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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS (PUC MINAS) BACHARELADO EM DIREITO MIRIÃ KÉZIA RODRIGUES DE OLIVEIRA PROJETO LER NO DIREITO Belo Horizonte 2020 MIRIÃ KÉZIA RODRIGUES DE OLIVEIRA PROJETO LER NO DIREITO Dissertação destinada à disciplina Teoria da Norma e Ordenamento jurídico da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC MINAS) da unidade São Gabriel ministrada pelo professor Júlio Aguiar de Oliveira em que o comando para seguir a diretriz da argumentação é: “disserte sobre o papel do Direito em "Quarto de Despejo", de Carolina Maria de Jesus”. Belo Horizonte 2020 3 A obra “Quarto de Despejo—Diário de Uma Favelada” de Maria Carolina de Jesus (1960) retrata a realidade vivenciada pela autora, que são descrições diárias da sua vida e a dos conflitos dos moradores na favela do Canidé. A escritora brasileira nasceu em Minas Gerais em 1914, além disso, ela também trabalhou em diversas áreas, como empregada doméstica e catadora de papéis e lixos reaproveitáveis. O Direito relaciona-se na obra por intermédio das garantias de direito fundamentais à pessoa humana, que foi promulgado em 1988 e que está em vigor hodiernamente por intermédio da norma, que é a Constituição Federal. Entretanto, a realidade vivenciada pela autora se distancia dessa norma constitucional, haja vista que Maria Carolina de Jesus vivia em extrema pobreza com seus três filhos, e muitas vezes, não encontrava amparo do Estado para os problemas de vulnerabilidade social que enfrentava além de diversas questões vividas na comunidade do Canidé. Desse modo, cabe pontuar a invalidez que muitas vezes a teoria constitucional é o Direito possui relacionando ao que Maria Carolina de Jesus vivenciou. Primeiramente, é válido analisar a perspectiva do Direito e oque retrata o artigo 6° da Constituição Federal do Brasil (1988): “são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. Sob essa perspectiva o livro “Quarto de Despejo – Diário de uma Favelada” retrata a falta desse direito na prática, uma vez que a personagem principal Maria Carolina de Jesus vive com seus três filhos uma situação de extrema vulnerabilidade social, ao qual não possuía auxílio estatal e os direitos à alimentação, e a assistência aos desamparados não eram contemplados na vida da escritora. Essa afirmativa é demonstrada na fala da escritora: “E assim no dia 13 de maio de 1958 eu lutava contra a escravatura atual – a fome!” (JESUS, 1958, p.27) ou “A tontura do álcool nos impede de cantar. Mas a da fome nos faz tremer. Percebi que é horrível ter só ar dentro do estômago” (JESUS, 1960, p. 45). Ademais, é importante pontuar o poderio que o Estado possui assegurado pelo povo que compõe um determinado território. Essa afirmação é pontuada por diversas áreas do saber e uma delas a filosofia. Sob essa perspectiva, essa ciência analisa o surgimento do Estado por intermédio dos filósofos contratualista que são importantes para formação de um governo. Nesse sentido, a filosofia evidencia um desses filósofos: Hobbes que observa a necessidade de 4 um indivíduo encontrar-se na tutela do Estado, uma vez sendo pertencente ao “estado de natureza” (uma situação de desordem) “Uma guerra de todos contra todos” (HOBBES, 1651) deve abandonar e renunciar por meio de um contrato em que o Estado fundado garantirá aos cidadãos segurança e estabilidade. Entretanto, apesar desse poder o Estado no livro “Quarto de Despejo – Diário de uma Favelada” encontra-se deturpado, visto que utiliza sua força coercitiva e legítima de forma criminosa e racista contra a população da Favela do Canidé: Eu estava pagando o sapateiro e conversando com um preto que estava lendo um jornal. Ele estava revoltado com um guarda civil que espancou um preto e amarrou numa árvore. O guarda civil é branco. E há certos brancos que transforma preto em bode expiatório. Quem sabe se guarda civil ignora que já foi extinta a escravidão e ainda estamos no regime da chibata? (JESUS, 1960,p. 96). Segundo o Jurista Hans Kelsen o ato coativo do Direito: O Direito é uma ordem cativa, não no sentido de que ele – ou, mais rigorosamente, a sua representação – produz coação psíquica; mas no sentido de que estatui atos de coação, designadamente a provação coercitivo da vida, da liberdade, de bens econômicos e outros, como consequência dos pressupostos por ele estabelecidos (KELSEN, 1934 p. 38). Nessa conjuntura, esses atos coercitivos devem estar respaldados em uma norma fundamental que assegura a eficácia e a validade, mas que não seja usado de forma ilegítima e criminosa. Infelizmente, esse ato inconstitucional persiste devido ao racismo e ao preconceito histórico contra à população negra. A escritora Maria Carolina de Jesus no livro “Quarto de Despejo” relata também o preconceito sofrido por ela e o desejo de isonomia (igualdade) social e jurídica desejada por ela entre brancos e negros: Esquecendo eles que eu adoro a minha pele negra, e o meu cabelo rustico. Eu até acho o cabelo de negro mais iducado do que o cabelo de branco. Porque o cabelo de preto onde põe fica. É obediente. E o cabelo de branco, é só dar um movimento na cabeça ele já sai do lugar. É indisciplinado. Se é que existe reencarnações, eu quero voltar sempre preta […] O branco é que diz que é superior. Mas que superioridade apresenta o branco? Se o negro bebe pinga, o branco bebe. A enfermidade que atinge o preto, atinge o branco. Se o branco sente fome, o negro também. A natureza não seleciona ninguém (JESUS, 1960, p. 58). 5 Evidencia-se, portanto, que o livro “Quarto de Despejo – Diário de uma Favelada” é um retrato da extrema pobreza vivenciada por Maria Carolina de Jesus e sua família e as situações diárias da favela que reside. Desse modo, o Direito relaciona em diversas abordagens, mas principalmente no que tange à dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais, e posteriormente direitos relacionados à vivência de Carolina e de sua comunidade e suas reflexões acerca da vida. REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo – diário de uma favelada. São Paulo: Francisco Alves, 1960. São Paulo, Ática, 2019.
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