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1 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV Problema 1 – Ciclos Da Vida Quando Carmelita notou que as mamas estavam aparecendo, entre os 10 e 11 anos de idade, ficou com vergonha de contar e, para disfarçar, apertava-as com faixas. Apresentava também pêlos debaixo dos braços e no monte pubiano e tinha vergonha dos meninos. Quando ocorreu a menarca, foi chorando até sua mãe, achando que estava machucada. Lembra bem que sua mãe a ajudou a se lavar, e disse que ela agora já era uma moça e precisava se cuidar para não ficar grávida. Após 5 anos da menarca, Carmelita começou a namorar um colega de escola e não teve coragem de contar para a mãe sobre o seu relacionamento. Meses após ter a sexarca, sem uso de métodos contraceptivos, notou que estava com um atraso menstrual de 15 dias. Realizou exame de beta-HCG e o resultado foi positivo. Notou que suas mamas cresciam e que seus mamilos estavam escurecidos. Uma de suas inúmeras dúvidas era: “como que do nada vai sair leite para alimentar meu filho?”. O tempo passou, ela veio para ParisCity e começou a trabalhar como doméstica em uma casa onde aprendeu muito. Sua patroa orientou-a como fazer acompanhamento médico e ela vem frequentando a UBS próxima da sua casa. Com as suas duas filhas, Dora e Sandra, Carmelita, agora com 46 anos, fez diferente. Dora ficou moça aos 13 anos, época que começou a acompanhar com o ginecologista da unidade. Sandra ainda não menstruou. INSTRUÇÃO: Entender como a compreensão do ciclo menstrual fisiológico e dos marcadores da puberdade poderiam ter auxiliado a Carmelita no planejamento familiar e durante o período de amamentação. BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA BARACAT ed. Manual de Ginecologia Endócrina— São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), 2015 CABRAL, ZAF. Manual de Ginecologia Infanto Juvenil - Sao Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), 2014. BRASIL. Lei N. 9263 de 12 de janeiro de 1996. Regula o § 7º do art. 226 da Constituição Federal, que trata do planejamento familiar, estabelece penalidades e dá outras providências. FINOTTIi, M. Manual de anticoncepção. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), 2015. HALL, J.E.; GUYTON, A. C. Tratado de Fisiologia Médica. 12ª Ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. Termos desconhecidos: ✓ Menarca: corresponde à primeira menstruação. É uma das últimas fases da puberdade. Tende a ocorrer entre os 10 a 15 anos variando conforme o estilo de vida, histórico familiar, alterações hormonais etc. ✓ Sexarca: momento da primeira relação sexual. ✓ Métodos contraceptivos: contraceptivos são métodos utilizados para evitar a gravidez, pois atuam impedindo a fecundação. ✓ Beta-HCG: HCG (Human Chorionic Gonadotropin) refere-se ao hormônio gonadotrofina coriônica humana. Este hormônio é amplamente utilizado como um teste de gravidez. Ele é produzido por um grupo de células chamado trofoblasto que dá origem à placenta. Os testes atuais permitem detectar o hCG a partir da 3ª ou 4ª semana de gestação contadas da última menstruação. Os testes laboratoriais utilizam geralmente uma sub- unidade do hCG – a sua fração beta. Existe uma tabela de valores de referência, mas não é possível calcular a idade gestacional pelos valores de hCG. Métodos contraceptivos: O Sistema Único de Saúde (SUS) distribui a pílula combinada, a anticoncepção de emergência (pílula do dia seguinte), a mini-pílula, o anticoncepcional injetável mensal e trimestral, o diafragma, os dispositivos intrauterinos (DIU), assim como preservativo feminino e masculino. As opções de contracepção hormonal são 99% eficazes na prevenção da gravidez. São elas: • Pílula oral: vários tipos de pílulas, compostos por um ou dois hormônios (estrogênio e/ou progesterona), de uso contínuo ou com pausas. • Anel vaginal: de silicone que a mulher insere na vagina, onde os hormônios são lentamente liberados, prevenindo assim a gravidez. • Adesivo anticoncepcional: semelhante a um curativo, o adesivo é colado no corpo e os hormônios são absorvidos através da pele. • Anticoncepcional injetável: aplicada uma injeção via intramuscular, à base de hormônios a cada um ou três meses, dependendo do tipo. • Implante contraceptivo: trata-se de pequeno bastão implantado sob a pele, na parte inferior do 2 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV braço. Após a implantação, o dispositivo libera progesterona, sendo eficaz por até três anos. A anticoncepção de emergência tem indicação de uso após uma relação sexual sem proteção, falha potencial de um método já utilizado ou para vítimas de violência sexual. Deve ser usado até 72 horas após a relação, quando reduz a possibilidade de gravidez em 75%. Com relação aos dispositivos intrauterinos (DIU), o DIU T de cobre ou T380A está disponível na rede pública e pode ser utilizado por adolescentes, mesmo as que nunca engravidaram. Trata-se de um método de longa duração (por volta de 10 anos). A camisinha masculina ou feminina deve ser usada em todas as relações sexuais, independentemente do uso de outro método anticoncepcional, pois a camisinha é o único método que oferece dupla proteção, ou seja, protege ao mesmo tempo das ISTs e da gravidez não desejada. Os métodos da tabela, do muco cervical e da temperatura basal são pouco recomendados, porque, além de serem pouco eficazes, exigem do adolescente disciplina e planejamento. A ligadura das trompas e a vasectomia são métodos cirúrgicos permanentes e não são indicados para os adolescentes. https://www.medicina.ufmg.br/observaped/metodos -contraceptivos/ Definição do problema: O desconhecimento da fisiologia feminina pode gerar dúvidas e constrangimentos dificultando o planejamento familiar e a lactação. Chuva de ideias: - Telarca: 1º sinal da puberdade em meninas; - Gonadarca: 1° sinal de puberdade em meninos; - Educação sexual; - Puberdade: meninas 8 a 13 anos e meninas 9 a 14 anos; - O tabu familiar na discussão sexual; - A falta de educação sexual interfere no planejamento familiar pois vai trazer gravidez indesejada e precoce; - A relação da educação sexual e a identificação de abusos, para meninas e meninos. Não abusar e saber quando houver abuso; - A importância do profissional de saúde aproveitar as consultas para orientar ao uso dos métodos contraceptivos, verificar se o uso está correto; - A automedicação nos métodos contraceptivos; - Tabu sobre a sexualidade e educação sexual enraizado na sociedade, levando uma dificuldade de transmissão de informação; - Dificuldade relacionadas ao conhecimento de práticas sexuais na atualidade e mecanismos de prevenção. Objetivos: O1. Descrever as características sexuais secundárias femininas (Adrenarca, pubarca, pelarca e menarca) inclusive as modificações psicológicas da puberdade. O2. Compreender os aspectos legais e políticas públicas envolvidas no planejamento familiar. O3. Discutir métodos anticoncepcionais não hormonais. O4. Compreender a fisiologia da lactação. O1. Descrever as característ icas sexua is secundár ia s femininas (adrenarca , pubarca , pe larca e menarca) inc lus ive as modif icações psicológ icas da puberdade . A puberdade marca o período de transição entre a infância e a vida adulta, durante o qual é adquirida a maturidade reprodutiva e emocional. Caracteriza-se por transformações físicas e psíquicas complexas em uma intrincada inter-relação do sistema endócrino com os órgãos-alvo. Os sinais clínicos da puberdade em ambos os sexos são: • A aceleração na velocidade de crescimento • O desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários. O momento de ocorrência e a duração do processo puberal apresentam variações individuais, e o conhecimento da normalidade é fundamental para o acompanhamento da puberdade fisiológica e o diagnóstico de situaçõespatológicas. A puberdade tem início com a ativação do eixo hipotálamo-hipófise-ovariano (HHO), antes mesmo do aparecimento de qualquer sinal externo de desenvolvimento de caracteres sexuais secundários e do estirão de crescimento, o que corresponde à idade óssea de 11 anos nas meninas e termina quando se estabeleceu os ciclos ovulatórios, último fenômeno desse período. A duração do processo puberal é variável, entre 1,5 e 6 anos, com média de 4,5 anos. São vários os fatores que influenciam o início da puberdade sendo o genético o mais determinante. Sabe-se que existe uma correlação entre a idade da menarca de mães e filhas e entre as irmãs. A situação geográfica e a exposição à luz parecem exercer algum papel, pois a puberdade tende a ocorrer mais cedo em baixas altitudes e próximo à linha do Equador. A melhoria das condições de nutrição e saúde fez a média de idade da menarca cair de maneira importante após a Revolução Industrial, nos últimos 30 anos persistindo estável nos países desenvolvidos. Mesmo se mantendo estável a idade média de ocorrência da menarca, observou-se nas últimas três a cinco décadas a diminuição da época de aparecimento dos eventos puberais de modo global. Apesar da diminuição da idade da telarca, não se observou diminuição na idade de ocorrência da menarca. Chama atenção a associação dessas alterações à obesidade e ao índice de massa corporal aumentado na infância com aceleração da velocidade de crescimento. Questiona-se ainda o papel de substâncias químicas presentes no meio ambiente, como pesticidas e fitoestrogênios nos alimentos, que poderiam atuar https://www.medicina.ufmg.br/observaped/metodos-contraceptivos/ https://www.medicina.ufmg.br/observaped/metodos-contraceptivos/ 3 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV sobre o eixo HHO com ação semelhante à do estrogênio. Conhecer a normalidade do desenvolvimento puberal e suas variações é fundamental para o acompanhamento da puberdade fisiológica e o diagnóstico e manejo de situações patológicas. F is io log ia da puberdade: A sequência de eventos da puberdade depende diretamente da integridade do eixo HHO com seus mecanismos de feedback. O típico padrão bifásico da secreção das gonadotrofinas, observado após a puberdade, resulta primariamente na alteração dos níveis de inibição central da secreção do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH), dando origem à cascata de eventos hormonais que levam à ativação gonadal e às alterações físicas da puberdade. Aparentemente, há diminuição na atividade dos neurotransmissores que inibem a secreção do Gn-RH, mediada principalmente pelo ácido gama-amino- butírico (GABA), além da ativação daqueles que estimulam sua secreção, como o glutamato e a kisspeptina. Além dos neurotransmissores, a leptina e o IGF-1 (insulin growth factor–1) parecem estar envolvidos no controle da secreção do GnRH; entretanto, seu papel no desencadeamento do processo puberal permanece controverso. O GnRH é um decapeptídeo secretado de maneira pulsátil pelos neurônios do núcleo arqueado localizado no hipotálamo. Tem meia-vida curta, de 2 a 4 minutos, e sua secreção é influenciada pelos centros corticais cerebrais, sistema límbico, neurotransmissores, além dos esteroides sexuais. O GnRH atua na hipófise, estimulando a secreção das gonadotrofinas, FSH (hormônio folículo-estimulante) e LH (hormônio luteinizante). Estes, por sua vez, vão atuar nos ovários, levando à secreção dos esteroides sexuais (androgênios, estrogênios e progesterona). Por meio de mecanismo de feedback, os hormônios ovarianos exercem ação sobre a secreção de gonadotrofinas. No hipotálamo, modulam a secreção de GnRH e, na hipófise, influenciam diretamente a secreção de FSH e LH. O eixo HHO é competente desde o período fetal, iniciando seu desenvolvimento a partir de 9 a 10 semanas. Em torno de 19 a 20 semanas de vida intrauterina já se observa a elevação na secreção de gonadotrofinas e esteroides sexuais ovarianos, que estimulam as células germinativas e determinam o crescimento folicular. Os mecanismos de feedback tanto negativo como positivo estão presentes a partir da metade da gestação e se encontram maduros ao nascimento. Imediatamente após o nascimento, os níveis dos hor- mônios maternos e placentários diminuem drasticamen-te na circulação da recém-nascida, fazendo com que não mais exista a inibição exercida por esses hormônios sobre o eixo HHO. Essa desinibição do eixo dá início à secre-ção pulsátil de GnRH, que leva ao estímulo na produ-ção de gonadotrofinas e, consequentemente, à estimula-ção ovariana. Esse quadro se prolonga até cerca de 4 me- ses de vida, quando, por meio de feedback negativo, ocorre o declínio da secreção hipofisária e ovariana. Os níveis de gonadotrofinas na primeira infância per- manecem baixos até cerca de 8 anos de idade em virtude da supressão da atividade hipotalâmica, conhecida como pausa juvenil. Essa “hibernação hormonal” está presente nos primatas evoluídos e está relacionada com o prolon-gamento da infância, período em que ocorre a aquisição de habilidades cerebrais, principalmente aquelas relacio-nadas com a socialização. A melatonina, hormônio pro-duzido pela glândula pineal, pode estar relacionada com esse fator intrínseco de bloqueio do eixo. Na infância, a secreção pulsátil de GnRH é discreta, com frequência e amplitude baixas, não resultando em produção de gona-dotrofinas pela hipófise e de esteroides pelos ovários. De-senvolve-se o feedback negativo com níveis mínimos de gonadotrofinas e esteroides ovarianos. Por muitos anos acreditou-se que existiria um “gona-dostato” hipotalâmico que controlaria o grau de sensibi-lidade dos neurônios secretores de GnRH aos esteroides sexuais. Esse modelo foi questionado a partir de estudos em primatas, onde se observou que a administração exó- gena de esteroides afeta a concentração, mas não o padrão da secreção de gonadotrofinas hipofisárias. A mudança para o padrão bifásico da secreção de gonadotrofinas ob-servada na puberdade resulta primariamente na diminui-ção dos fatores que inibem a produção de GnRH e em menor escala no grau de sensibilidade ao feedback negati-vo exercido pelos esteroides ovarianos. Parece haver uma inter-relação entre os centros cere- brais e seus neurotransmissores sobre os mecanismos de inibição e ativação do eixo HHO, em especial o GABA, o neuropeptídeo Y (NPY), o glutamato e as kisspepti-nas, embora o mecanismo exato ainda seja desconheci-do. O GABA é um neurotransmissor inibidor que se re-laciona inversamente com a secreção de GnRH na pu-berdade, sendo talvez o responsável por barrar a atividade do GnRH hipotalâmico na infância. O NPY é um neu-ropeptídeo hipotalâmico associado à ingestão alimentar e ao comportamento reprodutivo, que parece ter algum papel na diminuição da secreção do GnRH na infância. Já o glutamato estimula a secreção de GnRH e parece exercer um papel no retorno da atividade pulsátil na pu-berdade. As kisspeptinas são proteínas produzidas pelos neurônios do núcleo arqueado do sistema nervoso cen-tral (SNC) e agem sobre o sistema gerador de pulsos do hipotálamo, sendo provavelmente a chave que transmite os sinais do ambiente externo e do interno, que inicia o processo puberal. Em torno dos 7 anos de idade ocorre a ativação do eixo HHO com pulsos noturnos de GnRH que au- mentam em frequência e amplitude e com a conse- quente ocorrência de pulsos noturnos de gonadotrofi-nas, e os níveis de LH excedem os de FSH no início do processo puberal. A resposta do FSH, apesar de menor, é mais precoce que a do LH, sendo 4 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV grande no início da puberdade e declinando no meio do processo. Sob a ação dos picos de FSH se inicia a produção de estradiol pelos ovários cerca de 1 ano antes da telarca. O aumen-to progressivo na produção do estradiol leva ao apareci-mento dos caracteres sexuais secundários. Como evo-luir do processo puberal aumenta a responsividade da hipófise ao estímulo do GnRH com o aumento da sín- tese de gonadotrofinas, sendo a secreção de LH de 20 a 40 vezes maior que nos níveis pré-puberais e a do FSH, duas a três vezes maior. A resposta ao LH é pequena no início e aumenta acentuadamente com o evoluir da puberdade. Inicial-mente ocorrem picos noturnos, durante o sono, que vão aumentando gradativamente em amplitude e fre-quência. No final da puberdade, os pulsos diurnos pre-dominam sobre os noturnos. Nessa época se estabele-ce o padrão bifásico do feedback entre estrogênio e LH. Em baixas concentrações, o estrogênio promove um feedback negativo, inibindo a secreção de LH. Entretanto, quando em altas concentrações, o estrogênio promove um feedback positivo, levando ao surgimento do pico de LH, o que determina a ocorrência da ovulação, evento que caracteriza o fim do processo puberal. Além dos esteroides sexuais, outras substâncias são produzidas pelos ovários, como inibina A, inibina B, ati-vina, folistatina e citocinas, que atuam modulando a atividade das gonadotrofinas e participando do sistema de feedback positivo e negativo, essencial para o amadurecimento reprodutivo do eixo neuroendócrino. Inibinas são glicoproteínas produzidas principalmente pelas gô-nadas e funcionam como marcadores da atividade das células da granulosa. Agem na supressão do FSH, parti- cipando do feedback negativo do eixo HHO. A inibina B é produzida pelos folículos na fase folicular. Já a inibina A é produzida pelo corpo lúteo, na fase lútea. A ativina estimula a secreção do FSH, enquanto a folistatina exerce o papel de regulador do sistema inibina-ativina. Os ovários se tornam mais responsivos ao estímulo central com secreção crescente dos esteroides sexuais, apresentando aumento de volume com aumento do es-troma e do desenvolvimento folicular em número e di-mensões. O mecanismo exato do início da puberdade perma- nece desconhecido, mas o percentual de gordura cor- poral e alguns fatores metabólicos parecem ter o pa- pel de sinalizar ao hipotálamo o início do processo. Em 1974, Frisch identificou a relação entre o peso corporal e a ocorrência da menarca, propondo um peso mínimo de 47,8kg. Mais tarde, verificou-se que mais importante do que o peso seria o percentual de gordura corporal, entre 16% para ocorrer a menarca e 23%, para ocorre-rem os ciclos ovulatórios. A observação de que obesas menstruam mais precocemente e que anoréticas e atle tas com baixa porcentagem de massa gordurosa mens-truam mais tarde reforça a existência de uma relação entre a gordura corporal e a função reprodutiva. Estudos recentes sugerem aceleração do desenvolvi-mento mamário em meninas obesas, que alcançaram o estágio 3 de Tanner mais precocemente, além de ida- de óssea mais adiantada, e o fator que parece ser o res-ponsável pela antecipação da maturação esquelética em crianças obesas é o IGF-1. Estudo realizado com bailarinas demonstrou que elas apresentam ingesta calórica deficiente para a atividade fí-sica que realizam e retardo na maturação óssea, o qual é compensado ao longo do desenvolvimento puberal, não afetando a estatura final; entretanto, foi detectado atraso de 1 ano na idade da menarca. Provavelmente, esse retar-do no desenvolvimento se deve ao exercício físico inten-so associado a um aporte calórico insuficiente. A leptina, um peptídeo de modo pulsátil secreta-do pelos adipócitos, com um padrão diurno, comunica o status nutricional ao SNC e parece ter relação com o início da puberdade.Agindo sobre o SNC, regula o com- portamento alimentar e o consumo de energia, sinali- zando ao hipotálamo a quantidade de tecido adiposo disponível e o peso corporal. Em roedores, a adminis- tração de leptina acelera a puberdade e sua ausência esta relacionada com a infertilidade. Baixos níveis de leptina induzidos por um balanço energético negativo levam ao atraso no amadurecimento sexual, o que pode ser corrigido mediante a administração de leptina. As alterações séricas de leptina que ocorrem durante a transição puberal se constituem em argumento adicional que sustenta sua importância no desencadear da puber-dade. Em meninas, os níveis séricos de leptina aumentam durante a infância até o início do desenvolvimento pu-beral. Parece haver aumento do tecido adiposo com au-mento da produção de leptina até um nível crítico neces-sário para o início da puberdade. Quanto mais elevados os níveis de leptina, mais precoce o início da puberdade. Com o evoluir do processo puberal os níveis tendem a cair, observando-se aumento da sensibilidade à leptina. De acordo com o que já foi demonstrado em alguns es-tudos, a concentração de leptina se modifica nos diferen-tes estágios do desenvolvimento puberal e apresenta uma relação direta com IMC, FSH, LH e estradiol. Observam-se concentrações baixas em pacientes com puberdade retardada, atletas e anoréticas. Bailarinas apre-sentam alteração na liberação de leptina, o que leva à re-dução nos níveis de GnRH, LH, FSH e, consequente-mente, de estrogênios ovarianos. Inversamente, na obe-sidade, os níveis elevados de leptina levam à aceleração puberal e podem estar relacionados com disfunção ova-riana e anovulação crônica. Adrenarca: O processo da puberdade é iniciado na infância tardia por meio de uma cascata de alterações neuroendócrinas que levam a crescimento físico, maturação sexual e aquisição da capacidade reprodutiva. A maturação puberal consiste em dois processos associados, porém independentes: a adrenar-ca (início da produção androgênica) e a gonadarca (reativa-ção do eixo HHO). Por fim, e em decorrência de ambos os processos citados, ocorre a 5 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV menarca, que marca o final da puberdade.A coincidência temporal entre os dois even-tos faz pensar em uma relação entre eles, mas ainda não existem evidências que sustentem essa teoria. Paralelamente ao início da secreção de GnRH, mas in- dependentemente dele, observa-se a ativação da zona re-ticular das suprarrenais, que recebe o nome de adrenar-ca. Em virtude do aumento na atividade das enzimas do complexo P450c17, 17α-hidroxilase e 17,20-liase, inicia--se a secreção dos hormônios androgênicos, principal-mente desidroepiandrosterona (DHEA), sulfato de desi- droepiandrosterona (DHEA-S) e androstenediona. Ob-servam-se o crescimento dos pelos pubianos (pubarca) e dos axilares (axilarca) e a secreção das glândulas sebáceas. A adrenarca geralmente ocorre 2 anos antes da rea-tivação do eixo HHO. O estímulo primário para início da adrenarca é desconhecido, sendo o primeiro evento o aumento da sensibilidade adrenal ao estímulo do ACTH e consequente esteroidogênese adrenal. Observa-se ele-vação da 17 α-hidroxipregnenolona e da DHEA. Não se observa aumento da secreção do cortisol. A elevação do DHEA-S é o sinal necessário para o desenvolvimen-to de pelos pubianos e axilares. O aumento dos andro- gênios adrenais estimula ainda o desenvolvimento da unidade pilossebácea na pele e atua também no aumen-to da densidade cortical dos ossos. O início da secreção de androgênios pelas suprarrenais independe de GnRH, de gonadotrofinas ou da função ovariana. No período que precede a menarca, o aumento dos pulsos de FSH, em intensidade e frequência, associado ao aumento da sensibilidade ovariana ao estímulo das gonadotrofinas, leva ao aumento da secreção de estra-diol. Sob estímulo estrogênico, tornam-se evidentes os caracteres sexuais secundários e a sequência de eventos do desenvolvimento puberal. Seguindo a adrenarca e a gonadarca, e associada ao au-mento dos esteroides sexuais e da leptina, observa-se a ativação da secreção do hormônio do crescimento (GH) e do IGF- 1. O GH é secretado pela hipófise anterior em resposta ao hormônio liberador do hormônio do cres- cimento (GHRH) hipotalâmico. Fatores periféricos in- fluenciam a produção do GH, como grelina, que o es- timula,e somatostatina, que o inibe. Os picos de GH na puberdade são mais frequentes e amplos no início, levan-do à velocidade de crescimento maior, e decrescem no final do desenvolvimento puberal. O GH se liga aos re-ceptores no fígado, promovendo a produção do IGF-1, responsável pelo crescimento corporal. Eventos puberais: Na grande maioria das adolescentes, o primeiro sinal externo da puberdade é o estirão do crescimento, se- guido do início do desenvolvimento mamário (telarca), aparecimento dos pelos pubianos (pubarca) e, finalmen-te, início dos ciclos menstruais (menarca). No entanto, essa sequência pode apresentar variações individuais em tempo e ritmo, dependendo de fatores genéticos, ambientais e mesmo sociais. Em geral, a me-narca ocorre após o pico da velocidade de crescimento, em torno de 2,6 anos após o início da puberdade. A du-ração total do processo puberal, desde a aceleração do crescimento, passando pela telarca, pubarca e menarca, é em torno de 4,5 anos, com variação entre 1,5 e 6 anos. Estirão de crescimento: O estirão de crescimento se caracteriza pelo desenvolvi-mento somático, que acontece mais cedo nas meninas do que nos meninos. Depende da ação conjunta do GH e do IGF-1, que aumentam de maneira progressiva no início da puberdade, além dos níveis crescentes dos esteroides sexuais. Assim como as gonadotrofinas, o GH é secretado de modo pulsátil com picos durante o sono. O aumento nos níveis séricos de GH é o principal fator determinan-te da velocidade do ganho estatural obtido durante o esti-rão do crescimento. A duração do estirão é de 2 a 3 anos, e o ritmo de crescimento pode ser avaliado pelas curvas de crescimento, sendo as mais recomendadas para a po-pulação brasileira as da Organização Mundial da Saúde (OMS) (Figura 5.1). Cerca de 16% a 18% da estatura adulta final é obtida na puberdade, sendo o pico máximo de velocidade de crescimento atingido cerca de 6 meses antes da menarca e no estágio IV do desenvolvimento de mamas e pelos. Em meninas, o pico de velocidade de crescimento ocorre entre 9 e 14 anos, com cerca de 9cm/ano, menor que nos meninos, que é de 10,3cm/ ano. A diferença na estatura adulta entre meninas e meninos parece dever-se ao início mais precoce do crescimento em meninas, em cerca de 2 anos, mas, principalmente, ao fato de os meninos cresce-rem mesmo antes do pico de velocidade de crescimento. Após a menarca, a velocidade de crescimento é menor, podendo ser esperado um crescimento de 5 a 8cm em até 2 anos. As proporções do esqueleto também mudam, com as extremidades crescendo mais rapidamente, enquanto a coluna vertebral cresce mais lentamente. A estatura final do adulto é mediada pela produção dos esteroides sexuais, que, em níveis altos, promove o fechamento das epífises dos ossos longos. Nas meninas, aproximadamente 9 a 12 meses após o pico de velocidade de crescimento, ocorre ganho importante da massa óssea com pico em torno dos 17 aos 19 anos, mediado pela ação do GH, do estrogê-nio e dos esteroides adrenais. Com o crescimento somáti-co ocorre também mudança na composição corporal com distribuição de gordura em um padrão feminino. A massa óssea é determinada por fatores genéticos, condições gerais de saúde e nutrição, peso corporal, tabagismo, atividade fí-sica, uso de medicamentos e condições hormonais. A altura-alvo pode ajudar a verificar se a menina está crescendo dentro de seu padrão familiar. O cálculo po-de ser obtido por meio da seguinte fórmula: Caracteres Sexuais Secundários: 6 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV Os caracteres sexuais secundários são os sinais visíveis do desenvolvimento puberal, sendo descritos e estagia-dos pelo sistema de avaliação criado por Marshall e Tan-ner em 1969. São descritos cinco estágios distintos do desenvolvimento de mamas e pelos, indo de um aspecto pré-puberal até a configuração do adulto. Telarca A telarca consiste no desenvolvimento mamário que se inicia com o aparecimento do broto mamário cerca de 2 anos antes da menarca. Não é incomum que a princí-pio o crescimento seja unilateral ou assimétrico, o que, em geral, é corrigido ao longo do processo. É impor-tante registrar que o desenvolvimento de pelos e mamas pode não ser sincronizado, já que estes derivam de siste-mas hormonais distintos, ovariano e suprarrenal, poden-do, eventualmente, ser precedido pela pubarca. A sequên-cia de desenvolvimento foi bem estudada por Marshall e Tanner na década de 1960 e ainda hoje é bastante usada no acompanhamento da puberdade (Figura 5.2). Pubarca A pubarca é caracterizada externamente pelo apareci- mento dos pelos pubianos, seguidos dos axilares. O au-mento da secreção das glândulas sebáceas confere à ado-lescente odor peculiar, além do surgimento da acne. O desenvolvimento dos pelos pubianos foi também docu-mentado pelo trabalho de Marshall e Tanner e serve co-mo parâmetro no acompanhamento clínico (Figura 5.3): DesenvolviMenTo Da geniTália inTerna Paralelamente às alterações esqueléticas, de mamas e pe-los, alterações importantes ocorrem nos órgãos genitais internos e externos. Os ovários apresentam crescimento linear na infância, mas aumentam de volume a partir do início da puberdade e apresentam crescimento folicular. A vagina cresce em comprimento, partindo de cerca de 4cm ao nascimento para 7 a 8cm na puberdade. O útero experimenta crescimento e mudança de configuração; na infância, o comprimento uterino é de 2cm e a cérvice é mais proeminente que o corpo (relação corpo/colo < 1). Na menarca, o útero mede cerca de 6cm de comprimen-to e a cérvice e o corpo têm proporções semelhantes (re-lação corpo/colo = 1). Após a menarca, o útero continua crescendo e ao final do desenvolvimento puberal adquire a configuração adulta com o corpo uterino bem maior que a cérvice (relação corpo/colo > 2). Menarca A menarca é o evento social mais relevante do processo puberal, sendo erroneamente encarada como o final do desenvolvimento. Ocorre em torno de 2,5 anos após o início do desenvolvimento puberal, geralmente no está-gio IV de mamas e pelos pubianos. Resulta da estimu-lação endometrial pelos níveis crescentes de estrogênio e sua consequente descamação. O estudo de Marshall e Tanner demonstrou que o tempo médio decorrido entre a telarca e a pubarca é de 2,3 anos, mas com grande variação individual em vir-tude, principalmente, de questões genéticas e também da melhora nas 7 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV condições de saúde e nutrição. A ida-de da menarca apresentou queda importante no século XX, principalmente no período que sucedeu à Segunda Guerra Mundial, mas observa-se uma tendência à esta-bilidade nos últimos 30 anos. No Brasil, como em di-versos países, a idade média da menarca observada tem sido em torno dos 12 anos com variação de 1 a 2 anos. Os ciclos menstruais após a menarca tendem a ser anovulatórios e, portanto, irregulares. A ciclicidade da menstruação depende da maturidade do eixo HHO com o desenvolvimento do mecanismo de feedback bi-fásico entre estradiol e LH, sendo negativo em baixas doses e positivo em altas doses, levando a pico de LH no meio do ciclo, o que detona a ovulação. A regularidade menstrual, que reflete a ocorrência de ovulação, aumenta com o passar do tempo, estando presente em cerca de 65% das meninas após o primeiro ano e em 90% após o terceiro ano depois da menarca. A ciclicidade da ovulação marca o final da puberdade. Referência: SILVA, C.H.M.; SALOMÃO, C.L.B.; REIS, J.T.L.D. Manual SOGIMIG de ginecologia e obstetrícia na infância e adolescência. [Digite o Local da Editora]: MedBook Editora, 2018. 9786557830130. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9 786557830130/. Acesso em: 14 Sep 2021 – biblioteca online Puberdade Normal (Fis iológ ica): Puberdade é o período de transição entre a infância e a vida adulta, durante o qual é adquirida amaturidade reprodutiva. Caracteriza-se por transformações físicas e psíquicas complexas e depende da integridade do eixo hipotálamo-hipófise-ovários (H-H-O). Os sinais clínicos da puberdade em ambos os sexos são o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários e a aceleração na velocidade de crescimento. A puberdade tem início com a ativação do eixo H-H- O, antes mesmo do aparecimento de qualquer sinal externo de desenvolvimento de caracteres sexuais secundários e do estirão de crescimento, o que corresponde à idade óssea de 11 anos nas meninas. Termina quando se estabelecem os ciclos ovulatórios, último fenômeno deste período. A duração da puberdade é variável, sendo em média de quatro a cincoanos, mas pode estender-se por até seis anos1. São vários os fatores que influenciam o início da puberdade, sendo o genético o mais determinante. Sabe-se que existe uma correlação entre a idade da menarca entre mães e filhas e entre irmãs. A situação geográfica e a exposição à luz parecem exercer algum papel, pois a puberdade tende a ocorrer mais cedo em baixas altitudes e próximo à linha do Equador. A melhoria das condições de nutrição e saúde fez com que a idade média de menarca caísse de forma importante após a Revolução Industrial. Nos últimos 30 anos não se identificou diminuição significativa na idade média da menarca, nos países desenvolvidos. No entanto, mesmo mantendo-se estável a idade média de ocorrência da menarca, observou-se nas últimas três a cinco décadas a diminuição da época de aparecimento dos eventos puberais de forma global3. Estudos americanos Pediatric Reserch in Office Settings – PROS e National Health and Nutrition Examination Survey – NHANES identificaram telarca e pubarca antes dos oito anos em 10,5% das meninas brancas e em 37,8% das meninas negras, e antes dos sete anos em 5% das meninas brancas e em 15,4% das meninas negras. Apesar da diminuição da idade da telarca, não se observou uma diminuição na idade de ocorrência da menarca, estando este intervalo em cerca de 2,3 anos nos trabalhos de Marshal e Tanner e 3,3 anos nos estudo NHANES4. Chama à atenção a associação dessas alterações com a obesidade e índice de massa corporal aumentado na infância, com aceleração da velocidade de crescimento. Observa- se ainda associação com níveis de leptina elevados1,6. Questionase ainda o papel de substâncias químicas presentes no meio ambiente, como pesticidas e fitoestrogênios nos alimentos, que podem atuar sobre o eixo hipotálamo- hipófiseovariano com ação semelhante a do estrogênio. Em 1974, Frisch identificou a relação entre o peso corporal e a ocorrência da menarca, propondo um peso mínimo de 47,8 kg5. Mais tarde verificou-se que, mais importante que o peso seria o percentual de gordura corporal, entre 16% para ocorrer a menarca e 23% para ocorrer os ciclos ovulatórios1. A observação de que obesas menstruam mais precocemente e que anoréticas e atletas com baixa percentagem de massa gordurosa menstruam mais tarde, reforça a existência de uma relação entre gordura corporal e função reprodutiva. Trabalhos recentes sugerem aceleração do desenvolvimento mamário em meninas obesas, que alcançaram o estágio 3 de Tanner mais precocemente6, além de idade óssea mais adiantada, e o fator que parece ser o responsável pela antecipação da maturação esquelética em crianças obesas é o IGF-16,7. Estudo realizado com bailarinas demonstrou que elas apresentam uma ingesta calórica deficiente para a atividade física que realizam e um retardo na maturação óssea que é compensado ao longo do desenvolvimento puberal, não afetando a estatura final e houve atraso de um ano na idade da menarca8. Provavelmente esse retardo no desenvolvimento deve-se ao exercício físico intenso associado a um aporte calórico insuficiente8. Pode ser que a leptina, um peptídeo secretado pelos adipócitos, tenha relação com o início da puberdade. Agindo sobre o SNC, regula o comportamento alimentar e o consumo de energia, sinalizando ao hipotálamo a quantidade de tecido adiposo disponível e o peso corporal9. Em roedores, a administração de leptina acelera a puberdade e sua 8 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV ausência correlaciona-se à infertilidade. Baixos níveis de leptina induzidos por um balanço energético negativo levam a um atraso no amadurecimento sexual, que pode ser corrigido pela administração de leptina10. As alterações séricas de leptina que ocorrem durante a transição puberal se constituem em argumento adicional que sustenta a sua importância no desencadear da puberdade10. Em meninas, os níveis séricos de leptina aumentam durante a infância, até o início do desenvolvimento puberal. Parece haver um aumento do tecido adiposo, com aumento da produção de leptina a um nível crítico, necessário para o início da puberdade. Quanto mais elevados os níveis de leptina, mais precoce o início da puberdade. Com o evoluir do processo puberal, os níveis tendem a cair, observando-se um aumento da sensibilidade à leptina. De acordo com o que já foi demonstrado em alguns estudos, a concentração de leptina se modifica nos diferentes estágios do desenvolvimento puberal e apresenta uma relação direta com o IMC, FSH, LH e estradiol11. Observam-se concentrações baixas em pacientes com puberdade retardada, atletas e anoréticas9. Bailarinas apresentam alteração na liberação de leptina o que leva a redução nos níveis de GnRH, LH, FSH e, consequentemente, de estrógenos ovarianos8. Fisiologia Da Puberdade A sequência de eventos da puberdade depende diretamente da integridade do eixo H-H-O, com seus mecanismos de feedback. A secreção do GnRH no hipotálamo por neurônios específicos é o principal evento neuroendócrino da puberdade e dá origem à cascata de eventos hormonais que levam à ativação gonadal e às alterações físicas da puberdade. Vários fatores parecem estar envolvidos na ativação da produção do GnRH, mas os mecanismos moduladores permanecem pouco definidos. Aparentemente há uma diminuição da atividade dos neurotransmissores inibidores do neurônio GnRH, mediada principalmente pelo ácido gamaaminobutírico, acompanhada pela ativação dos neurotransmissores estimuladores da secreção do GnRH, cujo principal mediador é a kisspetiptina. A leptina parece ter um papel permissivo e não desencadeador nesta ativação12. 1 – Hipotálamo: produz o fator liberador de gonadotrofinas, o GnRH, um decapeptídeo de secreção pulsátil e meia vida de 2 a 4 minutos. Sua secreção é influenciada por: - Centros corticais. - Sistema límbico. - Neurotransmissores. - Esteroides sexuais. 2 – Hipófise: estimulada pela secreção pulsátil do GnRH hipotalâmico, produz as gonadotrofinas: - FSH: hormônio folículo estimulante. - LH: hormônio luteinizante. FSH e LH agem sobre os ovários, levando à maturação do epitélio germinativo e secreção dos esteroides sexuais. 3 – Ovários: estimulados pelas gonadotrofinas, produzem os esteroides sexuais. Produzem ainda IGF- 1, inibina, ativina e citoquininas. Determinam o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários. Por meio de mecanismo de feedback, os hormônios ovarianos exercem ação sobre a secreção de gonadotrofinas. No hipotálamo, modulam a secreção de GnRH e, na hipófise, influenciam diretamente a secreção de FSH e LH13. O eixo H-H-O é competente desde a metade da vida embrionária, estando bem desenvolvido ao nascimento, apresentando mecanismos de feedback negativo e positivo. A presença dos esteroides sexuais e das gonadotrofinas é fundamental na divisão celular e no desenvolvimento folicular no ovário fetal. Após o nascimento, cessa o estímulo dos hormônios maternos sobre o eixo H-H-O da neonata, levando a um aumento das gonadotrofinas, estímulo dos ovários e produção de estrogênios pelos ovários. Esta situação pode se prolongar até em torno do quarto mês de vida, quando através de feedback negativo ocorre declínio dos níveis de gonadotrofinase dos esteroides sexuais ovarianos. Este quadro permanece praticamente inalterado até em torno do oitavo ano de vida14. Durante a primeira infância, o eixo H-H-O apresenta atividade diminuída. Identifica-se a presença do gonadostato, sistema regulador das gonadotrofinas, extremamente sensível ao feedback negativo exercido pelo estrogênio, fazendo com que pequenas concentrações inibam a sua secreção. Além deste mecanismo de feedback negativo, identifica-se a presença de um fator de inibição central intrínseca ao GnRH. A melatonina, hormônio produzido pela glândula pineal, pode estar relacionada a este fator intrínseco de bloqueio do eixo15. Ao redor dos sete anos de idade inicia-se a ativação do eixo H-H-O, com pulsos noturnos de GnRH. Neste período identifica-se a liberação do gonadostato, resultante da diminuição da inibição central intrínseca ao GnRH e da menor sensibilidade do feedback negativo dos esteroides sexuais. Sob a ação do GnRH inicia-se a secreção de FSH e LH. Inicialmente os níveis são baixos, associados a pulsos, inicialmente noturnos, durante o sono. A resposta do FSH é mais precoce que a do LH, sendo grande no início da puberdade e declinando no meio do processo. Sob a ação dos picos de FSH inicia-se a produção de estradiol pelos ovários. A partir da presença de estradiol sérico começam a aparecer os caracteres sexuais secundários14. A resposta ao LH é pequena no início e aumenta acentuadamente depois, no evoluir da puberdade. Inicialmente ocorrem picos noturnos, durante o sono, que vão aumentando gradativamente em amplitude e frequência. No final da puberdade os pulsos diurnos predominam sobre os noturnos16. Nesta época 9 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV estabelece-se o padrão bifásico do feedback entre estrogênio e LH: Baixas concentrações: feedback negativo. Altas concentrações: feedback positivo, levando ao surgimento do pico de LH no meio do ciclo, favorecendo a ocorrência da ovulação, evento que determina o final do processo puberal. ADRENARCA Paralelamente ao início da secreção de GnRH, mas independentemente dele, observa-se a ativação da zona reticular das suprarrenais, que recebe o nome de adrenarca. Inicia-se a secreção dos hormônios androgênicos, principalmente a deidroepiandrosterona (DHEA), o sulfato de deidroepiandrosterona (DHEA-S) e a androstenediona. Ocorre também o aumento da atividade da 17 alfa hidroxilase e do P450 e 17. Observa-se o crescimento dos pelos pubianos (pubarca), dos axilares (axilarca) e a secreção das glândulas sebáceas17-18. A adrenarca ocorre geralmente dois anos antes do estirão de crescimento e da elevação das gonadotrofinas e dos estrogênios. Não depende de GnRH, de gonadotrofinas ou da função ovariana. O início da puberdade é marcado pelo aumento gradual dos picos de LH e FSH, inicialmente durante a noite e depois durante todo o dia. O LH estimula as células da teca interna, que sintetizam os precursores androgênicos. O FSH aumenta a síntese de aromatase, que converte os precursores em estrogênio. Os ovários crescem em volume e adquirem um aspecto multifolicular16. No período que precede a menarca, o aumento dos pulsos de FSH em intensidade e frequência e o aumento da sensibilidade ovariana ao estímulo das gonadotrofinas levam ao aumento da secreção de estradiol. Sob o estímulo estrogênico, tornam-se evidentes os caracteres sexuais secundários e a sequência de eventos do desenvolvimento puberal14: - Estirão de crescimento. - Telarca. - Pubarca. - Menarca. 1 - Estirão de crescimento: caracteriza-se pelo desenvolvimento somático, que acontece mais cedo nas meninas. Depende da ação conjunta do hormônio do crescimento (GH), dos estrogênios e do IGF-1. Estrogênio estimula o GH, que ativa o IGF-1, que é um mediador da ação do GH. Relação entre o estrogênio e o GH: baixas doses de estradiol estimulam o GH, porém altas doses o inibem, pela modulação do IGF-1. Durante o estirão ocorre ganho de peso, com alteração importante no percentual de gordura corporal. Sua duração é de dois a três anos e a velocidade de crescimento de 9 cm a 10 cm/ano. Ocorre desaceleração do crescimento após a menarca, com ganho estatural médio de 6 cm19. O ritmo de crescimento pode ser avaliado pelas curvas de crescimento. Atualmente as curvas recomendadas são as da OMS que representam melhor nossa população do que as curvas do NCHS. A altura-alvo pode auxiliar a verificar se a menina está crescendo dentro do seu padrão familiar. O cálculo pode ser obtido através da seguinte fórmula: 2 – Telarca: desenvolvimento mamário, que se inicia com o aparecimento do broto mamário por volta de dois anos antes da menarca. Eventualmente pode ser precedida pela pubarca. A sequência de desenvolvimento foi bem estudada por Marshall e Tanner na década de 60 e ainda hoje é bastante usada no acompanhamento da puberdade20: M1: ausência de desenvolvimento mamário, estágio infantil. M2: aparecimento do broto mamário. M3: crescimento de mama e aréola, sem separação de contornos. M4: projeção da papila e aréola acima do contorno da mama. M5: projeção apenas da papila e retorno da aréola ao contorno da mama. 3 – Pubarca: caracteriza-se externamente pelo aparecimento dos pelos pubianos, seguidos dos axilares. O aumento da secreção das glândulas sebáceas confere à adolescente odor peculiar, além do surgimento da acne. O desenvolvimento dos pelos pubianos foi também documentado pelo trabalho de Marshall e Tanner e serve como parâmetro no acompanhamento clínico20: P1: ausência de pelos pubianos. P2: pelos finos e lisos na borda dos grandes lábios. P3: aumento na quantidade de pelos nos grandes lábios e na sínfise púbica, pelos mais escuros e crespos. P4: pelos escuros, crespos, grossos, nos grandes lábios, na sínfise púbica e períneo. P5: pelos terminais abundantes em sínfise, períneo e raiz das coxas. 4 – Menarca: fenômeno mais marcante da puberdade, e é erroneamente encarado como o final do desenvolvimento. A idade da menarca apresentou queda importante no século XX, principalmente no período após a Segunda Guerra. Atualmente encontra-se estável. É influenciada por vários fatores, dentre os quais os que se relacionam à melhoria nas condições de vida e saúde. Idade média de ocorrência é 12,65 anos com variação de até um a dois anos21. No Brasil, como em diversos países, a menarca tem sido observada em torno dos 12 anos22. O tempo médio decorrido entre o aparecimento do broto mamário e a menarca é de dois a três anos. Geralmente a menarca ocorre após o pico do crescimento ponderal, com idade óssea igual ou maior que 13 anos e com desenvolvimento mamário em estágio M4 e de pelos P421. Após a menarca, os ciclos menstruais tendem a ser anovulatórios e, portanto, irregulares. Com o passar do tempo ocorre a maturidade do eixo e instala-se o feedback bifásico entre o estradiol e o LH, sendo que 10 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV em baixas doses ele é negativo e em altas doses é positivo, levando a pico de LH no meio do ciclo, o que detona a ovulação. A ciclicidade da ovulação leva à regularidade menstrual e marca o final da puberdade. Pode haver variações individuais quanto a sequência destes eventos. CABRAL, ZAF. Manual de Ginecologia Infanto Juvenil - Sao Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), 2014. O2. Compreender os aspectos legais e pol ít icas públ icas envolv idas no planejamento famil iar . A Lei n° 9.263, de 12 de janeiro de 1966 regula o parágrafo 7° do art. 226 da Constituição Federal, que trata do planejamento familiar, estabelece penalidades e dá outras providências. CAPÍTULO I DO PLANEJAMENTO FAMILIAR Art. 1° O planejamento familiar é direito de todo cidadão. Art. 2° Entende-se planejamento familiar como o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prolepela mulher, pelo homem ou pelo casal. Art. 3° O planejamento familiar é parte integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde. Parágrafo único – As instâncias gestoras do Sistema Único de Saúde, em todos os seus níveis, obrigam-se a garantir, em toda a sua rede de serviços, no que respeita a atenção à mulher, ao homem ou ao casal, programa de atenção integral à saúde, em todos os seus ciclos vitais, que inclua, como atividades básicas entre outras: I – a assistência à concepção e contracepção; II – o atendimento pré-natal; III – a assistência ao parto, ao puerpério e ao neonato; IV – o controle das doenças sexualmente transmissíveis; V – o controle e a prevenção dos cânceres cérvico- uterino, de mama, de próstata e de pênis. Art. 4º O planejamento familiar orienta-se por ações preventivas e educativas e pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para a regulação da fecundidade. Parágrafo único - O Sistema Único de Saúde promoverá o treinamento de recursos humanos, com ênfase na capacitação do pessoal técnico, visando a promoção de ações de atendimento à saúde reprodutiva. Art. 5º - É dever do Estado, através do Sistema Único de Saúde, em associação, no que couber, às instâncias componentes do sistema educacional, promover condições e recursos informativos, educacionais, técnicos e científicos que assegurem o livre exercício do planejamento familiar. Art. 6º As ações de planejamento familiar serão exercidas pelas instituições públicas e privadas, filantrópicas ou não, nos termos desta Lei e das normas de funcionamento e mecanismos de fiscalização estabelecidos pelas instâncias gestoras do Sistema Único de Saúde. Parágrafo único - Compete à direção nacional do Sistema Único de Saúde definir as normas gerais de planejamento familiar. Art. 7º - É permitida a participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros nas ações e pesquisas de planejamento familiar, desde que autorizada, fiscalizada e controlada pelo órgão de direção nacional do Sistema Único de Saúde. Art. 8º A realização de experiências com seres humanos no campo da regulação da fecundidade somente será permitida se previamente autorizada, fiscalizada e controlada pela direção nacional do Sistema Único de Saúde e atendidos os critérios estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde. Art. 9º Para o exercício do direito ao planejamento familiar, serão oferecidos todos os métodos e técnicas de concepção e contracepção cientificamente aceitos e que não coloquem em risco a vida e a saúde das pessoas, garantida a liberdade de opção. Parágrafo único. A prescrição a que se refere o caput só poderá ocorrer mediante avaliação e acompanhamento clínico e com informação sobre os seus riscos, vantagens, desvantagens e eficácia. Art. 10. Somente é permitida a esterilização voluntária nas seguintes situações: (Artigo vetado e mantido pelo Congresso Nacional – Mensagem nº 928, de 19.8.1997) I - em homens e mulheres com capacidade civil plena e maiores de vinte e cinco anos de idade ou, pelo menos, com dois filhos vivos, desde que observado o prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade, incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar, visando desencorajar a esterilização precoce; II - risco à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto, testemunhado em relatório escrito e assinado por dois médicos. § 1º É condição para que se realize a esterilização o registro de expressa manifestação da vontade em documento escrito e firmado, após a informação a respeito dos riscos da cirurgia, possíveis efeitos colaterais, dificuldades de sua reversão e opções de contracepção reversíveis existentes. § 2º É vedada a esterilização cirúrgica em mulher durante os períodos de parto ou aborto, exceto nos casos de comprovada necessidade, por cesarianas sucessivas anteriores. § 3º Não será considerada a manifestação de vontade, na forma do § 1º, expressa durante ocorrência de alterações na capacidade de discernimento por influência de álcool, drogas, estados emocionais alterados ou incapacidade mental temporária ou permanente. § 4º A esterilização cirúrgica como método contraceptivo somente será executada através da laqueadura tubária, vasectomia ou de outro método 11 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV cientificamente aceito, sendo vedada através da histerectomia e ooforectomia. § 5º Na vigência de sociedade conjugal, a esterilização depende do consentimento expresso de ambos os cônjuges. § 6º A esterilização cirúrgica em pessoas absolutamente incapazes somente poderá ocorrer mediante autorização judicial, regulamentada na forma da Lei. Art. 11. Toda esterilização cirúrgica será objeto de notificação compulsória à direção do Sistema Único de Saúde. (Artigo vetado e mantido pelo Congresso Nacional) Art. 12. É vedada a indução ou instigamento individual ou coletivo à prática da esterilização cirúrgica. Art. 13. É vedada a exigência de atestado de esterilização ou de teste de gravidez para quaisquer fins. Art. 14. Cabe à instância gestora do Sistema Único de Saúde, guardado o seu nível de competência e atribuições, cadastrar, fiscalizar e controlar as instituições e serviços que realizam ações e pesquisas na área do planejamento familiar. Parágrafo único. Só podem ser autorizadas a realizar esterilização cirúrgica as instituições que ofereçam todas as opções de meios e métodos de contracepção reversíveis. (Parágrafo vetado e mantido pelo Congresso Nacional) CAPÍTULO II DOS CRIMES E DAS PENALIDADES Art. 15. Realizar esterilização cirúrgica em desacordo com o estabelecido no art. 10 desta Lei. (Artigo vetado e mantido pelo Congresso Nacional) Mensagem nº 928, de 19.8.1997 Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, se a prática não constitui crime mais grave. Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço se a esterilização for praticada: I - durante os períodos de parto ou aborto, salvo o disposto no inciso II do art. 10 desta Lei. II - com manifestação da vontade do esterilizado expressa durante a ocorrência de alterações na capacidade de discernimento por influência de álcool, drogas, estados emocionais alterados ou incapacidade mental temporária ou permanente; III - através de histerectomia e ooforectomia; IV - em pessoa absolutamente incapaz, sem autorização judicial; V - através de cesária indicada para fim exclusivo de esterilização. Art. 16. Deixar o médico de notificar à autoridade sanitária as esterilizações cirúrgicas que realizar. Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa. Art. 17. Induzir ou instigar dolosamente a prática de esterilização cirúrgica. Pena - reclusão, de um a dois anos. Parágrafo único - Se o crime for cometido contra a coletividade, caracteriza-se como genocídio, aplicando-se o disposto na Lei nº 2.889, de 1º de outubro de 1956. Art. 18. Exigir atestado de esterilização para qualquer fim. Pena - reclusão, de um a dois anos, e multa. Art. 19. Aplica-se aos gestores e responsáveis por instituições que permitam a prática de qualquer dos atos ilícitos previstos nesta Lei o disposto no caput e nos §§ 1º e 2º do art. 29 do Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal. Art. 20. As instituições a que se refere o artigo anterior sofrerão as seguintes sanções, sem prejuízo das aplicáveis aos agentes do ilícito, aos co-autores ou aos partícipes: I - se particular a instituição: a) de duzentos a trezentos e sessenta dias-multa e, se reincidente, suspensão das atividades ou descredenciamento, sem direito a qualquer indenização ou cobertura de gastos ou investimentos efetuados; b) proibição de estabelecer contratos ou convênios com entidades públicase de se beneficiar de créditos oriundos de instituições governamentais ou daquelas em que o Estado é acionista; II - se pública a instituição, afastamento temporário ou definitivo dos agentes do ilícito, dos gestores e responsáveis dos cargos ou funções ocupados, sem prejuízo de outras penalidades. Art. 21. Os agentes do ilícito e, se for o caso, as instituições a que pertençam ficam obrigados a reparar os danos morais e materiais decorrentes de esterilização não autorizada na forma desta Lei, observados, nesse caso, o disposto nos arts. 159, 1.518 e 1.521 e seu parágrafo único do Código Civil, combinados com o art. 63 do Código de Processo Penal. BRASIL. Lei N. 9263 de 12 de janeiro de 1996. Regula o § 7º do art. 226 da Constituição Federal, que trata do planejamento familiar, estabelece penalidades e dá outras providências. Direitos Sexuais E Reprodutivos: A Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (CIPD) realizada no Cairo, em 1994, consagrou uma mudança no arquétipo cultural então vigente, elevando os direitos reprodutivos à condição de parte integrante e indissociável dos direitos humanos, ressaltando o novo conceito de planejamento familiar e garantindo a regulação da fecundidade como um direito individual. Os acordos estabelecidos nesta ocasião pelos 179 países presentes à conferência, entre os quais o Brasil, foram reafirmados e ampliados na IV Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada na cidade de Pequim (Beijing), em 1995. Na plataforma do Cairo, a saúde reprodutiva é definida como sendo: Capítulo VII § 7.2: 41 - [...] um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas ausência de doença ou enfermidade, em todas as matérias relacionadas com o sistema reprodutivo, suas funções e processos. A saúde reprodutiva implica, portanto, que as pessoas estejam aptas a ter 12 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV uma vida sexual satisfatória e segura, que tenham a capacidade de reproduzir-se e a liberdade de decidir fazê-lo se, quando e quantas vezes, desejarem. Implícito nesta última condição está o direito de homens e mulheres de ser informados e de ter acesso a métodos de planejamento familiar de sua escolha [...] que não sejam contra a lei [...] (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1994,). Já os direitos reprodutivos estão definidos da seguinte forma: § 7.3:41 - Os direitos reprodutivos englobam certos direitos humanos já reconhecidos em leis nacionais, documentos internacionais de direitos humanos e outros documentos consensuais das Nações Unidas. Tais direitos se baseiam no reconhecimento do direito fundamental de todos os casais e indivíduos de decidir livre e responsavelmente o número, o espaçamento e a época de ter seus filhos, e de ter informação e meios de fazê-lo, assim como o direito de atingir o nível mais elevado de saúde sexual e reprodutiva [...] (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1994). Os direitos reprodutivos, portanto, não admitem nenhuma forma de controle coercitivo da natalidade nem nenhuma forma de imposição natalista que implique na proibição de uso de qualquer meio de regulação da fecundidade. A garantia destes direitos é essencial para que as pessoas, notadamente as mulheres, exerçam seu direito à saúde sexual e reprodutiva, incluindo-se aí o direito a serviços de saúde integral e de boa qualidade, que garantam privacidade, informação, livre escolha, confidencialidade e respeito. O pressuposto imprescindível é que os direitos reprodutivos estejam incorporados ao contexto dos direitos humanos fundamentais, como o direito à vida, à igualdade, à liberdade à saúde, à educação e ao trabalho, à inviolabilidade da intimidade, em sua dimensão ética e política através do efetivo exercício destes direitos que, desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, em 1948, são considerados indivisíveis e interdependentes. O planejamento familiar no Brasil Nos anos de 1950 e 1960, o Brasil, oficialmente, adotava uma política neutra no que diz respeito à população, mas políticas públicas de apoio à maternidade tinham caráter francamente natalista, como a licença-maternidade e o salário-família. Os militares, que assumiram o poder na década de 60, em sua maioria, defendiam a tese de que o território brasileiro comportaria uma população maior e, de acordo com o ponto de vista predominante na época, a ocupação territorial era um objetivo estratégico para a garantia da segurança nacional. Neste meio tempo, as questões da sexualidade e da reprodução, que fez parte da luta feminista na Europa e nos Estados Unidos desde o início do século XX, ganhavam relevância na segunda onda do feminismo que teve lugar em todo o mundo durante a chamada “revolução sexual” dos anos de 1960. No Brasil, entretanto, devido ao momento político representado pela ditadura militar, o inimigo comum a ser enfrentado tanto pelo movimento feminista quanto pelo movimento popular era o regime militar e, nesta luta, o movimento feminista se aliou a setores da Igreja Católica deixando as reivindicações ligadas à reprodução e à sexualidade submersas na luta política mais geral e mais urgente. Em 1975, com a comemoração em todo o planeta, do ANO INTERNACIONAL DA MULHER, e a realização da I Conferência Mundial da Mulher, promovida pela Organização das Nações Unidas – ONU, o movimento de mulheres, no Brasil, tomou novo fôlego e se reestruturou, assumindo bandeiras mais amplas inclusive no que diz respeito à saúde. Em 1977, o Ministério da Saúde criou o Programa de Saúde Materno-Infantil, com o objetivo de contribuir para a redução da morbimortalidade materno-infantil, que incluía assistência à gestante, ao parto, e onde o planejamento familiar figurava discretamente sob o nome de paternidade responsável. Nesta mesma década, foi elaborado o Programa de Prevenção da Gravidez de Alto Risco (PPGAR), em parceria com um grupo de professores de universidades brasileiras envolvidos com a temática de saúde reprodutiva. Com o avanço das conquistas feministas e do processo de democratização, o planejamento familiar passou a ser defendido dentro do contexto da saúde integral da mulher. Nesta conjuntura, instalou-se, em 1983, uma Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI, para investigar os problemas vinculados ao crescimento populacional. Em 21 de junho de 1983, por ocasião de seu depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), o então Ministro da Saúde, Waldyr Arcoverde, apresentou a proposta de criação do PAISM que fora preparada com a colaboração de um grupo de médicos de longa tradição progressista e com a colaboração do movimento das mulheres. O PAISM propunha uma abordagem integral da saúde da mulher em seu ciclo vital, contemplando todos os aspectos de sua saúde, com pautas de ação e estratégias para um modelo assistencial, integral e equânime, contemplando um conjunto de ações educativas, preventivas, de diagnostico e terapia e/ou recuperação da saúde, incluindo prevenção de câncer, atenção ginecológica, planejamento familiar, tratamento para infertilidade, atenção pré-natal, no parto e pós-parto, diagnóstico e tratamento de doenças sexualmente transmissíveis - DSTs, assim como de doenças ocupacionais e mentais. Enquanto a discussão prosseguia na esfera política e administrativa, a taxa de natalidade do país despencava, e, na ausência de uma política pública para atender a procura das pessoas por métodos contraceptivos, farmácias e instituições privadas, como a Sociedade Bem-Estar da Família – BENFAM, criada em novembro de 1965 e filiada ao International Planned Parenthood Federation - IPPF e ao Centro de Pesquisa e Assistência Integral à Mulher e à Criança – CPAIMC, financiada por instituições vinculadas ao 13 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV sistema United States Agency for International Development - USAID através da Family Planning International Assistance - FPIA, Pathfinder Foundatione outras, passaram a suprir a demanda, como se demonstrou na PNDS de 1986. Entre os profissionais de saúde, a ideia predominante era de que o planejamento familiar seria um valioso instrumento para a prevenção do aborto provocado e inseguro e, por consequência, para a redução da mortalidade materna. Deste modo, chegou-se à constituinte no bojo de uma ampla discussão e participação agrupadas em três vertentes principais: a Igreja Católica, o movimento feminista e as entidades privadas de planejamento familiar (ROCHA,) No final dos debates na Assembleia Constituinte, o planejamento familiar foi contemplado no artigo 226 da Constituição Brasileira de 1988, com a seguinte redação: Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. “§ 7º. Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas (CF, 1988). A esterilização não foi citada no texto constitucional e ainda era considerada crime pelo código penal então vigente, uma vez que resultava em debilidade permanente de órgão ou função (no caso, função reprodutiva). Apesar disso, a esterilização feminina seguia inabalável seu curso como o método mais utilizado dentre todos aqueles disponíveis para anticoncepção.17 De acordo com os dados da PNDS de 1996, este representava 52% de todos os métodos contraceptivos utilizados, sendo consistentemente apontado como principal fator envolvido na brusca queda do crescimento populacional do país. A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde de 2006 revelou algumas mudanças no que diz respeito ao uso de métodos contraceptivos: o conhecimento de métodos anticoncepcionais manteve-se praticamente universal e ocorreu um aumento no número de métodos modernos conhecidos. Além dos já referidos (esterilização feminina, esterilização masculina, pílula, DIU, injeção contraceptiva, implantes, camisinha masculina e métodos vaginais) , em 1996, foram acrescentados a camisinha feminina e a pílula do dia seguinte. O porcentual de mulheres usando algum tipo de método anticoncepcional chegou a 80,6%, um aumento considerável quando comparado à Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde 1996.70 A prevalência por método anticoncepcional entre mulheres, neste grupo, também sofreu alteração: em 1996 a anticoncepção estava praticamente restrita à laqueadura (40% das mulheres) e à anticoncepcional oral (20,7%). Nos últimos dez anos, houve uma redução significativa no porcentual de mulheres laqueadas (29,1%) e um aumento dos demais métodos, marcadamente daqueles utilizados pelo homem – a camisinha masculina triplicou, passando de 4% para 12%, e a esterilização masculina praticamente dobrou, passando para 5,1%, insinuando uma redução nas iniquidades de gênero neste campo. Vale destacar ainda o uso de injetáveis que triplicou, passando de 1,2% para 4% das mulheres em idade fértil – MIF unidas. Também o uso das pílulas e do dispositivo intrauterino – DIU apresentou acréscimos, respectivamente, de 20,7% para 24,7%, e de 1,1% para 1,9%. De modo que é possível constatar algum avanço na cobertura das ações de atenção ao planejamento familiar, entretanto, é necessário avançar na qualificação destas ações, consolidando os direitos sexuais e os direitos reprodutivos, com atenção especial ao grupo de adolescentes, reafirmando os compromissos assumidos nas Conferências Internacionais de População e Desenvolvimento (Cairo, 1994) e da Mulher (Pequim, 1995). No que tange à informação sobre os métodos contraceptivos, vários estudos têm demonstrado que este conhecimento é praticamente universal, embora nem todas as mulheres conheçam todos os métodos ou saibam muito sobre cada um deles. A camisinha masculina e a pílula são os métodos mais citados, alcançando cifras superiores a 70%, embora a camisinha não esteja entre os mais utilizados. Desta forma, conclui-se que o aconselhamento precisa ir além da mera informação sobre os métodos. É necessário ampliar o leque de oferta, garantir a continuidade e o uso correto destes, pois embora o critério idade e número de filhos pareçam bastante liberais no que diz respeito à LT, o legislador transferiu para as equipes de saúde a responsabilidade de desencorajar a esterilização precoce, através de informação segura e adequada, e ao poder público, a obrigação de garantir a oferta de todos os métodos reversíveis ou não conforme previsto no Art. 9° da Lei 9.263/96: Art. 9º. Para o exercício do direito ao planejamento familiar, serão oferecidos todos os métodos e técnicas de concepção e contracepção cientificamente aceitas e que não coloquem em risco a vida e a saúde das pessoas, garantida a liberdade de opção (BRASIL, 1996). Para Faúndes e Hardy (1991), a dificuldade na relação médico-paciente, em especial nas questões de escolhas reprodutivas, é que o primeiro tende a agir partindo do princípio que sabe melhor que a própria pessoa o que é mais adequado para ela, acreditando que o saber médico está acima dos desejos pessoais. Neste caso, o principal problema ético é a possibilidade de o médico impor este ou aquele método, seja por ação direta, seja por omissão de informação sobre métodos que a mulher ou o homem poderiam preferir àquele que o médico recomenda ou ainda não oferecer este ou aquele método simplesmente por não estarem disponíveis nos serviços de saúde. Quem procura o planejamento familiar está em busca da satisfação de um desejo pessoal de limitar, regular 14 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV ou espaçar o número de filhos de acordo com o que considera melhor para si. À equipe de saúde, detentora de conhecimento técnico, cabe complementar e corrigir as informações para uma escolha realmente consciente e informada para a consecução deste objetivo. FINOTTIi, M. Manual de anticoncepção. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), 2015. O3. Discutir métodos anticoncepcionais não hormonais . Anticoncepção corresponde ao uso de métodos e técnicas com a finalidade de impedir que o relacionamento sexual resulte em gravidez. É recurso de Planejamento Familiar, para a constituição de prole desejada e programada de forma consciente. Classificação: • reversíveis • definitivos Os métodos reversíveis são: • comportamentais • de barreira • dispositivos intrauterinos • hormonais • de emergência Os métodos definitivos são os cirúrgicos: • esterilização cirúrgica feminina • esterilização cirúrgica masculina Eficácia de um método contraceptivo é a capacidade deste método de proteger contra a gravidez não desejada e não programada. É expressa pela taxa de falhas próprias do método, em um período de tempo, geralmente no decorrer de um ano. O escore mais utilizado para este fim é o índice de Pearl, que é assim calculado: Segurança: É o potencial de o método contraceptivo causar riscos à saúde de quem o utiliza. É avaliado pelos efeitos indesejáveis e complicações que pode provocar. Quanto maior a segurança do método, menor será a probabilidade de trazer qualquer tipo de problema à saúde de quem faz seu uso. Escolha do método: O critério mais importante para a escolha ou eleição de um método anticoncepcional é a opção feita pelo(a) usuário(a). O médico deve, sempre, privilegiar esta opção e considerá-la prioritária. Entretanto, nem sempre o método escolhido poderá ser usado, tendo em vista características clínicas evidenciadas pelo(a) usuário(a), que podem contraindicar seu uso. Assim, é tarefa primordial do médico desenvolver semiótica apropriada para avaliar se o(a) usuário(a) apresenta alguma destas condições clínicas ou afecções. Se sim, deve o médico colocar os demais métodos possíveis à disposição dapessoa interessada, explicando-lhe as suas características, modo de uso, riscos e benefícios, bem como a eficácia. Assim, possibilitará ao paciente, condições de fazer nova opção e se comprometer com ela. Os resultados do uso de qualquer método anticoncepcional, eficácia, uso correto, ausência de efeitos indesejáveis etc., são diretamente relacionados com o grau de comprometimento do usuário com a eleição do método. Critérios de elegibilidade de um método anticoncepcional: Estes são definidos pelo conjunto de características apresentadas pelo(a) candidato(a) ao uso de um determinado método e indicam se aquela pessoa pode ou não utilizá-lo. A Organização Mundial de Saúde montou um grupo de trabalho que classificou estas condições em quatro categorias, assim dispostas, conforme sua última edição do ano de 2009: • Categoria 1: o método pode ser utilizado sem qualquer restrição. • Categoria 2: o uso do método em apreço pode apresentar algum risco, habitualmente menor do que os benefícios decorrentes de seu uso. Em outras palavras, o método pode ser usado com cautela e mais precauções, especialmente com acompanhamento clínico mais rigoroso. • Categoria 3: o uso do método pode estar associado a um risco, habitualmente considerado superior aos benefícios decorrentes de seu uso. O método não é o mais apropriado para aquela pessoa, podendo, contudo, ser usado, no caso de não haver outra opção disponível ou no caso de a pessoa não aceitar qualquer alternativa, mas desde que seja bem alertada deste fato e que se submeta a uma vigilância médica muito rigorosa. Aqui estão enquadradas aquelas condições que antigamente se chamavam de contraindicações relativas para o uso do contraceptivo. • Categoria 4: o uso do método em apreço determina um risco à saúde, inaceitável. O método está contraindicado. Compreende todas aquelas situações clínicas que antigamente se chamava de contraindicações absolutas ou formais. Disposit ivos Intrauter inos: 15 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV O dispositivo intrauterino consiste em um objeto sólido de formato variável que é inserido através do colo uterino na cavidade uterina, com o objetivo de evitar a gestação. Podem ser classificados em: • Não medicados • Medicados ou de cobre • Hormonais. Existem ainda outras variedades chamadas de frameless, ou seja, sem a moldura, pois na verdade são implantados no interior da musculatura interina. As informações a seguir referir-se-ão ao Tcu380A, mais utilizado em nosso meio e mais estudado nos dias atuais. Tipos: DIUs não medicados: Ainda presente em alguns países, o dispositivo de polietileno impregnado com sulfato de bário, chamado de Alça de Lipps, é o exemplo mais comum. DIUs de cobre: O DIU T380A é o dispositivo de cobre mais eficaz disponível, de modo geral este tipo demonstra eficácia superior aos: Multiload 375 (MLCu375), Multiload 250 (MLCu250), Cobre T220 (TCu220) e Cobre T200 (TCu200). Entretanto, as diferenças em números absolutos de taxas de gravidez entre TCu380A e MLCu375 foi pequena. Os DIUs de cobre são altamente eficazes em prevenir a gravidez, o Tcu380A pode ser eficaz até 12 anos. Os números no nome do dispositivo referem-se à área de superfície em mm2 do cobre exposto na superfície endometrial. O TCu380A é o tipo de DIU preferido, quando disponível, o TCu380S, pode ser preferido em relação ao anterior, principalmente para aqueles que consideram a montagem do dispositivo no insertor difícil. O TCu380 Slimline (TCu380S) tem cobre nas bordas dos braços laterais, diferente do TCu380A, no qual o cobre está no meio dos braços. Esta modificação não melhorou a eficácia do dispositivo. Outros tipos como o Nova T e o Multiload podem ser úteis em mulheres com canal cervical estenótico, porém, alguns estudos demonstram que estes dispositivos têm menor eficácia. Outros DIUs: O frameless DIU foi desenvolvido para evitar problemas relacionados à moldura do dispositivo e ainda mantém as propriedades do DIU de cobre. Seu uso tem sido crescente em alguns países da Europa, e as nulíparas têm sido alvo da indicação principal. Este dispositivo consiste em fio de nylon inserido no miométrio fúndico com seis anéis de cobre anexos. Recentemente, os estudos demonstraram taxas de expulsão similares ao dispositivo T de cobre. O potencial de menor dor e sangramento pela ausência da moldura de plástico não foi confirmado, as taxas de remoção ainda são as mesmas para ambos tipos de DIU. Mecanismo de ação: Os DIUs têm múltiplos mecanismos de ação, o principal é a prevenção da fertilização. O DIU não medicado depende de uma reação de corpo estranho para sua ação contraceptiva, trata-se de reação inflamatória estéril que produz lesão tecidual mínima, porém suficiente para ser espermicida. O DIU de cobre consiste em um fio de prata corado com cobre. A presença de um corpo estranho e de cobre na cavidade endometrial causa mudanças bioquímicas e morfológicas no endométrio, além de produzir modificações no muco cervical. O DIU de cobre é associado à resposta inflamatória aumentada com acréscimo de citocinas citotóxicas. O cobre é responsável pelo aumento da produção de prostaglandinas e pela inibição de enzimas endometriais. Estas mudanças afetam adversamente o transporte de esperma, de modo a prevenir a fertilização. Os íons de cobre também têm um efeito direto na motilidade espermática, reduzindo a capacidade de penetração no muco cervical. A ovulação não é afetada em usuárias do cobre DIU de cobre. Indicações: Na ausência de contraindicações, o DIU pode ser considerado para qualquer mulher que esteja procurando por um método contraceptivo de confiança, reversível, independente do coito, de longo prazo. As mulheres que têm contraindicações ao estrogênio ou mulheres que amamentam podem ser boas candidatas para o uso dos DIUs. Benefícios não contraceptivos: Os estudos fornecem evidências que o uso de DIUs de cobre reduz o risco de câncer endometrial. Este efeito protetor não é bem entendido. Riscos: Perfuração uterina: É uma complicação rara da inserção do DIU. Toda as perfurações uterinas parciais ou completas ocorrem no momento de inserção do DIU. Fatores de risco para a perfuração incluem inserção pós-parto, um operador inexperiente e um útero extremamente anteversofletido ou extremamente retrovertido. Infecção: Estudos indicam que qualquer risco de infecção genital, depois do primeiro mês de uso do DIU, é pequena. Parece haver relação inversa entre o risco de infecção e o tempo desde a inserção do DIU, conforme estudos da OMS, o risco é mais alto nos primeiros 20 dias seguindo a inserção. Embora a inserção do DIU contamine a cavidade endometrial com bactérias, esta se torna estéril pouco depois. A exposição a DSTs é responsável pela ocorrência de DIP no primeiro mês de uso, e não o uso do DIU. Em usuárias assintomáticas que apresentam sinais clínicos ou culturas sugestivas de infecção por clamídia ou gonococo deve ser instituída a 16 Laís Flauzino | TUTORIA | 4°P MEDICINA UniRV antibioticoterapia sem a remoção do DIU. Por outro lado, na presença de sinais de ascensão endometrial ou tubária, deve-se instituir terapia antibiótica e retirar o DIU prontamente. A vaginose bacteriana deve ser tratada com metronidazol 500 mg, 12/12h, por sete dias, mas o DIU não precisa ser retirado. Não há evidências de que a presença do DIU modifique a prevalência desta patologia. Nos casos de endometrite simples, em que apenas sensibilidade uterina é encontrada, a introdução de doxiciclina 100 mg, 12/12h, por 14 dias é adequada. Na presença de dor, de mobilização do colo uterino, dor pélvica, alteração na contagem de leucócitos, aumento da velocidade de hemossedimentação ou massas anexiais palpáveis, a suspeita de infecção tubária e DIP deve ser acompanhada de introdução de antibioticoterapia, endovenosa ou oral dependendo da gravidade e retirada
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