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Direito do Consumidor Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª M.ª Christiane Cavalcante Marcellos Revisão Textual: Maria Cecília Andreo Relação de Consumo Relação de Consumo • Introduzir o aluno no estudo do Direito do Consumidor, de modo que possa reconhecer os sujeitos e o objeto da relação de consumo. OBJETIVO DE APRENDIZADO • Introdução; • Consumidor; • Consumidor por Equiparação; • Fornecedor; • Produtos e Serviços. UNIDADE Relação de Consumo Introdução Vamos começar a estudar uma das melhores legislações do Brasil, a Lei 8078/90, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Figura 1 – Consumidor e fornecedor Fonte: Getty Images Em se tratando de Direito do Consumidor, a primeira coisa que temos que pensar é que sempre deve existir a chamada Relação de Consumo, que nada mais é que a relação exis- tente entre o consumidor e o fornecedor, que tem por objeto um produto ou um serviço. Daí extraímos os elementos da relação de consumo, que são dois: • Elementos subjetivos (sujeito da relação): consumidor e fornecedor; • Elementos objetivos (objeto da relação): produto ou serviço. Na Figura 1, por exemplo, nota-se a presença da consumidora (consumidor = ele- mento subjetivo), que se encontra no Supermercado (fornecedor = elemento subjetivo), comprando produtos do gênero alimentício (produto=elemento objetivo). Simples assim! Existe relação de consumo sem tais elementos? Não! A falta de um deles afasta a apli- cação do Código de Defesa do Consumidor. Por isso, repito, para existir um consumidor deve existir um fornecedor de produto ou serviço. Mesmo não o conhecendo, tenho certeza de que quase 100% das relações que você estabelece é de consumo. Falo isso com tranquilidade, pois a maioria das pessoas tem contrato com diversos fornecedores de serviços, como os de telefonia, TV por assina- tura, energia elétrica, além de adquirir diversos produtos, tais como os alimentícios, tecnológicos e vestuário. Olha que interessante, dos contratos que firmamos, a maioria já vem pronto, a gente aceita ou não celebra, são os chamados contratos de adesão. Experimente negociar ou mudar alguma cláusula do contrato de prestação de serviços médicos, por exemplo, com certeza você não terá sucesso. Com esse simples exemplo já dá para perceber que o consumidor é a parte mais fraca da relação, ou seja, o consumidor é vulnerável, o que justifica a proteção do Código de Defesa do Consumidor. 8 9 Sobre a vulnerabilidade do consumidor, as principais são: • Vulnerabilidade técnica: O consumidor não tem conhecimento técnico sobre o produto ou serviço; • Vulnerabilidade jurídica ou científica: O consumidor não tem conhecimento jurí- dico ou científico, também não entende de economia, contabilidade, medicina etc.; • Vulnerabilidade fática/socioeconômica: O fornecedor é quem possui o poder econômico, estando o consumidor em franca desvantagem; • Vulnerabilidade informacional: O consumidor, além de não ter conhecimento téc- nico, não tem conhecimento da qualidade da informação que é transmitida. Como se vê, para sabermos quem merece a proteção do Código, temos que saber exatamente quem é considerado consumidor. Estudaremos agora a figura do consumidor, bem como dos demais elementos da relação de consumo. • 10) Não se aplica o Código de Defesa do Consumidor à relação contra- tual entre advogados e clientes, a qual é regida pelo Estatuto da Advo- cacia e da OAB Lei n. 8.906/94. • 13) O Código de Defesa do Consumidor se aplica indistintamente às entidades abertas e fechadas de previdência complementar, consoante a Súmula 321/STJ. • 14) O Código de Defesa do Consumidor não é aplicável à relação jurídica existente entre o participante e a entidade fechada de previdência privada. (STJ, 2019) Consumidor Você sabia que o Código de Defesa do Consumidor apresenta mais de 1 (um) con- ceito de consumidor? Figura 2 – Consumidora Fonte: Getty Images 9 UNIDADE Relação de Consumo O primeiro é o chamado consumidor em sentido estrito (também chamado de pa- drão ou standard), que é aquele que concretamente adquire/utiliza produto ou contrata serviços. É o mais comum, todos nó somos consumidores em sentido estrito. Exemplo: Maria comprou uma bolsa. Os outros três são os chamados consumidores por equiparação ou equiparado. Como o próprio nome já diz, são aquelas pessoas equiparadas ao consumidor, embora não tenham efetivamente adquirido produto ou serviço. Ex.: Paulo foi ao aniversário de um amigo, be- beu vinho (comprado pelo amigo) com larva dentro, passou mal e ficou internado por mais de 20 dias. Paulo poderá processar o fabricante do vinho, com fundamento no Código de Defesa do Consumidor. Vamos analisar quem são consumidores apontados pelo Código de Defesa do Consumidor. Consumidor em Sentido Estrito – Também Chamado de Padrão ou Standard O consumidor em sentido estrito, também chamado de padrão ou standard, o próprio Código de Defesa do Consumidor tratou de conceituar, conforme o art. 2º: “Consu- midor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. Lembre-se, sempre, de que consumidor é: • A pessoa física ou jurídica; • Que adquire ou utiliza produto ou serviço; • Como destinatário final do produto ou serviço adquirido ou contratado. Sob o enfoque do consumidor pessoa física, a definição apresentada parece simples. Afinal, a pessoa física costuma ser a destinatária final do bem que adquire ou do serviço que contrata. Em regra, compramos ou contratamos para nosso próprio consumo. Mas temos que estudar com calma o “destinatário final”. Temos 2 (dois) tipos de destinatário final, o destinatário final fático e o destinatário final fático e econômico. O destinatário final fático é aquele que retira o produto do mercado de consumo quando adquire ou utiliza. Já o destinatário fático e econômico é aquele que retira do mercado de consumo o produto para seu próprio consumo ou de sua família, sem o objetivo de lucro (ele não compra para entrar na cadeia de produção ou para revender). A pergunta que se faz é, toda pessoa jurídica pode ser considerada consumidora? O Professor Rizzatto responde que: Evidentemente, se alguém adquire produto não como destinatário final, mas como intermediário do ciclo de produção, não será considerado con- sumidor. Assim, por exemplo, se uma pessoa física ou jurídica – adquire calças para revendê-las, a relação jurídica dessa transação não estará sob a égide da Lei n. 8.078/90. (RIZZATTO, 2019, p. 121) Atenção, como vimos antes, o Código de Defesa do Consumidor protege o consumidor em razão de sua vulnerabilidade. 10 11 É fácil imaginar que o consumidor pessoa física seja a parte mais fraca da relação, por isso que, em se tratando de pessoa física, a vulnerabilidade é presumida. Mas será que o mesmo acontece com o consumidor pessoa jurídica? Vou adiantar que não, em regram ela não é vulnerável, se for, tem que provar. Exemplo para facilitar o entendimento. Se você compra uma tinta para pintar a sua casa, você é consumidor. Se uma construtora compra a mesma tinta para pintar todas as unidades de um prédio, ela não é consumidora. Qual a diferença? Está claro, você é des- tinatário final do produto, a construtora, não. A construtora pinto o imóvel para vendê-lo. Se analisarmos friamente, achamos que a pessoa jurídica nunca necessitará de pro- teção; que, quando adquire produto ou contrata serviços, ela está em pé de igualdade ou até em maior vantagem com relação ao seu fornecedor. No entanto, temos de tomar muito cuidado, pois o legislador é claro ao admitir a pessoa jurídica no conceito de con- sumidor do caput do art. 2º , resta saber quando. Para melhor compreensão, vamos estudar três teorias sobre conceito de consumidor destinatário final. Teorias que Explicam o Conceito de Consumidor Inicialmente, duas teorias foram criadas pela doutrina para explicar o conceito de con- sumidor, a teoria finalista e a teoria maximalista.Posteriormente, foi criada uma terceira, chamada de teoria finalista mitigada, que seria uma intermediária das duas anteriores. Como vimos, o conceito apresentado pelo caput do art. 2º parece simples de enten- der quando o destinatário final é a pessoa física. O mesmo não ocorre quando se trata de pessoa jurídica. Antes de estudarmos cada teoria, imagine duas situações: • Um advogado compra dois computadores, um para seu uso pessoal e o outro para o seu trabalho. Os dois computadores, apesar de novos, apresentam problemas para desligar; • Joana compra farinha para fazer um bolo para seu filho. A indústria alimentícia com- pra farinha para a produção de bolos em larga escala. Agora responda, todos são consumidores? Na situação 1, é evidente que o advogado, quando comprou para seu uso pessoal, é considerado consumidor. Resta saber se o é quando ele comprou para seu escritório. O que você acha? Se você disser que não é consumidor, imagino a justificativa, ele não é o destinatário final do produto. Peço que reflita, a resposta exata será dada quando do estudo da teoria finalista mitigada (terceira teoria) Na situação 2, é evidente que Joana é consumidora, mas a pessoa jurídica, não. Ficou claro que o bem entra na cadeia de produção de bolos (não é destinatário final) e que a pessoa jurídica não é vulnerável. Não é simples saber se a pessoa jurídica é ou não consumidora quando adquire pro- dutos ou serviços, o juiz terá que analisar o caso concreto. O estudo das três teorias explica o conceito de consumidor destinatário final, em especial em se tratando da pessoa jurídica. Vamos lá. 11 UNIDADE Relação de Consumo Teoria Finalista A teoria finalista é também conhecida como subjetiva ou limitativa. Essa teoria é extre- mamente restritiva, porque considera consumidor somente o destinatário fático e econô- mico, ou seja, aquele que retira o produto ou serviço do mercado de consumo para uso próprio ou de sua família, sem qualquer finalidade econômica. Pensando assim, a pessoa jurídica e os profissionais liberais, que de modo geral não são os destinatários dos bens ou serviços, nunca seriam consumidores, o que violaria a própria lei. • 6) A determinação da qualidade de consumidor deve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista. Somente em situações excepcio- nais essa teoria pode ser mitigada, para autorizar a incidência do CDC nas hipóteses em que a parte, embora não seja a destinatária final do produto ou serviço, apresenta-se em situação de vulnerabilidade (técnica, jurídica, fática ou informacional) teoria finalista mitigada. Precedentes. • 7) Na hipótese dos autos, as instituições de ensino utilizavam o software com o escopo de implementar suas atividades comerciais, facilitando o pagamento das mensalidades pelos alunos, não existindo qualquer vulnerabilidade técnica, jurídica, fática ou informacional. (STJ, 2021) Teoria Maximalista Ao contrário, a teoria maximalista amplia o conceito de consumidor destinatário final, trazendo uma visão objetiva de consumidor. Pela Teoria Maximalista, também chamada de objetiva ou extensiva, o consumidor seria somente o destinatário fático, aquele que retira do mercado de consumo produto ou serviço, sendo indiferente a sua destinação final. Em outras palavras, para essa teoria não importa se a pessoa física ou jurídica utilizará o bem para sua atividade profissional ou não, basta que o retire do mercado de consumo, que já será considerada consumidora. Se a teoria finalista peca pelo excesso de restrição, a maximalista, como o próprio nome já diz, peca pelo excesso de amplitude. Isso porque toda pessoa jurídica seria con- siderada consumidora, o que significa dizer que teria a proteção do Código de Defesa do Consumidor. Exagerada essa proteção! O Código não quer isso, ele protege a parte vulnerável, que á mais fraca da relação de consumo. A aplicação desmedida tornaria o CDC um Código geral de consumo, sendo que o nosso Código é de proteção ao consumidor. De qualquer forma, saiba que essa teoria já foi muito utilizada por nossos Tribunais. Teoria Finalista Mitigada A teoria finalista mitigada, também chamada de atenuada, aprofundada, interme- diária, é um meio termo entre as anteriores, veio com a ideia de atenuar a concepção finalista restritiva. Teve seu nascedouro no Superior Tribunal de Justiça – STJ e tem sido a adotada atualmente. 12 13 É, sem dúvida, a teoria mais acertada, pois considera consumidor o destinatário fá- tico e econômico com um segundo elemento, a vulnerabilidade da pessoa que adquire produto ou serviço. Por essa Teoria, fica mais fácil resolver a questão da pessoa jurídica. Votando ao exem- plo do advogado (item II, situação 1), quando ele adquiriu o computador para usar em seu escritório, apesar de não ser destinatário final do produto, está presente sua a vul- nerabilidade, que deve ser provada. Importante! A relação jurídica qualificada por ser “de consumo” não se caracteriza pela presença de pessoa física ou jurídica em seus pólos, mas pela presença de uma parte vulnerável de um lado (consumidor), e de um fornecedor, de outro. Mesmo nas relações entre pessoas jurídicas, se da análise da hipótese concreta de- correr inegável vulnerabilidade entre a pessoa-jurídica consumidora e a fornecedora, deve-se aplicar o CDC na busca do equilíbrio entre as partes. Ao consagrar o critério finalista para interpretação do conceito de consumidor, a jurisprudência deste STJ também reconhece a necessidade de, em situações específicas, abrandar o rigor do critério subjetivo do conceito de consumidor, para admitir a aplicabilidade do CDC nas relações entre fornecedores e consumidores-empresários em que fique evidenciada a relação de consumo. (STJ, 2020) Detalhe importante, não existe uma regra a ser estabelecida. A análise do caso con- creto, pelo Poder Judiciário, é que vai dizer se a pessoa jurídica é ou não consumidora, segundo o critério da vulnerabilidade (teoria finalista mitigada). Um exemplo da aplicação dessa teoria pelos Tribunais é o caso do taxista quando compra o veículo para desenvol- vimento de sua atividade. Em caso de problemas com o veículo, o Poder Judiciário tem entendido que, mesmo não sendo destinatário final do veículo, merece a proteção do Código com base na teoria finalista mitigada. Em Síntese • Teoria finalista: consumidor = destinatário fático e econômico; • Teoria maximalista: consumidor = destinatário fático; • Teoria finalista atenuada: consumidor = destinatário fático + vulnerabilidade. Consumidor por Equiparação Conforme estudamos, o legislador não quis proteger somente o consumidor padrão, mas também aquele que, embora não faça parte da relação de consumo, foi por ela atingido. Imagine uma festa de casamento em que os convidados passam mal após a inges- tão de uma salada de maionese. Sabemos que o noivo contratou o buffet (consumidor em sentido estrito), sendo os convidados considerados consumidores por equiparação, vítimas de acidente de consumo (art. 17 do CDC). Veja que eles não participaram, mas foram atingidos pela relação de consumo. 13 UNIDADE Relação de Consumo Segundo o Código de Defesa do Consumidor, são consumidores por equiparação: • A coletividade de pessoas que participa da relação – parágrafo único do § 2º; • As vítimas de acidente de consumo – art. 17; e • As pessoas expostas a práticas comerciais e contratuais abusivas – art. 29. A Coletividade de Pessoas que Participa da Relação Normalmente, quando pensamos em consumidor, vem sempre a ideia do consumi- dor individual, pessoa X ou Y. Por sorte, o legislador foi mais longe, pensou também em uma coletividade de pessoas (ex.: massa falida, condomínio), ainda que indetermináveis. É que o que se verifica no parágrafo único do § 2º, “Equipara-se a consumidor a coletivi- dade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.” De acordo com Filomeno: [...] o que se tem em mira no parágrafo único do art. 2ºdo Código do Consumidor é a universalidade, conjunto de consumidores de produtos e serviços, ou mesmo grupo, classe ou categoria deles, e desde que relacio- nados a determinado produto ou serviço. Tal perspectiva é extremamente relevante e realista, porquanto é natural que se previna, por exemplo, o consumo de produtos ou serviços perigosos ou então nocivos, benefician- do-se, assim, abstratamente, as referidas universalidades e categorias de potenciais consumidores. Ou, então, se já provado o dano efetivo pelo consumo de tais produtos ou serviços, o que se pretende é conferir à uni- versalidade ou grupo de consumidores os devidos instrumentos jurídico- -processuais para que possam obter a justa e mais completa possível reparação dos responsáveis, circunstâncias essas pormenorizadamente previstas a partir do art. 8º e seguintes do Código do Consumidor, e so- bretudo pelos arts. 81 e seguintes. (FILOMENO, 2018, p. 19) As Vítimas de Acidente de Consumo Como vimos, uma pessoa pode não ter participado da relação de consumo, mas ser negativamente por ela atingida. O legislador equipara aos consumidores todas as vítimas do evento (acidente de consumo), é o chamado consumidor por equiparação bystander do Art. 17. Acidente da TAM em 2017, disponível em: https://bit.ly/2RwgS5U Assim, o dever de indenizar existe, pois o fornecedor é responsável pelos danos causados não somente ao consumidor, mas também aqueles que foram vítimas de aci- dente de consumo. Exemplo clássico, triste até mesmo de ser lembrado, foi a queda do avião da TAM em 2017. Uma verdadeira tragédia, que atingiu não somente os consumidores que esta- vam no voo, mas também pessoas que não tinham participado da relação de consumo 14 15 (ex.: taxista que estava no posto de gasolina atingido pela aeronave). Todos, passageiros ou não, merecem a proteção do Código de Defesa do Consumidor. • 12) Considera-se consumidor por equiparação (bystander), nos termos do art. 17 do CDC, o terceiro estranho à relação consumerista que experimenta prejuízos decorrentes do produto ou serviço vinculado à mencionada relação, bem como, a teor do art. 29, as pessoas deter- mináveis ou não expostas às práticas previstas nos arts. 30 a 54 do referido código. (STJ, 2019) As Pessoas Expostas as Práticas Comerciais e Contratuais Abusivas Por último, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas comerciais previstas no Código de Defesa do Consumidor, conforme o art. 29. Quem melhor explica referido artigo é o Professor Rizzatto: A leitura adequada do art. 29. permite, inclusive, uma afirmação muito simples e clara: não se trata de equiparação eventual a consumidor das pessoas que foram expostas às práticas. É mais do que isso. O que a lei diz é que, uma vez existindo qualquer prática comercial, toda a coletivi- dade de pessoas já está exposta a ela, ainda que em nenhum momento se possa identificar um único consumidor real que pretenda insurgir-se contra tal prática. (RIZZATTO, 2019, p. 132 ) Fornecedor Importante lembrar que estamos estudando os sujeitos da relação de consumos. Já fala- mos do consumidor, agora estudaremos a figura do fornecedor de produtos ou serviços. Figura 3 – Fornecedor de produtos Fonte: Getty Images 15 UNIDADE Relação de Consumo Quem é o fornecedor? A resposta está no próprio Código de Defesa do Consumidor, que assim dispõe: Art. 3°. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desen- volvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transfor- mação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produ- tos ou prestação de serviços. Nota-se, primeiramente, que o legislador optou genericamente pela palavra “forne- cedor” em vez de especificar cada tipo, como vendedor, prestador de serviços etc. Agiu bem a lei, já que fornecedor seria todo aquele que põe no mercado de consumo produtos ou serviços. Assim, todo tipo de pessoa jurídica pode ser fornecedora de produtos ou serviços, não há exclusão legal. Exige-se, no entanto, habitualidade na atividade desenvolvida e, em se tratando de serviços, exige-se também que seja prestado mediante remuneração. Theodoro Junior, citando Claudia Lima Marques, explica que: O critério, portanto, para caracterização de fornecedor é “desenvolver atividades tipicamente profissionais, como a comercialização, a produ- ção, a importação, indicando também a necessidade de uma certa habi- tualidade, como a transformação, a distribuição de produtos”. E, tratando-se de prestação de serviços, o Código exige, além da habitualida- de da atividade, ser ela desenvolvida “mediante remuneração” (§ 2º, art. 3º., do CDC). (THEODORO JUNIOR, 2017, p. 16) Vamos analisar os fornecedores referidos pelo precitado art. 3º. Fornecedor Pessoa Física Quando se pensa em fornecedor, de imediato pensamos na pessoa jurídica, mas a pessoa física também pode ser fornecedora de produtos ou serviços. Pergunta interessante: Se eu quiser vender o meu carro para você, posso ser consi- derada fornecedora e, você, consumidor? A resposta é não. Isso porque eu não vendo veículos com habitualidade, minha atividade profissional é outra. Logo, se não existe um fornecedor, você também não será considerado consumidor. No caso, trata-se de relação civil, regida pelo Código Civil. Importante! Não esqueça: para a pessoa física ser considerada fornecedora, a precisa atuar com habitualidade. Ex.: encanador, eletricista, pintor, além do profissional liberal. 16 17 Fornecedor Pessoa Jurídica – Pública ou Privada, Nacional ou Estrangeira Como dito antes, o conceito de fornecedor engloba toda pessoa jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvol- vem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. São fornecedores as pessoas jurídicas públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, com sede ou não no País, as sociedades anônimas, as por quotas de responsabilidade limitada, as sociedades civis, com ou sem fins lucrativos, as fundações, as sociedades de economia mista, as empresas públicas, as autarquias, os órgãos da Administração direta etc. (RIZZATTO, 2019, p. 134 ) Entes Despersonalizados como Fornecedor Quem são os entes despersonalizados? Antes de responder, preciso que saiba quem são os entes personalizados. Os entes personalizados são aqueles que têm personalidade jurídica, ou seja, foi de- vidamente constituída e registrada no órgão competente. A contrario sensu, entes des- personalizados são aqueles que não têm personalidade jurídica própria, já que a pessoa jurídica não foi regularmente constituída, atuam no mercado de consumo somente de fato, fornecendo produto ou serviços. O Direito também considera como ente despersonalizado a massa falida, que nada mais é que o acervo de bens e direitos da pessoa jurídica que estiver em processo de falência, representada pelo Administrador judicial. Rizzatto acrescenta que: Além disso, é de enquadrar no conceito de ente despersonalizado as cha- madas “pessoas jurídicas de fato”: aquelas que, sem constituir uma pessoa jurídica, desenvolvem, de fato, atividade industrial, comercial, de presta- ção de serviços etc. A figura do “camelô” está aí inserida. O CDC não poderia deixar de incluir tais “pessoas” pelo simples fato de que elas for- mam um bom número de fornecedores, que suprem de maneira relevante o mercado de consumo. (RIZZATTO NUNES, 2010, p. 137 ) No concurso para Defensor Público Federal, ano de 2017, Banca CESPE, uma ques- tão apresentou a seguinte afirmativa: “Aplicam-se as disposições do CDC às relações de consumo estabelecidas pela compra de produtos de camelôs, haja vista o vendedor ser considerado fornecedor”. O candidato teria de responder se estava certo ou errado, sendo dadocomo “certo” pela CESPE. Você concorda? Embora a banca do concurso tenha se posicionado, vale a pena pesquisar para melhor aprimoramento do tema. Questão do concurso para Defensor Público Federal. Disponível em: https://bit.ly/33v7XUV 17 UNIDADE Relação de Consumo Modalidade de Fornecedores Existem três modalidades de fornecedores: • Reais: são aqueles que fazem parte do processo de criação, produção e fabricação do produto; • Aparentes: apenas põem seu nome no produto; • Presumidos: é o caso do importador, que responde pelos produtos que importou. Atividades Desenvolvidas Sobre as atividades desenvolvidas, o código abre um leque gigantesco, englobando praticamente todo tido de atividade: São consideradas atividades de: • Produção (ex.: indústria alimentícia); • Montagem (ex.: montadoras de veículos); • Criação (ex.: autor de obra intelectual posta no mercado de consumo); • Construção (ex.: construtoras); • Transformação (ex.: padarias); • Importação (ex.: venda de veículos importados); • Exportação (ex.: empresa nacional que vende café no exterior); • Distribuição e comercialização (ex.: empresa de telefonia e comércio em geral); e • Prestação de serviços (ex.: hospitais, escolas, bancos). Produtos e Serviços Chegamos, por fim, ao objeto da relação de consumo: produtos ou serviços. Isso porque o fornecedor introduz no mercado de consumo produtos ou serviços. Art. 3º. [...] § 1°. Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. § 2°. Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, me- diante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. Vamos estudar melhor cada objeto. Produto como Objeto da Relação de Consumo De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, “produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial” (§ 1° do art. 3º). Embora a lei tenha se referido a produto como qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial, o conceito deve ser o mais amplo possível, englobando também bens duráveis e não duráveis, conforme o artigo 26 do Código. 18 19 Importante! Definições importantes: • Bens Móveis: São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remo- ção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico- -social (art. 82 do Código Civil); • Bens Imóveis: São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente (art. 79 do Código Civil); • Bens Materiais: Bens materiais são aqueles que têm existência física, assim é clas- sificada a maioria; • Bens Imateriais: Bens imateriais, ao contrário, não têm existência física, assim, não podemos pegar ou tocar, temos como exemplo o direito ao crédito; • Bens Duráveis: Bem durável ou produto durável é aquele que o seu uso não acar- reta sua destruição, podendo ser utilizado reiteradas vezes, como uma roupa, por exemplo. É certo que com o tempo existe o desgaste natural, mas nem por isso deixa de ser durável; • Bens não Duráveis: Não durável, por sua vez, é aquele que o uso acarreta a destruição imediata, como o combustível e os alimentos. Serviço como Objeto da Relação de Consumo Como vimos, “Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, me- diante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista” (§ 2º do art. 3º). No conceito genérico de serviços todos estão inseridos. Por cautela, o Código incluiu os serviços bancários, financeiros, de crédito e securitária. Não apenas o serviço privado, mas os serviços públicos também estão no rol de forne- cedores do artigo 3º do CDC, é caso, por exemplo, dos serviços de água e esgoto. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qual- quer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, efi- cientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos (Art. 22 do CDC). 19 UNIDADE Relação de Consumo Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Sites PROCON SP O site do PROCON SP é um instrumento muito importante para nosso estudo. Recomen- do que faça um “passeio” pelo site e descubra como funciona o espaço consumidor, o es- paço fornecedor, reclamações, perguntas frequentes. Tenho certeza de que você aprenderá bastante, de forma prazerosa e rápida. https://bit.ly/3uFtupS Vídeos Saber Direito - Responsabilidade Civil Contemporânea – Aula 1 De forma bastante didática, o programa indicado trata do tema Consumidor por Equi- paração, comentando alguns casos que foram julgados pelo Tribunal. Os casos concretos, com certeza, vão ajudá-lo na compreensão da matéria, não deixe de assistir. https://youtu.be/H4vCyFtoqxw Saber Direito – Direito do consumidor (1/5) O Professor trata da evolução histórica do Código de Defesa do Consumidor e da relação jurídica. Com a aula, você aprenderá sobre o contexto em que o Código foi criado e sua evolução, além de reforçar os estudos sobre a relação de consumo. https://youtu.be/DyvY3XgSw6o Leitura Acórdão – Julgamento Proferido pelo Tribunal Sobre a Aplicação da Teoria Finalista Mitigada Trata-se de Ação Indenizatória proposta por um taxista contra uma loja de veículos, por prejuízos advindos da compra. A loja alegou que o taxista não era consumidor, mas o Tribu- nal de Justiça de São Paulo entendeu que sim, com fundamento na teoria finalista mitigada, que entende que, embora não seja destinatário final do produto, apresenta-se em situação de vulnerabilidade. Caso simples e bastante didático. https://bit.ly/3usXAwW 20 21 Referências NUNES, R. Curso de direito do consumidor. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. (e-book) ________. O Código de Defesa do Consumidor e sua interpretação jurisprudencial. 5. ed. São Paulo: Saraiva 2015. (e-book) THEODORO JÚNIOR, H. Direitos do consumidor. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense 2017 . (e-book) 21
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