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O CONFLITO DAS MALVINAS - Gen Paulo

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O CONFLITO DAS MALVINAS 
 
 
General PAULO DE QUEIROZ DUARTE 
 
O Plano de Invasão das Falklands*, elaborado pela Comissão de Trabalho, considerou a 
ocupação da capital do arquipélago, Port Staniey, mediante uma ação rápida, pela obtenção 
da surpresa estratégica e tática. Mas, a segunda não se verificou; a pequena guarnição de 
fuzileiros, alertada havia três jornadas, do que poderia acontecer, deu em resultado que as 
coisas não tivessem o desfecho planejado. Os ingleses, embora inferiores em número, na 
base de um para dez, guarneciam suas posições de combate e não foram surpreendidos. 
Entretanto, ocorreu a surpresa estratégica, pois ocupado com os problemas no Oriente 
Médio e distante do Teatro de Operações do Atlântico Sul, o Governo britânico não se deu 
conta, seriamente, do que estava acontecendo, em tempo de, prontamente, fazer frente à 
situação. Foi surpreendido pela atitude argentina. 
A OPERAÇÃO MILITAR — Fixado o dia "D" para 1 ° de abril, a força-tarefa incumbida 
da invasão e ocupação partiu de sua base de Porto Belgrano, na Baía Blanca, declarando 
oficialmente que seguiria no rumo de Montevidéu para realizar exercícios conjuntos com a 
Marinha Oriental do Uruguai, no domingo, 28 de março. 
Depois de ter navegado no rumo NE, na jornada seguinte mudou-o para SE. Enquanto 
isso acontecia, os satélites de observação dos Estados Unidos, rastreando a força-tarefa 
argentina desde seu ponto de partida, dera o alarme e, incontinenti, o Governo norte-
americano informou o Governo britânico, por intermédio de seu adido militar em Londres. 
Já não existia um só "olho" — o de Moscou — também espionando o mundo! 
Essa preciosa informação iria darão comando da pequena guarnição inglesa, em Port 
Staniey, o tempo necessário para dispor de seus meios, atento à situação. Ali, com a 
chegada do novo destacamento do Major Mike Norman que viera substituir o de 1980-81, 
comandado pelo Major Gary Noott, dobrara o efetivo disponível para tal emergência. 
A missão de ocupar as Malvinas foi atribuída á Força-Tarefa 40, sob o comando do 
Contra-Almirante Walter O. Aliara que dispunha dos seguintes componentes: 
a) A Força de Desembarque, integrada pelo Batalhão de Infantaria de Marinha 2, um 
grupamento de Comandos-anfíbios, uma seção de atiradores do Exército (do 
Regimento de Infantaria 25) e uma Reserva. 
b) Um Grupo de Transporte, com o navio de desembarque de tropas Cabo San António 
e o rompedor-de-gelo Almirante Irizar e mais o navio transporte Islã de los 
Estados. 
 
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 Esse documento recebeu a designação de "Plano Azul". 
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c) Um Grupo de Apoio, Escolta e Desembarque, formado pelas fragatas tipo 42: 
Hércules e Santíssima Trindade, mais as corvetas Drumond e Granville. 
d) Grupo de Tarefas Especiais, constituído pelo submarino, da Classe Guppy, Santa Fé. 
Os navios zarparam de suas bases no dia 28 de março, achando-se a bordo da fragata 
Santíssima Trinidad, de acordo com o CO-MIL, o Comandante do Teatro de Operações 
Malvinas, o General-de-Divisão Osvaldo Jorge Garcia. Devido às más condições meteo-
rológicas, a operação teve um retardo de 24 horas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Um carro blindado argentino diante da igreja em Port Stanley 
 
A força-tarefa foi disposta para o assalto final à última hora do dia 1° de abril. No 
cumprimento da missão, teria a força-tarefa de reduzir a resistência armada existente na ilha 
Soledad, constituída por 68 infantes de marinha, do Destacamento da Marinha Real NP 
8901, reforçados por mais alguns voluntários, mobilizados na população local. A ocupação 
de Porto Staniey, a ocupação do aeródromo para permitir o abastecimento das ilhas por 
meios aéreos próprios, e a instalação de um governo militar argentino no arquipélago. 
Antes de desencadear o "Plano Azul", o comandante da força-tarefa destacou uma 
unidade-tarefa, composta da corveta lança-mísseis P.1 Drumond e P-3 Granville ao 
encontro do navio-transporte polar Baía Paraíso que estava na área do Sul, com um 
destacamento de fuzileiros navais e helicópteros. Esses três navios reunidos passaram a 
constituir o Grupo-Tarefa destinado a invadir as Geórgias do Sul. 
As 00:30 horas do dia 2 de abril, uma sexta-feira, iniciou-se o desembarque no Porto 
Henriqueta, na Ilha Soledad (Falkland de Leste), 4km ao sul da capital, onde os comandos 
anfíbios da Armada iniciaram sua marcha sobre as barracas dos "mariners" britânicos, em 
Moody Brook. 
Três horas mais tarde fizeram o mesmo; os homens-rãs, desembarcando do submarino 
Santa Fé, nas proximidades do Cabo San Felipe, com a tarefa de tomar o farol desse lugar 
 
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e preparar o desembarque da tropa transportada no Cabo San António. Esse navio de-
sembarcou na praia York o Batalhão de Infantaria de Marinha 2 e a força do Regimento de 
Infantaria 25 que deviam tomar o aeroporto e avançar até Port Staniey, em um movimento 
de pinça, que convergia sobre a casa do Governo, desde Leste, enquanto os homens-râs o 
faziam do lado Oeste. 
A manobra foi coroada de pleno êxito, já que houve somente uma débil resistência que 
se traduziu a três baixas da força atacante*, enquanto os ingleses nada sofreram, tal como 
estabeleciam os critérios operacionais impostos pelo Comité Militar. O cessar-fogo e a 
rendição do Governador Rex Hunt realizou-se às 09:15 horas, diante do General-de-Divisâo 
Garcia. 
No restante da jornada de 2 se completou o desembarque administrativo dos meios e 
dos petrechos, incrementado por uma ponte-aérea, que se iniciou às 07:00 horas, logo que 
se concluiu a desobstrução da pista de pouso. 
Em horas da noite, havendo-se completado as fases do desembarque, assalto e 
consolidação dos objetivos do Plano de Operações, iniciou-se a fase do reembarque dos 
efetivos comprometidos, de acordo com a resolução prevista na Diretriz Estratégica. 
A guarnição militar inglesa em Port Staniey tinha o efetivo de um pelotão (33 fuzileiros 
navais), sob o comando de um major. Essa força, seguindo a rotina, era substituída 
anualmente e, na ocasião do ataque argentino, contava com o dobro, visto que o substituto, 
sob o comando do Major Gary Noott havia chegado recentemente de Londres, a bordo do 
John Biscoe. Assim, na manha de 2 de abril contava com os 68 fuzileiros, armados com 
armas portáteis (fuzis e revólveres), uma metralhadora pesada de emprego geral, foguetes 
antiblindados de ô6mm e Cari Gustav, de 84mm, de fabricação sueca. 
Após o recebimento da informação de que uma força naval argentina aproximava-se o 
Major Mike Norman, comandante do pelotão que seria substituído, por ser mais antigo e 
conhecer melhor os acidentes locais, assumiu o comando da tropa reunida (os dois pelo-
tões), em 1 ° de abril, e o Major Noott ficou como assessor militar do Governador Hunt. 
Logo foram tomadas as providências para a defesa da capital da colónia — o 1 ° GC, 
comandado pelo cabo Armour disposto na ponta Hookers e, na sua retaguarda.permaneceu 
o 2° GC, do cabo Brown, na antiga pista do aeroporto; o 3° GC, do cabo Johnson, nas proxi-
midades do rádio-farol, que foi desligado; o 4° GC, do cabo York, no estreito canal de 
acesso ao porto, dentro de um bote de assalto, inflável, (Gemini), com a missão de impedir a 
tentativa de penetração na enseada; o 5° GC, com a metralhadora, comandado pelo cabo 
Duff, postou-se ao sul do aeroporto, batendo com a arma pesada a praia e o 6° GC foi 
posicionado na colina Murray Heights, com a missão de cobrir o sul da cidade, instalando 
 
*
 As três baixas do lado argentino foram: capitão-de-corveta, um cabo e um soldado da Marinha. 
 
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um PO na colina Sapper. 
O QG funcionou na casa do Governador e o PO ao comando do Major Norman em Look 
Out Rocks. 
A pista do aeródromo situa-se em um promontório a leste da cidade de Staniey e a ela 
liga-se por um estreitoistmo, sobre o qual passa a estrada pavimentada que vai ao centro 
urbano. Obstruída a pista, por segurança, duas praias ao Norte dela foram consideradas 
prováveis locais de aterrissagem, daí ter o Major Norman sobre esses pontos a maior parte 
de seus meios; com ordem de retardar o avanço e retrair quando a pressão viesse a tornar-
se demasiadamente forte. 
O Governador Hunt determinou que não houvesse combate na cidade, para 
salvaguardar a vida de seus habitantes. 
 
 
 
 
 
 
 
 
O navio mercante Forrest, localizado em Porto William, com seu radar, foi arvorado em 
posto de vigilância, para dar o alarma antecipado da aproximação da força-tarefa argentina. 
Nas primeiras horas da sexta-feira, 2 de abril, o Forrest informou que seu radar 
contactara três grandes alvos, não identificados, ao largo de Ponta Mengary e do Cabo 
Pembrook, ao mesmo tempo que ruídos de helicópteros eram ouvidos nas proximidades do 
Porto Harriet. 
Segundo os argentinos, o primeiro desembarque deu-se no Cabo Pembroke, onde os 
homens-rãs saltaram de uma embarcação de assalto, tomaram o pequeno posto do Farol e 
prenderam o pessoal do PO. O primeiro desembarque efetivo de uma força de 150 fuzileiros 
verificou-se em Mullet Creek, constituída do 1 ° grupo-tarefa he-litransportado, cuja missão 
era neutralizar qualquer açâo defensiva dos ocupantes do quartel em Moody Brook e em 
seguida, prosseguir a fim de aprisionar o Governador. 
O 2° grupo-tarefa veio na esteira do primeiro, também transportado em helicóptero Sea 
King, tinha o efetivo de 70 homens. 
Cerca das 06:00 horas o 1° grupo-tarefa alcançou o quartel, que estava vazio, os 
 
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homens investiram para "limpá-lo", usando armas automáticas e granadas de fósforo 
branco, enquanto o 2° grupo-tarefa atacava o QG, na casa do Governador. 
Nesse local a guarda inglesa reagiu com tiros de armas portáteis, isso por volta das 
06:15 horas, sendo morto um oficial da Marinha e feridos um tenente e uma praça, também 
da Marinha. Os ingleses relatam, sem confirmação, que as baixas argentinas se elevavam a 
5 mortos e 17 feridos. 
O Tenente C.W. Trollepe e o sargento Sheppard, ingleses que estavam com o 2° GC no 
antigo campo de pouso, às 06:30 distinguiram navios ao Sul; pouco depois ouviram ruídos 
de viaturas sobre lagartas e logo puderam contar 16 VATD (veículos anfíbios de transporte 
de pessoal) armadas com metralhadoras de 12,7mm, do 1 ° Batalhão Anfíbio de Infantaria 
de Marinha galgando a encosta, vindo da Baía de York. Em presença de tal ameaça, o 2° 
GC, do cabo Brown, retirou-se, mas, enquanto recuava, o fuzileiro Gibbs deteve a viatura 
testa da coluna com um impacto de 66mm, no compartimento da guarnição, ao mesmo 
tempo que os fuzileiros Brown e Brest acertaram um tiro de 84mm na frente do blindado. As 
demais viaturas da coluna desdobraram-se para abrir fogo, mas o 2° GC continuou seu 
recuo. 
O exame da situação, procedido pelo comando inglês, levou-o a considerar duas linhas 
de ação: 
a) continuar a reação, até o último homem, que seria de curta duração; 
b) retirar-se com seus homens para o interior da ilha, onde o Governador pudesse 
estabelecer uma sede alternativa e aguardar reforços provenientes da Inglaterra. Mas o 
Governador Rex Hunt, de acordo com o prescrito na Ordenança de Poderes de Emergência 
de 1939, optou pela rendição, considerando que não adiantava o sacrifício de vidas, 
sobretudo as dos civis. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Abafada a resistência, os fuzileiros argentinos, no puro estilo de Iwo Jima, plantaram a 
sua bandeira no solo da Ilha Soledad. 
O Governador britânico declinou de tomar parte na cerimónia de rendição e de apertar a 
mão estendida do General Oswaido Garcia, feito Governador temporário e a do Almirante 
Carlos Busser, comandante do Corpo de Fuzileiros Navais, que conduziram a invasão. 
Pouco depois, em uniforme de gala, usando seu chapéu-armado de plumas brancas, 
medalhas, alamares dourados, espada à cintura, acompanhado de sua mulher o 
Governador Rex Hunt foi levado para o aeroporto, onde embarcou para o Reino Unido, via 
Montevidéu. Os fuzileiros da guarnição inglesa, pouco depois, tiveram o mesmo destino. 
Antes de seguirem para o porto, os prisioneiros militares do "Ro-yal Mariners", em fila 
indiana, ainda com a face lambuzada de graxa, como camuflagem, escoltados por fuzileiros 
argentinos, foram fotografados e suas imagens publicadas pela imprensa mundial. 
O público britânico, contemplando a imagem da pequena guarnição de mãos para o 
alto, rendida, achou ultrajante a cena; e foi essa lastimável imagem que tornou a reação 
armada a política mais aceitável. 
Dois meses e meio depois, essas mesmas cenas se repartiam; eram então os 
argentinos os prisioneiros, e os ingleses os da escolta... Só que não houve fotografia por 
aquiescência do vencedor... AS OPERAÇÕES CHEGAM AO DOMÍNIO PÚBLICO. A 
população de Buenos Aires teve ciência da operação nas Malvinas nas primeiras horas da 
manhã daquela mesma jornada de 2 de abril, por uma cadeia de rádio e TV. O povo em 
festa correu a reunir-se em frente à Casa Rosada, na Plaza de Mayo, como nos tempos do 
Vice-Reinado do Rio da Prata, aguardando um pronunciamento do Presidente General 
Leopoldo Galtieri, portando faixas e cartazes, cantando hinos. O próprio CGT que, havia 
duas jornadas, promovera manifestações contrárias ao Governo, convocou os trabalhadores 
e embandeirar a cidade e a comparecer à Plaza de Mayo. Os jornais Clarin, La Na-ción e 
outros logo esgotaram suas edições extraordinárias noticiando o grande acontecimento. 
Ás 08:00 horas começaram a aparecer em frente ao Palácio do Governo os primeiros 
manifestantes. Com o tempo confirmou-se a alvissareira notícia e logo uma verdadeira 
multidão agitada, nervosa, cantava "as Malvinas, as Malvinas têm bandeira argentina", ou 
mais agressivamente, "paredão para os ingleses e amanhã para os chilenos". 
O Povo passou a reclamar a presença do Presidente Galtieri com: 
"Presidente, o povo está presente". Alguns populares aproveitaram a oportunidade para 
ganhar alguns pesos, vendendo bandeiras, chapéus, fitas e tudo o mais que tivesse as 
cores nacionais — azul e branco. 
 
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