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1 Camila Carneiro Leão Cavalcanti Saúde Mental História da Psiquiatria Várias culturas primitivas utilizavam hipóteses demonológicas para explicar os transtornos psiquiátricos. Os acontecimentos inexplicáveis eram lidados com magia e misticismo, ou seja, o doente mental era divinizado ou demonizado. No início da Idade Média, os loucos eram vistos pela ordem do sagrado [ex: visões de santos | possessões]. A loucura faz com que o indivíduo não consiga se colocar no lugar do outro, causa estranhamento. Por isso, não consegue se fechar laços sociais, deixando esse indivíduo sem lugar na sociedade, excluído. Tendências da psiquiatria - Doente mental divinizado ou demonizado - Explicar as doenças mentais através da fisiologia e biologia: psicocirurgias, choque insulínico, eletrochoque. - Explicar as doenças mentais pelo viés psicológico (a partir do século XIX – início da psicologia com Freud) Reformas psiquiátricas no mundo ▪ Escola Francesa – 1ª Reforma Psiquiátrica Século XV: a identificação das doenças mentais era feita a partir de critérios socioculturais imprecisos. Século XVII: surgimento de locais para o cuidado de doentes mentais. Século XVIII: Luís XV sanciona lei que permite prender ou exterminar portadores de doenças mentais. Ainda no século XVIII, coincidindo com o período da Revolução Francesa surge e 1ª reforma psiquiátrica – igualdade, fraternidade, liberdade. A Reforma Psiquiátrica na França aboliu o caráter demoníaco da doença mental, que agora passa a ser reconhecida como uma patologia digna de cuidados médicos. A noção da doença mental se destaca com nitidez e o objetivo da psiquiatria se forma. Ato Pineliano [Philipe Pinel] Enfatizou os princípio humanitários nos cuidados médicos psiquiátricos nos hospitais que trabalhou, aprimorou a identificação de doenças mentais e formou vários médicos franceses. Os doentes psiquiátricos passaram a ser da ordem da Medicina, deixando de partir do princípio da periculosidade do louco. Dinheiro → mãe → quartel → SOLDADO Se insere o paciente na sociedade, o dando um papel social uma vez que ele se identifica como “soldado”. Você não entra na loucura, mas não diz ao paciente que ela não existe. Essa técnica evita gatilhos. 2 Camila Carneiro Leão Cavalcanti Pinel ordenou “desagrilhar” os doentes psiquiátricos. Agora, eles estavam livres dentro dos hospitais, mas continuavam internados. Como ele acreditava que a loucura era provocada pela sociedade, esses pacientes ainda continuaram internados nos hospitais psiquiátricos para funcionar como um local de proteção para eles, além de promover um melhor ambiente para o estudo de cada caso [descrição das doenças para estudar posteriormente]. - Esquirol, seu herdeiro disciplinar, incrementou as descrições detalhadas dos doentes; - J. P. Falret descreveu a loucura circular e J. Baillarger descreveu a loucura de dupla forma, o atual Transtorno Bipolar. - J. Moureau de Tours estudou a influência do haxixe na saúde mental através de seu efeito na dissociação de comportamento → foi o precursor da psicofarmacologia. - Ernest Laségue descreveu quadros delirantes de evolução crônica e a folie-à-deux (loucura a dois). ▪ Escola Alemã – 2ª Revolução psiquiátrica Aconteceu no contexto cultural romântico. Desprezava o espírito iluminista francês, enfatizava o aspecto irracional [o sentimento de contato com a natureza e os valores individuais] e considerava mais a empatia do que a razão. Enfatizava as particularidades individuais em conflito com suas pulsões irracionais, em busca do equilíbrio. Não melhoraram as condições de tratamento (caráter especulativo-teórico). Ernst von Feuchtersleben Criou o termo psicose, que foi relacionado a qualquer transtorno mental sem intenção classificatória. Além disso, concebe a doença mental de forma monista (corpo e mente não podem ser dissociados) e a reação somaticista (baseada na neuroanatomia e na neurofisiologia, exercendo a profissão em hospitais específicos – hospitais psiquiátricos). Ernst promoveu a formação de neuropsiquiatras e do ensino prático da psiquiatria, acumulando dados de várias áreas do conhecimento. - Kraepelin realizou o estudo das doenças psiquiátricas (nosologia psiquiátrica) baseada no curso natural da doença. Ele critica a mitologia cerebral por acreditar que a patologia deve ser estudada in vivo. Transtornos de pensamento Bleuler – define esquizofrenia (“mente dividida”) e identifica seus sinais fundamentais: dissociação dos processos de pensamento, ambivalência, autismo e embotamento afetivo. Kurt Schneider – identificou e especificou sintomas de primeira ordem da esquizofrenia: tipos específicos de delírios e alucinações. Freud e a Psicanálise – passagem do suporte físico ao psicológico após encontro com Charcot. Nesse ponto a fronteira rígida entre o normal e o patológico se dissolve. Rigor científico e extração das leis naturais universais para a compreensão do psiquismo. A Reforma Psiquiátrica Brasileira (RPB) – marcos históricos, conceituais e políticos Forma como foi designado o processo histórico marcado pela mudança da política de saúde mental e assistência psiquiátrica. 3 Camila Carneiro Leão Cavalcanti Acompanhou o período da ditadura militar e a construção do SUS. Na reforma brasileira aconteceu: - Descentralização do discurso médico - Demarcação da interdisciplinaridade - Rede de suporte [campo da ação territorial] - Território – conjunto de referências socioculturais e econômicas que moldam o cotidiano de determinada população O século XVII trouxe a criação de modalidades de hospitais, a saber, o hospital geral, que passou a cumprir a função de mantenedor da ordem social e política mais explícita. Para Foucault, o hospital geral foi de fundamental importância para a definição de um novo “lugar social” para o louco e a loucura na sociedade ocidental (AMARANTE, 2007). ➔ Hospital geral – HC – enfermarias – o internamento dura de 3 a 6 meses [adolescentes em crise, devido ao abuso de química e casos descompensados]. ➔ A enfermaria de psiquiatria é apenas mais uma área médica que poderia ser tratada no hospital geral. ➔ O paciente chega no hospital geral a partir da atenção básica e do ambulatório. O grupo composto pela Comunidade Terapêutica e pela Psicoterapia Institucional defendiam que o fracasso estava na gestão do próprio hospital e que a solução seria introduzir mudanças na instituição. O segundo grupo é formado pela Psiquiatria de Setor, e a Psiquiatria Preventiva defendia que o modelo hospitalar estava obsoleto e deveria ser substituído por outros serviços assistenciais, a saber, os hospitais-dia, oficinas terapêuticas e centros de saúdes mental. Existia um terceiro grupo, da Antipsiquiatria e a Psiquiatria Democrática, que colocava em questão o modelo científico psiquiátrico, assim como as instituições psiquiátricas (AMARANTE 2007). Como a Psiquiatria de Setor apontava para um trabalho externo ao manicômio, era preciso adotar formas de continuidade terapêutica após alta hospitalar. Nesse sentido, foram criados os Centros de Saúde Mental, distribuídos nos diferentes “setores” administrativos das regiões francesas. Esses serviços foram estabelecidos de acordo com a distribuição populacional das regiões, e pela primeira vez na história da assistência psiquiátrica se falou em regionalização (AMARANTE 2007). Ela propõe a ‘transversalidade’, como encontro e confronto dos papéis profissionais com o intuito de problematizar as hierarquias e hegemonia (AMARANTE, 2007). Isso tira a hierarquia e a responsabilidade da transmissão do conhecimento do psicólogo e psiquiatra. Outros profissionais da saúde estão agora envolvidos no tratamento da saúde mental, propondo hegemonia. ➔ USF (1º) – UPA (2º) – Hospital geral (3º) USF (1º) – CAPS (2º) – Hospitais psiquiátricos (3º) ➔ Alguns CAPS funcionam com acolhimento 24 horas. ➔ O CAPStem função mista, ou seja, tem a especialidade e lida com momentos de crise. Nem todos os serviços estão implantados onde deveriam. ➔ Manicômios judiciários são locais efetivos que continuam mesmo depois da reforma psiquiátrica. ➔ Moro no Espinheiro. Tenho uma crise psicótica em boa viagem. O CAPS de boa viagem é obrigado a me atender, iniciais o tratamento e entrar em contato pela rede com o CAPS da região do Espinheiro para continuar o tratamento. 4 Camila Carneiro Leão Cavalcanti Após a IIWW, surgiram as primeiras tentativas de transformar o hospital psiquiátrico (AMARANTE, 1995): - A Comunidade Terapêutica na Inglaterra; - Psiquiatria Institucional e a Psiquiatria de Setor na França; - Psiquiatria Preventiva nos EUA. No Brasil, essa transformação aconteceu no período da ditadura militar a partir do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM). 1ª Fase da Reforma Psiquiátrica Brasileira Crítica ao asilo e à mercantilização da loucura. Primeiras denúncias de violência e abandono. Em meio a um movimento de indignação pelas condições de tratamento do doente foi construída a primeira articulação entre jovens trabalhadores da saúde mental de SP, RJ, BA e MG → Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental (MTSM). Basaglia visita o Hospital Colônia de Barbacena e o compara a um campo de concentração [III Congresso Mineiro de Psiquiatria]. *Lembrar: as colônias agrícolas foram a base para a conformação Hospital Colônia. As primeiras formulações do movimento, o qual adotou o nome Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental (MTSM), baseavam-se na denúncia contra: O desrespeito aos direitos humanos dos pacientes; As condições de trabalho desfavoráveis para os profissionais de saúde mental (não havia concurso público, os trabalhadores tinham contratos ilegais – de bolsistas, por exemplo – e o ambiente interno dos hospitais era de abandono e confinamento); A mercantilização da loucura, isto é, a proliferação de hospitais psiquiátricos privados financiados pela Previdência Social. Franco Basaglia Década de 60; Psiquiatria democrática italiana; Gorizia e Trieste – dois polos da mudança; Ruptura; Lei 180 (13/05/1978) → Lei da Reforma Psiquiátrica Italiana Criticava a redução do sujeito à sua doença (institucionalização do indivíduo). Enxergava o internamento como a aniquilação da individualidade do doente e sua objetificação. Introduziu uma noção de desinstitucionalização – retirar a instituição de dentro do sujeito. - Desospitalização: alternativas de tratamento fora do ambiente de internação e reclusão. *Os pacientes eram retirados das suas instituições e levados para outros lugares. Esse procedimento mecânico promovia uma mudança, fazendo com que o paciente percebesse que ele tem outras formas de vida e leva o ser ao protagonismo da sua própria história. *A reforma italiana foi a que mais influenciou a brasileira. Franco Basaglia visitou o Hospital Psiquiátrico de Barbacena em 1979 – O Holocausto Brasileiro. 5 Camila Carneiro Leão Cavalcanti Determinantes políticos, econômicos e sociais para o abandono: Ideologia de que o louco era incapaz de viver fora do confinamento; Ausência de assistência à saúde mental fora dos hospitais; Inexistência de uma política de saúde mental nacional, suas organizações relacionadas à saúde (INAMPS e Ministério da Saúde) nem se comunicavam. 2ª Fase da Reforma Psiquiátrica Brasileira Primeiros esforços de desinstitucionalização, criação de ambulatórios e movimento pela mudança de conceitos e legislação. Dois maiores desafios: - Entrar no sistema asilar e transformá-lo; - Ampliar a oferta de atendimento em saúde mental fora dos hospitais. 1987 - I Conferência Nacional de Saúde Mental (CNSM) – favoreceu a articulação pró-reforma, apesar de ser pouco representativa e com convocação restrita. - Essas articulações levaram a MTSM a convocar o II Encontro Nacional de Trabalhadores em Saúde Mental. “Por uma sociedade sem manicômios” → lema criado pelo movimento internacional de redes alternativas. Surge o Movimento Nacional da Luta Antimanicomial (MNLA) surge para apoiar a RPB e congrega ativamente os usuários de serviços de saúde mental. É necessário a quebra do paradigmas e invalidação social e jurídica do louco. Implantação dos Centros de Apoio Psicossocial (CAPS) como alternativa aos hospitais psiquiátricos. [A experiência de Santos – mostrou que é possível substituir os hospitais psiquiátricos pelo CAPS e os leitos psiquiátricos por hospitais gerais] ➔ Os CAPS surgiram quando os leitos dos hospitais psiquiátrico foram fechados. Entretanto, a reforma psiquiátrica não foi tão efetiva, pois não foram criados CAPS ou equipes suficientes para atender esses pacientes. Os CAPS precisam ter uma estrutura para evitar as hospitalizações. Como não há estrutura suficiente, então, esses pacientes são transferidos para os hospitais para os hospitais psiquiátricos que ainda existem. 1989 Deputado Paulo Delgado – entrada no projeto de lei da reforma psiquiátrica. 3ª Fase da Reforma Psiquiátrica Brasileira Construção de uma política nacional de saúde mental. As propostas da RPB passam a fazer parte das orientações de política da saúde pública. A redemocratização do país, junto ao surgimento do SUS, permitam as ideias da RPB se desenvolverem em bases institucionais. O Ministério da Saúde criou as primeiras regulamentações para os serviços comunitários (CAPS). II CNSM – participação expressiva de usuários e familiares, que apoiam a substituição do modelo hospitalocêntrico por uma rede aberta e inovadora. 6 Camila Carneiro Leão Cavalcanti Teve início o processo de redução dos leitos psiquiátricos que não cumpriam as exigências mínimas a partir de uma fiscalização do SUS e do Ministério da Saúde. 4ª Fase da Reforma Psiquiátrica Brasileira Implantação e consolidação da Nova Política Nacional de Saúde Mental [a partir de 2001] Aprovação da Lei 10.216 que passou a regulamentar a assistência em saúde mental e realização da III Conferência Nacional de Saúde Mental (CNSM). A III CNSM foi um marco na consolidação da reforma a consolidação dos objetivos centrais que são a cidadania do louco e da rede comunitária e territorial de serviços de saúde mental. Baseado na lei e na III CNSM, o governo federal estabeleceu normas de financiamento e organização da rede de serviços comunitários por meio da portaria 335. Essa portaria definiu as diversas modalidades de CAPS, incluindo serviços destinados à população de crianças e adolescentes e aos usuários de álcool e outras drogas. Além disso, apontou o papel dos CAPS na organização da atenção psicossocial, definindo que os conceitos de rede e território e sua articulação deveriam ser centrais. 2002 – Complementação da lei 10.216 – Portaria 335 → definiu como os CAPS deveriam funcionar. Foram definidas as diversas modalidades de CAPS, incluindo serviços destinados à população de crianças e adolescentes e ao usuário de álcool e outras drogas. Além disso, apontou o papel dos CAPS na organização da atenção psicossocial no território, definindo que os conceitos de rede e território e a sua articulação deveriam ser centrais para a nova modalidade de atenção comunitária. [o paciente AD tem muito mais criticidade quando comparado com o paciente psicótico – eles precisam de clínicas diferentes] 2019 – Nota técnica → [nenhum serviço substitui mais o outro – ou seja, o hospital psiquiátrico não pode mais ser substituído] os hospitais psiquiátricos voltam; as crianças passam a poder ser hospitalizadas se o médico avaliar que é do interesse para o bem maior da criança (em espaços que não tenham contato com pacientes adultos); ECT como opção de 1ª escolha de tratamento. Premissas éticas e teóricas, pressupostos e as diretrizes gerais da RPB Direito do paciente e seu estatuto jurídico na sociedade democrática; Atenção psicossocial como caminhopara o acesso ao tratamento com qualidade e garantia da autonomia e liberdade do paciente; Construção de um novo lugar social para a loucura, o que significa o esforço de superação das concepções sociais que ainda sustentam o preconceito, estigma e a negação da autonomia possível do paciente. Isso também implica na existência de acolhimento e tratamentos capazes de sustentar os direitos e a subjetividade dos usuários que necessitam de acompanhamento mais permanente ou intensivo; O conhecimento sobre o sofrimento e tratamento, apontando a necessidade de uma construção permanente de práticas que aliviem o sofrimento e ampliem a autonomia e o protagonismo dos pacientes. Lei 10.126 e ONU – Direito dos usuários – direito ao tratamento, a ser informado, a recusar métodos terapêuticos, ao acesso as políticas sociais e ao reconhecimento de sua autonomia como sujeito de direitos; Lei 10.126: Organização da rede de serviços abertos e próximos à residência e a eliminação de características asilares ou confinamento. O Estado deve redirecionar o capital e os recursos humanos para serviços territoriais e comunitários, reservando ao hospital a função para situações de maior gravidade. 7 Camila Carneiro Leão Cavalcanti Desinstitucionalização: pacientes submetidos a formas asilares de tratamento devem ser apoiados para construir alternativas fora das instituições recebendo suporte de moradia. A garantia de vida dos asilos é um pressuposto ético da RPB. Descentralização e ampliação da rede de serviços com incorporação decisiva da atenção primária: ESF como porta de entrada através da articulação do CAPS com a atenção primária. Desenvolvimento de estratégias ativas de inclusão social por meio de ações de trabalho: cultura, educação, lazer e esporte. Principais transformações da RPB Mudança do modelo de atenção com a hegemonia da atenção psicossocial de base comunitária; Leitos psiquiátricos reduzidos e os CAPS, residências terapêuticas e centros de convivência implantados; Ampliação do acesso ao tratamento, especialmente em regiões muito desprovidas de serviços; Os municípios com menos de 15.000 habitantes deverão ter seu atendimento assegurado por meio da atenção primária ou da organização de CAPS intermunicipais, de abrangência microrregional; Desenvolvimento de diversas iniciativas de inclusão social e produção de autonomia para usuários, como projetos de geração de renda, cooperativas sociais; Desenvolvimento de um importante campo de reflexões e produção de conhecimento, o campo da atenção psicossocial, que é multidisciplinar (psiquiatria, psicologia, psicanálise e assistência intersetorial) com importante participação nas universidades e na formação de novos profissionais. CAPS – Centro de Atenção Psicossocial É um serviço de saúde aberto e comunitário do SUS ele é um lugar de referência e tratamento para pessoa que sofrem com transtornos mentais, psicoses, neuroses graves e demais quadros, cuja severidade e/ou persistência justifiquem sua permanência no dispositivo de cuidado intensivo, comunitário, personalizado e promotor de vida [trabalho – lazer etc]. O objetivo do CAPS é oferecer atendimento à população de sua área de abrangência, realizando o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários. É um serviço de atendimento de saúde mental criado para ser substitutivo às internações em hospitais psiquiátricos. Existem quatro tipos de CAPS: I (infanto-juvenil), AD (álcool e outras drogas), ADI (infanto-juvenil álcool e outras drogas) e adultos. 8 Camila Carneiro Leão Cavalcanti Os CAPS visam: ✓ Prestar atendimento em regime de atenção diária; ✓ Gerenciar os projetos terapêuticos oferecendo cuidado clínico eficiente e personalizado; ✓ Promover a inserção social dos usuários através de ações intersetoriais que envolvam educação, trabalho, esporte, cultura e lazer, montando estratégias conjuntas de enfrentamento dos problemas. Os CAPS também têm responsabilidade de organizar a rede de serviços de saúde mental de seu território; ✓ Dar suporte e supervisionar a atenção à saúde mental na rede básica, USF, PACS (Programa de Agentes Comunitários de Saúde); ✓ Regular a porta de entrada da rede de assistência em saúde mental de sua área; ✓ Coordenar junto com o gestor local as atividades de supervisão de unidades hospitalares psiquiátricas que atuem no seu território; ✓ Manter atualizada a listagem dos pacientes de sua região que utilizam medicamentos para a saúde mental. É comprovado que a chance de recaída é muito menor quando o paciente recebe terapia medicamentosa personalizada e ainda se mantém no trabalho, em atividades de lazer [promotoras de vida], entre outros → Gestão de cuidado do paciente. O CAPS deve contar, no mínimo, com os seguintes recursos físicos: ✓ Espaço próprio e adequadamente preparado para atender à sua demanda específica, sendo capazes de oferecer um ambiente continuamente estruturado [precisa ter a estruturação de uma casa]; ✓ Consultórios para atividades individuais (consultas, entrevistas, terapias); ✓ Salas para atividades em grupo; ✓ Espaço de convivência; ✓ Oficinas; ✓ Refeitórios (deve ter a capacidade de oferecer refeições de acordo com o tempo de permanência de cada paciente na unidade); ✓ Sanitários; ✓ Área externa para oficinas, recreação e esportes. Quem pode ser atendido? ✓ Pessoas com intenso sofrimento psíquico que lhes impossibilita de viver e realizar seus projetos de vida; ✓ Transtornos mentais severos e/ou persistentes; ✓ Transtornos relacionados a substâncias psicoativas (álcool e drogas); ✓ Crianças e adolescentes com transtornos mentais. Como se faz para ser atendido? Para ser atendido em um CAPS, pode-se procurar diretamente esse serviço ou ser encaminhado por qualquer serviço de saúde. A pessoa pode ir sozinha ou acompanhada, devendo procurar, preferencialmente o CAPS que atende a região onde mora. Quando chegar, deverá ser acolhida e escutada em seu sofrimento. Esse acolhimento poderá ser de diversas formas, de acordo com a organização do serviço. O objetivo nesse primeiro contato é compreender a situação, de forma mais abrangente possível, e iniciar um vínculo terapêutico e de confiança com os profissionais que lá trabalham. Estabelecer um diagnóstico é importante, mas não deverá ser o único e muito menos o principal objetivo desse momento de encontro do usuário com o serviço. 9 Camila Carneiro Leão Cavalcanti O acolhimento Consiste em reconhecer que o usuário e sua família têm demandas e expressões legítimas e fazer um aprofundamento em relação a isso. Como é o primeiro contato do indivíduo com o serviço, é o início de um relacionamento que abarcada as demandas trazidas pelo usuário e os recursos que o serviço dispõe. Logo, um dos trabalhos das equipes dos serviços é discutir este acolhimento e seus objetivos, pois, na prática cotidiana este acolhimento pode ser realizado de diferentes maneiras e por diferentes profissionais. O sofrimento psíquico não se mostra como uma entidade mórbida ou enfermidade, de apenas uma pura classificação. Ele envolve relações que se estruturam em torno da identidade e do sentimento de si mesmo ou pessoalidade nas diferentes relações que uma pessoa estabelece. Uma parte importante do sofrimento psíquico se relaciona com a impossibilidade de viver junto aos outros e de se inserir efetivamente na sociedade. O atendimento precisa ser feito em dupla, porque no CAPS todo o cuidado é feito em equipe interdisciplinar. O técnico de referência é o profissional da equipe que, independente da sua especialidade, fará a ponte entre a equipe, o paciente e o território. Ele constrói junto com o paciente o projeto terapêutico e faz os atendimentos e escutas de forma individual, além do acompanhamento das famílias. Na anamnese existe o examepsíquico, que avalia o humor, linguagem, afetividade, consciência, senso-percepção, entre outros. Essa é a etapa da “triagem”, que é uma tarefa que muitos serviços ainda se organizam em seus primeiros contatos com os usuários. Ao propiciar o acolhimento, é necessário acolher! Deve-se demonstrar um interesse genuíno, olhar nos olhos e realizar uma entrevista adequada. O contato inicial com o sujeito em sofrimento psíquico e seus familiares deve buscar o diálogo com as pessoas que estão ali e não enfatizar queixas, sintomas e diagnósticos, mas permitir a expressão e reflexão da situação. Em termos práticos, trata-se considerar que a pessoa que procura o serviço não é apenas portadora de problemas, mas capaz de se envolver com a transformação da situação. Quando se está com o paciente, é preciso ser amoral, ou seja, sua religião, time de futebol, crenças políticas, entre outros, não vão interferir no cuidado com o sujeito. RAPS - Rede de Atenção Psicossocial A Rede de Atenção Psicossocial é destinada às pessoas em sofrimento psíquico ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas no âmbito do Sistema Único de Saúde. Foi instituída pela Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011, republicada em 21 de maio de 2013 e disposta anteriormente pelo Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011. A RAPS é composto pelas Regiões de Saúde, que são espaços geográficos contínuos constituídos por agrupamentos de municípios limítrofes, delimitados a partir de identidades culturais, econômicas e sociais e de redes de comunicação e infraestrutura de transportes compartilhados, com a finalidade de integrar a organização, o planejamento e a execução de ações e serviços de saúde. Traz a noção de território para o cuidado da saúde mental. A Rede de Saúde é o conjunto de ações e serviços de saúde articulados em níveis de complexidade crescente, com a finalidade de garantir a integralidade da assistência à saúde. Fica definido que a Atenção Psicossocial é um componente mínimo obrigatório de serviços e ações que são necessários às institucionalizações das Regiões de Saúde, e estes serviços e ações são portas de entrar do usuário na Rede de Atenção à Saúde. Os objetivos das RAPS são: ✓ Ampliar o acesso à atenção psicossocial da população em geral; ✓ Promover o acesso das pessoas com transtornos mentais e com necessidades decorrentes do uso do crack, álcool e outras drogas e suas famílias aos pontos de atenção; 10 Camila Carneiro Leão Cavalcanti ✓ Garantir a articulação e integração dos pontos de atenção das redes de saúde dentro do seu território, qualificando o cuidado por meio do acolhimento, do acompanhamento contínuo e da atenção às urgências. As diretrizes das RAPS são: ✓ Respeito dos direitos humanos, garantindo a autonomia e a liberdade das pessoas; ✓ Ênfase em serviços de base territorial e comunitária, com participação e controle social dos usuários e de seus familiares; ✓ Promoção da equidade, reconhecendo os determinantes sociais da saúde; ✓ Desenvolvimento de estratégias de Redução de Danos [Em 2019, a política redução de danos foi retirada do cuidado de saúde mental e passou a ser de abstinência total. O sujeito só está apto a receber o cuidado caso passe pelo processo de abstinência] ✓ Desenvolvimento de atividades no território que favoreça a inclusão social com vistas à promoção de autonomia e ao exercício da cidadania; ✓ Desenvolvimento da lógica do cuidado para pessoas com transtornos mentais e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, tendo como eixo central a construção do projeto terapêutico singular; [No projeto terapêutico pessoal não se ressalta a doença, mas sim a saúde. São ressaltados os pontos de saúde do sujeito para que isso seja trabalhado para que o sujeito consiga refazer seus laços sociais] ✓ Garantia do acesso e da qualidade dos serviços, ofertando cuidado integral e assistência multiprofissional, sob lógica interdisciplinar; ✓ Organização dos serviços em rede de atenção à saúde regionalizada, com estabelecimento de ações intersetoriais para garantir a integridade do cuidado [intersetor = pediatria, psicóloga, psiquiatra e UBS conversando – são setores de cuidado dialogando]. ✓ Atenção humanizada e centrada nas necessidades das pessoas [projeto terapêutico pessoal]; ✓ Promoção de estratégias de educação permanente; ✓ Combate a estigmas e preconceitos do sujeito com transtorno mental [retirada da noção de incapacidade e periculosidade do louco, ou seja, dos estigmas que levam ao preconceito]; ✓ Diversificação das estratégias de cuidado. O RAPS se baseia na Psiquiatria Preventiva. ➢ Atenção Básica em Saúde Prevenção Primária – intervenção nas condições possíveis de formação da doença mental, condições etiológicas, que podem ser de origem individual e/ou do meio [“O que se pode evitar para que o sujeito caia em adoecimento psíquico?”] *Evitar o contato de qualquer fator que possa ser o gatilho de algum transtorno mental. Exemplo: transtorno mental por uso de substância psicoativa – uso de projetos sociais como meio para não deixar que a criança/jovem entre no mundo do tráfico e/ou faça uso das substâncias. Prevenção Secundária – intervenção em busca da realização do diagnóstico e tratamento precoce da doença mental [ao fazer a prevenção primária é possível diagnosticar mais rápido o sujeito, sendo hábil a realizar o tratamento precoce dessa doença mental] Prevenção Terciária – busca da readaptação do paciente à vida social após a sua melhoria. [nenhum indivíduo após um episódio de surto volta ao que era antes. Após a estabilização e a melhoria, esse indivíduo passa por uma reestruturação]. 11 Camila Carneiro Leão Cavalcanti Para o melhor manejo da saúde mental na Atenção Básica, propõe-se um trabalho compartilhado de suporte às equipes de Saúde da Família (SF) por meio do desenvolvimento do apoio matricial em saúde mental pelos profissionais dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF). O apoio matricial é um arranjo técnico-assistencial que visa à aplicação da clínica das equipes de Saúde da Família, superando a lógica de encaminhamentos indiscriminados para uma lógica de corresponsabilização entre as equipes de SF e Saúde Mental, com a construção de vínculos entre profissionais e usuários. O trabalho articulado dos profissionais da Saúde Mental com a equipe da Estratégia Saúde da Família rebela-se fundamental para o estabelecimento e o fortalecimento de vínculos entre a Atenção Estratégica (CAPS) e a Atenção Básica, possibilitando a corresponsabilidade dos casos, ampliando a capacidade resolutiva dos problemas de saúde pela equipe local e favorecendo a atenção territorializada. Uma das estratégias utilizadas foi a criação das Equipes de Consultório na Rua. Essas equipes são constituídas por profissionais que atuam de forma itinerante, ofertando ações e cuidados de saúde para a população em situação de rua, considerando suas diferentes necessidades de saúde, sendo responsabilidade dessa equipe, no âmbito da Rede de Atenção Psicossocial, ofertar cuidados em saúde mental. Outro ponto são os Centros de Convivência e Cultura, que são pontos públicos articulados às RAS, em especial à RAPS, onde são oferecidos à população em geral espaços de sociabilidade, produção e intervenção na cultura e na cidade. Um exemplo são as oficinas de geração de renda, que é um espaço que proporciona ao sujeito uma ocupação e um meio de se sustentar. Os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), vinculado à USF é constituído por profissionais de saúde de diferentes áreas de conhecimento, que atuam de maneira integrada, sendo responsável por apoiar as ESFs, as equipes de Atenção Básica e equipes da academia de saúde, atuando diretamente no apoio matricial e, quando necessário, no cuidado compartilhado com as equipes das unidades nas quais o NASF está vinculado (pode ser mais de um), incluindoo suporte ao manejo de situações relacionadas ao sofrimento ou transtorno mental e os problemas relacionados ao uso de crack, álcool e outras drogas. Atenção Psicossocial Estratégica CAPS I Atende pessoas de todas as faixas etárias que apresentam prioritariamente intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aqueles relacionados ao uso de substâncias psicoativas ou outras situações clínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida. É indicado para municípios ou regiões de saúde com população acima de 15 mil habitantes. CAPS II Atende prioritariamente pessoas em intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aqueles relacionados ao uso de substâncias psicoativas, e outras situações clínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida. Indicado para municípios ou regiões de saúde com população acima de 70 mil habitantes. CAPS III Atende prioritariamente pessoas em intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aqueles relacionados ao uso de substâncias psicoativas, e outras situações clínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida. Proporciona serviços de atenção contínua, com funcionamento 24 horas, incluindo feriados e fins de semana, ofertando retaguarda clínica e acolhimento noturno a outros serviços 12 Camila Carneiro Leão Cavalcanti de saúde mental, inclusive o CAPS AD. Indicado para municípios ou regiões de saúde com população acima de 150 mil habitantes. CAPS AD Atende pessoas de todas as faixas etárias, que apresentam intenso sofrimento psíquico decorrente do uso de crack, álcool e outras drogas. Indicado para municípios ou regiões de saúde com população acima de 70 mil habitantes. CAPS AD III Atende pessoas de todas as faixas etárias que apresentam intenso sofrimento psíquico decorrente do uso de crack e outras drogas. Proporciona serviços de atenção contínua, com funcionamento 24 horas, incluindo feriados e fins de semana, ofertando retaguarda clínica e acolhimento noturno. Indicado para municípios ou regiões de saúde com população acima de 150 mil habitantes. CAPSi Atende crianças e adolescentes que apresentam prioritariamente intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aqueles relacionados ao uso de substâncias psicoativas e outras situações cínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida. Indicado para municípios ou regiões com população acima de 70 mil habitantes. Política Nacional de Saúde Mental Infanto Juvenil A introdução sistemática da SMCA na agenda da saúde pública se inicia com a aprovação da Lei no 10.216 e com a realização da III CNSM, ambas em 2001. Em 2002, a Portaria do 336 introduziu no SUS um novo dispositivo específico para a atenção psicossocial de crianças e jovens: o Centro de Atenção Psicossocial para a Infância e Adolescência. São delimitados três períodos históricos na estruturação da Clínica da Criança: - O retardamento [único transtorno mental infantil]: compreende grande parte do século XIX. Nesse período, a possibilidade da loucura na criança não era aceita, conforme Griesinger, afirma “o eu nesta idade não está ainda formado de maneira estável para apresentar uma perversão durável e radical; assim as doenças produzem nas crianças verdadeira interrupções do desenvolvimento que atingem a inteligência em todas as suas faculdades”. A perversão possui sentido de doença psíquica, não na conotação atual de utilização. ▪ O mito fundador Em 1799, um menino com cerca de 12 anos, Victor, foi capturado no interior da França. Não falava e se movimentava como um quadrúpede. Itard, discípulo de Pinel, propôs-se a educá- lo, persuadido de que se tratava de uma criança normal, mas privada de um desenvolvimento comum devido ao isolamento extremo. A tentativa de Itard não foi um sucesso do ponto de vista de Victor, mas inaugurou uma tradição fecunda envolvendo a educação especial. - A loucura (do adulto) na criança (adultomorfismo): o segundo período começa no final da década de 1880, com as publicações dos primeiros tratados de psiquiatria infantil, calcadas na clínica e na nosologia elaboradas para o adulto. A possibilidade da existência de psicoses autísticas, diferenciadas do retardo mental, na criança, começa a criar corpo no final dessa fase. A principal diferença entre a fantasia e a psicose infantil, é que a criança tem total controle da fantasia, de como ela acontece, tem a consciência de que aquilo não é real, como entra e que também causa alegria – é egosintônico, que está em sintonia com o eu. Já a psicose infantil se apresenta como algo incontrolável, que assusta, a criança não sabe como começou ou terminou e é contrário aos afetos é egodistônico, não está em sintonia com o eu. Além disso, outro fator importante é que quanto mais velha a criança, mais complexo se torna esses acontecimentos. 13 Camila Carneiro Leão Cavalcanti História da saúde mental na infância e adolescência no Brasil Marco inicial (1903) Criação do Pavilhão Escola Bourneville no Hospício Nacional de Alienados no Rio de Janeiro em 1903 e a criação do Pavilhão Infantil no Hospital Juqueri em São Paulo no ano de 1921. Segundo a orientação da época, nessas duas unidades as crianças recebiam orientação pedagócica. A Liga Brasileira de Higiene Mental (1920 – 1940) Criada por Gustavo Riedel, tinha por objetivos: - Prevenção das doenças nervosas e mentais pela observação dos princípios da higiene geral, em especial do sistema nervoso; - Proteção e amparo no meio social aos indivíduos que saíram dos manicômios e aos deficientes mentais passíveis de internação; - Realização de um programa de Higiene Mental e Eugenética no domínio das atividades individuais, escolares, profissionais e sociais. Criação da APAE (1954) São organizações não-governamentais que surgem pelo vazio deixado pelo estado. Tinham o objetivo de atender pessoas com deficiência mental a partir da modalidade pedagógica de assistência. Atualmente apresenta outra proposta de atuação que não foca apenas na modalidade pedagógica. Inserção da psicanálise de crianças nos pais e emprego desta modalidade no tratamento (1920-1950) A psicanálise de crianças nos pais foi utilizada no contexto educacional com o intuito de melhor gerir a educação das crianças e solucionar seus problemas escolares, e o emprego deste modelo teórico como elemento complementar no tratamento de crianças com problemas emocionais atendidas em instituições dedicadas à promoção da saúde mental infantil, em sua maioria vinculadas ao meio psiquiátrico. SUS (década de 1990) O SUS foi sendo implantado como protagonismo dos municípios brasileiros, se voltando principalmente para a ampliação do acesso e a universalização do cuidado por meio do investimento na Atenção Primária. Em 1991, foi criado o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e, em 1994, o Programa de Saúde da Família (PSF), hoje denominado Estratégia da Saúde da Família. No entanto, não ocorreram ações mais globais voltadas para a saúde mental de crianças, que permaneceram, na maioria dos casos, sob cuidados da filantropia. Em relação às crianças, após promulgação do ECA, em 13 de junho de 1990, ocorreu um grande esforço para sua implementação, que ficou mais dirigido para os campos da Assistência Social e da Justiça, com grande participação de organizações não governamentais. A criação dos Conselhos dos Direitos, dos Conselhos Tutelares e de outros dispositivos preconizados na lei consumiram grande parte dos esforços despendidos pela sociedade. Em 1992, foi criado o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA). Início de uma nova era (2001-2005) Em 2001 foi aprovada no Congresso Nacional a lei 10.216 e a realização da III Conferência Nacionalde Saúde Mental com o objetivo de estabelecer diretrizes gerais para a definição de uma política da saúde mental para crianças e adolescentes no âmbito do SUS. O Estado brasileiro foi convocado à tomada de responsabilidade pelo cuidado e tratamento de crianças e adolescentes com problemas mentais e afirmou que este cuidado deveria se pautar no reconhecimento deles como sujeitos psíquicos, sendo exercido em dispositivos de base territorial e ter a inclusão social como norte ético. 14 Camila Carneiro Leão Cavalcanti Centro de Atenção Psicossocial (CAPSi) O CAPSi é um serviço de atenção diária destinado ao atendimento de crianças e adolescentes gravemente comprometidos psiquicamente. Estão incluídos nessa categoria os portadores de autismo, psicoses, neuroses graves e todos aqueles que, por sua condição psíquica, estão impossibilitados de manter ou estabelecer laços sociais. Surge com o objetivo de ampliar as possibilidades de tratamento para crianças e adolescentes, iniciando o atendimento o mais cedo possível e estabelecendo as parcerias necessárias com a rede de saúde, educação e assistência social ligadas ao cuidado da população infanto-juvenil. As psicoses da infância e o autismo infantil são condições clínicas para as quais não se conhece uma causa isolada que possa ser responsabilizada por sua ocorrência. Apesar disso, a experiência permite indicar algumas situações que favorecem as possibilidades de melhora, principalmente quando o atendimento tem início o mais cedo possível, observando-se as seguintes condições: - Manter a criança ou adolescente em seu ambiente doméstico e familiar; - As famílias como parte integrante do tratamento, quando possível [há maior dificuldade de melhora quando se trata a criança ou adolescente isoladamente] - Tratamento sempre feito com estratégias e objetivos múltiplos, preocupando-se com a atenção integral a essas crianças e adolescentes, o que envolve ações não somente no âmbito da clínica, mas também ações intersetoriais. É preciso se envolver com as questões das relações familiares, afetivas e comunitárias com justiça, educação, assistência, moradia, entre outros. - Equipes técnicas atuando sempre de forma interdisciplinar [Equipe mínima de trabalho = médicos com experiência no atendimento infantil, psicólogos, enfermeiros, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e assistentes sociais – devem ter experiência de trabalho com famílias] - A visão do tratamento como melhora importante na condição de vida do indivíduo e da sua família [obter progressos a nível de desenvolvimento e em qualquer aspecto de sua vida mental, mesmo quando não é possível trabalhar com a hipótese de remissão total do problema] - Atividades de inclusão social geral e escolar em particular como parte do projeto terapêutico individual. As atividades desenvolvidas no CAPSi são: ✓ Atendimento individual ✓ Atendimento grupal ✓ Atendimento familiar ✓ Visitas domiciliares ✓ Atividade de inserção social (privilegiando a inclusão social) ✓ Oficinas terapêuticas ✓ Atividades socioculturas e esportivas ✓ Atividades externas TRÊS PRINCIPAIS MARCOS 1) Portaria 336 de 2002 atualiza a Portaria MS/SAS no 224 (de 1992), criando o Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPSi), o 1º serviço público voltado para o cuidado em saúde mental de crianças. 2) Implantação do Fórum de Saúde Mental Infantojuvenil pela portaria 1.608 de 2004. 3) Publicação do documento Caminhos para uma Política de Saúde Mental Infantojuvenil que determinava os parâmetros para a abordagem das crianças e adolescentes. 15 Camila Carneiro Leão Cavalcanti [As atividades são iguals ao CAPS adulto, mas o CAPSi foca, principalmente, na inserção social] Caminhos para uma Política de Saúde Mental Infantojuvenil Princípios norteados pelo documento: - Reconhecimento de que a criança e o adolescente como sujeito de direito – o que implica a responsabilidade e singularidade das propostas de cuidado - Acolhimento universal - Encaminhamento implicado [procurar dentro do território o melhor encaminhamento] - Construção permanente da rede de cuidados [RAPS] - Atendimento de base territorial - Intersetorialidade na ação e cuidado
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