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2019 1a Edição Técnicas e Gêneros de PinTura Profª. Aline Sabbi Essenburg Copyright © UNIASSELVI 2019 Elaboração: Profª. Aline Sabbi Essenburg Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: ES78t Essenburg, Aline Sabbi Técnicas e gêneros de pintura. / Aline Sabbi Essenburg. – Indaial: UNIASSELVI, 2019. 233 p.; il. ISBN 978-85-515-0283-9 1. Pintura - Técnica. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 750 III aPresenTação Caro acadêmico! Seja bem-vindo à disciplina Técnicas e Gêneros de Pintura. O estudo e a pesquisa em torno desta temática almejam proporcionar o conhecimento acerca de aspectos relevantes sobre a prática pictórica. A primeira unidade versará sobre os gêneros da pintura, a saber, a histórica, o retrato, a paisagem, a natureza-morta e as chamadas pinturas de gênero, adentrando em seus respectivos subgêneros. Alguns artistas de realce serão estudados, a fim de verificarmos sua prática e o contexto em que estavam inseridos. Expoentes brasileiros e contemporâneos não ficarão de fora, além do entendimento do caráter de inacabamento de uma obra. A segunda unidade abordará o desenvolvimento do processo criativo com a pintura. Para tanto, serão discutidos conceitos como imitação e expressão, aspectos que caracterizam um trabalho de arte e seus elementos constituintes. Neste momento, também será verificado o novo cenário artístico e como a pintura se delineia e se reconfigura nele, em um diálogo com a tecnologia, a moda e o design. A pintura na escola será tratada no terceiro tópico desta seção. As técnicas de pintura (têmpera, guache, arte mural, encáustica, aquarela, óleo e acrílica) serão estudadas na última unidade, de modo a verificar como os artistas se valeram delas em seus trabalhos e quais ainda perduram atualmente. Os pigmentos, solventes, suportes, pincéis, acessórios, molduras e aspectos sobre conservação e limpeza também serão verificados. É importante, diante de tais questões, termos um olhar apurado a respeito de tudo o que está em torno da arte, ou seja, o mundo e suas esferas: econômica, política, histórica, social. Desse modo, a criticidade, tão almejada no mundo contemporâneo, se fará presente. Sugerimos, ao aluno proativo, não olvidar dos textos complementares e as indicações de leitura e pesquisa sugeridas ao longo deste Livro de Estudos, que auxiliarão com o conteúdo para apontamentos questionadores e embasamentos consistentes, fazendo com que o conhecimento neste campo de estudos aumente progressivamente. Ao trabalho! Prof.ª Aline Essenburg. IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, que é um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar mais essa facilidade para aprimorar seus estudos! UNI V VI VII UNIDADE 1 – GÊNEROS DE PINTURA ........................................................................................... 1 TÓPICO 1 – A PINTURA E SEUS MOTIVOS ................................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3 2 PINTURA HISTÓRICA ....................................................................................................................... 4 2.1 PINTURA ALEGÓRICA ................................................................................................................. 5 2.2 PINTURA ICÔNICA E RELIGIOSA ............................................................................................. 7 2.3 PINTURA MITOLÓGICA ............................................................................................................. 9 3 RETRATO ............................................................................................................................................... 10 3.1 AUTORRETRATO ........................................................................................................................... 13 3.2 NU ...................................................................................................................................................... 15 4 PAISAGEM ............................................................................................................................................ 19 5 NATUREZA-MORTA........................................................................................................................... 21 5.1 VANITA ............................................................................................................................................. 23 6 PINTURA DE GÊNERO ...................................................................................................................... 24 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 30 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 31 TÓPICO 2 – A PINTURA COMO OBRA DE ARTE ......................................................................... 33 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 33 2 GRANDES MESTRES DA ARTE DE PINTAR ............................................................................... 34 2.1 TICIANO ........................................................................................................................................... 34 2.2 POUSSIN ........................................................................................................................................... 36 2.3 UTRILLO ........................................................................................................................................... 38 2.4 DIEGO RIVERA ...............................................................................................................................40 3 O INACABAMENTO DA PINTURA .............................................................................................. 42 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 46 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 47 TÓPICO 3 – NOVOS RUMOS DA PINTURA................................................................................... 49 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 49 2 PINTORES CONTEMPORÂNEOS ................................................................................................... 49 3 A PINTURA NO BRASIL .................................................................................................................... 58 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 66 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 70 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 71 UNIDADE 2 – DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO CRIATIVO COM A PINTURA ........ 73 TÓPICO 1 – ESPECIFICIDADES ESTÉTICAS E HISTÓRICO-CULTURAIS DA PINTURA ................................................................................................................... 75 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 75 2 DESENHO E PINTURA: IMITAÇÃO E EXPRESSÃO .................................................................. 75 3 O QUE CARACTERIZA UMA PINTURA COMO OBRA DE ARTE? ...................................... 83 sumário VIII 4 NATUREZA E ELEMENTOS DA PINTURA ................................................................................. 86 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 92 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 93 TÓPICO 2 – PINTURA NO CAMPO AMPLIADO ........................................................................... 95 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 95 2 A PINTURA E O NOVO CENÁRIO ARTÍSTICO ......................................................................... 95 3 PERSPECTIVAS NA PINTURA ........................................................................................................ 99 4 AS NOVAS TECNOLOGIAS DA PINTURA CONTEMPORÂNEA ........................................104 5 A ARTE E SEUS DESDOBRAMENTOS PARA A MODA E O DESIGN ................................107 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................115 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................116 TÓPICO 3 – PINTURA NA ESCOLA ................................................................................................119 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................119 2 O ENSINO DA ARTE ........................................................................................................................120 3 ARTE E COMUNICAÇÃO ................................................................................................................123 4 A PINTURA NA EDUCAÇÃO ........................................................................................................126 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................135 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................141 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................142 UNIDADE 3 – TÉCNICAS DE PINTURA ........................................................................................143 TÓPICO 1 – MATERIAIS FUNDAMENTAIS PARA A PINTURA .............................................145 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................145 2 PIGMENTOS E SOLVENTES ..........................................................................................................148 2.1 PIGMENTOS ..................................................................................................................................148 2.2 SOLVENTES E ADITIVOS ............................................................................................................151 3 SUPORTES ...........................................................................................................................................152 4 PINCÉIS E ACESSÓRIOS .................................................................................................................156 4.1 PINCÉIS NATURAIS ....................................................................................................................156 4.2 PINCÉIS SINTÉTICOS ..................................................................................................................158 4.3 PALETAS .........................................................................................................................................162 4.4 GODÊS .............................................................................................................................................163 5 CONSERVAÇÃO E MOLDURAS ...................................................................................................164 5.1 HIGIENIZAÇÃO E PRESERVAÇÃO ..........................................................................................164 5.2 AS MOLDURAS .............................................................................................................................165 RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................169 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................170 TÓPICO 2 – ESTUDANDO PRÁTICAS DE PINTURA ................................................................171 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................171 2 TÊMPERA .............................................................................................................................................172 3 GUACHE ..............................................................................................................................................177 4 MURAL ..............................................................................................................................................179 5 ENCÁUSTICA .....................................................................................................................................185 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................191 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................192IX TÓPICO 3 – CONHECENDO TÉCNICAS DE PINTURA TRADICIONAIS ............................193 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................193 2 AQUARELA .........................................................................................................................................193 3 ÓLEO .....................................................................................................................................................201 4 ACRÍLICA ............................................................................................................................................204 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................208 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................214 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................215 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................217 X 1 UNIDADE 1 GÊNEROS DE PINTURA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • conhecer os gêneros que compuseram a história da pintura, bem como compreender sobre a antiga hierarquia; • verificar a qualidade dos trabalhos de alguns artistas reconhecidos historicamente e compreender a questão do inacabamento de uma pintura; • refletir sobre o lugar da pintura na contemporaneidade por meio da produção de alguns artistas, e percorrer a trajetória da arte produzida no Brasil. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você encontrará atividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – A PINTURA E SEUS GÊNEROS TÓPICO 2 – A PINTURA COMO OBRA DE ARTE TÓPICO 3 – NOVOS RUMOS DA PINTURA 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 A PINTURA E SEUS MOTIVOS 1 INTRODUÇÃO Os seres humanos sempre se expressaram por meio de imagens. É possível identificarmos algumas temáticas no decorrer da arte da antiguidade, entretanto, elas se unificam na era cristã. Multiplicam-se imagens narrativas e icônicas, ou seja, surgem pinturas que contam uma história (seja de cunho religioso ou profano), que retratam um personagem, uma igreja, um acontecimento bíblico. Essas representações pretendiam que o espectador refletisse, meditasse ou orasse a partir dela. Com o Renascimento, os artistas começam a produzir sob alguns temas peculiares. A esta segmentação denominamos gêneros, são eles: Pintura Histórica, Retrato, Paisagem, Natureza-morta e Pintura de Gênero. Com a estruturação de uma tipologia, a atividade pictórica se desenvolve, bem como o pensamento sobre a arte, e a maioria dos pintores passa a se especializar e a se dedicar a um motivo específico, como Jean Chardin (1643–1713) com suas naturezas-mortas, Nicolas de Largillière (1656–1746) e Rembrandt Harmenszoon van Rijn (1606–1669) com os retratos, e Claude Joseph Vernet (1714–1789) com suas paisagens. As propensões de cada pintor decorrem de sua personalidade, da época e da região em que se situam. Na Europa do sul, latina e católica, ou nas regiões reconquistadas pela Contrarreforma (Flandres, Baviera, Áustria...), predominam a pintura religiosa. Já nas regiões atingidas pela Reforma, onde os temas religiosos eram proibidos, os pintores se voltam para o retrato, as cenas de gênero e as naturezas-mortas (LANEYRIE-DAGEN, 2006, p. 10). O empenho e o consequente desenvolvimento de certos gêneros, em respectivos territórios, também perpassam por questões sociais, econômicas, religiosas e políticas. Afinal, há os governantes que quiseram imortalizar seus feitos, patrocinando retratos, conflitos ou guerras vencidas. Aqui, percebemos que começa a ocorrer uma certa hierarquia, sendo preferidas às pinturas religiosas e históricas aos retratos, paisagens, naturezas-mortas e temas cotidianos. Esses patamares de importância começam a se dissipar levemente no século XVIII. No século XIX, progressivamente, acontece seu nivelamento, quando há o auge das pinturas de paisagem e quando os próprios pintores começam a se questionar sobre a necessidade de categorias. Paul Cézanne (1839–1906), inclusive, recusa-se a classificar seus quadros. No século XX parecem findar as preferências e discussões a respeito da hierarquia de gêneros. Assim, a própria palavra “gênero” é substituída por “tema” (LANEYRIE-DAGEN, 2006, p. 13) e na contemporaneidade o uso da palavra “poética” ganha amplitude. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 4 Vamos, agora, adentrar às temáticas, ou melhor, aos gêneros artísticos que permearam a história da arte, e compreender sobre a hierarquia que foi estabelecida como maneira valorativa de um quadro. 2 PINTURA HISTÓRICA As cenas históricas foram tidas como o gênero mais importante na história da arte, no momento em que efervesciam as discussões a respeito do tema (do Renascimento ao Impressionismo), justamente por representar e retratar acontecimentos de realce, como coroações e batalhas. De fato, as pinturas históricas constroem e alicerçam a história de um país. Essa preocupação se evidencia em Debret (1768–1848), pintor na corte de Napoleão. Ele chegou no Brasil com a Missão Francesa e lecionou pintura histórica na Academia Imperial de Belas Artes, concomitantemente, com a execução de suas obras as quais retratam os costumes, as paisagens e as características dos homens locais. Com seus trabalhos, tinha a função de documentar e divulgar o que acontecia no território, a exemplo do quadro Coroação de Dom Pedro, conferindo-lhe um caráter político e cívico. FIGURA 1 - JEAN BAPTISTE DEBRET. COROAÇÃO DE DOM PEDRO I, 1828. ÓLEO SOBRE TELA. 340 X 640 CM. PALÁCIO DO ITAMARATY, BRASÍLIA FONTE: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Jean-Baptiste_Debret_-_ Coroa%C3%A7%C3%A3o_de_D._Pedro_I,_1828.jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. No Brasil, vemos cenas históricas retratadas pelo paraibano Pedro Américo (1843–1905) e o catarinense Victor Meirelles (1832–1903). IMPORTANT E TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 5 As obras de cunho histórico geralmente eram feitas sob a encomenda de governantes, de modo a mostrar sua força, poder e influência, por isso percebemos, muitas vezes, a idealização das figuras em telas de grandes dimensões. Ao contrário da pintura de gênero, que retrata personagens comuns em sua vida diária, a histórica enfatiza personalidades e grandes acontecimentos. E para isso, os artistas deveriam dominar os demais motivos, afinal, havia a paisagem, objetos e muitos retratos a serem pintados em uma mesma cena. Todos os gêneros eram contemplados, além de exibir novas composições a cada obra pictórica. Cabe ressaltar que, no Romantismo, artistas se valeram da pintura histórica para contestar e expressar suas insatisfações diante do poder político. E assim fizeram Francisco de Goya (1746–1828), Jean-Louis Théodore Gericault (1791–1824) e Ferdinand Victor Eugène Delacroix (1798–1863). 2.1 PINTURA ALEGÓRICA A alegoria compreende um subgênero da pintura histórica. Aqui são representadas ideias ou sentimentos, de modo que as figuras possuem um significado simbólico, a exemplo de A Fortaleza e Temperança com seis heróis antigos, de Pietro Vannucci (1446–1523), conhecido como Perugino. FIGURA 2 - PERUGINO. A FORTALEZA E TEMPERANÇA COM SEIS HERÓIS ANTIGOS, 1497. AFRESCO. 291 X 400 CM. CORSO PIETRO VANNUTTI, PERUGIA FONTE: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Eug%C3%A8ne_Delacroix_-_La_ libert%C3%A9_guidant_le_peuple.jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 6 Victor Meirelles (1832–1903) e sua Moema adentram a pintura alegórica nacional. Inspirada no Canto VI do poema Caramuru (1781), do frei José de SantaRita Mourão (1722–1784), o artista pinta Moema que, depois de ser abandonada por Caramuru (nome pelo qual é chamado o português Diogo Álvares Correia) lança-se ao mar atrás do navio e morre afogada. Seu corpo, então, é levado até a margem pelas águas. FIGURA 3 - VICTOR MEIRELLES. MOEMA, 1866. ÓLEO SOBRE TELA. 129 X 190 CM. MASP, SÃO PAULO DICAS Walter Benjamin, em A Origem do Drama Barroco Alemão (primeira publicação: 1928), discorre sobre a importância da alegoria para a percepção barroca do mundo, além de indicar como ela aparece na pintura moderna. FONTE: BENJAMIN, Walter. A Origem do drama barroco alemão. São Paulo: Brasiliense, 1984. FONTE: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Victor_Meirelles_-_Moema.jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. O tema indianista, pertencente ao imaginário nacional, dá-nos a ver a “incompletude”, característica crucial para a alegoria, quando a ligação entre a imagem e sua significação não é clara, como acontece ao vermos uma cruz, por exemplo. Seu significado é intelectualmente construído, ou seja, a alegoria fala de algo que não está em si mesma, assim como acontece com a metáfora nas obras literárias. TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 7 2.2 PINTURA ICÔNICA E RELIGIOSA No início do Império Bizantino destacou-se a pintura icônica, realizada sobre madeira e segundo regras rígidas de representação, como a utilização do dourado, os halos em torno das cabeças e os tamanhos das figuras de acordo com os níveis hierárquicos. Dessa forma, a maioria das imagens se assemelhavam. Antes de iniciar uma pintura, o artista deveria fazer jejum e orar, além de viver de acordo com os preceitos religiosos. Acreditavam que somente desta maneira conseguiriam representar os ícones corretamente. Andrey Rublev (1360– 1430) é considerado um dos melhores pintores de ícones, afrescos e iluminuras, cujas imagens aparecem sempre calmas e serenas. FIGURA 4 - ANDREY RUBLEV. SANTÍSSIMA TRINDADE, 1410. TÊMPERA SOBRE MADEIRA. 142 X 114 CM. GALERIA TRETYAKOV, MOSCOU FONTE: <http://o-povo.blogspot.com/2015/04/santissima-trindade-troitsa.html>. Acesso em: 18 set. 2018. A pintura religiosa ou sacra também se constitui como um subgênero, e vem para figurar as cenas bíblicas e seus personagens. Vigorava sobretudo na Idade Média, e ,na época, acreditava-se que ao fazer as representações, era como se a própria divindade estivesse ali. Essa peculiaridade se denomina teofania. As imagens tinham a função didática, de modo a ensinar os preceitos cristãos e narrar acontecimentos bíblicos para os analfabetos, além de afirmar verdades teológicas e valorizar as virtudes cristãs. Cabe observar que ainda não havia a denominação “artista”, sendo, os pintores, considerados artesãos ou mestres de ofício. Um exemplo é Fra Angélico (1395–1455), que logo quando chegou ao convento dominicano de Fiesole recebeu treinamento artístico, atuando, depois, no Convento São Marcos. Suas pinturas possuem traços refinados, característicos do gótico internacional, juntamente com uma tímida perspectiva. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 8 FIGURA 5 - FRA ANGELICO. ANUNCIAÇÃO, 1435. OURO E TÊMPERA SOBRE MADEIRA. 194 X 194 CM. MUSEU DO PRADO, MADRID FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Anuncia%C3%A7%C3%A3o_(Fra_Angelico,_Prado)>. Acesso em: 18 set. 2018. No decorrer da época renascentista, houve maior liberdade na representação e composição das figuras. Muitos artistas foram convidados a pintar os interiores das capelas e igrejas, como Michelangelo (1475–1564) e Leonardo da Vinci (1452–1519), de modo que essa tarefa deixou de ser restrita aos monges e artesãos devotos. No Barroco, a dramaticidade e a teatralidade, bem como os contrastes simbólicos, auxiliam na promoção do fervor da religiosidade e o controle das crenças nos cidadãos, afinal, isso era benquisto pelo poder político. Michelangelo Merisi, conhecido como Caravaggio (1571–1610), em A vocação de Matheus, descreve a passagem bíblica em que Jesus vê Matheus contando dinheiros com seus colaboradores, e lhe diz: “Segue-me”, e assim ele o fez. FIGURA 6 - CARAVAGGIO. A VOCAÇÃO DE MATHEUS, 1599-1600. ÓLEO SOBRE TELA. 340 X 322 CM. IGREJA SÃO LUIS DOS FRANCESES, ROMA FONTE: <http://www.noticiasdabota.com/2016/01/a-vocacao-de-sao-mateus-de-caravaggio. html>. Acesso em: 22 nov. 2018. TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 9 Pode-se observar o contraste intenso que o pintor consegue com o uso da luz e da sombra, sinalizando a dualidade do mundo terreno e espiritual. O vestuário das imagens da esquerda contrasta com os pés descalços de Jesus e Pedro, de modo a enfatizar a humildade. A iluminação recai sobre os personagens sentados, mas também sobre as mãos e o rosto de Cristo. 2.3 PINTURA MITOLÓGICA Nas pinturas caracterizadas como mitológicas, são utilizados figuras e elementos de modo a fazer referência aos mitos. No período renascentista houve um forte retorno aos valores e estética clássica grega e romana, assim, ícones daquelas civilizações foram usados demasiadamente nos quadros. No Barroco, elas se uniram à representação dramática, a exemplo de Vênus e Adônis, de Peter Paul Rubens (1577–1640). FIGURA 7 - PETER PAUL RUBENS. VÊNUS E ADONIS, 1636-1638. ÓLEO SOBRE TELA. 197,5 X 243 CM. KUNSTHISTORISCHES MUSEUM, VIENA FONTE: <http://virusdaarte.net/rubens-venus-e-adonis/>. Acesso em: 18 set. 2018. No quadro, Vênus tenta impedir que Adônis parta para a caçada, com medo de que ele seja vítima de animais selvagens. Os cães retratados denunciam a ansiedade da partida e, de fato, de acordo com o mito, o jovem é morto por um javali. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 10 A palavra grega mimese quer dizer imitação. Associa-se ao teatro, à música, à narrativa e às demais artes. Seria a cópia, a reprodução ou a representação da natureza. Aristóteles afirmava ser essa ação o que fundamentava a arte e o que diferenciava os seres humanos dos animais, afinal, toda a aprendizagem depende de um ato mimético. Já a concepção platônica coloca a arte em um patamar baixo, por se tratar de uma imitação das aparências (do real). NOTA Na pintura, o retrato se dá quando algum indivíduo (ou mais de um) é representado na tela. Esse processo pode se dar a partir de alguma imagem impressa, de uma lembrança, ou com base em um modelo vivo. Essa prática, inclusive, é muito utilizada até hoje nas academias para o estudo minucioso do corpo humano (formas, proporções, luz e sombra). Pode-se observar esse gênero na arte egípcia, grega e romana, até seu auge no século XIV, quando ganha autonomia. Em cada época ele adquiriu uma funcionalidade, seja de cunho funerário, religioso ou mesmo comemorativo. O retrato ganha destaque e se desenvolve tecnicamente na Renascença. Desse modo, podemos afirmar que é o precursor da fotografia. Foi por meio dele que podemos saber como era a aparência do filósofo francês René Descartes (1596–1650) e de tantos outros protagonistas da história. O retrato permite-nos vislumbrar um sem fim de traços de carácter que os dados históricos não nos podem proporcionar. O nosso interesse advém, sem dúvida, do que ainda resta de uma antiga convicção de que um retrato capta não apenas a semelhança física, mas também a alma do retratado (JANSON, 1998, p. 20). Você sabe qual é o retrato que é considerado mais famoso? É La Gioconda, ou seja, a Monalisa, pintado por Leonardo da Vinci (1452–1519) entre os anos de 1503 a 1507, de apenas 77 cm x 53 cm. 3 RETRATO O termo retrato vem do verbo latino retrahere, que significa copiar. Possui a mesma natureza da mimese. TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 11 FIGURA 8 - LEONARDO DA VINCI. MONALISA. 1503-1507. ÓLEO SOBRE MADEIRA DE ÁLAMO. 77 X 53 CM. MUSEU DO LOUVRE, PARIS FONTE: <https://www.pinterest.pt/pin/7951736819936742/>. Acesso em: 18 set. 2018. Por trás desse quadro está a proporção áurea, ou seja, o número de ouro (chamado de phi, que corresponde ao número 1,618), utilizado desde a antiguidade. Da Vinci salientou que a lei também faziaparte do corpo humano. ATENCAO A seção áurea recebe o nome de Phi em homenagem a Phídeas (Fídias), que a utilizou para conceber o Phartenon. Além dos gregos, os egípcios também já haviam utilizado. Leonardo Fibonacci (1170–1250) buscou, na observação da natureza e na geometria, a explicação para o funcionamento do cosmos. Ao viajar pelo Mediterrâneo, deparou-se com a matemática islâmica e a trouxe para os seus cálculos, de modo a propor uma sequência numeral que consistia no seguinte: o numeral seguinte resulta da soma dos anteriores, e o resultado da divisão desse mesmo número e seu antecessor é o Phi. O matemático observou que essa proporção estava na natureza, como nas folhas das bromélias e em conchas, conferindo harmonia a uma imagem. Interessante observar que atualmente algumas medidas são padronizadas seguindo esse cálculo, como o tamanho de uma folha de papel, cartão de crédito, revistas e fotografias. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 12 Em uma simplificação da razão áurea está a “técnica do terço”. Sobre a imagem a ser trabalhada são traçadas quatro linhas imaginárias (duas verticais e duas horizontais), de modo a dividir o quadro em terços. Os objetos de maior interesse são colocados nos pontos de intersecção, resultando em uma composição harmônica. E para que haja a simetria, o objeto pode ser colocado no meio. FIGURA 9 - TÉCNICA DO TERÇO UTILIZADA EM FOTOGRAFIA FONTE: <http://www.entreculturas.com.br/2011/03/curso-de-fotografia-aula-4/>. Acesso em: 18 set. 2018. É incrível como fotógrafos e pintores utilizam essa técnica até hoje. Veja o pintor inglês da contemporaneidade, Paul Wright (1973), que procura pela vitalidade em cada um de seus modelos, acentuando o estado de ânimo de cada um deles, com uma rica paleta de cores e texturas. FIGURA 10 - PAUL WRIGHT, THE GREEN HAT, 2015. ÓLEO SOBRE TELA FONTE: <http://www.thompsonsgallery.co.uk/exhibition.php/PAUL-WRIGHT---HEAD- STRONG-153/>. Acesso em: 18 set. 2018. TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 13 Vale notar a abstração presente em seus trabalhos, pouco encontrada em retratos. 3.1 AUTORRETRATO O autorretrato é considerado um subgênero, configura-se como sendo o retrato do artista feito por ele mesmo. Em considerável parcela da história da arte, artistas se valeram da pintura autobiográfica, como Rembrandt (1606–1669) e Albrecht Dürer (1471–1528). Em um dos autorretratos deste último, vemos a inscrição: “Eu Albrecht Dürer de Nuremberg, pintei-me a mim próprio em cores apropriadas a mim aos 28 anos de idade”. FIGURA 11 - ALBRECHT DÜRER. AUTORRETRATO COM MANTO DE PELICA, 1500. ÓLEO SOBRE MADEIRA, 67 X 49 CM. ALTE PINAKOTHEK, MUNIQUE FONTE: <http://artesteves.blogspot.com/2011/05/albrecht-durer-auto-retrato.html>. Acesso em: 18 set. 2018. É recorrente que o rosto seja focado nesses quadros — raramente o semblante é de felicidade — e escondendo os possíveis defeitos, a exemplo do famoso Autorretrato com orelha enfaixada (1888), de Van Gogh (1853–1890). Por vezes, artistas se retratam em atividade, como Courbet (1819–1877) em O Ateliê do Pintor: Uma Real Alegoria que Define uma Fase de Sete Anos de Minha Vida Artística. Esse trabalho possui dimensões de uma pintura histórica, mas retrata o ateliê em Paris, no qual estão 30 figuras representadas em tamanho natural. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 14 FIGURA 12 - GUSTAVE COURBET. O ATELIÊ DO PINTOR, 1854-1855. ÓLEO SOBRE TELA. 361 X 598 CM. MUSEÉ D’ÓRSAY, PARIS FONTE:<http://virusdaarte.net/courbert-o-atelie-do-artista/>. Acesso em: 18 set. 2018. FIGURA 13 - AUTORRETRATOS FONTE: <http://arteref.com/arte/top-10-mestres-do-autorretrato-para-voce-conhecer/>. Acesso em: 18 set. 2018. Leonardo da Vinci 1452-1519 Anita Malfatti 1889-1964 MC. Escher 1898-1972 Salvador Dali 1904-1989 Frida Kahlo 1907-1987 Andy Warhol 1928-1987 Paul Gauguin 1848-1903 Pablo Picasso 1881-1973 Amedeo Modigliani 1884-1920 Tarsila do Amaral 1886-1973 O trabalho artístico de Frida Kahlo (1907–1987) girou em torno de seus autorretratos. Agora veja como ela e alguns outros artistas se retrataram: TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 15 DICAS Não deixem de pesquisar sobre a artista Cindy Sherman, que faz uma crítica aos estereótipos por meio desse subgênero. De grande representatividade no cenário contemporâneo, utiliza o próprio corpo para suas múltiplas personificações. 3.2 NU Não podemos deixar de mencionar o nu como outro subgênero. Escultores gregos o utilizaram muito em suas obras, pois acreditavam que o corpo era o espelho da alma, assim, o representavam sempre em seus pormenores e com graciosidade, perfeição e beleza. Entretanto, com a difusão da religiosidade, deixou de ser utilizado de modo recorrente até o Renascimento. E mesmo nesse período, era relacionado às noções bíblicas e mitológicas. Já em 1875, Jules Joseph Lefebvre (1836–1911) se destacou com a pintura de Chloe (modelo parisiense), a qual se tornou capa de inúmeras revistas e nomeou vinhos e poemas. FIGURA 14 - JULES JOSEPH LEFEBVRE. CHLOE, 1875. ÓLEO SOBRE TELA. 260 X 139 CM. YOUNG AND JACKSON HOTEL, MELBOURNE FONTE: <https://br.pinterest.com/pin/467600373782409637/>. Acesso em: 18 set. 2018. No século XIX, vários nus foram produzidos em nosso país nas mãos de Rodolfo Amoedo (1857–1941), Eliseu Visconti (1866–1944), Carlos Leão (1906– 1983), Ismael Nery (1900–1934), Clóvis Graciano (1907–1988), Flávio de Carvalho (1899–1973), Victor Meirelles (1832–1903) e Pedro Américo (1843–1905), que fez A UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 16 Carioca. A pintura foi feita quando ele estava em Paris, a propósito de uma bolsa de estudos concedida pelo Imperador Pedro II, e recebeu Medalha de Ouro na Exposição Geral na Academia Imperial de Belas Artes no Rio de Janeiro. Como agradecimento, Pedro Américo a enviou para o Imperador, mas foi recusada pelo Mordomo Mor, alegando ser, ela, inapropriada para os padrões morais do Palácio. O quadro, então, retorna ao ateliê do pintor, ora em Florença, e é adquirido pelo Imperador da Prússia Guilherme Primeiro. Passados 20 anos, Pedro Américo realiza uma réplica, que hoje está no Museu Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro. Oliveira ratifica o acontecimento, agregando informações a respeito do título da obra: Em 1864, o pintor brasileiro Pedro Américo, bolsista do Imperador Pedro II na Europa, envia para a Exposição Geral da Academia Imperial de Belas Artes, a tela A Carioca. A pintura recebe a medalha de Ouro e, Pedro Américo, em agradecimento ao financiamento de seus estudos, decide presentear Sua Alteza Real com o quadro. Para a surpresa do artista a pintura é recusada pelo Mordomo Mor da Casa Imperial, Paulo Barbosa, por considerá-la licenciosa. Em uma época em que a Mordomia da Casa Imperial tinha como uma de suas funções adquirir obras de arte que exaltavam a raça brasileira em formação, como a tela de Vitor Meirelles, A primeira missa no Brasil (1861), parece que a tela não evocava, para um representante do Império, um florão do triunfo do povo brasileiro. [...] Partindo do programa de construção da obra seguido pelo artista, a imagem d´A Carioca é uma alegoria ao Rio Carioca – principal fonte abastecedora de água da cidade na época - e não a mulher nascida no Rio de Janeiro. O primeiro registro histórico do Rio Carioca remonta o ano de 1503, quando o Governador Geral da Província do Rio de Janeiro Gonçalo Coelho manda construir uma casa em sua nascente, no Silvestre - região localizada no caminho da Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro. Os índios Tamoios que lá viviam passaram a chamar o Rio, de Rio Carioca – palavra que na língua indígena significa “Casa de Homem Branco”. Com o tempo, a palavra indígena que dava nome ao Rio passou, também, a aludir ao povo que vivia na cidade. O Rio Carioca ganhou importância ainda maior quando foi canalizado no século XIX, e construído o Aqueduto da Carioca, que possibilitou que a água chegasse até o Centro da cidade, tornando-se, assim, acessível à populaçãoda cidade. A Carioca, de Pedro Américo, sendo uma alegoria de enaltecimento à geografia local, não parecia em nada contrariar a política imperial em relação às artes e tampouco àquela levada a cabo pela Academia Imperial de Belas Artes. Desde a sua concepção, em 1826, a Academia tinha como ação principal incentivar seus artistas e dar a conhecer ao Imperador e à sociedade em geral os seus progressos. As obras executadas pelos alunos da Academia seriam, ao mesmo tempo, uma forma de homenagear o Imperador pelo patrocínio às artes, ao mesmo tempo em que davam início a uma galeria de obras útil a diversas finalidades, como, por exemplo, aquelas voltadas ao enaltecimento da história da cidade e da Nação. Havia, ainda, o interesse, por parte da Academia e do Imperador Pedro II, de formar artistas nacionais capazes de figurarem ao lado dos artistas estrangeiros. A produção nascida do fazer artístico desses mestres e alunos contribuiria para criar um acervo nacional, cujas obras TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 17 FIGURA 15 - PEDRO AMÉRICO. A CARIOCA, 1882. ÓLEO SOBRE TELA. 205,5 X 134 CM. MUSEU NACIONAL DE BELAS ARTES, RIO DE JANEIRO FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/8/8b/Pedro_Am%C3%A9rico_- _A_carioca_-_1882.jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. Agora veja o tratamento geométrico que Ismael Nery confere ao seu nu, elaborado basicamente com formas ovais em contraste com os quadrados atrás da figura. Ele faz de suas pinturas o universo da androginia, em que duas polaridades convergem e se fundem, reunindo masculino e feminino, espiritualidade e carnalidade, como em seu poema Eu. “Eu sou a tangência de duas formas opostas e justapostas. Eu sou o que não existe entre o que existe. Eu sou tudo sem ser coisa alguma. Eu sou o amor entre os esposos. Eu sou o marido e a mulher. Eu sou a unidade infinita” (MATTAR, 2000, p. 6). Ginsburg (1989, p. 97) nos lembra que: “A espécie humana tende a representar a realidade em termos e opostos. O fluxo das percepções, em outras palavras, é decomposto na base de categorias nitidamente contrapostas: luz e sombra, calor e frio, alto e baixo”. refletiriam a história do país, a peculiaridade das diversas regiões, a sua fauna e flora, as suas riquezas, a sua gente (OLIVEIRA, 2013, p. 01 – 02). UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 18 FIGURA 16 - ISMAEL NERY. FIGURA COM CUBOS, 1927. ÓLEO SOBRE TELA. 76 X 57,5 CM FONTE: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra1877/figura-com-cubos>. Acesso em: 18 set. 2018. O poeta Murilo Mendes (1901–1975) colocou em versos o processo criativo de Ismael Nery no poema Saudação a Ismael Nery, de 1930: Acima dos cubos verdes e das esferas azuis um Ente magnético sopra o espírito da vida. Depois de fixar os contornos dos corpos transpõe a região que nasceu sob o signo do amor e reúne num abraço as partes desconhecidas do mundo. Apelo dos ritmos movendo as figuras humanas, solicitação das matérias do sonho, espírito que nunca descansa. Ele pensa desligado do tempo, as formas futuras dormem nos seus olhos. Recebe diretamente do Espírito a visão instantânea das coisas, ó vertigem! penetra o sentido das ideias, das cores, a tonalidade da Criação, olho do mundo, zona livre de corrupção, música que não para nunca, forma e transparência. FONTE: MENDES, M. Poesias: 1925/1955. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1959. NOTA TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 19 4 PAISAGEM Esse gênero originou-se nos retratos de retábulos e de cenas medievais, mas a paisagem era somente a imagem secundária, coadjuvante da pintura, entretanto, mesmo nesses casos, o artista deveria ter habilidade, justamente para dar veracidade ao que era representado. No Renascimento alguns pintores já demonstraram interesse pelo “pano de fundo” de seus personagens, como Giovanni Bellini (1430–1516) e Giorgio Barbarelli da Castelfranco, conhecido como Giorgione (1478–1510). Este último artista elaborou A Tempestade, um pequeno quadro com melancólicas e ricas cores, alvo de inúmeros estudos e interpretações. O pintor veneziano inaugura o que virá a ser a pintura de paisagem, uma vez que esta aparece de maneira mais significativa nesta obra. FIGURA 17 - GIORGIONE. A TEMPESTADE, 1505. ÓLEO SOBRE TELA. 82 X 73 CM. GALLERIA DELL’ACCADEMIA, VENEZA FONTE: <https://www.historiadasartes.com/sala-dos-professores/a-tempestade-giorgione/>. Acesso em: 18 set. 2018. A paisagem foi importante no Romantismo, retratada com a função de mostrar ao homem a sua pequenez diante do mundo, como nos trabalhos de Caspar David Friedrich (1844–1900), William Turner (1775–1851) e John Constable (1776–1837). UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 20 FIGURA 18 - CASPAR DAVID FRIEDRICH. THE CHASSEUR IN THE FOREST, 1814. ÓLEO SOBRE TELA. 66 X 47 CM FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/a/a6/The_Chasseur_in_the_Forest_ by_Caspar_David_Friedrich.jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. Inicialmente, os artistas visualizavam a paisagem e a estruturavam no ateliê, onde a pintura era trabalhada. Com o surgimento da tinta em bisnaga, eles passaram a pintar ao ar livre e estudar a luz e a cor da natureza, a exemplo de Paul Cézanne (1839–1906), Eugène-Henri-Paul Gauguin (1848–1903), Vincent van Gogh (1853–1890) e Oscar-Claude Monet (1840–1926). A valorização desse gênero seguiu os desdobramentos da arte moderna em direção à libertação das temáticas mitológicas e históricas, de modo a possibilitar que o artista se debruçasse no registro de seu olhar acerca da natureza. Também salientamos que ela se uniu às pesquisas científicas, especialmente na área da botânica, conferindo valor estético ao trabalho investigativo do circundante. Teixeira Coelho nos relata que: Mas em pintura há um gênero em que coisas e homens se tornam uma unidade: a paisagem a partir do século 18, a nascente ciência moderna era uma disciplina que dividia a natureza em suas partes para analisá- las. Ao lado, a pintura (e a pintura de paisagens) já era uma atividade de síntese propondo a unidade entre as emoções (a estética), os atos (a moral) e o conhecimento (a lógica) a unificação de todas as coisas (COELHO, 2008, s.p.). TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 21 Albert Eckhout (1610–1665), Franz Post (1612–1680), NicolasTaunay (1816–1821) e Debret (1768–1848), este último já citado na Pintura Histórica, foram destaques na pintura de paisagem durante a Missão Francesa no Brasil, de modo a documentar nosso país. NOTA 5 NATUREZA-MORTA Uma pintura pode ser denominada natureza-morta quando se atém às frutas, flores, utensílios domésticos, objetos, ou seja, seres inanimados. Na língua inglesa e anglo-saxã, esse gênero é chamado de still-life (vida imóvel). Seu surgimento data do Barroco, como uma derivação das cenas religiosas retratadas em ambientes populares, com destaque para Pieter Aertsen (1508–1575) e Jacopo Bassano (1510–1592). Os quadros de Giuseppe Arcimboldo (1527–1593) tornam-se peculiares pelo caráter simbólico e grotesco com o qual utiliza frutas e objetos. FIGURA 19 - GIUSEPPE ARCIMBOLDO. SEATED FIGURE OF SUMMER, 1573. ÓLEO SOBRE TELA. 63,5 X 76 CM. WEST DEAN HOUSE, SUSSEX FONTE: <https://www.wikiart.org/en/giuseppe-arcimboldo/seated-figure-of-summer-1573>. Acesso em: 29 nov. 2018. No século XVII, era tida como gênero menor, tanto em importância quanto em seu valor mercadológico, talvez por não abordar diretamente um indivíduo. Entretanto, a natureza-morta elaborada na região influenciada pela Reforma Protestante tinha a função de registrar a riqueza e as posses da família burguesa em ascensão. Willem Claeszoon Heda (1594–1680) é exímio nesse gênero, sobretudo UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 22 na representação dos reflexos e superfícies. Na maioria de seus trabalhos ele utiliza a composição triangular, em que o objeto mais alto é colocado em uma das laterais, com predominância dos tons acinzentados, tornando a pintura quase que monocromática à primeira vista. FIGURA 20 - WILLEM CLAESZOON HEDA.STILL LIFE WITH A GILT CUP, 1635. ÓLEO SOBRE TELA. 88 X 113 CM. RIJKSMUSEUM, AMTERDÃ FONTE: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Willem_Claesz._Heda_005.jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. Observe agora como a harmonia entre as cores aparece na obra Natureza- morta, de Amélia Toledo (1926–2017). A artista deixou submersos, à ação do tempo, alguns objetos de uso cotidiano para, depois, fazer a sua composição. FIGURA 21 - AMÉLIA TOLEDO. COLHEITA OU NATUREZA-MORTA, 1982 FONTE: <https://ameliatoledo.com/catalogo/listagem/#!prettyPhoto>. Acesso em: 18 set. 2018. Após a utilização da fotografia na arte contemporânea, a natureza-morta deixou de ser encontrada com facilidade, o que não significa que tenha sido deixada de lado, como vimos anteriormente. TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 23 5.1 VANITA Como um subgênero da natureza-morta há as vanitas, termo que se refere às vaidades e ao caráter passageiro do mundo. Os quadros constituintes deste motivo procuravam ser um aviso quanto à frivolidade, à efemeridade e à fragilidade da existência humana, orientando as pessoas para os valores espirituais, assim, são retratados objetos simbólicos, como caveiras. O neerlandês Harmen Steenwijck (1612–1656) realizou suas pinturas na época do florescimento do comércio, da ciência e da cultura. É enaltecido pela obra Uma Alegoria das Vaidades da Vida Humana, compondo com riqueza de elementos simbólicos, os quais representam a morte e o vazio da vida. O relógio nos lembra o tempo, enquanto os instrumentos musicais fazem referência ao amor (a flauta, por exemplo, seria o masculino e os instrumentos arredondados aludem às formas femininas). A concha lembra a perfeição e riqueza, o livro representa a sabedoria, o jarro de vinho são os prazeres materiais. Vemos também uma fina fumaça saindo da lâmpada, que acaba de ser apagada, sinal da fragilidade da existência humana. FIGURA 22 - HARMEN STEENWIJCK. UMA ALEGORIA DAS VAIDADES DA VIDA HUMANA, 1640. ÓLEO SOBRE TELA. 39 X 51 CM. NATIONAL GALLERY, LONDRES FONTE: <https://nl.wikipedia.org/wiki/Harmen_Steenwijck#/media/File:Harmen_Steenwijck_-_ Vanitas_Still-Life_-_WGA21768.jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. Steenwyck utilizou as diagonais do plano para construir a sua composição. Observe que na metade inferior direita do quadro estão os objetos simbólicos da vaidade humana, enquanto o vazio sobressai no lado superior esquerdo, representando o espiritual. É daqui que é projetado o feixe de luz que, dramaticamente, liga a vida ao plano superior e ilumina a caveira, justamente para enfatizar a efemeridade. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 24 DICAS Que horas são no Paraíso é o nome da exposição de Albano Afonso (Casa Triângulo (São Paulo, 2007). Nela o artista trata da transitoriedade da vida, que, segundo o crítico Paulo Reis (2007), “somente a arte é capaz de perpetuar”. Reis ainda coloca: Uma vanitas pop, luxuriante e sedutora aos olhos dos desavisados, pois o crânio humano, símbolo inequívoco da eminência da morte, foi sempre utilizado como alegoria. Comparece no monólogo existencial To Be or Not to Be, de Hamlet, bem como nas pinturas de naturezas- mortas no Renascimento e no Barroco. A caveira de espelhos de Albano Afonso tem a mesma natureza metafórica da Black Kites (1997) de Gabriel Orozco — uma caveira tabuleiro de xadrez — e da For the Love of God (2007), a caveira de diamantes de Damien Hirst. Todas essas vanitas têm as mesmas procedências formais e buscam as razões conceituais que levaram Hans Holbein a pintar uma anamorfose de caveira em The Ambassadors (1533) diante das glórias e das riquezas da vida. É disso que tratam as obras de Gabriel Orozco, de Damien Hirst e de Albano Afonso. Não deixe de ver o catálogo desta exposição, disponível em: <www.casatriangulo.com/ media/pdf/albano-afonso_portfolio2015_web_16.pdf>. Acesso em: 10 set. 2018. FONTE: REIS, P. Que horas são no paraíso? Lisboa: Casa Triângulo, 2007. 6 PINTURA DE GÊNERO O termo pintura de gênero refere-se às representações do cotidiano (trabalho e vida doméstica) que vigoraram a partir do século XVII, após a ideologia protestante que refutava as temáticas religiosas. As imagens ganham realismo e riqueza de detalhes, além de menores dimensões, uma vez que eram destinadas a espaços privados. É interessante observarmos que esse gênero pode ser uma rica fonte documental, pois mostra os costumes e os ambientes de cada época, de modo que a historiadora Svetlana Alpers (1983) o enfatiza como “arte da descrição”. Pieter Bruegel (1525–1569), por exemplo, retrata os camponeses em seus trabalhos e festejos. O Casamento Aldeão ocorre dentro de um celeiro, e é pintado com ricos detalhes de personagens e situações em primeiro plano, além de grande cromatismo. TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 25 FIGURA 23 - PIETER BRUEGEL. A CASAMENTO ALDEÃO, 1568. ÓLEO SOBRE MADEIRA. 114 X 164 CM. KUNSTHISTORISCHER MUSEUM, VIENA FONTE: <http://historcuriosa.blogspot.com/2012/03/o-casamento-dos-camponeses-1567-de. html>. Acesso em: 18 set. 2018. Jan Steen (1626–1679) pega esse viés popular e representa com bastante humor as tavernas da época, e cenas da vida doméstica descontraída, cujos destaques são A festa de São Nicola (s/d), A festa na Osteria (1674), A festa de batizado (1664) e Na luxúria, preste atenção (1663), onde são trabalhadas ricamente as tonalidades das cores em uma pintura repleta de objetos, deixando-nos ver, inclusive, parte do cômodo ao lado, à direita do quadro. FIGURA 24 - JAN STEEN. NA LUXÚRIA, PRESTE ATENÇÃO, 1663. ÓLEO SOBRE TELA. 105 X 145,5 CM. KUNSTHISTORISCHER MUSEUM, VIENA FONTE: <https://fr.wikipedia.org/wiki/Fichier:Jan_Steen_-_Beware_of_Luxury_(%E2%80%9CIn_ Weelde_Siet_Toe%E2%80%9D)_-_Google_Art_Project.jpg>. Acesso em: 28 nov. 2018. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 26 Johannes Vermeer (1632–1675) deixou registros memoráveis de cenas da vida doméstica, realizadas com composição harmoniosa em que são focadas uma ou duas imagens, frequentemente com luz entrando por alguma janela à esquerda do quadro. O pintor utiliza sobretudo os azuis, amarelos e cinzas. Obras como Jarro de Vinho, Mulher lendo Diante da Janela, A Lição de Música e A leiteira são algumas de suas pinturas. Nesta última, vemos bem um instante de uma moça na cozinha, demonstrando, pela tranquilidade com a qual segura a jarra, que esse é um momento rotineiro. FIGURA 25 - JOHANNES VERMEER. A LEITEIRA, 1657 - 1658. ÓLEO SOBRE TELA. 45,5 X 41 CM. RIJKSMUSEUM, AMSTERDÃ FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/A_Leiteira>. Acesso em: 18 set. 2018. DICAS Assista ao filme A moça com brinco de pérola, de Peter Webber, que foi inspirado no quadro homônimo de Jan Vermeer. Na película, lançada em 2003, discorre-se sobre a vida do pintor, bem como sobre a sociedade em questão. Lichtenstein afirma que, para Hegel: [...] a metamorfose artística de assuntos em si medíocres é a prova do poder do pintor sobre o mundo e, com isso, sua tarefa essencial. A análise das cenas de gênero holandesas, revelando a afeição de uma sociedade por um universo que ela construiu inteiramente, demonstra a coerência de um empreendimento que impõe a sua marca tanto nas criações artísticas como na própria realidade. Esse autor afirmava que os artistas holandeses conseguiam transformar um assunto banal, sem interesse, em uma obra maravilhosa. Ainda assim, a pintura de gênero era considerada menos importante do que as pinturas históricas, que abordavam eventos grandiosos como batalhas, coroações e grandes feitos dos governantes (LICHTENSTEIN, 2006, p. 106). TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 27 Muitos artistas se valeram desta temática para desenvolver seus trabalhos, como Jean-Baptiste-Siméon Chardin (1881–1955), Gustave Courbet (1819–1877), e mesmo os impressionistas e os que se seguiram. Pode-se afirmar que esse gênero revive as ilustrações encontradas em manuscritos medievais, como o Livro das Horas (1415–1416), o qual continha imagens das atividades correspondentesa cada mês do ano (em junho, por exemplo, há a imagem de pessoas ceifando e arrumando os fenos). FIGURA 26 - LIVRO DAS HORAS, 1819-1877. ILUMINURA. 22,5 X 13,6 CM. CONDÉ MUSEUM, CHÂTEAU DE CHANTILLY FONTE: <http://www.escritoriodolivro.com.br/historias/junho.php>. Acesso em: 28 nov. 2018. No Brasil, a pintura de gênero encontra lugar nas mãos de Jean-Baptiste Debret (1768-1848). Integrante da Missão Francesa no Brasil, publicou Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil (1834–1839), no qual deixou registrados aspectos da sociedade e da paisagem do país. Seu trabalho de pesquisa ganhou notável relevância ao nortear as formas e as cores da bandeira brasileira. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 28 FIGURA 27 – JEAN-BAPTISTE DEBRET. FAMÍLIA DE UM CHEFE CAMACAN SE PREPARANDO PARA UMA FESTA, c. 1820 – 1830. AQUARELA. 18,6 X 29,3 CM FONTE: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Famille_d%E2%80%99un_Chef_Camacan_ se_pr%C3%A9parant_pour_une_F%C3%AAte.jpg>. Acesso em: 28 nov. 2018. José Ferraz de Almeida Júnior (1850-1899) foi aclamado por inserir na pintura brasileira temas regionais, sobretudo a cultura caipira, quando retrata anônimos de modo naturalista. Vale destacar que o Dia do Artista Plástico é comemorado em 08 de maio, data em que nasceu o pintor. FIGURA 28 - ALMEIDA JUNIOR. CAIPIRA PICANDO FUMO, 1893. ÓLEO SOBRE TELA. 202 X 141 CM. PINACOTECA, SÃO PAULO FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Caipira_picando_fumo.jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. TÓPICO 1 | A PINTURA E SEUS MOTIVOS 29 Não podemos finalizar este tópico sem lembrar de Belmiro de Almeida (1858-1935), Henrique Bernardelli (1858-1936) e Modesto Brocos (1852-1936). Este último colocou, em xilogravuras e pinturas, imagens de típicos brasileiros com grande realismo, cujo destaque é Redenção de Cam, na qual denuncia a tese de branqueamento de João Batista de Lacerda. FIGURA 29 - MODESTO BROCOS. REDENÇÃO DE CAM, 1895. ÓLEO SOBRE TELA. 199 X 166 CM. MUSEU NACIONAL DE BELAS ARTES, RIO DE JANEIRO FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Modesto_Brocos#/media/File:Reden%C3%A7%C3%A3o. jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. Depois de saber a respeito das características dos gêneros da pintura e suas especificidades, podemos observar que alguns quadros atendem a duas ou mais especificidades. Fato que demonstra que, na arte, são árduas as categorizações estanques, dificuldade esta que acentua na contemporaneidade. 30 Neste tópico, você aprendeu que: • O desenvolvimento de gêneros na pintura, em certos territórios, perpassa questões sociais, econômicas, religiosas e políticas. • A hierarquia dos gêneros vigora do Renascimento ao século XIX, quando é superada. • Os gêneros seguiam a seguinte ordem hierárquica: a) Pintura histórica: são retratados fatos históricos, como batalhas, guerras, ações de homens notáveis, sempre em grandes dimensões. o Alegórica: são representadas ideias ou sentimentos, cujo significado é simbólico. o Icônica: ícones são retratados, sempre com regras rígidas de representação. o Religiosa: destaca cenas bíblicas e seus personagens. o Mitológica: contém figuras ou elementos que se referem aos mitos, sobretudo os gregos e romanos. b) Retrato: quando um indivíduo é representado no quadro. Aparece na história da arte desde os egípcios, gregos e romanos, ganhando autonomia no século XIV. o Autorretrato: quando o artista representa a si mesmo. o Nu: os gregos o utilizavam com frequência, com perfeição das formas. Entretanto, ele deixa de vigorar com a difusão da religiosidade, voltando, aos poucos, a ser utilizado. c) Natureza-morta: quando a pintura se atém às frutas, flores, utensílios domésticos, objetos, ou seja, seres inanimados. o Vanitas: faz menção às vaidades e ao caráter passageiro do mundo. d) Paisagem: tem origem nos retábulos e cenas medievais, e ganha o primeiro plano no Renascimento. e) Pintura de Gênero: cenas domésticas, cotidianas e personagens anônimos aparecem nos quadros. RESUMO DO TÓPICO 1 31 AUTOATIVIDADE 1 Ao longo da História da Arte, foram definidas algumas temáticas na área da pintura, sobre as quais se debruçaram inúmeros artistas. Sobre elas, assinale a alternativa INCORRETA: a) ( ) A Pintura Histórica era tida como a de maior valor hierárquico dentre os gêneros pictóricos. b) ( ) Antes de iniciar uma Pintura Icônica, o artista deveria fazer jejum e orar. c) ( ) Com o surgimento da tinta em bisnaga, os artistas permaneceram em seus ateliês. d) ( ) O termo Pintura de Gênero refere-se às representações do cotidiano. 2 A partir do texto abaixo, contido na figura Homem Vitruviano, de Leonardo da Vinci, marque a alternativa CORRETA: Os 4 dedos fazem uma palma e 4 palmas fazem 1 pé, 6 palmas fazem um cúbito; 4 cúbitos fazem a altura de um homem. 4 cúbitos fazem um passo e 24 palmas fazem um homem. Se abrir as pernas até termos descido 1/14 de altura e abrirmos os braços até os dedos estarem ao nível do topo da cabeça então o centro dos membros abertos será no umbigo. O espaço entre as pernas abertas será um triângulo equilátero. O comprimento dos braços abertos de um homem é igual à sua altura. Desde as raízes dos cabelos até ao fundo do queixo é um décimo da altura do homem; desde o fundo do queixo até ao topo da cabeça é um oitavo da altura do homem; desde o topo do peito até ao topo da cabeça é um sexto da altura do homem; desde o topo do peito até as raízes do cabelo é um sétimo da altura do homem; desde os mamilos até ao topo da cabeça é um quarto da altura do homem. A maior largura dos ombros contém em si própria a quarta parte do homem. Desde o cotovelo até a ponta dos dedos é um quinto da altura do homem e desde o cotovelo até ao ângulo da axila é um oitavo da altura do homem. A mão inteira será um décimo da altura do homem. O início dos órgãos genitais marca o centro do homem. O pé é um sétimo do homem. Da sola do pé até debaixo do joelho é um quarto da altura do homem. Desde debaixo do joelho até o início dos órgãos genitais é um quarto do homem. A distância entre o fundo do queixo e o nariz e entre as raízes dos cabelos e as sobrancelhas é a mesma e é, como a orelha, um terço da cara (DA VINCI, 1490). FONTE: <https://lucnix.be/index.php?/search/1728>. Acesso em: 4 fev. 2019. Para melhor fixar o conteúdo desta unidade, resolva as três questões apresentadas abaixo: 32 a) ( ) A proporção áurea só foi utilizada a partir do Renascimento. b) ( ) Essa lei é apenas um cálculo matemático, de modo que não se aplica à natureza. c) ( ) A lei do terço enfatiza em quais pontos do quadro o olhar se detém. d) ( ) Com o advento da fotografia, o gênero retrato deixou de ser utilizado pelos artistas. 3 A obra Untitled (Perfect Lovers), de Félix Gonzalez-Torres, apresenta dois relógios iguais que marcam o mesmo tempo. Entretanto, à medida que as pilhas se gastam, eles entram em um descompasso, denunciando a efemeridade, a morte, a ausência. A qual dos gêneros artísticos a obra de Gonzalez-Torres se aproxima? Justifique sua resposta: FIGURA - FÉLIX GONZALEZ-TORRES. UNTITLED (PERFECT LOVERS), 1991 FONTE: <https://www.moma.org/collection/works/81074>. Acesso em: 18 set. 2018. 33 TÓPICO 2 A PINTURA COMO OBRA DE ARTE UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO No tópico anterior, vimos as características dos gêneros mais difundidos na pintura, bem como o grau de importância de cada um deles. E, vale enfatizar, a importância de termos um olhar crítico, de modo a sempre relacionar a produção com o que ocorria na sociedade em que a obra foi produzida, em termos culturais, religiosos e políticos. Além de pensar no simbolismo dos trabalhos, é interessante observarmos os materiais que os artistas tinham disponíveis. De fato, é confortável qualificarmos trabalhos de outras épocas como tal, mas diante de trabalhos contemporâneos, por vezes, a dúvida adentra os espectadores, sendo necessário, portanto, se valerem dos textos explicativos ou poéticos a respeito de uma exposição e ter um conhecimento sobrea história da arte. Para nos valermos melhor dessas questões artísticas, estudaremos com mais atenção alguns artistas, cujos trabalhos pulsam até hoje, e o que faz com que eles permaneçam com essa característica mesmo depois de passados tantos anos. Depois desse mergulho, pensaremos como a pintura dá, ao espectador, a oportunidade para continuá-la, justamente pela sua qualidade de inacabamento, fato que sustenta a cumplicidade do artista e do espectador. DICAS As novas maneiras da arte se apresentar requerem também mudanças nas concepções acerca dos locais em que as obras são mostradas. No Interior do Cubo Branco, livro de Brian O’Doherty, oferece inúmeras observações críticas acerca das relações visíveis e inerentes aos espaços expositivos, bem como auxilia o leitor no entendimento do contexto em que os trabalhos artísticos se inserem a partir do modernismo. Segue o referencial como uma boa opção de leitura: O´DOHERTY, Brian. No interior do cubo branco: a ideologia do espaço da arte. São Paulo, Martins Fontes, 2002. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 34 2 GRANDES MESTRES DA ARTE DE PINTAR Observamos que, no decorrer da história, alguns artistas se destacaram de tal maneira que ainda hoje são utilizados como referenciais para quem quer saber um pouco mais sobre a arte, seja no fazer artístico ou na posição de apreciador. Então, vamos conhecer alguns deles, cujas obras ainda nos propõem questionamentos. 2.1 TICIANO O famoso pintor veneziano, Ticiano Vecellio, nasceu por volta de 1485 na cidade de Cadore, nos Alpes, e morreu com 99 anos em 1576. Alguns historiadores relatam que até mesmo o imperador da época se abaixou para recolher um pincel do pintor que havia caído, o que significou um triunfo para a figura do artista e para a arte pictórica. Ticiano era muito hábil com seus pincéis, assim, pôde se libertar das regras de composição estipuladas até então. No quadro Nossa Senhora com santos e membros da família Pesaro, o artista não coloca a Santa no lugar central da composição, e faz com que São Francisco e São Pedro participem da cena, não em posições simétricas. A pintura foi encomendada por Jacopo Pesaro, o qual Ticiano retratou ajoelhado diante da Virgem. Sua família aparece no canto inferior direito, sob os olhos do menino Jesus. Atrás do protagonista está um alferes, arrastando um prisioneiro derrotado em uma batalha contra os turcos. Tudo ocorre em um local aberto, emoldurado com duas colunas direcionadas até as nuvens, onde estão dois anjos. É interessante notar que essa assimetria, e fuga dos cânones vigentes, não apresenta desequilíbrio, mas continua harmônica, justamente pela maestria na utilização das cores e luminosidade. De acordo com Kennedy (2006, p. 37), o artista une “o formato do ex- voto, onde os protagonistas se encaram de frente e são representados de perfil, com a tradicional pintura de altar”. O segundo plano é composto pelo céu e as duas colunas frontais “resolvem o enquadramento, [e] representam a entrada dos céus, tradicionalmente identificada com Maria” (DAVIES, 2010, p. 600). TÓPICO 2 | A PINTURA COMO OBRA DE ARTE 35 FIGURA 30 - TICIANO VECELLIO. NOSSA SENHORA COM SANTOS E MEMBROS DA FAMÍLIA PESARO, 1519-1528. ÓLEO SOBRE TELA. 478 X 268 CM. IGREJA DE SANTA MARIA DEI FRARI, VENEZA FONTE: <https://www.flickr.com/photos/28433765@N07/5309655903>. Acesso em: 18 set. 2018. Ticiano elaborou muitos retratos. Jovem Inglês ganhou notoriedade por ele, ainda, parecer estar entre nós, como podemos observar na imagem que segue. FIGURA 31 - TICIANO VECCELIO. JOVEM INGLÊS, 1540. ÓLEO SOBRE TELA. 111 X 93 CM. PALÁCIO PITTI, FLORENÇA FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/9b/Tizian_076.jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. Não diferente é a pintura do papa Paulo III em Nápoles, na qual o pintor coloca em diálogo o chefe eclesiástico com um parente, Alexandre Farnese, enquanto seu irmão Otávio observa o espectador. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 36 FIGURA 32 - TICIANO VECCELIO. O PAPA PAULO III COM ALEXANDRE E OTÁVIO FARNESE, 1546. ÓLEO SOBRE TELA. 210 X 174 CM. GALERIA NACIONAL DE CAPODIMONTE, NÁPOLES FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/a/ab/Titian_-_Pope_Paul_III_with_ his_Grandsons_Alessandro_and_Ottavio_Farnese_-_WGA22985.jpg>. Acesso em: 18 set. 2018. Muitos artistas passaram pelo ateliê de Ticiano, a exemplo de El Greco. Após sua morte, vítima de febre oriunda da peste que atingiu Veneza em 1576, dois pintores dominaram o cenário artístico veneziano: Jacopo Robusti conhecido como Tintoretto (1518–1594) e Paolo Caliari Veronesse (1528–1588). Este último “[...] pintou imagens mais próximas da primeira fase de Ticiano, como a Virgem de Pesaro, com ênfase no realismo, Tintoretto explorou a teatralidade e a pincelada fluida da última pintura de Ticiano, a Pietà” (DAVIES et al., 2010, p. 629). Assim, cabe observar que o modo de utilizar as cores em oposições entre claro e escuro influenciou vários artistas posteriores, sobretudo no Maneirismo e Barroco. 2.2 POUSSIN Nicolas Poussin (1594-1665), francês radicado em Roma, é considerado o maior mestre acadêmico, que estudou por demasiado as esculturas clássicas, em busca dos ares de outrora. Em Et in Arcadia ego o pintor retrata uma calma paisagem sob o Sol, em que pastores e uma bela jovem estão ao redor de uma lápide na tentativa de decifrá-la. O título da obra transcreve que a morte está, inclusive, na terra dos pastores. E Poussin a elabora com grande conhecimento técnico, só assim consegue transpor o sentimento de nostalgia, mesmo diante desta temática. TÓPICO 2 | A PINTURA COMO OBRA DE ARTE 37 FIGURA 33 - NICOLAU POUSSIN. ET IN ARCADIA EGO, 1650-1655. ÓLEO SOBRE TELA. 85 X 121 CM. MUSEU DO LOUVRE, PARIS FONTE: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Nicolas_poussin,_i_pastori_dell%27arcadia_ (et_in_arcadia_ego),_1638-40_ca._02.JPG>. Acesso em: 18 set. 2018. Muitos artistas se voltaram para as pinturas de Poussin, como fez Cézanne em busca de sua particularidade: “O projeto de Cézanne [...], é de reencontrar os princípios de Poussin, mais pelo estudo da natureza que pelo estudo acadêmico da arte” (SHIFF, 1995, p. 119). Foi responsável pelas imagens figuradas na capela de Notre Dame e nomeado como Primeiro Pintor do Rei Luis XIII, na França, além de fazer projetos para o Louvre e ilustrar livros. Mas o desagradava ter muitos assistentes, fato este que o fez deixar seu país e fixar residência na Itália. De grande destaque para sua vida artística foi O Julgamento de Salomão, A Sagrada Família na Escadaria e Eliézer e Rebeca. Nesta última, o artista representa uma cena bíblica, e enche de simbolismos sobre a fertilidade: poço com água abundante, torre com 12 janelas (na tradição mediterrânea construía-se um novo piso para cada geração). FIGURA 34 - NICOLAS POUSSIN. ELIÉZER E REBECA, 1648. ÓLEO SOBRE TELA. 118 X 199 CM. MUSÉE DU LOUVRE, PARIS FONTE: <http://pt.wahooart.com/@@/8XYMDY-Nicolas-Poussin-%60eliezer%60-e-rebecca-no- bem>. Acesso em: 18 set. 2018. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 38 Ao nos depararmos com os quadros do pintor, devemos demorar nosso olhar sobre as figuras, uma vez que Poussin não nos possibilita sua compreensão imediata. Só assim podemos visualizar a riqueza de detalhes, elementos e expressões que constam em cada pintura. DICAS Guy de Compiegne analisa as obras de Poussin, sobretudo seus detalhes, nos quais o pintor confere uma conotação simbólica inesperada para cada trabalho. Portanto, como sugestão de leitura, segue o referencial: COMPIEGNE, Guy de. Nicolas Poussin: L’Ambiguité Recherchée. France: Edições du Varulv, 2015. 2.3 UTRILLO Grande referência do início do século XX é Maurice Utrillo (1883-1955), pertencente à Escola de Paris. Sua mãe, Suzanne Valadon (1865–1938, outrora modelo de Renoir), o incentivou a pintar, juntamente com seu padrasto, Miguel Utrillo (1862–1934) — que largou a engenharia pela pintura. Com 16 anos tornou- se alcoólatra, e precisouser internado inúmeras vezes, o que não prejudicou a qualidade de seus trabalhos. Escola de Paris é o nome dado a um grupo de artistas (muitos estrangeiros), que se reuniam em Paris no período compreendido entre as duas guerras mundiais. Apesar de terem conhecimento de todas as escolas e movimentos, não aderiram a nenhum deles. NOTA Seu estilo realista se vale de maior liberdade no uso das cores e das formas. Pintou inúmeras cenas de Montmartre e do subúrbio de Paris, transpassando enorme melancolia. Cabe destacar que, em 1925, foi convidado por Serguei Diaghilev (1872–1929) a criar figurinos e cenários para o Balé Russo. TÓPICO 2 | A PINTURA COMO OBRA DE ARTE 39 FIGURA 35 - MAURICE UTRILLO. RUE DE LA JONQUIÈRE, 1910. ÓLEO SOBRE TELA. 60 X 81 CM FONTE: <https://www.christies.com/lotfinder/Lot/maurice-utrillo-1883-1955-rue-de-la-5138451- details.aspx>. Acesso em: 29 nov. 2018. No quadro acima, o artista se vale de uma paleta em tons cinza para figurar uma rua parisiense, sob o céu cinza do inverno que concebe ares tristes e sombrios. Sua pintura tem características da tradicional representação realista, entretanto, utilizou formas e cores com maior liberdade, enfatizadas pelos emplastos conseguidos com tinta à óleo, notadamente visíveis quando retrata o coração do bairro Montmartre no quadro a seguir. Cabe notar que o local possui semblantes de uma vila, quando as cores quentes no plano inicial denotam um pouco de humanidade aos passantes. FIGURA 36: MAURICE UTRILLO. LA PLACE ST. PIERRE ET LE SACRÉ COEUR DE MONTMARTRE, 1938. ÓLEO SOBRE TELA. 41 X 33 CM FONTE: <https://www.lempertz.com/en/catalogues/lot/1090-1/281-maurice-utrillo.html>. Acesso em: 18 set. 2018. UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 40 Utrillo, juntamente com Amedeo Clemente Modigliani (1884–1920), tinha gosto apurado pela vida noturna e cafés, motivo pelo qual sua família passa a mantê-lo em casa. Nesse momento, iniciou a produção de cartões-postais, com a mesma técnica de seus quadros, como se fossem miniaturas deles, afinal a pequena dimensão do suporte não trouxe prejuízos à sua expressão. DICAS Assista ao filme Modigliani: A Paixão pela Vida, dirigido por Mick Davis, mostra a rivalidade entre o artista e Pablo Picasso. Também revela traços da sociedade artística da época. FIGURA 37 - MAURICE UTRILLO. LA TOUR EIFFEL, 1913. ÓLEO SOBRE CARTÃO. 49,9 X 66,7 CM. NATIONAL GALLERY OF VICTÓRIA, MELBOURNE FONTE: <http://www.ngv.vic.gov.au/explore/collection/work/4428/>. Acesso em: 18 set. 2018. Após casar-se, em 1935, o pintor tornou-se mais estável, religioso e parou de beber, entretanto, a depressão lhe acometeu até a sua morte. 2.4 DIEGO RIVERA Diego María de la Concepción Juan Nepomuceno Estanislao de la Rivera y Barrientos Acosta y Rodríguez, o conhecido Diego Rivera (1886-1957), é considerado o maior muralista mexicano de todos os tempos. Aos 21 anos foi para a Europa, quando conheceu Pablo Picasso (1881–1973), Juan Miró (1893–1983), Salvador Dalí (1904–1989), Antoni Gaudí (1852–1926) e, consequentemente, toda a arte que estava sendo produzida na ocasião, o que o influenciou e o fez aprimorar a sua pintura. De volta à terra natal, volta-se para a arte mural, com o propósito de resgatar a suntuosidade dos tempos pré-colombianos vivenciada pelo México. Outro motivo TÓPICO 2 | A PINTURA COMO OBRA DE ARTE 41 para a escolha dos murais era porque acreditava que os quadros convencionais iriam para as coleções particulares da burguesia. Cabe indicar que se casou quatro vezes. Sua primeira esposa foi a pintora russa Angelina Beloff (1879 – 1969), a segunda foi a modelo e romancista Guadalupe Marín (1895 – 1983) e a terceira a talentosa e inesquecível Frida Kahlo (1907 – 1954). Um ano depois de sua morte, Rivera se une a Emma Hurtado (1907 – 1974), negociante de arte. Por ser um ávido militante político, era comum ver em suas pinturas duras críticas, e justamente por uma crítica ao sistema capitalista, seu mural no Rockfeller Center foi derrubado antes mesmo de ser concluído. Rivera tornou- se um ídolo da classe trabalhadora de seu país, uma vez que a história dos direitos civis ganhara destaque em suas mãos. Fazia questão de deixar claro o seu viés político-social e a vontade e luta a favor de reformas no sistema. Assim, como nos murais de Portinari, havia nos murais de Rivera o aspecto racial; a necessidade de exprimir o vigor da natureza física e humana do México; a ideia era o povo reconhecer-se em suas obras, e para isso redefiniu seu estilo. No México, os murais sempre foram uma tradição, desde o século VI. No século XVI eram usados para decorar os primeiros conventos, porém na primeira metade do século XIX, as produções estavam paradas. A guerra da Independência havia destruído muita coisa no país; a miséria e a desordem cresceram sob o império da ditadura. Rivera inspirou-se muitas vezes nas culturas Maia e Asteca, para compor seus murais. [...] Rivera trabalhou durante seis anos (1923-1929) em suas obras murais para a Secretaria da Educação, com temas mexicanos como: festas indígenas, mercados, manifestações populares, cenas das revoltas operárias, retratos dos revolucionários (Zapata e Carrilho Puerto), cenas de exploradores e aristocratas sendo humilhados pelos operários, trabalhadores do campo e soldados e, finalmente, a reconstrução do México. [...] Em muitos retratos, Rivera coloca personagens políticos e membros do governo, como José Vasconcelos (Secretário da Educação Pública), cujas ideias políticas Rivera não compartilhava; Vasconcelos era colocado entre os intelectuais impotentes. Até mesmo o presidente foi retratado como magnata que consultava as cotações da bolsa. [...] Rivera era incansavelmente preocupado com a política nacional e internacional; na Europa, o totalitarismo de direita estava em alta; na Itália e na Polônia, em 1926, ocorreu a consolidação de governos fascistas; na antiga União Soviética, o poder operário era transformado em totalitarismo burocrático de esquerda, por Stalin e seus partidários. Até a classe trabalhadora do Brasil estava insatisfeita com o desemprego, a carestia de vida e as reformas realizadas pelo governo de Getúlio Vargas. [...] Artistas críticos como Diego Rivera e Cândido Portinari usaram toda sua técnica artística para expressar, através de suas obras, seus posicionamentos políticos e sociais; apesar disso, ambos sofreram críticas de outros artistas e intelectuais na questão polêmica da chamada “Arte Oficial”, em seus respectivos países. [...] UNIDADE 1 | GÊNEROS DE PINTURA 42 Rivera desafiou políticos e figuras importantes da sociedade mexicana; através de seus murais destacou sempre a Cultura Maia e Asteca e os grandes revolucionários mexicanos (COLAR, 2007, p. 35–42). FIGURA 38 - DIEGO RIVERA. NOITE DO POBRE, 1928. AFRESCO FONTE: <http://pt.wahooart.com/@@/8BWNZS-Diego-Rivera-noite-do-pobre>. Acesso em: 18 set. 2018. DICAS Assista ao filme Frida, de 2002, sob a direção de Julie Taymor. Onde é possível acompanhar a vida da artista, bem como a de Diego Rivera. 3 O INACABAMENTO DA PINTURA Em 1935, Picasso afirmou o caráter vivo de uma pintura. Em suas palavras: [...] um quadro não é pensado e fixado de antemão. Enquanto o produzimos ele segue a mobilidade do pensamento. Depois de terminado ele continua a mudar, conforme o estado daquele que o contempla. Um quadro vive sua vida como um ser vivo, sofre as mudanças que a vida cotidiana nos impõe. Isso é natural, já que um TÓPICO 2 | A PINTURA COMO OBRA DE ARTE 43 quadro só vive graças àquele que o contempla [...] (PICASSO, 1973 apud CHIPP, 1999, p. 272). Neste viés, muitos artistas defendem que a obra de arte é um organismo latente, pois suscita sensações e pensamentos nos espectadores, que modificam seu olhar perante o mundo e aspectos da sociedade. E uma obra, depois de começada, segue seu caminho próprio, ou seja, na medida em que o artista vai pintando, ela própria vai “pedindo” que se coloque mais um
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