida, após terapia antichoque apropriada. . O choque prolongado e a consequente hipoperfusão de órgãos resultam no comprometimento progressivo destes, bem como em acidose metabólica e coagulação intravascular disseminada. Isso, por sua vez, pode levar a hemorragias graves, causando diminuição de hematócrito agravando ainda mais o choque. Hemorragias grave Em alguns casos pode ocorrer hemorragia massiva sem choque prolongado e este sangramento massivo é critério de dengue grave. Esse sangramento se dá não só pelo acometimento vascular, mas também pelo fato deles afetarem as plaquetas, o que torna mais difícil o processo de tamponamento. Inclusive, é justamente por conta dessa complicação que é contraindicado para os pacientes com diagnóstico ou suspeita de Dengue, o uso de medicamentos como o ácido acetil- salicílico (AAS) e os AINEs, já que eles afetam a cascata de coagulação e por isso podem acabar estimulando ainda mais as hemorragias. Disfunções graves de órgãos O grave comprometimento orgânico, como hepatites, encefalites ou miorcardites pode ocorrer sem o concomitante extravasamento plasmático ou choque. A Dengue também pode levar ao comprometimento funcional de vários órgãos como o fígado (que pode desenvolver hepatite devido à elevação de enzimas hepáticas), o coração (que pode ter uma miocardite - alteração do ritmo cardíaco), os rins (que entram em insuficiência aguda) e também o sistema nervoso central (provocando convulsões, encefalites, etc.). Isso mostra para a gente que é importante incluir na nossa solicitação de pacientes com Dengue Grave, uma série de exames para avaliar função orgânica geral como, por exemplo: TGO e TGP, ECG, ureia e creatinina. FASE DE RECUPERAÇÃO Por fim, a última fase da doença é a de recuperação, que é quando o paciente começa a ter uma melhora progressiva dos sintomas e do estado geral, mas isso não significa que vamos ficar tranquilos e pronto. A fasecrítica começa do mesmo jeito, então é importante continuar acompanhando o paciente por um tempo e mantê-lo orientado de que deve retornar aos serviços caso identifique algum dos sinais de alarme Somado a isso, quando se encerra o quadro de Dengue, ficará mais fácil de se identificar a presença de outras infecções associadas, então nós temos que ficar atento a isso. E além disso, é nessa fase que o paciente irá começar a reabsorver o líquido perdido para terceiro espaço, de modo que nós devemos nos preocupar também com o risco de hiper- hidratação Nesta fase o débito urinário se normaliza ou aumenta, podem ocorrer ainda bradicardia e mudanças no eletrocardiograma. 6 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV Alguns pacientes podem apresentar um rash cutâneo acompanhado ou não de prurido generalizado. ASPECTOS CLÍNICOS NA CRIANÇA A dengue na criança pode ser assintomática ou apresentar-se como uma síndrome febril clássica viral, ou com sinais e sintomas inespecíficos: adinamia, sonolência, recusa da alimentação e de líquidos, vômitos, diarreia ou fezes amolecidas. Nos menores de 2 anos de idade os sinais e os sintomas de dor podem manifestar-se por choro persistente, adinamia e irritabilidade, podendo ser confundidos com outros quadros infecciosos febris, próprios da faixa etária. O início da doença pode passar despercebido e o quadro grave ser identificado como a primeira manifestação clínica. O agravamento, em geral, é mais súbito do que ocorre no adulto, em que os sinais de alarme são mais facilmente detectados. ASPECTOS CLÍNICOS NA GESTANTE GESTANTES As gestantes necessitam de vigilância, independente da gravidade, devendo o médico estar atento aos riscos para mãe e concepto. Os riscos para mãe infectada estão principalmente relacionados ao aumento de sangramentos de origem obstétrica e às alterações fisiológicas da gravidez, que podem interferir nas manifestações clínicas da doença. Para o concepto de mãe infectada durante a gestação, há risco aumentado de aborto e baixo peso ao nascer; Obs: Gestantes com sangramento, independente do período gestacional, devem ser questionadas quanto à presença de febre ou ao histórico de febre nos últimos sete dias. DIAGNÓSTICO Clinicamente, conforme determinação da vigilância epidemiológica, considera-se caso suspeito de dengue, pacientes com doença febril aguda, com duração máxima de 7 dias, acompanhada de, pelo menos, 2 dos seguintes sintomas: cefaleia, dor retro-orbitária, mialgia, artralgia, prostração e exantema, confirmados laboratorialmente ou por critério clínico- epidemiológico (resida ou tenha estado nos últimos 15 dias em zona de circulação do vírus da dengue) Presença de quadro clínico clássico + período epidemiologicamente ativo (surtos) = dispensa qualquer outra investigação para a doença. Obs: Todo caso suspeito precisa ser notificado ao serviço de Vigilância Epidemiológica do município, poisa dengue é doença de notificação compulsória Mas fora isso, o método de escolha para fazer o diagnóstico da Dengue depende do tempo de início da doença. Até 5 dias: Durante os 5 primeiros dias da doenças, o paciente ainda não vai ter desenvolvido sorologia para Dengue, de modo que a única forma que teremos de fazer esse diagnóstico é através da dosagem de partículas relacionadas ao próprio vírus causador. Assim, nossas opções são: - Pesquisa de Antígeno Viral (NS1); - Teste de Amplificação Genética (RRT-PCR); - Imuno-histoquímica Tecidual - Cultura. Desses todos, o NS1, que é uma proteína presente durante a fase inicial da infecção, em altas concentrações no soro de pacientes infectados com o vírus da dengue, é o mais indicado, pois apresenta sensibilidade de 70% e especificidade de 95%, o que nos confere valores de RP+ de 14 e RP- de 0,3. Mas além disso, outras 2 coisas muito importantes com relação à dosagem de NS1 são: a) ela deve ser feita até o 3º dia da doença pois depois disso a sua acurácia começa a cair bastante; b) caso o paciente já tenha tido Dengue antes, esse exame também perde um pouco do seu valor diagnóstico. A partir de 5 dias: Do sexto dia em diante, realiza- se a sorologia com pesquisa de anticorpos IgM e IgG. 7 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV O IgG, só vai mostrar se o paciente já foi exposto ao vírus alguma vez, então pode ser que ele venha positivo por causa de infecção ontem, mas também pode ser que seja uma infecção de 2 anos atrás. Dessa forma, o que vai importar mesmo para podermos fazer o diagnóstico de Dengue no momento será o IgM, o qual tem sensibilidade e especificidade em torno de 80% e é um método que se mantém válido por até 90 dias após a infecção. CLASSIFICAÇÃO DE RISCO A classificação de risco do paciente com dengue visa reduzir o tempo de espera no serviço de saúde. Os dados de anamnese e exame físico serão usados para fazer esse estadiamento e para orientar as medidas terapêuticas cabíveis. Estadiamento clínico GRUPO A Paciente com suspeita de dengue, mas sem sinais de alarme ou condições especiais GRUPO B Pacientes com suspeita de dengue e sem sinais de alarme, mas com condições especiais GRUPO C Paciente com diagnóstico de dengue e com sinais de alarme GRUPO D Paciente com diagnóstico de dengue grave, apresentando choque, hemorragia ou disfunção orgânica TRATAMENTO CATEGORIA A 1) Solicitar os exames diagnósticos 2) Prescrever dipirona e/ ou paracetamol no intuito de fazer o controle dos sintomas. 3)Acompanhamento desses pacientes deve ser feito em ambulatório, 4) Orientar o paciente a fazer repouso, se hidratar bastante e retornar ao serviço o mais rápido possível caso apareça qualquer um dos sinais de alarme. CATEGORIA B Apesar de os pacientes estarem bem, eles possuem alguma condição de base que pode piorar com o quadro de dengue, 1) Manter o acompanhamento em leitos de observação, mas com a mesma conduta que adotamos para o paciente A: exames diagnósticos, medicamentos para controle álgico e hidratação oral (também do mesmo jeito) CATEGORIA C 1) Internação e reposição volêmica imediata (10mL/kg de soro fisiológico na 1ª hora), Obs: Devem permanecer em acompanhamento em leito de internação até estabilização – mínimo 48 horas 2) Prescrever dipirona e/ ou paracetamol no intuito de fazer o controle dos sintomas. 3) Realizar exames complementares obrigatórios: • Hemograma completo. • Dosagem de albumina sérica e transaminases. 3) Realizar exames de imagem: radiografia de tórax (PA, perfil e incidência de Laurell) e ultrassonografia de abdome. 4) Solicitar outros exames conforme necessidade: • glicemia, • ureia, • creatinina, • eletrólitos, • gasometria, • TPAE • ecocardiograma. 5) Se houver melhora do quadro, nós vamos readaptar a hidratação para 25mL/kg em 6h e 8 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV se continuar melhorando, a próxima etapa é novamente 25mL/kg só que em 8h. 6) Caso contrário, se o paciente não apresentar qualquer melhora à intervenção, aí vamos realoca-lo para o grupo D. CATEGORIA D 1) Encaminhar paciente para sala de emergência 2) Receber medicamentos para controle de sintomas 3) Realização dos mesmos exames do grupo C 4) Iniciar reposição volêmica imediata (20mL/kg de solução salina por via parenteral em até 20min). Obs: Caso necessário, repetir por até três vezes, de acordo com avaliação clínica. 5) Os pacientes devem ser reavaliados a cada 15- 30min e também precisam repetir o hemograma a cada 2h para que seja acompanhado o valor do Hematócrito 6) Se houver melhora clínica e laboratorial após fases de expansão, retornar paraa fase de expansão do grupo C e seguir a conduta recomendada para o grupo. Obs: Estes pacientes devem permanecer em acompanhamento em leito de UTI até estabilização (mínimo 48 horas), e após estabilização permanecer em leito de internação PREVENÇÃO Preparo do serviço de saúde antes de período críticos como o verão, associado a isso o controle vetorial, que podemos conseguir se evitarmos acúmulos água parada. No entanto, essa última é uma ação que requer um grande investimento em divulgação por parte do governo, uma vez que é uma medida de caráter individual, e por isso mais difícil de se conseguir adesão. Além disso, uma vacina contra a doença foi liberada há pouco tempo, mas ainda não é uma coisa 100% efetiva. Ela é feita com o vírus vivo, porém atenuado - mesmo assim acaba sendo contraindicada para populações de risco como gestantes e imunocomprometidos - e vem apresentado uma prevenção em torno de apenas 60%. Contudo, vale destacar que ela tem evitado a progressão para quadros mais graves em cerca de 80-95% e é justamente por isso que ela conseguiu se manter no serviço de saúde. Zika vírus INTRODUÇÃO A Zika é uma doença também causada por um flavivírus (o ZIKAV) transmitido pelo mesmo mosquito Aedes aegypti. No entanto, é importante comentar que existem evidências – ainda não conclusivas – de que esse vírus também é passado por transmissão vertical e sexual! QUADRO CLÍNICO De modo geral, a Zika não é uma doença tão expressiva como as outras duas de que já falamos: ela costuma passar por um período de incubação que dura de 2-14 dias, sendo que cerca de 80% dos indivíduos não manifestam qualquer sintoma após esse período. O outros 20%, no entanto, podem apresentar um quadro de exantema máculo-papular pruriginoso, febre baixa, fadiga e hiperemia conjuntival. O vírus da Zika possui o que chamamos de “neurotropismo”, ou seja, é um vírus que gosta do tecido nervoso e isso pode levar a uma série de complicações graves, sendo as mais comuns: a) Síndrome de Guillain-Barré, uma doença desmielinizante que cursa com dor e fraqueza muscular progressiva, além de perdas motoras e paralisia flácida; b) Microcefalia, que é uma má formação do sistema nervoso central devido ao ataque do vírus a células ainda em fase de migração e diferenciação. 9 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV RELAÇÃO DO ZIKA VÍRUS COM A MICROCEFALIA O zika vírus apresenta neurotropismo e por conta disso uma grande preocupação se dá quando ocorre a infecção durante a gestação. A Microcefalia é uma má formação do sistema nervoso central devido ao ataque do vírus a células ainda em fase de migração e diferenciação, de modo que a criança se apresenta com redução do perímetro cefálico, além de comprometimento neuropsicomotor significativo. A microcefalia é causada por vírus de maneira geral, como citomegalovírus a partir da transmissão transplacentária. Dessa forma, o vírus atinge o SNC do feto e desacelera o crescimento neuronal, provocando alterações no crescimento ósseo e, consequentemente, redução do perímetro cefálico. É importante destacar que o risco de microcefalia é muito maior no primeiro trimestre da gestação devido ao período de formação do SNC do feto, no entanto, o risco de infecção neonatal pelo feto é muito maior no terceiro trimestre. Chikungunha INTRODUÇÃO A Chikungunya é uma doença causada pelo vírus CHIKV (do gênero Alphavirus e família Togaviridae), o qual tem o Aedes aegypti como vetor e o homem como hospedeiro definitivo. Dessa forma, assim que é infectado pelo vírus, o paciente entra em um período de incubação que pode durar entre 1 e 12 dias (média de 3-7 dias) e só depois disso é que ele entra no período sintomático da doença, o qual pode ser dividido em 3 fases distintas: QUADRO CLÍNICO FASE AGUDA Febre alta de até 40ºC que dura no máximo 10 dias e, frequentemente associado à poliartralgia intensa e incapacitante (comumente com edema periarticular), que acomete principalmente mãos, punhos e tornozelo. Além disso tudo, o paciente também pode cursar com vários daqueles sintomas inespecíficos, inclusive o rash eritematoso maculopapular, que está presente em até 75% dos casos, sendo mais comum seu aparecimento por volta do 3º dia de sintomas. FASE SUBAGUDA Após cerca de 10 dias a febre desaparece marcando o fim da fase aguda e o início da fase subaguda, a qual pode se estender por até 3 meses e que é marcada persistência da dor articular, normalmente nas mesmas articulações previamente acometidas, mas que agora pode começar a cursar com rigidez matinal, edema e tenossinovite hipertrófica, podendo levar a complicações como a Síndrome do Túnel do Carpo. Por fim, depois de 3 meses os pacientes costumam evoluir para a recuperação mesmo, no entanto, uma pequena parcela acaba entrando numa 3ª fase da doença que é a fase crônica. FASE CRÔNICA A fase crônica é marcada por uma evolução do quadro articular, podendo apresentar deformação (como na Artrite Reumatoide) e, em 20% dos casos, o fenômeno de Raynaud. Mas além disso, o paciente pode voltar a apresentar vários dos sintomas inespecíficos como fadiga, cefaleia, prurido, alopecia, dor neuropática, distúrbio do sono, etc. 10 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV Diagnóstico Diferencial 11 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV
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