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Abordagens Psicoterápicas Gestalt-terapia Autorregulação organísmica e homeostase Autorregulação organísmica É o princípio natural que rege o funcionamento do organismo ↪ Antes era entendido como impulso ou drive ↪ Foi substituído pela ideia de potencialidades, que são capacidades naturais do organismo de lidar com o meio afim de estar sempre buscando a autorregulação ● em resumo, a autorregulação organísmica é uma potencialidade própria do organismo. É um princípio holístico, porque o organismo faz parte da natureza. Rege tanto os níveis individuais quanto ambientais do seu funcionamento A autorregulação permite que o organismo se organize para buscar modos eficientes para satisfazer no meio suas necessidades mais imediatas. O fim último da autorregulação é a busca do bem- estar, do prazer e da harmonia Perls: o grande desafio da autorregulação é que ao mesmo tempo que precisamos nos ajustar, isso só pode ser feito de modo criativo e inovador. Goldstein: a mudança é parte da autorregulação e adaptar-se a ela é fundamental para o resgate da saúde do organismo. Mudar constantemente é fundamental para funcionarmos do modo mais saudável possível ao longo da vida. O crescimento se dá como processo de autorregulação: homeostase - processo de busca de satisfação de necessidades na direção de um equilíbrio dinâmico no campo organismo Homeostase Goldstein: equiparava a autorregulação organísmica ao princípio homeostático ↪ busca do corpo pela manutenção das condições estáveis ou constantes do meio interno do corpo Princípio autorregulativo É um princípio geral, que se aplica a qualquer sistema. É o que governa nossas relações com o meio externo e é o mesmo princípio intraorganísmico de busca de equilibro. É acreditar que as ações do ser humano buscam a harmonia e realização, jamais autodestruição. O papel da frustração no ciclo autorregulativo O ser humano pode experimentar a frustração diante do impedimento da resolução de modo ideal de sua necessidade sem que se paralise por essa experiencia, ele poderá criar outros recursos e alternativas (ajustamento criativo) para tentar se autorregular; Sem a frustração não existe necessidade e nem mobilização de recursos para descobrir a sua própria capacidade. Papel da criatividade Perls: concebe o homem como dotado de um potencial criativo que lhe assegura novos modos e se expressar e agir Ser criativo é algo inerente a natureza do organismo Criatividade – capacidade do ser humano de buscar respostas novas aos entraves do meio ↪ essencial no processo autorregulativo. Nem sempre, na interação indivíduo-meio, a satisfação total é possível, então é necessário criatividade e a possibilidade de “inventar” novos modos de resolver, são fundamentais para estabelecer um funcionamento saudável. Pensamento e fantasia – grandes aliados na procura mental de outras saídas. A disfuncionalidade surge quando o indivíduo percebe- se impedido de realizar uma ação esperada no meio e se paralisa, não buscando outras soluções – estagna seu fluxo autorregulativo e estanca. Autorregulação e adoecimento psíquico Goldstein: expandiu o alcance do princípio da autorregulação para pensar o adoecimento psíquico do ser humano como processos nos quais existem bloqueios e rupturas no ciclo natural da autorregulação Quando o processo homeostático falha, quando o organismo se mantém num estado de desequilíbrio por muito tempo e é incapaz de satisfazer suas necessidades, está doente. Restrições severas e impedimentos constantes de se autorrealizar, podem gerar reações sintomáticas devido a frustração de suas necessidades mais básicas – o sujeito busca se adaptar à situação de algum jeito, mas passa a funcionar de um modo não harmônico e pode ter atitudes destrutivas. Visão inovadora para a psicopatologia: compreende que todo sintoma foi incialmente uma tentativa de buscar a autorregulação diante de um impedimento do meio A experiência neurótica é também autorreguladora - a energia encontra-se presa a uma tarefa que não pode ser acabada Hierarquia de necessidades Capacidade de descriminar e escolher aquilo que se torna mais importante e prioritário a cada momento As necessidades são diversas e perturbam o equilíbrio, que quando afetado, o organismo busca restaurá-lo por meio do contato ou da fuga A hierarquia não é fixa Para lidar com as diversas necessidades, a pessoa organiza-se para satisfazê-las, já que uma será atendida por vez, criando-se assim, uma hierarquia A necessidade prioritária será figura; as demais recuam para o fundo até que se tornem emergentes e possam ser atendidas Esse processo de figura-fundo se denomina de processo de formação da gestalt Quando a necessidade dominante é desfeita, a gestalt se fecha e volta para o campo, a figura retorna ao fundo e um novo ciclo se inicia Dominâncias espontâneas: o que é importante para a pessoa, necessidades de uma situação atual e evidenciam a hierarquia de necessidades X Dominâncias não espontâneas: Aquelas que são forçadas e impostas; envolvem menor motivação Quando ocorre algum tipo de perturbação ou interferência, a necessidade não é satisfeita e Gestalt não é satisfeita, a Gestalt não se fecha, criando assim uma situação não acabada A tensão e o resíduo que se formam interferem na capacidade do organismo de reagir às novas situações no presente, assim o fluxo do processo de crescimento se interrompe – a vida torna-se repetição - acarretando sentimentos de aprisionamento no passado, insatisfações Para reconhecer essa ocorrência na clínica, percepção de confusão, dificuldade de realizar escolhas e tomar decisões, impossibilidade de projetar o futuro, sensação de esforço excessivo, etc. Princípio de figura/fundo Para compreender o funcionamento do ciclo da autorregulação organísmica, é importante entender o princípio figura/fundo A necessidade dominante se torna figura de primeiro plano, e as outras necessidades recuam para segundo plano. A necessidade dominante é a que exige mais agudamente ser satisfeita. O adequado funcionamento da autorregulação se dá como um fluxo, um ciclo vital no qual a reversibilidade de figura/fundo é fundamental A interrupção ou fixidez desse fluxo é um processo não saudável ou não funcional A necessidade dominante quando não atendida, “rouba” energia da próxima necessidade da hierarquia A terapia gestáltica Busca reestabelecer a fluidez do processo de formação figura/fundo por meio da análise das estruturas internas da experiencia presente O processo psicoterapêutico busca, por meio da awareness, permitir que o fluxo autorregulativo se reestabeleça plenamente, os sintomas sejam ressignificados e outros modos de agir e estar no mundo sejam alcançados ↪ A awareness não é uma reflexão sobre o problema, mas é ela própria uma integração criativa deste. Mudanças não ocorrem apenas por meio da psicoterapia: ↪ estar atento a nossa experiencia, buscando contato pleno com as emoções, sensações, e pensamentos que emergem e permitindo-nos identificar as reais necessidades que surgem em cada momento, é, por si só, uma experiencia curativa. Para que a reintegração ocorra, Perls dá especial destaque a importância do autosuporte do cliente, que deixaria cada vez mais de depender do referencial externo (suporte ambiental) e passaria a confiar mais na própria sabedoria organísmica, no seu fluxo autorregulativo. O processo de maturação é a transferência do apoio ambiental para o auto apoio, e o objetivo da terapia é fazer com que o paciente não dependa dos outros e descubra que desde o primeiro momento ele pode fazer muito mais do que ele acha que pode. A psicoterapia é a restauração do poder de ajustamento criativo do paciente, processo de autorrealização de suas potencialidades criativas É importante que o psicoterapeuta compreenda que o sintoma, o adoecimento e asorganizações defensivas são formas de ajustamento criativo, porém disfuncionais pois estão desatualizadas e de desconsiderar a existência de outros recursos Acolher sua singularidade, sustentar seu sofrimento, compartilhar fragilidades Lugar do terapeuta como testemunha Ajustamento criativo e hierarquia de valores ou necessidades Gestalt-terapia “O recurso de todos os recursos é a fé na existência de recursos” - confiança na capacidade criativa do ser humano é um dos pilares fundamentais. Perls: revelou a necessidade ética de enraizamento na comunidade humana, o que só pode acontecer como acolhimento do singular e do criativo. Perls: no fundo do eu havia um outro, uma comunidade. Não poder confiar é nunca ter vivido a experiência de encontrar lugar na vida de um outro. É estar desenraizado. Enraizar é desconstruir o mundo do jeito que se organiza, atualizando o mundo a partir de sua singularidade, recriando-o. O homem é um ser DE fronteiras – viver na fronteira é viver na comunidade humana: estar com o outro sem deixar de ser si mesmo e para se tornar si mesmo. A fronteira é onde se dá a experiência - o que possibilitará a constituição do si mesmo sem aniquilar a si ou ao outro, alcançando a diferenciação e a união, vivendo no tempo e no lugar, aberto ao novo e ao inédito. Essa abordagem contempla essas facetas do humano: o campo da interdependência, a constituição do si mesmo ante o outro, o crescimento como processo, a necessidade de enraizamento e de abertura, o ajustamento criativo. O homem realizado: é o homem aberto, em constante processo de atualização, transformação e realização criativa, capaz de unir-se e de separar-se ritmicamente, de tocar e ser tocado pelo mundo. É o homem singular, que cresce de modo contínuo, responsável pela própria existência e consciente de seu lugar e participação no mundo que o cerca. O ethos revela as necessidades básicas que precisam ser contempladas para que nos tornemos humanos - é por meio do ethos que os psicoterapeutas poderão acolher e compreender a pessoa: sua subjetividade, sofrimento, formas de adoecimento, recursos. A relação terapêutica em Gestalt-terapia, compreendida como intersubjetividade - é o lugar da ética: morada, hospitalidade, solidariedade, ternura, cuidado, encontro, solo fértil a partir do qual o paciente pode enraizar-se, acontecer em sua singularidade, atualizar suas potencialidades. A Gestalt-terapia é prática dialógica (travessia e transformação compartilhadas) - abertura e disponibilidade para se deslocar dos próprios referenciais e ser tocado e transformado pelo modo de funcionar do paciente, que nos revelará o que antes dele desconhecíamos. Perls: função da terapia e transformar pessoas de papel em pessoas reais. A concepção de homem do psicoterapeuta estará sempre presente no processo terapêutico - a antropologia da Gestalt é a antropologia da esperança: o homem é capaz de ir além do trágico e da errância, capaz de se transformar e crescer. Uma abordagem integrativa e interativa que considera o homem uma totalidade unificada que se autorregula a partir da interação com o meio. O contato é o paradigma fundamental da Gestalt- terapia - por meio do contato e da fuga satisfazemos nossas necessidades O contato é o reconhecimento das diferenças, do outro - só há experiência quando ocorre contato Perls: Todo contato é ajustamento criativo do organismo e ambiente O homem é uma totalidade que se autorregula, num processo constante de interação com o meio Ajustamento Criativo Fazer uso de outras formas de busca de satisfação quando não há resolução de uma satisfação de modo primeiramente desejado Busca do equilíbrio entre aquilo que se precisa e as possibilidades existentes no meio Não é um modo padronizado e mecânico Dimensões do sofrimento e do adoecimento e humano: a prisão, a dispersão e a divisão. Voar sem enraizar é perder-se, estar sem chão. Enraizar-se sem voar é aprisionar-se, sem a possibilidade de vislumbrar o céu. Voar sem enraizar e enraizar sem voar é estar dividido, partido, desintegrado. Sem abertura e liberdade para enraizar e voar não há presente, não há ritmo, não há fluxo. Perls: considera que o ritmo é o senhor de tudo. Enfatiza a presença da pessoa no presente - atualização do passado e pressentimento do futuro Uma criatividade que ajusta e um ajustamento que cria polaridades que se inter-relacionam e compõem a realidade Ajustar-se implica imprimir sua marca nos acontecimentos da vida, “pessoalizando-os”, tornando- a própria Ajustar-se é viver a vida como fluxo, na interação com os outros e os acontecimentos, apropriando-se e criando recursos, assumindo a responsabilidade das nossas ações e escolhas O ajustamento sem a criatividade é a adaptação excessiva, acomodação, conformismo Superação de estruturas relacionais funcionais sem negá-las como matriz - encerrar situações inacabadas para que novos espaços sejam explorados – a realidade é flexível e pode ser transformada Yontef: o ajustamento criativo é o relacionamento entre a pessoa e o meio no qual há responsabilidade e engajamento na condução da vida, lidando com seu espaço e criando as condições que conduzirão ao seu próprio bem-estar = diferente de autossuficiência, mas como uma capacidade de reagir às dores que acompanham o crescimento, encarando-o cm responsabilidade A criatividade e o ajustamento criativo são polaridades, um não existe sem o outro A capacidade de sustentar-se numa situação, de forma diferente, usando os recursos disponíveis Ajustamento Criativo disfuncional Buscar se sustentar de forma rígida e estereotipada Não se reconhece como EU Não consegue mais se diferenciar entre o que é meu e o que é do outro Confusão entre o que intoxica e o que o nutre A interação é estereotipada e assume a forma de controle defensivo Quando há grandes perturbações na hierarquia das necessidades, a pessoa passa a não se responsabilizar por sua existência, sente-se desprovida de recursos A sabedoria da resistência Resistência Resistência é o resíduo de uma tentativa de diálogo interrompido abruptamente no meio da frase. As raízes da resistência são interpessoais e ontológicas, assim como intrapsíquicas. A maneira como a resistência se manifesta na terapia é um produto da interação entre terapeuta e cliente. Resistência como autoproteção Toda resistência é apenas uma manifestação de como essa pessoa sente-se vulnerável. É um comunicado do medo de assumir riscos que não tinham suporte na experiência anterior da pessoa - é uma forma essencial de autoproteção. A resistência é sempre um muro com dois lados – do ponto de vista externo: a pessoa está fechada, do ponto de vista subjetivo é uma evitação de um sofrimento psíquico. É um muro semipermeável que encerra feridas antigas sensíveis - é tarefa do psicólogo ajudar o cliente a tornar o muro mais permeável. A sabedoria da resistência Se encararmos a resistência como emergindo de um ponto em que a pessoa não tem suporte interno para lidar com a situação ameaçadora, podemos dizer que há uma sabedoria nessa resistência. As raízes intrapsíquicas não interpessoais – sua origem está na vulnerabilidade inerentes à infância - a abertura ingênua aos outros nos primeiros anos de vida traz a dor inevitável Decorre da ilusão da perfeição da infância - a awareness surpreendente de que não sou sempre aceito, nem aceitável - apenas “ser” não é suficiente, também tenho que “fazer”. O “fazer” impõe o risco e o medo de não ser aceito e nem amado. A resistência é a forma de a pessoa ser no mundo. É sempre uma resposta as necessidades múltiplas – o que é visto como resistência em um nível, pode, na verdade, estar satisfazendo necessidades em outro nível. O problema da resistência O problema da resistência é que ela é anacrônica - não é uma resposta a situação presente - esquecemosa decisão tomada a longo tempo e falhamos no uso de recursos atuais de maneira apropriada, ou seja, caímos na inércia - o medo inibe o crescimento. A resistência protege, mas impede a pessoa de crescer: ela corta diálogo com o mundo A resistência pode ser uma expressão profunda de alguma coisa que a pessoa precisa desesperadamente, e essa é a única forma que ela conhece para cuidar de si mesma. Diferente de um protetor de verdade, a resistência é primariamente defensiva, em vez de nutritiva - o comportamento resistente impede a nutrição que poderia vir dos outros Gestalt-terapia Para entrar no mundo experiencial do cliente, será essencial compreender as partes resistentes de sua personalidade - “em vez de procurar remover a resistência, é melhor colocá-la em foco. Na melhor das hipóteses a pessoa cresce através de resistência e, na pior, a resistência é uma parte de sua identidade”. “Quanto mais rápido eu aceitar a resistência do paciente, mais rápido virá o dia que ele se tornará mais colaborador na sua relação comigo”. O cliente que vem para a terapia não está valorizando sua resistência - é mais provável que ele tenha rejeitado essa parte sua e, por consequência, está sempre em guerra consigo mesmo. Ambivalência do ciente em relação à resistência - inconscientemente está resistindo, mas em algum nível sente que está trabalhando contra si mesmo. Se o terapeuta aceita com cuidado excessivo o desafio de “curar” alguém, a tendência é fazer surgir mais resistência. A tarefa inicial do terapeuta dialógico é entender a sabedoria da resistência. O terapeuta deve reconhecer o quão limitante a resistência pode ser, mas torná-lo predominante muito cedo é fazer da terapia um campo de batalha, com um vencedor e um perdedor O valor criativo da resistência É preciso que o terapeuta veja na resistência seu valor criativo e aprecie essa parte da pessoa. Com essa atitude o cliente é convidado a começas a apreciar uma parte até então rejeitada de si mesmo. Nenhum progresso real pode ser feito em terapia, até que o cliente esteja disposto a fazer isso. É importante descobrir o que a resistência está dizendo – só quando o cliente for capaz de entender isso, a mudança ocorrerá. Quando a pessoa para de se castigar por causa da derrota face à resistência, então já foi alterada a dialética das expectativas irreais, por um lado, e por outro, a sensação do fracasso – dar valor a resistência muda a dinâmica interna. A resistência deve ser abraçada e incorporada – a única forma de chegar onde se deseja, é aceitar onde está - para crescer é preciso valorizar até as partes indesejáveis. Transferência A resistência do cliente é frequentemente um aspecto do que tradicionalmente é chamado de transferência - o cliente se manifesta na situação terapêutica com muitos dos mesmos medos e expectativas que ele tem em outras situações interpessoais A resistência transferencial é uma função do “entre”, do encontro terapeuta/cliente. A falta de responsividade do terapeuta pode provocar ou amentar a resistência. A resistência “entre” Uma das questões inquietantes da alma que precisa ser questionada em toda psicoterapia é: quem está sendo resistente: o cliente ou o terapeuta? Frequentemente ambos. Uma tendência humana natural dos terapeutas, como autoprotetores, é ficar na defensiva diante da resistência do cliente A principal defesa do terapeuta é observar a resistência apenas como uma defesa do cliente A resistência do cliente é frequentemente exacerbada pela própria resistência do terapeuta, ou seja, as expectativas e os medos que não permitem ao terapeuta abranger o comportamento do cliente. Uma das formas mais básicas de resistência do terapeuta e que pode emergir secretamente, acontece quando o terapeuta impõe um método na terapia que não é consoante com as necessidades do cliente. O objetivo da terapia é fazer contato com o cliente e não com a teoria. Os terapeutas são humanos e é essa humanidade que contribui para a cura em terapia – os clientes passam a ver as falhas humanas do terapeuta, assim como sua coragem, esforçando-se para lidar com essas limitações existenciais. Há também sabedoria na resistência do terapeuta – ela informa quais são os limites entre sua abertura e a aceitação dos outros, e a necessidade de expandir ainda mais esses limites. O terapeuta se tornará aware de algumas de suas resistências na terapia, embora não seja o foco. Se existem resistências significativas por parte do terapeuta, deverão ser levadas para a supervisão ou para a própria terapia. É a confiança no terapeuta e na relação que se estabelece uma ponte sobre a aparente divisão criada pela resistência. A resistência como um ponto de contato É tarefa criativa do terapeuta poder encontrar o cliente no ponto de sua resistência Toda resistência é uma evitação de um comportamento e ao mesmo tempo um contato intrapsíquico consigo mesmo. É o contato com antigas necessidades de defesa ao passo que, paralelamente, ocorre o contato intrapessoal – um contato através do conflito A resistência é um contato defensivo me marcadamente delimitado. Sua importância é ressaltada pela realidade de que, nesse ponto, outros abandonaram aquela pessoa. O desafio do terapeuta é encontrar, criativamente, os meios de estabelecer um diálogo com essa pessoa e sua resistência. Encontrar o cliente no ponto de contato e incluir a resistência e vê-la como ponto de contato “entre” e não meramente como uma força de oposição. Em vez de ficar desanimado com a resistência o terapeuta poderia muito bem saudá-la e ver o porquê de o paciente precisar se comportar dessa forma. É exatamente nesse ponto que o cliente está mais ferido e demarca um novo nível de encontro entre cliente e terapeuta, abrindo possibilidade de ser um meio para a cura Ver a resistência como legítima e essencial, uma sabedoria – o terapeuta deve encontrar o cliente no ponto da resistência, bem como unir-se a ela. “Unir-se a” é o próximo movimento depois do contato com o ponto de resistência. Aliar-se significa pôr-se no lugar cliente. É necessário se colocar como o lado resistente do cliente, porque o cliente por si mesmo pode não estar completamente aware de sua resistência. Somente quando é possível aliar-se à resistência pode a cura genuína - aliar-se não significa se opor em força. A tarefa do terapeuta é ajudar os clientes a se tornarem aware daquelas resistências que interferem grosseiramente no funcionamento saudável. Significa, também, reconhecer que certas “resistências” são, de fato, partes de nossa existência e são parte do estar- no-mundo. Compreensão clínica em Gestalt-terapia: pensamento diagnóstico processual e ajustamentos criativos funcionais e disfuncionais Modelo médico de diagnóstico Modelo médico – diagnóstico como um processo investigativo que deve preceder o tratamento ou a intervenção clínica Diagnóstico como algo fixo ou como um “rótulo” – despersonalizante, rótulo limitante. Supõe: → que uma situação orgânica tem uma causa que a antecede → que o controle dessa situação é mais possível se essa causa for conhecida → que a descoberta e a descrição exata da causa são problemas que podem ser cientificamente investigados Movimento humanista e antipsiquiatria anos ’60 - acreditava-se que o diagnóstico reduzia as pessoas a conceitos e as categorizava, sendo antiterapêutico e repressivo. ↪ visão de diagnóstico como critérios diagnósticos, que tem função operacional e o objetivo é oferecer uma convenção que possibilite uma comunalidade de linguagem e de critérios ↪ Agrupam, nomeiam e classificam aquilo que se refere à perda dos mecanismos normais de funcionamento – CID e DSM ● Oferecem comunalidade – o que há de comum entre os homens ↪ Essas classificações são uteis por proporcionar uma linguagem em comum, importantes no trabalho interdisciplinar ↪Descrevem o que há de comum entre as pessoas portadoras de determinado distúrbio, mas não descrevem o conteúdo singular dos sintomas em cada paciente e seu significado ● Falta-lhes singularidade – o que há de diferente, próprio, singular em cala homem Esse modelo de diagnóstico é insuficiente para o desenvolvimento do trabalho clínico → é necessária a compreensão da dinâmica e da complexidade de cada paciente em sua singularidade existencial É preciso que nos afastemos do modelo médico. Concepção de homem na GT Homem como uma totalidade, em constante processo de crescimento e desenvolvimento – concepção holística ↪ ser biopsicossocial dotado de múltiplas dimensões: física, afetiva, intelectual, social, cultural e espiritual É preciso uma atenção a suas dificuldades e sofrimentos, e a suas possibilidades e potencialidades no processo terapêutico É necessária uma concepção de diagnóstico que contemple esses aspectos sem excluir os demais Diagnóstico em GT Investigação ao longo do processo terapêutico, lado a lado com o tratamento Reconfiguração do diagnóstico conforme investigação e tratamento se desenvolvem no processo psicoterapêutico Implica um processo dinâmico e contínuo de formação e destruição de Gestalten (Gestalt no plural) Diagnóstico deve ser entendido como a descrição e a compreensão de cada cliente em sua singularidade existencial ↳ é preciso compreender o que cada sintoma e queixa significam no contexto específico em que surgiram e no conjunto da vida da pessoa, bem como a que propósito serviram Não deve ser vinculado a uma doença ou anormalidade, e sim ao modo de existir a alguém Diagnosticar implica pensar os processos de ajustamentos criativos funcionais e disfuncionais. Awareness Capacidade de aperceber-se do que se passa dentro e fora de si no momento presente, seja em que dimensão for (corporal, mental, emocional) Perceber os meios externo e interno, mediante recursos perceptivos emocionais Contato Se dá por meio das Funções de Contato: ↪ Visão, audição, olfato, tato, fala e movimento É pelas funções de contato que nossa percepção se organiza e nossos sentimentos adquirem significado Awareness e Contato A experiencia é fruto da interação do indivíduo com o ambiente, e o que a possibilita é o contato e a awareness Para que haja awareness é necessário que exista contato, embora possa haver contato sem awareness Contato com awareness empobrecida resulta em contato que carece de qualidade É o processo de contato de boa qualidade que propicia que a interação indivíduo/ambiente seja nutritiva e que ocorram mudanças no campo relacional pessoa-ambiente → crescimento e desenvolvimento Hierarquia de necessidades ● Temos necessidades distintas e inter-relacionadas em nossa vida ↪ de natureza fisiológica – comer, beber, dormir. . . ↪ de natureza psicológica – relacionarmo-nos com o outro, expressarmos emoções, sermos amados e respeitados, estabelecimento e manutenção da relação com o outro. . . Ao longo do desenvolvimento, nossas necessidades tornam-se progressivamente mais complexas e abrangem diferentes âmbitos de inserção social e cultural As necessidades se manifestam e se realizam no campo indivíduo/ambiente (da experiência) → A satisfação de necessidades se dará por meio da interação saudável entre indivíduo e ambiente (Eu/não Eu) → O outro faz parte do ambiente e as experiencias do indivíduo são relacionais desde o início da vida ● Hierarquia de necessidades: Quando diferentes necessidades ocorrem ao mesmo tempo, a pessoa atende à necessidade dominante primeiro contato awareness Trata-se de uma hierarquia que, no caso de ajustamentos criativos funcionais, sempre varia – a todo momento nossas necessidades mudam Ajustamento criativo funcional O atendimento de necessidades ocorre por intermédio do ajustamento criativo ↪ capacidade de satisfazer às nossas necessidades de acordo com a nossa hierarquia de necessidades e com as possibilidades no campo organismo/meio, simultaneamente ↪ capacidade de interagir de modo ativo com o ambiente na fronteira de contato, adaptando, quando necessário, a demanda das necessidades às possibilidades de atendimento do ambiente Ajustamento criativo saudável implica awareness de nossas necessidades, bem como ser capaz de priorizá-las de acordo com a hierarquia de necessidades Nos remete as possibilidades e potencialidades do paciente Ajustamento criativo funcional é um fenômeno interativo que ocorre na fronteira de contato e se refere à habilidade de se relacionar criativamente com o ambiente como indivíduo único, com vistas à expressão e ao atendimento de necessidades – mantendo uma relação respeitosa com o outro em sua unicidade, ao mesmo tempo. Ajustamento criativo disfuncional É um fenômeno interativo que ocorre na fronteira de contato e se refere à inabilidade e/ou impossibilidade de se relacionar criativamente com o ambiente A pessoa se relaciona por meios de padrões cristalizados, padronizados e repetitivos, pelos quais a expressão de necessidades e sentimentos é distorcida ou suprimida a fim de manter a relação com o outro. Ao longo do desenvolvimento, a satisfação de certas necessidades pode rivalizar com a manutenção da relação com o outro. Quando isso ocorre, a pessoa busca formas diferentes de expressar suas necessidades, por meio do ajustamento criativo, tentando, ao mesmo tempo, manter a relação com o outro. ↪ No entanto, se essas tentativas falharem, haverá conflito Quanto mais intensa a necessidade e maior a dificuldade de expressá-la e satisfazê-la, e quanto mais precocemente ela ocorrer, mais provável depararmos com sintomas graves (físicos e psíquicos) O ajustamento criativo disfuncional implica algum grau de desorganização ou distorção do universo das percepções e dos sentimentos ↪ o que interfere nos processos de awareness ↪ funcionamento não saudável Interfere na qualidade e na possibilidade de desenvolvimento das potencialidades da pessoa e na ampliação do âmbito e da complexidade de suas experiências Tobin: “respostas adaptativas necessárias à sobrevivência em função de situações difíceis” Tais respostas são mantidas em situações atuais presentes que parecem semelhantes ou idênticas às situações passadas. As pessoas tinham escolhas possíveis, apesar de sentirem como se não as tivessem, porque não podiam fazê-las, seja qual fosse a natureza da impossibilidade ↪ A escolha feita pela pessoa é sempre a escolha que ela pôde fazer, naquela circunstância e com aquela experiência ↪ A escolha feita foi em função de uma necessidade absolutamente verdadeira e legítima: a de sobreviver como indivíduo mantendo a relação com o outro É preciso considerar a maneira como a pessoa percebeu o fato e a reação que isso suscitou nela ● Princípio da pregnância (da boa forma): ↪ A organização psicológica será sempre tão “boa” quanto as condições reinantes o permitirem O princípio da pregnância é o pressuposto do conceito de autorregulação organísmica: ↪ O organismo fará o melhor que pode para se regular levando em conta suas capacidades e os recursos do ambiente, simultaneamente. ↪ As respostas adaptativas necessárias à sobrevivência que observamos em funcionamento não saudável resultam de processos de autorregulação organísmica ↪ São ajustamentos criativos em sua origem e constituem aquilo que é possível Ajustamentos criativos disfuncionais muitas vezem revelam possibilidades que, reconfiguradas, podem revelar potencialidades a serviço do desenvolvimento de um modo de funcionar saudável e criativo Respostas adaptativas em situações infantis difíceis são mais significativas por ser quando a necessidade de manutenção da relação com o outro é maior e o conflito então é mais crucial – mas essas respostas adaptativas podem ocorrer com outras situações relacionais significativasdifíceis ao longo da vida Pensamento diagnóstico processual Ao longo do processo terapêutico, constantemente se pergunta o que está acontecendo e a serviço do quê (para quê). Se identifica os ajustamentos disfuncionais e os ajustamentos criativos funcionais Esse diagnóstico deve acompanhar o processo terapêutico levando em consideração o crescimento do paciente e suas mudanças ao longo do tempo e na sua relação consigo e com o outro É necessário compreender a serviço de que se constitui aquilo que aparece O pensamento diagnóstico processual não se refere ao que a pessoa é, mas a como ela está a cada momento do processo terapêutico envolve uma descrição e compreensão do funcionamento psíquico de cada indivíduo singular, bem como seu desenvolvimento e mudanças ao longo do processo terapêutico é singular com cada cliente, por cada um ser único não é linear não envolve apenas os aspectos disfuncionais do paciente – é importante atentar para os aspectos funcionais (forças, recursos, sucessos nas diferentes áreas, as potencialidades, as capacidades, as qualidades, energias etc.) ● Relação figura/fundo – passado/presente/futuro Aquilo que o cliente traz no aqui e agora não é apenas seu presente imediato, a-histórico O aqui e agora inclui o passado – que surge na forma de lembranças e experiências – e o futuro – que se apresenta na forma de projetos, anseios, planos. O que aparece no relato do paciente é uma figura que se insere num fundo Fundo – história de vida do cliente, suas experiencias, seus relacionamentos passados (em especial as suas relações primárias significativas), suas potencialidades e seus limites. É preciso compreender a relação entre o aqui e agora e lá e então; do passado com o presente – pois a configuração presente está relacionada a como a pessoa viveu suas experiencias e a como elas a afetaram e ainda afetam entre a figura/queixa e o fundo – pois é a relação figura/fundo que dá sentido à figura Desenvolvimento psíquico saudável → O processo de tornar-se indivíduo decorre da qualidade da relação com o outro, que possibilita o desenvolvimento psíquico saudável “À medida que a pessoa possa experienciar ao longo de seu desenvolvimento, uma relação amorosa e respeitosa, em que possa expressar suas necessidades (sejam elas de que natureza forem) e exercer seu potencial, poderá se desenvolver como indivíduo único e singular, interagindo com o ambiente por meio do ajustamento criativo, de acordo com sua hierarquia de valores.” Conforme ocorrem os processos de desenvolvimento e crescimento, a independência e a autonomia da pessoa aumentam A necessidade de se relacionar com o outro persiste, porém, a natureza dessa relação se modifica ↪ decresce em grau de dependência, cresce em grau de reciprocidade e mutualidade Quanto mais se ampliam os processos de desenvolvimento e maturação, maiores o âmbito e a complexidade das experiencias que se apresentam à pessoa, e maior a possibilidade de ela dar conta dessas experiências ● Aspectos necessários para o pensamento diagnóstico processual ↳ não ter nenhuma ideia apriorística em mente – estado de disponibilidade interna e abertura ao outro, no qual é possível deixar-se entrar em contato com aquilo que possa emergir da relação ↳ atitude respeitosa de curiosidade – tomando o cuidado de não invadir, e sim de mostrar interesse; perguntar sem insistir, ouvir e acolher sem julgar ou avaliar ↳ estar atento àquilo que impacta – o que chama atenção, intriga, não faz sentido, impressiona. . . . No discurso do paciente, na aparência, na energia, na postura corporal, na afetividade (ou seus bloqueios), na voz etc. O impacto sinaliza algo que, embora não seja compreendido de imediato, pode vir a fazer sentido ao longo do tempo ↳ omissões – o que o paciente não conta, deliberadamente ou não. podem ser significativas e esclarecedoras; não são percebidas pelos sentidos, mas por lacunas no relato verbal lacunas podem indicar áreas de dificuldade ou menosprezadas pelo paciente ↳ associações espontâneas – fluxo associativo da expressão verbal e não verbal do cliente (seja fatos e/ou afetos) As associações espontâneas podem revelar conexões figura/fundo, das quais o cliente muitas vezes não se dá conta ↳ repetições – podem sinalizar cristalizações, que impedem a fluidez e a formação de Gestalten Podem ser re-petições: um pedir novamente A questão não é atender ao pedido, e sim ouvi-lo no que concerne à sua função, de forma que o pedido possa ser ressignificado e o processo fluido de formação e destruição de Gestalten possa ser restaurado “a compulsão neurótica à repetição é sinal que uma situação inacabada do passado ainda está inacabada no presente” “é o esforço repetido do organismo para satisfazer sua necessidade que causa a repetição” ● Sintomas que podem sinalizar relações figura/fundo O sintoma pode ser uma forma, às vezes dramática, de expressar uma necessidade muito profunda que, por alguma razão, não pôde ser expressa de outra maneira Evitar sofrimento gera sofrimento – no funcionamento não saudável, os sintomas podem ter função compensatória, indicando um desequilíbrio. Talvez revelem, metaforicamente, o que a pessoa não pode dizer Lidar com o sintoma como se fosse completamente desconhecido, como se o terapeuta não soubesse a que o cliente está se referindo – pedir para o cliente descrever o sintoma, que se identifique com ele e que lhe dê a voz Perguntar-se o que o sintoma faz para o paciente, a serviço de quê aquele paciente tem tal sintoma, o que este favorece ou dificulta ● Conclusão Todos esses elementos se entrecruzam e podem ocorrer ao mesmo tempo São sinais que indicam possíveis relações figura/fundo e sugerem hipóteses diagnósticas que aguçam a observação e a discriminação do Gestalt-terapeuta
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