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Prévia do material em texto

2010
Literatura Portuguesa
Prof. Célio Antonio Sardagna
Copyright © UNIASSELVI 2010
Elaboração:
Prof. Célio Antonio Sardagna
Revisão, Diagramação e Produção:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri 
UNIASSELVI – Indaial.
Impresso por:
 869
S244l Sardagna, Célio Antonio.
 Literatura Portuguesa/ Célio Antonio Sardagna
 Centro Universitário Leonardo da Vinci – Indaial, Grupo 
UNIASSELVI, 2010.x ; 266 p.: il
 Inclui bibliografia.
 ISBN 978-85-7830-350-1
 1. Literatura Portuguesa 2. Brasil - Literatura 
 I.Centro Universitário Leonardo da Vinci II. Núcleo de 
Ensino a Distância III. Título
 
III
aPresentação
Como proposta de reflexão, leitura e estudo, apresentamos o caderno 
da disciplina de Literatura Portuguesa, objetivando o conhecimento das 
principais manifestações literárias portuguesas, tanto da lírica quanto da 
prosa, bem como os textos mais representativos, que vão do período medieval 
à contemporaneidade.
Num momento inicial (Primeira Unidade), nossa atenção se 
concentrará na visão geral acerca da literatura, no estudo das primeiras 
manifestações literárias de Portugal (Trovadorismo), com suas cantigas e 
novelas, e no Humanismo Português, principalmente o teatro de Gil Vicente.
Na sequência (Segunda Unidade), analisaremos a importância do 
Classicismo, do Barroco e do Arcadismo lusitanos, centrando a atenção em 
Camões – épico e lírico –, em Padre Vieira e em Bocage, por considerá-los 
colunas mestras na composição da literatura portuguesa dentro dos períodos 
a que pertencem.
 
Na última parte (Terceira Unidade), o olhar se volta para os períodos 
romântico, realista, moderno e para a contemporaneidade. Num primeiro 
momento, nesta unidade, as principais linhas de força se concentram nas 
manifestações literárias do século XIX, desenhadas pelo Romantismo, 
Realismo e Simbolismo. A parte final desta unidade terá como filão as 
manifestações literárias do século XX, ou seja, o período moderno e 
contemporâneo da Literatura Portuguesa. Nesta parte, as lentes voltar-se-ão 
especialmente às personalidades de Fernando Pessoa e José Saramago.
Na composição deste material, pensando em você, caro/a acadêmico/a 
de Ensino a Distância, optamos por uma metodologia que possa facilitar 
o autoestudo. Assim, inicialmente, enfocar-se-á historiograficamente e 
criticamente cada período literário, a fim de que você possa ter uma melhor 
compreensão de cada um dos períodos formativos da Literatura Portuguesa. 
Dentro de cada tópico, ainda, analisar-se-ão textos representativos de cada 
escola literária, com vistas a que se conheçam os textos literários dos autores 
mais expressivos, com os quais é possível trabalhar na sala de aula.
Há que se ressaltar que o estudo da Literatura Portuguesa não pode 
se limitar à pura leitura deste caderno. Você deveria, sim, ir além, ou seja, 
procurar outras obras e leituras críticas nas bibliotecas, na internet, assistir a 
filmes alusivos aos diferentes períodos etc. Enfim, colocamos em você nossas 
melhores apostas, confiamos na sua dedicação, cremos que você se valerá 
deste material da melhor maneira possível para a sua reflexão. Mãos à obra...
Prof. Célio Antonio Sardagna
IV
Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto 
para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há 
novidades em nosso material.
Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é 
o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um 
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. 
O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova 
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também 
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.
Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, 
apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade 
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. 
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para 
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto 
em questão. 
Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas 
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa 
continuar seus estudos com um material de qualidade.
Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de 
Desempenho de Estudantes – ENADE. 
 
Bons estudos!
NOTA
V
VI
VII
UNIDADE 1 – LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO 
PERÍODO MEDIEVAL ................................................................................................ 1
TÓPICO 1 – A FORMAÇÃO DA LITERATURA PORTUGUESA ................................................. 3
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3
2 LITERATURA: A ESTÉTICA, A ESCRITURA E A IMAGEM ..................................................... 4
3 O MUNDO MEDIEVAL E A PENÍNSULA IBÉRICA.................................................................... 9
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 13
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 15
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 17
TÓPICO 2 – O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA ................ 19
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 19
2 AS CANTIGAS ..................................................................................................................................... 19
2.1 CANTIGAS DE GÊNERO LÍRICO ................................................................................................ 21
2.2 CANTIGAS DE GÊNERO SATÍRICO ........................................................................................... 27
3 AS NOVELAS DE CAVALARIA ........................................................................................................ 31
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 40
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 42
TÓPICO 3 – A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO 
PORTUGUÊS ..................................................................................................................... 43
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 43
2 A PROSA: HISTORIOGRAFIA ......................................................................................................... 44
3 A PROSA DIDÁTICA .......................................................................................................................... 48
4 LIRISMO: A POESIA MEDIEVAL PORTUGUESA ...................................................................... 51
5 TRADIÇÃO DRAMÁTICA: O TEATRO DE GIL VICENTE....................................................... 55
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 66
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................69
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 72
UNIDADE 2 – A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E 
ÁRCADE ......................................................................................................................... 75
TÓPICO 1 – O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO ...... 77
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 77
2 ASPECTOS GERAIS DO CLASSICISMO ...................................................................................... 78
3 A ÉPICA PORTUGUESA: “OS LUSÍADAS” .................................................................................. 83
4 A POESIA LÍRICA DE CAMÕES ...................................................................................................... 105
5 OS POETAS MENORES DA LÍRICA QUINHENTISTA PORTUGUESA................................ 115
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 120
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 125
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 127
sumário
VIII
TÓPICO 2 – UMA ÉPOCA DE DUALISMOS: O BARROCO PORTUGUÊS ............................. 129
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 129
2 ASPECTOS GERAIS DA ESTÉTICA BARROCA .......................................................................... 130
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 140
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 142
TÓPICO 3 – AS LUZES DA RAZÃO: O ARCADISMO................................................................... 145
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 145
2 AS IDEIAS ILUMINISTAS E A ESTÉTICA NEOCLÁSSICA ..................................................... 146
3 BOCAGE: A EXPRESSÃO DO LIRISMO PORTUGUÊS ............................................................. 152
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 158
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 159
UNIDADE 3 – DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A 
PRODUÇÃO LITERÁRIA .......................................................................................... 161
TÓPICO 1 – O ESPÍRITO CRIADOR E LIVRE: PERÍODO ROMÂNTICO ................................ 163
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 163
2 A ESTÉTICA DA POESIA E DA PROSA ROMÂNTICA ............................................................. 164
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 177
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 179
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 181
TÓPICO 2 – A REVOLUÇÃO DA MENTALIDADE E O CULTO AO ETÉREO: AS ESCOLAS 
REALISTA E SIMBOLISTA ............................................................................................ 183
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 183
2 ASPECTOS GERAIS DO REALISMO ............................................................................................. 185
3 ASPECTOS GERAIS DO SIMBOLISMO ........................................................................................ 196
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 204
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 206
TÓPICO 3 – LIBERDADE DE CONCEPÇÃO E EXPRESSÃO E A ATUALIDADE: A ERA 
MODERNA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA CONTEMPORÂNEA ....................... 207
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 207
2 PANORAMA DO MODERNISMO E DA EXPRESSÃO LITERÁRIA CONTEMPORÂNEA .......208
3 EXPOENTES DA POESIA E DA PROSA MODERNA E JOSÉ SARAMAGO ......................... 217
4 MANIFESTAÇÕES DA LITERATURA PORTUGUESA ALÉM-PORTUGAL ......................... 239
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 243
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 245
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 247
TÓPICO 4 – A LITERATURA PORTUGUESA E O ENSINO: ALGUMAS IDEIAS .................. 249
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 249
2 A LITERTURA PORTUGUESA E O ENSINO: UM COMEÇO ................................................... 249
RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 256
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 257
REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 259
1
UNIDADE 1
LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS 
E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO 
MEDIEVAL
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
A partir do estudo desta unidade, o/a acadêmico/a estará apto/a a:
• refletir acerca da literatura, estética literária e suas diferentes manifesta-
ções: escrita, imagem etc.;
• compreender o processo de formação da Literatura Portuguesa;
• refletir acerca das primeiras manifestações literárias portuguesas: cantigas 
e novelas;
• analisar as manifestações literárias clássica e barroca portuguesa e com-
preender sua importância e influência na formação dos primeiros perío-
dos literários brasileiros.
Esta unidade está dividida em três tópicos. Ao final de cada um deles, você 
poderá dispor de atividades que o/a auxiliarão na fixação do conteúdo.
TÓPICO 1 – A FORMAÇÃO DA LITERATURA PORTUGUESA
TÓPICO 2 – O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA 
TROVADORESCA 
TÓPICO 3 – A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO 
HUMANISMO PORTUGUÊS
2
3
TÓPICO 1
UNIDADE 1
A FORMAÇÃO DA LITERATURA PORTUGUESA
1 INTRODUÇÃO
“O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente 
que chega a fingir que é dor
a dor que deveras sente.”
(PESSOA, Fernando. Autopsicografia, 1932.)
A função da Literatura e suas diferentes concepções foi, desde os tempos 
primordiais, objeto de muitas discussões. É sabido, porém, que, nas diferentes 
épocas em que ela se manifesta, lhe são atribuídas funções e naturezas diversas, 
em consonância com a sua realidade cultural e social.
A literatura é umaforma de manifestação da linguagem. Há autores que 
veem a linguagem a partir de uma ótica social, entre os quais poder-se-ia citar 
Roland Barthes, que a concebe como a expressão do poder social, ao qual toda 
a sociedade está submetida. Diz ele que “[...] esse objeto em que se inscreve o 
poder, desde toda eternidade humana, é a linguagem – ou, para ser mais preciso, 
sua expressão obrigatória: a língua.” (BARTHES, 1978, p. 2). Isto posto, percebe-
se que Barthes (1978) atribui à linguagem a expressão do pensamento humano, 
numa determinada época, ou período histórico.
Porém, no que diz respeito especificamente à literatura, diz o autor em 
questão que há maneiras de o ser humano libertar-se da submissão da linguagem, 
valendo-se, para isto, da própria língua. O crítico francês revela ainda que “[...] 
essa trapaça, salutar, essa esquiva [...], eu a chamo, quanto a mim: literatura.” 
(BARTHES, 1978, p. 16).
Diante do exposto, percebe-se que, na ideia de Barthes, a literatura é 
retratada como a maneira de se utilizar a linguagem sem a sujeição ao poder, 
distante da escravidão das regras. Assim, o autor (escritor literário) tem a 
liberdade de escolha e criação das palavras e estruturas, a fim de exprimir 
pensamentos, emoções e ideias. Na linguagem literária, as palavras adquirem 
novos significados, sabor diferente. 
É, pois, caro/a acadêmico/a, com esta visão que, nas próximas seções deste 
tópico, passaremos a refletir acerca da literatura e da estética literária, para focar, 
ao final, a manifestação literária portuguesa medieval.
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
4
2 LITERATURA: A ESTÉTICA, A ESCRITURA E A IMAGEM
Dentre as muitas manifestações da arte, está a literatura. Em relação 
às demais manifestações artísticas, ela apresenta muitas semelhanças e pontos 
distintivos. Talvez o elemento a partir do qual ela se distingue das outras artes 
seja o modo de expressar, a matéria-prima a partir da qual o artista trabalha. E 
aqui, passe-se a palavra a Alceu de Amoroso Lima:
A distinção entre a literatura e demais artes vai operar-se nos seus 
elementos intrínsecos, a matéria e a forma do verbo. De que se serve o homem de 
letras para realizar seu gênio inventivo? Não é, por natureza, nem do movimento 
como o dançarino, nem da linha como o escultor ou o arquiteto, nem do som 
como o músico, nem da cor como o pintor. E sim – da palavra. A palavra é, pois, 
o elemento material intrínseco do homem de letras para realizar sua natureza e 
alcançar seu objetivo artístico.
Por meio das palavras, o ser humano realizou registros de toda ordem: 
documentou, efetuou acordos, criou todo tipo de mensagem, catalogou dados 
etc. Muitos textos antigos chegaram às posteridades via palavra escrita. Obras 
das civilizações passadas perduram até hoje graças à escrita. 
Assim, há que se dizer que a literatura é uma das partes essenciais da 
cultura das civilizações. E a arte da escrita revela a criatividade e a imaginação 
que permeia a cultura dessas civilizações. Conforme você já estudou em outros 
cadernos durante o curso, somente utilizar palavras para fazer literatura não é o 
suficiente. A palavra adquire função literária na medida em que a intenção daquele 
que escreve passa a focalizar a mensagem em si, seja na combinação e seleção das 
palavras, seja na estrutura da mensagem. O que se requer é que as palavras sejam 
carregadas de significado, permitam a multiplicidade de interpretações, que 
encerrem em si o colorido, a sonoridade, que sejam aprazíveis ao leitor-receptor. 
Importante, aqui, que se dê voz a Umberto Eco (2003, p. 38): “Ora, é sabido que 
as obras literárias, sejam elas clássicas ou modernas, são abertas, ou ambíguas”, 
prestando-se, portanto a várias interpretações, o que expõe o leitor a um trabalho 
criativo, na medida em que tenta interpretá-las, compreendê-las. Uma vez que 
nem tudo está dado no texto de forma fechada, mas que a obra se organiza com 
uma ambiguidade fundamental em todos os níveis, isto é, “[...] abre-se numa 
potencialidade muito grande de sentidos, necessariamente, provoca um trabalho 
por parte do leitor.” (ECO, 2003, p. 38). Por isso, considera-se que, dentro da 
questão literária, as palavras vão além do limite de sua significação. Portanto, 
elas podem conquistar novos espaços e revelar novas possibilidades de se ver a 
realidade. 
Assim, caro/a acadêmico/a, você pode observar qual é o caminho que a 
literatura percorre. Observe que o artista sente, seleciona e manipula as palavras, 
organiza-as de tal modo que produzam um efeito que ultrapasse a sua significação 
primeira, avizinhando-as do imaginário.
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DA LITERATURA PORTUGUESA
5
Não é a toa que se diz que a obra do escritor origina-se da sua imaginação, 
ainda que tenha como base elementos da realidade. A partir de sua aguçada 
percepção, o autor capta a realidade através de seus sentimentos. Ele consegue 
explorar as muitas possibilidades linguísticas e manipulá-las nos mais diversos 
níveis, entre os quais o fonético e o semântico.
Com as suas habilidades, o escritor é capaz de criar uma outra realidade, 
a dita realidade artística, a qual precisa ser concebida e analisada de modo 
diferente, não como se estivéssemos diante de seres dotados de vida, de carne e 
de osso. Ela “[...] é caracterizada pela ficção enquanto forma e conteúdo, isto é, 
enquanto conceito ou modelo.” (COMPAGNON, 2003, p. 38).
Anteriormente, em outra parte, você pôde perceber, caro/a acadêmico/a, 
que a literatura é a arte manifestada via linguagem, a qual procura levar ao 
máximo a ambiguidade dos termos. Assim, pode-se entender que a arte literária 
não se caracteriza puramente pela transmissão de informações, mas ela “[...] 
cria em cada ser aquilo que os sentidos o levam a interpretar. Através da leitura 
podemos vivenciar aquilo que lemos e criar dentro de nós a imagem proposta 
pelo texto.” (LAJOLO, 1995, p. 28). 
Vê-se, assim, que a literatura tanto pode ser percebida sob a ótica do 
verídico como pode ser concebida como ficção. As personagens, por sua vez, 
tanto poderiam ter existido como poderiam ter sido criadas pelo autor. Enfim, 
em literatura tudo é possível. Considere-se, entretanto, que, mesmo na ótica da 
ficção, há o fundamento real, no qual o autor se apoiou para criar a ficção. Por isso, 
há quem veja a literatura como uma imitação do real, entre os quais Aristóteles. 
Ele concebeu a arte literária como mimese, ou seja, imitação. Ela seria, assim, a 
arte que imita pela palavra.
Caro/a acadêmico/a de Letras! Ao estudar literatura é muito importante que 
você conheça o que se falou na antiguidade acerca dela. Talvez um dos primeiros a falar 
sobre a literatura como arte tenha sido Aristóteles, filósofo grego do quarto século antes de 
Cristo. Por isso, sugerimos que você leia a obra “Arte Poética”, na qual ele trata de diferentes 
gêneros textuais. 
IMPORTANT
E
Até aqui, foi possível compreender que a literatura está enraizada na arte 
da palavra, e que esta suscita uma multiplicidade de interpretações, considerando-
se, inclusive a etimologia. Literatura origina-se do termo latino littera, que remete 
à “arte da escrita”. 
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
6
Segundo autores como Eagleton (2001, p. 2), esta arte de escrever se dá 
dentro dos moldes da escrita já existentes e que “[...] intensificam a linguagem 
comum”, que poderiam sugerir algo diferente da linguagem comum, usual. Se 
esta linguagem pudesse ser intensificada, far-se-iam necessários certos recursos 
para dizer do que se trata. Assim, a aplicação da linguagem escrita de modo 
diferente constitui o que poderia ser chamado de valor estético. 
E a literatura lida com a estética por excelência. Conforme já mencionado, 
na literatura, a linguagem adquire status artístico. Essa maneira especial de 
combinar as palavras, de modo impressionar o leitor e aprazê-lo é que poderia ser 
chamada de estética literária.Vale aqui dizer-se que, segundo D’Onofrio (2002, 
p. 23), as funções da literatura são “[...] estética – arte da palavra e expressão do 
belo –, lúdica – provocar um prazer –, cognitiva – forma de conhecimento de uma 
realidade –, catártica – purificação dos sentimentos – e pragmática – pregação de 
uma ideologia.” 
Dentre as tantas funções das quais está imbuída a arte da literatura, a 
questão estética é a que cumpre a função de fazer com que o ato de escrever de 
modo literário seja diferente de todos os outros modos. Isto posto, concebe-se 
um texto como literário se este busca representar de um modo todo diferente, 
artístico, a realidade. No aspecto literário, portanto, há que se considerar a 
combinação forma e conteúdo.
Caro/a acadêmico/a, sugere-se que você assista aos seguintes filmes e observe 
que imbricações eles têm com a Literatura. Observe os aspectos literários ressaltados em 
cada um:
“Sociedade dos poetas mortos” e “O carteiro e o poeta”.
NOTA
No que se refere à questão estética, seja via palavra, seja via imagem, é 
importante considerar as palavras de Mikhail Bakhtin (2006, p. 84), no texto “O 
todo espacial da personagem e do seu mundo. Teoria do horizonte e do ambiente”. 
Para um bom entendimento do que o autor revela neste texto, a seguir, você, 
caro/a acadêmico/a, encontra alguns tópicos resumidos. Leia-os nas palavras do 
próprio autor e faça as devidas ligações com os aspectos tratados anteriormente 
acerca da literatura.
• A forma material, que determina se uma obra é de pintura, poesia ou música, 
determina de maneira substancial também a estrutura do objeto estético 
correspondente, tornando-o um tanto unilateral e acentuando um ou outro 
aspecto seu. Ainda assim, o objeto estético é multifacetado, concreto como 
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DA LITERATURA PORTUGUESA
7
a realidade ético-cognitiva (o mundo vivenciável) que nele se justifica e 
se conclui artisticamente, cabendo observar que é na obra verbalizada 
(o menos possível na música) que esse mundo artístico é mais concreto e 
multifacetado. A criação verbalizada não constrói forma espacial externa, 
porquanto não opera com material espacial como a pintura, a escultura, o 
desenho: seu material é a palavra (a forma espacial da disposição do texto – 
estrofes, capítulos, figuras complexas da poesia escolástica etc. – sumamente 
insignificante), material não-espacial pela própria substância (o som na música 
é ainda menos espacial); no entanto, o próprio objeto estético, representado 
pela palavra, evidentemente não se constitui só de palavras, embora haja nele 
muito de puramente verbal, e esse objeto da visão estética possui uma forma 
espacial interna artisticamente significativa, representada pelas palavras da 
mesma obra (enquanto na pintura essa forma é representada pelas cores, 
no desenho pelas linhas, de onde tampouco se conclui que o objeto estético 
correspondente seja constituído apenas de linhas ou apenas [de] cores; trata-
se precisamente de criar um objeto concreto de linhas ou cores.
• Outra questão é saber como se realiza essa forma espacial: deve ela 
reproduzir-se numa representação puramente visual, nítida e completa, ou 
só se realiza o seu equivalente volitivo-emocional, o tom sensorial que lhe 
corresponde, o colorido emocional, sendo que a representação visual pode 
ser descontínua, fugidia ou até estar ausente, substituída pela palavra? (O 
tom volitivo-emocional, embora vinculado à palavra e como que fixado à 
sua imagem sonora tonalizante, evidentemente não diz respeito à palavra, 
mas ao objeto que esta exprime, mesmo que este não se realize na consciência 
como imagem visual; só pelo objeto assimila-se o tom emocional, mesmo 
que este se desenvolva junto com o som da palavra.) Um estudo detalhado 
da questão assim colocada está fora do alcance deste ensaio; seu lugar é na 
estética da criação verbalizada. No nosso caso, bastam algumas indicações 
sumaríssimas sobre essa questão. A forma espacial interna nunca se realiza 
com toda sua perfeição visual e plenitude (aliás, o mesmo se dá com a forma 
temporal com toda a sua perfeição sonora e sua plenitude) nem no campo 
das artes plásticas; a plenitude visual e a perfeição só são próprias da forma 
material externa da obra, cujas qualidades são como que transferidas para 
a forma interna (até as artes plásticas, a imagem visual da forma interna é 
consideravelmente subjetiva). A forma visual interna é vivenciada de modo 
volitivo-emocional, como se fosse perfeita e acabada, mas essa perfeição e 
esse acabamento nunca podem ser uma concepção efetivamente realizada. 
É claro que o grau de realização da forma interna da representação visual 
é diferente em modalidades diversas de criação verbalizada e em diversas 
obras particulares.
• Visto que o artista lida com a existência e o mundo do homem, lida também 
com a sua concretude espacial, com suas fronteiras exteriores como elemento 
indispensável dessa existência, e, ao transferir essa existência do homem para 
o plano estético, deve transferir para esse plano também a imagem externa 
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
8
dela nos limites determinados pela espécie do material (cores, sons etc.). 
O poeta cria a imagem, a forma espacial da personagem e de seu mundo 
com material verbal: por via estética assimila e justifica de dentro o vazio 
de sentido e de fora a riqueza factual cognitiva dessa imagem, dando-lhe 
significação artística.
• A imagem externa expressa em palavras, representada visualmente (até 
certo ponto no romance, por exemplo) ou apenas vivenciada de modo 
volitivo-emocional, tem significado de acabamento formal, ou seja, não é só 
expressiva, mas também artisticamente impressiva. Aqui se aplicam todas 
as teses que expusemos, o retrato verbal se subordina a elas assim como o 
retrato pictural. Também aqui, só a posição de distância cria o valor estético 
da imagem externa, a forma espacial expressa a relação do autor com a 
personagem; ele deve ocupar uma posição firme desta e de seu mundo e 
usar todos os elementos transgredientes à imagem externa da personagem.
• A obra de criação verbal é criada de fora para cada personagem, e, quando 
a lemos, é de fora e não de dentro que devemos seguir as personagens. Mas 
é justamente na criação verbal (e, acima de tudo, na música) que parece 
muito sedutora e convincente a interpretação puramente expressiva da 
imagem externa (da personagem e do objeto), porquanto a distância do 
autor-espectador não tem a precisão espacial como nas artes plásticas (a 
substituição das representações visuais pelo equivalente volitivo-emocional 
fixado à palavra). Por outro lado, a linguagem como material não é 
suficientemente neutra em face da esfera ético-cognitiva, onde é empregada 
como autoexpressão e comunicação, ou seja, como recurso expressivo, e nós 
transferimos essas habilidades expressivas da linguagem (de traduzir a si 
mesmo e designar o objeto) para a percepção das obras de arte verbal.
• O conteúdo (aquele que se insere na personagem, sua vida de dentro) e a 
forma não se justificam nem se explicam no plano de uma consciência, mas 
tão somente nas fronteiras de duas consciências: nas fronteiras do corpo 
realizam-se o encontro e a dádiva artística da forma. Sem essa atribuição de 
princípio ao outro como uma dádiva a que ele o justifica e o conclui (com 
a justificação estético-imanente), a forma, sem encontrar a fundamentação 
interna de dentro do ativismo do autor-contemplador, deve degenerar 
fatalmente em algo hedonicamente agradável, simplesmente “bonito” e 
imediatamente agradável para mim, assim como eu sinto diretamente frio 
ou calor: o autor cria tecnicamente o objeto do prazer, o contemplador se 
proporciona passivamente esse prazer.
FONTE: Extraído e adaptado de: BAKHTIN, Mikhail. O todo espacial da personagem e do seu 
mundo. Teoria do horizonte e do ambiente. In: ______. Estética da criação verbal. Tradução de 
Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes,2006. p. 84-90.
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DA LITERATURA PORTUGUESA
9
Ao lermos alguns tópicos do texto de Bakhtin, percebemos o tratamento 
que ele dá à questão literária, seja enquanto palavra ou como imagem. O crítico 
russo dedica especial atenção à personagem e à linguagem literária enquanto 
artefatos literários que concorrem para deixar em aberto a relação da obra literária 
com o mundo, a qual é passível de uma multiplicidade de interpretações, de 
acordo com as leituras e de acordo com os leitores das diferentes épocas.
Caro/a acadêmico/a! Agora que tivemos a oportunidade de refletir acerca 
da literatura enquanto obra, linguagem, criação, estética e arte, passemos a uma 
reflexão acerca do contexto histórico e cultural da Península Ibérica do período 
medieval, ressaltando en passant os fatores que possibilitaram o surgimento das 
primeiras manifestações literárias. É importante que se destaque que a obra 
literária é fruto da inspiração individual do seu criador (artista), mas acima de 
tudo ela é um fenômeno social, graças ao seu idioma de criação, aos problemas e 
inquietações que ela retrata. Do mesmo modo, a Literatura Portuguesa também 
não foge a isto. Por isso, a ligação entre história literária, história política e 
história social é importante, evidenciando sempre que esta constitui o cenário 
que favoreceu a criação das primeiras manifestações literárias.
3 O MUNDO MEDIEVAL E A PENÍNSULA IBÉRICA
FONTE: De Giovanni (2007, p. 17)
FIGURA 1 – LISBOA, LARGO DE CAMÕES (PRINCÍPIOS DO SÉCULO XX)
Entre os muitos modos de conceber a literatura, está a visão de Antonio 
Candido (1997, p. 26) que a define “como um conjunto de textos escritos (muitas 
vezes também fixados na oralidade), esteticamente elaborados a partir da linguagem 
comum, que dão conta da especificidade cultural de uma comunidade. A comunidade, 
a propósito da presente seção, seria a Península Ibérica do período medieval”.
E dentro desta visão, está a literatura portuguesa, a qual se constituiu a partir 
de um espaço geográfico uno, ou seja, o território português. Sabe-se, outrossim, 
que ela se alargou pelas várias partes do mundo, via aventuras marítimas das 
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
10
grandes navegações, as quais resultaram nos descobrimentos ultramarinos, na 
ampliação do comércio, na concretização de interesses religiosos com a propagação 
do cristianismo, nos séculos XV e XVI. Tudo isto possibilitou que se concretizasse 
numa riquíssima tradição literária de viagens e que tivesse como consequência a 
expansão do falar português. E a tradição literária lusitana evolui juntamente com a 
estética da cultura ocidental, oriunda de uma matriz medieval que tem base latina, 
dentro da qual se constitui e se aperfeiçoa a língua literária.
Historicamente, tem-se que a independência de Portugal foi resultado 
de uma luta gradativa contra os reinos cristãos da Península Ibérica, região 
que compreende os atuais territórios de Portugal e Espanha. Este processo de 
independência está ligado à diferenciação das atividades econômicas desta região 
e às rivalidades entre os diferentes grupos feudais. Por isso, é importante dizer-
se que “[...] foi o povo quem participou ativamente desse processo, através das 
organizações municipais, os conselhos populares. Havia neles maior liberdade e 
relações sociais mais avançadas, que levavam a população a lutar para afastar do 
país a servidão de outras regiões cristãs.” (ABDALA JÚNIOR; PASCHOALIN, 1985, 
p. 9). Após várias lutas, somente em 1143 negociou-se um tratado definitivo de paz, 
na chamada Conferência de Zamora. O título de rei a Afonso Henriques só foi dado 
pelo papa Alexandre III, em 1179. Portugal tornou-se uma nação autônoma, mas a 
luta para concretizar esta independência avançou ainda muitos anos, até o reinado 
de D. Afonso III (1248-1279), com a definitiva expulsão dos sarracenos.
Para seu maior conhecimento, caro/a acadêmico/a, sobre a Independência de 
Portugal, é importante lembrar que, em 1139, depois de uma estrondosa vitória na batalha 
de Ourique contra um forte contingente mouro, D. Afonso Henriques afirma-se como rei de 
Portugal, e com o apoio dos nobres portugueses, é aclamado como rei soberano. Nascia, 
assim, em 1139, o reino de Portugal e sua primeira dinastia e Casa Real: a Borgonha, com o 
rei Afonso I de Portugal (ex-D. Afonso Henriques). Só a 5 de outubro de 1143 é reconhecida 
a independência de Portugal pelo rei Afonso VII de Leão e Castela, no Tratado de Zamora, 
assinando-se a paz definitiva. Desde então, D. Afonso Henriques (Afonso I) procurou 
consolidar a independência por si declarada. Fez importantes doações à Igreja e fundou 
diversos conventos. Dirigiu-se ao papa Inocêncio II e declarou Portugal tributário da Santa Sé, 
tendo reclamado para a nova monarquia a proteção pontifícia. Em 1179, o papa Alexandre III, 
através da Bula Manifestis Probatum, confirma e reconhece Portugal como país independente 
e soberano protegido pela Igreja.
Na continuação das conquistas, procurou também terreno ao sul, povoado, até então, por 
Mouros e, após ver malograda a primeira tentativa de conquistar Lisboa, em 1142, feito que 
só conseguiu realizar em 24 de outubro do mesmo ano, após conquistar Santarém, no dia 15 
de março, com o auxílio de uma poderosa esquadra com 160 navios e um contingente de 12 
a 13 mil cruzados, que se dirigiam para a Terra Santa.
FONTE: Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira. Lisboa; Rio de Janeiro: Editorial 
Enciclopédia Limitada, 1978. v. 25. p. 317.
NOTA
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DA LITERATURA PORTUGUESA
11
No que concerne à língua, esta tem origem no latim, já que os romanos 
chegaram à Península Ibérica em 61 a. C. Esta língua radicou-se na península 
até meados do século V, com a invasão dos bárbaros. Por causa das invasões 
árabes no século VII, ocorreu a decadência do latim. “O latim reduziu-se a falares 
vernáculos e quase desapareceu.” (PINHEIRO, 2007, p. 12).
O norte, região nunca conquistada pelos árabes, serviu de ponto de 
organização para prepararem o processo de reconquista do território, a qual 
assumiu caráter de Cruzada. Para o enfrentamento, apresentaram-se muitos 
cavaleiros cristãos. As lutas estenderam-se por muito tempo, inclusive após 
a morte de D. Afonso Henriques. A expulsão total se dá sob D. Sancho, o qual 
consolida a primeira dinastia portuguesa, a de Borgonha. 
Este fato possibilitou ao povo português a opção de não mais falar árabe, 
como também não mais se voltou a falar o latim. A nova língua passou a ser 
a mistura de falares da gente humilde, enquanto para a literatura adotou-se o 
galaico-português.
Usa-se a expressão galaico-português (ou galego-português ou ainda galécio-
português) para caracterizar “esta nova língua falada em Portugal”, composta por uma mescla 
de palavras entre uma língua e outra. A origem está em Galiza (Espanha) e Portugal.
NOTA
As primeiras palavras portuguesas de que se têm conhecimento aparecem 
em documentos do século IX e são redigidas em latim bárbaro, que seria o já 
futuro português. Não são propriamente textos literários, mas documentos de 
utilidade, como partilhas, testamentos, cartas de doação, cartas de quitação, 
instrumentos jurídicos de vários tipos.
Quanto às primeiras manifestações literárias portuguesas, estas são 
registradas em galego-português e ocorrem entre os séculos XII e XV. Esta foi 
a língua com que os rudes guerreiros das cruzadas manifestaram seus anseios 
amorosos e as suas aspirações ideais. Foi também esta língua que levou “[...] os 
trovadores a revelarem a sua vida interior e o jardim secreto de suas meditações. 
Foi também o bordão florido em que se apoiaram os primitivos poetas para o 
descobrimento e conquista da própria alma.” (FIGUEIREDO, 1980, p. 35).
Após estar solidificado o território português, como também definida a 
língua, já é possível empreender tempo para o povo desenvolver e cultivar a arte. 
No nosso caso, a arte literária que, viamanifestações poéticas, começa a aparecer 
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
12
na corte de D. Sancho. A data que se toma para marcar o início da atividade 
literária em Portugal é 1189 (ou 1198), quando o trovador Paio Soares Taveirós 
compõe uma cantiga, endereçada a Maria Pais Ribeiro, também chamada “A 
Ribeirinha”.
FONTE: De Giovanni (2007, p. 20)
FIGURA 2 – CANTIGA DA RIBEIRINHA OU CANTIGA DA GUARVAIA
Caro/a acadêmico/a, a composição do primeiro texto literário em língua 
portuguesa (A “Cantiga da Ribeirinha”, de Paio Soares de Taveirós) marca o 
início da primeira escola literária portuguesa, o Trovadorismo. Este assunto será 
tratado no próximo tópico.
A Cantiga da Ribeirinha, de Paio Soares de Taveirós, é também conhecida como 
“cantiga da guarvaia”. Guarvaia significa um vestido luxuoso usado na corte.
NOTA
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DA LITERATURA PORTUGUESA
13
A LITERATURA PORTUGUESA
Massaud Moisés
Portugal ocupa especial posição geográfica no mapa da Europa. Reduzido 
território de menos de noventa mil quilômetros quadrados, limita-se com a 
Galiza ao norte, com a Espanha a leste, e com o Oceano Atlântico ao sul e ao 
oeste. Como empurrado contra o mar, toda a sua história, literária ou não, atesta 
o sentimento de busca dum caminho que só ele representa e pode representar. 
Tal condicionamento geográfico, enriquecido por exclusivas e marcantes 
influências étnicas e culturais (árabes, germânicas, francesas, inglesas etc.), havia 
de gerar, como gerou, uma literatura com características próprias e permanentes. 
A fatalidade de ser a língua portuguesa o seu meio de comunicação ajuda a 
completar e explicar o quadro.
Diante da angústia geográfica, o escritor português opta pela fuga ou pelo 
apego à terra de origem, matriz de todas as inquietudes e confidente de todas as 
dores, centro de inspiração e nutridora de sonhos e esperanças. A fuga dá-se pelo 
mar, o descobrimento, fonte de riqueza algumas vezes, de males incríveis e de 
emoção quase sempre; ou, transcendendo a estreiteza do solo físico, para o plano 
mítico, à procura de visualizar numa dimensão universal e perene a inquietação 
particular e egocêntrica.
Assim, a Literatura Portuguesa oscila entre posições externas, com 
certeza porque uma compensa a outra. Ao lirismo da raiz, por vezes carregado de 
pieguice e morbidez, corresponde um sentimento hipercrítico, exagerado, pronto 
a agredir, a ofender, a mostrar no “outro” a chaga ou a fraqueza. A sátira, não raro 
levando ao desbocamento e ao destempero pessoal, dialoga com o culto fetichista 
da sensação, do sentimento, exacerbado por atitudes de confessionalismo 
adolescente. Uma atitude esconde a outra, a tal ponto que na base íntima de todo 
satírico ou erótico se percebe logo o sentimental, o hipersensível, que defende 
suas tibiezas com o verniz do procedimento contrário. E vice-versa.
Vem daí que seja uma literatura rica de poetas: aquela ambivalência 
constitui o suporte do “fingimento poético”, na expressão feliz, e hoje tornada 
lugar-comum, de Fernando Pessoa. A poesia é o melhor que oferece a Literatura 
Portuguesa, dividida entre o apelo metafísico, que significa a vivência e a expressão 
de problemas fundamentais e perenes (a relação conflitiva com o divino, o ser e o 
não-ser, a condição humana, os valores eróticos etc.) e a atração amorosa da terra 
(representada por temas populares, folclóricos), ou um sentimento superficial, 
feito da confissão de estados da alma provocados pelos embates afetivos 
primários, tendo por fulcro o eterno “eu-te-gosto-você-me-gosta”, de que fala 
LEITURA COMPLEMENTAR
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
14
Carlos Drummond de Andrade. Não obstante essa derradeira tendência constitua 
polo permanente, a Literatura Portuguesa ocupa lugar de relevo no mapa literário 
europeu, graças a alguns poetas vocacionados para a contemplação metafísica, 
como Camões, Bocage, Antero, Fernando Pessoa, entre outros.
Literatura pobre em teatro, eis outra afirmação indiscutível. Decorrência 
natural do arraigado lirismo egocêntrico e sentimental, a dramaturgia portuguesa 
só poucas vezes alcançou sair do nível mediano ou razoável. Tirante Gil Vicente, 
Garret (sobretudo o de Frei Luís de Sousa) e alguma coisa de Antônio José da 
Silva e Bernardo Santareno, tudo o mais vive no esquecimento. O grande surto 
teatral operado nos dias que correm, embora prometedor e já realizador de peças 
notáveis, é ainda muito recente para permitir afirmar que a atividade cênica de 
Portugal conhece uma época de reviravolta e mudança radical. 
[...] Assim sendo, compreende-se que este panorama histórico da atividade 
literária de Portugal esteja dividido nos seus fundamentais momentos evolutivos. 
No tocante às datas empregadas para os delimitar, constituem somente pontos 
de referência, pois nunca se sabe com precisão quando começa ou termina um 
processo histórico: funcionam, na verdade, como indício de que alguma coisa de 
novo está acontecendo, sem caracterizar a morte definitiva do padrão velho até 
aí em voga.
[...] A data que se tem utilizado para marcar o início da atividade literária 
em Portugal é a de 1189 (ou 1198), quando o trovador Paio Soares de Taveirós 
compõe uma cantiga (celebrizada como “cantiga da garvaia”, vocábulo este 
que designava um luxuoso vestido de Corte), endereçada a Maria Pais Ribeiro, 
também chamada A Ribeirinha, favorita de D. Sancho I.
A cantiga, oscilando entre ser de amor e de escárnio, revela tal 
complexidade na estrutura da arte de poetar. Decerto houve, antes dessa cantiga, 
considerável atividade lírica, infelizmente desaparecida: no geral, os trovadores 
memorizavam as composições que interpretavam, fossem suas ou alheias, e só 
em alguns casos as transcreviam em cadernos de notas, que podiam extraviar-se, 
perder-se ou ser descartados.
Por isso, toda uma anterior produção poética – cujo volume e cujos 
limites jamais poderão ser fixados – desapareceu por completo. Em vista de tal 
circunstância, compreende-se que se tome a cantiga de Paio Soares de Taveirós 
como o marco inicial da Literatura Portuguesa, pois trata-se do primeiro documento 
literário que se conhece em vernáculo, o que de forma alguma significa negar a 
existência duma intensa atividade poética antes de 1198.
FONTE: Adaptado de: MOISÉS, Massaud. Introdução. A Literatura Portuguesa. São Paulo: 
Cultrix, 2008. p. 17-22.
15
Caro/a acadêmico/a, no presente tópico, você teve oportunidade de 
estudar aspectos importantes relacionados à Literatura Portuguesa, os quais 
revemos, resumidamente, a seguir:
• Nas diferentes épocas em que a Literatura se manifesta, são atribuídas funções 
e naturezas diversas a ela, em consonância com a sua realidade cultural e social.
• A literatura é uma forma de manifestação da linguagem. Há autores que veem 
a linguagem numa ótica puramente social, entre os quais citamos Roland 
Barthes, que a concebe como a expressão do poder social, ao qual toda a 
sociedade está submetida.
• Na linguagem literária, as palavras adquirem novos significados, sabor 
diferente. O elemento a partir do qual a literatura se distingue das outras artes 
é o modo de expressar, a matéria-prima a partir da qual o artista trabalha. 
• A literatura é uma das partes essenciais da cultura das civilizações. E a arte 
da escrita revela a criatividade e a imaginação que permeiam a cultura dessas 
civilizações.
• A palavra adquire função literária na medida em que a intenção daquele que 
escreve passa a focalizar a mensagem em si, seja na combinação e seleção das 
palavras, seja na estrutura da mensagem. Por meio das palavras, o ser humano 
realizou registros de toda ordem: documentou, efetuou acordos, criou todo 
tipo de mensagem, catalogou dados etc.
• O artista sente, seleciona e manipula as palavras, organiza-as de tal modo que 
produzam um efeito que ultrapasse a sua significação primeira, avizinhando-
as do imaginário.
• Aobra do escritor origina-se da sua imaginação, ainda que tenha como base 
elementos da realidade. A partir de sua aguçada percepção, o autor capta 
a realidade através de seus sentimentos. Ele consegue explorar as muitas 
possibilidades linguísticas e manipulá-las nos mais diversos níveis, entre os 
quais o fonético e o semântico.
• O escritor é capaz de criar uma outra realidade, a dita realidade artística, a qual 
precisa ser concebida e analisada de modo diferente, não como se estivéssemos 
diante de seres dotados de vida, de carne e de osso.
RESUMO DO TÓPICO 1
16
• A literatura tanto pode ser percebida sob a ótica do verídico como pode ser 
concebida como ficção. Por sua vez, as personagens tanto poderiam ter existido 
como poderiam ter sido criadas pelo autor. Enfim, em literatura tudo é possível.
• A literatura é vista também como uma imitação do real, como Aristóteles. Ele 
concebeu a arte literária como mimese, ou seja, imitação. Ela seria, assim, a 
arte que imita pela palavra. Ela está enraizada na arte da palavra e suscita uma 
multiplicidade de interpretações, considerando-se, inclusive, a etimologia. 
Literatura origina-se do termo latino littera, que remete à “arte da escrita”. 
 
• A literatura lida com a estética por excelência. O autor (de literatura) tem o 
cuidado de selecionar e combinar as palavras, colocando em evidência o 
lado palpável, material dos signos. Ao selecionar e combinar de um modo 
todo particular e especial os termos, o autor procura obter alguns elementos 
fundamentais no que diz respeito à linguagem, entre os quais o ritmo, a 
sonoridade, o belo, o inusitado das imagens. 
• A maneira especial de combinar as palavras, de modo a impressionar o autor e 
aprazê-lo é que poderia ser chamada de estética literária. A questão estética é a 
que cumpre a função de fazer com que o ato de escrever de modo literário seja 
diferente de todos os outros modos.
• A obra literária é fruto da inspiração individual do seu criador (artista), mas 
acima de tudo ela é um fenômeno social, graças ao seu idioma de criação, aos 
problemas e inquietações que ela retrata.
• A história da literatura lusitana evolui juntamente com a estética da cultura 
ocidental, oriunda de uma matriz medieval que tem base latina, dentro da qual 
se constitui e se aperfeiçoa a língua literária.
• A nova língua (português) passou a ser a mistura de falares da gente humilde, 
enquanto para a literatura se adotou o galaico-português.
• As primeiras palavras portuguesas de que se tem conhecimento aparecem em 
documentos do século IX e são redigidas em latim bárbaro, que seria o já futuro 
português.
• A data que se toma para marcar o início da atividade literária em Portugal é 
1189 (ou 1198), quando o trovador Paio Soares Taveirós compõe uma cantiga, 
endereçada a Maria Pais Ribeiro, também chamada “A Ribeirinha”.
17
Caro/a acadêmico/a, para que você possa melhor fixar o conteúdo deste 
tópico, apresentamos, a seguir, uma atividade. Procure resolvê-la com base no 
que você estudou.
1 Releia o texto de Mikhail Bakhtin. Nele você pode observar as diferentes 
maneiras de o artista representar esteticamente as imagens, os objetos, 
ambiente, personagens. Assim, comente como o artista que lida com a 
palavra (escritor) representa esteticamente os objetos.
2 No primeiro capítulo deste tópico são apresentadas muitas definições de 
Literatura. Caro/a acadêmico/a, utilize a internet ou livros e pesquise outra 
definição de Literatura. Em seguida, transcreva-a e socialize-a com os demais 
acadêmicos no próximo encontro.
3 Conforme apresentado na terceira seção, a língua portuguesa foi levada, via 
navegações e descobrimentos, às diferentes partes do mundo. Pesquise os 
diferentes locais em que, no mundo, é falada a língua portuguesa.
AUTOATIVIDADE
18
19
TÓPICO 2
O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA 
TROVADORESCA
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO
Como um país realmente autônomo, Portugal surge na primeira metade 
do século XII. É nesse período que aparecem as primeiras manifestações da 
Literatura Portuguesa, através da poesia. Na verdade, são manifestações orais, 
quem sabe até sem provas concretas sobre a sua origem. No entanto, toma-se 
o ano de 1189 (ou 1198) como a data provável do aparecimento do primeiro 
documento literário. Trata-se da já citada cantiga de amor escrita por Paio Soares 
de Taveirós, em galego-português, conhecida como Cantiga da Ribeirinha (ou da 
Guarvaia). É dirigida a Maria Pais Ribeiro (a Ribeirinha). De acordo com o que 
observa Fujyama (1970, p. 11), “poder-se-ia até crer na existência de uma tradição 
lírica, oral, até de longa data, haja vista perceber-se na cantiga uma composição já 
bastante avançada e complexa”.
O início da literatura portuguesa traz a marca do lirismo trovadoresco, 
antecedendo a prosa, para a qual o processo evolutivo será mais lento. Veem-se, 
assim, dois períodos marcando o surgimento da literatura portuguesa: o primeiro, 
lírico, que cultivou a poesia lírica (cantigas), e o segundo, a prosa, trazendo as 
novelas de cavalaria, originárias das canções de gesta, que eram composições 
poéticas em forma de canções que narravam feitos heróicos.
A seguir, caro/a acadêmico/a, você terá oportunidade de estudar 
separadamente cada um destes períodos e, ao mesmo tempo, apreciar alguns 
textos representativos de ambas as épocas.
2 AS CANTIGAS 
O primeiro período da literatura portuguesa, marcado pelo florescimento 
das chamadas cantigas, recebe o nome de Trovadorismo, por serem estas cantigas 
poemas criados com o objetivo de que fossem cantados, acompanhados por 
instrumentos musicais, entre os quais a flauta, a viola, o alaúde além de outros 
utilizados na época. Os autores de tais cantigas eram conhecidos por trovadores, 
enquanto aos que as apresentavam de maneira cantada chamavam-se jograis.
“A, senhor, ide rogar mia senhor,
Por Deus que haja mercee de mi.”
(D. Dinis)
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
20
O Dicionário Houaiss trata como jogral o artista medieval que cantava e recitava 
poesia. A partir do século X, os jograis começaram, juntamente com os menestréis, a divulgar 
a poesia trovadoresca, cantando-a acompanhados de música.
NOTA
Há quem atribua a origem deste tipo de poesia ao movimento das cruzadas, 
já que os fiéis cruzados encontravam-se em Lisboa, que era a área portuária mais 
próxima para embarcar com destino a Jerusalém. Junto com todo este movimento 
de chegada e partida dos cruzados, havia os jograis, os quais introduziram a nova 
moda literária em Portugal. Conforme explica Massaud Moisés (2008, p. 24), em 
Portugal, esta modalidade poética encontrou terreno fértil, haja vista já haver ali 
uma “[...] espécie de poesia popular de velha tradição. A íntima fusão de ambas 
as correntes (a provençal e a popular) explicaria o caráter próprio assumido pelo 
trovadorismo”. 
 
Poder-se-ia até imaginar que um papel fundamental era desempenhado 
pelos jograis, já que estes eram como que os atuais artistas ambulantes, que 
animavam festas, romarias, feiras, torneios, valendo-se para isto das melodias 
e canções. Eles levavam, assim, “[...] de cidade em cidade, de castelo em castelo 
essa nova forma de arte, que fez do amor e da saudade a fonte de uma expressão 
poética que adquiriu diferentes formas ao longo do tempo.” (TUFANO, 1990, p. 
111).
 
Considerando-se as condições em que foram compostas, geralmente uma 
tradição oral ou, se escritas, provisoriamente anotadas, principalmente por não 
haver intenção de registrá-las, muitas das cantigas foram perdidas. Mas, há que 
se considerar a existência de documentos que trazem coletâneas de cantigas de 
diferentes tipos e autores variados – são os chamados cancioneiros. Pela sua 
importância, no que concerne ao conhecimento do Trovadorismo português, são 
relevantes os seguintes cancioneiros:
• Cancioneiro da Ajuda: sua composição parece datar do século XIII, no reinado 
de Afonso III. Contém 310 cantigas, a maiorparte delas de amor.
• Cancioneiro da Biblioteca Nacional: conhecido também pelo nome dos dois 
italianos que o possuíram – Cancioneiro Collocci-Brancuti –, contém 1.647 
cantigas, de todos os tipos, cujos autores datam dos reinados de Afonso III e D. 
Dinis. Trata-se de uma cópia italiana do século XVI.
• Cancioneiro da Vaticana: também constitui uma cópia italiana do século XVI e 
contém uma coletânea de 1.205 cantigas, dos mais diversos tipos: amor, amigo, 
escárnio e maldizer. Foi localizado em 1840, na Biblioteca do Vaticano. 
 
TÓPICO 2 | O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA
21
No seu conjunto, as cantigas são distribuídas em dois gêneros maiores e 
subdivididas em quatro modalidades, conforme segue:
1) Gênero lírico: cantigas de amor e cantigas de amigo.
2) Gênero satírico: cantigas de escárnio e cantigas de maldizer.
FONTE: De Giovanni, 2007, p. 23
FIGURA 3 – D. DINIS (1279-1325)
2.1 CANTIGAS DE GÊNERO LÍRICO
Este grupo compreende as cantigas de amigo e as de amor. “As cantigas 
de amigo compreendem uma manifestação poética cujas raízes estão nas próprias 
manifestações populares da Península Ibérica.” (TUFANO, 1981, p. 9). Portanto, 
surgiram do próprio sentimento popular. Caracterizam-se pela expressão 
do sentimento feminino, apesar de terem autoria masculina. São vivências, 
principalmente amorosas. Nelas, na maior parte das vezes, aparece o termo 
amigo, no primeiro verso da cantiga. O poeta assume o papel do eu lírico feminino, 
fazendo esta “mulher”, via tal estratagema, confidências à pessoa amada. 
Deste modo, observa-se na letra destas cantigas o sofrimento do eu lírico 
por causa da ausência do “amigo” (namorado, pessoa amada), o que é confessado 
à mãe, às irmãs, às amigas, ou ainda à natureza de um modo geral – campo, mar, 
rio, fonte, árvore, flores. No que concerne à ausência do amado, poderia tratar-se 
da sua partida para alguma batalha, a espera pelo seu regresso.
Outras vezes, as cantigas de amigo revelam estados de ânimo mais 
diversificados, como a alegria pela chegada do amigo, a ansiedade pelo seu 
regresso, o desejo de vingança, ciúmes. Já no que diz respeito às personagens 
que tomam parte na estrutura da cantiga, temos: a amiga, que constitui a própria 
voz poética. Poderia ser vista como ingênua, narcisista, com um comportamento 
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
22
esquivo ou vingativo, a mãe, a qual representa a norma social do caráter proibitivo, 
as confidentes, representadas pela figura da mãe, ou uma amiga, a irmã, noivas, 
a natureza (flores, ondas, mar), o amigo, representando o namorado, geralmente 
ausente.
Com o objetivo de estimular o conhecimento deste tipo de cantiga, caro/a 
acadêmico/a, passemos à leitura de uma dentre as muitas cantigas de amigo, 
seguida de alguns comentários:
Ai flores
(D. Dinis)
Ai flores, ai flores do verde pino,
Se sabedes novas do meu amigo!
Ai Deus, e u é?
Ai flores, ai flores do verde ramo,
Se sabedes novas do meu amado!
Ai Deus, e u é?
Se sabedes novas do meu amigo,
Aquel que mentiu do que pôs comigo!
Ai Deus, e u é?
Se sabedes novas do meu amado,
Aquel que mentiu do que mi há jurado!
Ai Deus, e u é?
Vós me preguntades polo voss’amado?
E eu bem vos digo que é san’e vivo:
Ai Deus, e u é?
Vós me preguntades polo voss’amado?
E eu bem vos digo que é viv’e sano:
Ai Deus, e u é?
E eu bem vos digo que é san’e vivo,
E seerá vosc’ant’o prazo saído:
Ai Deus, e u é?
E eu bem vos digo que é viv’e sano
E seerá vosc’ant’ o prazo passado:
Ai Deus, e u é?
FONTE: BRAGA (2005 p. 186) 
TÓPICO 2 | O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA
23
Efetuada a leitura da cantiga de amigo, seria de bom alvitre que 
se observassem no texto alguns aspectos importantes, como a estrutura 
paralelística, a qual pode ser comprovada já a partir dos dois primeiros versos 
das duas primeiras estrofes – “Ai flores, ai flores”/“Se sabedes novas”. No final 
destes versos, alternam-se as expressões, aparecendo – “verde pino”/“verde 
ramo” e “meu amigo”/“meu amado”. As demais estrofes também apresentam 
paralelismos. Faça você mesmo, acadêmico/a, esta análise.
No final de cada uma das quatro estrofes, repete-se a expressão “Ai Deus, 
e u é?”, a qual poderia ser considerada refrão, como ocorre também nas músicas 
atuais.
Caro/a acadêmico/a, no que concerne às cantigas de amigo, estas apresentam 
uma estrutura um tanto formalizada e com certa rigidez, no que diz respeito às repetições. 
Veja-se, por exemplo:
1) Paralelismo: repetição da mesma ideia em duas estrofes sucessivas, nas quais só mudam 
as palavras finais.
2) Leixa-pren: repetição dos segundos versos de um par de estrofes como primeiros versos 
do par seguinte.
3) Refrão: verso ou versos repetidos ao final de cada estrofe.
NOTA
A seu turno, as cantigas de amor exprimem um sentimento masculino 
e são ambientadas em palácios. Sua origem é provençal e mostram um homem 
apaixonado, na condição de vassalagem, ou seja, apaixonado por uma dama de 
classe social superior. Eis por que, nestas cantigas, o tratamento dado pelo eu 
lírico masculino à dama é “senhor” (senhora). Estes homens (eu lírico) vivem 
uma paixão insatisfeita, pois não são correspondidos pelas mulheres amadas, 
o que ocasiona sofrimento amoroso. Diante disto, por vezes, estes homens se 
colocam em situação de serventia.
Caro/a acadêmico/a, quando falamos em origem provençal, fazemos referência 
à região da Provença, sul da França, ou seja, alguém que é natural ou habitante desta região, 
bem como àquilo que é originário desta região.
NOTA
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
24
A mulher cantada pelos trovadores nas cantigas de amor é idealizada, 
é alguém dotada de perfeição, não possuidora de defeitos, é colocada acima de 
todas as coisas. A mulher amada é alguém inacessível, que parece não atender aos 
seus apelos, principalmente porque é superior (nobre), enquanto ele (o homem 
que ama), um fidalgo, um decaído. Na caracterização das cantigas, importante 
que se faça eco às palavras de Massaud Moisés: “Os apelos do trovador a colocam 
no alto (a mulher), num plano de espiritualidade, de idealidade ou contemplação 
platônica, mas que se entranham no mais fundo dos sentidos.” (2008, p. 25). Vê-
se, assim, que o poeta sofre; seu sofrimento é pior que a morte, e o amor é sua 
única razão de viver.
Atente-se, a seguir, aos dois exemplos de cantigas de amor:
1) Cantiga da Ribeirinha
(Paio Soares de Taveirós)
No mundo non me sei parelha
mentre me for como me vai,
cá já moiro por vós-e ai!
mia senhor branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi em saia!
Mau dia me levantei,
que vos entom no vi fea!
E, mia senhor, dês aquel di’, ai!
Me foi a mi mui mal,
e vós, filha de Don Paai
Moniz, e bem vos semelha
d’aver eu por vós guarvaia,
pois eu, mia senhor, d’alfaia
nunca de vós houve nem ei
valia d’ua correa.
 
FONTE: Braga (2005, p. 182)
TÓPICO 2 | O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA
25
Veja-se como ficaria a tradução, para o português moderno, da “Cantiga da 
Ribeirinha”, efetuada pelo professor Stélio Furlan, da UFSC – Universidade Federal de Santa 
Catarina:
No mundo ninguém se assemelha a mim
enquanto a minha continuar como vai,
porque morro por vós, e ai!
Minha senhora de pele alva e faces rosadas,
quereis que vos retrate (que me afaste)
quando vos vi em manto! (na intimidade)
Maldito dia! Me levantei
que não vos vi feia!
E, minha senhora, desde aquele dia, ai!
Tudo me foi muito mal,
e vós, filha de Don Pai
Moniz, e bem vos parece
de ter eu por vós guarvaia,
pois eu, minha senhora, como mimo
nunca de vós recebe
algo, mesmo sem valor.
NOTA
2) Tão grave dia
(D. Afonso Sanches)
Tam grave dia que vos conhoci
por quanto mal me vem por vós, senhor!
Ca ma vem coita, nunca vi mayor,
sem outro bem, por vós, senhor, des i
por este mal que mh’a mim por vós vem,
como se fosse bem, vem-me por em
gran mal a quem nunca o mereci.Ca, mia senhor, porque vos eu servi,
sempre digo que sode’la milhor
do mund’e trobo polo vosso amor,
que me fazedes gram bem e assy
veedd’ora mha senhor do bom sen,
este bem tal se cumpre em mi rrem,
senon, se valedes vós mays per y.
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
26
Mais eu, senhor, em mal dia naci,
del que non tem, nem é conhecedor
do vosso bem, a que non fez valor
Deus de lho dar, que lhy fezo bem y,
per, senhor, assy me venha bem,
deste gram bem, que El por bem non tem,
muy pouco Del seria grand’a mi.
Poys, mha senhor, razon é, quand’alguen
serv’e non pede, já que rem lhi den;
eu servi sempr’e nunca vos pedi.
FONTE: Braga (2005, p. 183)
Nesta cantiga, importante observar a presença de um tipo de 
comportamento comedido por parte do eu lírico, caracterizado pela obediência 
à senhora, o desejo de servi-la, o que serviria para retratar o amor cortês, 
característica importante da poesia trovadoresca. Vê-se clara a presença do eu 
lírico que confessa seu amor pela mulher amada, assumindo que ela é superior 
a ele, afirmando que nada quer, a não ser viver o seu próprio sentimento, sem 
interesse. Porém, fica sentido porque ela não corresponde aos seus amores.
Em vários momentos, caro/a acadêmico/a, durante o nosso estudo das cantigas 
até aqui, citamos os trovadores. Ao que parece, na lírica medieval, o trovador era o artista de 
origem nobre do sul da França que, geralmente acompanhado de instrumentos musicais, 
como o alaúde ou a cistre, compunha e entoava cantigas. Já nos nossos dias trovador é 
entendido como aquele que divulga, cantando ou declamando, poemas próprios ou alheios 
(a referência é feita a qualquer poeta).
NOTA
TÓPICO 2 | O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA
27
FONTE: Duby; Perrot (1990, p. 26)
FIGURA 4 – MULHER MEDIEVAL
2.2 CANTIGAS DE GÊNERO SATÍRICO
No que se refere às cantigas de gênero satírico, nestas o eu lírico tem o 
objetivo de criticar o outro, procurando ridicularizar essa pessoa de forma sutil 
ou grosseira. Há, dentro desse gênero, dois tipos de cantigas: as de escárnio e as 
de maldizer. As cantigas de escárnio encerram um tipo de ironia que é realizada 
por meio do sarcasmo, valendo-se de uma linguagem de sentido ambíguo, velada, 
mas sem deixar de lado certo humor. O objetivo sempre é satirizar alguém ou 
então comentar jocosamente alguma situação.
Ao falarmos em jocoso, amigo/a acadêmico/a, segundo o Dicionário Houaiss, 
fazemos referência àquilo que provoca o riso, que é engraçado, divertido, cômico.
NOTA
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
28
De um modo geral, poder-se-ia até pensar o escárnio como uma zombaria, 
uma forma de menosprezo, de desdém. Ao escarnecer, o trovador jamais 
revela o nome do destinatário da crítica (sátira) e não utiliza também palavrões 
exagerados. Veja-se, a seguir, um exemplo de cantiga em que a pessoa satirizada 
não é nomeada:
Cantiga de escárnio
(João Garcia de Guilhade)
Ai, dona fea! Fostes-vos queixar
Que vos nunca louv’em meu trobar;
Mais ora quero fazer um cantar
Em que vos loarei toda via
e vedes como vos quero loar:
dona fea, velha e sandia!
Ai dona fea! Se Deus me perdon!
E pois havedes tan gran coraçon
Que vos eu loe em esta razon,
Vos quero já loar toda via;
E vedes qual será a loaçon:
Dona fea, velha e sandia!
Dona fea, nunca vos eu loei
Em meu trobar, pero muito trobei;
Mais ora já um bom cantar farei
Em que vos loarei toda via;
E direi-vos como vos loarei:
Dona fea, velha e sandia!
FONTE: Braga (2005, p. 191)
Já as cantigas de maldizer satirizam de modo mais agressivo, de 
modo direto, mais desvelado. Mais do que isto, o cunho destas cantigas é até 
difamatório, ocorrendo, inclusive, uma intenção de vituperar, com o uso de 
palavrões e xingamentos. Dito de outro modo, as cantigas de maldizer seriam 
como uma espécie de praga proferida contra alguém em específico para provocar 
maledicência e injúria.
Ao efetuar uma sátira com uma cantiga, neste caso com a de maldizer, isto 
se dava de modo direto, ocorrendo citação explícita dos nomes das pessoas em 
questão. Estas cantigas valiam-se, entre muitos, de temas como o amor interesseiro 
ou ilícito, o adultério, temas da política. Os assuntos tratados nestas cantigas, na 
época, despertavam grandes comentários por parte do público e possivelmente 
também entre os trovadores.
TÓPICO 2 | O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA
29
Tais sátiras atingiam a vida social e a política da época, valendo-se de um 
tom de irreverência e vasta riqueza, haja vista seu considerável vocabulário, em 
muitos casos, o uso de trocadilhos, o que conferia certa riqueza em termos de 
recursos poéticos, e, de um modo geral, havia a fuga às normas rígidas adotadas 
nas cantigas de amor.
Caro/a acadêmico/a, veja a seguir um exemplo de cantiga de maldizer. 
Procure você mesmo/a analisar o modo de elaboração, o assunto tratado, o nome 
da pessoa satirizada, o uso de certos “palavrões”, tipo de crítica efetuado pelo 
autor-trovador Afonso Eanes do Coton. Coloque-se no lugar dos cidadãos da 
época. Será que você, vivendo na época deste autor, seria uma pessoa que gostaria 
de tê-lo como inimigo?
Bem me cuidei
Bem me cuidei eu, Maria Garcia,
em outro dia, quando vos fodi, 
que me non partiss’eu de vós assi
como me parti já, mão vazia,
vel por serviço muito que vos fiz;
que me non deste, como x’omen diz,
sequer um soldo que ceass’um dia.
Mais desta seerei eu escarmentado
de nunca foder já outra tal molher,
se m’ant’algo na mão non poser,
ca non ei porque foda endoado;
sabedes como: ide-o fazer
com quen teverdes vistid’e calçado.
Ca me non vistides nem me calçades
nem ar sel’eu enovosso casal,
nen avedes sobre min non pagades;
ante mui bem e mais vos en direi:
nulho medo, grad’a Deus, e a El-Rei,
non ei de força que me vós façades.
E, mia dona, quen pregunta non erra;
e vós, por Deus, mandade preguntar
polos naturaes deste logar
se foderan nunca em paz nen em guerra,
ergo se foi por alg’ou por amor.
Id’adubar vossa prol, ai senhor,
c’avedes, grad’a Deus, renda na terra.
FONTE: Braga (2005, p. 191)
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
30
Caro/a acadêmico/a, para seu melhor entendimento da cantiga, eis um 
pequeno glossário para uma melhor elucidação da cantiga:
vel: em troca de; como x’omen diz: como se diz; ceass’: suficiente; seerei: sairei; se m’ant’algo: 
antes me algo; ca: pois; ei: hei, há; endoado: de graça; teverdes: tiverdes; vistid’e: vestido; 
nem ar: novamente: eno: na; vosso casal: vossa casa; nen avedes: tendes; nulho: nenhum; 
grad’a: graças; ergo: salvo.
NOTA
Como você teve a oportunidade de perceber, a cantiga revela um trovador 
(ou o autor da poesia) que se lamenta com a mulher – Maria Garcia – pelo fato de 
lhe ter prestado serviços prazerosos (sexuais) e, no caso dela, nada lhe ofereceu 
como retorno (pagamento, troca), seja dinheiro, seja roupa. Por esse motivo, ele 
diz que não repetirá tal favor. Diz ainda que ela, sob nenhuma hipótese poderia 
obrigá-lo a tal ação. E mais, afirma que não existe força que o obrigue a prestar-
lhe tal obséquio. O homem revela à mulher (Maria Garcia) que nenhum homem 
se presta a isso gratuitamente, salvo quando se trata de amor.
Retornando ao argumento central deste capítulo, poder-se-ia dizer 
que, de um modo geral, as cantigas de cunho satírico (de escárnio e maldizer) 
apresentam, acima de tudo, um interesse histórico, principalmente por tratar-se 
de textos que conseguem documentar a vida social da época, notadamente da 
corte. Tais textos trazem à tona as reações dos cidadãos frente a certos fatos da 
vida política, desnudam detalhes da vida íntima das classes aristocráticas, dos 
próprios trovadores e dos jograis, enfim, fazem chegar aos nossos dias “fofocas” 
e desvelam vícios considerados muitas vezes ocultos da sociedade portuguesa 
medieval.
Após os estudos que você teve oportunidade de efetuar acerca das 
cantigasde escárnio e maldizer, é muito oportuno que se dê voz ao crítico de 
literatura Massaud Moisés (2008), o qual nos oferece algumas palavras valiosas 
acerca deste tipo de cantigas:
Essas duas formas de cantiga satírica, não raro escritas pelos próprios 
trovadores que compunham a poesia lírico-amorosa, expressavam, como é fácil 
de depreender, o modo de sentir e de viver peculiares de ambientes dissolutos, e 
acabaram por ser canções de vida boêmia e marginal, que encontrava nos meios 
frascários e tabernários o seu lugar ideal. A linguagem em que eram vazadas 
admitia, por isso, expressões licenciosas ou de baixo calão: poesia “maldita”, 
descambando para a pornografia ou o mau gosto, possui escasso valor estético, 
mas em contrapartida documenta os meios populares do tempo, na sua linguagem 
e nos seus costumes, com uma flagrância de reportagem viva. 
TÓPICO 2 | O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA
31
“Visto constituir um tipo de poesia cultivado notadamente por jograis 
de má vida, era natural que propiciasse e estimulasse o acompanhamento 
de soldadeiras (= mulheres a soldo), cantadeiras e bailadeiras, cuja vida atirada e 
dissoluta fazia coro com as chulices presentes nos versos das canções.” (MOISÉS, 
2008, p. 28).
Isto posto, há que se ressaltar que, com o transcorrer do tempo, a sociedade 
e a economia portuguesas se desenvolveram, modificando-se consequentemente. 
Atrelada a estas mudanças, veio também a transformação da arte, da literatura. 
Transitava, assim, a Península Ibérica, de uma estrutura tipicamente feudal para 
um sistema econômico mercantil, com a consequente valorização da vida cortês 
(principalmente no reinado de D. Dinis – 1279-1325), a criação das primeiras 
universidades, a sustentação do espírito guerreiro e aventureiro do tempo das 
lutas pela Reconquista, a grande influência que o clero exercia: todo este conjunto 
de situações fomenta e cria as condições ideais para que se desenvolva, dentro da 
literatura portuguesa, a prosa, entre os séculos XII e XIV. 
 
A prosa medieval portuguesa se manifesta primeiramente através das 
chamadas novelas de cavalaria, as quais têm sua origem na França e derivam das 
canções de gesta – poemas da Idade Média, cantados em linguagem popular e 
que retratavam os feitos heroicos dos guerreiros. Dentro da literatura portuguesa, 
têm grande destaque enquanto obras de ficção escritas em prosa.
As Novelas de Cavalaria marcam a segunda etapa da literatura portuguesa 
do período medieval, as quais, caro/a acadêmico/a, você terá o prazer de estudar 
na seção a seguir. 
3 AS NOVELAS DE CAVALARIA
O desenvolvimento da vida cortesã e do amor cortesão na Europa, 
principalmente na França e na Inglaterra, a partir do século XII, impulsionou a 
difusão das novelas de cavalaria. Estas têm sua origem nas canções de gesta, a 
saber, poemas que tratam de aventuras de guerreiros. Transformados em prosa, 
foram traduzidos para diferentes línguas e rapidamente ganharam popularidade 
em toda a Europa, chegando também a Portugal. 
 
A tradição europeia da cavalaria estava em franca decadência e obteve 
nestas narrativas a sua compensação, já que estas novelas tratavam justamente 
de aventuras de cavaleiros andantes. Neste ponto, a respeito destas narrativas, 
poder-se-ia afirmar que se trata de uma “[...] novela a serviço do movimento 
renovador do espírito da cavalaria andante, nela o herói também está a serviço, 
não do senhor feudal, mas de sua salvação sobrenatural: uma brisa de teologismo 
varre a narrativa de ponta a ponta” (MOISÉS, 2008, p. 37). Ou seja, estas narrativas 
trazem em si traços de misticismo, de um desejo claro do herói pela busca de 
perfeição, pelo alcance de um ideal utópico de vida.
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
32
Nas narrativas destes cavaleiros, os heróis (cavaleiros) são sempre valentes, 
cuja vida é posta em constante perigo, o que destaca a coragem e o destemor destes 
valentes jovens heróis. Estes se colocam a serviço de belas damas e envolvem-se 
em aventuras amorosas, o que excita ainda mais os leitores medievais.
Estas aventuras amorosas perigosas destes destemidos guerreiros 
caracterizam o amor cortesão (ou fino amor). Este tipo de amor desenvolve-se 
geralmente fora do casamento, um amor que geralmente não se efetiva no plano 
real, pois é um amor virtual, adúltero. O cavaleiro geralmente se coloca diante 
da mulher como se estivesse diante de seu rei ou seu senhor, numa situação de 
vassalagem amorosa. Não raro, tal amor revela uma mulher que se encontra num 
patamar superior e inacessível, e um homem em situação de serventia (vassalo), 
como nas cantigas de amor.
Essa ideologia de amor cortesão mantém-se viva até fins do século 
XV, para ser retomado “[...] por uma forma absolutamente nova, o romance” 
(LUKÁCS, 2000, p. 39). O romance romântico tenta reaver nas suas narrativas o 
modelo cortesão, via mulher idealizada, amor platônico, sofrimento, final feliz.
Caro/a acadêmico/a! A propósito dos cavaleiros e suas aventuras, você poderia 
assistir a filmes como Excalibur, As Brumas de Avalon, Lancelot, entre os muitos que existem. 
Observe como são retratados os cavaleiros, as mulheres, as aventuras amorosas nas aventuras 
dos cavaleiros andantes.
NOTA
Para retomar o assunto que constitui o filão deste capítulo, muitas 
personagens citadas nas novelas de cavalaria tornaram-se famosas, e entre estas 
citem-se Lancelot, Tristão, Isolda, Galaaz. Em todos eles, observa-se a presença 
de um guerreiro concebido pela Igreja: herói casto, fiel, dedicado, escolhido para 
uma peregrinação mística, em luta por Deus e por sua dama.
Ainda dentro do assunto das novelas, em vista de uma questão didática, 
convencionou-se dividi-las em ciclos, como é demonstrado no quadro que segue:
TÓPICO 2 | O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA
33
CICLO ÉPOCA CARACTERÍSTICAS OBRAS
Carolíngio Império de 
Carlos Magno
As novelas tratam das batalhas 
entre os muçulmanos e os saxões, 
as aventuras de Carlos Magno e 
Os Doze Pares de França.
Canção de Rolando, 
Crônica de Turpin e 
Maynete.
Clássico Império de 
Alexandre 
Magno
Abordam temas retomados 
da antiguidade greco-romana 
(Troia, vida de Alexandre, 
aventuras de Eneias.
Romance de Tebas, 
Romance de Troia, 
Romance de Eneias.
Bretão ou 
arturiano
Século XII Exaltação religiosa, lirismo, 
sentimentalismo, devoção 
amorosa.
José de Arimateia, 
História de Merlim, 
A Demanda do 
Santo Graal.
FONTE: O autor 
QUADRO 1 – DIVISÃO DA NOVELA EM CICLOS
Caro/a acadêmico/a, com o intuito de instigar o espírito da leitura, 
oferecemos, a seguir, o resumo comentado de uma das novelas do Ciclo Clássico, 
Romance de Troia. Leia-o para sentir-se impelido/a à leitura de mais textos destas 
novelas.
ROMANCE DE TROIA
O Romance de Troia, que se compõe de mais ou menos trinta mil versos, 
remonta ao ano de 1160, cuja autoria pertenceria, segundo alguns pesquisadores, 
ao trovador Benoît de Sainte-Maure. O poema presta uma homenagem à obra de 
Homero, nomeadamente, à Ilíada e à Odisseia, dois poemas épicos da Antiguidade 
clássica grega, cujos temas heroicos fazem parte da origem desta obra.
E aqui poderia ser lembrada a intertextualidade, que se caracteriza por 
relações que um texto mantém com outros textos que o precedem. Neste caso, o 
Romance de Troia é antecedido pela Ilíada e pela Odisseia, o que permite dizer 
que existe uma relação intertextual entre ambos.
Retornando ao assunto do romance, o termo roman, na França, designava, 
nessa época, uma narração em verso e, mais tarde, em prosa escrita, em romance 
ou romanço, e contava as aventuras fabulosas ou os amores de heróis imaginários 
ou idealizados. Ao contrário das canções de gesta, que eram para ser cantadas, os 
romances eram para ser lidos, em voz alta, perante um grupo de pessoas.
O Romance de Troia é um dos primeiros romances medievais, escritos 
no reino de Leonor de Aquitânia, que se debruça sobre as lendas e osmitos da 
Antiguidade. O Romance de Troia distingue-se pela narrativa de índole política 
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
34
e pela importância e desenvolvimento dados ao amor cortês, e incide sobre a 
inevitável destruição que provocam as forças irracionais da Fortuna e do Amor, 
os deuses que simbolizam o destino e o amor.
Esta obra relata a queda de Troia desde a sua origem, a partir dos erros 
do rei Laomedon, ao ser incorreto para com Hércules e Jasão, até a destruição 
final da cidade. Inclui as quatro histórias de amor: Jasão e Medeia, Páris e Helena, 
Troilos e Briseida (que inspirou vários escritores, como Boccaccio e Shakespeare) 
e Aquiles e Polixena. A história de amor de Aquiles por Polixena conta a paixão 
irracional do grego pela troiana, que aquele conheceu na altura do resgate do 
corpo do troiano Heitor. Aquiles, que tinha vingado a morte do amigo Pátroclo, 
com a morte de Heitor, recusava-se a devolver o corpo do troiano à família. 
Numa comitiva troiana para resgatar o corpo de Heitor, encontrava-se Polixena, 
uma das filhas de Príamo, por quem Aquiles se apaixonou. Querendo casar 
com a jovem, Aquiles prometeu enganar os gregos e aliar-se aos troianos com a 
finalidade de obter o consentimento de Príamo. Numa emboscada, Aquiles foi 
morto por Páris, irmão de Polixena, e os troianos recuperaram o corpo de Heitor. 
Exigiram, então, que os gregos resgatassem o corpo de Aquiles. Esta é uma das 
versões da morte de Aquiles que surgiu, tardiamente, em relação à Ilíada. Outras 
acrescentaram que, antes da partida dos gregos, Polixena foi sacrificada sobre o 
túmulo de Aquiles, em memória do herói.
O Romance de Troia revela o interesse que os governantes medievais 
tinham pela mítica cidade que acreditavam ter existido e que estaria na origem 
do Império Romano. As Cruzadas contribuíram também para este renovado 
interesse sobre a Antiguidade Clássica e para a criação de histórias de amor, 
paixão, ambição, guerra e política que tinham lugar no Oriente. Estes romances, 
inspirados na cultura e nos ideais cortesãos, ressuscitaram as lendas clássicas, 
acrescentando-lhes pormenores, análises e comentários relativamente aos 
personagens e feitos.
FONTE: Adaptado de: Romance de Troia. In: Infopédia. Porto: Porto Editora, 2003. 
Disponível em: <www.infopedia.pt/$romance-de-troia>. Acesso em: 20 out. 2010.
Em síntese, no que se refere às novelas mais conhecidas, temos as lendas 
do Rei Artur e os Cavaleiros da Távola Redonda. O rei Artur tenta congregar sob 
seu comando cristãos e celtas, ao redor de uma mesa redonda – Távola Redonda 
– sem lugar principal (por isso redonda), a exemplo da mesa de Santa Ceia de 
Jesus Cristo, revelando a igualdade entre seus membros. Os cavaleiros principais 
seriam doze – como os apóstolos – e o mestre deles, Rei Artur, no papel de 
Cristo, representando o que é bom, santo e belo. O reino do Rei Artur, Camelot, 
cujo governo estava sob o comandado de uma figura masculina, opunha-se a 
Avalon, geralmente um lugar desconhecido, além do mar, sempre encoberto 
pelas brumas, sob o governo de mulheres iniciadas nos mistérios da mente, que 
podiam prever o futuro. O acesso a este misterioso lugar era exclusividade das 
sacerdotisas celtas e do Mago Merlim.
TÓPICO 2 | O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA
35
FONTE: De Giovanni (2007, p. 25)
FIGURA 5 – OS CAVALEIROS DA TÁVOLA REDONDA
Já a narrativa da Demanda do Santo Graal faz menção à lenda de José de 
Arimateia e como ele recolheu o sangue que Cristo verteu no momento de sua 
crucificação. Conta a história que o cavaleiro Percival vislumbra o cálice sagrado 
em que José de Arimateia depositara o sangue que escorreu do corpo de Jesus 
quando estava agonizando na cruz. Este cálice seria também o mesmo com que o 
Messias bebera na sua última ceia.
José de Arimateia, mais tarde, foi preso e libertado. Após muitas idas e 
vindas em viagens, instalou-se na Inglaterra e escondeu o cálice (Santo Graal) 
na floresta de Corberic. Os cavaleiros que estão à procura do Santo Graal são ao 
todo 150, mas somente o cavaleiro Galaaz consegue encontrá-lo, pois era virgem e 
puro de coração (ele nunca “conhecera” intimamente uma mulher). Assim, pode-
se perceber que, na Demanda do Santo Graal, o amor é pecaminoso, enquanto na 
lírica o amor é caminho para a felicidade. Tem-se, assim, uma inversão de valores. 
A procura pelo cálice sagrado, aos poucos, tornou-se o centro da imaginação 
cavaleiresca.
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
36
FONTE: De Giovanni (2007, p. 27)
FIGURA 6 – VERSÃO CRISTÃ DO SANTO GRAAL CATEDRAL DE VALÊNCIA
Um dos primeiros textos em prosa conhecidos em Portugal é a novela de 
cavalaria Amadis de Gaula, a qual oferece o paradigma do verdadeiro cavaleiro, 
ou seja, o tímido herói apaixonado pela donzela, no caso Oriana. Diferentemente 
das demais narrativas acerca do Rei Artur, em Amadis de Gaula, o leitor não 
se vê diante de um amor adúltero, mas, sim, um amor entre solteiros (tanto 
Amadis quanto Oriana eram livres). Portanto, não mais o amor se encontra no 
plano idealístico, platônico, mas sai deste plano para passar à esfera do físico. 
Assim, poder-se-ia dizer que em Amadis de Gaula está o prenúncio do homem 
renascentista e suas inquietações. Amadis é um herói valente, viril, mas, por outro 
lado, doente de amor por Oriana. A propósito do par de namorados em questão, 
faça-se eco ao comentário de Massaud Moisés (2008, p. 62):
O cavaleiro humaniza-se, desce à realidade cotidiana, a ponto de [...] 
casar-se sacramentalmente, embora em segredo, para oficializar a 
antiga relação amorosa com Oriana. Nascem daí os conflitos que agitam 
Amadis, não os padronizados pela tradição, mas os dum ser humano 
complexo, denso psicologicamente: o homem medieval começava a 
ceder vez ao homem concebido segundo os valores renascentistas, 
que então entravam a predominar. Amadis anuncia o herói moderno, 
de largo curso e influência no século XV e XVI, servindo de elo entre 
um mundo que mergulhava no ocaso, a Idade Média, e o outro que 
despontava, a Renascença.
Neste comentário, Moisés esclarece que, embora seja uma novela medieval, 
no seu texto encontram-se muitas marcas humanistas, o que faz a crítica acreditar 
num período de transição dos conceitos medievais para um período renascentista. 
Muitos críticos também afirmam que Amadis de Gaula foi a novela de cavalaria 
de maior expressão e importância escrita na Península Ibérica, embora nunca se 
tenha encontrado o verdadeiro autor e o texto original em português. 
TÓPICO 2 | O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA
37
No texto de Amadis de Gaula, são abordados temas como fidelidade 
à mulher amada, o desejo físico em flagrante oposição ao platonismo, o 
sentimentalismo e a timidez do herói, o amor cortês palaciano, as lutas e o ideal 
guerreiro, o sensualismo evidente, o desejo carnal masculino e o desejo carnal 
feminino – presente em Oriana.
Por fim, tanto Amadis como outros personagens homens representam 
o ideal cavaleiresco e continuamente envolvem-se em aventuras, na defesa 
de um reino, de uma mulher, uma causa e apresentam ao mesmo tempo um 
comportamento cavalheiresco, haja vista adotarem uma conduta de gentis-
homens em suas conquistas amorosas. É a aventura e a emoção andando de mãos 
dadas.
Caro/a acadêmico/a, aproveite para ler um trecho da novela Amadis de 
Gaula, apresentado a seguir:
COMBATES DE AMADIS E SALVAÇÃO DE ORIANA
Quando o outro cavaleiro viu tal destruição em seus companheiros, 
começou de fugir quanto mais podia. Amadis, que ia em pós ele, ouviu gritar 
a sua senhora; e, tornando prestes, viu Arcalaus já montado, tomando Oriana 
pelo braço, pô-la em frente a si e fugiu a todo galope. Sem detença, correu 
em sua perseguição, alcanço-o na larga campina e alçou a espada para o 
ferir. Sofreu-se, porém, de lhe dar grande golpe, porque a espada era tal que, 
matando-o a ele, matariasua senhora. Descarregou-lho por cima das espáduas, 
sem grande força; mas ainda lhe derribou um pedaço de loriga e um pouco de 
couro dos lombos. 
 
Então, Arcalaus, para melhor fugir, deixou cair por terra Oriana, com 
temor da morte. 
Amadis gritou-lhe:
 
– Arcalaus! Vem cá, e verás se estou morto como disseste!
 
Mas ele não quis ouvir e lançou fora o escudo. Amadis alcançou-o e 
deu-lhe de longe uma espadeirada na cinta, que lhe cortou a loriga e a carne e 
foi tocar na ilharga do cavalo. O animal amedrontado começou a correr de tal 
forma, que em pouco tempo se alongou a perder de vista.
 
Amadis, ainda que muito o desamasse e desejasse matar, não foi mais 
adiante para não perder a sua senhora, e voltou para onde ela estava. Desceu 
do cavalo, foi-se por de joelhos diante dela, beijou-lhe as mãos e disse:
 
– Agora, faça Deus de mim o que quiser, que nunca, senhora, cuidei 
tornar a ver-vos!
 
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
38
Oriana estava tão sobressaltada que não lhe podia falar; e abraçou-se 
com ele, com medo que tinha dos cavaleiros mortos, que jaziam a seus pés. A 
donzela de Dinamarca foi tomar o cavalo de Amadis; vendo por terra a espada 
de Arcalaus, pegou nela e trouxe-lhe dizendo:
 
– Vede, senhor, que formosa espada!
 
Amadis atentou nela e viu que era aquela com que o tinham deitado ao 
mar, e que Arcalaus lhe furtara, ao encantá-lo.
 
Estando assim, como ouvis, sentado junto de sua senhora, que não 
tinha ânimo para se levantar, chegou Gandalim, que andara toda a noite, e com 
que sentiram grande prazer. Também ele o sentiu, vendo o bom fim daquelas 
coisas.
FONTE: BARROS, João de. Amadis de Gaula. Tradução de Rodrigues Lapa. Lisboa: Gráfica 
Lisbonense, 1941. p. 36-37.
Após se tratar, na presente seção, das novelas de cavalaria, efetuar-se-
ão comentários (em algumas linhas somente, em virtude da escassez de espaço 
e tempo) acerca de três destas narrativas, e poder-se-ia dizer, consideradas 
principais, à guisa de conclusão, que elas foram grandes influenciadoras do 
romantismo português e brasileiro. Temas a exemplo do amor cortês, do 
cavalheirismo, do amor platônico, da pureza, da nobreza de caráter, da virtude, 
da lealdade, da religiosidade, do endeusamento da figura feminina são marcantes 
dentro do romantismo. 
E aqui valeria a pena trazer à baila o crítico Massaud Moisés (2008, p. 37), 
o qual, referindo-se às novelas de cavalaria, não hesita em classificá-las como 
de “[...] alto vigor narrativo e de elevada intenção” no que concerne a mostrar a 
imagem mística da idade medieval. Continua ainda o citado crítico classificando 
estas narrativas como sendo “[...] o maior monumento literário que a época 
nos legou no campo da ficção: exprime um utópico ideal de vida numa forma 
artisticamente elaborada, a ponto de alcançar um raro grau de perfeição estética 
na prosa do tempo”.
Então, caro/a acadêmico/a, você certamente se deparará com estes temas 
ao estudar a estética do romantismo, na terceira unidade. Finaliza-se, assim, o 
segundo tópico. No próximo, tratar-se-á da poesia, do teatro e da prosa humanista.
TÓPICO 2 | O PERÍODO MEDIEVAL: A POESIA E A PROSA TROVADORESCA
39
Caro/a acadêmico/a, a título de melhor fixar o conteúdo das novelas de 
cavalaria, propomos que você assista ao filme “Excalibur” (1981). Direção de John Boormann. 
Com Nigel Terry, Helen Mirren, Nicol Williamson. Procure observar o enredo e perceber 
como é feita a referência às Novelas de Cavalaria.
NOTA
40
RESUMO DO TÓPICO 2
Caro/a acadêmico/a, no presente tópico, você teve oportunidade de 
estudar aspectos importantes relacionados à Literatura Portuguesa, os quais 
revemos, resumidamente, a seguir:
• O início da literatura portuguesa traz a marca do lirismo trovadoresco.
• Dois períodos marcam o surgimento da literatura portuguesa: o primeiro, 
lírico, que cultivou a poesia lírica (cantigas), e o segundo, a prosa, trazendo as 
novelas de cavalaria, originárias das canções de gesta.
• O primeiro período da literatura portuguesa, marcado pelo florescimento das 
chamadas cantigas, recebe o nome de Trovadorismo, por serem estas cantigas 
poemas criados com o objetivo de que fossem cantados. Há quem atribua a 
origem deste tipo de poesia ao movimento das cruzadas, já que os fiéis se 
encontravam em Lisboa, que era a área portuária mais próxima para embarcar 
com destino a Jerusalém.
• Um papel fundamental era desempenhado pelos jograis, já que estes eram 
como que os atuais artistas ambulantes, que animavam festas, romarias, feiras, 
torneios, valendo-se, para isto, das melodias e canções. Por não haver intenção 
de registrá-las, muitas das cantigas foram perdidas.
• As cantigas de amigo caracterizam-se pela expressão do sentimento feminino, 
apesar de terem autoria masculina. O poeta assume o papel do eu lírico 
feminino, fazendo, via tal estratagema, esta “mulher” confidências à pessoa 
amada. 
• As cantigas de amor exprimem um sentimento masculino e são ambientadas 
em palácios. Sua origem é provençal e mostram um homem apaixonado, na 
condição de vassalagem, ou seja, apaixonado por uma dama de condição social 
superior. A mulher amada é alguém inacessível, que parece não atender aos 
seus apelos, principalmente porque é superior (nobre), enquanto ele (o homem 
que ama) um fidalgo, um decaído.
• Nas cantigas de gênero satírico, o eu lírico tem o objetivo de criticar o outro, 
procurando ridicularizar essa pessoa de forma sutil ou grosseira.
• As cantigas de escárnio encerram um tipo de ironia que é realizada por meio 
do sarcasmo, valendo-se de uma linguagem de sentido ambíguo, velada, mas 
sem deixar de lado certo humor. O objetivo sempre é satirizar alguém ou então 
comentar jocosamente alguma situação.
41
• As cantigas de maldizer satirizam de modo mais agressivo, de modo direto, 
“mais descobertamente”. Mais do que isto, o cunho destas cantigas é até 
difamatório, ocorrendo, inclusive, uma intenção difamatória, com o uso de 
palavrões e xingamentos.
• As cantigas satíricas valiam-se de temas como o amor interesseiro ou ilícito, o 
adultério, temas da política.
• As cantigas de cunho satírico (de escárnio e maldizer) apresentam, acima 
de tudo, um interesse histórico, principalmente por se tratar de textos que 
conseguem documentar a vida social da época, notadamente da corte.
• Estas narrativas trazem em si traços de misticismo, de um desejo claro do herói 
pela busca de perfeição, pelo alcance de um ideal utópico de vida. Os heróis 
(cavaleiros) colocam-se a serviço de belas damas e envolvem-se em aventuras 
amorosas, o que excita ainda mais os leitores medievais.
• O cavaleiro geralmente se coloca diante da mulher como se estivesse diante de 
seu rei ou seu senhor, numa situação de vassalagem amorosa.
• O romance romântico tenta reaver nas suas narrativas o modelo cortesão, via 
mulher idealizada, amor platônico, sofrimento, final feliz.
• Amadis de Gaula foi a novela de cavalaria de maior expressão e importância 
escrita na Península Ibérica, embora nunca se tenha encontrado o verdadeiro 
autor e o texto original em português. Nesta novela, poder-se-ia dizer que está 
o prenúncio do homem renascentista e suas inquietações.
42
Caro/a acadêmico/a, para que você possa melhor fixar o conteúdo 
deste tópico, apresentamos, a seguir, uma atividade. Procure resolvê-la com 
base no que você estudou.
1 Considere a cantiga apresentada, já transcrita em português moderno. 
Leia-a e, em seguida, responda algumas questões que são apresentadas:
 
a) Identifique o sentimento que a mulher expressa através desta cantiga.
b) Nas palavras da cantiga, tente descobrir o motivo deste sentimento.
c) Conforme é possível observar nas diferentes estrofes da cantiga, o sofrimento 
aumenta gradativamente. Isto considerado, explique a diferença existente 
no emprego dos seguintes verbos: dizer (“e bem vos digo”), pedir (“que 
peço”) e suplicar (“eu vos suplico”).
d) Procure valer-se da parte teórica do textopara explicar as características das 
cantigas de amigo que estão presentes neste texto. 
2 Releia o texto “Combates de Amadis e salvação de Oriana”, no final da 
terceira seção, e responda às seguintes questões:
a) Comente as semelhanças que poderiam ser observadas entre o relacionamento 
cavaleiro/senhora (mostradas nesse texto) e o relacionamento trovador/
senhora, das cantigas de amor.
b) Retire do texto a passagem (ou as palavras) que demonstram que estas 
narrativas (novelas) eram lidas em voz alta. 
AUTOATIVIDADE
Com esta saudade, amigo,
que me faz triste e coitada,
já não vivo; e bem vos digo:
que seja a vossa morada,
amigo, onde me possais
falar, e onde me vejais.
Não posso, onde não vos vejo,
viver, bem o podeis crer;
e é tão grande o meu desejo
que peço: vinde viver,
amigo, onde me possais
falar, e onde me vejais.
Nasci num dia fatal:
por Deus, amigo, abrandai
a minha pena e meu mal;
eu vos suplico: morai,
amigo, onde me possais
falar, e onde me vejais.
- Senhora, eu irei morar
Onde quiserdes mandar.
 (Don Dinis)
43
TÓPICO 3
A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO 
HUMANISMO PORTUGUÊS
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO
Em Portugal, os séculos XIII, XIV e XV constituem um período de 
renovação cultural, graças à introdução de uma nova estética literária – o 
Humanismo. Este período é muito propício ao desenvolvimento da prosa, haja 
vista o trabalho dos cronistas, notadamente Fernão Lopes, nomeado para o cargo 
de cronista-mor da Torre do Tombo, em 1434. Ele é considerado o precursor da 
crônica histórica lusitana. No que concerne ainda ao período humanista, tem-se 
como uma manifestação de grande valor o teatro popular, tendo como expoente 
Gil Vicente. Já a poesia, após haver conhecido um período de decadência nos 
anos de 1400, começa a desenvolver-se novamente, no ambiente dos palácios, 
influenciada por Dante Alighieri e Petrarca.
Em suma, esse novo período literário assinala a passagem de um país 
(Portugal) marcado por valores estritamente medievais para uma nação que 
traz a marca da realidade mercantil, com a ascensão dos ideais burgueses – a 
economia feudal (de subsistência) é calcada pelas atividades comerciais. Além 
disso, o pensamento do primeiro período medieval, que tinha como coluna 
mestra a figura de Deus (teocentrismo), dá lugar a uma nova maneira de pensar, 
em que a figura do homem passa a ser o centro – antropocentrismo.
Com este pensamento, que criou o ambiente propício para o surgimento de 
uma nova estética literária, marcada por “uma onda de realismo, de terrenalismo, 
de apego à natureza física” (MOISÉS, 2008, p. 42), passar-se-á, a seguir, a tratar 
especificamente de cada uma das três manifestações literárias marcantes do 
período humanista português.
“Toda a glória de viver das gentes é 
ter dinheiro, e quem muito quiser ter 
cumpre-lhe de ser primeiro o mais 
ruim que puder.”
(VICENTE, Gil. Auto da feira. 1527)
44
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
2 A PROSA: HISTORIOGRAFIA
Considerando-se, para início de conversa, a história de Portugal, sabe-se 
que, no ano de 1418, Fernão Lopes, um dos secretários da corte real, foi designado 
guarda-mor da Torre do Tombo. Este era um cargo importante e merecedor de 
grande confiança, haja vista a função que lhe estava reservada – chefe dos arquivos 
do Estado. E é justamente com este guarda-mor que se dá o início das crônicas 
históricas de Portugal, sendo este também o nome mais expressivo da prosa da 
época. Em suma, esse autor é também o criador da historiografia nacional na sua 
forma cronística, isto é, a biografia de uma grande personagem ou o relato de um 
grande sucesso.
Caro/a acadêmico/a, para efeito de conhecimento, explicamos o significado de 
GUARDA-MOR e CRONISTA-MOR. Guarda-mor é o posto mais alto assumido por alguém no cargo 
da guarda real. Seria o mesmo que chefe do corpo da guarda do reino. Mor é o mesmo que maior. 
Cronista-mor é o historiador principal, ou seja, o que tem delegação régia (do rei) para escrever a 
crônica ou a história de um reino.
NOTA
Por causa da probidade de suas narrativas, do seu cuidado na escolha 
do material a ser escrito, da sua ordenação, a preocupação com a clareza e 
composição estrutural da obra, entre outras qualidades, Fernão Lopes foi 
denominado “pai da história portuguesa” e também de “historiador superior a 
seu século”. Num comentário, expressa-se Douglas Tufano (1981, p. 32) acerca 
do guarda-mor lusitano afirmando: ”[...] muito cauteloso ao confrontar textos, 
ao interpretar episódios, ao apreciar fatos, Fernão Lopes nos deixou uma lição de 
ponderação diante da história que até hoje continua válida”. Sua sensibilidade, 
inteligência e habilidade em concatenar fatos, dados e versões diferentes de um 
mesmo episódio possibilitaram a construção de uma obra irretocável quer do 
ponto de vista histórico quer literário.
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
45
FONTE: De Giovanni (2007, p. 30)
FIGURA 7 – FERNÃO LOPES (1378-1459) 
O cronista em questão conseguiu criar a história de Portugal tomando 
como base documentos, deixando de lado testemunhos duvidosos ou frágeis, 
mantendo viva a chama da arte e não permitindo que prevalecesse seu ponto de 
vista pessoal acerca dos fatos. Suas crônicas colocavam em cena principalmente a 
nobreza, os feitos bélicos da nação lusitana. Fernão Lopes traz à baila ainda o povo, 
a nação como um todo, “[...] como um organismo vivo que gesta a história de seu 
país. O toque literário está nos detalhes, na constituição dos tipos psicológicos, 
na focalização dos dramas e dos amores, nas batalhas internas travadas pelos 
indivíduos e, sobretudo, no domínio da arte de contar histórias, mantendo o leitor 
interessado e atento.” (OLIVEIRA, 2000, p. 29). Por isso, poder-se-ia dizer com 
segurança que Fernão Lopes procura passar uma ideia até moderna da história, 
pois, para ele, a história de uma nação não era alicerçada puramente nas façanhas 
dos monarcas e cavaleiros, mas, ao contrário, também nos movimentos populares 
e nas forças econômicas. 
Em vista disto, o cronista-mor já apresentado, ao escrever suas crônicas de 
valor histórico, buscava reconstruir o clima, o contexto tratado. Ele não dedicava 
atenção somente ao ambiente da corte, mas também às aldeias, não somente aos 
combates dos exércitos, mas também às revoltas que se passavam nas ruas, não 
somente às alegrias das vitórias, mas também ao sofrimento das cidades sitiadas, 
não somente às festas, mas também às dores. Vê-se, assim, que, no trabalho de 
Fernão Lopes, prevalecia “[...] o seu interesse pelo lado humano dos fatos que 
determinavam a história [...], não poupando, inclusive, críticas a reis e nobres.” 
(TUFANO, 1990, p. 131).
Neste sentido, a visão de Fernão Lopes foi mais abrangente, diferentemente, 
talvez, da visão de outros cronistas medievais, a qual tendia à imparcialidade 
e à fragmentação. Ao contrário, ele apresenta de modo visual o panorama da 
sociedade lusitana, expondo a vida palaciana e suas contradições e vícios (ele que 
bem a conheceu intimamente), o movimento dos trabalhadores nas aldeias, as 
46
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
festas urbanas, a decadência da aristocracia, entre outros aspectos que podem ser 
observados nas suas narrativas.
Por adotar um modo diferente de elaborar as crônicas historiográficas, 
é justo que se concorde com Abdala Júnior e Paschoalin (1985, p. 23), quando 
estes dizem, acerca de Fernão Lopes, que “[...] a essa visão de conjunto associa-
se a visão de que o povo é agente das mudanças históricas. Não há a ideia da 
história factual feita por heróis individualizados. Nas crônicas não há o cavaleiro 
de aventuras monárquicas”.
Por causa de toda a sua genialidade na organização dos textos, do seu 
espírito crítico, da suavisão investigativa, da sua criatividade na maneira de 
narrar, do valor historiográfico das suas crônicas, mereceu destaque dentro 
da literatura portuguesa da Idade Média, fazendo-o, seguramente, o melhor 
prosador lusitano medieval.
A título de conhecimento, caro/a acadêmico/a, aproveite para ler um 
excerto de uma crônica de Fernão Lopes, o qual você já teve oportunidade de 
conhecer.
RETRATO DE D. PEDRO
Fernão Lopes
Este Rei D. Pedro era muito gago, e foi sempre grande caçador e 
monteiro, em sendo infante e depois que foi rei, trazendo grande casa de 
caçadores e moços de monte, e de aves, e cães, de todas as maneiras que para 
tais jogos eram pertencentes.
Ele era muito viandeiro, sem ser comedor mais que outro homem; 
que suas salas eram de praça em todos os lugares por onde andava, fartas de 
vianda, em grande abastança.
Ele foi grande criador de fidalgos de linhagem, porque naquele tempo 
não se costumava ser “vassalo”, senão filho, e neto, ou bisneto de fidalgo de 
linhagem; e por usança haviam então a quantia que ora chamam maravedis, 
dar-se no berço, logo que o filho do fidalgo nascia, e a outro nenhum não.
Este Rei acrescentou muito nas quantias dos fidalgos, depois da morte 
de el-Rei seu padre; cá, não embargando que el-Rei D. Afonso fosse comprido 
de ardimento e muitas bondades, tachavam-no, porém, de ser escasso, e em 
dar mui ledo; e tanto, que muitas vezes dizia que lhe afrouxassem a cinta, que 
então usavam não mui apertada, para que se lhe alargasse o corpo, para mais 
espaçosamente poder dar, dizendo que o dia que o rei não dava, não devia ser 
havido por rei.
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
47
Era ainda de bom desembargo aos que lhe requeriam bem e mercê; e tal 
ordenança tinha nisto, que nenhum era detido em sua casa por cousa que lhe 
requeresse.
Amava muito fazer justiça com direito. E, assim como quem faz 
correição, andava pelo Reino; e, visitada uma parte, não lhe esquecia de ir ver 
a outra; em guisa que poucas vezes acabava um mês em cada lugar de estada.
Foi muito mantenedor de suas leis, grande executor das sentenças 
julgadas; e trabalhava quanto podia das gentes não serem gastadas por azo de 
demandas e prolongados pleitos.
E se a escritura afirma que, por o Rei não fazer justiça, vêm as tempestades 
e tribulações sobre o povo; não se pode assim dizer deste; pois não achamos, 
enquanto reinou, que a nenhum perdoasse morte de alguma pessoa, nem que 
a merecesse por outra guisa, nem lha mandasse em tal pena por que pudesse 
escapar a vida.
A toda gente era galardoador dos serviços que lhe fizessem, e não 
somente dos que faziam a ele, mas dos que haviam feito a seu padre; e 
nunca tolheu a nenhuma cousa que lhe seu padre desse, mas mantinha-a e 
acrescentava nela.
Este Rei não quis casar depois da morte de D. Inês, em sendo infante, 
nem depois que reinou, lhe prouve receber mulher; mas houve amigas com 
que dormiu, e de nenhuma houve filhos, salvo de uma dona, natural da Galiza, 
que chamaram Dona Teresa, que pariu dele um filho que houve nome D. João, 
que foi mestre de Avis em Portugal, e depois rei, como adiante ouvireis. O qual 
nasceu em Lisboa, onze dias do mês de abril, às três horas depois do meio-dia, 
no primeiro ano do seu reinado. E mandou-o el-Rei criar, enquanto foi pequeno, 
a Lourenço Martins da Praça, um dos honrados cidadãos dessa cidade, que 
morava junto com a igreja catedral, onde chamam a Praça dos Canos; e depois 
o deu, que o criasse, a D. Nuno Freire de Andrade, Mestre da Cavalaria da 
Ordem de Cristo.
FONTE: SPINA, Segismundo. Presença da Literatura Portuguesa – Era Medieval. Rio de Janeiro: 
Bertrand Brasil, 1991. p. 98-100.
48
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
Caro/a acadêmico/a, importante que se apresente um pequeno glossário para 
que você possa compreender melhor o texto de Fernão Lopes. Procure efetuar uma segunda 
leitura da crônica, substituindo as palavras do original pelo sinônimo aqui colocado. Acredita-
se que isso permita que você tenha um melhor entendimento do texto.
Monteiro: caçador de monte; grande casa: grande quantidade; pertencentes: próprios; 
viandeiro: apreciador de carnes; salas: banquetes; de praça: franqueados a todos; criador: 
protetor; maravedis: remuneração dada pelos reis aos fidalgos que os serviam; não 
embargado: não obstante; comprido de ardimento: bem dotado de coragem, de intrepidez; 
apertamento de grandeza: mesquinhez; de bom desembargo: rápido, expedito no despacho; 
correição: visita do corregedor à comarca para emendar os danos e fazer justiça; trabalhava-
se: esforçava-se; gastadas: prejudicadas; por azo: por causa; Escritura: Bíblia; tolheu: tirou, 
confiscou.
NOTA
Sabe-se que o exercício da função de cronista da Torre do Tombo, Fernão 
Lopes o exerceu até 1454 e, entre as muitas obras que lhe são atribuídas, três 
merecem destaque: Crônica d’El-Rei D. Pedro, Crônica d’El-Rei D. Fernando e 
Crônica d’El-Rei D. João I. Apesar de considerado “[...] um extraordinário cronista, 
iniciador da historiografia portuguesa a sério e um notável escritor (MOISÉS, 
2008, p. 46), já com idade um tanto avançada, além de debilitado, Fernão Lopes 
é substituído por Gomes Eanes de Zurara, o qual figura entre os cronistas que 
legaram escritos que contribuíram para compor a historiografia lusitana. Sua obra 
mais expressiva é a Crônica da Tomada de Ceuta, Crônica dos Feitos da Guiné, 
Crônica de D. Pedro de Meneses e Crônica de D. Duarte de Meneses. Merecem 
reconhecimento também Vasco Fernandes de Lucena, do qual nenhuma obra se 
conhece, talvez porque deixa o cargo sem nada escrever, Rui de Pina, que deixou 
muitas crônicas, merecendo destaque a Crônica de D. Duarte, Crônica de D. 
Afonso e a Crônica de D. João II. 
Apesar de terem desempenhado a mesma função de Lopes, nenhum 
outro cronista conseguiu atingir a genialidade do primeiro cronista-mor. Por isso, 
a obra destes é considerada de menor importância em termos literários, inclusive 
por apresentar pouca expressividade em termos de renovação.
3 A PROSA DIDÁTICA
Há que se pensar, no entanto, que não foi somente a crônica histórica que 
abrilhantou literariamente o segundo período medieval lusitano. Importantes 
contribuições trouxeram também a prosa didática, a qual se constitui 
principalmente de textos doutrinários compostos ou traduzidos pela nobreza.
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
49
Este tipo de literatura desenvolveu-se principalmente durante os reinados 
de D. João I, D. Duarte e a regência de D. Pedro, períodos estes em que houve 
grande preocupação com o desenvolvimento da cultura de um modo geral. Neste 
sentido, vale lembrar a preocupação dos príncipes na organização de bibliotecas 
e com a escrita, já que muitos destes apresentaram certo interesse pela leitura.
Na prosa doutrinária, muito importante é mencionar-se a predominância 
dos temas religiosos e morais sobre os poéticos. E aqui valeria lembrar-se da 
encomenda da tradução de muitas obras estrangeiras, principalmente por 
iniciativa da nobreza mais culta que governava Portugal neste período. Tal fato 
muito contribuiu para o alargamento do horizonte dos idiomas.
Vista sob a ótica da utilidade, este tipo de literatura desenvolveu-se 
também durante os reinados de D. João I, D. Duarte e a regência de D. Pedro. E, 
ao que parece, um dos objetivos é com o uso da língua, procurando diferenciar a 
linguagem coloquial da linguagem tida como culta.
Para um melhor esclarecimento do objetivo deste tipo de literatura, que se 
dê voz a Massaud Moisés (2008, p. 47):
Ecoando o surto de humanização da cultura e a consolidação 
do absolutismo régio durante o reinado dos Avises, cultiva-se 
intensamente, ao longo do século XV, a prosa doutrinal e moralista. 
Servindo precipuamente à educação da realeza e da fidalguia, com 
o fito de orientá-la no convívio social e no adestramento físico para a 
guerra, não estranha que essa prosapedagógica fosse escrita sobretudo 
por monarcas. O culto do esporte, sobretudo o da caça, ocupa o 
primeiro lugar nessa pedagogia pragmática. As virtudes morais 
também se lembram e se enaltecem, mas sempre visando alcançar o 
perfeito equilíbrio entre a saúde do corpo e a do espírito.
No que se refere a obras de destaque deste período, importante mencionar-
se a denominada prosa doutrinária da corte de Avis, cuja relevância maior é para 
os seguintes escritos: Livro da montaria (de D. João I, que trata da caça), Ensinança 
de bem cavalgar toda sela (de D. Duarte, o qual exalta o prazer do esporte aliado 
à disciplina moral), Leal conselheiro (também de autoria de D. Duarte, propõe 
princípios e normas de conduta moral à nobreza), Virtuosa benfeitoria (escrito 
por D. Pedro, faz recomendações morais aos nobres), Livro de falcoaria (escrito 
por Pero Menino, ensina a tratar das doenças dos falcões).
Já no campo da prosa religiosa e mística, há que se destacar obras como o 
‘Horto do esposo’, escrita por um monge português que não revela o nome, a qual 
apresenta uma série de reflexões em torno de temas religiosos, ao mesmo tempo 
que apresenta histórias que demonstram exemplos em torno de determinadas 
virtudes que deveriam ser cultivadas. Outra obra de cunho doutrinador é ‘Boosco 
deleitoso’, a qual recebe grande influência do autor italiano Petrarca (trazendo 
inclusive partes que são tradução direta da obra do autor italiano) e narra a 
trajetória da alma na busca pela salvação e seu refúgio final em Deus. Esta obra é 
de autoria desconhecida.
50
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
A título de conhecimento, apresentamos, na sequência, um excerto de 
‘Boosco deleitoso’, cuja obra é oferecida pelo autor desconhecido à rainha Dona 
Leonor, esposa de D. João II:
NO HORTO APRAZÍVEL, EM COMPANHIA DAS VIRTUDES
Do homem mesquinho, desterrado e lançado no paraíso terreal e da 
bem-aventurança do paraíso espiritual, que é a casa da boa consciência et cetera.
Eu, sendo pecador e mui mesquinho, desterrado do paraíso terreal 
das mui doces deleitações polo pecado dos primeiros padres, e lançado em no 
vale da mesquinhidade deste mundo, padecia enel muitas coitas e trabalhos 
e mínguas e tribulações sem conto. E como quer que fossem grande mal e 
agravamento a mi, coitado, as pressas corporais deste segre, muito mais era 
grande a minha tribulaçom e mesquindade porque a minha alma era desterrada 
do seu paraíso espiritual, que ham as almas santas enesta vida, do qual se 
trespassam ao paraíso celestial.
Este paraíso espiritual da alma é a casa da boa consciência, em que 
é tanta abundaça de paz, que a abastença obedece e serve à castidade, e a 
devoçon se acosta à oração; e ali folga a humildade em no temor de Deus, e a 
pureza há folgança em o amor do Senhor Deus. Ali há limpeza do coraçom com 
a paz de Jesu Cristo per alegria, e a fé pura folga em na verdade. Ali a justiça 
despõe e ordena todas as cousas brandamente, e a temperança as tempera 
concordadamente. Ali a sabidoria ensina e a fortaleza a firma e a abstinência 
desseca toda sujidade de pecado e a esperança conforta e a humildade e a 
paciência reinam. Cá ali é o reino de Deus e o paraíso, u é o ajuntamento das 
virtudes; e porém a alma do homem virtuoso é em paraíso espiritual nesta vida 
presente.
Deste paraíso mui deleitoso era eu, mesquinho, desterrado, e lançado 
em na profundeza do lixo dos pecados, cá em na minha alma não era paz nem 
assessego; mais era movida e abalada com os movimentos turvos da carne, e 
eu queimado era com as chamas dos acendimentos carnais, e movediço era 
a todo odor luxurioso. O meu espírito era derribado e abaixado sob a carne, 
sem orvalho de limpeza; a minha carne era fagueira às deleitações carnais e 
desobediente aos usos e trabalhos espirituais e ajudador dos meus contrairos.
Afastado era do assossego divinal, movediço às injúrias que me fazerom 
e com toda perseguição. Nom havia firmeza da mente em nenhua cousa de 
boa andança nem de contraira. Em tal guisa era o meu estado, que me parecia 
que jazia em o inferno. Cá já começava de sentir aqui, em esta vida presente, 
as penas infernais e todo era de mui grandes trevas, que estavom e andavom 
sempre arredor de mi, em guisa que me parecia que sempre estava em lugar 
trevoso. 
FONTE: SPINA, Segismundo. Presença da Literatura Portuguesa – Era Medieval. Rio de Janeiro: 
Editora Bertrand Brasil, 1991. p. 75-76. 
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
51
Para uma leitura mais proveitosa do texto, observe a seguir o significado de 
algumas palavras: pressas: apertos, perigos; segre: mundo profano; abastença: abastança, 
fartura; acosta: apoia-se; cá: porque; u: onde; mais: mas.
NOTA
Ainda no que se refere à prosa didática e religiosa, mesmo que muitos 
críticos não a tomem muito em consideração enquanto literatura, há que se 
registrar o valor de tais escritos enquanto traduções de obras que são consideradas 
verdadeiros patrimônios da época medieval, outras, enquanto inéditas, pela sua 
grande importância didática para a história da formação da literatura lusitana, 
para o enriquecimento da língua e aquisição de sua expressividade literária. 
Por falar-se em literatura, outra manifestação do segundo período medieval, em 
Portugal, foi a poesia, a qual adquiriu novas feições, dissociada, agora, da música, 
diferentemente do que ocorria com as cantigas. Este assunto, caro/a acadêmico/a, 
tratá-lo-emos na seção a seguir.
4 LIRISMO: A POESIA MEDIEVAL PORTUGUESA
O lirismo português passa por um período de decadência após a morte 
de D. Dinis. Desenvolve-se mais o comércio, surge uma mentalidade nova, mais 
prática, sem clima para o desenvolvimento da poesia. Ao contrário, o interesse 
do público era outro: caça, assuntos morais, religiosos, por isso a prosa didática, 
estudada anteriormente.
Assim, já no reinado de D. Afonso V, “assiste-se a um novo clima na corte 
portuguesa, a qual apresenta maior requinte, uma vida palaciana mais sociável, 
maior propensão às atividades espirituais desinteressadas, o que poderia abrir 
caminho para uma melhor acolhida às obras poéticas”, conforme expõe Tufano 
(1981, p. 49). Desenvolve-se, assim, a Poesia Palaciana, feita por nobres e para a 
nobreza, ressaltando seus usos, seus costumes na vida da corte.
Esta poesia é de influência espanhola e se apresenta dissociada da música, 
passando a ser declamada, recitada, lida, o que requer técnica e expressão. A 
riqueza desta poesia, sua complexidade temática e formal tomam o lugar da 
singeleza e da espontaneidade das cantigas trovadorescas. Bem lembra José de 
Nicola (2003, p. 64) que “[...] isso ocasiona um maior apuro formal: os textos 
apresentam seu próprio ritmo e melodia, obtidos a partir da métrica, da rima, 
das sílabas tônicas e átonas”. E aqui é importante ressaltar a influência que esse 
52
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
tipo de poesia recebeu – Dante e Petrarca, poetas italianos que desenvolvem 
uma poesia mais estilizada. Por isso, o assunto gira em torno da mulher ideal, 
a saudade do tempo em que se foi feliz no amor, enfim, constitui-se um lirismo 
sentimental, sutil e sofisticado.
Acima de tudo, é nova a forma deste tipo de poesia: geralmente são versos 
de sete sílabas (as redondilhas maiores) e de cinco sílabas (redondilhas menores). 
Em geral, as poesias desenvolvem um tema colocado no início (mote), ou então se 
trava um debate entre dois poetas, em verso, sobre algum tema amoroso.
Essas poesias foram compiladas em 1516, à moda dos espanhóis, no 
chamado ‘Cancioneiro Geral’, por um frequentador da corte portuguesa – Garcia 
de Resende. Este livro constitui a mais importante fonte para o conhecimento da 
poesia nas cortes portuguesas do século XV. As poesias nele contidas datam a 
partir de 1450.
FONTE: De Giovanni (2007, p. 33)
FIGURA 8 – CANCIONEIRO GERAL
As poesias contidas no Cancioneiro Geralrevelam um novo formalismo 
poético, o qual poderia reduzir-se no seguinte esquema:
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
53
a) poesias com mote glosado:
1) Glosa: em que o mote é repetido textualmente em cada um de seus versos, no 
meio e no fim da estrofe.
2) Vilancete: com mote de um a três versos, seguido de volta ou voltas. Volta é 
a estrofe em que o mote é aproveitado, sem repetição textual. No vilancete, a 
volta tem sete versos, em que os quatro primeiros formam uma quadra, e os 
três restantes se ligam pela rima à quadra, e os três restantes se ligam pela rima 
à quadra e ao mote.
3) Cantiga: com mote de quatro ou mais versos, seguido de uma volta ou várias. 
As voltas têm oito a dez versos.
b) poesias sem mote: 
1) Esparsa: composição monostrófica, de oito a dezesseis versos.
2) Trova: composição com duas ou mais estrofes.
Para que você possa melhor compreender as explicações acerca dos tipos de 
poesias compostas na segunda fase lírica da era medieval portuguesa, caro/a acadêmico/a, 
veja o significado de “mote”, “glosa” e “volta”, segundo o Dicionário Houaiss:
Mote: estrofe, anteposta ao início de um poema, utilizada pelos poetas como motivo da obra, 
que desenvolve a ideia sugerida pela estrofe.
Glosa: tipo de composição poética que desenvolve um mote, em geral em tantas estrofes 
quantos são os versos deste e acabando cada estrofe com um deles.
Volta: cada um dos versos que repetem outros da estrofe inicial ou do mote; glosa poética.
NOTA
54
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
FONTE: De Giovanni (2007, 
p. 32)
FONTE: De Giovanni (2007, 
p. 34)
FIGURA 9 – FRANCESCO 
PETRARCA (1304-1374). 
FIGURA 10 – DANTE 
ALIGHIERI (1265-1321).
Para seu melhor conhecimento da poesia palaciana portuguesa, eis alguns 
exemplos. Leia-os com atenção e compare-os às características estudadas: 
Trovas à morte de D. Inês de Castro
(Garcia de Resende)
Qual será o coração 
tão cru, e sem piedade,
que lhe não cause paixão
ua tam grã crueldade
e morte tão sem razão?
Triste de mim, inocente,
que por ter muito fervente
lealdade, fé, amor,
ao príncipe meu senhor,
me mataram cruamente!
FONTE: Braga (2005, p. 196)
Que de meus olhos
(Rui Gonçalves)
Que de meus olhos partays
em qual quer parte questeys
em eu coraçam fycays
e nele vos converteys 
Este é o vosso luguar
Em que mays certa vos vejo,
por que nam quer meu desejo
que vos dy possays mudar.
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
55
E por ysso que partays,
em qual quer parte questeys 
em meu coraçam fycays
pois nele vos converteys.
FONTE: Braga (2005, p. 196) 
No texto da poesia apresentada, percebe-se o envolvimento íntimo do eu 
lírico por meio de sua confissão íntimo-amorosa, em que chega a afirmar que, 
mesmo que a pessoa amada se tenha ausentado, ela continuará presente por ter se 
transformado no coração do próprio poeta. Vê-se, também no poema a presença 
de uma linguagem simples e, em parte, a escrita se aproxima daquela dos dias 
atuais. 
De um modo geral, a produção poético-lírica deste período da Literatura 
de Portugal revela certa delicadeza lírica, uma musicalidade linguística, a riqueza 
imagética que se manteve oculta nas cantigas do Trovadorismo. Mais do que isso, 
há que se valorizar na nova poesia a formalidade que ela oferece, a se começar 
pela métrica, os ricos motivos de inspiração, a sua forma, o seu conteúdo. Acima 
de tudo, a sua riqueza está na influência de dois grandes poetas: Dante Alighieri 
e Francesco Petrarca.
5 TRADIÇÃO DRAMÁTICA: O TEATRO DE GIL VICENTE
Na transição entre o período medieval europeu e o Renascimento, há a 
presença do movimento intelectual, filosófico e artístico chamado Humanismo. 
Ele é marcado por ideias como o retorno ao cristianismo mais primitivo, valendo-
se, entre muitos aspectos, como a crítica ao luxo e a fuga do dito “bom caminho” 
pela Igreja Romana. Outro ponto ao qual se apegavam os humanistas era a 
valorização da cultura clássica greco-romana, via filosofia, literatura e história, 
apegando-se, por isso, aos aspectos mais racionais. Por esse motivo, a visão 
adotada pelos humanistas estava centrada no homem, colocando-o como o centro 
de toda História. Eis por que tem início o antropocentrismo, em contrariedade ao 
período anterior, cuja visão era teocêntrica. 
Grandes expoentes e disseminadores das ideias humanistas foram os 
italianos Francesco Petrarca e Dante Alighieri. Já Portugal tem Gil Vicente como o 
grande representante do Humanismo. Esse período, nas terras lusitanas, coincidiu 
com o período da grande expansão do reino português, via procura pelo caminho 
para as Índias e os consequentes descobrimentos que permitiram o alargamento 
do império (século XV).
56
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
Acerca da vida de Gil Vicente, pouco se sabe. Há quem diga que ele 
poderia ter nascido por volta de 1465, em Guimarães ou talvez em Beira. Sabe-se, 
porém, que ele se casou duas vezes e que esses casamentos tiveram como frutos 
cinco filhos, dos quais os mais conhecidos são Paula Vicente, que teve fama de 
ser uma mulher muito culta, e Luís Vicente, o qual se empenhou em organizar a 
primeira compilação das obras de seu pai.
No início do século XVI, ele já começava a fazer-se presente nos ambientes 
da corte, participando de competições poéticas que foram documentadas por 
Garcia de Resende no Cancioneiro Geral. Sabe-se também que o seu nome começa 
a despontar já em 1502, através da encenação do Auto da Visitação ou Monólogo 
do Vaqueiro, por ocasião do nascimento do príncipe D. João, futuro rei D. João 
III. Ao que se sabe, ele foi muito bem-sucedido nesta apresentação, e que por 
isso passou a dedicar-se à dramaturgia, estimulado por pessoas da corte e que 
possivelmente o financiavam. 
Na corte, dedicou-se ao ofício de dramaturgo e encenador durante o 
reinado de D. Manuel e D. João III. Foi nesta época que produziu mais de quarenta 
e quatro peças de teatro. Esse teatrólogo procurou manter-se preso às tradições 
medievais e fez, antes de tudo, um tipo de teatro de tom didático e moralizante, 
cujas raízes estavam fincadas no teocentrismo e nas ideias da salvação da alma. 
A respeito desse aspecto, que seja dada a palavra ao estudioso de Literatura 
Portuguesa Segismundo Spina (1991, p. 157): 
A sua autonomia intelectual, a ortodoxia das suas ideias religiosas e a 
coragem expressa no seu teatro de crítica social explicam o parentesco 
do seu ideário com o parentesco reformista do tempo; explicam 
também o prestígio de que gozou na corte, onde a proteção da Rainha 
Velha D. Leonor, viúva de D. João II, e logo a seguir a do próprio rei D. 
João III mantiveram o esplendor do teatro vicentino durante 34 anos.
FONTE: De Giovanni (2007, p. 41) 
FIGURA 11 – GIL VICENTE 
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
57
Há certa dificuldade para se estabelecer uma classificação mais precisa 
das peças criadas por Gil Vicente. Ele próprio as dividiu em três grupos: obras de 
devoção, farsas e comédias. Na sua compilação, Luís Vicente juntou um quarto 
gênero – a tragicomédia. Estudiosos mais contemporâneos preferem considerar 
os seguintes tipos: autos de moralidade, autos cavaleirescos e pastoris, farsas, 
alegorias de temas profanos. No entanto, há que se pensar que, muitas vezes, na 
mesma peça, podem ser encontrados elementos característicos de muitos desses 
tipos.
E este tipo de teatro recebeu, realmente, o nome de teatro popular por 
causa das suas características consideradas fundamentais – popular nos temas, 
popular na linguagem utilizada e popular nos atores. Gil Vicente, poder-se-ia 
dizer, explora o que é conhecido pelo povo para compor seu teatro, como bem o 
revela Douglas Tufano (1990, p. 148) em um comentário sobre o teatro vicentino: 
“Gil Vicente explora o trocadilho, os ditos populares, utiliza-se de falaresregionais, aproveita (como trovador que foi) a beleza da linguagem das cantigas 
e a suavidade dos hinos religiosos”.
É prudente acentuar-se que, antes de Gil Vicente, provavelmente não 
havia teatro em Portugal. O que havia, segundo se conhece, eram encenações de 
caráter religioso, cuja função era puramente catequética, com finalidades morais 
e éticas.
Caro/a acadêmico/a, é possível que antes de Gil Vicente tenha havido algum 
tipo de encenação muito simples em Portugal, a exemplo de outras partes da Europa, mas 
não se têm provas documentais concretas disto. Sabe-se, entretanto, da possível existência 
de breves representações, de caráter cavaleiresco, religioso, satírico ou burlesco (que provoca 
riso, zombaria), as quais foram denominadas momos, arremedilhos e entremezes (o momo 
seria o ator mímico ou a cena que ele representa; o arremedilho consistiria numa breve farsa 
ou sátira de costumes e o entremez, qualquer representação que servisse de intermezzo, ou 
seja, entreato). O documento mais antigo de que se tem conhecimento referente ao assunto 
remonta a 1193 e revela o pagamento que o rei D. Sancho I teria efetuado a dois jograis 
(Bonamis e Acompaniado) por seus arremedilhos. Afora isso, no Cancioneiro Geral, além de 
várias referências a momos e entremezes, encontram-se registros de peças dialogadas muito 
parecidas com teatros.
NOTA
Com o tempo, este tipo de teatro acabou por abandonar o palco das 
igrejas, o pátio dos templos religiosos (numa fase posterior) para chegar às feiras, 
mercados, aldeias, povoados e inclusive às cortes reais. Grande acolhida este 
teatro teve também nos reinos ibéricos de Castela, Leão, Navarra e Aragão. Por 
influência castelhana, acabou penetrando também em Portugal, via Gil Vicente, 
seguindo o exemplo de Juan de Encina (1468-1529).
58
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
Juan de Encina (1468-1529), teatrólogo espanhol, de vida aventurosa, 
terminando pelo ingresso na vida sacerdotal aos cinquenta anos, escreveu entre os catorze 
e os vinte e cinco anos a maior parte de suas obras, especialmente de caráter pastoril e 
religioso.
NOTA
Nas suas composições, Vicente procurou manter certa proximidade às 
suas influências medievais, fazendo, antes de tudo, um teatro que trazia a tônica 
didático-moralizante. Se, em parte, focalizavam-se as virtudes cristãs como 
objetivo a ser perseguido, procurava também não perder de vista a sociedade 
lusitana da época, trazendo-a à baila com um tom de humor e senso crítico, 
mantendo ali uma visão humanista. Para completar, eis o que diz Massaud 
Moisés (2008, p. 58): 
[...] o teatro vicentino se mostra lírico ou cômico (ou ainda cômico-
lírico): a predominância de temas ou duma visão medieval das coisas 
[...]. Neste tipo de teatro, Gil Vicente realiza-se mais pelo núcleo 
ideológico ou sentimental que pelas qualidades propriamente cênicas, 
elementares de todo, como é sabido.
Valendo-se de uma simplicidade que lhe era peculiar, Gil Vicente 
procurava passar ao público uma visão crítica da sociedade, deixando de lado a 
parcialidade: não distinguia classes sociais, colocava em cena nobres e plebeus, 
membros da política e cidadãos comuns, pobres e ricos, censurava a hipocrisia de 
qualquer que fosse o cidadão, incluindo entre estes os frades que pregavam e não 
colocavam em prática as virtudes, denunciava os exploradores das classes mais 
populares, colocava à vista de todos as imoralidades das prostitutas, os velhos 
sensuais, ridicularizava quem quer que fosse ou o defeito que ele considerava 
necessário. 
O teatro vicentino, então, constituiu-se num verdadeiro espetáculo 
formador de senso crítico das classes sociais lusitanas, não somente com o objetivo 
de divertir a sociedade, mas, ao contrário, com o cunho de destacar vícios que 
poderiam ser tidos como perniciosos numa sociedade e num tempo, objetivando, 
com isto, a recondução ao caminho considerado “do bem”. E para complementar 
esta ideia, importantes as palavras de Douglas Tufano (1981, p. 72), ao dizer este 
que “[...] o espírito medieval de Gil Vicente não encontra lugar na nova ordem 
que se vai construindo. Daí seu ataque ferino a todas as classes sociais, que são 
chamadas a uma reconsideração de atitudes e valores”. O seu trabalho, ao que 
parece, assenta-se sobre a base da fidelidade aos valores espirituais e à visão 
crítica.
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
59
Durante a sua vida, Gil Vicente foi autor de mais de uma quarentena de 
peças, as quais, para fins de estudo, podem ser divididas em diferentes fases, a 
saber:
I) A primeira fase compreende o período que vai de 1502 a 1508, tempo este que 
recebeu grande influência de Juan de Encina, principalmente nos primeiros 
tempos. Nesta fase, predominam os assuntos religiosos, tendendo para a lírica. 
Destacam-se neste período o Auto da Visitação ou Monólogo do Vaqueiro, 
Auto Pastoril Castelhano, Auto de São Martinho, Auto dos Reis Magos. 
II) Já a segunda fase transcorre entre os anos de 1508 a 1516, e neste período já 
passou a fase da influência castelhana. A preocupação de Vicente está dirigida 
aos problemas sociais suscitados pela expansão portuguesa e o relaxamento 
dos costumes. Gil Vicente, nesta época, trabalha mais com a crítica social. 
Destacam-se peças como Quem tem farelos?, Auto das Fadas, Auto da Índia, 
O Velho da Horta, Exortação da Guerra.
III) Por fim, a terceira fase, que se passa entre os anos de 1516 e 1536, é concebida 
pelos estudiosos como a época da maturidade do artista Gil Vicente. A sua 
produção dramática concebe um tom religioso e define grandes qualidades 
artísticas. Aparecem, neste período, obras carregadas com atitudes 
moralizantes explícitas, com grande representatividade dentro do teatro de 
costumes, a exemplo da Trilogia das Barcas (Auto da Barca do Inferno, Auto 
da Barca do Purgatório e Auto da Barca da Glória), Auto das Almas, Farsa de 
Inês Pereira, Auto da Feira, Floresta de Enganos, O Juiz da Beira. 
A Farsa de Inês Pereira pode ser vista como uma das mais complexas 
peças teatrais de Gil Vicente. Esta é uma comédia de costumes e uma marca do 
auge do trabalho do autor. A sua apresentação de estreia ocorreu no Convento de 
Tomar, para o rei D. João II, em 1523. 
Farsa significa uma representação popular com intenções de satirizar. Trata-se 
de pequena peça cômica popular, de concepção simples e de ação trivial ou burlesca, em 
que predominam gracejos, situações ridículas.
NOTA
Esta farsa caracteriza-se pela ilustração do dito popular “mais quero asno 
que me leve que cavalo que me derrube”. Através desta peça, o autor põe em 
ato personagens que encarnavam os elementos dessa comparação. O provérbio 
faz referência a três personagens da farsa: Asno (Pero Marques), Me (Inês, a 
protagonista que deseja se casar) e Cavalo, a figura do escudeiro. 
60
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
Depois de uma experiência amorosa malsucedida com o primeiro marido 
(o Escudeiro), Inês quer casar-se novamente, mas, desta vez, com alguém em 
quem possa mandar. Mais do que isso, anseia por uma vingança quanto ao 
primeiro casamento. Dizem os versos da peça:
“Andar! Pero Marques seja!
Quero tomar por esposo
Quem se tenha por ditoso
De cada vez que me veja.
Por usar de siso mero
Asno que me leve quero,
E não cavalo folão
Antes lebre que leão;
Antes lavrador que Nero.” (SPINA, 1991, p. 170)
A análise destes versos reporta a uma comparação entre dois personagens 
(Pero Marques e o Escudeiro) e suas respectivas atitudes a dois animais (o asno e 
o cavalo). Pero Marques apresenta maneiras de agir equiparáveis às de um asno 
(estúpido, ativo, persistente, serviçal e deselegante) – comuns estas ao animal 
comparado – e o escudeiro é o contrário de um cavalo (mentiroso, desleal, 
preguiçoso, cínico e perverso). Em comum, quem sabe, ele tem a elegância e a 
nobreza. Acerca disto, comenta Antônio Soares amora que:Gil Vicente ofendeu injustamente o cavalo, comparando-o a um homem 
que não tinha quaisquer virtudes. Aqui o autor falhou, não cumpriu o que 
propusera. Para ilustrar ‘o que me derrube’ bastava a escravização de Inês. [...] 
preocupou-se demasiadamente com vincar a inferioridade do Escudeiro em 
relação a Pero Marques – ou deu lugares à má vontade contra estes parasitas da 
corte.
Entre esta comparação existe uma simetria que apresenta certa perfeição, 
haja vista a necessidade que o autor sentiu de demonstrar que Pero Marques 
e Lianor (comadre casamenteira) eram superiores ao Escudeiro e aos judeus 
casamenteiros. Por sua vez, Inês não encontrou nenhuma felicidade no amor, 
mas, ao contrário, na vingança, graças à sua desilusão.
Inês despreza a proposta de Pero Marques, que é filho de um rico 
camponês. Ele é homem considerado tolo e ingênuo, por isso, Inês prefere casar 
com Brás da Mata, escudeiro malvestido e pobretão. No entanto, os sonhos de 
Inês logo se desfazem, pois o esposo logo revela sua verdadeira índole, passando 
a maltratá-la e explorá-la. Brás da Mata vai embora para a África e lá falece tempos 
depois. Inês, após ter aprendido com essa experiência, se dá conta da realidade e 
concorda em casar com Pero Marques, seu primeiro admirador. Logo também a 
jovem Inês aceita o galanteio de um falso ermitão. A peça chega ao seu fim com 
o esposo (cantado por ela como cuco, gamo e cervo, tradicionalmente concebidos 
como símbolos do homem traído) levando-a às costas (asno que me carregue) até 
a gruta em que vive o ermitão, para um encontro nada ingênuo.
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
61
Quanto aos personagens desta importante peça de Gil Vicente, importante 
apresentá-los a seguir, com algumas características:
INÊS PEREIRA: personagem fundamental, que constitui o eixo da peça. 
Primeiramente é solteira, preguiçosa, alegre, gosta de se divertir, sem preocupações 
com luxo e riquezas. Deseja um homem que lhe possa proporcionar vida alegre. 
Aparece mais tarde casada, estranhando as imposições do marido, porém aceita a 
obediência e lhe é fiel. Num terceiro momento, vê-se a Inês de Pero Marques, com 
um comportamento desumano, desleal, provocado pelo escudeiro. Essa é a Inês 
má, que desacredita os homens e o amor.
PERO MARQUES: segundo marido de Inês, comparado ao asno. É um homem 
estúpido, ingênuo e honesto. Seu desejo é a felicidade sua e poder espalhá-la à 
sua volta. É um personagem cômico, um homem trabalhador e que conseguiu 
juntar um pouco de dinheiro com o passar dos anos.
ESCUDEIRO BRÁS DA MATA VALO: é uma figura bastante importante na peça. 
É o primeiro marido de Inês, comparado ao cavalo. Ele transforma Inês numa 
pessoa vingativa e explora a ingenuidade de Pero.
LIANOR VAZ: é a confidente e ajuda os expectadores a conhecer os sentimentos 
e intenções de Inês e de Pero. Ela mostra o enredo da peça.
MÃE: Tenta lutar pela felicidade da filha, que está iludida quanto à sua escolha, 
da qual se arrepende. É extremamente compreensiva quanto às opções da filha e 
aceita a comemoração das bodas.
JUDEUS CASAMENTEIROS: são pessoas indiferentes aos preceitos morais, 
conhecem os defeitos do Escudeiro, não ignoram que Inês seja uma pessoa 
preguiçosa, vaidosa e insensata. São inteligentes, seguem seus próprios caprichos 
e vingam-se com ironia.
MOÇO (AJUDANTE DO ESCUDEIRO): é um confidente que faz conhecer a vida, 
os sentimentos e as intenções do Escudeiro.
ERMITÃO: vive eternamente solitário, dedicado à salvação das almas e ao serviço 
a Deus. Representa os falsos religiosos. 
Caro/a acadêmico/a, apresentamos alguns dados sobre uma das peças 
de Gil Vicente, para que você possa conhecer o conteúdo (em parte) do teatro 
português do período medieval. Lembre-se de que o elemento básico para a 
composição das peças era vida diária, a vida real das pessoas e a doutrina cristã. O 
objetivo era a busca pelo caminho considerado melhor, seja por parte das pessoas 
comuns, da corte ou da Igreja. Visto sob esta ótica, Gil Vicente poderia ter sido 
considerado reformador da sociedade. 
62
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
As palavras da estudiosa do teatro vicentino, Carolina Michaelis de 
Vasconcelos, muito bem podem resumir o teatrólogo lusitano medieval. Diz esta 
crítica que Gil Vicente era mais que um poeta. Ele era também um pensador, um 
cristão que vivia sua fé num mundo medieval. Diz ela ainda que “[...] colocado 
nos umbrais do tempo moderno, emancipado, e só de leve atingido pelo bafo 
humanista do Renascimento com seus gozos intelectuais e aristocráticos, ele 
tinha sempre em mente o mundo do além.” (VASCONCELOS, 1949, p. 38). Tinha 
grande preocupação com a salvação das almas e com boa maneira de cada um 
empregar no dia a dia cada capítulo da vida que é vivido no mundo terreno. 
E completa: “Tinha simpatia pelos humildes, ingênuos e perseguidos; antipatia 
pelos prevaricadores e devassos.” (VASCONCELOS, 1949, p. 38).
Caro/a acadêmico/a, também para aguçar o seu espírito de leitura e 
conhecimento, considerando que você é estudante de Letras, oferecemos a leitura 
de um excerto de uma peça de Gil Vicente. Leia-o com carinho e observe as 
personagens, as falas, a linguagem da época. Boa leitura!
AUTO DA BARCA DO INFERNO 
(Gil Vicente)
Auto de moralidade composto por Gil Vicente por contemplação da 
sereníssima e muito católica rainha Lianor, nossa senhora, e representado por 
seu mandado ao poderoso príncipe e mui alto rei Manuel, primeiro de Portugal 
deste nome. 
Começa a declaração e argumento da obra. Primeiramente, no presente 
auto, se fegura que, no ponto que acabamos de espirar, chegamos subitamente 
a um rio, o qual per força havemos de passar em um de dous batéis que naquele 
porto estão, um deles passa pera o paraíso e o outro pera o inferno: os quais 
batéis tem cada um seu arrais na proa: o do paraíso um anjo, e o do inferno um 
arrais infernal e um companheiro. 
O primeiro intrelocutor é um Fidalgo que chega com um Paje, que lhe 
leva um rabo mui comprido e üa cadeira de espaldas. E começa o Arrais do 
Inferno ante que o Fidalgo venha. 
DIABO: À barca, à barca, houlá! 
que temos gentil maré! 
- Ora venha o carro a ré! 
COMPANHEIRO: Feito, feito! 
Bem está! 
Vai tu muitieramá, 
e atesa aquele palanco 
e despeja aquele banco, 
pera a gente que virá. 
À barca, à barca, hu-u! 
Asinha, que se quer ir! 
Oh, que tempo de partir, 
louvores a Berzebu! 
- Ora, sus! que fazes tu? 
Despeja todo esse leito! 
COMPANHEIRO: Em boa hora! 
Feito, feito! 
DIABO: Abaixa aramá esse cu! 
Faze aquela poja lesta 
e alija aquela driça. 
COMPANHEIRO: Oh-oh, caça! 
Oh-oh, iça, iça! 
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
63
DIABO: Oh, que caravela esta! 
Põe bandeiras, que é festa. 
Verga alta! Âncora a pique! 
- Ó poderoso dom Anrique, 
cá vindes vós?... Que cousa é esta?... 
Vem o Fidalgo e, chegando ao batel 
infernal, diz: 
FIDALGO: Esta barca onde vai ora, 
que assi está apercebida? 
DIABO: Vai pera a ilha perdida, 
e há-de partir logo ess'ora. 
FIDALGO: Pera lá vai a senhora? 
DIABO: Senhor, a vosso serviço. 
FIDALGO: Parece-me isso cortiço... 
DIABO: Porque a vedes lá de fora. 
FIDALGO: Porém, a que terra 
passais? 
DIABO: Pera o inferno, senhor. 
FIDALGO: Terra é bem sem-sabor. 
DIABO: Quê?... E também cá 
zombais? 
FIDALGO: E passageiros achais 
pera tal habitação? 
DIABO: Vejo-vos eu em feição 
pera ir ao nosso cais... 
FIDALGO: Parece-te a ti assi!... 
DIABO: Em que esperas ter 
guarida? 
FIDALGO: Que leixo na outra vida 
quem reze sempre por mi. 
DIABO: Quem reze sempre por 
ti?!... 
Hi, hi, hi, hi, hi, hi, hi!... 
E tu viveste a teu prazer, 
cuidando cá guarecer 
por que rezam lá por ti?!... 
Embarca - ou embarcai... 
que haveis de ir à derradeira! 
Mandai meter a cadeira, 
que assi passou vosso pai. 
FIDALGO: Quê? Quê? Quê? Assi 
lhe vai?! 
DIABO: Vai ou vem! Embarcai 
prestes! 
Segundo lá escolhestes, 
assi cá voscontentai. 
Pois que já a morte passastes, 
haveis de passar o rio. 
FIDALGO: Não há aqui outro 
navio? 
DIABO: Não, senhor, que este 
fretastes, 
e primeiro que expirastes 
me destes logo sinal. 
FIDALGO: Que sinal foi esse tal? 
DIABO: Do que vós vos 
contentastes. 
FIDALGO: A estoutra barca me 
vou. 
Hou da barca! Para onde is? 
Ah, barqueiros! Não me ouvis? 
Respondei-me! Houlá! Hou!... 
(Pardeus, aviado estou! 
Cant'a isto é já pior...) 
Oue jericocins, salvanor! 
Cuidam cá que são eu grou? 
ANJO: Que quereis? 
FIDALGO: Que me digais, 
pois parti tão sem aviso, 
se a barca do Paraíso 
é esta em que navegais. 
ANJO: Esta é; que demandais? 
FIDALGO: Que me leixeis 
embarcar. 
Sou fidalgo de solar, 
é bem que me recolhais. 
ANJO: Não se embarca tirania 
neste batel divinal. 
FIDALGO: Não sei porque haveis 
por mal 
que entre a minha senhoria... 
ANJO: Pera vossa fantesia 
mui estreita é esta barca. 
FIDALGO: Pera senhor de tal marca 
nom há aqui mais cortesia? 
Venha a prancha e atavio! 
Levai-me desta ribeira! 
ANJO: Não vindes vós de maneira 
pera entrar neste navio. 
Essoutro vai mais vazio: 
a cadeira entrará 
e o rabo caberá 
e todo vosso senhorio. 
Ireis lá mais espaçoso, 
64
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
vós e vossa senhoria, 
cuidando na tirania 
do pobre povo queixoso. 
E porque, de generoso, 
desprezastes os pequenos, 
achar-vos-eis tanto menos 
quanto mais fostes fumoso. 
DIABO: À barca, à barca, senhores! 
Oh! que maré tão de prata! 
Um ventozinho que mata 
e valentes remadores! 
Diz, cantando: 
Vós me veniredes a la mano, 
a la mano me veniredes. 
FIDALGO: Ao Inferno, todavia! 
Inferno há i pera mi? 
Oh triste! Enquanto vivi 
não cuidei que o i havia: 
Tive que era fantesia! 
Folgava ser adorado, 
confiei em meu estado 
e não vi que me perdia. 
Venha essa prancha! Veremos 
esta barca de tristura. 
DIABO: Embarque vossa doçura, 
que cá nos entenderemos... 
Tomarês um par de remos, 
veremos como remais, 
e, chegando ao nosso cais, 
todos bem vos serviremos. 
.......................................
Vem um Frade com üa Moça pela 
mão, e um broquel e üa espada 
na outra, e um casco debaixo do 
capelo; e, ele mesmo fazendo 
a baixa, começou de dançar, 
dizendo: 
FRADE: Tai-rai-rai-ra-rã; ta-ri-ri-
rã; 
ta-rai-rai-rai-rã; tai-ri-ri-rã: 
tã-tã; ta-ri-rim-rim-rã. Huhá! 
DIABO: Que é isso, padre?! Que 
vai lá? 
FRADE: Deo gratias! Som 
cortesão. 
DIABO: Sabês também o tordião? 
FRADE: Porque não? Como ora sei! 
DIABO: Pois entrai! Eu tangerei 
e faremos um serão. 
Essa dama é ela vossa? 
FRADE: Por minha la tenho eu, 
e sempre a tive de meu, 
DIABO: Fezestes bem, que é fermosa! 
E não vos punham lá grosa 
no vosso convento santo? 
FRADE: E eles fazem outro tanto! 
DIABO: Que cousa tão preciosa... 
Entrai, padre reverendo! 
FRADE: Para onde levais gente? 
DIABO: Pera aquele fogo ardente 
que nom temestes vivendo. 
FRADE: Juro a Deus que nom t'entendo! 
E este hábito no me val? 
DIABO: Gentil padre mundanal, 
a Berzebu vos encomendo! 
FRADE: Corpo de Deus consagrado! 
Pela fé de Jesu Cristo, 
que eu nom posso entender isto! 
Eu hei-de ser condenado?!... 
Um padre tão namorado 
e tanto dado à virtude? 
Assi Deus me dê saúde, 
que eu estou maravilhado! 
DIABO: Não curês de mais detença. 
Embarcai e partiremos: 
tomareis um par de ramos. 
FRADE: Nom ficou isso n'avença. 
DIABO: Pois dada está já a sentença! 
FRADE: Pardeus! Essa seria ela! 
Não vai em tal caravela 
minha senhora Florença. 
Como? Por ser namorado 
e folgar com üa mulher 
se há um frade de perder, 
com tanto salmo rezado?!... 
DIABO: Ora estás bem aviado! 
FRADE: Mais estás bem corregido! 
DIABO: Devoto padre marido, 
haveis de ser cá pingado...
..........................................
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
65
Vêm Quatro Cavaleiros cantando, 
os quais trazem cada um a Cruz 
de Cristo, pelo qual Senhor e 
acrecentamento de Sua santa 
fé católica morreram em poder 
dos mouros. Absoltos a culpa e 
pena per privilégio que os que 
assi morrem têm dos mistérios 
da Paixão d'Aquele por Quem 
padecem, outorgados por todos os 
Presi- dentes Sumos Pontífices da 
Madre Santa Igreja. E a cantiga que 
assi cantavam, quanto a palavra 
dela, é a seguinte: 
CAVALEIROS: À barca, à barca 
segura, 
barca bem guarnecida, 
à barca, à barca da vida! 
Senhores que trabalhais 
pola vida transitória, 
memória, por Deus, memória 
deste temeroso cais! 
À barca, à barca, mortais, 
Barca bem guarnecida, 
à barca, à barca da vida! 
Vigiai-vos, pecadores, 
que, depois da sepultura, 
neste rio está a ventura 
de prazeres ou dolores! 
À barca, à barca, senhores, 
barca mui nobrecida, 
à barca, à barca da vida! 
E passando per diante da proa do 
batel dos danados assi cantando, com 
suas espadas e escudos, disse o Arrais 
da perdição desta maneira: 
DIABO: Cavaleiros, vós passais 
e nom perguntais onde is? 
1º CAVALEIRO: Vós, Satanás, 
presumis? 
Atentai com quem falais! 
2º CAVALEIRO: Vós que nos 
demandais? 
Siquer conhece-nos bem: 
morremos nas Partes d'Além, 
e não queirais saber mais. 
DIABO: Entrai cá! Que cousa é essa? 
Eu nom posso entender isto! 
CAVALEIROS: Quem morre por Jesu 
Cristo não vai em tal barca como essa! 
Tornaram a prosseguir, cantando, seu 
caminho direito à barca da Glória, e, 
tanto que chegam, diz o Anjo: 
ANJO: Ó cavaleiros de Deus, 
a vós estou esperando, 
que morrestes pelejando 
por Cristo, Senhor dos Céus! 
Sois livres de todo mal, 
mártires da Santa Igreja, 
que quem morre em tal peleja 
merece paz eternal. 
E assi embarcam.
FONTE: VICENTE, Gil. Os Autos das Barcas. Porto: Publicações Europa-América, 1973. p. 28-56.
66
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
LEITURA COMPLEMENTAR
GIL VICENTE
Fidelino de Figueiredo
Durante os trinta e quatro anos da sua carreira dramática, Gil Vicente anima 
os serões dos Paços da Ribeira, de Lisboa e dos lugares onde pousava a corte nas 
suas constantes viagens pelo país, anima-os com a representação dos seus autos 
e as surpresas das suas aquisições artísticas, porque o gênero novo, que em 1502 
tomara de Juan de Encina, vai ampliando o seu alcance, a sua composição e o seu 
interesse emotivo. Através das três fases da sua evolução, o poeta vai definindo 
um gênero novo, o auto, antagônico da comédia clássica.
 
E em que se opunha o auto vicentino ao teatro clássico, tal como os 
antigos ensinavam? Essencialmente nestas coisas: enquanto o teatro clássico ia 
caminhando para a concentração dos seus efeitos emotivos pela prática rigorosa da 
disciplina das unidades de ação, de tempo e de lugar, de limitação do número de 
personagens, de eliminação de todos os elementos antidramáticos e de unificação 
ou homogeneidade do seu tom, o auto de Gil Vicente caminhava para a ampliação 
dos seus temas, para o aumento da população do palco, para uma duração cada 
vez maior da ação, não da representação, e para a mais audaciosa justaposição dos 
lugares. Os antigos haviam fixado um quadro de motivos cênicos para certo grau 
de cômico; Gil Vicente desce até o burlesco mais plebeu e abre o seu proscênio a 
todas as classes sociais, dos papas, imperadores e reis aos fidalgos arruinados e 
aos borrachos das vilelas, uma vez que sejam tipos reais do seu tempo e do seu 
meio. Junta fugas de lirismo ao drama das almas e ao conflito dos interesses, à 
hipocrisia e à velhacaria humana; não hesita em adotar convenções e simbologias, 
e não se detém no exercício das maiores liberdades. Regressa à origem, a uma 
fase que talvez o teatro grego tivesse percorrido com autores desaparecidos, mas 
que só vemos recapitulada no moderno teatro russo. É um teatro libérrimo, que 
recomeça a sua vida e a sua experiência, alheio à vida já vivida pelos antigos, 
parte outra vez ab ovo (desde o princípio), com a consciência orgulhosa de quem 
servia um povo exaltado a uma febre heroica e criadora.
Esse teatro vicentino é a coisa maior da dramaturgia primitivapeninsular. 
Expressa uma continuidade fiel do espírito da Idade Média, do seu goticismo puro, 
desse idealismo ingênuo e transcendente dos painéis dos pintores primitivos, em 
que os homens viviam vida dúplice, com um pé na terra e outro no céu, aliando 
na sua consciência o mais grosseiro materialismo das preocupações terrenas com 
a mais alada fé num além copiado desse terreno cenário, só mundificado das suas 
bastardas aderências. Gil Vicente conheceu e desdenhou as importações novas 
da poesia italianizante; obstinou-se no emprego dos velhos metros; teimou em 
achar dia a dia a sua própria maneira. Da Renascença só tomou o drama social, os 
reflexos morais e essa atitude crítica ou erasmista da Pré-Reforma religiosa. 
TÓPICO 3 | A PROSA, A POESIA E O TEATRO: A ESTÉTICA DO HUMANISMO PORTUGUÊS
67
A forma dramática nova, o auto, que ele define, perpetua-se em Portugal, 
mas sem movimento. Os seus continuadores, Afonso Álvares, Ribeiro Chiado, 
Antônio Prestes, Gil Vicente de Almeida (seu neto), Jerônimo Ribeiro, Baltasar 
Dias, o próprio Camões, e muitos outros recapitulam os caracteres deste seu 
teatro poético peninsular, que era um ponto de partida e tinha um conteúdo a 
diferenciar. É na Espanha que o auto há de seguir sua carreira triunfal e conduzir 
ao esplendor dramático da língua castelhana com Lope da Veja, Guillén de Castro, 
Tirso de Molina, Ruiz de Alarcón, Vélez de Guevara, Calderón de La Barca e 
Moreto – triunfo que não foi atingido sem luta áspera com a comédia clássica.
Gil Vicente é um bom exemplo da fecundidade do ponto de vista 
comparativo para o estudo das literaturas peninsulares. Aquele caráter beirão 
do ambiente de seus autos satíricos, que impressionou Mr. Aubrey Bell, explica-
se facilmente por esse método comparativo: é imitado de Juan de Encina e 
corresponde ao caráter “saiaguês” do poeta favorito dos Duques de Alba.
Saiaguês significa, literalmente, o falar típico da comarca de Saiago, 
inçado de regionalismos e arcaísmos, obsoletos, fora dos confins da província 
de Zamora. Menendez y Pelayo cria que o “saiaguês” fosse uma geringonça 
convencional de origem literária. Devia ser uma coisa e outra: autêntica na base 
ou no ponto de partida e artificial no superior uso literário. Um fenômeno análogo 
ao moderno galego literário: autêntico na sua base oral ou vivo e artificial, inçado 
de portuguesismos e neologismos arbitrários, como linguagem literária. 
Saiago era uma Beócia castelhana. Os saiagueses, isolados na sua vida 
pastoril, eram insociáveis, obstinados nos seus hábitos primitivos, no seu falar 
cerrado e nos seus trajes peculiares. Formavam um singular contraste com os 
castelhanos de Toledo distante – um ambiente de corte e cultura, que havia de 
sugerir ao Cardeal Cisneros a sua Universidade de Alcalá – ou mesmo com a 
gente de Salamanca e os familiares dos Duques de Alba, a quem eram destinadas 
as peças dramáticas de Encina. [...]
De um lado e do outro daquela Beócia leoneso-portuguesa se diziam 
provincianismos análogos, com aqueles desnorteadores “samicas”, “soncas” e 
“algorrem”. Portanto, o regionalismo beirão dos autos não sugere que Gil Vicente 
fosse natural de Beira, como quer Mr. Aubrey Bell, o primeiro a pô-lo em relevo, 
mas documenta que os autos vicentinos foram primitivamente beirões, pelo 
idioma e pelo ambiente, como imitação próxima ou fiel das éclogas dramáticas 
de Encina, “saiaguesas” pela língua e pelo meio representado.
FONTE: FIGUEIREDO, Fidelino de. História literária de Portugal. Rio de Janeiro: Fundo de 
Cultura, 1980. p. 121-123.
Caro/a acadêmico/a, chegamos ao final do nosso terceiro tópico e, à 
guisa de conclusão, apresentamos um comentário acerca dos estudos que você 
pôde efetuar neste tópico. O tópico final da nossa primeira unidade tratou 
mais especificamente da literatura do período humanista lusitano. Este período 
literário-cultural faz a transição entre o medievo e a época renascentista, marcado 
68
UNIDADE 1 | LITERATURA PORTUGUESA: ORIGENS E ESCOLAS LITERÁRIAS DO PERÍODO MEDIEVAL
que é por um tempo em que as relações sociais passam por muitas mudanças, 
principalmente o nascimento da burguesia mercantilista, a qual contribui para 
o desenvolvimento do comércio, a laicização da cultura, o desenvolvimento do 
pensamento mais racional e a preocupação com os valores humanos. Tudo isto 
possibilita que aflorem as ideias antropocentristas, que marcam profundamente 
o Humanismo.
E dentro da literatura também o novo pensamento deixa suas marcas, 
principalmente a partir dos pensamentos de Dante Alighieri e Francesco Petrarca. 
Suas influências na literatura permitem que os escritos passem a retratar um novo 
homem, o ambiente passa a ser a corte e entram em cena novas produções, entre 
estas a prosa (crônicas que têm como centro os reis e o povo), a poesia palaciana 
e o teatro.
Nas crônicas, as atenções se voltaram para os relatos acerca dos reis e 
do povo português. A poesia palaciana marca o desvinculamento da poesia 
trovadoresca, passando a ser lida ou declamada. A nova poesia reflete a 
sensibilidade e o modo de vida da corte. A seu turno, o teatro inicia com Gil 
Vicente, e traz como marca a presença de elementos ideológicos que buscam a 
inovação e a polêmica com vistas à crítica da sociedade da época.
E uma sociedade mais crítica, mais pensante, mais racional, torna-se mais 
criativa, mais inventiva e progride. Com as atenções voltadas ao homem, vieram 
os inventos, a ampliação geográfica de muitos territórios, entre eles Portugal, 
disseminaram-se muitas e novas teorias, as quais contribuíram para renovar as 
ideias. Renovou-se também a literatura, caracterizando assim o surgimento de 
um novo tempo – o período clássico. E o estudo deste período será nosso próximo 
assunto. Até lá!
69
RESUMO DO TÓPICO 3
Caro/a acadêmico/a, no presente tópico, você teve oportunidade de 
estudar aspectos importantes relacionados à Literatura Portuguesa, os quais 
revemos, resumidamente, a seguir:
• Durante o período humanista, o teatro popular é uma manifestação de grande 
valor, tendo como expoente Gil Vicente. Já a poesia, após haver conhecido um 
período de decadência pelos anos de 1400, começa a se desenvolver novamente 
no ambiente dos palácios, influenciada por Dante Alighieri e Petrarca.
• O pensamento do primeiro período medieval, que tinha como coluna mestra a 
figura de Deus (teocentrismo), dá lugar a uma nova maneira de pensar, em que 
a figura do homem passa a ser o centro – antropocentrismo.
• Com o guarda-mor Fernão Lopes se dá o início das crônicas históricas de Portugal, 
sendo este também o nome mais expressivo da prosa da época. Em suma, esse 
autor é também o criador da historiografia nacional na forma cronística, isto é, a 
biografia de uma grande personagem ou o relato de um grande sucesso.
• A sensibilidade, inteligência e habilidade de Fernão Lopes em concatenar fatos, 
dados e versões diferentes de um mesmo episódio possibilitaram a construção 
de uma obra irretocável, quer do ponto de vista histórico quer literário.
• Fernão Lopes procura passar uma ideia até moderna da história, pois para 
ele a história de uma nação não era alicerçada puramente nas façanhas dos 
monarcas e cavaleiros, mas, ao contrário, também nos movimentos populares 
e nas forças econômicas. 
• Ele apresenta de modo visual o panorama da sociedade lusitana, expondo a 
vida palaciana e suas contradições e vícios, o movimento dos trabalhadores nas 
aldeias, as festas urbanas, a decadência da aristocracia, entre outros aspectos 
que podem ser observados nas suas narrativas.
• Apesar de terem desempenhado a mesma função de Lopes, os outros cronistas 
não conseguiram atingir a genialidade do primeiro cronista-mor.
• A prosa didática desenvolveu-se principalmente durante os reinados de D. 
João I, D. Duarte e a regência de D. Pedro, períodos estes em que houve grande 
preocupação com o desenvolvimento da cultura de um modo geral.
70
• No que se refere à prosa didática e religiosa, mesmo que muitoscríticos não a 
tomem muito em consideração enquanto literatura, há que se registrar o valor 
de tais escritos enquanto traduções de obras que são consideradas verdadeiros 
patrimônios da época medieval, outras, enquanto inéditas, pela sua grande 
importância didática para a história da formação da literatura lusitana, para o 
enriquecimento da língua e aquisição de sua expressividade literária.
• A poesia palaciana é de influência espanhola e se apresenta dissociada da 
música, passando a ser declamada, recitada, lida, o que requer técnica e 
expressão. A riqueza desta poesia, sua complexidade temática e formal tomam 
o lugar da singeleza e da espontaneidade das cantigas trovadorescas.
• A forma deste tipo de poesia é nova: geralmente são versos de sete sílabas (as 
redondilhas maiores) e de cinco sílabas (redondilhas menores).
• Há que se valorizar na nova poesia a formalidade que ela oferece, a se começar 
pela métrica, os ricos motivos de inspiração, a sua forma, o seu conteúdo. 
Acima de tudo, a sua riqueza está na influência de dois grandes poetas: Dante 
Alighieri e Francesco Petrarca.
• O teatro criado por Gil Vicente recebeu o nome de teatro popular por causa das 
suas características consideradas fundamentais – popular nos temas, popular 
na linguagem utilizada e popular nos atores. Gil Vicente, poder-se-ia dizer, 
explora o que é conhecido pelo povo para compor suas peças.
• Antes de Gil Vicente, provavelmente, não havia teatro em Portugal. O que 
havia, segundo se conhece, eram encenações de caráter religioso, cuja função 
era puramente catequética, com finalidades morais e éticas.
• Vicente procurou manter certa proximidade às suas influências medievais, 
fazendo, antes de tudo, um teatro que trazia a tônica didático-moralizante. Se, 
em parte, focalizavam-se as virtudes cristãs como objetivo a ser perseguido, 
procurava também não perder de vista a sociedade lusitana da época, trazendo-a 
à baila com um tom de humor e senso crítico, mantendo ali uma visão humanista.
• Gil Vicente procurava passar ao público uma visão crítica da sociedade, 
deixando de lado a parcialidade: não distinguia classes sociais, colocava em 
cena nobres e plebeus, membros da política e cidadãos comuns, pobres e ricos, 
censurava a hipocrisia de qualquer que fosse o cidadão, incluindo entre estes 
os frades que pregavam e não colocavam em prática as virtudes, denunciava 
os exploradores das classes mais populares, colocava à vista de todos as 
imoralidades das prostitutas, os velhos sensuais, ridicularizava quem quer que 
fosse ou o defeito que ele considerava necessário. 
71
• Gil Vicente foi autor de mais de uma quarentena de peças, as quais podem ser 
divididas em diferentes fases: a primeira fase compreende o período em que 
recebeu grande influência de Juan de Encina. Já na segunda fase a preocupação 
de Vicente está dirigida aos problemas sociais. Por fim, na terceira fase, a sua 
produção dramática concebe um tom religioso e define grandes qualidades 
artísticas.
72
Caro/a acadêmico/a, para que você possa melhor fixar o conteúdo 
deste tópico, apresentamos, a seguir, uma atividade. Procure resolvê-la com 
base no que você estudou.
1 Leia com atenção a poesia a seguir e procure responder às questões 
propostas:
Partem tão tristes
(João Ruiz de Castelo Branco)
Senhora, partem tão tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida, 
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tão tristes os tristes,
tão fora d’espertar bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
FONTE: Braga (2005, p. 193)
 
a) No texto apresentado, notam-se resquícios das cantigas de amor. Identifique-
os.
b) Existe, na poesia, um relacionamento amoroso que revela certo 
distanciamento. Explique-o e comprove-o com partes do texto.
c) Comente o tema desta poesia. Em que este tema se assemelha a certo tipo de 
cantiga do Trovadorismo?
d) Procure contar as sílabas poéticas da poesia. Qual foi o tipo de verso utilizado 
pelo poeta?
AUTOATIVIDADE
73
2 Releia o texto do Auto da Barca do Inferno (no final do quinto item deste 
tópico) e, em seguida, responda às questões ora apresentadas:
a) No texto, aparece o Fidalgo, o qual tem esperanças de não ir para o Inferno 
depois de morto. Comente o fato no qual ele se baseia para que isto aconteça.
b) De acordo com o Diabo, o Fidalgo já teria fretado seu navio em vida. 
Explique esta proposição.
c) Explique o motivo de o anjo se recusar a receber o Fidalgo.
d) Nas reflexões anteriores ao embarque com o Diabo, comente as conclusões 
a que chega o Fidalgo.
e) O autor se vale da figura do Frade. Através dele, que crítica é efetuada?
f) Entre as personagens da peça, há a figura dos Cavaleiros. Através deles, 
poderia ser valorizado algum aspecto da Idade Média? Explique.
74
75
UNIDADE 2
A PRODUÇÃO LITERÁRIA 
PORTUGUESA CLÁSSICA, 
BARROCA E ÁRCADE
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
A partir do estudo desta unidade, o/a acadêmico/a estará apto/a a:
• refletir acerca das características estéticas das escolas literárias portugue-
sas do Classicismo, do Barroco e do Arcadismo;
• apresentar o momento histórico-social em que ocorreram os movimentos 
artístico-literários em estudo;
• conhecer a produção literária épica e lírica do período clássico português;
• discutir acerca da produção camoniana nas duas perspectivas: lírica e épica;
• compreender o porquê da inserção de alguns autores (a exemplo de Ca-
mões, Padre Antônio Vieira e Manoel Maria Barbosa du Bocage) em deter-
minada escola literária;
• analisar alguns textos literários considerados marcantes na formação dos 
períodos literários clássico, barroco ou árcade de Portugal, localizando ne-
les características da respectiva escola literária.
Esta unidade está dividida em três tópicos. Ao final de cada um deles, o/a 
acadêmico/a poderá dispor de atividades que o/a auxiliarão na fixação do 
conteúdo.
TÓPICO 1 – O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E 
CAMÕES LÍRICO
TÓPICO 2 – UMA ÉPOCA DE DUALISMOS: O BARROCO PORTUGUÊS
 
TÓPICO 3 – AS LUZES DA RAZÃO: O ARCADISMO
76
77
TÓPICO 1
O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E 
CAMÕES LÍRICO
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
"― Ó glória de mandar! Ó vã cobiça 
Desta vaidade, a quem chamamos Fama! 
Ó fraudulento gosto, que se atiça 
C'uma aura popular, que honra se chama! 
Que castigo tamanho e que justiça 
Fazes no peito vão que muito te ama! 
Que mortes, que perigos, que tormentas, 
Que crueldades neles experimentas!”
 (CAMÕES, Luís Vaz de. Os Lusíadas, Canto IV)
Em meados do século XIV, verifica-se no cenário europeu o fim do 
monopólio clerical nas questões culturais. Ao mesmo tempo, muitos filhos da 
burguesia passam a frequentar os ambientes universitários, o que lhes permite 
o contato com a produção cultural desvinculada das ideias medievais. E dentro 
dessa mesma realidade vivida pela Europa, com a decadência do feudalismo e a 
ascensão da burguesia, verifica-se a necessidade de uma nova cultura, talvez mais 
liberal, mais centralizada no ser humano (antropocêntrica), que se identificasse 
com a economia mercantilista.
E isto também chegou às terras de Portugal, com a dinastia de Avis no 
poder, vivendo o momento do auge das Grandes Navegações e o sucesso do 
comércio. O contexto era propício às novas ideias que vinham da Itália, via 
grandes obras dos autores do humanismo italiano – Dante Alighieri, Francesco 
Petrarca e Giovanni Boccaccio.
No que concerne à literatura, o Classicismo tem seu início em 1527, com a 
volta de Sá de Miranda de uma viagem de estudos pela Itália. Este autor obteve 
novos conhecimentos sobre a renovação literária e novas maneiras de compor a 
poesia, como o caso da nova forma – o soneto. Dentro desta nova fase literária de 
Portugal, tem-se como expressão máxima o autor da épica e da lírica, Luís Vaz de 
Camões, do qual, caro/aacadêmico/a, trataremos neste tópico.
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
78
FONTE: Borges (2001, p. 26)
FIGURA 12 – LUÍS VAZ DE CAMÕES
2 ASPECTOS GERAIS DO CLASSICISMO
Na Europa dos séculos XV e XVI, floresceu um movimento que tinha por 
intuito a renovação da arte e da cultura, incluindo neste conjunto a literatura. 
Para produzir esta renovação, a base era a cultura clássica grega e latina. Este 
movimento recebeu o nome de Renascimento. A sua origem parece ter sido na 
Itália, mas disseminou-se pela Europa como um todo, marcando a transição entre 
a época feudal e o capitalismo burguês.
Diante disto, a Europa (e Portugal) assiste a uma verdadeira revolução 
em termos de comércio, cujo impulso principal era a importação das ditas 
especiarias do Oriente para serem revendidas na Europa. Isto ocasionou o 
nascimento e crescimento de uma nova classe social – a burguesia – composta 
principalmente de comerciantes que enriqueceram com os recursos provenientes 
das vendas. Atrelado a todo esse novo contexto econômico, há o ressurgimento e 
crescimento das cidades, a consolidação da vida nestas cidades (urbanização), a 
maior circulação de dinheiro, a necessidade de mais trabalhadores para produzir 
alimentos no campo (pois a produção passou a ser maior) e o consequente 
surgimento da classe trabalhadora (operariado), já que a servidão do feudalismo 
acabou. 
A sociedade, então marcada profundamente pelas ideias teocêntricas do 
medievalismo, assume uma postura de atenção voltada ao ser humano, ou melhor, 
antropocêntrica. Diante disto, se dá a valorização do ser homem, de modo que ele 
passa a ser focado nos estudos e exaltado na sua natureza. Com isto, ele começa 
a compreender a sua capacidade de realização – inventa, conquista, cria, produz 
e é capaz de grandes criações. 
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
79
Portanto, o período renascentista foi um dos grandes contribuidores para a 
radical transformação do homem, seja no campo religioso, filosófico, sentimental, 
político, enfim, o ser humano passou a conceber o mundo, a realidade, de modo 
diferente. No que se refere a esse período novo, o historiador de literatura Teófilo 
Braga (2005, p. 381) assim se expressa: “[...] ante sua presença, acaba a Idade 
Média imediatamente: e eis que ávida de pensamentos e de conhecimentos, a 
sociedade lhe lança, como uma semente fecunda, todas as ideias que constituirão 
um dia a ciência e a consciência moderna”. O desenvolvimento das diferentes 
áreas de estudo, das experiências científicas propiciou as bases para que se 
desenvolvesse a técnica moderna. Muitas conquistas se sucederam e permitiram 
que o ser humano dominasse cada vez mais a natureza, a qual se transforma em 
objeto de estudo de muitos cientistas.
E nesse avanço cresce também o interesse do homem pelas obras gregas 
e latinas, sejam elas voltadas para a filosofia, para os assuntos científicos ou 
ainda para a literatura. Os autores ditos clássicos começaram a ser tomados 
como modelos, passando, inclusive, a ser influenciadores das obras do período 
renascentista. A própria maneira de pensar se nutre da filosofia grega, e as 
diferentes artes inspiram-se nas obras clássicas.
Diante disso, no que concerne especificamente à Literatura, pode-se 
dizer que, dentro desse período voltado para a retomada dos valores greco-
romanos, acontece a escola literária do Classicismo, ou seja, um período em 
que os escritores seguiram de perto os modelos clássicos, tentando imitá-los ou 
ao menos adaptá-los à realidade da época. Entre as consequências, poder-se-ia 
dizer que estava a existência de uma estrutura formal e o apego às normas de 
composição em conformidade com a tradição greco-latina. Já no que diz respeito 
ao conteúdo, importante citar o paganismo e o amor platônico. Há que se dizer, 
as atividades artísticas e científicas corroboram para a formação de uma cultura 
nova, ou também, “[...] todas as atividades resultam na formação de um novo 
clima intelectual otimista e confiante na força do ser humano, que se torna agora 
o centro do universo” (TUFANO, 1981, p. 95). Diante disto, homem, mundo e 
vida passam a ser vistos com os olhos da razão. 
No que concerne à sociedade como um todo, nesse período conviveu-se 
com dois movimentos de cunho religioso que marcaram o século XVI, ao mesmo 
tempo em que repercutiram nas esferas social e cultural: o primeiro seria a 
Reforma Protestante, sob a liderança de Martinho Lutero (1483-1546), e o segundo 
a Contrarreforma, movimento de reação à reforma protestante, empreendido 
pela Igreja Católica Romana. 
Embalada por essas questões religiosas que abalaram o poderio da Igreja, 
grande parte dos artistas teve subordinada sua fé aos imperativos da razão e, 
nesse sentido, houve um grande estímulo à curiosidade intelectual, abrindo 
caminhos para investigações conflitantes com base na filosofia, uma vez que se 
adotava a liberdade de pensamento e o exame de muitas questões da ciência, sem 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
80
necessitar levar em conta os dogmas da Igreja. Os artistas, entre estes os pintores, 
os escultores, os arquitetos e os literatos, tomaram como modelos e inspiração as 
obras dos antigos gregos e romanos. Por isso mesmo, caro/a acadêmico/a, dizia-
se que a gloriosa arte antiga estava ressurgindo. E para completar esta ideia, faça-
se eco às palavras de Moisés (2008, p. 67):
[...] o Classicismo consistia, antes de tudo, numa concepção de arte 
baseada na imitação ou mimese dos clássicos gregos e latinos, 
considerados modelos de suma perfeição estética. Imitar não 
significava copiar, mas, sim, a procura de criar obras de arte segundo 
as fórmulas, as medidas empregadas pelos antigos.
Os artistas do período clássico retomaram o conceito de mimese (imitação) 
de Aristóteles. Entendiam eles que a obra de arte deveria imitar a natureza. Por 
isso se diz que o Renascimento voltou-se decididamente para a natureza: imitação 
da natureza, imitação da realidade, imitação da vida.
A palavra mimese tem origem no grego – mímesis – imitação; ou no latim – 
imitatio – que designa a ação ou a faculdade de imitar; cópia, reprodução ou representação 
da natureza, o que constitui, na filosofia aristotélica, o fundamento de toda a arte. O conceito 
de mimese é parte integrante da filosofia de Platão e da Poética de Aristóteles. Sugiro que 
você aprofunde o conceito/ideia de mimese como imitação lendo uma das principais obras 
do filósofo grego Aristóteles – “Arte Poética”. Nesta obra, ele trata da literatura como uma 
imitação.
NOTA
De uma maneira geral, dentro do espírito do Classicismo, tem-se a 
presença do culto, da prática, da imitação por excelência dos valores artísticos dos 
autores da antiguidade clássica grega e romana. Entre estes autores, poder-se ia 
citar, entre os gregos, Homero, com suas duas grandes obras – Ilíada e Odisseia, 
e entre os latinos, Virgílio, com a Eneida.
Caro/a acadêmico/a, há que se dizer que muitos outros autores serviam de 
inspiração e poderiam ser imitados. Citem-se, por exemplo, dentre os muitos autores gregos, 
Ésquilo, Sófocles, Eurípides (dramaturgos), Aristófanes (cômico), Safo e Anacreonte (poetas 
líricos), Heródoto (historiador), entre outros. Entre os latinos, haveria ainda poetas como 
Horácio e Catulo, oradores como Cícero, pensadores como Sêneca, comediógrafos como 
Plauto e Terêncio.
NOTA
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
81
Os escritores e os pensadores do período clássico estudaram e imitaram 
os clássicos da antiguidade, voltando à prática de gêneros e formas literárias mais 
antigas, entre estas a epopeia, a ode, a elegia, a comédia etc. Por isso, podemos 
dizer como a estudiosa portuguesa de literatura, Maria Leonor Carvalhão Buescu 
(1992, p. 80), que “o escritor do Classicismo está sempre voltado aos autores 
gregos e latinos, os quais ele considera como seus originais,e de quem emanam 
boas odes, boas tragédias e excelentes epopeias”. E foi a partir dessa imitação 
dos modelos da antiguidade que surgiu a renovação literária chamada de 
Classicismo. Tal imitação não consistia em copiar, mas, sim, recriar. A partir da 
técnica, a qual pode ser denominada arte, adquirida via estudo dos clássicos, os 
escritores renascentistas valiam-se do talento próprio para conceber novas obras.
As ideias classicistas instalaram-se também na Península Ibérica. O 
momento histórico em que Portugal vivia também era propício para tal. Nas 
terras lusitanas, gradativamente, verificou-se o fim do monopólio clerical no que 
concernia à produção cultural. D. João II, cujo reinado durou de 1521 a 1557, 
fundou a Universidade de Coimbra e o Colégio das Artes, também na cidade de 
Coimbra, no qual se ensinava o latim, o grego, a matemática, a lógica e a filosofia. 
Os filhos da classe burguesa passaram a cursar o ensino universitário, colocando-
se, deste modo, em contato com um tipo de cultura desapegado dos conceitos 
arcaicos da Idade Média. 
Lembre-se de que a nova realidade econômica que se vivia, a qual se criou 
graças ao fim do sistema feudal e com o fortalecimento da classe burguesa. Por 
causa disto, fazia-se necessária uma nova forma de cultura, mais liberal, centrada 
no homem (já que ele era o centro) e identificada com o mercantilismo. 
A dinastia de Avis vivia um momento histórico novo, o poder estava 
centralizado nas mãos do rei, as Grandes Navegações e o comércio estavam em 
alta, por isso, tudo parecia propício aos novos conceitos culturais do Renascimento 
veiculados na Itália.
A partir da retomada dos valores greco-latinos pelos escritores classicistas, 
resultam as principais características literárias clássicas, dentre as quais podem-
se destacar:
• Busca do homem universal – o mundo, o ser humano e a vida passaram a ser 
vistos sob a ótica da razão. O homem do Renascimento passou a entender a 
harmonia do universo e suas noções de beleza, bem e verdade, sempre tomando 
como base para os seus conceitos o equilíbrio entre a razão e a emoção. Não 
se aceitava a "arte pela arte", mas apresentava-se um alto objetivo ético: o 
do aperfeiçoamento do homem na contemplação das paixões humanas que 
transpareciam através da arte. Aqui reside também a catarse grega.
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
82
Na Grécia antiga, com as tragédias, havia um momento em que os espectadores, 
a partir do que era apresentado no palco, entravam num processo de purificação, por meio 
da purgação de suas paixões, já que muitos espetáculos suscitavam sentimentos de terror ou 
de piedade, os quais eram vivenciados na contemplação do espetáculo trágico. Este processo 
de purgação, de purificação da alma, a partir do conteúdo da obra, recebe o nome de catarse.
NOTA
• Valores greco-latinos – o homem renascentista adotou a mitologia pagã 
como parte das suas obras, recorrendo a personagens mitológicas para pedir 
inspiração, simbolizar emoções e exemplificar comportamentos. Entendia-se 
que os antigos haviam chegado à perfeição formal, o que era almejado também 
pelos artistas do Renascimento, os quais queriam revivê-la.
• Novas medidas e formatos – novas formas de composição foram criadas, entre 
as quais o soneto, o verso de dez sílabas poéticas (decassílabo) e a oitava rima, 
a qual foi levada a Portugal por Sá de Miranda, após um tempo de estudo na 
Itália.
• Consciência da Nação – no Classicismo português, além da consciência do 
homem como um ser universal, criou-se um forte sentimento de nacionalismo, 
que foi um dos resultados das grandes navegações, que criaram o novo herói – 
o povo português, cantado por Camões na sua épica Os Lusíadas.
Em Portugal, as ideias do Classicismo atingiram seu ápice no período 
entre 1527 e 1580. O marco do seu início é o ano de 1527, quando se dá o regresso 
do escritor Sá de Miranda de uma viagem empreendida pela Itália. Desta viagem, 
ele trouxe os ideais de inovação herdados dos poetas italianos, entre estes as 
novas formas de composição da poesia, como o soneto, os versos decassílabos e 
as posturas amorosas do dolce stil nuovo. 
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
83
Caro/a acadêmico/a, chamamos de dolce stil nuovo a uma expressão italiana 
que quer dizer "doce estilo novo". Trata-se de um movimento da poesia italiana que surgiu 
na Toscana por volta da segunda metade do século XIII e o início do século XIV. Este estilo foi 
criado por um grupo de poetas florentinos, entre os quais Guido Guinizelli, Dante Alighieri, 
Guido Cavalcanti, Lapo Gianni, Gianni Alfani e Cino da Pistoia. Um dos primeiros a utilizar esta 
denominação foi Dante Alighieri, na Divina Comédia. Num primeiro momento, caracteriza-
se pela concepção diferente do amor – não mais como uma vassalagem, mas, sim, sob os 
princípios da gentileza, como determina a nova sociedade burguesa. Uma segunda ideia diz 
respeito à concepção da mulher, vista agora sob a ótica angelical, a qual provoca no homem 
o desejo de bondade, de perfeição moral, de gentileza e de elevação espiritual. Uma terceira 
ideia trata do estado de espírito do enamorado que, a partir da recordação da beleza e da 
imagem angelical da figura feminina, procura encontrar equilíbrio entre o doce encanto do 
coração e o receio de ser abandonado ou de se ver privado de tal graciosa figura.
NOTA
Todas essas novas técnicas adquiriram aperfeiçoamento com o poeta Luís 
Vaz de Camões, que, ao que parece, viveu dentro deste espaço de tempo. Ele, 
inspirado em Petrarca, criou poemas líricos, além de um poema épico, por meio 
do qual ele exalta as conquistas do povo português na descoberta do caminho 
marítimo para a Índia, por meio do navegador Vasco da Gama. “Uma das 
inspirações para essa epopeia portuguesa foi a Eneida, de Virgílio, ao melhor 
estilo renascentista clássico, que não foi copiada, nem imitada, mas, sim, esta lhe 
serviu de exemplo, de fonte de inspiração, já que Virgílio era para Camões um 
autor encantador” (BORGES, 2001, p. 32). O poeta lírico e épico Camões constitui 
o assunto dos itens a seguir. 
3 A ÉPICA PORTUGUESA: “OS LUSÍADAS”
Agora que você, caro/a acadêmico/a, conheceu o período clássico 
renascentista de Portugal, chegou o momento de entrar em contato com a maior 
expressão da literatura clássica lusitana – Luís Vaz de Camões. Particularmente, 
nesta seção, tratar-se-á do Camões da épica ou da epopeia. 
Acredita-se que você já tenha ouvido falar na epopeia (ou poesia épica). 
Caso não esteja lembrado/a, eis uma explicação. Um poema épico, ou epopeia, é 
uma forma de poesia que trata de uma série de realizações heroicas sob a forma 
de narrativa (poesia narrativa). Os fatos relatados (é comum dizer-se cantados) 
podem ser de um indivíduo, de vários e mesmo de toda uma nação. Ainda, os 
fatos narrados podem ter base real, lendária ou mitológica. A título de lembrança, 
há como modelos de epopeias (ou poemas épicos) as de autoria do grego Homero 
– A Ilíada e A Odisseia. Homero viveu por volta do século VIII a.C., na região da 
atual Turquia, e na época conhecida por Jônia. Estas duas obras constituem os 
mais antigos documentos da literatura helênica que chegaram aos nossos dias.
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
84
DICAS
Amigo/a acadêmico/a, você pode ler os poemas épicos de Homero – A Ilíada 
e A Odisseia – baixando-os na internet no sítio “dominiopublico” ou assisti-los sob a forma de 
filme: filme “Troia” (trata da epopeia A Ilíada) e filme “A Odisseia” (trata da epopeia A Odisseia). 
No que diz respeito a Portugal, para relatar a história do povo português 
e heroicizá-lo pelos seus feitos nas Grandes Navegações, através do herói 
individual Vasco da Gama, o autor português quinhentista Luís Vaz de Camões 
criou a epopeia Os Lusíadas. Ela é considerada a mais notável poesia épica da 
era moderna, graças à sua grandeza e universalidade. Em Os Lusíadas é contada 
a históriade Vasco da Gama e dos heróis portugueses que navegaram ao redor 
do Cabo da Boa Esperança (África do Sul) e encontraram uma nova rota marítima 
para chegar à Índia.
Na sua epopeia, Camões consegue conciliar diferentes visões: a mitologia 
pagã e a visão cristã, os sentimentos opostos sobre a guerra e o império, a vontade 
de repouso da viagem aventureira e o desejo da aventura, o desfrute do prazer e as 
exigências de uma visão heroica. Camões escolheu uma aventura real, realizada 
por um povo, para perpetuá-la, ou seja, eternizá-la, através de sua obra o herói, 
no caso, o povo português foi o herói representado em Vasco da Gama. Sobre 
isto, importante considerar-se a opinião de Quadros (1992, p. 19):
[...] em contraste com as obras que lhe servem de modelo, Os Lusíadas 
escolhem um tema histórico, real. Não inventam proezas fantasiosas, 
limitam-se (e com que orgulho!) a narrar coisas acontecidas. E, mesmo 
assim, aquilo que narram, supera de longe as ficções antigas:
Que por muito e por muito que se afinem,
Nestas fábulas vãs tão bem sonhadas,
A verdade que eu canto, nua e pura,
Vence toda grandíloca escritura! (Canto V)
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
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FONTE: De Giovanni (2007, p. 46)
FIGURA 13 – D. SEBASTIÃO  
Conforme já comentado anteriormente, Camões se valeu da antiguidade 
clássica para a forma adequada: o poema épico, gênero poético narrativo e 
pomposo, desenvolvido pelos autores dos tempos clássicos antigos para cantar 
a história de todo um povo. A Ilíada e a Odisseia, imputadas ao grego Homero 
(século VIII a.C.), narram os eventos da Guerra de Troia, contam as lendas, a 
história e as aventuras heroicas do povo helênico na guerra. Já a Eneida, do latino 
Virgílio (71 a 19 a.C.), apresenta as aventuras do herói Eneias, após a guerra de 
Troia, a história da fundação de Roma e as origens do povo romano. 
DICAS
Caro/a acadêmico/a, para melhor poder acompanhar os estudos deste item, 
pedimos que você também, como Vasco da Gama, realize uma aventura, enfrente um grande 
desafio: faça uma leitura cuidadosa da obra de Camões – Os Lusíadas. Você pode baixá-la no 
seu computador, via sítio “dominiopublico”.
Ao elaborar a mais notável obra poética da língua portuguesa, Os 
Lusíadas, publicada em 1572, Luís de Camões toma por base a estrutura narrativa 
da Odisseia de Homero, como já frisado, assim como versos da Eneida de Virgílio. 
Vale-se, para estruturar as estrofes, da oitava rima, criada pelo italiano Ariosto, 
que consiste em estrofes de oito versos, rimadas sempre da mesma forma: AB 
AB AB CC. A epopeia de Camões é considerada grande não só por causa da sua 
extensão, mas também por seu importante valor literário e histórico. E por que 
sua extensão? Muitas pessoas ficam perplexas, assustam-se com a extensão da 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
86
obra. É composta por dez cantos organizados, contendo em média cento e dez 
oitavas, perfazendo um total de oito mil oitocentos e dezesseis (8.816) versos, 
todos decassílabos e paroxítonos. Como já vimos, caro/a acadêmico/a, versos 
decassílabos são os que se compõem de dez sílabas poéticas e as oitavas são 
composições com estrofes de oito versos. Veja-se um exemplo:
Observe a seguir a decomposição de alguns versos do Canto I, 
demonstrando o número de sílabas poéticas e as rimas:
FONTE: Azevedo Filho (1991, p. 162)
QUADRO 2 – DECOMPOSIÇÃO DE PARTE DA PRIMEIRA ESTROFE DE OS LUSÍADAS
Observe também um exemplo de uma estrofe quanto à organização das 
rimas:
1- Uns vão nas almadias carregadas; (A). 
2- Um corta o mar a nado, diligente; (B). 
3- Quem se afoga nas ondas encurvadas; (A). 
4- Quem bebe o mar e o deita juntamente. (B). 
5- Arrombam as miúdas bombardadas. (A). 
6- Os pangaios sutis da bruta gente. (B). 
7- Desta arte o Português enfim castiga. (C). 
8- A vil malícia, pérfida, inimiga. (C). 
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
87
Em suma, a maneira de Camões (2008, p. 70) organizar seu poema é 
engenhosa, como ele próprio o diz no poema: “Cantando espalharei por toda 
parte, se a tanto me ajudar engenho e arte.” Este dizer é prudente que seja 
complementado com o comentário de Massaud Moisés: “os seus textos reduzem-
se [...] a exercícios de arte (técnica poética) a que está faltando o engenho 
(inspiração, talento). A reunião de ambos resulta bem, mas a arte, sem o engenho, 
consiste no trabalho artesanal destituído de inspiração e talento”. E Camões, 
certamente, desejava, pelo que diz nos seus versos, contar tanto com a arte quanto 
com o engenho. 
FONTE: De Giovanni (2007, p. 48)
FIGURA 14 – VASCO DA GAMA
Apresentada a análise da estrutura externa do poema, e sendo Os 
Lusíadas um texto renascentista, não poderia deixar de seguir a estética grega, a 
qual valorizava, de modo particular, o clímax. Na epopeia camoniana, o clímax 
se encontra no início do Canto VII – a chegada à Índia. Mas antes de analisarmos 
de maneira mais acurada algumas partes do poema, apresentamos os dados 
biográficos do seu autor, Camões.
Luís Vaz de Camões era filho de Simão Vaz de Camões e Ana de Sá e 
Macedo. Segundo pesquisas mais antigas, teria nascido em lugar incerto, por 
volta de 1525. A sua família era de origem galega, mas há muito tempo radicada 
em Portugal. Pertencia à pequena nobreza. É possível que tenha frequentado a 
Universidade de Coimbra. Um parente seu, D. Bento de Camões, foi prior do 
Mosteiro de Santa Cruz e chanceler da Universidade de Coimbra.
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
88
Em Lisboa conviveu com a fidalguia cortesã, tendo em 1550 embarcado 
como soldado para Ceuta, no norte de África, onde perdeu um olho em uma luta. 
Retornando a Lisboa, levou, durante certo tempo, uma vida desregrada, jogado 
à boêmia. No ano de 1552, esteve envolvido em desacatos no transcorrer de uma 
procissão do Corpo de Deus, ferindo gravemente um funcionário da corte. Ficou 
encarcerado durante certo tempo (alguns meses), mas dispôs-se a partir para a 
Índia, lá chegando em setembro de 1553.
Na qualidade de soldado, fez parte das forças de patrulhamento da região 
do Mar Vermelho e do Golfo Pérsico. Nos anos de 1555, esteve nas ilhas Molucas 
e dois anos depois em Macau, exercendo a função de provedor dos defuntos 
e ausentes. Em 1560, regressou a Goa, e ficou preso novamente, desta vez sob 
acusações vagas. Ali conheceu o cientista Garcia de Orta para cuja obra escreveu 
o seu primeiro poema impresso.
Passados alguns anos, anseia retornar às terras lusitanas, mas, em 1568, 
Diogo de Couto encontrou-o retido em Moçambique, passando dificuldades, 
pobre e sobrevivendo com a ajuda de amigos. Por volta de 1569 consegue 
regressar a Lisboa, e publica Os Lusíadas, em 1572. D. Sebastião, rei de Portugal, 
como recompensa pelos serviços prestados na Índia e pela criação da epopeia 
nacional, institui-lhe uma pensão anual de 15.000 réis.
Conforme ficou demonstrado, Camões teve uma vida muito atribulada e 
viajou bastante, inclusive, e pelo que se sabe, refez a rota de Vasco da Gama na 
viagem do descobrimento do caminho marítimo para a Índia. Conta a história que 
numa dessas viagens Camões e sua amada Dinamenes naufragam às margens do 
rio Mekong, no Camboja. Nessa viagem, o autor épico também trazia consigo um 
manuscrito de sua grande obra, Os Lusíadas. Há quem diga que, no momento do 
naufrágio, com toda a confusão instalada, Camões não sabia quem salvar, se a 
amada ou sua obra-prima. No final do incidente, a amada morre e o manuscrito 
permanece intacto, salvo pelo autor graças ao cuidado. 
 
O autor vem a óbito na cidade de Lisboa, a 10 de junho de 1580. Em 
vida, além da grande epopeia, publicou três poemas líricos e três autos, a saber: 
Anfitriões, Filodemo, El-rei Seleuco. O restante da sua produção poética foi 
publicada postumamente, a partir de 1595.
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
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FONTE: Tufano (1990,p. 186)
FIGURA 15 – PRIMEIRA EDIÇÃO DE OS LUSÍADAS – 1572
Quanto ao seu conteúdo, o poema épico Os Lusíadas mantém uma 
divisão em cinco partes, seguindo a regra da antiguidade clássica greco-latina: 
proposição, invocação, dedicatória, narração e epílogo. A seguir, apresentamos 
para você, caro/a acadêmico/a, um pequeno estudo de cada uma das partes do 
poema.
1) PROPOSIÇÃO (Canto I, estrofes 1 a 3): é uma parte inicial que compreende a 
síntese da poesia épica. Ali é apresentado o assunto do poema. Camões se vale, 
para isto, das três primeiras estrofes do poema. É nesta parte que o poeta faz o 
propósito de cantar os feitos heroicos dos soldados, dos nautas lusitanos, bem 
como fazer memória aos reis que se empenharam pela expansão das fronteiras 
do império lusitano e da fé cristã. Nesta parte, o poeta deixa claras algumas 
características dos poemas, entre as quais o seu caráter coletivo, a valorização 
do ser humano (antropocentrismo), a sobrevivência do "ideal cruzada", a 
elevação da antiguidade clássica, o ideal nacionalista (ufanismo), sintaxe rica e 
complexa.
AS armas e os Barões assinalados
Que da ocidental praia Lusitana
Por mares nunca de antes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
90
E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando,
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando,
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.
Cessem do sábio Grego e do Troiano
As navegações grandes que fizeram;
Cale-se de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram.
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta.
FONTE: CAMÕES, Luis Vaz de. Os Lusíadas. Lisboa: Instituto Camões/Ministério dos Negócios 
Estrangeiros, 2000. p. 1.
2) INVOCAÇÃO (Canto I, estrofes 4 e 5): o poeta lusitano, nesta parte, roga 
inspiração às Tágides, ninfas do Tejo, importante rio de Portugal. Pede-lhes o 
estilo e a eloquência necessários à execução da sua obra. Obviamente, um tema 
tão grandioso deveria exigir um estilo elevado, uma eloquência superior, eis 
por que havia necessidade de pedir o auxílio das divindades protetoras dos 
poetas.
E vós, Tágides minhas, pois criado
Tendes em mi um novo engenho ardente,
Se sempre, em verso humilde, celebrado
Foi de mi vosso rio alegremente,
Dai-me agora um som alto e sublimado,
Um estilo grandíloco e corrente,
Por que de vossas águas Febo ordene
Que não tenham enveja às de Hipocrene.
Dai-me uma fúria grande e sonorosa,
E não de agreste avena ou frauta ruda,
Mas de tuba canora e belicosa,
Que o peito acende e a cor ao gesto muda.
Dai-me igual canto aos feitos da famosa
Gente vossa, que a Marte tanto ajuda;
Que se espalhe e se cante no Universo,
Se tão sublime preço cabe em verso.
 (Canto I, 4-5)
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
91
3) DEDICATÓRIA (canto I, estrofes 6 a 18): Camões dedica seu poema épico 
a D. Sebastião, rei de Portugal quando se deu a publicação de Os Lusíadas. 
D. Sebastião, desde pequeno, era tido como a garantia da independência de 
Portugal. Há que se frisar que a dedicatória não era parte da estrutura das 
epopeias clássicas. Camões introduziu esta parte para mostrar o caráter superior 
da obra e demonstrar a sua dependência de um protetor (o rei) para poder 
publicá-la. Além disso, é um modo de demonstrar as proporções alcançadas 
pelo império português.
Vós, tenro e novo ramo florescente
De uma árvore, de Cristo mais amada
Que nenhuma nascida no Ocidente,
Cesárea ou Cristianíssima chamada,
Vede-o no vosso escudo, que presente
Vos mostra a vitória já passada,
Na qual vos deu por armas e deixou
As que Ele para si na Cruz tomou;
Vós, poderoso rei, cujo alto império
O Sol, logo em nascendo, vê primeiro;
Vê-o também no meio do Hemisfério,
E quando desce, o deixa derradeiro;
Vós, que esperamos jugo e vitupério
Do torpe Ismaelita cavaleiro,
Do Turco Oriental e do Gentio
Que ainda bebe o licor do santo Rio.
 (Canto I, 7-8) 
4) NARRAÇÃO (compreende 1.072 estrofes, que vão do Canto I ao Canto X): trata-
se de uma longa narrativa em que o poeta desenvolve o tema apresentando 
vários episódios ocorridos durante a viagem. Compreende três principais 
acontecimentos: a Viagem de Vasco da Gama às Índias, a narrativa da história 
de Portugal e, concomitantemente, o poeta lusitano narra os conflitos entre os 
deuses do Olimpo (nome de um monte grego que, segundo a mitologia, seria a 
morada dos deuses). 
A narrativa começa já no meio da viagem (in edia res), quando já estavam 
em pleno Oceano Índico, próximos a Moçambique, ponto em que pararam. 
Depois de passarem em vários lugares da África, chegaram a Melinde, e Vasco da 
Gama conta os muitos episódios anteriores, e a história de Portugal. Partindo de 
Melinde, chegaram por fim ao destino – Calicute, na Índia. Na viagem de retorno, 
como recompensa pelos grandes feitos, os heróis portugueses são recebidos por 
Tétis e várias ninfas, numa ilha paradisíaca – a Ilha dos Amores. É o famoso 
episódio da Ilha dos Amores. Os dois planos, o divino e o humano, encontram-se 
no episódio da “Ilha dos Amores” (Cantos IX e X). Vitoriosos na sua empreitada, 
os nautas portugueses são recompensados pelas ninfas. 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
92
In media res: é uma expressão de origem latina, usada por Horácio, que 
significa literalmente “no meio dos acontecimentos”. Esta é uma característica mais utilizada 
nas epopeias. Na Odisseia e na Ilíada, a narração não ocorre a partir do início temporal da 
ação, mas a partir de um ponto médio do seu desenvolvimento. Luís de Camões, em Os 
Lusíadas, faz o mesmo, a exemplo dos clássicos: a narração da viagem de Vasco da Gama 
começa na estrofe 19, do primeiro canto, com “Já no largo Oceano […]” (I, 19). Com isto, a 
ação tornava-se mais dinâmica e mais atraente para o público, no entender da época.
NOTA
No poema, há muitos episódios interessantes. Alguns deles, porém, 
merecem um olhar mais atento. Por isso, dedicaremos a eles alguns comentários 
e selecionaremos algumas estrofes para que você, acadêmico/a, possa melhor 
conhecê-los. 
- CONCÍLIO DOS DEUSES (Canto I, estrofes 20 a 41): os deuses convocam uma 
reunião (concílio) para aprovar ou não o sucesso da empreitada do povo português, 
representado em Vasco da Gama e os nautas. O veredictum é dado por Júpiter, 
que acena positivamente, já que isso (aos portugueses) já está previsto. Mas há a 
discordância de Baco, que alega que, se isso for concedido, as conquistas do Oriente 
serão esquecidas, ultrapassadas por esse povo. Já a deusa Vênus concebe o povo 
português como herdeiro dos romanos, portanto, pode vir a ser celebrada por ele. 
Há um tumulto entre os deuses, uns tomando o partido de Vênus, outros o de 
Baco, mas o deus Marte se impõe declarando que os portugueses são merecedores 
de realizar a façanha, além do que Júpiter tinha, de antemão, concedido o favor. 
Por isso, o supremo Deus concorda e encerra a reunião.
Quando os Deuses no Olimpo luminoso,
Onde o governo está da humana gente,
Se ajuntam em consílio glorioso,
Sobre as cousas futuras do Oriente.
Pisando o cristalino Céu fermoso,
Vêm pela Via Láctea juntamente,
Convocados, da parte de Tonante,
Pelo neto gentil do velho Atlante.
Em luzentes assentos, marchetados
De ouro e de perlas, mais abaixo estavam
Os outros Deuses, todos assentados
Como a Razão e a Ordem concertavam
(Precedem os antigos, mais honrados,
Mais abaixo os menores se assentavam);
Quando Júpiter alto, assi dizendo,
Cum tom de voz começa grave e horrendo:
 
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO:CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
93
<<Prometido lhe está do Fado eterno,
Cuja alta lei não pode ser quebrada,
Que tenham longos tempos o governo
Do mar que vê do Sol a roxa entrada.
Nas águas têm passado o duro Inverno;
A gente vem perdida e trabalhada;
Já parece bem feito que lhe seja
Mostrada a nova terra que deseja.
Estas palavras Júpiter dizia,
Quando os Deuses, por ordem respondendo,
Na sentença um do outro diferia,
Razões diversas dando e recebendo.
O Padre Baco ali não consentia
No que Júpiter disse, conhecendo
Que esquecerão seus feitos no Oriente
Se lá passar a Lusitana gente.
Sustentava contra ele Vénus bela,
Afeiçoada à gente Lusitana
Por quantas qualidades via nela
Da antiga, tão amada, sua Romana;
Nos fortes corações, na grande estrela
Que mostraram na terra Tingitana,
E na língua, na qual quando imagina,
Com pouca corrupção crê que é a Latina.
E disse assi: – <<Ó Padre, a cujo império
Tudo aquilo obedece que criaste:
Se esta gente que busca outro Hemisfério,
Cuja valia e obras tanto amaste,
Não queres que padeçam vitupério,
Como há já tanto tempo que ordenaste,
Não ouças mais, pois és juiz direito,
Razões de quem parece que é suspeito.
Como isto disse, o Padre poderoso,
A cabeça inclinando, consentiu
No que disse Mavorte valeroso
E néctar sobre todos esparziu.
Pelo caminho Lácteo glorioso
Logo cada um dos Deuses se partiu,
Fazendo seus reais acatamentos,
Pera os determinados apousentos.
FONTE: CAMÕES, Luis Vaz de. Os Lusíadas. Lisboa: Instituto Camões/Ministério dos Negócios 
Estrangeiros, 2000. p. 6.
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
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- EPISÓDIO DE INÊS DE CASTRO (Canto III, estrofes 118 a 135): um dos 
grandes momentos da narrativa da epopeia lusitana é o de Inês de Castro. 
Dona Inês e Dom Pedro são os amantes cujo amor é proibido pelos poderes. 
O pai, D. Afonso IV, tem o propósito de casar o filho, herdeiro do trono, mas 
este, por nutrir uma paixão proibida com Inês, recusa-se. D. Pedro já era casado 
e possuía um filho legítimo, mas também tinha outros filhos com a amante 
Inês. Quando sua esposa morre, o príncipe se vê obrigado a casar novamente, 
então declara já ser casado com Inês. O rei e a corte, com medo de que um de 
seus filhos bastardos assumisse o trono, na ausência de D. Pedro, mandam 
matar Inês. Esta é trazida à presença do rei e implora pela sua vida, só para 
poder cuidar dos seus filhos. Comove o velho soberano, mas os conselheiros 
e o povo exigem a morte, e assim a frágil e bela apaixonada é assassinada. 
Quando fica sabendo do acontecido, D. Pedro ordena que sua amada, mesmo 
morta, seja coroada rainha. Daí a conhecidíssima frase do episódio de Inês de 
Castro, “aquela que depois de ser morta foi rainha”.
FONTE: De Giovanni (2007, p. 51)
FIGURA 16 – EPISÓDIO DE INÊS DE CASTRO
Passada esta tão próspera vitória, 
Tornado Afonso à Lusitana Terra, 
A se lograr da paz com tanta glória 
Quanta soube ganhar na dura guerra, 
O caso triste e dino da memória, 
Que do sepulcro os homens desenterra, 
Aconteceu da mísera e mesquinha 
Que despois de ser morta foi Rainha.
Tu, só tu, puro Amor, com força crua, 
Que os corações humanos tanto obriga, 
Deste causa à molesta morte sua, 
Como se fora pérfida inimiga. 
Se dizem, fero Amor, que a sede tua 
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
95
Nem com lágrimas tristes se mitiga, 
É porque queres, áspero e tirano, 
Tuas aras banhar em sangue humano.
Estavas, linda Inês, posta em sossego, 
De teus anos colhendo doce fruito, 
Naquele engano da alma, ledo e cego, 
Que a Fortuna não deixa durar muito, 
Nos saudosos campos do Mondego, 
De teus fermosos olhos nunca enxuito, 
Aos montes insinando e às ervinhas 
O nome que no peito escrito tinhas.
Do teu Príncipe ali te respondiam 
As lembranças que na alma lhe moravam, 
Que sempre ante seus olhos te traziam, 
Quando dos teus fermosos se apartavam; 
De noite, em doces sonhos que mentiam, 
De dia, em pensamentos que voavam; 
E quanto, enfim, cuidava e quanto via 
Eram tudo memórias de alegria.
De outras belas senhoras e Princesas 
Os desejados tálamos enjeita, 
Que tudo, enfim, tu, puro amor, desprezas, 
Quando um gesto suave te sujeita. 
Vendo estas namoradas estranhezas, 
O velho pai sesudo, que respeita 
O murmurar do povo e a fantasia 
Do filho, que casar-se não queria,
Tirar Inês ao mundo determina, 
Por lhe tirar o filho que tem preso, 
Crendo c’o sangue só da morte ladina 
Matar do firme amor o fogo aceso. 
Que furor consentiu que a espada fina, 
Que pôde sustentar o grande peso 
Do furor Mauro, fosse alevantada 
Contra hûa fraca dama delicada?
Pera o céu cristalino alevantando, 
Com lágrimas, os olhos piedosos 
(Os olhos, porque as mãos lhe estava atando 
Um dos duros ministros rigorosos); 
E despois, nos mininos atentando, 
Que tão queridos tinha e tão mimosos, 
Cuja orfindade como mãe temia, 
Pera o avô cruel assi dizia: 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
96
Tais contra Inês os brutos matadores, 
No colo de alabastro, que sustinha 
As obras com que Amor matou de amores 
Aquele que despois a fez Rainha, 
As espadas banhando e as brancas flores, 
Que ela dos olhos seus regadas tinha, 
Se encarniçavam, fervidos e irosos, 
No futuro castigo não cuidosos.
 (Canto III, estrofes 118 a 135)
- EPISÓDIO DO VELHO DO RESTELO (Canto IV, estrofes 90 a 104): há que se 
compreender que o chamado episódio do “Velho do Restelo” não constitui um 
fato ou uma personagem histórica de Portugal. Pelo contrário, trata-se de uma 
alegoria criada pelo autor Camões, que encerra em si significação simbólica. 
Há quem sustente a ideia de que, de uma parte, o velho e suas palavras seriam 
aqueles que não viam com bons olhos a ideia de Portugal envolver-se nos 
descobrimentos. Sustentavam que criar um império colonial além-mar, no 
Oriente, poderia ser uma tentativa frustrada, além de ser demasiadamente 
dispendiosa para os cofres do país. Cabia ainda a ideia de que os resultados eram 
duvidosos. Esta corrente era da opinião de que o país deveria, sim, expandir-
se, porém valendo-se das conquistas militares no Norte de África. Entre estes, 
estava a nobreza. A seu turno, a burguesia queria expansão marítima, pois eles 
queriam comércio frutuoso.
Do outro lado, poder-se-ia ver na figura do Velho do Restelo a voz do 
bom senso, os que recusam as aventuras duvidosas, considerando ser melhor a 
tranquilidade da vida mediana que promessa de riquezas, pois poderiam resultar 
em desgraças. Aqui se pode entender uma manifestação do espírito humanista, 
favorável à paz e à tranquilidade, em oposição ao espírito aventureiro e guerreiro 
medieval. 
Nesse sentido, o episódio do “Velho do Restelo”, de certo modo, 
constitui-se uma exaltação ao esforço guerreiro e expansionista dos portugueses 
e, concomitantemente, apresenta as contradições da sociedade portuguesa da 
época. Entre os críticos, isso é opinião corrente, a exemplo de que “[...] o discurso 
do Velho do Restelo manifesta a contradição central do poema, a sua estrutura 
oscilante e a sua modernidade”. (QUADROS, 1992, p. 37).
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
97
FONTE: De Giovanni (2007, p. 53)
FIGURA 17 – EPISÓDIO DO VELHO DO RESTELO
"Qual vai dizendo: —" Ó filho, a quem eu tinha 
Só para refrigério, e doce amparo 
Desta cansada já velhice minha, 
Que em choro acabará, penoso e amaro, 
Por que me deixas, mísera e mesquinha? 
Por que de mim te vás, ó filho caro, 
A fazer o funéreo enterramento, 
Onde sejas de peixes mantimento!"
"Nestas e outras palavras que diziam 
De amor e de piedosa humanidade, 
Os velhos e os meninos os seguiam, 
Em quem menos esforço põe a idade. 
Os montes de mais perto respondiam, 
Quase movidos de alta piedade; 
A branca areia as lágrimas banhavam, 
Que em multidão com elas se igualavam.
"Mas um velho d'aspeito venerando, 
Que ficava nas praias, entre a gente, 
Postosem nós os olhos, meneando 
Três vezes a cabeça, descontente, 
A voz pesada um pouco alevantando, 
Que nós no mar ouvimos claramente, 
C'um saber só de experiências feito, 
Tais palavras tirou do experto peito:
—"Ó glória de mandar! Ó vã cobiça 
Desta vaidade, a quem chamamos Fama! 
Ó fraudulento gosto, que se atiça 
C'uma aura popular, que honra se chama! 
Que castigo tamanho e que justiça 
Fazes no peito vão que muito te ama! 
Que mortes, que perigos, que tormentas, 
Que crueldades neles experimentas!
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
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— "Dura inquietação d'alma e da vida, 
Fonte de desamparos e adultérios, 
Sagaz consumidora conhecida 
De fazendas, de reinos e de impérios: 
Chamam-te ilustre, chamam-te subida, 
Sendo dina de infames vitupérios; 
Chamam-te Fama e Glória soberana, 
Nomes com quem se o povo néscio engana!
— "Mas ó tu, geração daquele insano, 
Cujo pecado e desobediência, 
Não somente do reino soberano 
Te pôs neste desterro e triste ausência, 
Mas inda doutro estado mais que humano 
Da quieta e da simples inocência, 
Idade d'ouro, tanto te privou, 
Que na de ferro e d'armas te deitou:
— "Ó maldito o primeiro que no mundo 
Nas ondas velas pôs em seco lenho, 
Dino da eterna pena do profundo, 
Se é justa a justa lei, que sigo e tenho! 
Nunca juízo algum alto e profundo, 
Nem cítara sonora, ou vivo engenho, 
Te dê por isso fama nem memória, 
Mas contigo se acabe o nome e glória.
— "Não cometera o moço miserando 
O carro alto do pai, nem o ar vazio 
O grande Arquiteto co'o filho, dando 
Um, nome ao mar, e o outro, fama ao rio. 
Nenhum cometimento alto e nefando, 
Por fogo, ferro, água, calma e frio, 
Deixa intentado a humana geração. 
Mísera sorte, estranha condição!" 
 (Canto IV, estrofes 90 a 104)
- O GIGANTE ADAMASTOR (Canto V, estrofes 37 a 60): ao chegarem no sul 
do continente africano, no conhecido Cabo das Tormentas (atual Cabo da 
Boa Esperança), os marinheiros avistam uma nuvem escura, tão carregada 
que pôs os corações dos marinheiros em pavor. Vasco da Gama sente-se no 
dever de recorrer ao Deus todo poderoso. Este é o aparecimento do gigante 
Adamastor, que constitui uma figura mitológica, criação do próprio autor da 
epopeia portuguesa. Com isso, Camões desejava representar todos os perigos, 
as tempestades, os naufrágios, as perdições de toda sorte que os portugueses 
tiveram que enfrentar e vencer durante a viagem. Aliás, durante muitos anos, 
vingou a ideia de que o Oceano Atlântico era o mar tenebroso. A crítica também 
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
99
concorda de que “[...] o poeta dá livre curso à antiga superstição de que o mar 
seria um espaço proibido, no qual o homem não deve aventurar-se, sob pena 
de sofrer punições terríveis.” (MOISÉS, 1998, p. 70). Talvez seja por causa disso 
que Camões insiste em repetir que os portugueses enfrentam “os mares nunca 
de outrem navegados”.
FONTE: De Giovanni (2007, p. 55)
FIGURA 18 – GIGANTE ADAMASTOR
Porém já cinco Sóis eram passados 
Que dali nos partíramos, cortando 
Os mares nunca de outrem navegados, 
Prosperamente os ventos assoprando, 
Quando uma noite, estando descuidados 
Na cortadora proa vigiando, 
Uma nuvem, que os ares escurece, 
Sobre nossas cabeças aparece. 
 
Tão temerosa vinha e carregada, 
Que pôs nos corações um grande medo; 
Bramindo, o negro mar de longe brada, 
Como se desse em vão nalgum rochedo. 
"Ó Potestade (disse) sublimada: 
Que ameaço divino ou que segredo 
Este clima e este mar nos apresenta, 
Que mor cousa parece que tormenta?" 
 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
100
Não acabava, quando uma figura 
Se nos mostra no ar, robusta e válida, 
De disforme e grandíssima estatura; 
O rosto carregado, a barba esquálida, 
Os olhos encovados, e a postura 
Medonha e má, e a cor terrena e pálida; 
Cheios de terra e crespos os cabelos, 
A boca negra, os dentes amarelos.
Tão grande era de membros, que bem posso
Certificar-te que este era o segundo
De Rodes estranhíssimo Colosso,
Que um dos sete milagres foi do mundo
Co’ um tom de voz nos fala, horrendo e grosso,
Que pareceu sair do mar profundo.
Arrepiam-se as carnes e o cabelo,
A mim e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo.
 (Canto V, estrofes 37 a 60)
- A ILHA DOS AMORES (Canto IX e X): estando ainda em Melinde, à hora 
de partirem as naus, dois dos nautas portugueses que vendiam mercadorias 
em Calicute são mantidos em terra, querendo que a partida fosse atrasada, 
podendo, assim, talvez, ser alcançadas e destruídas por alguma esquadra 
muçulmana. Em contrapartida, Vasco da Gama também mantém a bordo das 
naus portuguesas alguns comerciantes indianos. Assim, o samorim aceita 
trocar os prisioneiros portugueses pelos orientais. Ele também manda restituir 
as mercadorias que os portugueses tomaram como resgate pelo capitão. Os 
nautas, após cumprida sua missão, partem em viagem de retorno a Lisboa. 
E a deusa Vênus, como prêmio aos navegadores por todo o sucesso e como 
descanso pela empreitada, decide presenteá-los com uma estada numa ilha 
paradisíaca. Lá ela reúne as nereidas (ninfas marinhas), feridas por Cupido 
com suas flechas para que ardam de amor pelos portugueses. Os nautas ficam 
alucinados com tamanho espetáculo, perseguem as ninfas, que se deixam 
alcançar e se entregam, entre alaridos de prazer. Este episódio parece ser uma 
manifestação de prazer, uma ideia de distanciamento do sexo como pecado. 
O autor consegue mostrar um momento de congraçamento entre os humanos 
e os deuses. Está aí também o engrandecimento dos navegadores (do povo 
português) e sua elevação à esfera da imortalidade.
A ninfa Tétis oferece aos navegantes e às ninfas um banquete. Tétis 
aproveita para vaticinar os feitos dos ilustres heróis. Depois do banquete, convida 
o capitão (Vasco da Gama) para ir ao cimo do monte para mostrar-lhe a máquina 
do mundo, que “[...] vem a ser o ápice e coroamento do poema. Seu significado é 
que todo esforço humano deve culminar com a vitória do conhecimento racional.” 
(MOISÉS, 1998, p. 101). Por fim, as ninfas despedem-se dos nautas e Tétis prediz 
o feliz regresso dos navegantes portugueses à sua pátria.
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
101
FONTE: De Giovanni (2007, p. 57)
FIGURA 19 – AS NINFAS DA ILHA DOS AMORES 
De longe a ilha viram, fresca e bela,
Que Vênus pelas ondas lha levava
(Bem como o vento leva branca vela)
Pera onde a forte armada se enxergava;
Que, por que não passassem, sem que nela
Tomassem porto, como desejava,
Pera onde as naus navegam, a movia
A Acidália, que tudo, enfim, podia.
Mas firme a fez e imóbil, como viu
Que era dos nautas vista e demantada,
Qual ficou Delos, tanto que pariu
Latona Febo e a deusa à caça usada.
Pera lá logo a proa o mar abriu,
Onde a costa fazia uma enseada
Curva e quieta, cuja branca areia
Pintou de ruivas conchas Citereia.
Nesta frescura tal desembarcavam
Já das naus os segundos argonautas,
Onde pela floresta se deixavam
Andar as belas deusas, como incautas.
Algumas, doces cítaras tocavam,
Algumas , harpas e sonoras frautas;
Outras co’os arcos de ouro, e fingiam
Seguir os animais que não seguiam.
Já não fugia a bela ninfa tanto,
Por se dar cara ao triste que a seguia,
Como por ir ouvido o doce canto,
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
102
As namoradas mágoas que dizia.
Volvendo o rosto, já sereno e santo,
Toda banhada em riso e alegria,
Cair se deixa aos pés do vencedor,
Que todo se desfaz em puro amor.
Oh! Que famintos beijos na floresta,
E que mimoso choro que soava!
Que afagos tão suaves, que ira honesta,
Que em risinhos alegres se tornava!
O que mais passam na manhã e na sesta,
Que Vênus com prazeres inflamava,
Melhor é exprimentá-lo que julgá-lo;
Mas julgue-o quem não pode exprimentá-lo.
Destarte, enfim, conformes já as fermosas
Ninfas co’os seus amados navegantes,
Os ornamde capelas deleitosas
De louro e de ouro e flores abundantes.
As mãos alvas lhes davam como esposas;
Com palavras formais e estipulantes
Se prometem eterna companhia,
Em vida e morte, de honra e alegria.
Assim cantava a ninfa; e as outras todas,
Com sonoroso aplauso, vozes davam,
Com que festejam as alegres vodas
Que com tanto prazer se celebravam.
“Por mais que da Fortuna andem as rodas
(Numa cônsona voz todas soavam),
Não vos hão-de-faltar, gente famosa,
Honra, valor e fama gloriosa.”
Despois que a corporal necessidade
Se satisfaz do mantimento nobre,
E na harmonia e doce suavidade
Viram os altos feitos que descobre,
Tétis, de graça ornada e gravidade,
Pera que com mais alta glória dobre
As festas deste alegre e claro dia,
Pera o felice Gama assim dizia:
“Faze-te mercê, barão, a Sapiência
Suprema de, co’os olhos corporais,
Veres o que não pode a vã ciência
Dos errados e míseros mortais.
Sigue-me firme e forte, com prudência,
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
103
Por este monte espesso, tu co’os mais”.
Assim lhe diz, e o guia por um mato
Árduo, difícil, duro e humano trato.
Vês aqui a grande máquina do mundo,
Etérea e elemental, que fabricada
Assim foi do Saber, alto e profundo,
Que é sem princípio e meta limitada.
Quem cerca em derredor este rotundo
Globo e sua superfície tão limitada,
É Deus; mas o que é Deus, ninguém o entende,
Que a tanto o engenho humano não se entende.
 (Cantos IX e X, estrofes 52 a 90)
5) EPÍLOGO (Canto X, estrofes 145 a 156): a epopeia camoniana conclui com um 
epílogo em que o poeta apresenta suas lamentações e críticas à coroa portuguesa 
pelas injustiças que esta teria cometido. Além disso, reitera a dedicação da obra 
ao rei D. Sebastião. Camões, nesta parte, apresenta um tom mais pessimista, de 
descrédito, de crítica aos portugueses que estavam deixando à parte os valores 
nacionais. O epílogo de Os Lusíadas está em contraposição ao tom ufanista com 
que se desenvolveu a trama. Há, porém, uma característica que a difere em relação 
à epopeia clássica. Há que se dizer, outrossim, que neste epílogo do poema de 
Camões aparece uma atitude subjetiva do poeta, o qual desabafa acerca dos seus 
próprios conflitos íntimos e das privações nos seus últimos dias de vida.
FONTE: Disponível em: <http://www.cki.com.br/Historia/images/Rota_VGama.jpg>. Acesso em: 
25 nov. 2010.
FIGURA 20 – ROTA DE VASCO DA GAMA ATÉ A ÍNDIA
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104
Não mais, Musa, não mais que a Lira tenho 
Destemperada e a voz enrouquecida, 
E não do canto, mas de ver que venho 
Cantar a gente surda e endurecida. 
O favor com que mais se acende o engenho 
Não no dá a pátria, não, que está metida 
No gosto da cobiça e na rudeza 
Duma austera, apagada e vil tristeza.
E não se por que influxo do destino
Não tem um ledo orgulho e geral gosto,
Que os ânimos levanta de contino
A ter pêra trabalhos ledo o rosto.
Por isso vós, ó Rei, que por divino
Conselho estais no régio sólio posto,
Olhai que sois (e vede as outras gentes)
Senhor só de vassalos excelentes.
Todos favorecei em seus ofícios,
Segundo têm das vidas o talento:
Tenham religiosos exercícios
De rogarem, por vosso regimento,
Com jejuns, disciplina, pelos vícios
Comuns; toda ambição terão por vento,
Que bom religioso verdadeiro
Glória vã não pretende nem dinheiro.
Para servir-vos, braço às armas feito;
Pera cantar-vos, mente às musas dada;
Só me falece ser a vós aceito,
De quem virtude deve ser prezada.
Se me isto o céu concede, e o vosso peito
Dina empresa tomar de ser cantada,
Como a pressaga mente vaticina,
Olhando a vossa inclinação divina,
Ou fazendo que, mais que a de Medusa,
A vista vossa tema o monte Atlante,
Ou rompendo nos campos de Ampelusa
Os muros de Marrocos e Trudante,
A minha já estimada e leda musa
Fico em que todo o mundo de vós cante
De sorte que Alexandro em v´pos se veja,
Sem à dita de Aquiles ter inveja.
 (Canto X, estrofes 145 a 156)
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
105
De um modo geral, o poema épico lusitano – Os Lusíadas – representa 
muito mais do que uma simples obra do período classicista português. Essa épica 
constitui-se em um monumento da humanidade, pois o seu valor é o mesmo de 
um hino a todo o período clássico, é a glorificação do povo português pelos seus 
feitos no Oriente, pelas batalhas empreendidas. Camões conseguiu eternizar-se, 
eternizar Vasco da Gama e eternizar os portugueses e seus feitos heroicos. “[...] os 
homens tomam para si a fama e a glória [...]. Divinizam-se, quer dizer, glorificam-
se.” (QUADROS, 1992, p. 22). 
Da magnitude assumida por esta obra máxima do classicismo lusitano, 
adveio a grande influência que Os Lusíadas exerceram nos séculos vindouros. 
Já se passaram muitos séculos da sua publicação, e esse poema épico ainda 
atrai e fascina os leitores e constitui-se inspiração para os novos escritores. Atrai 
e inspira porque é um clássico. E sobre os clássicos, para completar, eis o que 
diz Ítalo Calvino (1993, p. 23): “[...] os clássicos são livros que exercem uma 
influência particular quando se impõem como inesquecíveis e também quando se 
ocultam nas dobras da memória, mimetizando-se como inconsciente coletivo ou 
individual. Talvez essa atração seja resultado da beleza, da arte, da força que está 
contida nos seus versos. Por tudo isso é um clássico.
Caro/a acadêmico/a, nesta seção, vocês tiveram oportunidade de conhecer 
o Camões épico. Mas este autor português destacou-se também por uma vasta 
obra lírica. A lírica camoniana constitui o nosso próximo assunto. 
4 A POESIA LÍRICA DE CAMÕES
Além da grande obra épica, a qual, caro/a acadêmico/a, você acabou de 
estudar, Camões notabilizou-se por uma vasta obra lírica. Poder-se-ia arriscar a 
dizer que ele é considerado um dos maiores poetas líricos da literatura universal. 
Há que se ressaltar, no entanto, que as poesias líricas de Camões só foram reunidas 
e publicadas em 1595, portanto, quinze anos depois da sua morte.
Quanto à questão estética do lirismo camoniano, há que se destacar que 
ele soube conciliar a tradição medieval com as inovações clássicas. Para isto, ele 
recebeu grande influência do poeta humanista italiano Francesco Petrarca. Além 
disto, outra influência marcante veio dos autores da antiguidade latina (Ovídio, 
Horácio, Virgílio).
Entre os temas da poesia lírica camoniana, há que se destacar:
- O AMOR: este parece ser o tema mais rico tratado pelo poeta. Há momentos 
em que ele o trata como uma ideia (neoplatonismo), mas há também ocasiões 
em que Camões lhe dá a tônica da carnalidade. Muitas vezes, nas poesias, 
esse amor é visto de maneira idealizada, o que leva o poeta a ter que valer-
se de muitos adjetivos para poder descrever a pessoa amada. Por isso, em 
muitos momentos, ela é tratada como um ser superior, em outros ela passa 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
106
a ser alguém angelical ou ainda perfeito. Nisto ele se assemelha a Dante e 
Petrarca, que tratavam a pessoa amada como um ser angelical: Laura (Petrarca) 
e Beatriz (Dante). Camões cantou o sentimento amoroso sob todas as óticas 
possíveis, seja como paixão desenfreada, como sofrimento pela indiferença ou 
rejeição da pessoa amada, como a beleza da mulher, sua sensualidade, carinho, 
delicadeza, sua força. Por causa dos diferentes modos de tratar o amor, talvez, 
seus poemas se tornaram universais.
Eu cantarei de amor tão docemente,
por uns termos em si tão concertados,
que dous mil acidentes namorados
faça sentir ao peito que não sente.
Farei que amor a todos avivente,
pintando mil segredos delicados,
brandas iras, suspiros magoados,
temerosa ousadia e pena ausente.
Também, senhora, do desprezo honesto
de vossa vista branda e rigorosa,
contentar-me-ei dizendo a menor parte.
Porém, para cantar de vosso gesto
a composição alta e rigorosa
aqui falta saber, engenho e arte.
 (RODRIGUES, 1993, p.20)
- O DESCONCERTO DO MUNDO: o poeta manifestou-se, por meio deste tema, 
acerca das injustiças sociais, as recompensas dadas aos maus cidadãos e as 
penalidades infligidas a muitos bons cidadãos, a ambição, o vício de poupar 
bens que acabam com a morte, enfim, o conflito existente entre o ser e o dever 
ser. O poeta manifesta seu inconformismo com um poema chamado “Ao 
desconcerto do mundo”:
Os bons vi sempre passar
no mundo graves tormentos;
e, para mais me espantar,
os maus vi sempre nadar
em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim
o bem tão mal ordenado,
fui mau, mas fui castigado.
Assim que, só para mim
anda o mundo concertado.
 RODRIGUES, 1993, p. 19)
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
107
Dentro do gênero lírico, o poeta Camões compôs as mais variadas formas, 
entre as quais podem-se destacar: 
a) Redondilhas: poemas compostos por versos na medida velha, melhor dizendo, 
com cinco sílabas poéticas (redondilha menor) ou então com sete sílabas 
poéticas (redondilha maior).
Aquela cativa
que me tem cativo,
porque nela vivo,
já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa
em suaves molhos,
que pera meus olhos
fosse mais fermosa.
Nem no ceo estrelas,
nem no campo flores,
me pare(s) cem belas,
como os meus amores.
Rosto singular,
olhos sossegados,
pretos e cansados,
mas não de matar.
FONTE: AZEVEDO FILHO, Leodegário A. de. Introdução à lírica de Camões. Lisboa: Instituto de 
Cultura e Língua Portuguesa/Ministério da Educação, 1991. p. 152.
b) Canções: as canções clássicas geralmente versavam em torno do amor, sendo 
compostas por versos decassílabos – com dez sílabas poéticas – ou então em 
versos de seis sílabas poéticas – o também chamado quebrado.
Tão suave, tão fresca e tão fermosa,
nunca no ceo saiu
a Aurora, no princípio do verão,
às flores dando a graça costumada,
como a fermosa mansa fera,
quando um pensamento vivo me inspirou,
por quem me desconheço.
Bonina pudibunda, ou fresca rosa,
nunca no campo abriu,
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
108
quando os raios do Sol no Touro estão,
de cores diferentes esmaltada,
como esta flor, que, os olhos inclinando,
o sofrimento triste costumou
à pena que padeço.
Ligeira, bela Ninfa, linda, irosa,
não creo que seguiu
Sátiro, cujo brando coração
de amores comovesse fera irada,
que assi fosse fugindo, e desprezando
este tormento, aonde amor mostrou
tão próspero começo.
FONTE: AZEVEDO FILHO, Leodegário A. de. Introdução à lírica de Camões. Lisboa: Instituto de 
Cultura e Língua Portuguesa/Ministério da Educação, 1991. p. 115.
c) Elegias: poemas compostos com uma tonalidade triste, melancólica. Veja-se o 
exemplo:
Aquela que de amor descomedido
polo fermoso moço se perdeo,
que só por si de amores foi perdido,
depois que a deosa em pedra a converteo
de seu humano gesto verdadeiro,
a última voz só lhe concedeo.
Assi meu mal do próprio ser primeiro
outra cousa nenhũa me consente
que este canto que escrevo derradeiro.
E, se algũa pouca vida, estando ausente,
me deixa Amor, é porque o pensamento
sinta a perda do bem de estar presente.
Se, Senhor, vos espanta o sentimento
que tenho em tanto mal, pera escrevê-lo
furto este breve tempo a meu tormento;
porque quem tem poder pera sofrê-lo,
sem se acabar a vida com o cuidado,
também terá poder pera dezê-lo.
FONTE: AZEVEDO FILHO, Leodegário A. de. Introdução à lírica de Camões. Lisboa: Instituto de 
Cultura e Língua Portuguesa/Ministério da Educação, 1991. p. 126.
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
109
d) Odes: este tipo de poema remonta à Grécia antiga e se constitui um tipo de 
poesia criada com o objetivo de ter acompanhamento musical. No entanto, com 
o passar dos tempos, ela perdeu essa característica original. Manteve, porém, o 
seu caráter elogioso, seu tom alegre e entusiástico.
Fogem as neves frias
dos altos montes, e já reverdecem
as árvores;
as verdes ervas crecem
e o prado ameno de mil cores tecem.
Zéfiro brando aspira;
suas setas Amor afia agora;
Progne triste suspira,
e Filomena chora;
o ceo da fresca terra se namora.
Vai Vénus Citerea
com os coros das Ninfas rodeada:
a linda Pasitea,
com as duas irmãs acompanhada.
Em quanto as oficinas
dos Ciclopas Vulcano está queimando,
vão colhendo boninas
as Ninfas, e cantando;
a terra com o ligeiro pé tocando.
Dece do duro monte
Diana, já cansada da espessura,
buscando a clara fonte,
onde por sorte dura
perdeo Actéon a natural figura.
FONTE: AZEVEDO FILHO, Leodegário A. de. Introdução à lírica de Camões. Lisboa: Instituto de 
Cultura e Língua Portuguesa/Ministério da Educação, 1991. p. 120.
e) Oitavas: as oitavas são tipos de poesias que se estruturam em estrofes com oito 
versos cada uma.
Como nos vossos ombros tão constantes,
Príncipe ilustre e raro, sustenteis
tantos negócios árduos e importantes,
di(g)nos do largo Império que regeis;
como sempre nas armas rutilantes
vestido, o mar e a terra segureis
do pirata insolente e do tirano
jugo do potentíssimo otomano.
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
110
E como, com virtude necessária,
mal entendida do juízo alheo,
à desordem do vulgo temerária, 
na santa paz ponhais o duro freo;
se com minha escritura longa e vária
vos ocupasse o tempo, certo creu
que com ridiculosa fantasia
contra o comum proveito pecaria.
FONTE: AZEVEDO FILHO, Leodegário A. de. Introdução à lírica de Camões. Lisboa: Instituto de 
Cultura e Língua Portuguesa/Ministério da Educação, 1991. p. 134.
f) Éclogas (ou églogas): trata-se de uma compilação de caráter pastoril e 
campestre, de maneira que os pastores dialogam entre si.
A rústica contenda desusada
entre as Musas dos bosques, das areas,
de seus rudos cultores modulada,
a cujo som, atónitas e alheas,
do monte as brancas vacas estiveram,
e do rio as saxátiles lampreas,
desejo de cantar; que, se moveram
os troncos as avenas dos pastores
e os silvestres brutos sospenderam,
não menos o cantar dos pescadores
as ondas amansou do alto pégo
e fesz ouvir os mudos nadadores.
E se, por sustentar-se, o Moço Cego
nos trabalhos agrestes a alma inflama,
o que é mais próprio no ócio, e no sossego,
mais maravilhas dando à voz da Fama,
no mesmo mar undoso e vento frio,
brasas roxas acende a roxa flama.
FONTE: AZEVEDO FILHO, Leodegário A. de. Introdução à lírica de Camões. Lisboa: Instituto de 
Cultura e Língua Portuguesa/Ministério da Educação, 1991. p. 139.
g) Sonetos: Camões, na lírica, volta-se muito para a composição chamada soneto, 
procurando, inclusive, levá-la à perfeição. Na realidade, o soneto é uma obra 
bastante curta e compõe-se de catorze versos, distribuídos em quatro estrofes: 
duas de quatro versos (quartetos) e duas de três versos (tercetos). Geralmente, 
estes versos são rimados. O soneto admite número restrito de variações quanto à 
forma e segue normas rigorosas quanto ao conteúdo e desenvolvimento do tema. 
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
111
Há um tipo de soneto, chamado petrarquiano, que apresenta rimas do 
tipo ABBA, ABBA (dentro dos quartetos), as ditas rimas interpoladas ou opostas, 
e rimas CDC, DCD nos tercetos, as chamadas rimas intercaladas ou alternadas. 
Deve-se, no entanto, considerar que são mais usuais nos tercetos três rimas 
alternadas ao melhor modo CDE, CDE. Importante levar-se em conta que esse 
tipo de soneto é composto por versos de dez sílabas poéticas, ou decassílabos, 
cujo último verso deve concluir a composição, sendo por isso chamado “chave de 
ouro”, pois é ele que sintetiza o tema central do poema. 
Há que se lembrar que Camões, nas suas composições líricas, valeu-se da 
maneira medieval de escrever, mais tradicional, a chamada medida velha, versos 
com cinco sílabas poéticas – as chamadas redondilhas menores – e versos com 
sete sílabas poéticas – as conhecidas redondilhas maiores.
FONTE: MACHADO, Álvaro Manuel. Dicionário de literatura portuguesa. Lisboa: Presença, 1996. 
p. 134.
1. Amor é um fogo que ardesem se ver;
2. É ferida que dói e não se sente;
3. É um contentamento descontente;
4. É dor que desatina sem doer.
5. É um não querer mais que bem querer;
6. É um andar solitário entre a gente;
7. É nunca contentar-se de contente;
8. É um cuidar que ganha em se perder.
9. É querer estar preso por vontade;
10. É servir a quem vence o vencedor;
11. É ter com quem nos mata lealdade.
12. Mas como causar pode ser favor
13. Nos corações humanos amizade,
14. Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Quartetos
Tercetos
Foi Sá de Miranda, em 1527, quem trouxe da Itália (com o seu já tratado 
retorno, após alguns anos de estudo) a denominada medida nova. Esta era 
chamada nova pelo fato de recuperar as tendências clássicas: retomava a poesia 
greco-latina, reafirmava o uso de regras rígidas para criar as formas.
Caro/a acadêmico/a, para você fixar, são medida nova os versos decassílabos, 
expressos em sonetos, odes, elegias, canções, éclogas, sextilhas e oitavas. A medida velha 
compreende as poesias em que se adotam redondilhas maiores e menores.
NOTA
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
112
Tanto de meu estado me acho incerto
que em vivo ardor tremendo estou de frio;
sem causa, juntamente choro e rio,
o mundo todo abarco, e nada aperto.
É tudo quanto sinto desconcerto:
dalma um fogo me sai, da vista um rio,
agora espero, agora desconfio,
agora desvario, agora acerto.
Estando em terra, chego ao ceo voando;
em ù’hora acho mil anos, e de jeito
que em mil anos não posso achar ù’hora.
Se me pregunta alguém porque assi ando,
respondo que não sei; porém sospeito
que é só porque vos vi, minha Senhora.
FONTE: AZEVEDO FILHO, Leodegário A. de. Introdução à lírica de Camões. Lisboa: Instituto de 
Cultura e Língua Portuguesa/Ministério da Educação, 1991. p. 114.
Um dos grandes sonetos de Camões, e dos mais conhecidos, foi “Alma 
minha”, o qual ele teria dedicado à sua amada chinesa, Dinamene, com quem 
teria vivido durante a sua estada em Macau. Segundo algumas tradições, ele 
teria sido acusado de crimes administrativos, e Camões e a mulher, Dinamene, 
teriam sido levados da China à Índia, e ele julgado. No trajeto, por volta de 1560, 
o navio naufragou no litoral do Camboja, na desembocadura do rio Mekong. 
Neste acontecimento trágico, o poeta lusitano teria perdido a sua amada, a “alma 
gentil”, mais tarde relembrada, poeticamente elevada e eternizada com o soneto 
especialmente a ela dedicado. 
O amor do poeta, neste soneto, é manifestado ao ver a mulher amada 
que passou, com a morte, a pertencer a uma dimensão superior, fazendo parte 
agora de um universo puro, sincero, verdadeiro, elevado, não mais matéria, mas, 
sim, um corpo etéreo, inacessível. Ou nas palavras de Massaud Moisés (2008, 
p. 75), esse amor revelado no soneto a Dinamene representa, de um lado “[...] o 
sentimento do bem perdido que não mais se alcança e, por isso, mais desejado 
e, de outro, a presença da morte, revelando o plano transcendente para onde 
emigrou a bem-amada”. 
Veja, caro/a acadêmico/a, a seguir a poesia (soneto) de Camões na qual ele 
remete a Dinamene:
Alma minha gentil, que te partiste
tão cedo deste corpo descontente,
repousa tu nos ceos eternamente,
e viva eu cá na terra sempre triste.
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
113
Se lá no assento etéreo onde subiste,
memória deste mundo se consente,
não te esqueças daquele amor ardente
que já nos olhos meus tão puro viste.
E se vires que pode merecer-te
algũa cousa a dor que me ficou
da mágoa sem remédio de perder-te,
pede a Deos, que teus anos encurtou,
que tão cedo de cá me leve a ver-te,
quão cedo dos meus olhos te levou.
FONTE: AZEVEDO FILHO, Leodegário A. de. Introdução à lírica de Camões. Lisboa: Instituto de 
Cultura e Língua Portuguesa/Ministério da Educação, 1991. p. 112.
De um modo um tanto geral, é possível perceber-se na obra lírica camoniana 
a presença dos poetas clássicos como Virgílio, principalmente na maneira de 
conceber o meio natural, de nela perceber a capacidade de sentir e vibrar com 
o ser humano, de Ovídio, autor da obra Metamorfoses, muito relembrada por 
Camões, e Horácio, de quem Camões herdou a questão da preferência por uma 
condição mediana em vista da garantia da tranquilidade. Mas é sobretudo de 
Petrarca (e dos petrarquistas) que Camões herda as influências para as poesias 
de cunho amoroso. E a crítica é incisiva ao dizer que a poética renascentista 
era essencialmente imitativa, “[...] empenhada no aperfeiçoamento através da 
aprendizagem com os modelos; nada disto era incompatível com a expressão da 
originalidade pessoal, nem sequer com o cultivo de uma maneira individual.” 
(QUADROS, 1992, p. 44). Deste modo, pode-se perceber que o poeta aproveita a 
sugestão do tema e do estilo, ou até parte do texto, para apresentar um conteúdo 
poético diferente.
Para Camões, outra fonte de inspiração era a efemeridade das coisas, 
tratado dentro do tema do desconcerto do mundo, ou seja, a contrariedade que se 
faz presente entre dois mundos: aquele tal como deveria ser e aquele real, como é. 
Quem provoca as mudanças é o efeito do tempo. Observe-se como isso é tratado 
no soneto camoniano: 
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
muda-se o ser, muda-se a confiança;
todo o mundo é composto de mudança,
tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
diferentes em tudo da esperança;
do mal ficam as mágoas na lembrança,
e do bem, se algum houve, as saudades.
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
114
O tempo cobre o chão de verde manto,
que já coberto foi de neve fria,
e enfim converte em choro o doce canto.
E, afora este mudar-se cada dia,
outra mudança faz de mor espanto:
que não se muda já como soía.
 (RODRIGUES, 1993, p. 31)
Na lírica camoniana, está muito presente a marca de uma visão de que o 
mundo é dinâmico. Às mudanças estão sujeitos tanto o homem quanto a natureza 
de um modo geral; ambos com seus sentimentos e seus afetos. Tal mudança 
constitui a essência de todas as coisas.
Para o ser humano, ao que parece, as mudanças, geralmente, são para 
pior, e de nada adianta ser prevenido, haja vista serem elas imprevisíveis. Desde 
o filósofo Heráclito, é sabido que tudo é mutável e nada permanece como é, tudo 
entra em contradição com o que era antes.
No soneto de Camões, pode-se perceber que o mundo está em constante 
guerra de contradições e de mutações. E essas mudanças, para o poeta, implicam 
uma degeneração do mundo, um desconcerto do mundo. Se tudo nesse mundo é 
mutável, a mudança também é algo instável.
Um outro olhar sobre a lírica camoniana nos leva a perceber os embates 
da vida, principalmente o enfrentados no seu país, mas também fora dele, o que 
poderia constituir, para a época, uma tendência. O destino (Fado, Fortuna), o 
peso das injustiças humanas, as dores do presente em contraste com os prazeres 
do passado constituem motivos recorrentes, marcados no fundo por certo 
pessimismo, o que nos dá uma imagem “negra” do mundo, e trazendo um espelho 
da pequenez do ser humano. Como exemplo, veja a estrofe de uma sextina:
Foge-me, pouco a pouco, a curta vida,
Se por caso é verdade que inda vivo:
Vais-me o breve tempo de ante os olhos;
Choro pelo passado; e, enquanto falo,
Se me passam os dias passo a passo.
Vais-me, enfim, a idade e fica a pena.
 (RODRIGUES, 1993, p. 31)
Em matéria lírico-amorosa, Camões, com muita propriedade, soube 
honrar a influência petrarquista. Para ele, encarnado na poesia, o amor se 
apresenta como uma aspiração perene, muitas vezes como um ideal difícil de 
ser atingido, pairando além do real, ou melhor, uma aspiração que se aperfeiçoa 
à medida que o objeto amado se imaterializa, se espiritualiza no pensamento. 
Enfim, nas suas poesias, cujo denominador comum poderia ser o desabafo, a 
confissão, veem-se de modo flagrante as reações do poeta em face do amor e do 
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICOE CAMÕES LÍRICO
115
mundo. Enfim, “[...] Camões confessa, ao longo de sua torturada reflexão, um 
pronunciado amor e respeito pelo homem, o que confere a tal espécie de poesia 
indiscutível permanência.” (MOISÉS, 2008, p. 77).
Mas, caro/a acadêmico/a, sob a influência de Camões, vieram outros poetas, 
dir-se-ia, petrarquizados, pois receberam da poesia camoniana a influência do 
poeta italiano Petrarca, e que compuseram o cânone da lírica clássica portuguesa. 
Há que se dizer, com importância menor, se comparados ao mestre Camões. 
Sobre estes poetas menores, trataremos a seguir.
5 OS POETAS MENORES DA LÍRICA QUINHENTISTA 
PORTUGUESA
Dentre os poetas menores, ou seja, aqueles que tiveram menor destaque 
dentro da lírica clássica de Portugal, merecem ser mencionados Bernardim 
Ribeiro e Cristóvão Falcão.
Pelo pouco que se conhece acerca da produção literária de Bernardim 
Ribeiro, sabe-se que ele foi muito influenciado por Sá de Miranda. Aliás, o próprio 
Sá de Miranda revela, em sua poesia, o talento precoce para a produção literária 
de Ribeiro: 
Veislo que a maiores alcança
Em criança,
Em saber i ser lozano.
Ai! de uma vana esperança,
Alfin que queda em la mano?
Era locura pensar
Cosas que aun niño dezia;
Despues cantava i tañia
El caramillo sin par
Sabia mas que...
FONTE: BRAGA, Teófilo. História da Literatura Portuguesa – Renascença. Lisboa: INCM, 2005. 
p. 79. v. II.
Por causa do tipo de vida que levava, um tanto doentio, isolado, pela sua 
situação pessoal, Bernardim Ribeiro encontrou nos quadros pastoris o meio de 
objetivar a intensidade dos sentimentos afetivos, alcançando pela verdade da 
emoção a mais surpreendente expressão do seu amor. O autor, depois de 1516, 
deu início a esta nova forma lírica, carregada de realismo pastoril, seguindo uma 
tradição nacional.
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
116
FONTE: De Giovanni (2007, p. 63)
FIGURA 21 – BERNARDIM RIBEIRO
Pelo seu próprio temperamento afetivo e a situação especial de sua vida, 
Bernardim Ribeiro tirou do isolamento da infância, no campo e da sensibilidade 
mórbida de uma paixão absoluta todos os elementos da realidade do seu 
incomparável lirismo.
Nas suas cinco églogas, a linguagem vernácula, a beleza dos modismos 
e as locuções populares dão um maior relevo à expressão apaixonada, pela 
harmonia com o quadro bucólico ou o meio campesino em que sofreu o seu triste 
amor.
Caro/a acadêmico/a, você sabe o que é égloga, ou écloga? É um tipo de poesia 
que geralmente toma como tema a vida e os costumes do campo, ou louva os encantos 
da vida rural. Quem introduziu em Portugal este tipo de composição poética foram Sá de 
Miranda e Bernardim Ribeiro.
NOTA
Na Égloga II, Bernardim Ribeiro descreve a época em que veio para Lisboa 
e o momento do seu encontro com Joana Zagalo, sua prima:
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
117
Quando as fomes grandes foram,
Que Alemtejo foi perdido,
Da aldeia que chamam Torrão
Foi este pastor fugido;
Levava um pouco de gado,
Que lhe ficou de outro muito
Que lhe morreu de cansado,
Que Alemtejo era enxuto
De água, e mui secco de prado.
Toda a terra foi perdida;
No campo do Tejo só
Achava o gado garida;
Vêr Alemtejo era um dó;
E Jano pera salvar
O gado que lhe ficou,
Foi esta terra buscar.
E se um cuidado levou,
Outro maior foi achar.
FONTE: BRAGA, Teófilo. História da Literatura Portuguesa – Renascença. Lisboa: INCM, 2005. 
p. 81. v. II.
“Sabe-se, pelas pesquisas acerca de sua vida, que era uma pessoa de 
temperamento muito delicado, de uma sensibilidade quase feminina e sempre 
cercado por um halo de permanente melancolia” (SPINA, 1991, p. 204), o que fez 
de Bernardim Ribeiro um dos poetas mais emotivos da literatura portuguesa.
Quanto a Cristóvão de Souza Falcão, sabe-se que este, por causa da 
semelhança na sua produção literária, é muito confundido com Bernardim 
Ribeiro. Falcão adota, em vida, o nome de Crisfal, formado pelas iniciais do nome 
e do sobrenome. A produção poética de Falcão é marcada por um forte cunho de 
realidade e de humanidade. Ao que parece, pouco tem em si de platonismo e de 
petrarquismo. 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
118
FONTE: De Giovanni (2007, p. 64)
FIGURA 22 – OBRA DE CRISTÓVÃO DE SOUZA FALCÃO (1893)
A sua mais importante produção literária, a Égloga de Crisfal, é formada 
por 900 versos, colocados em um sem-número de estrofes, cada uma com dez 
versos. Ao que parece, é a mais extensa e melhor poesia bucólica do cânone da 
literatura portuguesa e, quem sabe, da maior parte das literaturas modernas. O 
amor cantado por ele em suas produções parece ser da mais alta realidade:
Alli triste, só, saudosa,
Vi entre duas ribeiras,
Uma serrana queixosa,
Carreando umas cordeiras,
Sendo cordeira formosa.
E, como alli tem por uso, 
Em uma roca fiando,
Mas, com o que ia cuidando
Caia-se-lhe o fuso
Da mão de quando em quando.
FONTE: BRAGA, Teófilo. História da Literatura Portuguesa – Renascença. Lisboa: INCM, 2005. 
p. 166. v. II.
“Teófilo Braga lembra que Cristóvão Falcão era um poeta vibrante, e que 
sabia valer-se dos versos de outros poetas para compor os seus desabafos líricos”. 
(2005, p, 168).
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
119
Caro/a acadêmico/a, sabemos que haveria ainda outros poetas líricos dessa 
época, mas, em virtude do espaço de que dispomos, não nos é possível efetuar um estudo 
profundo. Deste período (Classicismo), sabe-se que o brilho maior está reservado a Camões, 
do qual tratamos em profundidade. E para complementar os estudos deste tópico, oferecemos 
uma leitura que pode ajudar você a complementar seus estudos.
NOTA
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
120
LEITURA COMPLEMENTAR
A UTOPIA DO PARAÍSO EM CAMÕES
Carlos D’Alge
Ensina-nos Homero que os deuses se definem por oposição aos homens. 
Ao contrário dos humanos, os deuses escapam da velhice e da morte. Todavia 
não são eternos, nem estão fora do tempo. Sabe-se de quem cada divindade é 
filho ou filha. A imortalidade, sim, está ligada aos deuses que, por oposição aos 
humanos mortais, são designados como imortais.
A morte para Homero também não é o fim. Ele participa da crença comum 
a várias sociedades primitivas, de que cada homem vivo abriga em si um “duplo”, 
isto é, um outro eu. A existência desse outro duplo seria comprovada pelos 
sonhos, quando o outro eu parece sair e realizar outras travessias envolvendo 
inclusive outros “duplos”. A morte, pois, nada representaria para o homem – a 
psyché ou o “duplo” desprender-se-ia pela boca ou ferida do agonizante, descendo 
às sombras subterrâneas do Érebo. Deslocada definitivamente do corpo que se 
decompõe, a psyché passa a integrar o cortejo de seres que povoam o reino de 
Hades. O “duplo” permanece como imagem ou ídolo, mas não tem consciência 
própria. Não passa de uma sombra no reino das sombras.
Assim, humanizando os deuses e afastando o medo da morte, as 
epopeias de Homero descrevem um universo luminoso no qual os valores da 
vida presente são exaltados. A Homero os gregos voltarão sempre, para conceber 
novos poemas, para dele tirar exemplos. O Renascimento redescobrirá os textos 
épicos, as aventuras de Ulisses serão tomadas como símbolos morais. O Ulisses 
que retorna à pátria, exilado durante muitos anos, terá que vencer inúmeros 
perigos e tentações. Outros dois exilados, Camões e Dante, terão também que 
passar por muitas provações, pois para que a alma humana consiga retornar à 
sua essencialidade, terá que desdobrar-se em esforços e enfrentar os perigos à 
sua volta.
É a Hesíodo, porém, que devemos o aparecimento do subjetivo na 
literatura. Na época mais antiga, o poeta era o simples veículo anônimo das 
musas. Já Hesíodo assina a sua obra usando Os Trabalhos e os Dias e a Teogonia 
para fazer história pessoal. Na Teogonia, diz que as Musas lhe ensinam um belo 
canto. O conteúdo desse belo canto é o relatosobre a origem dos deuses. Haveria 
três gerações de deuses: a do Céu, a de Cronos e a de Zeus. Prometeu e Pandora 
constituem os dois mitos que servem a Hesíodo para justificar a condição humana. 
Uma visão pessimista, sem dúvida, que transparece também no mito das idades 
ou das raças em Os Trabalhos e os Dias. As raças compreendem cinco idades. 
A primeira, a de ouro, teria vivido sem cuidados e sofrimentos. A segunda, a 
de prata, seria constituída por gênios interiores que viveram uma longa infância 
de cem anos, mas que ao crescer entregar-se-iam a excessos e se recusariam a 
oferecer culto aos deuses. A terceira, a de bronze, seria a dos homens violentos 
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
121
que se dedicariam à guerra, e por isso sucumbiriam nas mãos dos outros. A 
quarta, a raça dos heróis que combateriam em Tebas e em Troia. Para eles, Zeus 
reservara uma morada na ilha dos Bem-Aventurados, onde viveriam felizes, 
distantes dos mortais. Finalmente, a quinta raça, a de ferro, a do próprio Hesíodo, 
que viverá um tempo de fadigas, misérias e angústias. A essa raça aguardam dias 
tenebrosos. “O pai não mais se assemelhará ao filho, nem o filho ao pai; o hóspede 
não será mais caro ao seu hospedeiro, nem o amigo a seu amigo, nem o irmão ao 
seu irmão”.
Falamos de deuses e de mitos. Mitos que se tornaram símbolos. O mito de 
Prometeu significa a ideia de trabalho: o mito das idades, a ideia da justiça. Isto é, 
nenhum ser humano pode negar-se à lei do trabalho, assim como nenhuma raça 
pode evitar a justiça.
Segundo Cassirer, os símbolos são modelados pelas necessidades 
objetivas do homem. O símbolo não é um aspecto da realidade: é a realidade. No 
símbolo, há uma rigorosa identificação entre o sujeito e o objeto: “em vez de uma 
‘expressão’ mais ou menos adequada, encontraremos uma relação de identidade, 
de completa congruência entre a ‘imagem’ e o ‘objeto’, entre o nome e a coisa”. 
Por outro lado, Cassirer, no seu estudo sobre linguagem e mito, torna claro que o 
sentimento “puro” expresso pela arte, não é apenas a emoção pessoal do poeta. O 
poeta lírico não é apenas o homem que se entrega a manifestações de sentimento. 
O poder criador original da linguagem não é somente preservado, mas renovado. 
Assim, a poesia não exprime: 
[...] nem o miúdo retrato por palavras de deuses e demônios, nem a 
verdade lógica das determinações e relações abstratas. [...] O mundo 
da poesia mantém-se afastado de ambos, como um mundo de ilusão e 
fantasia, mas é exatamente nesta modalidade de ilusão que o reino do 
puro sentimento pode encontrar expressão e pode, portanto, atingir a 
sua total e concreta atualização.
Retornaremos mais tarde ao problema. Por enquanto, aceitamos a ideia 
de que a arte não é mero entretenimento, nem diversão ou ato de representação. 
A arte é a revelação de um aspecto genuíno da nossa existência.
Falamos do mito das idades. Para os heróis, que são a quarta raça, estaria 
reservada como prêmio a ilha dos Bem-Aventurados. Nela, segundo desígnio 
de Zeus, viveriam felizes, distantes dos mortais. Compreendamos os heróis de 
Tebas e Troia elevados à categoria de deuses. Portanto, imortais. Identificados 
pela mais nobre das virtudes: a areté. Os aristei, isto é, os possuidores da areté, 
são uma minoria que se eleva acima da multidão de homens comuns; se são 
dotados de virtudes legadas pelos seus antepassados, precisam dar testemunho 
das suas qualidades em combates e lutas. Séculos mais tarde, Platão e Aristóteles 
proporiam a substituição da aristocracia guerreira e de sangue pela aristocracia 
do espírito. Os tempos eram outros. 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
122
Surge, desta maneira, parece-nos, o mito da ilha afortunada, que será 
recuperado pelas utopias modernas. Não será a ilha dos Bem-Aventurados, mito 
narrado por Hesíodo, o arquétipo das utopias de Thomas Morus, Tommaso 
Campanella, Francis Bacon e de Camões.
 
Northrop Frye, que aplicou a teoria do arquétipo de Jung à crítica 
literária, considera a causa formal do poema o seu arquétipo. O poeta é apenas 
a causa eficiente do poema, mas o poema, porque tem forma, tem também uma 
causa formal que deve ser pesquisada. A causa formal, como dissemos, é o 
arquétipo. Deste modo, “[...] a procura de arquétipos constitui-se uma espécie de 
antropologia literária, interessada pela forma como a literatura é informada por 
categorias pré-literárias tais como o ritual, o mito e o conto popular”. [...] 
O mito paradisíaco aparece em todas as culturas. Ele se liga a um estado 
cosmogônico quando o mundo se encontrava em equilíbrio perfeito, sem violência, 
e à fatalidade escatológica da sua perda, mediante a falta humano-ancestral. A ira 
divina justifica-se como a compensação necessária e fatal por se haver permitido 
que surgissem as forças do caos. O mundo deverá ser julgado, então, por meios 
catastróficos até que se inicie um novo ciclo. É o momento de questionarmos o 
mito do paraíso em Camões.
Assim, escolhemos o Canto IX dos Lusíadas, conhecido pelo episódio da 
Ilha dos Amores. Tentaremos mostrar que o mito da Ilha Namorada remonta ao 
arquétipo da Ilha dos Bem-Aventurados, de que fala Hesíodo, e é coerente com 
o utopismo platônico, podendo ainda encontrar pontos de identidade com as 
utopias de Marcuse e Campanella, especialmente com o hedonismo do filósofo 
inglês. Afinal de contas, Camões já anuncia que após tanta aventura e sofrimento 
há um conforto à vista:
“Para prêmio de quanto mal passaram
Buscar-lhes algum deleite, algum descanso
No reino de cristal líquido e manso.” [...]
Há no poema quatro planos estruturais bem deliberados e que se referem 
à ação, que é a viagem dos portugueses à Índia. Camões utiliza quatro estâncias 
para interligar as partes do seu discurso: no Canto I, serve-se da estância 19 para 
introduzir os portugueses em sua navegação e em seguida colocá-los frente ao 
mundo dos deuses; no Canto VI, estância 92, vencida esta etapa, apressam-se os 
novos argonautas a atingir a sua meta terrestre – a Índia; superada a dificuldade, 
coloca-os a estância 16, do Canto IX, ante a sua meta celestial, no retorno à Pátria; 
finalmente, no Canto X, estância 144, com a visão da máquina do mundo, que 
é o real mundo divino, isto é, católico, voltarão os portugueses à condição de 
humanos (pois haviam se transformado em deuses na Ilha Namorada), e esta 
única estância os devolverá, incontinenti, ao porto de saída, fechando assim o ciclo 
perfeito do poema. [...]
TÓPICO 1 | O PERÍODO LITERÁRIO CLÁSSICO: CAMÕES ÉPICO E CAMÕES LÍRICO
123
E por que não acrescentar a tudo isto a experiência do poeta, cuja viagem 
de partida para a Índia foi bastante tormentosa, e cujas peregrinações pela costa 
asiática constituíram episódios suficientemente dolorosos? Não caberia, pois, 
uma parada, no tempo do retorno, entes de dobrar “A Meta Austrina da Esperança 
Boa”, para descansar o coração tão sofrido e reparar tanto dano havido?
O porto de salvação é a Ínsula Divina:
“Depois de procelosa tempestade,
Noturna sombra e sibilante vento,
Traz a manhã serena, claridade
Esperança de porto e salvamento,
Aparta o sol a negra escuridade,
Removendo o temor ao pensamento,
Assi no reino forte aconteceu
Depois que o Rei Fernando faleceu.”
Dissemos porto de salvação. Interregno para a catarse necessária. Os 
cansados navegantes, intérpretes de uma gesta de tragédia, de espadas banhadas 
do sangue daquela que depois de morta foi rainha, bem mereciam um repouso 
divino. Um mergulho no paraíso de que nem criam a existência. Haveria realmente 
um Éden na banda do Oriente?
A ilha afortunada ou a Ilha dos Amores, que é a utopia camoniana, será 
o ponto decisivo no relacionamento dos deuses e dos humanos. Os deuses que 
assumiram uma postura humana no decorrer da ação do poema e se envolveriam 
em intrigas e conflitos estão prestes a ceder lugar aos humanos. Na verdade, a 
relação entre os deuses e os homens e o seu encontro final na Ilhados Amores são, 
em síntese, a própria estrutura d’ Os Lusíadas. [...]
O ponto culminante de Os Lusíadas estaria na Ilha Namorada. Assim é, 
casando-se os marinheiros com as ninfas e Vasco da Gama elevado à honra de 
consorte de Tétis, ficção e realidade se encontram, mito e verdade se defrontam, 
os deuses são anulados, não servirão para mais nada. Os portugueses, pelos 
casamentos havidos na ilha são elevados à imortalidade. Os deuses podem 
despedir-se do público, têm pés de barro, esfumaçam-se; tiveram, na verdade, 
um notável mérito, o de possibilitar a glorificação dos descobridores da Índia.
O mito que funcionou como mediação simbólica entre o sagrado e 
o profano torna-se realidade. Ele não é concebido como algo que se oponha à 
realidade. Sendo a própria realidade, esta se expressa através do ritual que 
constitui a verdadeira repetição dum fragmento do tempo primordial em que os 
deuses agiam e quando tudo era possível.
É esse tempo primordial que serve de arquétipo, no pensamento mítico, 
a todos os tempos. O mito da Ilha Afortunada torna-se claro, a ilha é a própria 
realidade da gesta portuguesa.
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
124
A utopia é revelada: a Ilha dos Amores, o Paraíso dos afortunados, é uma 
grande alegoria. Toda concepção dos deuses serviu a um fim agora explícito: a 
divinização do herói. O herói aqui é toda a nação portuguesa, representada pelos 
nautas e por Vasco da Gama. Os heróis são de carne e osso, não são lendários nem 
fantásticos como os heróis da idade de ouro. É através do mito que eles ingressam 
na imortalidade. A Fama vai coroá-los. Essa mesma fama já os ajudara com a 
eficácia das flechas de Cupido. A ilha é um merecido prêmio, o meio de os fazer 
chegar à glória e à Fama. Pois Fama e Glória poderão libertá-los da lei da morte.
FONTE: D’ALGE, Carlos. A utopia do paraíso em Camões. Convergência Lusíada, Rio de Janeiro, 
n. 8, ano V, [s.d.], p.119-143.
125
RESUMO DO TÓPICO 1
Caro/a acadêmico/a, no presente tópico, você teve oportunidade de 
estudar aspectos importantes relacionados à Literatura Portuguesa, os quais 
revemos, resumidamente, a seguir:
• Com a decadência do feudalismo e a ascensão da burguesia, verifica-se a 
necessidade de uma nova cultura, talvez mais liberal, mais centralizada no ser 
humano (antropocêntrica) que se identificasse com a economia mercantilista.
• Em Portugal, o Classicismo tem seu início em 1527, com a volta de Sá de 
Miranda de uma viagem pela Itália. Este autor obteve novos conhecimentos 
sobre a renovação literária e novas maneiras de compor a poesia, como o caso 
da nova forma – o soneto.
• Na Europa dos séculos XV e XVI, floresceu o Renascimento, um movimento 
que tinha por intuito a renovação da arte e da cultura, incluindo neste conjunto 
a literatura. A base era a cultura clássica grega e latina. 
• O período renascentista foi um dos grandes contribuidores para a radical 
transformação do homem, seja no campo religioso, filosófico, sentimental, 
político, enfim, o ser humano passou a conceber o mundo, a realidade, de 
modo diferente.
• O Renascimento voltou-se decididamente para a natureza: imitação da 
natureza, imitação da realidade, imitação da vida.
• Os autores ditos clássicos começaram a ser tomados como modelos, passando, 
inclusive, a ser influenciadores das obras do período renascentista. A própria 
maneira de pensar se nutre da filosofia grega e as diferentes artes se inspiram 
nas obras clássicas.
• O homem do Renascimento passou a entender a harmonia do universo e 
suas noções de beleza, bem e verdade, sempre tomando como base para os 
seus conceitos o equilíbrio entre a razão e a emoção. O homem renascentista 
adotou a mitologia pagã como parte das suas obras, recorrendo a personagens 
mitológicas para pedir inspiração, simbolizar emoções e exemplificar 
comportamentos.
• Os escritores do Renascimento criaram novas formas de composição, entre as 
quais o soneto, o verso de dez sílabas poéticas (decassílabos) e a oitava rima, as 
quais foram levadas a Portugal por Sá de Miranda. 
126
• No Classicismo português, além da consciência do homem como um ser 
universal, criou-se um forte sentimento de nacionalismo.
• Na sua epopeia, Camões consegue conciliar diferentes visões: a mitologia pagã 
e a visão cristã, os sentimentos opostos sobre a guerra e o império, a vontade 
de repouso da viagem aventureira e o desejo da aventura, o desfrute do prazer 
e as exigências de uma visão heroica. 
• Ao elaborar a mais notável obra poética da língua portuguesa, Os Lusíadas, 
publicado em 1572, Luís de Camões toma por base a estrutura narrativa da 
Odisseia de Homero, assim como versos da Eneida de Virgílio.
• A épica camoniana constitui um monumento da humanidade, pois o seu valor 
é o mesmo de um hino a todo o período clássico, é a glorificação do povo 
português pelos seus feitos no Oriente, pelas batalhas empreendidas. Camões 
conseguiu se eternizar, eternizar Vasco da Gama e eternizar os portugueses e 
seus feitos heroicos.
• Camões notabilizou-se também por uma vasta obra lírica. Poder-se-ia arriscar 
a dizer que ele é considerado um dos maiores poetas líricos da literatura 
universal.
127
AUTOATIVIDADE
Caro/a acadêmico/a, para que você possa melhor fixar o conteúdo 
deste tópico, apresentamos, a seguir, uma atividade. Procure resolvê-la com 
base no que você estudou.
1 Leia o texto poético de Camões e, em seguida, responda ao que se pede:
Posto o pensamento nele,
porque a tudo o amor obriga,
cantava, mas a cantiga
eram suspiros por ele.
Nisto estava Lianor
o seu desejo enganando,
às amigas perguntando:
- Vistes lá meu amor?
O rosto sobre uma mão,
os olhos no chão pregados,
que, de chorar já cansados,
algum descanso lhe dão.
Desta sorte Lianor
suspende de quando em quando
sua dor e, em si tornando,
mais pesada sente a dor.
Não deita dos olhos água,
que não quer’ que a dor se abrande
amor, porque, em mágoa grande,
seca as lágrimas a mágoa.
Depois que de seu amor
soube, novas perguntando,
de improviso a vi chorando.
Olhai que extremos de dor!
 (CAMÕES, 1966, p. 89)
a) Comente o seu entendimento dos versos: “Não deita dos olhos água” e 
“não quer’ que a dor se abrande”.
b) Ao ter notícias do seu amor, a personagem da poesia começa a chorar. 
A partir deste fato, e no seu entendimento, comente qual aspecto do 
comportamento é destacado por Camões na poesia.
c) Se você fosse traçar um paralelo entre esta poesia e as cantigas de amigo, 
estudadas na Unidade 1, que semelhanças você detalharia?
128
2 Leia estas estrofes da épica de Camões, referentes ao Episódio do Velho do 
Restelo (Canto IV, estrofes 94 e 97). Em seguida, responda às questões:
 
Mas um velho daspeito venerando, 
Que ficava nas praias, entre a gente, 
Postos em nós os olhos, meneando 
Três vezes a cabeça, descontente, 
A voz pesada um pouco alevantando, 
Que nós no mar ouvimos claramente, 
Cum saber só de experiências feito, 
Tais palavras tirou do experto peito. 
- A que novos desastres determinas 
De levar estes reinos e esta gente? 
Que perigos, que mortes lhe destinas 
Debaixo dalgum nome preminente? 
Que promessas de reinos, e de minas 
Douro, que lhe farás tão facilmente? 
Que famas lhe prometerás? que histórias? 
Que triunfos, que palmas, que vitórias? 
 (CAMÕES, 1980, p. 118)
a) Observando a primeira estrofe (IV, 94), identifique as qualidades que o 
autor atribui ao velho.
b) Considere atentamente a segunda estrofe (IV, 97). Determine qual(quais) 
o(s) motivo(s) da expedição marítima.
129
TÓPICO 2
UMA ÉPOCA DE DUALISMOS: O BARROCO PORTUGUÊS
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
“Aprendamos do céu o estilo da disposição, também o das 
palavras. Como hão de ser as palavras? Como as estrelas. As 
estrelas são muito distintas e muito claras. Assim há de ser o 
estilo da pregação: muito distinto e muito claro.”
 (VIEIRA, Padre Antônio. Os Sermões, 1980)
Caro/a acadêmico/a, iniciamos mais um tópico dos nossos estudos acerca 
daLiteratura Portuguesa. E o assunto que ora iniciamos é a escola barroca, que, 
ao que parece, teve sua gênese durante o século XVI, atrelada ao movimento 
espiritual desencadeado pela Contrarreforma. Junto com isso, havia a vontade 
de reaproximar o homem e Deus, os aspectos celestiais e os terrenos, o religioso 
e o profano, ao mesmo tempo tentando conciliar duas heranças – a medieval e a 
renascentista.
Talvez seja por isso que é costume dizer-se que o período denominado 
Barroco está marcado, no seu eixo espiritual e ideológico, por dualismos, por 
ideias que contrastam entre si, o que coloca o homem entre dois polos: homem 
e Deus, pecado e perdão, religiosidade e paganismo, material e espiritual, 
antropocentrismo e teocentrismo.
Por isso, a estética do Barroco é marcada por um jogo de oposições, por 
irregularidades, pelo rebuscamento e pela assimetria. Não à toa, é costume 
dizer-se que o Barroco, por excelência, é a arte dos contrastes, pois o artista está 
constantemente tentando conciliar forças polares. O resultado disso é uma obra 
de arte com a marca do exagero e da desigualdade, revelando, inclusive, certa 
angústia por causa deste conflito. 
Dentro da Literatura Portuguesa, grandes personagens marcaram o 
Barroco literário, entre estes o jesuíta Padre Antônio Vieira, que será o nosso foco 
neste segundo tópico.
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
130
2 ASPECTOS GERAIS DA ESTÉTICA BARROCA
O ano de 1580, dentro da literatura peninsular, é de grande importância, 
já que foi marcado pela morte de Camões, ao mesmo tempo em que entra em 
decadência o movimento clássico. Nessa mesma época, inicia-se uma crise 
política, pois o rei D. Sebastião desaparece durante uma guerra na África. 
Sucede-o no poder Felipe II, da Espanha, o qual anexa o reino de Portugal ao 
território espanhol.
No que concerne à cultura, a influência agora é espanhola. Nesse período, 
surge na Espanha uma geração de escritores, entre os quais Gôngora, Quevedo, 
Cervantes, Lope de Vega, Calderón entre outros. A partir das ideias de Gôngora, 
começam a difundir-se pela Espanha os ideais barrocos.
A partir de 1640, Portugal inicia a busca pela reconquista de sua posição na 
Europa, tentando, para isto, libertar-se do domínio da Espanha. Muitas batalhas 
são travadas contra o território espanhol, na defesa da independência e contra 
os holandeses, em vista de manter sobre seu poder as colônias ultramarinas do 
Brasil e da África.
Esse período traz a marca de muita agitação política, econômica, social 
por causa da tentativa do restabelecimento da autonomia econômica, social, 
política e cultural. Ao mesmo tempo, nas terras portuguesas, começaram a 
circular, de modo clandestino, panfletos que traziam escritos que imprecavam 
contra a corrupção política estatal e denunciavam a exploração do povo. Dentre 
estes escritos, poder-se-ia citar o que deu origem à obra A Arte de Furtar, de 1652, 
cuja autoria é atribuída ao Padre Manuel da Costa.
Há que se considerar também que, nesse intervalo de tempo, a mentalidade 
popular ainda trazia as marcas das ideias renascentistas, de modo que a expressão 
do pensamento refletia certa ênfase na razão humana e sua visão crítica. De certo 
modo, isto até abriu novos horizontes à mentalidade europeia, durante o século 
XVI. 
Por outro lado, começam a surgir novos modos de ver a realidade, 
aparecem movimentos de renovação, que refutam vários setores da sociedade, 
de cunho cultural e religioso. Entre estes, um dos mais marcantes e que mexeu 
com a sociedade como um todo, está a Reforma Protestante, empreendida 
por Lutero, contra certos problemas havidos no seio da Igreja Católica. Mais 
tarde, para combater o protestantismo, a Igreja Católica lança o movimento 
da Contrarreforma. Esse movimento, a seu turno, buscava também reprimir 
tentativas de manifestações religiosas e de cunho cultural que pudessem, de 
qualquer forma, opor-se aos dogmas pregados pela Igreja Católica. E para a 
difusão do catolicismo, na própria Península Ibérica, nasceu a Companhia de 
Jesus (jesuítas), por volta de 1540, por obra do espanhol Inácio de Loyola.
TÓPICO 2 | UMA ÉPOCA DE DUALISMOS: O BARROCO PORTUGUÊS
131
De certo modo, o clima que se instalou na sociedade era de repressão, 
de recolhimento, de medo. Quanto a Portugal, neste mesmo século, instala-se 
o Tribunal de Inquisição. Começam a surgir julgamentos e condenações, listas 
de livros proibidos e as manifestações culturais são coibidas. Assim, importante 
frisar-se, esta época parece marcada pela censura e pela volta ao teocentrismo 
medieval. Nas palavras de Alfredo Bosi (1984, p. 34), “[...] é na estufa da nobreza e 
do clero espanhol, português e romano que se incuba a maneira barroco-jesuítica: 
trata-se de um mundo já em defensiva, organicamente preso à Contrarreforma 
[...] em luta com as áreas liberais do Protestantismo e do racionalismo”. Por isso, 
percebe-se que a tônica do Barroco é dada pelos ideais da reação da Igreja às 
ideias reformistas. Em vista disso, há o medo, a crescente quantidade de templos 
religiosos construídos, de estátuas de santos e de Jesus, de documentos sacros. As 
obras de arte deveriam suscitar compaixão, autopiedade. Deveriam ainda falar 
aos fiéis com a maior eficácia possível. Eis o motivo do caráter solene da arte 
barroca. Este tipo de arte deveria convencer, conquistar, impor admiração.
FONTE: De Giovanni, 2007, p. 89
FIGURA 23 – IGREJA BARROCA DE SÃO FRANCISCO
O ser humano, de certa forma, se encontra “perdido” dentro deste cenário 
dualista, seja dos valores antropocêntricos seja dos teocêntricos, da Reforma ou 
da Contrarreforma, espiritualismo e materialismo. Percebe-se, deste modo, um 
desequilíbrio, uma desarmonia, o que transparece nas obras de arte (pintura, 
escultura, literatura) via exageros. O homem se sente perdido num labirinto 
de dúvidas, num constante dilema existencial, restando-lhe como saída o 
aproveitamento do momento presente, vivendo-o intensamente, já que a morte 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
132
é certa (carpe diem). No fundo, a estética do Barroco colocou o ser humano diante 
de uma encruzilhada em que deveria “[...] conciliar o claro e o escuro, a matéria e 
o espírito, a luz e a sombra, visando a anular, pela unificação, a dualidade do ser 
humano, dividido entre os apelos do corpo e os da alma.” (MOISÉS, 2008, p. 111). 
O dilema está, portanto, centrado na oposição entre vida eterna e vida terrena, 
espírito e carne. Dentro do Barroco, parece impossível haver conciliação entre 
estas antíteses. Ou se vive sensualmente a vida ou se foge dos gozos humanos e 
se alcança a eternidade.
 
No que concerne à literatura deste período, esta expressa esse novo clima 
intelectual e espiritual: à tendência mais racional, opõe-se a atração pelo místico e 
irracional; excita-se a percepção dos contrastes entre os apelos do corpo e os desejos 
pela espiritualidade. Além disso, manifesta-se um uso excessivo de figuras de 
linguagem, o que constitui uma das principais características do movimento literário 
barroco. Entre estas figuras, destaquem-se as metáforas (comparações de ordem 
subjetiva, em que um termo adquire o sentido de outro), antíteses (oposição entre 
diferentes ideias), paradoxos (contrariedade entre ideias, o que leva a um absurdo), 
oxímoros (conflito de ideias que leva a um disparate, formado pela oposição 
substantivo-adjetivo, advérbio-adjetivo), hipérboles (uso de expressões exageradas) 
e hipérbatos (inversão da ordem natural dos termos na composição das orações).
Veja, caro/a acadêmico/a, como exemplo, a poesia de Gregório de Matos:
“Nasce o sol, e não dura mais que um dia,
depois da luz segue a noite escura,
em tristes sombras morre a formosura,
em contínuas tristezas a alegria.
Porém, se acaba o sol, por que nascia?
Se é tão formosa a luz, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?”
De outra parte, dentro de arte (e daliteratura) do Barroco, o terror que 
era manifestado pela Inquisição tentava impor certos limites à manifestação dos 
pensamentos, à expressão cultural de um modo geral; além disso, impunha certa 
austeridade. E dentro das características do Barroco, nesse sentido, aparece o 
Cultismo e o Conceptismo.
O Cultismo (ou Culteranismo ou ainda Gongorismo) tem no poeta 
espanhol Luís de Gôngora a sua expressão máxima. Este estilo caracteriza-se 
pelo uso de uma linguagem rebuscada, culta e extravagante. Para isto, vale-se de 
artifícios vários, entre os quais o jogo de palavras – ludismo verbal, o jogo com as 
imagens e o jogo de construções. O objetivo é ocultar sob o trabalho da perfeição na 
forma uma temática banal e estéril. Ocorre dentro desta característica o trabalho 
com as metáforas e as hipérboles, a adjetivação excessiva, o apelo sensorial. Veja-
se um exemplo de texto que se vale destes artifícios:
TÓPICO 2 | UMA ÉPOCA DE DUALISMOS: O BARROCO PORTUGUÊS
133
“O todo sem parte não é todo;
a parte sem o todo não é parte;
mas se a parte faz o todo, sendo parte,
não se diga que é parte, sendo o todo.
Em todo o sacramento está Deus todo,
e todo assiste inteiro em qualquer parte,
e feito em partes todo em toda a parte,
em qualquer parte sempre fica todo.”
 (Gregório de Matos)
Por sua vez, a característica conceptista se manifesta na linguagem que se 
vale de jogos de ideias ou conceitos, seguindo um raciocínio lógico, racionalista 
e com uma retórica aprimorada. Está presente também a argumentação com 
base antitética ou paradoxal, com certa aproximação à dissertação. Este estilo foi 
muito cultivado pelo escritor espanhol Francisco Gomez Quevedo y Villegaz, 
daí também chamar-se este estilo de quevedismo. Os conceptistas desejavam 
pesquisar a essência íntima dos objetos, tentando definir a sua face oculta. 
Observe-se um pequeno excerto de texto conceptista:
“Mui grande é o vosso amor e o meu delito;
porém pode ter fim todo o pecar,
e não o vosso amor, que é infinito.
Essa razão me obriga a confiar
que, por mais que pequei, neste conflito
espero em vosso amor de me salvar.”
 (Gregório de Matos)
Questionamos, aqui, caro/a acadêmico/a, se existe uma característica que 
seja fundamental no Barroco. O que se pode dizer é que todas as características 
que tentamos demonstrar nas reflexões até aqui efetuadas têm na dualidade a 
sua coluna mestra. No fundo, havia por trás da estética do Barroco as intenções 
da Contrarreforma, já que esta se valia do espírito catequizador. Na questão 
do lúdico da linguagem cultista, aliada à dialética da linguagem conceptista e 
persuasiva, estava o objetivo de ensinar e convencer.
O Barroco português, na sua expressão poética, não teve a mesma 
expressão que na prosa. Os poetas, de um modo geral, procuraram seguir o 
exemplo camoniano do soneto, valendo-se ora de uma linguagem de cunho mais 
conceptista, ora de cunho cultista. Talvez os poetas portugueses não tenham 
alçado voos mais altos em virtude da falta de esforço para a inovação. O seu valor 
é pequeno e “[...] somente raras composições alcançaram dizer-nos alguma coisa: 
tudo o mais pereceu com o tempo que lhe deu causa e razão de ser.” (MOISÉS, 
2008, p. 127).
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
134
A maior expressão poética barroca portuguesa deve-se a Gregório 
de Matos, inclusive com grande expressão no Barroco brasileiro. Outros que 
figuram entre a poesia barroca são Francisco Rodrigues Lobo, Sóror Violante do 
Céu, Francisco Manuel de Melo, D. Tomás de Noronha, Jerônimo Baía e Antônio 
Barbosa Bacelar.
Quando o Sol nasce e a sombra principia,
A doce abelha, a borboleta airosa
Procura luz ardente e fresca rosa,
Que faz a terra céu e a noite dia.
Mas quando à flor se entrega, à luz se fia,
Uma fica infeliz, outra ditosa
Pois vive a abelha e morre a mariposa
Na favorável rosa e chama ímpia.
Fílis, abelha sou, sou borboleta,
Que com afecto igual, com igual sorte,
Busco em vós melhor luz, flor mais selecta.
Mas quando a flor é branda, a chama é forte,
Néctar acho na flor, na luz cometa;
A boca me dá vida, os olhos morte.
AUTOR – JERÔNIMO BAÍA
FONTE: SILVEIRA, Francisco Maciel. Literatura 
Barroca. São Paulo: Global Editora, 1987. p. 
147. 
A vós correndo vou, braços sagrados,
nessa cruz sacrossanta descobertos,que, para 
receber-me, estais abertos,
e por não castigar-me, estais cravados.
A vós, divinos olhos, eclipsados
de tanto sangue e lágrimas cobertos,
pois, para perdoar-me, estais despertos,
e, por não condenar-me, estais fechados.
A vós, pregados pés, por não deixar-me,
a vós, sangue vertido, para ungir-me,
a vós, cabeça baixa, pra chamar-me.
A vós, lado patente, quero unir-me,
a vós, cravos preciosos, quero atar-me,
para ficar unido, atado e firme.
AUTOR – GREGÓRIO DE MATOS
FONTE: SILVEIRA, Francisco Maciel. Literatura 
Barroca. São Paulo: Global Editora, 1987. p. 
136. 
Já no que se refere à prosa barroca portuguesa, vale dizer que esta 
apresentou notável expressão, talvez pela sua maturidade, principalmente 
no que concerne ao aspecto formal. A contribuição, para atingir este patamar, 
deve-se, em muito, à influência exercida pelo Barroco. Diga-se que, no tocante à 
desenvoltura e à fluência, aproxima-se da prosa moderna.
Graças às suas características cultista e conceptista, aos seus variados 
recursos expressivos, a prosa barroca seiscentista ganhou uma plasticidade e 
elegância extraordinárias e um novo colorido, muito além da prosa medieval 
novelística. Além de tudo isto, logicamente, há que se considerar a genialidade, 
a expressividade de escritores como Padre Antônio Vieira, a maior expressão da 
prosa barroca portuguesa. 
TÓPICO 2 | UMA ÉPOCA DE DUALISMOS: O BARROCO PORTUGUÊS
135
FONTE: Ramalho; Ramos; Carvalho (2010, p. 15)
FIGURA 24 – PADRE ANTÔNIO VIEIRA
Acerca da sua produção literária em prosa, é possível classificá-la dentro 
do cânone do barroco. Constitui-se de cerca de duzentos sermões, quinhentas 
cartas que constituem valiosos documentos históricos que tratam da situação 
da Colônia, a Inquisição, os cristãos-novos, a relação entre Portugal e Holanda, 
entre outros fatos históricos da época. Sustenta-se que a parte mais valiosa de 
sua obra esteja nos sermões que, em linguagem simples e sem torneios de estilo, 
revelam um grande domínio da língua, criatividade, sensibilidade, humanidade 
e convicções. 
Antônio Vieira é natural de Lisboa, e já em 1614 mudou-se com a família 
para o Brasil, instalando-se na Bahia. Estreou no púlpito com um sermão proferido 
em 1633, ainda na Bahia, antes de ser ordenado sacerdote, um ano. A partir de 
1641, retorna novamente a Lisboa, para ser nomeado Pregador Real e Tribuno 
da Restauração (lembre-se, caro/a acadêmico/a, de que a Restauração da Coroa 
portuguesa começa por volta de 1640, com D. João IV). Nos anos de 1646 e 1647, 
Padre Vieira ficou encarregado de missões secretas na França e na Holanda. Entre 
1652 e 1661, esteve no Maranhão, coordenando uma missão jesuítica. Sua atuação 
foi muito importante para a promulgação da “Lei da Liberdade dos Índios”, de 
1655. 
Tratando-se de um homem tão brilhante e politicamente tão atuante, 
não haveria como escapar de perseguições, inclusive da Igreja. Foi preso pela 
Inquisição e permaneceu encarcerado entre os anos de 1665 e 1668. Por meio de 
uma sentença emanada do Tribunal do Santo Ofício, foi-lhe cassada a palavra, 
em 1667. Dirigiu-se, então, para Roma, e lá permaneceu pelo período de seis 
anos. Neste tempo de permanência em Roma, consegue que o papa Clemente X 
o livre da Inquisição. Retorna então ao Brasil, novamente para a Bahia, e passa ali 
os últimos dezesseis anos de sua vida, organizando suas obras para publicação. 
Morreu em Salvador, capital da Bahia, aos 18 de julho de 1697. 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
136
Entre os sermões mais famosos de Padre Vieira, podem-se destacar:
 - Sermão pelo Bom Sucesso das Armasde Portugal Contra as de Holanda (1640). 
Por causa da ação dos invasores holandeses, que cercaram a cidade de Salvador, 
o Padre Vieira, ainda aos 32 anos de idade, declara que talvez este seja o seu mais 
ousado e impressionante sermão, diante de uma plateia amedrontada, na Igreja de 
Nossa Senhora da Ajuda. Padre Vieira, no sermão, não se dirige ao povo, mas, sim, 
ao próprio Deus, rogando-lhe proteção para o seu povo: “Acordai, Senhor, por que 
dormis?”, diz ele, com as palavras do Salmo 43.
 
- Sermão do Mandato (1650): este sermão trata do amor místico de Cristo, e é 
considerado como um dos mais belos e mais perfeitos sermões. 
- Sermão de Santo Antônio aos Peixes (1654). Este sermão foi proferido no 
Maranhão, durante a luta dos jesuítas contra a escravização dos índios pelos 
colonizadores. Vieira dá mostra de sua veia satírica, comparando os vícios dos 
colonos ao comportamento das diversas espécies de peixes. 
- Sermão da Sexagésima (1655): este sermão é visto como um dos mais famosos. 
Foi proferido pelo Padre Vieira, em 1655, na Capela Real. Nas suas palavras, 
o autor faz referência à arte de pregar, demonstrando suas dez partes. Padre 
Vieira vale-se da metáfora de que pregar é o mesmo que semear. Ele traça um 
paralelo entre a parábola bíblica do semeador que semeou nas pedras, nos 
espinhos (em que o trigo frutificou e morreu), na estrada (ali não frutificou) e 
na terra (que frutificou). Vieira critica muitos dos pregadores contemporâneos 
seus, achando que estes o faziam mal, por tratarem de vários assuntos 
concomitantemente. Consequentemente, a pregação tornava-se vaga, ineficaz, 
agradando aos homens sem agradar a Deus. O sermão em questão foi chamado 
de Sermão da Sexagésima, pois esta era, no calendário da Igreja, o segundo 
domingo antes do primeiro da quaresma, ou seja, aproximadamente sessenta 
dias antes da Páscoa.
Valendo-se da boa retórica, como jesuíta que era, sabendo organizar 
e ordenar os conceitos e as ideias, Vieira mostrou-se um autêntico barroco 
conceptista, no desenvolvimento e ordenação das ideias lógicas, com o objetivo 
de persuadir a plateia. Pode ser visto também como um bom clássico, já que 
possui clareza e simplicidade na sua maneira de se expressar. Entre os temas de 
sua preferência, destacam-se o valor que deve ser atribuído à vida humana, para 
reaproximá-la de Deus, e a exaltação do sofrimento, vendo-se nele o caminho 
para a salvação. 
A seguir, caro/a acadêmico/a, apresentamos um excerto do Sermão da 
Sexagésima, para que você possa conhecer o conteúdo, a linguagem, o estilo, a 
estética da prosa do período barroco português.
TÓPICO 2 | UMA ÉPOCA DE DUALISMOS: O BARROCO PORTUGUÊS
137
Sermão da Sexagésima
Padre Antônio Vieira
Sabeis, cristãos, por que não faz fruto a palavra de Deus? Por culpa dos 
pregadores. Sabeis, pregadores, por que não faz fruto a palavra de Deus? — 
Por culpa nossa. [...] 
Mas dir-me-eis: Padre, os pregadores de hoje não pregam do Evangelho, 
não pregam das Sagradas Escrituras? Pois como não pregam a palavra de 
Deus? Esse é o mal. Pregam palavras de Deus, mas não pregam a palavra de 
Deus: Qui habet sermonem meum, loquatur sermonem meum vere, disse Deus por 
Jeremias. As palavras de Deus, pregadas no sentido em que Deus as disse, 
são palavras de Deus; mas pregadas no sentido que nós queremos, não são 
palavras de Deus, antes podem ser palavras do Demônio. Tentou o Demônio a 
Cristo a que fizesse das pedras pão. Respondeu-lhe o Senhor: Non in solo pane 
vivit homo, sed in omni verbo, quod procedit de ore dei. Esta sentença era tirada do 
capítulo VIII do Deuteronômio. Vendo o Demônio que o Senhor se defendia da 
tentação com a Escritura, leva-o ao Templo, e alegando o lugar do Salmo 90, 
diz-lhe desta maneira: Mille te deorsum; scriptum est enim, quia Angelis suis Deus 
mandavit de te, ut custodiant te in omnibus viis tuis. “Deita-te daí abaixo, porque 
prometido está nas Sagradas Escrituras que os anjos te tomarão nos braços, 
para que te não faças mal.” De sorte que Cristo defendeu-se do Diabo com a 
Escritura, e o Diabo tentou a Cristo com a Escritura. Todas as Escrituras são 
palavra de Deus: pois se Cristo toma a Escritura para se defender do Diabo, 
como toma o Diabo a Escritura para tentar a Cristo? A razão é porque Cristo 
tomava as palavras da Escritura em seu verdadeiro sentido, e o Diabo tomava 
as palavras da Escritura em sentido alheio e torcido; e as mesmas palavras, que 
tomadas em verdadeiro sentido são palavras de Deus, tomadas em sentido 
alheio, são armas do Diabo. As mesmas palavras que, tomadas no sentido em 
que Deus as disse, são defesa, tomadas no sentido em que Deus as não disse, 
são tentação. Eis aqui a tentação com que então quis o Diabo derrubar a Cristo, 
e com que hoje lhe faz a mesma guerra do pináculo do templo. O pináculo do 
templo é o púlpito, porque é o lugar mais alto dele. O Diabo tentou a Cristo 
no deserto, tentou-o no monte, tentou-o no templo: no deserto, tentou-o com a 
gula; no monte, tentou-o com a ambição; no templo, tentou-o com as Escrituras 
mal-interpretadas, e essa é a tentação de que mais padece hoje a Igreja, e que 
em muitas partes tem derrubado dela, senão a Cristo, a sua fé. [...]
Miseráveis de nós, e miseráveis dos nossos tempos! Pois neles se veio a 
cumprir a profecia de S. Paulo: Erit tempus, cum sanam doctrinam non sustinebunt: 
Virá tempo, diz S. Paulo, “em que os homens não sofrerão a doutrina sã. Sed ad 
sua desideria coacervabunt sibi magistros prurientes auribus: Mas para seu apetite 
terão grande número de pregadores feitos a montão e sem escolha, os quais 
não façam mais que adular-lhes as orelhas. A veritate quidem auditum avertent, 
ad fabulas auten convertentur: Fecharão os ouvidos à verdade, e abri-los-ão às 
fábulas”. Fábula tem duas significações: quer dizer fingimento e quer dizer 
comédia; e tudo são muitas pregações deste tempo. São fingimento, porque 
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
138
são sutilezas e pensamentos aéreos, sem fundamento de verdade; são comédia, 
porque os ouvintes vêm à pregação como à comédia; e há pregadores que vêm 
ao púlpito como comediantes. Uma das felicidades que se contava entre as do 
tempo presente era acabarem-se as comédias em Portugal; mas não foi assim. 
Não se acabaram, mudaram-se; passaram-se do teatro ao púlpito. Não cuideis 
que encareço em chamar comédias a muitas pregações das que hoje se usam. 
Tomara ter aqui as comédias de Plauto, de Terêncio, de Sêneca, e veríeis se não 
acháveis nelas muitos desenganos da vida e vaidade do mundo, muitos pontos 
de doutrina moral, muito mais verdadeiros, e muito mais sólidos, do que 
hoje se ouvem nos púlpitos. Grande miséria por certo, que se achem maiores 
documentos para a vida nos versos de um poeta profano, e gentio, que nas 
pregações de um orador cristão, e muitas vezes, sobre cristão, religioso! [...] 
Estamos às portas da Quaresma, que é o tempo em que principalmente 
se semeia a palavra de Deus na Igreja, e em que ela se arma contra os vícios. 
Preguemos e armemo-nos todos contra os pecados, contra as soberbas, contra 
os ódios, contra as ambições, contra as invejas, contra as cobiças, contra as 
sensualidades. Veja o Céu que ainda tem na terra quem se põe da sua parte. 
Saiba o Inferno que ainda há na terra quem lhe faça guerra com a palavra de 
Deus, e saiba a mesma terra que ainda está em estado de reverdecer e dar muito 
fruto: Et fecit fructum centuplum.
FONTE: PÉCORA, Alcir. Sermão da Sexagésima. In: Sermões: Padre Antônio Vieira. São Paulo: 
Hedra, 2003. p. 163-175.
O Sermão da Sexagésima constitui-se uma verdadeira aula de retórica 
clássica dentro da arte literária. Não à toa, já foi dito que, em muitos momentos, 
os escritores barrocos se valeram da literatura para atingir certos objetivos. No 
caso de Vieira, não seria diferente. Pelo sermão, ele ensina aos demais pregadores 
a arte de pregar, isto é, indiretamente, como elaborar um bom sermão. Para ele, os 
pregadores sempre deviamvaler-se dos recursos argumentativos que pudessem 
fazer com que os ouvintes permanecessem atentos, durante toda a pregação. 
Acredita ele que se esses elementos fossem bem articulados, o sermonista atingiria 
o fim último de convencer o ouvinte.
O termo retórica refere-se à arte de bem falar através da oratória, também 
chamada de eloquência, no sentido de persuadir o interlocutor.
NOTA
TÓPICO 2 | UMA ÉPOCA DE DUALISMOS: O BARROCO PORTUGUÊS
139
Por outro lado, vislumbram-se já as luzes do século XVIII, tempo em que 
as mentes também começam a se modificar, não aceitando, principalmente, a 
pregação religiosa “imposta” pela Contrarreforma. Os exageros da arte barroca 
não têm mais a mesma aceitação, o pensamento antropocêntrico começa a ser 
retomado, o saber passa a ser racional, pois reflete o desenvolvimento tecnológico, 
industrial, social e científico. Vive-se, agora, o século das luzes, o iluminismo 
burguês que prepara o caminho para a chegada da Revolução Francesa, que 
influenciará o mundo em muitos aspectos.
E a Literatura também passa a refletir as mudanças que se aproximam, 
por isso, o Barroco começa a perder força, e novas maneiras de conceber e refletir 
a produção literária começam a surgir. É o Arcadismo. E este será o assunto do 
nosso próximo tópico. Até lá!
140
RESUMO DO TÓPICO 2
Caro/a acadêmico/a, no presente tópico, você teve oportunidade de 
estudar aspectos importantes relacionados à Literatura Portuguesa, os quais 
revemos, resumidamente, a seguir:
• O período denominado Barroco está marcado, no seu eixo espiritual e 
ideológico, por dualismos, por ideias que contrastam entre si, o que coloca 
o homem entre dois polos: homem e Deus, pecado e perdão, religiosidade e 
paganismo, material e espiritual, antropocentrismo e teocentrismo.
• O Barroco, por excelência, é a arte dos contrastes, pois o artista está 
constantemente tentando conciliar forças polares. O resultado disso é uma 
obra de arte com a marca do exagero e da desigualdade, revelando, inclusive, 
certa angústia por causa deste conflito. 
• A tônica do Barroco é dada pelos ideais da reação da Igreja às ideias reformistas. 
Em vista disso, há o medo, a crescente quantidade de templos religiosos 
construídos, de estátuas de santos e de Jesus, de documentos sacros. As obras 
de arte deveriam suscitar compaixão, autopiedade.
• No que concerne à literatura deste período, esta expressa um novo clima 
intelectual e espiritual: à tendência mais racional, opõe-se a atração pelo místico 
e irracional; excita-se a percepção dos contrastes entre os apelos do corpo e 
os desejos pela espiritualidade. Além disso, manifesta-se um uso excessivo de 
figuras de linguagem, o que constitui uma das principais características do 
movimento literário barroco.
• O Cultismo (ou Culteranismo ou ainda Gongorismo) caracteriza-se pelo uso de 
uma linguagem rebuscada, culta e extravagante. 
• A característica conceptista manifesta-se na linguagem que se vale de jogos 
de ideias ou conceitos, seguindo um raciocínio lógico, racionalista e com uma 
retórica aprimorada.
• Por trás da estética do Barroco havia as intenções da Contrarreforma, já que esta 
se valia do espírito catequizador. Na questão do lúdico da linguagem cultista, 
aliada à dialética da linguagem conceptista e persuasiva, estava o objetivo de 
ensinar e convencer. 
• Os poetas, de um modo geral, procuraram seguir o exemplo camoniano do 
soneto, valendo-se ora de uma linguagem de cunho mais conceptista ora de 
cunho cultista. Talvez os poetas portugueses não tenham alçado voos mais 
altos em virtude da falta de esforço para a inovação.
141
• No que se refere à prosa barroca portuguesa, esta apresentou notável expressão, 
talvez pela sua maturidade, principalmente no que concerne ao aspecto formal. 
• Padre Antônio Vieira constitui a maior expressão da prosa barroca portuguesa. 
Valendo-se da boa retórica, mostrou-se um autêntico barroco conceptista, no 
desenvolvimento e ordenação das ideias lógicas, com o objetivo de persuadir a 
plateia.
142
AUTOATIVIDADE
Caro/a acadêmico/a, para que você possa melhor fixar o conteúdo deste 
tópico, apresentamos, a seguir, uma atividade. Procure resolvê-la com base no 
que você estudou.
1 Leia este soneto de Gregório de Matos e, em seguida, responda às questões 
apresentadas:
Meu Deus, que estais pendente de um madeiro,
em cuja lei protesto de viver,
em cuja santa lei hei de morrer
animoso, constante, firme e inteiro:
neste lance, por ser o derradeiro,
pois vejo a minha vida anoitecer,
é, meu Jesus, a hora de se ver
a brandura de um pai, manso cordeiro.
Mui grande é vosso amor e o meu delito;
porém, pode ter fim todo o pecar,
e não o vosso amor, que é infinito.
Esta razão me obriga a confiar,
que, por mais que pequei, neste conflito
espero em vosso amor de me salvar.
 (Gregório de Matos)
a) Observe o seguinte verso: “pois vejo a minha vida anoitecer”. Dentre as 
muitas figuras de linguagem de que se valiam os poetas barrocos, qual está 
presente neste verso?
b) No primeiro terceto, o poeta joga com a ideia de “finito” e “infinito”. 
Comente o que o poeta diz ser finito e o que diz ser infinito.
2 Releia este trecho do Sermão do Mandato, de Padre Antônio Vieira. Em 
seguida, responda às questões propostas:
143
A INGRATIDÃO
Padre Antônio Vieira
Outra vicissitude do tempo é a ingratidão. Esfriar o amor a ausência 
é sem razão de que todos se queixam; mas que a ingratidão mude o 
amor e o converta em aborrecimento, a mesma razão “quase” o aprova, 
o persuade e parece que o manda. Que sentença mais justa que privar 
do amor a um ingrato? A essência pode ser força, a ingratidão sempre é 
delito. Se ponderarmos os efeitos de cada um desses contrários, acharemos 
que a ingratidão é o mais forte. A ausência tira ao amor a comunicação, a 
ingratidão tira-lhe o motivo. De sorte que o amigo, por estar ausente, não 
perde o merecimento de ser amado; se o deixamos de amar não é culpa sua, 
é injustiça nossa. Porém, se foi ingrato, ficou indigno de amor. Finalmente 
a ausência combate o amor pela memória, a ingratidão pelo entendimento 
e pela vontade; e ferido o amor no cérebro e ferido no coração, como pode 
viver? “Assim, ensina a experiência no amor humano.” É a ingratidão com 
o amor, como o vento com o fogo: se o fogo é pequeno, apaga-o o vento; se 
é grande, acende mais. “E tal foi o amor de Cristo.” Quantas ingratidões 
usaram com ele os homens! Mas nenhuma, nem todas juntas foram bastantes 
para lhe remitirem um ponto o amor, nem vivo, nem morto: Cum dilexisset 
suos qui erant in mundo, in finem dilexit eos (Como amasse os seus que estavam 
no mundo, amou-os até o fim). 
Dizem que um amor com outro se paga; o mais certo é que um amor 
com outro se apaga. Ora, grande coisa deve de ser o amor; pois, sendo 
assim que não bastam a encher um coração mil mundos, não cabem em 
um coração dois amores. Daqui vem que se acaso se encontram e pleiteiam 
sobre o lugar, sempre fica a vitória pelo melhor objeto. É o amor entre os 
afetos, como a luz entre as qualidades. “Uma luz apaga-se por outra maior; 
e assim vemos que em aparecendo o sol, que é luz maior, desaparecem as 
estrelas. O mesmo sucede ao amor, por grande e extremado que seja. Em 
aparecendo maior e melhor objeto, logo se desamou o menor.”
FONTE: GOMES, Eugênio. Vieira - trechos escolhidos. Rio de Janeiro: Agir, 1971. p. 85.
a) Neste sermão, Vieira fala dos efeitos da ausência sobre o amor. Cite-os.
b) Discorra acerca de como a razão considera o enfraquecimento do amor na 
ausência do ser amado.
c) Encontre no texto do sermão características que se referem ao Barroco.
d) Considerando o modo de Vieira tratar o tema do amor neste sermão, 
comente acerca de qual linha de pensamento do Barroco você julga que o 
texto está mais próximo: se do cultismo ou do conceptismo.
144
145
TÓPICO 3
AS LUZES DA RAZÃO: O ARCADISMO
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
“Eis, Bocage, em quem luz algum talento; 
Saíram dele mesmo estas verdades
Numdia em que se achou mais 
pachorrento.”
 (BOCAGE, Manuel. Sonetos. São Paulo: 
Publifolha, 1997, p. 298.)
Gradativamente, a ação do movimento da Contrarreforma foi perdendo 
terreno e, por outro lado, o movimento expansionista continuou seu trabalho, 
deixando para o mundo os seus resultados, entre os quais, a expansão comercial. 
Ao mesmo tempo em que as relações comerciais se intensificavam, desenvolviam-
se os instrumentos tecnológicos, o que garantiu o aparecimento de meios de 
produção mais eficientes, mais rápidos. Diante disto, aumentou o consumo, 
criou-se a necessidade de maior comércio, de maior integração econômica entre 
as nações, desenvolveu-se, como consequência, o capitalismo comercial e, além 
de tudo, promovia-se a integração cultural da Europa como um todo e o Mundo, 
além do Novo Mundo, incluindo o Brasil. 
Neste cenário, dava-se a ascensão da classe burguesa, por um lado, mas, 
pelo outro, a classe dos trabalhadores do campo sentia-se atraída pelas novas 
oportunidades de trabalho que eram abertas nas cidades, graças ao crescimento 
da produção e o consequente alto consumo e aumento das vendas; era o êxodo 
rural que começava a dar as caras. Via-se, ao mesmo tempo, a decadência dos 
governos monárquicos absolutistas, e no seu lugar ganhavam espaço governos 
revestidos de propostas rígidas e autoritárias e que respaldavam o capitalismo 
comercial.
Atreladas a estas profundas mudanças socioeconômicas, chegaram 
também as novas ideias artísticas e filosóficas, entre as quais a razão, que passou 
a suplantar a religião, reinante esta no período barroco. Muitas correntes do 
pensamento surgiram em toda a Europa, entre as quais o movimento mais 
importante da época, o Iluminismo. Os seguidores desta corrente defendiam 
a ideia de que a fonte do conhecimento estaria centrada na razão. Além disso, 
“[...] o homem desse momento histórico, senhor do mundo pelo conhecimento, 
modificador do mundo pela técnica” (SARAIVA, 1970, p. 39) conta agora com 
um espírito mais reformista e deseja modificar também os vários aspetos das 
manifestações artísticas, entre estas a literatura, já que se vive agora um novo 
tempo e uma nova ideologia.
146
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
Este tempo novo, que manifesta novas ideias dentro do espírito iluminista, 
denomina-se Arcadismo (ou Setecentismo ou ainda Neoclassicismo), e dá uma 
nova tônica às artes principalmente na segunda metade do século XVIII. Este 
novo matiz vem principalmente dos ideais da nova burguesia e é caracterizado 
pela procura da pureza e da simplicidade das formas clássicas. O Arcadismo 
português, caro/a acadêmico/a, constitui o assunto deste terceiro tópico, e a sua 
estética será estudada a seguir.
FONTE: Enciclopédia Brasileira de Consultas e Pesquisas (1988, p. 368)
FIGURA 25 – ILUSTRAÇÃO TÍPICA DO ARCADISMO
2 AS IDEIAS ILUMINISTAS E A ESTÉTICA NEOCLÁSSICA
Dentro do contexto do espírito iluminista do século XVIII, é natural que 
os escritores também fossem tomados pela visão racional do mundo e das coisas. 
E a expressão da literatura do momento histórico que se impõe nesta época, 
representada pela crítica da burguesia mais culta ao modo de vida simbolizado 
pelo clero e pela nobreza, recebe a denominação de Arcadismo.
O momento era de inovação, de insatisfação com a repetição dos modelos 
e das formas, com a impregnação de um mesmo estilo. Com a influência do 
racionalismo, da invenção, da técnica, as ideias do novo, a tendência só poderia 
ser de romper com o presente e estabelecer projeções em relação ao futuro, 
propondo novos modos, novas maneiras de fazer literatura. Mas, ao que parece, 
vêm à tona elementos de um passado remoto. É novamente a retomada do 
velho, acompanhada da negação de um passado imediatamente anterior. Ao 
ser retomado, o modelo mais antigo recebe as devidas roupagens do momento 
presente, para assim adaptar-se àquilo que é tido como estilo atual. 
TÓPICO 3 | AS LUZES DA RAZÃO: O ARCADISMO
147
E isto não foi diferente com o Arcadismo, movimento que sucedeu o 
Barroco, cuja estética calcada no rebuscamento, nos detalhes, nas contrariedades, 
estava voltada para as classes mais abastadas, entre as quais a burguesia e o clero. 
No atual movimento (Arcadismo), a reação procede da burguesia emergente, 
propondo formas de expressão mais simples, mais ao seu gosto. Poder-se-
ia afirmar que, nesse trânsito, atenuam-se certos aspectos mais pesados do 
seiscentismo e “[...] prefiguram-se as tendências estéticas do Arcadismo como a 
busca do natural e do simples e a adoção de esquemas rítmicos mais graciosos.” 
(BOSI, 1984, p. 61). Os ideais de uma vida mais modesta e natural vêm calhar com 
os anseios de um público novo, consumidor em formação, que é composto pela 
burguesia, a qual historicamente lutava pelo poder e denunciava a vida de luxo 
da nobreza nas cortes.
A denominação do novo estilo – Arcadismo – origina-se da palavra 
“arcádia”, que remete a uma região da Grécia antiga, no Peloponeso, que era 
habitada por personagens mitológicas, constituída por um local de florestas, com 
muitas riquezas e belezas naturais. No plano da mitologia grega, esse era um local 
de morada das divindades, porém, na realidade, habitavam ali muitos pastores, 
os quais se dedicavam também à composição de poesias.
Não à toa, os poetas arcadistas têm como fonte principal de inspiração e 
como tema das suas composições a natureza. Por isso, o modelo a ser seguido é a 
Arcádia. Ao iniciarem os literatos a reação aos exageros do Barroco, começaram 
a denominar de Arcádias as agremiações em que se reuniam com o fim de 
restaurarem a simplicidade e a sobriedade da poesia greco-latina. Geralmente, 
nos encontros das arcádias, o que dominava era a disciplina. De acordo com as 
regras, era necessária a adoção de pseudônimos, geralmente pastoris, muitas 
vezes copiados da literatura ou da tradição mitológica clássica.
FONTE: Enciclopédia Brasileira de Consultas e Pesquisas (1988, p. 366)
FIGURA 26 – ARCÁDIA, EM GREGO Αρκαδία, REGIÃO DA GRÉCIA ANTIGA
148
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
Tem-se como marco do início do Arcadismo lusitano o ano de 1756, data 
em que foi fundada a Arcádia Lusitana. Esta entidade reunia vários artistas para 
discutirem acerca da arte, entre esta a literária. Este período deu início a uma nova 
fase à literatura portuguesa, seja em termos doutrinários seja de criação. Esta 
Arcádia foi fundada nos mesmos moldes da já existente e inspiradora Arcádia 
Romana, a qual foi fundada ainda em 1690. Com a recém-fundada Arcádia nas 
terras lusitanas, dizem Saraiva e Lopes (1976, p. 564) “[...] que iriam culminar as 
tendências neoclássicas e preparar a evolução literária no sentido do realismo 
burguês setecentista.” Além disso, importante completar-se este pensamento com 
as palavras de Vítor Manuel de Aguiar e Silva, o qual diz que com a fundação da 
Arcádia Lusitana, em 1756, cobrou-se maior amplitude, consistência doutrinária e 
relativa eficácia prática à difusão dos ideais neoclássicos à Literatura Portuguesa. 
(1979).
Na fundação da Arcádia Lusitana, participaram poetas de renome dentro 
da literatura portuguesa, entre os quais Antônio Dinis da Cruz e Silva, Pedro 
Antônio Correia Garção, Manuel Nicolau Esteves Galvão e Teotônio Gomes de 
Carvalho. Estes assumiram as principais características do novo movimento, 
como a concepção da arte como imitação da natureza e o ataque ao movimento 
barroco. Esta Arcádia tem duração até o ano de 1774, quando, por divergências 
internas, seus sócios acabam se dispersando. 
FONTE: Enciclopédia Brasileira de Consultas e Pesquisas (1988, p. 362)
FIGURA 27 – SÍMBOLO DA ARCÁDIA LUSITANA
TÓPICO 3 | AS LUZES DA RAZÃO: O ARCADISMO
149
Em termos de espírito doutrinário, o Arcadismo realizou um grande 
trabalho dentro da literatura portuguesa, haja vista o espírito crítico que fez 
amadurecer, por meio da revisão dos valores literários do passado e do presente. 
Tome-se,por exemplo, a divisa inutilia truncat, inscrita no símbolo da Arcádia 
Lusitana, a qual põe em evidência o espírito de rebeldia dos primeiros árcades, 
em vista dos excessos praticados pelo estilo passado, Barroco.
Por meio do repúdio aos ideais do passado barroco e procurando seguir 
racionalmente os ideais dos antigos, reformulando-os para adaptá-los à realidade 
moderna, os escritores árcades conseguem restabelecer o equilíbrio de que a 
poesia portuguesa necessita, o seu bom gosto e simplicidade enquanto arte 
baseada na renascença.
Os escritores do período arcádico tinham por cunho a procura pela 
recuperação dos ideais clássicos da literatura, conforme você já pôde perceber, 
caro/a acadêmico/a. Nesse sentido, as fontes de equilíbrio e das quais emanava a 
sabedoria têm sido os clássicos. Não à toa chamar-se a este estilo Arcadismo, pois, 
como já foi apresentado, Arcádia era a morada dos pastores, a qual designava 
o lugar verdadeiro para o poeta obter o equilíbrio necessário e a sabedoria. Em 
vista disso, em muitas ocasiões, os poetas árcades autodenominavam-se pastores 
e caracterizavam-se com alcunhas como pastores gregos e latinos. 
É a partir da clara reação contra os exageros do Barroco que surgem as 
principais características do Arcadismo: 
EQUILÍBRIO: os escritores do Arcadismo, inicialmente, buscavam a 
retomada dos moldes do período clássico, alegando que nesses modelos poderiam 
encontrar o equilíbrio dos sentimentos, por meio do racionalismo (razão). Para 
eles, esta seria a força capaz de monitorar os excessos. O desejo era, contrariamente 
ao Barroco, uma linguagem simples, com frases diretas e vocabulário acessível, 
distante do exagerado uso de figuras de linguagem, retirando tudo o que fosse 
inútil, desnecessário à produção literária. Para eles, o texto deveria valer-se de um 
caráter mais didático, concorrendo para a criação da consciência. Os escritores 
do Arcadismo celebravam a virtude, o espírito de humildade, o desdém do luxo, 
o enaltecimento de um tipo de vida que buscava a simplicidade e a moderação. 
Heróis, para eles, geralmente, eram pastores anônimos e felizes. Veja-se o excerto 
de uma poesia:
“Se não tivermos lãs e peles finas,
podem mui bem cobrir as carnes nossas
as peles dos cordeiros mal curtidas,
e os panos feitos com as lãs mais grossas.
Mas ao menos será o teu vestido
por mãos de amor, por minhas mãos cosido”.
 (Tomás Antônio Gonzaga, Lira XV)
150
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
BUCOLISMO: é o princípio do fugere urbem (palavras em latim cujo 
significado é a fuga da cidade) adotado pelos árcades. A linguagem simples e clara 
também é uma característica do Arcadismo. Por meio da inspiração no poeta latino 
Horácio, com o fugere urbem (fugir da cidade, fugir da civilização), os escritores 
do período arcádico acreditavam que o ser humano seria capaz de alcançar todo 
o equilíbrio, a felicidade, a espiritualidade, através do contato com a natureza, o 
chamado locus amoenus. O locus amoenus – lugar ameno – “[...] consiste de uma 
bela e ensombrada nesga da natureza, cujo mínimo de apresentação consiste 
numa árvore (ou várias), numa campina e numa fonte ou regato.” (CURTIUS, 
1957, p. 202). Esta é a paisagem sonhada pelos poetas (ou pastores) árcades.
Nessa época estava em pleno andamento o crescimento acelerado das 
cidades, embalado pelo rápido processo de industrialização; o Arcadismo 
divulgava o retorno à vida simples do campo. Por causa disto, eram frequentes 
os temas pastoris e cenas do campo sendo tratados pelos autores desse período. 
Há que se explicar que a natureza de que falam os textos árcades geralmente é 
criada pelo poeta, como um cenário artificial, falando de lindos campos, riachos 
cristalinos, ou ainda relva verde. Os escritores, por sua vez, estão em pleno centro 
urbano, por isso, está aí o chamado fingimento poético.
“Destes penhascos fez a natureza 
O berço em que nasci: oh! quem cuidara 
Que entre penhas tão duras se criara 
Uma alma terna, um peito sem dureza!”
 (Cláudio Manoel da Costa)
FONTE: Enciclopédia Brasileira de Consultas e Pesquisas (1988, p. 381)
FIGURA 28 – O BUCOLISMO
TÓPICO 3 | AS LUZES DA RAZÃO: O ARCADISMO
151
CONVENCIONALISMO: o estilo árcade traz uma marca característica 
chamada convencionalismo, ou seja, a presença das frases prontas, dos clichês 
e dos lugares comuns. Destaquem-se as ovelhas, os pastores e as pastoras, os 
montes, as ninfas entre outros tantos elementos naturais, artificialmente criados 
pelo poeta árcade. Tal convencionalismo transforma a poesia do Arcadismo, de 
um modo geral, estigmatizado por causa da exígua expressividade e do amplo 
artificialismo. Há que se destacar, nesse sentido, a monotonia causada pela 
repetição, por vezes exaustiva, de temas bucólicos e pastoris. 
“Amáveis solidões, bosques sagrados,
que nas noites tranquilas livremente,
prestais um doce abrigo aos desgraçados.
de meus olhos a límpida corrente
deixai-me desatar; suspiros, brados,
expliquem sem receio o que a alma sente.”
 (Marquesa de Alorna) 
CARPE DIEM: uma das grandes marcas da estética árcade é ocarpe diem, 
ou seja, aproveitar o dia, tido também como o princípio do viver intensamente os 
momentos presentes. Este tema também, visto sob a ótica da fugacidade da vida 
(por isso aproveitar o momento), é muito comum na literatura ocidental. E há 
que se ressaltar que o próprio Barroco se valeu dele, porém o ângulo de visão do 
Barroco era o negativo, próximo à ideia do fim, da morte. Por sua vez, os árcades 
o utilizam na perspectiva de um convite amoroso, como uma insinuação erótica. 
O poeta, na certeza de que a vida é algo passageiro (efemeridade da vida) chama 
a amada para que juntos aproveitem o momento atual. Isto é o carpe diem, ou o 
desejo de aproveitar o momento, a vida enquanto é possível, já que esta é apenas 
uma passagem.
“Prendamo-nos, Marilia, em laço estreito, 
gozemos do prazer de sãos amores.
Sobre nossas cabeças,
sem que o possam deter, o tempo corre:
e para nós o tempo que se passa
também, Marília, morre.”
 (Tomás Antônio Gonzaga) 
Em consonância com outras escolas literárias, o Arcadismo também 
refletiu a sociedade de sua época, no caso, os valores emanados do Iluminismo, 
entre os quais o culto à razão e a busca pelo conhecimento. Contrariando os valores 
barrocos, por outro lado, distinguiu-se por um estilo mais simples, valendo-se 
das paisagens bucólicas, dos temas pastoris, criando cenas artificialmente. O 
Arcadismo adotou uma estética que se voltou mais às formas poéticas do que 
para a prosa. Sabe-se, no entanto, que as manifestações em prosa desse período 
não seguiram os cânones do Arcadismo.
152
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
Durante o período árcade, muitos escritores se destacaram, entre os quais: 
• Manuel Maria Barbosa du Bocage: Idílios Marítimos (1791); Obras Poéticas 
(1812-1813) e Verdadeiras Inéditas Obras Poéticas (1814);
• Antonio Diniz Cruz e Silva: Odes Pindáricas, 1801; O Hissope, 1802;
• Correia Garção: Assembleia ou Partido; Obras Poéticas;
• Francisco José Freire: Vieira defendido, Lisboa, 1746; Lisboa, 1745;
• Marquesa de Alorna: Alcippe, Lisboa, 1844;
• Padre Francisco Manoel do Nascimento: Da Arte Poética Portuguesa;
• Domingos Reis Quita: Obras Poéticas;
• Domingos Caldas Barbosa: A Viola de Lereno;
• José Agostinho de Macedo: A Pena de Talião.
A partir de 1790, a literatura portuguesa contou com a Nova Arcádia, 
e esta, por sua vez, foi agraciada com a presença de um dos maiores poetas 
portugueses do Arcadismo – e talvez do século XVIII – Manuel Maria Barbosa du 
Bocage. Por ter sido ele a maior expressão desse período, merece ser estudado à 
parte, no próximo item.
FONTE: Enciclopédia Brasileira de Consultas e Pesquisas (1988, p. 383) 
FIGURA 29 – PALÁCIO DOS CONDES DE POMBEIRO, NO QUAL SE REUNIA A NOVA ARCÁDIA
3 BOCAGE: A EXPRESSÃO DO LIRISMO PORTUGUÊS
Dentreos autores árcades, o mais renomado, o mais expressivo foi Manuel 
Maria Barbosa L’ Hedois du Bocage, mais conhecido por Bocage. É considerado 
o ícone do movimento literário do Arcadismo. Ao mesmo tempo, ele é uma 
figura que se insere no período que marca a passagem para o estilo romântico e 
constitui uma forte presença na literatura lusitana do século XIX. Para um melhor 
conhecimento desse autor, é prudente que se apresente uma biografia sua, de 
modo mais simplificado.
Bocage nasceu em Setúbal, Portugal, em 15 de setembro de 1765, às 
quinze horas. Seu falecimento ocorre em Lisboa, capital do país, na manhã de 21 
de dezembro de 1805. Seu pai era o bacharel José Luís Soares de Barbosa, juiz, 
ouvidor e advogado. Sua mãe, D. Mariana Joaquina Xavier L’ Hedois Lustoff 
TÓPICO 3 | AS LUZES DA RAZÃO: O ARCADISMO
153
du Bocage, era filha de um francês. Ainda em relação à mãe, esta era segunda 
sobrinha da importante poetisa francesa Marie Anne Le Page du Bocage. 
Ainda que tenham sido publicadas muitas biografias desse importante 
poeta português, grande parte de sua vida permanece obscura. Pouco ou nada 
se sabe acerca de seus estudos, mas acredita-se, segundo as análises da sua obra 
poética, que tenha estudado (ou lido) muito os clássicos e a mitologia grega e 
latina, que tenha estudado a língua francesa e também a latina. No que concerne 
às mulheres que teria amado, não é possível (ou é duvidosa, ou ainda discutível) 
a sua identificação.
Pelo que se sabe, o período de sua infância não foi muito infeliz. Seu pai foi 
preso por causa de dívidas com o Estado, quando o menino Bocage ainda contava 
seis anos. Permaneceu recluso pelo período de seis anos. Quando o menino tinha 
dez anos, ocorreu o falecimento da mãe. 
Em 22 de setembro de 1781, Bocage alistou-se para servir o exército como 
voluntário, talvez por causa de uma desilusão amorosa, e permaneceu nas forças 
armadas até 15 de setembro de 1783. Nesta mesma data, deu-se sua admissão à 
Escola da Marinha Real, na qual fez seus estudos para guarda-marinha. Concluso 
o curso, desertou, porém, mesmo assim, seu nome apareceu como uma das 
nomeações para guarda-marinha efetuadas pela rainha D. Maria I. Neste tempo, 
já é famoso como poeta e como versejador em Lisboa.
No ano de 1786, em 14 de abril, na qualidade de oficial da marinha 
portuguesa, embarcou com destino à Índia, numa das naus portuguesas 
denominada Nossa Senhora da Vida, a qual fez uma escala no Rio de Janeiro, por 
volta do final de junho do mesmo ano. Segundo registros existentes, teria vivido 
certo tempo na cidade, na atual Rua Teófilo Otoni, “[...] onde se regala em festins 
e amores tropicais” (MOISÉS, 2008, p. 156).
O vice-rei ordenou que prosseguisse viagem para o seu destino final – a 
Índia – e, no início de setembro de 1786, fez escala em Moçambique, chegando à 
Índia em 28 de outubro do mesmo ano. Na cidade de Pangin, frequentou estudos 
como oficial da Marinha e é promovido a tenente, sendo deslocado para Damão. 
Entregue a baixos amores, deserta, segue para Macau em 1789, e depois retorna a 
Lisboa, chegando em meados 1790.
A década que se segue, para ele, é muito promissora, por causa da sua 
grande produção literária, ao mesmo tempo em que se caracteriza como um 
período de entregas à vida boêmia e de aventuras. Ainda no ano de 1790, recebeu 
o convite para compor a Academia das Belas Letras ou Nova Arcádia, à qual 
aderiu e, como de costume, deveria adotar um pseudônimo, escolhendo, para 
isso, Elmano Sadino.
154
UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
FONTE: Enciclopédia Brasileira de Consultas e Pesquisas (1988, p. 396)
FIGURA 30 – MANUEL MARIA BARBOSA L’ HEDOIS DU BOCAGE
A cidade de Lisboa era então dominada pelo Intendente da Polícia 
Pina Manique, o qual decidiu pôr ordem na cidade, optando, em 7 de agosto 
de 1797, pela prisão de Bocage, alegando ser este “desordenado nos costumes”. 
Permaneceu recluso no Limoeiro até 14 de novembro de 1797, passando em 
seguida ao calabouço da Inquisição, no Rossio. Ali permaneceu até 17 de fevereiro 
do ano seguinte, tendo passado, logo após, ao Real Hospício das Necessidades, 
coordenado pelos Padres Oratorianos de São Filipe Neri. Antes, porém, passou 
brevemente pelo Convento dos Beneditinos. No seu demorado período de 
detenção, Bocage poliu muito o seu jeito de ser e começou a trabalhar de modo 
mais “sério” como redator e como tradutor. Foi libertado, finalmente, no dia 31 
de dezembro de 1798.
Os anos que vão de 1799 a 1801 são para Bocage de muito trabalho, 
principalmente com Frei José Mariano da Conceição Veloso, um frade brasileiro, 
com uma boa posição política e bem visto pelo intendente Pina Manique. Ele lhe 
proporcionou muitas oportunidades de trabalho, na área da tradução. A começar 
pelo ano de 1801 até sua morte, causada por um aneurisma, morou numa casa 
por ele mesmo arrendada, no Bairro Alto, no atual número 25, na travessa André 
Valente, em Lisboa.
Durante a sua trajetória, Bocage levou uma vida até certo ponto confusa, 
conturbada, dedicando-se, em muitos momentos, à boêmia. Frequenta também os 
bares portugueses, convive com prostitutas, marinheiros, vagabundos. Em certos 
momentos, tem oportunidade de estar com pessoas de bom nível cultural, social 
e literário. Do mesmo modo que Camões, foi soldado e, por um certo período, 
viveu e viajou para algumas terras portuguesas ultramarinas, as ditas colônias 
portuguesas no Oriente ou no Ocidente. Entre a vida de Bocage e a de Camões, 
há muitas semelhanças, por isso ele dedica um dos seus sonetos a traçar este 
paralelo entre ele e o poeta épico português: 
Camões, grande Camões, quão semelhante
acho teu fado ao meu, quando os cotejo!
Igual causa nos fez, perdendo o Tejo,
arrostar co’o sacrilégio gigante;
TÓPICO 3 | AS LUZES DA RAZÃO: O ARCADISMO
155
como tu, junto ao Ganges sussurrante,
da penúria cruel no horror me vejo;
como tu, gostos vãos, que em vão desejo,
também carpindo estou, saudoso amante.
Ludíbrio, como tu, da Sorte dura
meu fim demando ao Céu, pela certeza
de que só terei paz na sepultura.
Modelo meu tu és. Mas, oh tristeza!
Se te imito nos transes da Ventura,
não te imito nos dons da Natureza.
 (BOCAGE, 1997, p. 35)
É muito conhecido como um poeta de múltiplas faces, pois a sua produção 
vai do lírico ao satírico e ao erótico. Num de seus sonetos, ele traça um perfil de 
si próprio. Nas quadras e no primeiro terceto, ele esboça seu autorretrato. Já na 
segunda parte (último terceto), ele revela sua identidade e o motivo da criação do 
soneto. 
Magro, de olhos azuis, carão moreno,
bem servido de pés, meão na altura,
triste de facha, o mesmo de figura,
nariz alto no meio, e não pequeno;
incapaz de assistir num só terreno,
mais propenso ao furor do que à ternura,
bebendo em níveas, por taça escura,
de zelos infernais letal veneno;
devoto incensador de mil deidades
(digo de moças mil) num só momento,
e somente no altar amando frades;
eis Bocage em quem luz algum talento;
saíram dele mesmo estas verdades,
num dia em que se achou mais pachorrento.
 (BOCAGE, 1997, p. 35)
A seguir, mais um soneto desse autor, no qual é possível perceber as 
características neoclássicas:
Olha, Marília, as flautas dos pastores
que bem que soam, como estão cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha não sentes
os Zéfiros brincar por entre as flores?
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UNIDADE 2 | A PRODUÇÃO LITERÁRIA PORTUGUESA CLÁSSICA, BARROCA E ÁRCADE
Vê como ali beijando-se os Amores
incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes,
as vagas borboletas de mil cores.
Naquele arbusto o rouxinol suspira,
ora nas folhas a abelha para,
ora nos ares sussurrando gira.
Que alegre campo! Que manhã tão clara!
Mas ah! Tudo o que vês, se eu não te vira,
mais tristeza que a noite me causara.
 (BOCAGE, 1997, p. 41)
Caro/a acadêmico/a, veja neste poema (soneto) a presença de características 
próprias do período neoclássico. Entre estas a descrição de umpossível locus 
amoenus, este apresentado ao longo de quase todo o soneto. Eis a característica 
chamada bucolismo, marcado pelo princípio do fugere urbem. Ao que parece, a 
paisagem quase paradisíaca apresentada é passível de realização com a presença 
da pessoa amada. Os elementos do neoclassicismo se manifestam também na 
forma do poema (soneto) com a ocorrência de elementos mitológicos, como os 
Zéfiros.
Já no que se refere à literatura erótica, o século XVIII encontra em Bocage 
uma das grandes expressões. Dentro deste tema, há uma obra sua chamada 
Poesias Eróticas, Burlescas e Satíricas. Este tipo de literatura, em Bocage, pode ser 
considerado como um desejo de libertação do desejo sexual ou do amor sensual. 
Veja-se, por exemplo, a poesia a seguir, intitulada Soneto de Todas as Putas:
Não lamentes, oh Nise, o teu estado;
puta tem sido muita gente boa;
putíssimas fidalgas tem Lisboa,
milhões de vezes putas têm reinado:
Dido foi puta, e puta d’ um soldado;
Cleópatra por puta alcança a c’ roa;
tu, Lucrécia, com toda a tua proa,
o teu cono não passa por honrado:
essa da Rússia imperatriz famosa,
que inda há pouco morreu (diz a Gazeta)
entre mil porras expirou vaidosa:
todas no mundo dão a sua greta:
não fiques pois, oh Nise, duvidosa
que isso de virgo e honra é tudo peta.
 (BOCAGE, 1997, p. 35)
TÓPICO 3 | AS LUZES DA RAZÃO: O ARCADISMO
157
A obra poética de Bocage, quando analisada, revela certa evolução, a qual 
poderia ser traduzida em três momentos principais; primeiramente ele revela 
certa polêmica, ainda em vida; segue-se uma fase de idealização romântica ao 
longo do século XIX e, por fim, a reinterpretação estética e ideológica dos nossos 
dias. Diante disso, caro/a acadêmico/a, para um melhor aproveitamento da obra, 
uma boa compreensão, calcule o quanto é necessário atentarmos às palavras do 
poeta e ao modo de ele arranjá-las esteticamente. 
Há que se frisar que o bom leitor da obra bacagiana, nos dias atuais, 
jamais poderia, ou deveria, ignorar o quanto é difícil e o quanto é complexa a 
compreensão da produção literária desse que é o maior e melhor poeta árcade 
português. Assim, a obra de Bocage, no seu conjunto, não é totalmente árcade 
tampouco romântica; é, sim, uma literatura de passagem de um tempo a outro, 
ou melhor, que apresenta, ao mesmo tempo, aspectos de duas escolas literárias 
portuguesas: o Arcadismo e o Romantismo. Esse aspecto de Bocage bem o revela 
Massaud Moisés (2008, p, 161): “[...] é todo ele o anúncio da visão romântica do 
mundo [...] é assim que deve ser considerado. Para ser integralmente romântico, 
faltou-lhe caminhar um passo a mais e libertar-se por inteiro da formação 
neoclássica”. E a escola romântica portuguesa, caro/a acadêmico/a, constitui o 
assunto da nossa próxima unidade.
158
RESUMO DO TÓPICO 3
Caro/a acadêmico/a, no presente tópico, você teve oportunidade de 
estudar aspectos importantes relacionados à Literatura Portuguesa, os quais 
revemos, resumidamente, a seguir:
• Muitas correntes do pensamento surgiram em toda a Europa, no século XVIII, 
entre as quais o movimento mais importante da época, o Iluminismo.
• O novo tempo, que manifesta novas ideias dentro do espírito iluminista, 
denomina-se Arcadismo (ou Setecentismo ou ainda Neoclassicismo). Ele dá 
uma nova tônica às artes principalmente na segunda metade do século XVIII.
• Os ideais de uma vida mais modesta e natural vêm calhar com os anseios de um 
público novo, consumidor em formação, que é composto pela burguesia, a qual 
historicamente lutava pelo poder e denunciava a vida de luxo da nobreza nas cortes.
• Ao iniciarem a reação aos exageros do Barroco, os literatos começaram 
a denominar de Arcádias as agremiações em que se reuniam com o fim de 
restaurarem a simplicidade e a sobriedade da poesia greco-latina. 
• O marco do início do Arcadismo lusitano é o ano de 1756, data em que foi 
fundada a Arcádia Lusitana.
• Os escritores do período arcádico tinham por cunho a procura pela recuperação 
dos ideais clássicos da literatura.
• É a partir da clara reação contra os exageros do barroco que surgem as 
principais características do arcadismo: equilíbrio, bucolismo, convencionalismo 
e carpe diem.
• Um dos maiores poetas portugueses do Arcadismo – e talvez do século XVIII 
– foi Manuel Maria Barbosa du Bocage. É considerado o ícone do movimento 
literário do Arcadismo. Bocage é muito conhecido como um poeta de múltiplas 
faces, pois a sua produção vai do lírico ao satírico e ao erótico.
• A obra poética de Bocage revela certa evolução, a qual poderia ser traduzida 
em três momentos principais. Primeiramente, ele revela certa polêmica, ainda 
em vida; segue-se uma fase de idealização romântica ao longo do século XIX e, 
por fim, a reinterpretação estética e ideológica dos nossos dias.
• Bocage, ao que parece, não é totalmente árcade tampouco romântico; ele faz uma 
literatura de passagem de um tempo a outro, ou melhor, que apresenta, ao mesmo 
tempo, aspectos de duas escolas literárias portuguesas: o Arcadismo e o Romantismo.
159
Caro/a acadêmico/a, para que você possa melhor fixar o conteúdo 
deste tópico, apresentamos, a seguir, uma atividade. Procure resolvê-la com 
base no que você estudou.
1 Leia o soneto de Bocage e, em seguida, responda às questões propostas:
Sobre estas duras, cavernosas fragas,
que o marinho furor vai carcomendo, 
me estão negras paixões na alma fervendo
como fervem no pego as crespas vagas.
Razão feroz, o coração me indagas,
de meus erros a sombra esclarecendo,
e vás nele (ai de mim!) palpando, e vendo
de agudas ânsias venenosas chagas.
Cego a meus males, surdo a teu reclamo,
mil objetos de horror co’a ideia eu corro,
solto gemidos, lágrimas derramo.
Razão, de que me serve o teu socorro?
Mandas-me não amar, eu ardo, eu amo;
Dizes-me que sossegue, eu peno, eu morro.
 (BOCAGE, 1997, p. 31)
a) Na primeira estrofe, existe certa analogia entre o ambiente evocado e o 
estado de espírito do “eu lírico”. Explique este fato.
b) Encontre, na estrofe inicial, exemplos que permitem associar as paixões à 
ideia de escuridão e trevas.
c) Comente a contraposição existente entre Razão e Paixão, expressa no 
segundo quarteto. 
d) Discorra acerca das características árcades que podem ser perceptíveis no 
poema.
2 Leia, a seguir, um soneto da Marquesa de Alorna. Procure, com base na 
leitura, resolver a atividade proposta.
Como posso explicar em brando verso
doce prazer, se o peito nunca o sente?
Musas, vós não ditais ao descontente
senão queixas do seu fado adverso!
AUTOATIVIDADE
160
Linda cena, espetáculo diverso
embora alegre o mundo me apresente,
que em luto, isto que choro amargamente,
me sepulta o vastíssimo universo.
Jamais um dia alegre me afigura
a incerta e voadora fantasia,
que a mágoa o não transforme em sombra escura.
Que quereis que vos diga d’ alegria,
se vítima da negra desventura
sirvo sempre a cruel melancolia?!
FONTE: AMORA, Antônio Soares. Presença da Literatura Portuguesa – era clássica. São 
Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1970. p. 287.
a) Explique o modo como, na primeira estrofe, é apresentada a ideia de poesia 
enquanto expressão do mundo interior.
b) Na segunda estrofe, parece haver uma separação entre o eu lírico e a 
realidade que o cerca. Comente como este fato é apresentado na poesia.
c) Discorra sobre as características do Arcadismo que podem ser percebidas 
neste soneto.
161
UNIDADE 3
DO ROMANTISMO À 
CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E 
A PRODUÇÃO LITERÁRIA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
A partir do estudo desta unidade, o/a acadêmico/a estará apto/a a:
• apresentar o momento histórico dos períodos romântico, simbolista, mo-
derno e contemporâneo da Literatura Portuguesa;
• refletir sobre as características estéticas do Romantismo, Simbolismo, Mo-
dernismo e da contemporaneidade literária portuguesa;
• conhecer a produção literária em prosa e em verso dos séculos XIX e XX, 
da Literatura Portuguesa;
• discutir acerca da produçãoliterária romântica, realista e moderna, na 
perspectiva estética;
• localizar alguns autores marcantes dentro de cada escola literária, a exem-
plo de Almeida Garret, Eça de Queirós, Fernando Pessoa, José Saramago;
• analisar alguns textos literários considerados marcantes na formação dos 
períodos literários romântico, realista, simbolista, modernista e contempo-
râneo, localizando neles características das respectivas escolas literárias.
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. Ao final de cada um deles, o/a 
acadêmico/a poderá dispor de atividades que o/a auxiliarão na fixação do 
conteúdo.
TÓPICO 1 – O ESPÍRITO CRIADOR E LIVRE: PERÍODO ROMÂNTICO
TÓPICO 2 – A REVOLUÇÃO DA MENTALIDADE E O CULTO AO 
ETÉREO: AS ESCOLAS REALISTA E SIMBOLISTA
TÓPICO 3 – LIBERDADE DE CONCEPÇÃO E EXPRESSÃO E A 
ATUALIDADE: A ERA MODERNA E A PRODUÇÃO 
LITERÁRIA CONTEMPORÂNEA
TÓPICO 4 – A LITERATURA PORTUGUESA E O ENSINO: ALGUMAS 
IDEIAS
162
163
TÓPICO 1
O ESPÍRITO CRIADOR E LIVRE: PERÍODO ROMÂNTICO
UNIDADE 3
1 INTRODUÇÃO
“Só me lembra que um dia formoso 
Eu passei... dava o sol tanta luz! 
E os meus olhos, que vagos giravam, 
Em seus olhos ardentes os pus. 
Que fez ela? eu que fiz? – não no sei; 
Mas nessa hora a viver comecei...”
 (GARRET, Almeida. Este Inferno de Amar)
É historicamente sabido que o século XVIII é marcado por um grande 
crescimento da classe burguesa, e isto é visto com maior rigor no território francês. 
Na França, a burguesia sentia-se pouco valorizada, principalmente por parte dos 
membros da realeza, monarquia absolutista. Atrelada ao descontentamento da 
burguesia, estava também uma grande massa empobrecida que muito sofria, haja 
vista a desigualdade social reinante na França nesse momento. A revolta popular 
era iminente, em vista do descontentamento geral: os camponeses explorados 
por causa da injusta cobrança de impostos, a burguesia rica e crescente exigia 
igualdade de condições, as massas empobrecidas desejavam mudanças e muitos 
dos que eram favorecidos pelo regime governamental temiam perdas de suas 
posses.
Assim, a burguesia rebela-se e tenta uma tomada de poder, amparada 
por três ideais revolucionários: liberdade, igualdade e fraternidade. Era o início 
da Revolução Francesa, 14 de julho de 1789. Por isso, vale dizer que se trata 
da expressão dos “[...] sentimentos dos descontentes com as novas estruturas. 
[...]”. São as “[...] atitudes saudosistas ou reivindicatórias que pontuam todo o 
movimento.” (BOSI, 1984, p. 100).
Os ideais pregados pelos revolucionários passam a constituir as novas 
diretrizes políticas, econômicas e sociais, não somente na França, mas além 
do território francês, e passam a intervir na maior parte das sociedades do 
século XVIII. É crescente a influência da Revolução Francesa e da Revolução 
Industrial, além do pensamento liberal, pregado pelos ideais de liberdade dos 
revolucionários, o que passa a disseminar-se em todos os campos. 
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
164
FONTE: Enciclopédia Brasileira de Consultas e Pesquisas (1988, p. 346)
FIGURA 31 – LIBERDADE GUIANDO O POVO
No que concerne às artes de um modo geral, estas também refletem esses 
ideais. A literatura não é diferente e também passa a mostrar essas influências. A 
liberdade suplanta as regras fixas de outrora, a razão é posta acima da emoção. 
Instaura-se, assim, uma nova maneira de expressão artística (entre esta a literatura) 
na Europa, o que chegou também em Portugal. É o chamado Romantismo. Este 
novo estilo é o nosso assunto, caro/a acadêmico/a, deste primeiro tópico.
2 A ESTÉTICA DA POESIA E DA PROSA ROMÂNTICA
De um modo geral, as origens do Romantismo, embora a Revolução 
Francesa tenha sido um dos grandes marcos deste estilo, estão na Inglaterra e 
na Alemanha, sem desmerecer a função da França enquanto divulgadora do 
movimento. Assim, os ideais românticos têm suas marcas a partir do escocês 
Allan Ramsay, em 1724, o qual publicou uma antologia de poemas intitulada The 
Evergreen. No ano de 1725, ele faz chegar ao público a obra The Gentle Shepherd 
e, em 1727, este mesmo autor escreve The Teatabble Miscellany. Nestes livros 
poéticos, ele valoriza o fator sentimental da poesia, ao mesmo tempo em que se 
valia da natureza como fonte de expressão.
Do mesmo modo, um irlandês, James Macpherson, impulsiona, com sua 
obra em prosa, a nova estética, publicando, em 1760, um volume que tratava das 
poesias do autor do século II, Ossian, o que obteve imediato sucesso.
Em território alemão, novo o movimento chama-se Ímpeto e Violência, e 
valorizava mais o sentimento que a razão, rompia com as regras rígidas, buscava 
o retorno ao primitivismo e desejava liberdade de criação. Marcante, nesse 
sentido, foi a obra de Johann Wolfgang von Goethe, Os Sentimentos do Jovem 
Werther. Neste livro, é narrado o drama do jovem Werther por amar Charlotte, 
uma moça comprometida. Por causa desse amor irrealizável, o garoto chega ao 
TÓPICO 1 | O ESPÍRITO CRIADOR E LIVRE: PERÍODO ROMÂNTICO
165
suicídio. O livro foi muito bem aceito entre a juventude europeia, a ponto de 
muitos jovens, em toda a Europa, suicidarem-se, o que chegou a ser um surto. 
Portugal conseguiu controlar este surto graças à imprensa, que parou de publicar 
os fatos.
Referindo-se ao surgimento da nova tendência e às suas origens inglesa e 
alemã, diz Octávio Paz (1984, p. 34) que “[...] o romantismo nasceu, quase que ao 
mesmo tempo, na Inglaterra e na Alemanha. Daí estendeu-se por todo o continente 
europeu, como se fosse uma epidemia espiritual”. No território português, os 
historiadores da literatura marcam o surgimento do novo movimento literário 
a partir da publicação do poema Camões, por Almeida Garret, em 1825. Por sua 
vez o término dar-se-ia com a polêmica da Questão Coimbrã, em 1865.
O Romantismo em geral passou a ser visto como um novo modo de 
expressão, uma maneira diferente de enfrentar os percalços da vida e do modo 
de pensar. Esta escola literária opunha-se aos clássicos, às regras e modelos fixos, 
desejando certa liberdade na maneira de criar. Diante do domínio da burguesia, 
percebe-se uma maior profissionalização do escritor, o qual passa a receber 
pagamento pela produção da obra. Por sua vez, para ter acesso a essa obra, o 
público deve pagar, pois é consumidor.
FONTE: Nicola (2003, p. 127)
FIGURA 32 – ALMEIDA GARRET 
Ao falarmos em “romântico”, caro/a acadêmico/a, não é possível pensar 
puramente no amor à moda antiga, a exemplo das pessoas que se amam e 
mandam flores umas às outras, exemplo típico de amor cantado por muitas 
músicas populares. Essa é, poderíamos dizer, uma imagem estereotipada do amor 
romântico, além de muito pouco ou nada acrescentar para a definição do termo 
romântico. Há inclusive autores que arriscam dizer que o movimento romântico 
constitui um enigma:
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
166
Considerando a natureza arbitrária da escolha de algumas 
características em relação a outras, vários críticos tentaram contornar 
essa dificuldade apresentando listas cada vez mais compridas de 
denominadores comuns da literatura romântica. Até aqui, a mais 
extensa é aquela elaborada [...] sobre o romantismo europeu que 
estabelece uma tabela sistemática de vinte e três denominadores 
comuns: medievalismo, imaginação, culto das emoções fortes, 
subjetivismo, interesse pela natureza, mitologia e folclore, mal do 
século, simbolismo, exotismo, realismo, retórica etc. Uma vez mais: ao 
admitir que essas características se encontram na obra de inúmeros, 
ou até mesmo da maioria dos escritores românticos, será que por essa 
razão ficamos sabendo o que é o romantismo? Seria possível alongar 
as listas até o infinito, acrescentando um número cada vez maior 
de denominadores comuns, sem nos aproximarmos da solução do 
problema. (SAYRE; LÖVY, 1995, p. 97).
Conforme foi possível notar, a definição constitui um fenômeno difícil de 
ser contornado, por isso,adiante, tentaremos tratar separadamente de alguns de 
seus atributos, que constituem as principais características, que foram comuns 
nos mais diversos locais em que ele obteve expressão. Para nós, o mais importante 
é sua manifestação na Literatura Portuguesa.
Mas não poderíamos deixar de dar voz a alguém que tentou defini-
lo, ainda que de maneira simples, a exemplo de que o Romantismo 
foi, sobretudo, um movimento de liberdade espiritual, primeiro, 
que remonta às origens, filosófica, literária e artística, e depois, de 
cunho social e político. Em arte e literatura, seu objetivo foi fazer algo 
diferente dos movimentos do passado e daquele em voga no momento 
presente, e até contra ambos. Excedeu o seu propósito, e em todos os 
ramos de atividade mental, até nas ciências, foi uma reação contra o 
espírito clássico, que, embora desnaturado, ainda dominava em todos. 
(VERÍSSIMO, 1976, p. 77).
Sabemos que as características marcantes do Romantismo são várias, 
e que todas elas procuram centrar-se na valorização do eu e da liberdade, ao 
mesmo tempo em que vão se juntando e formam um painel muito amplo com 
os traços reveladores da estética romântica. Para mostrar as principais, tomamos 
como base os estudos de literatura efetuados por Domício Proença Filho (1995, 
p. 216-227):
- Contraste entre os ideais divulgados e a imitação imposta pela realidade 
vivida: o universo conhecido se apresenta de modo amplo, o século das 
luzes (Iluminismo) deixa a marca dos anseios de liberdade, deslocando 
o centro do poder, a dependência social e econômica, a inconsciência, o 
desconhecimento, que estabelecem para uma grande maioria, no entanto, 
uma existência marcada por limitações de todas as espécies.
- Imaginação criadora: na tentativa de fuga, o escritor (artista) romântico 
dirige-se para universos criados, que são, ao mesmo tempo, invenção de sua 
inteligência, localizados num passado ou num futuro por ele idealizados, 
que podem estar longe, envolvidos em magia e no exotismo, nos ideais de 
liberdade concebidos a partir de figuras heroicas. É a fantasia que é capaz de 
TÓPICO 1 | O ESPÍRITO CRIADOR E LIVRE: PERÍODO ROMÂNTICO
167
levar os românticos a imaginar um mundo fascinante de beleza, como um 
universo em que a emoção pode se realizar no que é belo associado àquilo 
que é mais aterrorizante.
- Subjetivismo: o espaço para a criação é constituído pelo mundo pessoal, 
interior, do próprio autor e seus sentimentos. O autor romântico não tem 
medo de expor as emoções pessoais. Ele se sente em plena liberdade para 
isso, pois ele faz delas um tema em constante recuperação nas suas obras.
- Evasão: nas obras românticas, o escapismo manifesta-se via idealização da 
realidade ou por meio da fuga para mundos imaginários. Há momentos em 
que essa evasão traz a marca da desesperança, neste caso percebe-se o clamor 
pela morte, em muitos casos desejada pelo artista. A morte, o seu chamado, 
constitui tema de muitos poetas.
- Senso de mistério: as criações do romantismo trazem muito a questão da 
valorização daquilo que é misterioso, mágico, maravilhoso. Talvez seja por 
esse motivo que muitos românticos buscaram aquilo que é sobrenatural ou o 
terror.
- Consciência da solidão: o autor romântico é levado a refugiar-se no próprio 
eu por causa do seu elevado grau de subjetivismo. Isso lhe atribui um 
sentimento de inadequação, por isso deslocado do mundo real.
- Reformismo: os ideais contestadores e libertários, adquiridos pelos artistas 
românticos por causa da sua participação em movimentos sociais, influíram, 
e muito, na sua produção literária, a exemplo da campanha abolicionista e o 
movimento pela república. 
- Sonho: por meio dessa característica, os escritores revelam a busca por certas 
verdades, a revelação de anseios, a idealização do mundo. 
- Fé: a fé, condutora do movimento, manifesta-se na crença na própria 
verdade, na busca de justiça, na crença nos sentimentos revelados, nos ideais 
perseguidos, na manifestação da religiosidade cristã. Esta é uma influência 
medieval manifestada na construção do romantismo.
- Ilogismo: por meio desta característica, certas manifestações emocionais se 
opõem entre si e se contradizem.
- Culto à natureza: no ambiente romântico, a natureza tem especial 
significado, haja vista constituir-se testemunha e companheira das almas 
que são sensíveis. Ela é um refúgio, uma proteção, uma verdadeira mãe que 
acolhe. Há quem diga que a natureza, para os românticos, foi personagem 
nas tramas.
- Retorno ao passado: esse retorno resultou, em muitas obras, na saudade 
da infância, da terra natal, do passado individual, no medievalismo, no 
indianismo, na busca pelas raízes históricas, nas origens da pátria.
- Gosto pelo pitoresco, pelo exótico: fator que remete à valorização dos locais 
ainda inexplorados, ao mundo oriental, às terras distantes.
- Exagero: manifestação exacerbada das emoções, dos sentimentos, da figura 
do herói, do vilão, na separação entre bem e mal.
- Liberdade criadora: valorização do gênio criador do artista. Ele se coloca 
acima de qualquer regra.
- Sentimentalismo: caracteriza-se através da paixão, do amor e do eu 
expressos na poesia. Principalmente o amor representa o estado de fruição 
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
168
estética, manifestado por meio da exaltação extrema, do cinismo ou ainda da 
libertinagem. Contudo, será sempre o amor.
- Ânsia de glória: por meio da vontade de obter a glória, o artista romântico 
de um modo geral anseia pelo seu reconhecimento, deseja ser admirado, 
glorificado.
- Importância da paisagem: constitui a principal temática das obras literárias 
românticas. Esta é tecida em consonância com as emoções das personagens 
da obra.
- Gosto pelas ruínas: dentro desta característica, a natureza é colocada acima 
da obra construída.
- Gosto pelo noturno: o noturno aparece em harmonia com a atmosfera de 
mistério criada pelo artista, muito apreciada pelos românticos.
- Idealização da mulher: a figura da mulher, dentro do Romantismo, é sempre 
criada pela idealização do artista, seja ela prostituta ou anjo.
- Função sacralizadora da arte: a arte é vista com uma função redentora e o 
poeta sente-se um guia para a humanidade.
FONTE: De Giovanni (2007, p. 72)
FIGURA 33 – SÓ DEUS, QUADRO METRASS
Se passarmos um olhar mais genérico sobre o novo estilo, ou ainda 
na tentativa de reforçarmos as características apresentadas, podemos dizer 
que o Romantismo passou a ser visto como uma nova forma de expressão, de 
enfrentamento dos problemas da vida e do pensamento, a exemplo do que revela 
Massaud Moisés (2008, p. 168): “[...] corresponde a muito mais do que uma 
revolução literária: sendo mais uma nova maneira de enfrentar os problemas 
da vida e do pensamento, implica uma profunda metamorfose, uma verdadeira 
revolução histórico-cultural.” A nova escola literária repudiava os clássicos, 
opunha-se às regras fixas e aos modelos do passado, buscava, sim, maior 
liberdade de criação e expressão. Mais do que isso, queria defender a "impureza" 
dos gêneros literários. 
TÓPICO 1 | O ESPÍRITO CRIADOR E LIVRE: PERÍODO ROMÂNTICO
169
Os elementos naturais, do mesmo modo que a figura feminina, são 
pontos marcantes do novo momento literário. O artista homem buscava idealizar 
a mulher, constituí-la deusa, colocá-la num plano divino, e com isso retornava 
ao passado medieval, ao Trovadorismo, às madames que eram desejadas pelos 
trovadores, ainda que inatingíveis por causa das condições sociais de um e de 
outro. Agora, o escritor romântico desejava, ansiava, pela mulher nos seus sonhos, 
mas frustrava-se ao tomar consciência de que não a tinha ou a perdia ao acordar, 
o que o levava ao devaneio por meio da obra.
 Assim, para escapar, fugir, desta situação, na escrita, desnudava-se dos 
seus desejos e tentava esquivar-se da realidade, valendo-se, para isto, da natureza 
como sua confidente. Não raro, buscava na obscuridade a fuga, procurando nos 
ambientesfúnebres e sombrios o seu consolo. Tais frustrações tinham seu ponto 
central geralmente nos amores ou ainda nas desilusões comuns da vida, muitas 
vezes levadas ao extremo através do suicídio. Por causa disto, são frequentes no 
Romantismo temas como a morte, caracterizados através do chamado Mal do 
Século.
 Nesse sentido, o romântico padecia o caos interior, e acabava por “[...] 
sentir melancolia e tristeza que, cultivadas ou brotadas durante a introversão, o 
conduzem ao tédio, ao já dito Mal do Século.” (MOISÉS, 2008, p. 170). Assim, o 
constante desgosto podia levá-lo a uma terrível angústia, que trazia o desespero. 
E para sair desse desespero, “[...] o romântico vislumbrava duas saídas: [...] a 
fuga, a deserção pelo suicídio, caminho escolhido por não poucos, ou a fuga para 
a natureza, a pátria, terras exóticas, a história.” (MOISÉS, 2008, p. 170).
Dentro do Romantismo de Portugal, merecem destaque alguns escritores 
como Alexandre Herculano e Almeida Garret, apesar de, como é normal em toda 
nova tendência literária, o novo estilo também não ter sido implantado totalmente 
e de modo súbito, logo nos primeiros instantes de sua manifestação em Portugal. 
No começo, procurava-se gradativamente desfazer os modelos rígidos clássicos 
que ainda se faziam presentes na sociedade. Os artistas, de todas as modalidades, 
nesse momento, manifestavam-se como românticos espiritualmente, nos seus 
ideais, na sua ação política e literária, porém ainda clássicos em muitos aspectos.
Nos parágrafos que seguem, procuraremos apresentar um pouco de cada 
um dos escritores nominados, com uma pequena reflexão acerca de sua obra:
1) ALMEIDA GARRETT: João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett, 
também conhecido como Visconde de Almeida Garrett, destacou-se como 
escritor romântico, como orador e Secretário de Estado Honorário português. 
Nasceu na cidade do Porto, em 4 de fevereiro de 1799 e faleceu em Lisboa, aos 
9 de dezembro de 1854, vítima de câncer. Cultivou bastante o jornalismo, a 
poesia, a prosa de ficção e o teatro; teve uma vida amorosa muito atribulada, 
em vista também do romance adúltero com a Viscondessa da Luz, a qual serviu 
de fonte de inspiração para os seus poemas mais importantes.
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
170
Na sua produção poética, tomou como base os modelos clássicos, mas 
faleceu sem vir a ser um autêntico escritor romântico, pois não incorporou certas 
características como o egocentrismo. Em 1824, foi à França e lá escreveu o poema 
Camões, no ano de 1825, e Dona Branca, em 1826, poemas vistos pela história 
literária portuguesa como as primeiras obras da literatura romântica em Portugal. 
No ano de 1826, retornou à sua pátria natal, mas deixa novamente a terra 
em 1828. Nesse mesmo ano, sofre com o falecimento da filha recém-nascida. 
Estando na Inglaterra, publica Adozinda e Catão, em 1828. 
FONTE: Nicola (2003, p. 131)
FIGURA 34 – ALMEIDA GARRET
Em Portugal, exerceu alguns cargos políticos, em cujas funções distinguiu-
se como um dos grandes oradores nacionais. Além de trabalhar para a construção 
de teatros, Garrett buscou renovar a produção teatral do país. Em 1843, Garrett 
publica duas coletâneas de poesias: o Romanceiro e o Cancioneiro Geral. 
A obra que publica em seguida é o livro Viagens na Minha Terra, no qual 
ele retrata fatos contemporâneos ocorridos em diferentes lugares que ele visita 
e descreve. Na poesia, Garrett também destacou-se como inovador. Na última 
fase da sua vida, publica duas coletâneas: Flores sem fruto, em 1844, e Folhas 
caídas, em 1853. Por meio delas, ele consegue introduzir certa espontaneidade e 
simplicidade quase que não praticadas na poesia lusitana até então. 
Em 1851, Almeida Garrett recebe a titulação de Visconde de Almeida 
Garrett. Durante o século XIX e o século XX, a obra literária de Garrett era 
geralmente considerada como uma das mais importantes, inferior apenas à de 
Camões. A sua obra terá para sempre, no cânone da literatura portuguesa, o seu 
lugar de destaque, em vista das inovações que introduziu, as quais abriram novos 
rumos aos autores que vieram após ele. Por isso e por outros aspectos, Garrett 
merece ser considerado um autor representativo da poesia do Romantismo 
lusitano. 
Este inferno de amar
Este inferno de amar - como eu amo! 
Quem mo pôs aqui n'alma... quem foi? 
Esta chama que alenta e consome, 
TÓPICO 1 | O ESPÍRITO CRIADOR E LIVRE: PERÍODO ROMÂNTICO
171
Que é a vida - e que a vida destrói - 
Como é que se veio a atear, 
Quando - ai quando se há-de ela apagar? 
 
Eu não sei, não me lembro: o passado, 
A outra vida que dantes vivi 
Era um sonho talvez... – foi um sonho – 
Em que paz tão serena a dormi! 
Oh! que doce era aquele sonhar... 
Quem me veio, ai de mim! despertar? 
 
Só me lembra que um dia formoso 
Eu passei... dava o sol tanta luz! 
E os meus olhos, que vagos giravam, 
Em seus olhos ardentes os pus. 
Que fez ela? eu que fiz? - não no sei; 
Mas nessa hora a viver comecei...
 (FERREIRA, 1985, p. 29)
Acerca da obra Folhas Caídas, lançada em 1853, da qual faz parte o poema 
Este Inferno de Amar, compõe-se de quarenta e seis poemas, divididos em duas 
partes. De um modo geral, envolvem a paixão amorosa, ou, como expressa o 
poema Inferno de Amar, aparecem os efeitos contraditórios do amor, que oscilam 
entre a alegria de amar e os tormentos sentimentais.
Ao mesmo tempo em que apresenta estrofes regulares, com o mesmo 
número de versos, um esquema também regular de rimas, o “[...] ritmo dos versos 
ganha um andamento coloquial ou mesmo popular, à beira de transformar-se em 
prosa versificada.” (MOISÉS, 2008, p. 185). É claro também no poema o jogo de 
antíteses e imagens que visam, talvez, caracterizar a paixão amorosa do eu lírico. 
Ele tece uma oposição entre o tempo hodierno (inferno de amar) e o passado 
(paz), um sentimento que o faz sofrer e o faz viver. Nesse sentido, valem também 
as palavras de Jorge de Sena (apud FERREIRA, 1985, p. 16), as quais se aplicam 
principalmente aos aspectos formais do poema, mormente à sua perfeição:
O tom do livro, em que, a par de singelíssimas líricas, todos os 
cambiantes de uma paixão violenta e sensual eram dados com 
uma contenção rítmica e uma elegância coloquial inigualáveis, esse 
ressumava uma intensa e culposa sinceridade, que só uma juventude 
muito madura seria capaz de atingir.
Nas suas palavras, Garrett caracteriza “uma época de vida íntima e 
recolhida”. Se ele concebe a arte como expressão da sociedade e a literatura como 
reflexo da época, pode-se dizer que em seus poemas encontramos uma escrita 
de si. No poema Este Inferno de Amar, o autor faz várias referências a termos 
como rosa e luz. Trata-se de referências claras à sua dama de eleição, talvez Dona 
Rosa de Montúfar, Viscondessa da Luz, mulher lindíssima, porém já casada com 
um oficial do exército, o que, de certa forma, justifica o escândalo causado pela 
publicação do livro.
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
172
O poeta, assim, não mais canta nos seus versos as damas idealizadas dos 
clássicos, mas prefere confessar as próprias vivências amorosas, o que é uma 
característica fundamental do Romantismo. Por isso, quem sabe, essa poesia (e a 
romântica em geral) é um fazer poético da personalidade.
Já no que concerne à prosa romântica portuguesa, um dos destaques é 
Alexandre Herculano, cuja preocupação enquanto escritor romântico se dirige 
mais para a caracterização de especificidades geo-históricas e culturais da sua 
nação, buscando, na sua produção, a construção de figuras modelares capazes de 
corporificar os ideais pátrios.
Assim, temos a criação do cavaleiro medieval, na figura de Eurico, no 
romance Eurico, o presbítero, obra em que “[...] Herculano consegue atingir 
o ponto mais alto de suas possibilidades como ficcionista, em razão de haver 
deixado mais livres a imaginação e o impulso lírico.” (MOISÉS, 2008, p. 195).
Caro/a acadêmico/a,aproveitamos, neste espaço, para apresentar o autor 
da prosa romântica lusitana, Alexandre Herculano, seguindo-se uma reflexão 
acerca do romance Eurico, o presbítero:
2) ALEXANDRE HERCULANO: Alexandre Herculano de Carvalho e Araújo 
nasceu em Lisboa, no dia 28 de março de 1810. Seu falecimento ocorre em 
Santarém, aos 18 de setembro de 1877. Sua obra é marcada por uma profunda 
coerência, de acordo com um programa romântico que norteou não apenas o 
seu trabalho, mas também a sua vida. 
Herculano descende de uma família modesta. Na sua juventude, dedicou-
se ao estudo de humanidades na Congregação do Oratório, na qual também se 
dedicou à leitura meditada da Bíblia. Por causa de dificuldades econômicas e 
familiares, não pôde estudar na universidade, porém preparou-se para a vida 
profissional frequentando um curso prático de comércio e estudando diplomacia 
na Torre do Tombo. À altura dos dezoito anos, já demonstrava sinais para 
a vida literária. Por isso, estudou o francês e o alemão, leu vários românticos 
estrangeiros e iniciou-se nos textos literários da marquesa de Alorna, a qual seria 
por ele reconhecida sua mentora. 
TÓPICO 1 | O ESPÍRITO CRIADOR E LIVRE: PERÍODO ROMÂNTICO
173
FONTE: De Giovanni (2007, p. 92) 
FIGURA 35 – ALEXANDRE HERCULANO
Em 1831, por causa de uma acusação de conspiração, foi obrigado a 
exilar-se na Inglaterra (primeiramente) e depois na França. No exílio, dedicou-
se ao estudo da história, leu os que seriam mais tarde seus modelos literários: 
Chateaubriand, Lamennais, Klopstock e Walter Scott. Entre 1834 e 1835, lançou 
vários artigos de teoria literária na revista Repositório Literário. De volta a 
Lisboa, dirigiu a revista literária do Romantismo português, O Panorama, para a 
qual contribuiu com diversos artigos, narrativas e traduções. 
Em 1867, após a morte do rei, prefere retirar-se para a sua quinta em 
Vale de Lobos, dedicando-se com esmero à vida rural. Também casa-se com D. 
Maria Hermínia Meira, namorada do seu tempo de juventude. Em 1872, orientou 
a publicação do primeiro volume dos Opúsculos, ao mesmo tempo em que 
aproveitou para manter correspondência com muitas pessoas ilustres da vida 
política e literária. Foi a óbito vitimado por uma pneumonia, quando contava 67 
anos, em 1877.
A obra de Alexandre Herculano é muito vasta, e entre os seus muitos 
escritos destacam-se A Voz do Profeta, livro escrito em 1836 (poesias); A Harpa 
do Crente, escrito em 1838 (poesias); Eurico, o Presbítero, romance publicado em 
1844; História de Portugal, em quatro volumes, escritos respectivamente em 1846, 
1847, 1850 e 1853 (obra historiográfica) e O Monge de Cister, romance escrito em 
1848.
Para os nossos estudos, caro/a acadêmico/a, trataremos do romance 
Eurico, o Presbítero. Apresentaremos a seguir um pequeno resumo, seguido de 
uma reflexão acerca do enredo e das personagens:
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
174
O romance Eurico, o Presbítero conta a história triste do amor entre dois 
jovens: Hermengarda e Eurico. O episódio se passa nas terras espanholas, no início 
do século VIII, no tempo em que ocorreram as invasões dos visigodos. Eurico e 
Teodomiro são amigos e juntos combatem na companhia de Vitiza, imperador da 
Espanha, contra os montanheses rebeldes e contra os francos, seus aliados.
Depois de um combate vitorioso, Eurico pede ao Duque de Fávila a 
mão de sua filha, Hermengarda, em casamento. Fávila, conhecendo a intenção 
de Eurico e sabendo ainda que este descendia de família humilde, nega-lhe o 
pedido. A partir disto, a vida de Eurico passa a resumir-se à prática religiosa, 
à composição de hinos sacros e poemas, atividades estas que lhe ocupavam a 
mente e afastavam dele os pensamentos dirigidos a Hermengarda.
Porém, tudo muda de figura a partir do instante que ele descobre que 
os muçulmanos, liderados por Tarrique, invadem a Península Ibérica. Ele toma 
para si a responsabilidade de liderar o combate contra os invasores. Num 
momento inicial, avisa seu amigo Teodomiro, mas posteriormente, já durante o 
combate, o Presbítero de Carteia, assume a identidade do misterioso Cavaleiro 
Negro. Incansavelmente, ele luta para defender as terras espanholas, o que atrai 
a admiração dos companheiros godos e lhes dá forças para combater os povos 
invasores.
Em dado momento, sob ameaça de os godos assumirem o trono, o domínio 
dos combates passa às mãos dos árabes. Morre, então, em combate, Roderico, rei 
dos godos, e à liderança do povo passa Teodomiro. É nesse momento que os árabes 
invadem o Mosteiro da Virgem Dolorosa, no qual se encontra Hermengarda, que 
é raptada. O Cavaleiro Negro e mais alguns companheiros conseguem salvá-la, 
no instante em que o príncipe árabe iria profaná-la.
Durante a fuga, Hermengarda é levada para as montanhas das Astúrias, 
local em que é aguardada por seu irmão Pelágio, que também se encontra 
refugiado. Este local é o único ponto de refúgio do povo godo, conforme tratado 
de paz efetuado após uma longa batalha com os árabes. 
Já em segurança na gruta Covadonga, Hermengarda depara-se com 
Eurico, que lhe declara seu amor. Ele, porém, sabe que o romance é impossível, 
devido às suas convicções religiosas. Ele lhe revela também que o presbítero de 
Carteia e o Cavaleiro Negro são a mesma pessoa. Sabendo disso, Hermengarda 
perde a razão, e Eurico, ciente de suas obrigações religiosas, parte para a batalha 
com os árabes, convicto de que se trataria de um combate suicida.
Esse romance é recheado de história, de reflexão, predominando no seu 
corpus a narrativa e a descrição. Predominam as marcas do estilo da primeira 
geração romântica portuguesa, a qual tinha por cunho as questões nacionalistas, 
o historicismo, o medievalismo e a criação e valorização do herói medieval, neste 
caso incorporado por Eurico.
TÓPICO 1 | O ESPÍRITO CRIADOR E LIVRE: PERÍODO ROMÂNTICO
175
As marcas da história são a tônica deste romance, o que permite o resgate 
do culto ao sentimento nacionalista e a ficção elaborada a partir da figura do 
herói medieval, ambos ideais românticos. Não se pode deixar de apresentar a 
caracterização da mulher como anjo, presente na descrição do romancista: 
“Era bela, mais bela que nos tempos da mocidade. O seu gesto angélico [...].” 
(HERCULANO, 1997, p. 168).
Ainda no que se refere à presença de caracteres típicos do romantismo 
no texto de Herculano, há que se destacar o grande número de comparações, 
hipérboles, antíteses e metáforas, figuras estas que atribuem à obra o verdadeiro 
perfil poético ao romance. Com base nisto, o romance de Herculano desenvolve 
várias ideias ao longo do episódio, entre as quais merecem destaque:
• RELIGIOSIDADE: o conflito entre os adeptos do cristianismo e do islã (cristãos 
e muçulmanos), portanto os ditos fiéis e os infiéis, os seguidores do evangelho 
e os seguidores do corão.
• LEIS SOCIAIS: por causa das diferenças de posição social, Eurico e Hermengarda 
foram impedidos de se unir em casamento. Eis aí, então, a dicotomia humana 
entre razão e emoção, a vontade do coração e as regras da vida em sociedade.
• AMOR PROFANO E AMOR DIVINO: o amor profano não é realizado em 
vista do amor divino. E isso é perceptível na figura de Eurico, pois era movido 
pelos seus ideais cavalheirescos, pela fidelidade a estes ideais e pelas leis a 
estes impostas. O amor, ou dever divino, trazia a marca do celibato e da rígida 
disciplina do clero da época.
• MANIQUEÍSMO: a disputa constante entre bem e mal é marca muito presente 
nas obras do período romântico. No romance Eurico, o Presbítero, é visível 
este duelo quando se trata da guerra entre cristãos e muçulmanos, ou seja, uns 
(cristãos) personificam o bem, os outros (muçulmanos) são a personificação do 
mal. 
A doutrina maniqueísta baseia-se em uma divisão dualista do universo, na luta 
entre o bem (Deus) e o mal (Satã). O maniqueísmo se constitui por um modo de pensar 
muito simples, em que o mundo é visto sob a ótica dos dois polos: o bem e o mal,certo e 
errado, causa e efeito, isto ou aquilo. 
NOTA
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
176
• MULHER: a mulher, neste caso, é representada por Hermengarda, tratada sob 
a visão romântica de angelical, pura e imaculada. Outro caso, no romance, é 
mostrado quando as monjas são sacrificadas para que não sejam violadas pelos 
infiéis invasores do mosteiro. 
Afora os aspectos tratados anteriormente, num sentido mais genérico, 
podemos dizer, caro/a acadêmico/a, que no romance Eurico, o Presbítero 
destacam-se os conflitos um tanto trágicos entre o coração e a consciência moral, 
a intensidade do drama passional e de consciência dos amantes, ou melhor, há 
uma lógica de ordem social que é colocada acima da paixão dos apaixonados, 
ao melhor estilo de Guinsburg: “E o conceito de noite se funde e confunde com 
o conceito de amor, e a ideia de amor, com a de morte. É a grande trindade 
romântica: noite, amor e morte.” (BRAGA, 2005, p. 272).
Caro/a acadêmico/a, neste tópico tratamos do romantismo, dando mostras 
de duas das principais estrelas: Almeida Garrett e Alexandre Herculano. Fica 
aqui o convite para que você pesquise outros autores e os leia. Além do mais, é 
importante que você leia as principais obras destes autores. E para completar os 
seus estudos, oferecemos, a seguir, uma leitura complementar:
TÓPICO 1 | O ESPÍRITO CRIADOR E LIVRE: PERÍODO ROMÂNTICO
177
LEITURA COMPLEMENTAR
O ROMANTISMO EM PORTUGAL
Massaud Moisés
Com o Romantismo, abre-se um ciclo de cultura inteiramente novo, 
correspondente à diminuição do poder das oligarquias reinantes em favor das 
monarquias constitucionais ou das repúblicas federativas, e ao aparecimento do 
Liberalismo em política, moral, arte etc. A aristocracia de sangue aos poucos cede 
terreno à burguesia na pirâmide social, invertendo completamente os papéis e 
estabelecendo nova escala de valores, marcada agora pela posse do dinheiro. 
Por fim, os ideais românticos e burgueses acabam por confundir-se, numa rede 
inextricável de malhas que se repelem e se aproximam desordenadamente. 
Opera-se, em suma, o domínio amplo das fórmulas burguesas de viver e 
pensar, com todas as suas múltiplas e complexas consequências. Dentre elas, 
a profissionalização do escritor, que desfruta agora das melhores condições de 
trabalho, graças à remuneração que lhe vem de produzir um artefato consumido 
por um grande público, a classe média. O mecanismo desaparece, dando origem 
a uma relação diversa entre escritor e público: aquele produz um objeto, e este 
paga para consumi-lo.
No plano das teorias, das ideias e temas literários, dá-se o seguinte 
processo: repudiando os clássicos, ou melhor, os neoclássicos, os românticos 
revoltam-se contra as regras, os modelos, as normas, batem-se pela total liberdade 
na criação artística, e defendem a mistura e a impureza dos gêneros literários. 
Em lugar da ordem clássica, colocam a aventura; ao cosmos, como sinônimo de 
equilíbrio, preferem o caos, ou a anarquia; ao universalismo clássico opõem um 
conceito de arte extremamente individualista: substituem a visão macrocósmica 
que os clássicos tinham da vida e da arte, por uma visão microcósmica, isto é, 
centrada no eu interior de cada um. 
O eu torna-se o universo em que vivem, ou, ao menos, o centro do 
Universo: à semelhança de Narciso, o romântico contempla a si próprio, como se 
estivesse permanentemente voltado para um espelho real ou imaginário, e faz-se 
espetáculo de si próprio. A tal ponto que, quando se projeta para fora de si, não 
consegue ver os objetos ou os sentimentos alheios e coletivos senão como reflexo 
e prolongamento do próprio eu: este engloba tudo quanto cai sob os sentidos do 
homem romântico, acabando por identificar-se com o mundo real e sensível, e 
por transformá-lo numa espécie de manifestação exterior sua. O homem volta a 
sentir-se a medida de todas as coisas, mas agora com nova intensidade e novos 
conteúdos trazidos pelas artes e as filosofias em voga.
Esse egocentrismo traduz a existência de um condimento feminino na 
atitude romântica, revelado pela aceitação de expedientes próprios da vaidade 
das mulheres [...] e pelas características seguintes, dele decorrentes: ao culto da 
Razão, que fazia o apanágio dos clássicos, opõe-se o culto das razões do coração; 
em lugar do racionalismo, o sentimentalismo, em lugar da especulação conceitual, 
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
178
a fantasia. Mas o sentimentalismo implica introversão, e os românticos voltam-
se para si, na sondagem do mundo interior, onde vegetam sentimentos vagos. 
Mais ainda: os sentimentos, já de si contraditórios, levam ao desequilíbrio, ao 
paradoxo, à anarquia. Instável, complexo, rebelde, jogado por sentimentos 
opostos, numa irrefreável mobilidade, o romântico cultiva atitudes feminoides 
e adolescentes: o Romantismo é uma estética da juventude, expressando 
sentimentos femininamente juvenis, ou vice-versa.
Daí que o romântico mergulhe cada vez mais na própria alma, a examinar-
lhe masoquistamente os desvãos, com o intento vaidoso de revelá-la e confessá-la. 
E, embora confesse tempestades íntimas ou fraquezas sentimentais, experimenta 
um prazer agridoce em fazê-lo, certo da superior dignidade do sofrimento. À 
confissão de intimidades sentimentais corresponde a descoberta de sensações 
ligadas à fragilidade e ao mistério dos destinos humanos, submetidos aos azares 
e à perpétua mudança de tudo.
Imerso no caos interior, o romântico acaba por sentir melancolia e tristeza 
que, cultivadas ou brotadas durante a introversão, o conduzem ao tédio, ao “mal 
do século”. Repetido o tédio, sobrevém terrível angústia, logo transformada 
em insuportável desespero. Para sair dele, o romântico vislumbra duas saídas, 
apenas diferentes no aspecto e no grau, visto serem essencialmente idênticas: a 
fuga, a deserção pelo suicídio, caminho escolhido por não poucos, ou a fuga para 
a Natureza, a Pátria, terras exóticas, a História.
FONTE: Adaptado de: MOISÉS, Massaud. Romantismo. In: ______. A Literatura Portuguesa. São 
Paulo: Cultrix, 2008. p. 169-170.
Ao completarmos este item, importante dizermos que a sociedade europeia 
do século XIX vivia profundas transformações sociais e econômicas, entre estas, 
a segunda revolução industrial. E nessa sociedade não havia mais espaço para 
idealizações. Era necessária, sim, uma nova postura diante da realidade. As artes, 
como sempre, refletem as novas posturas. E a literatura também assim age: é o 
Realismo que vem ali, assunto do nosso próximo tópico.
179
Caro/a acadêmico/a, no presente tópico, você teve oportunidade de 
estudar aspectos importantes relacionados à Literatura Portuguesa, os quais 
revemos, resumidamente, a seguir:
• O século XVIII é marcado por um grande crescimento da classe burguesa, e 
isto é visto com maior rigor no território francês. Na França esta burguesia 
se sentia pouco valorizada, principalmente da parte dos membros da realeza, 
monarquia absolutista. 
• Os ideais pregados pelos revolucionários passam a constituir as novas diretrizes 
políticas, econômicas e sociais, não somente na França, mas além do território 
francês, e passam a intervir na maior parte das sociedades do século XVIII. 
• A literatura também passa a mostrar essas influências. A liberdade suplanta as 
regras fixas de outrora, a razão é posta acima da emoção. Instaura-se, assim, 
uma nova maneira de expressão artística (entre esta a literatura) na Europa, o 
que chegou também em Portugal. É o chamado Romantismo. 
• Os ideais românticos têm suas marcas a partir do escocês Allan Ramsay, em 
1724, o qual publicou uma antologia de poemas intitulada The Evergreen.
• No território português, os historiadores da literatura marcam o surgimento 
do novo movimento literário a partir da publicação do poema Camões, por 
Almeida Garret, em 1825. 
• O Romantismo opunha-se aos clássicos, às regras e modelos fixos, desejando 
certa liberdade namaneira de criar. 
• O Romantismo foi um movimento de liberdade espiritual, filosófica, literária, 
artística, social e política. Em arte e literatura, seu objetivo foi fazer algo 
diferente do passado e do existente, e até contra ambos. 
• As características que são marcantes no Romantismo são várias. Todas elas 
procuram se centrar na valorização do eu e da liberdade, ao mesmo tempo 
em que vão se juntando e formam um painel muito amplo com os traços 
reveladores da estética romântica.
• O Romantismo passou a ser visto como uma nova forma de expressão, de 
enfrentamento dos problemas da vida e do pensamento.
RESUMO DO TÓPICO 1
180
• O artista homem buscava idealizar a mulher, constituí-la deusa, colocá-la num 
plano divino, e com isso retornava ao passado medieval, ao Trovadorismo, 
às madames que eram desejadas pelos trovadores, ainda que inatingíveis por 
causa das condições sociais de um e de outro. 
• Dentro do Romantismo de Portugal, merecem destaque alguns escritores 
como Alexandre Herculano e Almeida Garret, apesar de, como é normal em 
toda nova tendência literária, o Romantismo também não ter sido implantado 
totalmente e de modo súbito, logo nos primeiros instantes de sua manifestação, 
em Portugal.
181
Caro/a acadêmico/a, para que você possa melhor fixar o conteúdo 
deste tópico, apresentamos, a seguir, uma atividade. Procure resolvê-la com 
base no que você estudou.
1 Leia o seguinte trecho extraído do romance Eurico, o Presbítero, de 
Alexandre Herculano. Em seguida, resolva a atividade que é proposta:
O mundo atual nunca poderá entender plenamente o afeto que, 
vibrando-me dolorosamente as fibras do coração, me arrastava para as solidões 
marinhas do promontório, quando os homens nos povoados se apinhavam à 
roda do lar aceso e falavam das suas mágoas infantis e dos seus contentamentos 
de um instante. E que me importa a mim isso? Virão um dia a esta nobre terra 
de Espanha gerações que compreendam as palavras do presbítero. Arrastava-
me para o ermo um sentimento íntimo, o sentimento de haver acordado, vivo 
ainda, deste sonho febril chamado vida, e de hoje ninguém acorda, senão 
depois de morrer. Sabeis o que é esse despertar de poeta? É o ter entrado 
na existência com o coração que transborda de um amor sincero e puro por 
tudo quanto o rodeia, e ajuntaram-se os homens e lançaram-lhe dentro do seu 
vaso de inocência lodo, fel e peçonha e, depois, rirem-se dele: é o ter dado às 
palavras – virtude, amor, pátria e glória – uma significação profunda e, depois 
de haver buscado por anos a realidade delas neste mundo, só encontrar ali 
hipocrisia, egoísmo e infâmia.
 
E o perceber à custa de amarguras que o existir e padecer, o pensar, 
descrer, o experimentar desenganar-se, é a esperança das coisas da terra uma 
cruel mentira de nossos desejos, um fumo tênue que ondeia em horizonte 
aquém do qual está assentada a sepultura. Este é o acordar do poeta. Depois 
disso, nos abismos de sua alma só há para mandar aos lábios um sorriso de 
desprezo em resposta às palavras mentidas dos que o cercam, ou uma voz de 
maldição desabridamente sincera para julgar as ações dos homens. É então que 
para ele há unicamente uma vida real – a íntima; unicamente uma linguagem 
inteligível – a do bramido do mar do rugido dos ventos; unicamente uma 
convivência não travada de perfídia – a da solidão. 
(HERCULANO, Alexandre. Eurico, o Presbítero. São Paulo: Publifolha, 1997. p. 37.)
a) Extraia do texto elementos que fazem parte da estética do Romantismo.
b) Identifique o trecho em que é possível observar o individualismo da 
personagem.
c) Retirar do texto partes que identificam o poeta com a natureza.
AUTOATIVIDADE
182
183
TÓPICO 2
A REVOLUÇÃO DA MENTALIDADE E O CULTO AO ETÉREO: 
AS ESCOLAS REALISTA E SIMBOLISTA
UNIDADE 3
1 INTRODUÇÃO
“O Romantismo era a apoteose do sentimento; o 
Realismo é a anatomia do caráter. É a crítica do 
homem. É a arte que nos pinta a nossos olhos – para 
condenar o que houver de mal na sociedade.”
(QUEIRÓS, Eça de. Conferência no Cassino 
Lisbonense)
“Meu infinito amor é a alma universal,
Essa nuvem primeira, essa sombra d’ outrora...
O bem que tenho hoje é o meu antigo mal,
A minha antiga noite é hoje a minha aurora!”
(PASCOAES, Teixeira de. Poesias. Rio de Janeiro: 
Agir, 1970, p. 68.)
Com o advento da segunda metade do século XIX, o contexto sociocultural 
da Europa começa a dar mostra de mudanças muito significativas, principalmente 
no que concerne à burguesia e à indústria mecânica, as quais começam a firmar-
se. Os ideais de liberalismo e democracia recebem proporções gradativamente 
maiores. Do mesmo modo, as ciências naturais começam a desenvolver-se e, na 
mesma medida, os métodos experimentais e de observação da realidade começam 
a ser vistos como possíveis para explicar racionalmente o mundo físico. 
O desenvolvimento científico tomou conta da grande maioria dos 
intelectuais, bem como passou a ser bem aceito em todos os ambientes, dos mais 
simples aos ambientes universitários. A adesão, enfim, ao cientificismo e ao 
materialismo é geral, em flagrante oposição à metafísica, à religião e a tudo o que 
pudesse fugir dos limites da matéria. 
Certas doutrinas científicas e filosóficas surgidas na época marcaram 
visivelmente a produção literária. Nesse sentido, Hegel põe à mostra a Dialética 
do Processo Racional, para quem qualquer raciocínio pode ser lógico, desde 
que seja estruturado na trilogia sequencial tese – antítese – síntese. Juntamente, 
Augusto Comte, com o Positivismo, justifica o valor da ciência para a sociedade 
humana. Segundo ele, a Teologia e a Metafísica poderiam ser postas de lado, já 
que a realidade é concreta, objetiva e lógica, valendo, para fins de entendimento, 
a análise lógica e experimental, pois tudo é possível de ser explicado e entendido 
por todos. Neste mesmo tempo, surge a obra científica de Charles Darwin, A 
184
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
Origem das Espécies, por meio da qual retomou a teoria da evolução dos animais 
e plantas, ou melhor, dos seres vivos. A teoria de Darwin obteve grande oposição 
da Igreja, mas, por outro lado, foi extraordinariamente aceita pelo público, haja 
vista a curiosidade geral em torno deste novo tema. 
Todos estes conhecimentos e mudanças sociais trouxeram novos ares à 
literatura, que começava a refletir a realidade; enfim, na segunda metade do século 
XIX, surge uma geração de escritores contrária à monarquia e em parte adepta 
do regime republicano. Esta geração de escritores preferia mostrar o momento 
presente, a realidade social, tal qual a via, descrevendo-a nos pormenores. Era 
a geração que trazia um novo estilo artístico – o Realismo, que chega às terras 
lusitanas por volta de 1865, com momentos de intensa agitação e polêmicas no 
ambiente literário português.
Por outro lado, nas últimas décadas do século XIX, começava a surgir 
na Europa uma nova corrente literária, a qual se opunha ao Realismo. Esta 
geração dizia-se frustrada nas suas tentativas de modificar a realidade. Bem o 
revela Alfredo Bosi (1984, p. 296) que “[...] do âmago da inteligência europeia 
surge uma oposição vigorosa ao triunfo da coisa e do fato sobre o sujeito – aquele 
sujeito a quem o otimismo do século prometera o paraíso, mas não dera senão o 
purgatório de contrastes e frustrações”. 
Ao mesmo tempo em que temos a desilusão dos escritores realistas, há os 
estados ricos que disputam entre si as benesses dos países menos desenvolvidos, 
entre estas as matérias-primas e a mão de obra. De carona, aparecem novas ideias, 
novas atitudes e concepções contrárias ao racionalismo, as concepções psicológicas 
de Freud, a escola sociológica de Durkheim. E mais, na arte convive-se com novas 
revoluções estéticas, entre os novos meios expressivos como o impressionismo, 
o cubismo, o surrealismo e o expressionismo, os quais refletiram no ambiente 
literário. Tudo isto levou, sobretudo, ao retorno ao "eu", ao afastamentodo real 
em prol de uma adesão à nebulosidade, ao culto do vago, ao oculto, ao mistério, 
à ilusão, à solidão. Diante disto, percebe-se um retorno à crença na teologia e 
à metafísica, as quais foram abandonadas quando do surgimento do Realismo. 
Em Portugal, esta nova estética chega por volta de 1890, tendo recebido grande 
influência do Simbolismo francês.
Assim, caro/a acadêmico/a, neste tópico temos por propósito tratar destes 
dois estilos de época bastante marcantes, ao mesmo tempo que esteticamente 
opostos, dentro do panorama literário português. Trata-se do Realismo e do 
Simbolismo.
TÓPICO 2 | A REVOLUÇÃO DA MENTALIDADE E O CULTO AO ETÉREO: AS ESCOLAS REALISTA E SIMBOLISTA
185
2 ASPECTOS GERAIS DO REALISMO
No ambiente lusitano, a escola literária do Realismo chega via importação. 
Ao que parece, trata-se mais de uma posição assumida por grupos intelectuais 
minoritários, ansiosos por reformas, entre os quais figuram Eça de Queirós 
e Antero de Quental. Todavia, a influência destes literatos será de grande 
importância no seio dos setores burgueses mais progressistas. 
Os realistas desejavam apresentar os fatos ou as cenas cotidianas da 
sociedade tais quais se apresentavam, sem ocultar, inclusive, o seu lado mais 
sombrio, desfazendo-se da ficção e da fantasia, marcas de estilos anteriores. 
Desejosos de mostrar o que era real na sociedade, dirigem, por isso, suas lentes 
do mundo dos mais abastados, dos nobres, para o mundo dos menos favorecidos, 
dos pobres. E mais ainda, quando focalizam o universo burguês, o alvo não é o 
aparente, mas procuram as essências, desmistificando as hipocrisias da sociedade. 
Grande exemplo que não poderia deixar de ser mostrado, até por se 
tratar de um marco do realismo, é o romance Madame Bovary, publicado em 
1857, por Gustave Flaubert, que faz uma sátira discreta à hipocrisia da educação 
sentimental da burguesia. É a partir deste exemplo literário que a literatura passa 
a ser um instrumento de denúncia e crítica social.
Implantado o novo modelo estético, percebeu-se também uma nova tônica 
na maneira de apresentar os fatos, ou seja, transformou-se a linguagem, a qual 
abandonou o tom emocional romântico, adquiriu um timbre mais objetivo. Além 
disso, para ser mais reveladora, fez-se necessário aproximar-se da modalidade 
realmente falada pelas personagens focalizadas. Houve, sim, preocupação com a 
utilização da língua nos moldes gramaticais clássicos, sem a presença das formas 
regionais típicas do nacionalismo romântico.
FONTE: De Giovanni (2007, p. 106) 
FIGURA 36 – GUSTAVE FLAUBERT
186
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
No que concerne ao conteúdo tratado, na literatura realista não há 
heróis. São as pessoas comuns os protagonistas dos romances no novo estilo. A 
preocupação dos autores é fixar a sua psicologia, desnudar o que há por trás 
das ações e das atitudes. Acredita-se que é dessa maneira que se criam “[...] 
as bases para a representação da realidade cotidiana, com a abordagem dos 
problemas sociais, políticos, econômicos e psicológicos desse novo público-
leitor.” (ABDALA JÚNIOR; PASCHOALIN, 1985, p. 100). Diante disso, há que 
se dizer que o desejo de observar e analisar impulsionou os escritores realistas 
a valerem-se da realidade da vida contemporânea, do seu próprio tempo, como 
fonte de inspiração e objeto de escrita. 
Não menos importante é mencionarmos que a renovação literária, no 
território lusitano, deu-se paralelamente à construção da ferrovia que interligou 
Portugal ao restante da Europa, por volta do ano de 1864, fator este que permitiu 
(e talvez facilitou) o fluxo das ideias e mercadorias ou, de um modo geral, a 
acessibilidade àquilo que havia de moderno então.
Sobre isso, vale o depoimento do autor realista Antero de Quental, que 
pode testemunhar as mudanças artístico-literárias que se aproximam das terras 
lusitanas:
Coimbra vivia então numa grande atividade, ou antes, num grande tumulto 
mental. Pelos caminhos de ferro, que tinham aberto a Península, rompiam cada 
dia, descendo da França e da Alemanha (através da França), torrentes de coisas 
novas, ideias, sistemas, estéticas, formas, sentimentos, interesses humanitários. 
Cada manhã trazia a sua revelação, como um sol que fosse novo. (NICOLA, 1994, 
p. v).
Percebe-se no comentário a questão inerente ao programa estético realista, 
no qual transparece a preocupação em observar o ser humano de modo imparcial, 
ou seja, como o fariam as ciências físicas. É desse modo que se desejava a criação 
de uma literatura verdadeira, mais apropriada aos novos tempos. Desta maneira, 
o novo escritor poderia intervir na cena contemporânea, de posse de uma atitude 
mais crítica e de modo combativo.
É diante deste novo momento em Portugal que, em 1865, ocorre a 
Questão Coimbrã, que marca o início do Realismo português, e acontecem as 
Conferências Democráticas do Cassino Lisbonense, em 1871, que definem os 
verdadeiros propósitos e consagram a nova arte. Estes são momentos de intensa 
movimentação e preparam a tomada de posição dos literatos portugueses 
envolvidos na polêmica.
A chamada Questão Coimbrã, que irrompeu em 1865, foi o resultado da 
confrontação entre jovens estudantes de Coimbra e alguns poetas ultrarromânticos 
de Lisboa. Dito de maneira simples, a palavra “questão coimbrã” faz alusão, num 
primeiro momento, à prolongada polêmica literária estabelecida entre os escritores 
Antônio Feliciano de Castilho, representante do Romantismo já em decadência, na 
cidade de Lisboa, e Antero de Quental, acadêmico da Universidade de Coimbra, 
TÓPICO 2 | A REVOLUÇÃO DA MENTALIDADE E O CULTO AO ETÉREO: AS ESCOLAS REALISTA E SIMBOLISTA
187
autor da obra Odes Modernas, o qual já havia assumido as novas tendências 
literárias e se inteirado da nova visão de mundo, advinda das transformações 
técnicas e estéticas. 
Nessa polêmica, tomaram parte, entre outros, escritores portugueses 
notáveis, Ramalho Ortigão, Camilo Castelo Branco, Teófilo Braga, alguns 
assumindo o partido de Castilho, outros o de Quental, na tentativa de apaziguar 
a questão ou levar para o debate ponderações de harmonização. Nas palavras de 
Massaud Moisés (2008, p. 222), no que concerne à questão, “[...] formaram-se dois 
partidos, um pró-Castilho e outro, pró-Antero, que vão engrossando durante os 
anos de 1865 e 1866, inclusive estendendo-se até o Brasil, com a adesão de D. 
Pedro II e Sílvio Romero”. Há, assim, uma grande polêmica instalada, entre duas 
gerações – a velha e a nova. 
O início da questão teria sido uma referência não muito elogiosa do poeta 
Antônio Feliciano de Castilho, defensor da ala ultrarromântica, à nova estética 
literária portuguesa, representada pela publicação do livro Odes Modernas, no 
ano de 1865, do escritor Antero de Quental. Castilho valeu-se do posfácio ao 
Poema da Mocidade, de Pinheiro Chagas (seu favorecido) para criticar o novo 
modelo de poesia lançado por Quental. 
Sentindo-se no direito de replicar, Antero de Quental utilizou-se de uma 
carta aberta, sob o título de Bom Senso e Bom Gosto, na qual sustentou que a 
grande falha da escola de Coimbra teria sido a vontade de introduzir a novidade 
estética. Na ocasião, aproveitou para criticar a atividade literária de Castilho, 
a qual, para Antero, estaria esvaziada de conteúdo ideológico, porém cheia de 
frases e sentimentos postiços de acadêmico. Dizia Antero de Quental na carta: 
“O escritor quer o espírito livre de jugo, o pensamento livre de preconceitos e 
respeitos inúteis, o coração livre de vaidades, incorruptível e intemerato. Só assim 
serão grandes e fecundas as suas obras.” (ABDALA JÚNIOR; PASCHOALIN, 
1985, p. 101). Como podemos ver, as palavras de Quental defendem a liberdade 
de pensamento e opõem certos princípios estéticos românticos àquilo que é 
pregado pela ciência.
O texto de Antero levou à publicação de diversos folhetins e artigos 
trocados entre as duas alas, acabando com a Questão Coimbrã. Exemplo disto é 
o textointitulado Vaidades Irritadas e Irritantes, publicado em 1866 por Camilo 
Castelo Branco, por meio do qual defende Castilho. No mesmo ano, Teófilo Braga 
toma o partido de Quental, com o folhetim Teocracias Literárias. Outro a defender 
Antero de Quental foi Luciano Cordeiro, com o artigo A Arte Realista, em 1867. 
Por fim, há quem diga que tudo chegou ao extremo através de um duelo à espada, 
na cidade do Porto, entre Antero de Quental e Ramalho Ortigão, defensor de 
Castilho. Não sabemos como isso terminou, mas talvez o respondam as palavras 
de Moisés: “[...] A vitória sorri aos moços, mas era preciso que voltassem à carga 
mais adiante a fim de consolidarem as suas posições. A derrota de Castilho 
188
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
significava apenas o golpe de morte do Romantismo.” (2008, p. 222). Não à toa, 
o grupo de jovens acadêmicos da Universidade de Coimbra, antirromânticos e 
anticastilhistas, após um tempo de dispersão, volta a se congregar em Lisboa, em 
1868, num grupo chamado Cenáculo. 
“E é este mesmo grupo que, em 1871, resolve organizar uma série 
de palestras, com o fim de discutir questões de ordem ideológica que então 
interessavam à gente culta da Europa e da América do Norte”. (MOISÉS, 2008, 
p. 222). O evento passou a chamar-se Conferências Democráticas do Cassino 
Lisbonense. Saraiva (1976, p. 802), acerca das conferências, de um modo resumido, 
demonstra o que segue:
O propósito das conferências era o de expor “[...] as grandes questões 
contemporâneas religiosas, literárias, políticas, sociais e científicas, num espírito 
de franqueza, coragem e positivismo.” Isso é o que se pode ler no manifesto 
publicado sob o título A Revolução de Setembro, de 18 de maio de 1871, que 
define a finalidade das conferências: 
 abrir uma tribuna em que tenham voz as ideias e os trabalhos que caracterizam 
esse movimento do século, preocupando-nos, contudo, com a transformação 
social, moral e política;
 ligar Portugal com o movimento moderno, fazendo-o assim nutrir-se dos 
elementos vitais de que vive a humanidade civilizada;
 procurar adquirir consciência dos fatos que nos rodeiam na Europa;
 agitar na opinião pública as grandes questões da Filosofia e da Ciência moderna;
 estudar as questões da transformação política, econômica e religiosa da 
sociedade portuguesa.
FONTE: Adaptado de: <http://www.citi.pt/cultura/literatura/romance/eca_queiroz/manifesto.
html>. Acesso em: 24 nov. 2010.
Caro/a acadêmico/a, valeria registrar aqui que em virtude das ideias 
revolucionárias divulgadas nas conferências às críticas lançadas contra a 
influência da Igreja, após decorrida a quinta conferência, o Cassino Lisbonense 
acabou fechado por um decreto real. Tal intervenção excessivamente autoritária 
por parte das autoridades acirrou os ânimos e acabou por provocar maiores 
polêmicas na comunidade literária e as palestras e reuniões não aconteceram mais. 
Há que se expor que “[...] as ideias básicas, porém, já tinham sido divulgadas e a 
renovação da cultura portuguesa marcou indelevelmente o final do século XIX, 
principalmente as décadas de setenta e oitenta.” (TUFANO, 1981, p. 185). 
TÓPICO 2 | A REVOLUÇÃO DA MENTALIDADE E O CULTO AO ETÉREO: AS ESCOLAS REALISTA E SIMBOLISTA
189
Com o andamento das ideias realistas na literatura portuguesa, novos 
métodos são propostos, entre estes a proposição do método científico para escrever, 
divulgado por Émile Zola, em 1867, por meio da publicação das obras Thérèse 
Raquin, O Romance Experimental e O Germinal, em que ele sustenta a importância 
de se utilizar o método científico na escrita – coleta de dados, formulação de 
hipóteses, criação de personagens para comprovar a validade dessas hipóteses. 
Esta nova estética dentro do Realismo passa a chamar-se Naturalismo. Surge 
agora o Realismo/Naturalismo, cujas características principais são:
 OBJETIVISMO, IMPASSIBILIDADE, OBSERVAÇÃO E ANÁLISE: procura por 
uma explicação que seja lógica e aceita cientificamente para os fatos e as ações 
tratadas no texto. 
 SENSORIALISMO: destaque para a descrição objetiva, para as impressões 
sensoriais claras. A narrativa ocorre de modo lento, por causa da necessidade 
da apresentação de pormenores excessivos, ocorrendo, inclusive a perda 
de importância do enredo diante da necessidade de caracterização das 
personagens. As personagens são esféricas, ou seja, muito complexas, 
multiformes, imprevisíveis e dinâmicas. O autor aparece mais distante da 
narrativa, em vista da necessidade de se tornar um observador marcado pela 
neutralidade. 
 TEMAS CONTEMPORÂNEOS: para isto, os autores valiam-se de críticas sociais 
à burguesia, ao clero, à ignorância do provincianismo; ao capitalismo selvagem, 
ao preconceito racial, à monarquia. Dentro desta característica, aparecem os 
romances sociais, psicológicos e de tese. Destaque grande é dado a temas como 
o sexo, o adultério, a degradação das personagens, os assassinatos, o triunfo 
do mal. A corrente naturalista, a seu turno, prefere explorar a sexualidade, no 
sentido de que os escritores adeptos dessa corrente buscarão no cotidiano os 
fatos mais inusitados e incomuns para fazer deles a sua matéria artística. 
 PREOCUPAÇÃO FORMAL: o Realismo preocupava-se muito com a clareza, 
com a concisão, com a precisão lexical, com a rigidez da língua e das formas, 
com o vernáculo. Na escrita, havia o predomínio da denotação, com as 
metáforas cedendo lugar às metonímias. 
190
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
FONTE: De Giovanni (2007, p. 108) 
No que diz respeito à semelhança das duas estéticas, a realista e a 
naturalista, apresentamos a seguir um quadro comparativo, principalmente no 
que concerne aos modos de tratar os diferentes temas:
FIGURA 37 – ÈMILE ZOLA
REALISMO NATURALISMO
A investigação da sociedade e dos caracteres 
individuais é feita de "dentro para fora", isto é, 
por meio de uma análise psicológica capaz de 
abranger toda a sua complexidade, utilizando 
entre outros recursos a ironia, que sugere e 
aponta, em vez de afirmar.
A investigação da sociedade e dos caracteres 
individuais ocorre "de fora para dentro"; as 
personagens tendem a se simplificar, pois 
são vistas como joguetes, títeres dos fatores 
biológicos e sociais que determinam suas 
ações, pensamentos e sentimentos.
 Ênfase nas relações entre os homens 
e a sociedade burguesa, atacando suas 
instituições e seus fundamentos ideológicos: 
o casamento, o clero, a escravidão do 
homem ao trabalho como meio de "vencer 
na vida"; as contradições entre ricos e pobres, 
vistas da ótica dos "vencidos" (os marginais, 
os operários, as prostitutas) e não dos 
"vencedores".
Ênfase na descrição das coletividades, dos 
tipos humanos que encarnam os vícios, 
as taras, as patologias e anormalidades 
reveladoras do parentesco entre o homem 
e o animal; o homem descendo à condição 
animalesca em sua situação de mero 
produto das circunstâncias externas, como a 
hereditariedade e o meio ambiente.
O tratamento imparcial e objetivo dos temas 
garante ao leitor um espaço de interpretação, 
de elaboração de suas próprias conclusões a 
respeito das obras.
O tratamento dos temas a partir de uma 
visão determinista conduz e direciona 
as conclusões do leitor e empobrece 
literalmente os textos.
FONTE: Machado (1996, p. 256)
QUADRO 3 – COMPARAÇÃO ENTRE OS MOVIMENTOS REALISTA E NATURALISTA
TÓPICO 2 | A REVOLUÇÃO DA MENTALIDADE E O CULTO AO ETÉREO: AS ESCOLAS REALISTA E SIMBOLISTA
191
Até aqui, caro/a acadêmico/a, apresentamos a parte estética do movimento 
realista. Importante também tratarmos dos autores que foram marcantes neste 
movimento. Por isso optamos por apresentar um que se destaca pela poesia – 
Antero de Quental – e outro que se destaca na prosa – Eça de Queirós.
Um dos principais líderes do movimento realista foi o poeta Antero de 
Quental, considerado também um dos grandes sonetistas da literatura portuguesa,ao lado de Camões e Bocage. Ele foi também um dos que trabalharam pela 
ruptura com o Romantismo português. Dele, apresentamos inicialmente alguns 
dados biográficos: 
FONTE: Machado (1996, p. 161)
FIGURA 38 – ANTERO DE QUENTAL
ANTERO TARQUÍNIO DE QUENTAL nasceu na ilha de São Miguel, nos 
Açores, em 18 de abril de 1842. É descendente de uma das mais antigas famílias 
dos colonizadores. Era filho de Fernando de Quental, um dos 7.500 liberais que, 
em 1832, contribuíram para implantar o regime constitucional. A mãe de Antero, 
Ana Guilhermina da Maia, educou-o religiosamente, o que contribuiria para as 
suas reflexões místicas, mesmo que mais tarde abandonasse a religião. Aliás, uma 
das suas primeiras emoções intelectuais ocorre quando, em 1852, lê Ode a Deus, 
de Alexandre Herculano.
Em 1847, aprende francês com Antônio Feliciano de Castilho e inglês com 
Mr. Rendall. Em 1852, vai para Lisboa e passa a frequentar o Colégio Pórtico, cujo 
diretor é o já conhecido Castilho. Em 1865, depois de uma viagem a São Miguel, 
Antero retorna a Coimbra e passa a estudar Direito. Logo passa a ser muito bem 
visto pelos colegas e torna-se um líder entre os companheiros de turma.
Em 1865, publica uma de suas primeiras obras, Odes Modernas, fato que 
192
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
lhe confere renome e prediz o seu caminho futuro. Esta publicação de Quental 
contribui para desencadear a já citada por nós Questão Coimbrã. Depois de uma 
estada breve em Paris e Nova Iorque, retorna a Lisboa a passa a fazer parte do 
grupo Cenáculo, em 1868, do qual se torna um dos líderes. A partir de 1871, 
compõe o grupo que lidera as Conferências do Cassino, das quais participa 
ativamente.
Afastado do convívio social, desiludido com algumas de suas ideias, 
tomado por problemas psíquicos, não vê para si outra saída a não ser o suicídio, o 
qual comete em 11 de setembro de 1891, com dois tiros na boca. Antero cultivou 
um tipo de poesia e de prosa carregadas de polêmica e filosofia. Destacam-se, entre 
as suas obras poéticas, Odes Modernas, poesia publicada em 1865, Primaveras 
Românticas e Versos dos Vinte Anos, publicadas em 1871, Sonetos Completos, 
publicados em 1886 e Raios da Extinta Luz, em 1892. 
Sua obra traz a marca de uma temática muito rica e variada, porém 
interessa-nos destacar o que consideramos o desdobramento poético da polêmica 
Questão Coimbrã. Ao que parece, ele escreveu o soneto A Um Poeta com o objetivo 
de atingir os poetas do romantismo, colocando como epígrafe a frase bíblica em 
latim, tirada do evangelho surge et ambula!, a qual significa “levanta-te e anda!”.
Tu que dormes, espírito sereno,
posto à sombra dos cedros seculares,
como um levita à sombra dos altares,
longe da luta e do fragor terreno.
Acorda! É tempo! O sol, já alto e pleno
afugentou as larvas tumulares...
para surgir do seio desses mares
um mundo novo espera só um aceno...
Escuta! É grande a voz das multidões!
São teus irmãos, que se erguem! São canções...
mas de guerra... e são vozes de rebate!
Ergue-te, pois, soldado do Futuro,
e dos raios de luz do sonho puro,
sonhador, faze espada de combate!
 (QUENTAL, 1991, p. 191)
Nas palavras do soneto de Quental, percebe-se uma intenção estética que 
acaba com o caráter pessoal, intimista, confessional, e reafirma o caráter do não-
eu, que atenta para a coletividade. Nos mesmos versos, pode-se ler o domínio de 
um caráter diurno, longe do culto ao noturno, próprio do romântico, clima este 
apropriado aos devaneios pessoais.
TÓPICO 2 | A REVOLUÇÃO DA MENTALIDADE E O CULTO AO ETÉREO: AS ESCOLAS REALISTA E SIMBOLISTA
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Outro poema interessante nesse sentido é o Mais Luz!, também de 
Antero de Quental, o qual traz a marca da iluminação pelo desejo de intervir no 
contemporâneo, já que a poesia, no dizer do próprio poeta, “é a voz da revolução”.
Amem a noite os magros crapulosos,
e os que sonham com virgens impossíveis,
e os que se inclinam, mudos e impassíveis,
à borda dos abismos silenciosos...
Tu, Lua, com teus raios vaporosos,
cobre-os, tapa-os e torna-os insensíveis,
tanto aos vícios cruéis e inextinguíveis,
como os longos cuidados dolorosos!
Eu amarei a santa madrugada,
e o meio-dia em vida refervendo,
e a tarde rumorosa e repousada.
Viva e trabalhe em plena luz: depois,
seja-me dado ainda ver, morrendo,
o claro Sol, amigo dos heróis!
 (QUENTAL, 1991, p. 186)
Na parte relacionada à prosa, temos como expoente Eça de Queirós, 
cuja produção literária é marcada pela noção de literatura de intervenção, mais 
voltada para a tomada de consciência dos problemas sociais. Esta questão é muito 
bem definida na textualidade de Queirós. Inicialmente, consideramos importante 
apresentar alguns dados biográficos de Eça de Queirós:
JOSÉ MARIA EÇA DE QUEIRÓS nasceu em Póvoa de Varzim, Portugal, 
aos 25 de novembro de 1845. Equivocadamente, muitos escrevem seu nome como 
Eça de Queiroz, com a letra Z. Eça faleceu em Paris, capital francesa, em 16 de 
agosto de 1900, porém, seu funeral foi realizado em Lisboa, no dia 17 de agosto. 
Eça de Queirós era casado com a D. Emília de Castro Pamplona, irmã do conde 
de Resende.
194
UNIDADE 3 | DO ROMANTISMO À CONTEMPORANEIDADE: A ESTÉTICA E A PRODUÇÃO LITERÁRIA
FONTE: Machado (1996, p. 173)
FIGURA 39 – EÇA DE QUEIRÓS
Seu pai era o Dr. José Maria Teixeira de Queirós, juiz do Supremo 
Tribunal de Justiça, e sua mãe D. Carolina de Eça. Estudou em alguns colégios da 
cidade do Porto e cursou ensino superior (Direito) na Universidade de Coimbra, 
completando a sua graduação em 1866. Em 1867, estabeleceu-se como advogado, 
cuja profissão exerceu durante algum tempo, mas logo a abandou por achar que 
não alcançaria um futuro promissor. Era amigo pessoal de Antero de Quental, 
com o qual viveu fraternalmente. Estabeleceu com ele e outros companheiros 
uma verdadeira agremiação literária, em cuja assembleia entraram Ramalho 
Ortigão, Oliveira Martins, Salomão Saraga e Lobo de Moura. Este grupo, em 
1871, estabeleceu as famosas Conferências Democráticas no Cassino Lisbonense. 
Eça, mais tarde, decidiu-se pela carreira diplomática e prestou concurso 
para tal em 21 de julho de 1870, sendo aprovado como primeiro colocado. Em 
1872, foi nomeado cônsul geral em Havana – Cuba – cidade para a qual partiu. 
Permaneceu pouco tempo em Cuba, no meio das agitações do governo espanhol. 
No ano de 1874, foi transferido para Newcastle, em 1876 foi para Bristol e, 
finalmente, no ano de 1888, para Paris, cidade em que faleceu. 
Entre as suas muitas obras, destacam-se alguns romances mundialmente 
conhecidos, como: O Crime do Padre Amaro, publicado em 1876, O Primo Basílio, 
cujo lançamento se deu em 1878, Os Maias, publicado em 1888, A Ilustre Casa de 
Ramires, publicado em 1900 e A Cidade e as Serras, lançado no mesmo ano, 1900. 
Dentre os romances marcantes de Eça de Queirós, primeiramente está 
O Primo Basílio, lançado em 1878, no qual ganha destaque a fútil educação 
romântica das burguesas lisboetas, representada na personagem Luísa. Outro 
romance é O Crime do Padre Amaro, lançado ainda em 1875, o qual faz uma 
crítica contundente a certos membros do clero, tanto pela tendência aos gozos 
materiais quanto pela luxúria e gula.
TÓPICO 2 | A REVOLUÇÃO DA MENTALIDADE E O CULTO AO ETÉREO: AS ESCOLAS REALISTA E SIMBOLISTA
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Em ambos os textos, estamos diante do que poderia ser denominado 
romance de tese, pois as suas personagens, Luísa no primeiro e Amaro e Amélia 
no segundo, são condicionadas pelo meio em que estão dispostas. Acerca destas 
personagens, pode-se ler no Dicionário de Literatura Portuguesa que:
Eça procura fundar a representação narrativa na observação que 
pode fazer dos cenários que privilegia; as personagens que os 
povoam surgem então como figuras afetadas por fatores educativos 
e hereditários que os romances tratam de pôr em evidência, de forma 
normalmente muito crítica. Se Luísa é levada ao adultério, um tal 
destino há de ser

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