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Pesquisa em Educação Matemática Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Dra. Edda Curi Revisão Textual: Prof. Ms. Claudio Brites O Papel da Pesquisa na Formação e na Prática do Professor • Introdução • Professor Pesquisador e Reflexivo • O Processo Reflexivo • A Pesquisa na Formação de Professores: Meta ou Mito? · Esta Unidade tem como objetivos discutir o papel da pesquisa na formação do professor e também em sua prática. Com o material produzido, você entenderá porque essa concepção de formação via pesquisa vem sendo apontada por vários autores como a que permite melhorar a qualidade do ensino básico. OBJETIVO DE APRENDIZADO Nesta Unidade, você lerá um texto que discute a formação de professores via pesquisa, em que a o futuro professor tem acesso à pesquisa e também realiza pequenas investigações. Haverá momentos de reflexão em que você relacionará sua formação com as teorias atuais para formação de professores. O tema central da Unidade é o papel da pesquisa na formação e na prática do professor. Para seu melhor aproveitamento, faça pequenas sínteses dos itens do texto e as relacione com as ideias iniciais que você tinha sobre o assunto. Faça anotações e guarde-as para fazer as atividades de sistematização e de avaliação. Você pode ampliar seus conhecimentos lendo outros textos dos autores citados, principalmente de Schon, Carlos Marcelo Garcia e Zeichner, que focalizam temas como professor reflexivo, pesquisa da própria prática, professor pesquisador. Esses textos são facilmente encontrados na internet. Bons estudos! ORIENTAÇÕES O Papel da Pesquisa na Formação e na Prática do Professor UNIDADE O Papel da Pesquisa na Formação e na Prática do Professor Contextualização Você certamente já deve ter ouvido falar em pesquisa. Mas você sabe a diferença entre pesquisa e opinião? Veja os relatos de dois professores de Matemática e pense sobre o que realmente revela uma pesquisa. Os relatos desses dois professores indicam que foram realizadas pesquisa com os alunos? Qual dos dois relatos se aproxima mais de uma pesquisa? Depois dessa reflexão, você vai conhecer mais sobre pesquisas em educação matemática nesta Unidade. Depois de discutir com os alunos as regras de sinais das operações com números inteiros, passei uma lista de exercícios. Pela minha experiência, sei que eles têm muita dificuldade com os sinais nas operações, então dei uma lista grande de exercícios. Reforcei os exercícios de multiplicação e divisão porque sei que vão errar mais. Os resultados foram os esperados: muitos erros de sinais principalmente nas operações de multiplicação e divisão. A partir desses resultados, reforcei a lista de exercícios. Depois de discutir com os alunos as regras de sinais das operações com números inteiros, fiz uma lista de exercícios para verificar suas dificuldades. Depois que resolveram, tabulei os resultados e encontrei 90% de acertos na adição, 75% de acertos na subtração, 50% de acertos na multiplicação e na divisão. A partir desses resultados, retomei as discussões das estratégias de cálculo de multiplicação e divisão, enfatizando os sinais dos resultados para que melhorassem as aprendizagens. 6 7 Introdução Uma das finalidades da formação inicial do professor para ensinar Matemática é o desenvolvimento de conhecimentos fundamentais e basilares para o ensino dessa disciplina. Mas que conhecimentos são esses? Pense na formação que você teve até aqui e no ensino de Matemática nas escolas do ensino básico. Sua formação vai dar conta para que você seja um professor que faça seus alunos aprenderem Matemática? Que tipos de conhecimento você acha que deveria entrar em contato no curso de Licenciatura para efetivamente se formar um bom professor de Matemática? Ex pl or Hoje há um discurso que muito incomoda aqueles que são realmente educadores. Há uma tendência muito forte de os professores que ensinam Matemática, em todos os graus de ensino, colocarem a culpa pela falta de aprendizagem nos alunos. Isso acontece desde a educação infantil até os cursos stricto sensu de mestrado e doutorado. Algumas reflexões são possíveis de serem realizadas a partir dessa constatação. Será que as crianças da educação infantil não “tem base” para aprender Matemática? Onde elas deveriam construir essa “base”, no útero materno? E as crianças dos anos iniciais? E os jovens dos anos finais e do ensino médio? Será que a formação do professor hoje ainda não lhe dá pistas para proporcionar aprendizagens a seus alunos e por esse motivo ele aponta outros fatores para a falta de aprendizagem da Matemática? Por que será que a culpa é sempre do aluno? Ex pl or Em função dessa e de outras constatações, há um consenso de que a formação do professor no curso de Licenciatura em Matemática deva ser modificada. Uma proposta para essa mudança, fundamentada em estudos abordados no final do século XX, é a formação de um professor que tenha acesso a pesquisas sobre o ensino de sua área do conhecimento, mas que também faça pesquisas sobre sua própria prática. Assim, o papel da pesquisa na formação do professor tem duplo significado: por um lado, o conhecimento de pesquisas, principalmente das denominadas nucleares, permite ao futuro professor se engajar em resultados que vão embasar sua prática, desmistificando a crença de que a culpa por não aprender Matemática é do aluno; por outro, quando o futuro professor faz pesquisas, ele consegue perceber com mais clareza que seus alunos reais mostram aprendizagens, evoluem, mesmo com algumas dificuldades. 7 UNIDADE O Papel da Pesquisa na Formação e na Prática do Professor Hoje é bastante clara, nos cursos de Licenciatura, a concepção de que o professor é um produtor de conhecimentos, e não um mero receptor de informações prontas, e também que ele é investigador de sua própria prática com a finalidade de melhorá-la. Importante! Com certeza você já ouviu falar sobre professor reflexivo, professor pesquisador, pesquisa do professor, prática pedagógica reflexiva, entre outros termos semelhantes. Faça uma síntese do que você entende sobre esses conceitos e depois leia o trecho a seguir, que discorre sobre eles. Trocando ideias... Professor Pesquisador e Reflexivo Neste item, vamos discutir o significado dos conceitos de professor pesquisador, pesquisa do professor, professor reflexivo e prática pedagógica reflexiva. Schön (2000) nos remete ao conceito de professor reflexivo. Para o autor, a reflexão do professor ocorre durante a ação e após a ação. Mas há uma reflexão anterior que corresponde aos estudos prévios sobre o que, como e porque ensinar tal conteúdo, e envolve formulação de hipóteses sobre as aprendizagens e dificuldades dos alunos, busca de recursos didáticos e planejamento. A reflexão na ação desenvolve-se quando o professor analisa o que está acontecendo na implementação de sua proposta didática. Nesse processo, o professor reformula suas ações, testa novas hipóteses. Por fim, o professor realiza uma reflexão sobre a ação, em que analisa as ações desenvolvidas, tentando compreendê-las e avaliar sua prática no sentido de modificá-la, ou não, e no de planejar outras ações. A prática pedagógica reflexiva é definida pelo autor como a análise contínua que o professor faz da própria prática, em função do seu conhecimento sobre ela e também de suas dúvidas. A reflexão do professor sobre sua própria prática pode ser considerada como o início do processo de compreensão e de melhoria do ensino. A pesquisa do professor pode ser relacionada com a prática e a reflexão sobre a prática. O professor é um profissional que deve ter a capacidade de equacionar e resolver problemas dessa prática, e isso só é possível se ele reflete sobre ela. Consideramos o professor pesquisador como aquele que explicita os problemas que emergem de sua prática, e os toma como foco de sua pesquisa, buscando soluções com a finalidade de implementar mudançasconcretas na sala de aula. A pesquisa na formação do professor exerce dois papéis fundamentais: de um lado o conhecimento de pes- quisas já existentes sobre o ensino e aprendizagem de matemática; de outro, o exercício da pesquisa por parte do professor. 8 9 A pesquisa revela o caráter sistemático da reflexão e se apoia em contribuições teóricas que permitem ultrapassar soluções baseadas apenas no senso comum. Garcia (2009) afirma que a pesquisa do professor tem caráter instrumental e utilitário. Segundo o autor, o tema se refere às inquietações do professor no exercício da profissão, na própria prática e na ação docente. Os objetivos das pesquisas de professores se referem à compreensão do ensino, das dificuldades de aprendizagem de seus alunos e do conhecimento da realidade, buscando a transformação das práticas pedagógicas e do ensino. Os relatos desse tipo de pesquisa consistem em textos descritivos que discutem o desenvolvimento de processos ou produtos educacionais como propostas curriculares, planos de ensino, sequências didáticas, recursos pedagógicos e tecnológicos, entre outros elementos que podem produzir impacto na prática. A formação do professor pesquisador nos cursos de Licenciatura permite que ele se envolva em todas as etapas da pesquisa, com o uso de um referencial com informações teóricas e indicações para estudos apropriados, a organização e validação de uma situação didática, proporcionando segurança e racionalização no processo. Vários autores discutem esse assunto, entre eles Contreras (1994), que apresenta uma retomada histórica da evolução do papel da pesquisa na formação do professor. A Concepção de Professor como Pesquisador: Uma Retomada Histórica Contreras (1994) estuda a concepção do professor como investigador e produtor de conhecimentos sobre a sua prática pedagógica, com o objetivo de melhorá-la. Ele considera que essa concepção veio se transformando ao longo dos anos. Os primeiros indícios dessa visão, segundo o autor, surgiram nos anos 40 com a proposição de pesquisa-ação realizada por Kurt Zadek Lewin (1890-1947), um sociólogo norte-americano de origem alemã que fazia oposição a pesquisas teóricas Dr. José Contreras Domingo Titular de Universidade Universitat de Barcelona Departament de Didàctica i Organització Educativa Facultat de Formació del Professorat Passeig de la Vall d´Hebrón, 171 08035 Barcelona (España) Dessa forma, consideramos tam- bém o professor pesquisador como um professor reflexivo, que pon- dera sobre sua própria pedagógica e busca compreender e enfrentar os desafios do trabalho docente. 9 http://www.ub.edu/ http://www.ub.edu/doe/ UNIDADE O Papel da Pesquisa na Formação e na Prática do Professor estritamente acadêmicas, mas que não relacionavam conhecimento científico e ação social. O autor define a pesquisa-ação como um processo cíclico de exploração, atuação e valorização dos resultados. Essa concepção, segundo Contreras, se modificou a partir da década de 70 com os estudos de Lawrence Stenhouse e John Elliott. É impossível falar em professor-pesquisador sem citar o nome de Lawrence Stenhouse. Nasceu em 1926, em Manchester, Inglaterra, e faleceu em 1982. John Elliot, professor emérito no Centro de Pesquisas Aplicadas em Educação (CARE), junto à Universidade East Anglia, no Reino Unido. Stenhouse (1993) dedicou-se ao estudo do currículo escolar. Para ele, um currículo de boa qualidade depende da capacidade de os professores desenvolverem uma postura investigativa, analisando suas próprias práticas de forma crítica. Ele considera a sala de aula como um laboratório, com uma comunidade científica composta por professores. Elliott (1998) destaca a importância da dimensão da pesquisa-ação como uma das maneiras de produzir conhecimentos sobre os problemas profissionais, com a finalidade de melhorar uma situação da prática, de si mesmo e da sociedade. Para esses autores, a pesquisa-ação significa uma técnica de investigação que permite mudanças. Há um consenso nas opiniões dos autores, de que o valor das ideias educativas se traduz quando há intenção de usá-las nas práticas. Segundo os autores, essa intenção ganha significado quando professores investigam com suas práticas e com as ideias com as quais tentam guiar-se. Contreras afirma que, na década de 80, as mudanças na concepção de pesquisa- ação são decorrentes dos estudos de Carr e Kemmis (1988). Wilfred Carr e Stephen Kemmis (1988), pesquisadores da Universidade de Deakin, na Austrália, tentam recontextualizar o que compreendem por pesquisa- ação. Consideram que essa concepção não pode ser entendida como um processo de transformação das práticas individuais de professores, mas como um processo de intercambio social que se desenvolve coletivamente. É possível perceber a evolução do conceito de pesquisa-ação quando esses autores comentam sobre a passagem de um processo individual de pesquisa da prática para um processo coletivo, dialogado, refletido em conjunto. Figura 01 Fonte: fundacionluminis.org.ar Figura 02 Fonte: namespedia.com 10 11 Você consegue delinear algumas características da pesquisa-ação? Veja algumas delas no item a seguir.Ex pl or Características da pesquisa-ação A pesquisa-ação se apresenta como uma metodologia de pesquisa orientada para mudanças educativas. Bausela (2004), com base em Carr e Kemmis (1988), destaca algumas características da pesquisa ação: ela se constrói desde a prática e para a prática; permite melhorar a prática a partir de sua transformação, ao mesmo tempo em que se procura compreendê-la; demanda participação do professor na melhoria de suas próprias práticas; exige uma atuação grupal para que os sujeitos implicados colaborem cordialmente em todas as fases do processo de investigação; implica em análises críticas das situações; e se configura como uma espiral de ciclos de planejamento, ação, observação e reflexão. A essas características Bausela acrescenta que a pesquisa-ação não pode ser reduzida à aula porque a prática docente também não está reduzida à essa. Comenta ainda que a pesquisa nos leva a mudar a forma de entender a prática, discutindo que aquilo que questionamos, que nos parece natural ou inevitável, nossas possibilidades e responsabilidades, levam-nos a nos sentir comprometidos e nos transformar. Considera que é uma forma pela qual os professores podem reconstituir seu conhecimento profissional como parte da constituição de seus discursos públicos unidos à prática, seus problemas e necessidades. Comenta que não pode ser nunca uma tarefa individual e que, pelo contrário, deve ser um trabalho cooperativo. Termina afirmando que qualquer tarefa de investigação requer um contexto social de intercâmbio, discussão e constatação, pois é esse tipo de contexto que possibilita a elaboração e a reconstrução do conhecimento profissional não individual, mas com diálogo com outras vozes e outros conhecimentos. Para adotar tal conduta, é preciso de condições de trabalho que possibilitem o desenvolvimento dessa postura investigativa, de colaboração com os colegas. É uma tarefa que demanda tempo, que se consome com a discussão com os colegas, o planejamento conjunto de tarefas, a coleta de informações, suas análises. A pesquisa ação é um processo que segue uma evolução sistemática e muda tanto o investigador como as situações em que atua. Algumas vantagens da pesquisa-ação são o aumento da autoestima do professor, a diminuição do isolamento profissional e o reforço da motivação profissional. A investigação permite formar um professor mais reflexivo. Faça uma síntese das características da pesquisa-ação e procure refletir sobre os conhecimentos prévios do assunto que você elencou antes da leitura deste item. Pense sobre sua formação e em quais aspectos dela permitem a você fazer reflexões sobre o ensino e a aprendizagem em Matemática. Ex pl or 11 UNIDADE O Papel da Pesquisa na Formação e na Práticado Professor O Processo Reflexivo Ainda na década de 80, um estudo importante é o de Schon (2000), que discute a concepção de professor reflexivo. Donald Schön foi um pedagogo estadunidense que estudou sobre a reflexão na educação. Foi professor no Instituto de Tecnologia de Massachusetts de 1968 até sua morte. Nasceu em 19 de setembro de 1930, em Boston, Massachusetts, EUA, e faleceu em 13 de setembro de 1997. Schön (2000) enfatiza três ideias no que se refere ao processo reflexivo: a reflexão na ação, a reflexão sobre a ação e a reflexão sobre a reflexão na ação. O autor destaca que o professor reflete sobre sua ação enquanto está desenvolvendo-a, reflete também sobre ela depois da ação desenvolvida e, por último, reflete sobre sua própria reflexão sobre a reflexão da ação desenvolvida. O autor revela que o professor reflete sozinho sobre questões de ensino. Contrapondo-se à ideia do processo reflexivo individual destacado por Schon, Zeichner (2000) defende a ideia de um processo reflexivo ser coletivo, ainda nos anos 90, ele discute e ideia de o professor refletir junto a colegas sobre suas ações e sua prática. Segundo esse autor, a reflexão deve ocorrer coletivamente, em ambiente de colaboração e de cooperação. De acordo com o autor, numa sociedade desigual, os formadores de professores precisam não apenas prestar atenção em assuntos sociais e políticos nos cursos de formação docente, mas torná-los pontos centrais do currículo. Kenneth Zeichner é professor titular do Departamento de Currículo e Ensino da Universidade do Estado de Wisconsin, Madison, EUA. Desenvolve trabalhos de pesquisa e ensino na área de formação docente, desenvolvimento profissional de professores e pesquisa- ação. É autor de vários livros – muitos traduzidos para diferentes línguas, inclusive o português –, capítulos de livros e artigos publicados em periódicos internacionais e dos Estados Unidos. Até aqui, a leitura do texto aponta para a evolução do conceito de pesquisa ação, um tipo de pesquisa interessante no que se refere à formação do professor, principalmente nos aspectos práticos. Destaque às mudanças ocorridas nesse conceito nas décadas de 80 e 90. Ex pl or Figura 03 Fonte: unicamp.br Figura 04 Fonte: Wikimedia Commons 12 https://www.google.de/search?biw=1920&bih=979&q=boston&stick=H4sIAAAAAAAAAGOovnz8BQMDgz4HnxCnfq6-gUlWSkm5EgeIaZhcEa8llp1spV-Qml-Qkwqkiorz86yS8ovy1h0tuTLHfPPi3kXv2w496GD8OtOlEQDa6RUZTAAAAA&sa=X&sqi=2&ved=0CJ8BEJsTKAEwE2oVChMI7tn0nOeRxgIVjeCACh08xgBV https://www.google.de/search?biw=1920&bih=979&q=boston&stick=H4sIAAAAAAAAAGOovnz8BQMDgz4HnxCnfq6-gUlWSkm5EgeIaZhcEa8llp1spV-Qml-Qkwqkiorz86yS8ovy1h0tuTLHfPPi3kXv2w496GD8OtOlEQDa6RUZTAAAAA&sa=X&sqi=2&ved=0CJ8BEJsTKAEwE2oVChMI7tn0nOeRxgIVjeCACh08xgBV 13 Importante! Acreditamos que, com a leitura até aqui, foi possível observar que existem diversas concepções e perspectivas a respeito da natureza e do papel da pesquisa em educação. A proposição da pesquisa-ação colocou novas perspectivas no campo da formação docente, tanto inicial como continuada. Esse novo olhar permite que se compreenda que a atuação do professor exige interrogações e questionamentos constantes, a identificação de problemas e a busca de soluções para os problemas identificados, delineando o papel da pesquisa na formação do professor. Em Síntese Pesquisa de professores Importante! Você sabia que o professor teoriza a respeito de suas práticas, suas angústias, problemas e resultados? Continue a leitura do texto, ele permitirá ampliar seus conhecimentos sobre o assunto. Você Sabia? Para Zeichner (1998), os professores estão sempre a teorizar, à medida que são confrontados com os vários problemas pedagógicos, tais como a diferença entre as suas expectativas e os resultados. Muitas vezes eles não conseguem discorrer sobre suas teorizações. As observações pessoais de um professor sobre a razão pelas quais uma determinada tarefa ocorreu melhor ou pior do que o esperado não deixam de ser uma teoria, assim como aquelas geradas nas universidades sobre o desenvolvimento daquele tipo de tarefa – na verdade, ambas precisam ser avaliadas quanto à sua qualidade, mas ambas são teorias sobre a realização de objetivos educacionais e, na maioria dos casos, funcionam bem quando dialogam. No entanto, a natureza e a especificidade das pesquisas realizadas por professores podem parecer estranhas para os pesquisadores que trabalham no âmbito das pesquisas acadêmicas. Cochran-Smith e Lytle afirmaram que, na maioria dos estudos, os professores são objeto de investigação dos pesquisadores e espera-se que sejam consumidores e implementadores de resultados de pesquisas. As autoras comentam que é preciso dar a voz aos próprios professores, refletir sobre as questões que eles colocam, os quadros referenciais interpretativos que eles usam para compreender e melhorar sua própria prática de sala de aula. Revelam que deveriam ser pesquisadores de sua própria prática acima de tudo. A pesquisa da própria prática é essencialmente uma pesquisa de professores. Para os professores em formação, ela permite engajarem-se na análise de suas experiências de ensino de modo que tais análises possam tornar-se base para o 13 UNIDADE O Papel da Pesquisa na Formação e na Prática do Professor aprofundamento e para a expansão de seu conhecimento. Zeichner (2009) afirma que a pesquisa da própria prática nos cursos de Licenciatura permite o início da construção de um compromisso autêntico dos professores em formação com as mudanças em sua prática de sala de aula. Importante! Você sabe o que diz a legislação dos cursos de Licenciatura sobre a pesquisa? Você conhece essa legislação? Após fazer uma reflexão sobre essas questões, leia o próximo item que vai abordar esse assunto. Você Sabia? A Pesquisa na Formação de Professores: Meta ou Mito? A Proposta para Formação de Professores da Educação Básica em nível Superior elaborada pelo Conselho Nacional de Educação em 2001 inclui a pesquisa como foco essencial na formação do professor. Destaca a importância da reflexão do professor e o domínio de procedimentos de pesquisa científica com registros e sistematizações de informações, análise e socialização de resultados. O documento enfatiza que, no processo de formação do professor, a pesquisa é um instrumento de ensino e um conteúdo de aprendizagem, importante para a análise de situações reais da escola, para a construção de conhecimentos que ela demanda e compreensão da tarefa de educar. Muitas vezes, ao ler uma pesquisa desenvolvida por um pesquisador acadêmico, o professor costuma achar que os dados apresentados não se adequam a seus alunos, que os alunos pesquisados não têm o mesmo perfil dos seus e que com seus alunos os resultados seriam diferentes. Quando o documento aborda a pesquisa como instrumento de ensino, considera as pesquisas já realizadas e divulgadas; quando discorre sobre a pesquisa como um conteúdo de aprendizagem, considera que o futuro professor vai aprender a fazer pesquisa com seus alunos, desmistificando a ideia de que a pesquisa desenvolvida por acadêmicos não se adequa a alunos reais. Ao destacar a pesquisa como conteúdo de aprendizagem, o documento revela que o professor precisa ter noções básicas dos procedimentos de pesquisa usados nas diferentes ciências, e não ser um mero reprodutor de tarefas. O texto oficial indica ainda que as pesquisas dos futuros professores poderão ser realizadas no interior de componentes curriculares, de seminários ou de outras práticas educativas. Importante! Como podemos perceber, a prática de pesquisa é introduzida nesse documento como um dos elementos curriculares na formação pedagógica do professor. Em Síntese 14 15 No texto legal, é possível identificar algumas noções bastante difundidas no Brasil e já estudadas neste texto – como as de prático reflexivo, de Donald Schön (2000), ou a de professor pesquisador da própria prática, de Keneth Zeichner(2000) –, essas ideias pressupõem reconhecer o professor como protagonista de sua profissão e não como mero executor de planos curriculares. No entanto, os diferentes discursos produzidos nos variados contextos curriculares são recontextualizados, muitas vezes provocando o esvaziamento do sentido original dos conceitos que, supostamente, “inspiram” os textos oficiais. No entanto, há uma parte do documento que deixa dúvidas em relação ao foco dado à pesquisa, quando o mesmo afirma que a pesquisa desenvolvida no âmbito do trabalho do professor não pode ser confundida com a pesquisa acadêmica ou pesquisa científica. O documento aponta que a pesquisa na formação do professor refere-se a uma atitude cotidiana de busca de compreensão dos processos de aprendizagem do desenvolvimento dos alunos, da interpretação da realidade e dos conhecimentos que constituem seus objetos de ensino. Esse trecho pode indicar que o documento oficial faz uma separação entre a pesquisa acadêmica e a pesquisa do professor, contrariando estudos do próprio Zeichner. Cabe destacar que ainda são poucos os professores de educação básica no Brasil que se dedicam à pesquisa (LÜDKE, 2012). Essas poucas pesquisas se vinculam, em sua maioria, a projetos individuais de pós-graduação. Esses mesmos pesquisadores nos informam sobre o crescente interesse de professores em participar de eventos científicos universitários, trazendo, para o debate acadêmico, o resultado de suas investigações e experiências em escolas básicas. Explore o texto de Ludke, você vai saber mais sobre o assunto discutido nesta Unidade.Exp lo r Assim, é possível concluir que a inclusão da pesquisa nos currículos de Licenciatura deve ser perseguida como uma meta para melhorar a qualidade da educação, senão permanecerá como um mito, originalmente produzido no interior dos discursos acadêmicos. Um tipo de pesquisa que o aluno do curso de Licenciatura pode fazer é a pesquisa da própria prática nos momentos que faz estágios. Na Unidade IV, discutiremos a natureza e as características da pesquisa da própria prática. Importante! Neste texto foram discutidas as ideias de pesquisa-ação, pesquisa da própria prática, professor reflexivo e sobre o papel da pesquisa na formação do professor. Faça uma síntese das ideias-chave discutidas no texto Em Síntese 15 UNIDADE O Papel da Pesquisa na Formação e na Prática do Professor Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Cartografias do trabalho docente: professor (a) pesquisador (a) GERALDI, C.; FIORENTINI, D.; PEREIRA, E. M. de A. denominado Cartografias do trabalho docente: professor (a) pesquisador (a), da Editora Mercado de Letras, publicado em 1998. Esse livro traz vários textos sobre a pesquisa na formação de professores. Leitura Desafios para a pesquisa em formação de professores O artigo complementa o texto teórico de referência da Unidade. Apresenta resultados de um programa de pesquisas sobre a formação de professores da educação básica, focalizando o papel da pesquisa nessa formação e na prática do professor. Ressalta a importância da dimensão da pesquisa para a formação do professor. www2.pucpr.br/reol/index.php/dialogo?dd99=pdf&dd1=7195 Pesquisar E Transformar A Prática Educativa: Mudando As Perguntas Da Formação De Professores Entrevista com KENNETH M. ZEICHNER para a revista da Puc-SP. http://revistas.pucsp.br/index.php/curriculum/article/viewFile/21405/15931 Investigação em Educação Matemática: percursos teóricos e metodológicos Leitura de um texto que discute a Ética na pesquisa. O texto é do livro de autoria de FIORENTINI e LORENZATO denominado Investigação em Educação Matemática: percursos teóricos e metodológicos, 3ª Edição revisada editada pela Autores Associados, 2009. Tem o título: Ética na pesquisa educacional: implicações para a educação matemática. https://www.fe.unicamp.br/ensino/sec_pesquisa/docs/Fiorentini_Lorenzato_EticaPesq.pdf 16 17 Referências BAUSELA, E. La docencia a través de la investigación-acción. Revista Iberoamericana de Educación, 2004, p.1-10. Disponível em: <http://www. rieoei.org/deloslectores/682Bausela.PDF> Acesso, junho 2015. BRASIL. MEC/CNE. Proposta de diretrizes para a formação inicial de professores da educação básica, em cursos de nível superior. Brasília, 2001. COCHRAN-SMITH, M.; LYTLE, S. L. Inside/Outside: teacher research and knowledge. New York: Teachers College Press, 1993. CONTRERAS, J.D. La investigación en la acción. Tema del mes. Cuadernos de Pedagogia, v. 224, p. 7-19, abr. 1994. ELLIOTT, J. Recolocando a pesquisa-ação em seu lugar original e próprio. In: GERALDI, C.; FIORENTINI, D.; PEREIRA, E. M. de A. (Org.). Cartografias do trabalho docente: professor (a) pesquisador (a). Campinas: Mercado de Letras, 1998. GARCIA, C. M. Desenvolvimento Profissional: passado e futuro. Sísifo – Revista das Ciências da Educação, n. 8, p. 7-22, jan./abr. 2009. KEMMIS, S; CARR, W. Teoria crítica de la enseñanza, Ed. Martinez Roca, Barcelona, 1988. LUDKE, M. Desafios para a pesquisa em formação de professores. In Diálogo Educação, Curitiba, v. 12, n. 37, p. 629-646, set./dez. 2012. STENHOUSE, Lawrence. La investigación como base de la enseñanza. 2. ed. Madrid: Morata, 1993. SCHÖN, D A. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000. ZEICHNER, K. Para além da divisão entre professor e professor pesquisador. In: GERALDI, C.; FIORENTINI, D.; PEREIRA, E. M. de A. (Org.). Cartografias do trabalho docente: professor (a) pesquisador (a). Campinas: Mercado de Letras, 1998. __________. Uma agenda de pesquisa para a formação docente. Formação Docente, v. 1, n. 1, p. 13-40, ago./dez. 2009. 17 http://www.rieoei.org/deloslectores/682Bausela.PDF http://www.rieoei.org/deloslectores/682Bausela.PDF
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