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TUTORIA 2- 1- Diferenciar analgesia e anestesia A anestesia refere-se à cessação induzida da percepção dolorosa. Existem três tipos diferentes de anestesias: 1. Anestesia geral implica na perda reversível e controlada da consciência, o que significa que o paciente não consegue sentir, ouvir ou lembrar de nada. Algumas funções fisiológicas essenciais são suspensas, como a respiração, por exemplo, e têm de ser mantidas artificialmente. Paralelamente, o paciente recebe drogas que desfazem o tônus muscular e paralisam os movimentos. No final da anestesia geral, as drogas que a induzem e a mantêm são interrompidas e os pacientes recebem agentes para reverter todos os seus efeitos. A anestesia geral é usada em cirurgias de grande porte, sobretudo naquelas que envolvem abertura da cavidade torácica ou abdominal. 2. A anestesia regional torna uma região do corpo incapaz de sentir dor, sem abolir a consciência. É o que acontece na anestesia raquidiana ou peridural, em que a pessoa fica anestesiada da cintura para baixo. Esse tipo de anestesia pode ser empregado em intervenções na metade inferior do corpo, como partos, por exemplo. Outros exemplos são os bloqueios anestésicos de troncos nervosos, usados para possibilitar procedimentos cirúrgicos nas extremidades ou para aliviar dores intratáveis. 3. A anestesia local torna uma pequena área focal incapaz de sentir dor. É utilizada, por exemplo, em pequenas cirurgias, como retirada de um cisto dérmico, pequenas suturas ou extração de dentes. Na maioria das formas de anestesia, os pacientes são pré-medicados (sedados) antes da cirurgia para ajudá-los a relaxar e se tornarem menos ansiosos. Os medicamentos mais utilizados para este processo são os benzodiazepínicos. A analgesia é definida simplesmente como alívio da dor, sem afetar os níveis de consciência dos pacientes. As drogas capazes de produzir tais efeitos — os analgésicos — apenas provocam a ausência ou o amortecimento da dor sem alterar a consciência. Os https://www.abc.med.br/p/exames-e-procedimentos/513274/anestesia+geral+como+e+este+procedimento.htm https://www.abc.med.br/p/exames-e-procedimentos/359034/raquianestesia+o+que+e+quais+os+preparos+necessarios+como+e+feita+quais+sao+as+vantagens+e+as+desvantagens.htm https://www.abc.med.br/p/exames-e-procedimentos/358844/como+e+a+anestesia+peridural+ou+epidural.htm https://www.abc.med.br/p/exames-e-procedimentos/359079/como+e+feita+uma+anestesia+local.htm https://www.abc.med.br/p/exames-e-procedimentos/1275243/tipos+de+anestesia.htm https://www.abc.med.br/p/psicologia-e-psiquiatria/1286128/coisas+que+voce+precisa+saber+sobre+os+benzodiazepinicos.htm analgésicos são uma classe extensa de medicamentos, que se dividem em dois tipos básicos: 1. Os analgésicos narcóticos: reduzem a percepção da dor e diminuem a atividade cerebral, provocando sono. São os analgésicos mais fortes, utilizados em dores de maiores intensidades. O mais potente deles é a morfina. A grande desvantagem desses analgésicos é a possibilidade de causarem rápida dependência. 2. Os analgésicos não narcóticos: esses analgésicos inibem a produção de determinadas substâncias e, com isso, diminuem a sensação de dor. Pode-se diferenciar três tipos de analgesias: ● A analgesia periférica é um tipo de ação do sistema nervoso que controla a entrada da informação dolorosa, antes dela chegar no córtex cerebral. Nesse sentido, o intuito da analgesia periférica é reduzir a aferência do estímulo doloroso, reduzindo o desequilíbrio eletrolítico entre o interior e o exterior das células. ● A analgesia central refere-se a ações que têm origem em áreas mais superiores do sistema nervoso, mas que tem o mesmo intuito, de reduzir a aferência da dor. ● Na analgesia descendente, áreas do sistema nervoso central projetam-se para baixo e tentam regular e bloquear os níveis de entrada das informações dolorosas periféricas no cérebro. 2- Explicar o mecanismo da dor neuropática e entender seu quadro clínico (sensibilização central e periférica, relacionando conceitos álgicos). A dor neuropática é, por definição, uma dor que resulta de lesão ou disfunção do sistema nervoso central ou periférico. São vários os mecanismos que podem contribuir para o aparecimento de sintomatologia dolorosa associada a neuropatias periféricas. Um dos mais estudados relaciona-se com o aparecimento de focos ectópicos geradores de impulsos nervosos. https://www.abc.med.br/p/sinais.-sintomas-e-doencas/791882/disturbios+hidroeletroliticos+o+que+devemos+saber.htm Em condições fisiológicas, os potenciais de ação que percorrem os neurônios aferentes primários têm origem apenas nos terminais periféricos desses neurônios. Para o efeito, dispõem localmente dos receptores e canais iónicos qualitativamente e quantitativamente apropriados, sendo de salientar, pela sua importância funcional na génese dos potenciais de ação, os canais de sódio dependentes da voltagem (VDNC). Estes canais iónicos, como a esmagadora maioria das proteínas neuronais, são sintetizados no pericário do neurónio e transportados para os terminais periféricos. Quando ocorre uma lesão da fibra nervosa, por exemplo uma secção traumática de um nervo periférico, seja ela de causa acidental ou no decurso de uma intervenção cirúrgica, o segmento distal das fibras nervosas degenera, enquanto a parte proximal, aquela que se mantém em contacto com o corpo celular, vai proliferar distalmente e formar uma massa de fibras nervosas pouco organizada designada por neuroma. Assim, os receptores e canais iônicos sintetizados no pericário, nomeadamente os VDNC, vão começar a acumular-se no neuroma, tornando-o particularmente sensível a estímulos externos, bem como à estimulação pelo sistema nervoso simpático. O neuroma pode mesmo tornar-se fonte de potenciais de ação espontâneos, tal como o pericário, onde se verifica também um aumento dos VDNC. Estas alterações nos pericários poderão contribuir para que alguns casos a anestesia local do neuroma não bloqueie totalmente a sintomatologia dolorosa associada a estas lesões. Mas não é necessário haver interrupção total da fibra nervosa para aparecerem focos ectópicos. As fibras nervosas mielínicas possuem uma concentração muito diminuta de VDNC nas zonas recobertas pela mielina, devido a uma ação inibidora local dependente da própria mielina. Aqueles canais localizam-se preferencialmente nos nós de Ranvier, locais, indispensáveis para a condução saltatória do impulso nervoso, onde a fibra não está recoberta pela mielina. Porém, quando uma lesão neuropática provoca uma desmielinização dos neurônios sensitivos, vai haver uma acumulação dos VDNC nas zonas desmielinizadas, que podem tornar-se fonte de impulsos ectópicos. Em condições fisiológicas, a transmissão de um potencial de ação ao longo de uma fibra nervosa não tem efeitos significativos sobre as fibras vizinhas pertencentes ao mesmo nervo, dado que as fibras estão isoladas eletricamente umas das outras. Esta propriedade fica a dever-se fundamentalmente à existência da bainha de mielina e à disposição aleatória dos nós de Ranvier, bem como ao fato de as próprias fibras amielínicas estarem alojadas em reentrâncias das células de Schwann. Porém, as lesões neuropáticas provocam frequentemente alterações desta organização histológica, que podem condicionar o surgimento de interacções efáticas entre as fibras, isto é, as alterações da concentração de sódio e potássio, que se verificam no meio extracelular ,quanto ocorre passagem do potencial de acção numa fibra, podem provocar a despolarização das fibras vizinhas e o consequente desencadear de potenciais de acção nessas fibras. Deste modo, a ativação de fibras não nociceptivas por estímulos inócuos pode conduzir à ativação das fibras nociceptivas através de interacções efáticas, e consequentemente o estímulo inócuo poderá ser percepcionado como doloroso (alodínia). Podem também ocorrer interacções não-efáticas entre as fibras nervosas na sequência de umalesão neuropática. Neste caso, é a ativação síncrona e rítmica de um grande número de fibras, por exemplo devido à presença de um foco ectópico, que leva a que as fibras vizinhas sejam simultaneamente ativadas, por mecanismos ainda pouco esclarecidos, aumentando assim o número de impulsos nervosos que chegam à medula espinhal. Esta ativação pode ocorrer também nos GRD, dado que o isolamento dos pericários está alterado em algumas neuropatias. A sensibilização dos nociceptores é outro dos fenómenos que pode contribuir para a fisiopatologia da dor neuropática. O NGF, produzido e libertado em quantidades muito diminutas pelas células não neuronais, nomeadamente fibroblastos e células de Schwann, é fundamental para a sobrevida de uma grande população de nociceptores. Porém, o mesmo NGF pode sensibilizar os nociceptores quando existe em excesso, tal como se verifica em lesões inflamatórias, e assim contribuir para a dor nociceptiva. No caso de algumas lesões neuropáticas, mesmo que não haja um componente inflamatório, pode ocorrer sensibilização dos nociceptores não lesados devido a um excesso relativo de NGF, que não é captado pelas fibras sensitivas degeneradas. Por outro lado, o aparecimento de focos ectópicos em fibras sensitivas que mantêm terminais periféricos, leva à libertação de SP e CGRP daqueles terminais, devido à condução antidrómica (do local onde surge para a periferia) do impulso ectópico. Tanto a SP como o CGRP podem ativar e sensibilizar os nociceptores presentes na vizinhança daqueles terminais. O sistema nervoso simpático tem um papel importante na fisiopatologia de determinadas neuropatias dolorosas. Em condições normais, o sistema nervoso simpático não exerce qualquer efeito direto sobre os terminais periféricos dos nociceptores. Porém, verificou-se que os neuromas são particularmente ricos em receptores α-2-adrenérgicos, e recebem uma abundante inervação por fibras simpáticas pós ganglionares. Os pericários dos neurónios sensitivos tornam-se também ricos naquele tipo de receptores nalgumas neuropatias, observado-se igualmente uma proliferação de fibras simpáticas pósganglionares nos GRD, que rodeiam os pericários dos neurónios sensitivos. Assim, estes neurónios ficam particularmente sensíveis não só à atividade do sistema nervoso simpático, como também às próprias aminas circulantes. Em concordância com estas observações, a simpaticectomia alivia a sintomatologia dolorosa observada em modelos experimentais de dor neuropática. Observaram-se diversas alterações fenotípicas dos nociceptores nas neuropatias periféricas. Para além da referida alteração da expressão dos VDNC, verificou-se uma diminuição da concentração de SP e CGRP e o aumento da galanina, colecistocinina e polipeptídeo intestinal vasoativo (VIP). Pensa-se que estas alterações estejam relacionadas com a diminuição ou interrupção do transporte de NGF dos terminais periféricos para os pericários. Os neurónios Aβ, transmissores de informação inócua, também apresentam alterações fenotípicas, como a síntese de substância SP e CGRP, que em condições fisiológicas não possuem, e o aumento da concentração intracelular de VIP e NO. A secção de nervos periféricos leva à atrofia dos terminais centrais de nociceptores que terminam na lâmina II da medula espinhal. Paralelamente, as fibras inócuas Aβ, que normalmente terminam nas lâminas III e IV, proliferam e invadem as lâminas mais superficiais indo estabelecer sinapses com neurónios nociceptivos localizados na lâmina II. Assim, após secção traumática dos nervos periféricos, a ativação das fibras Aβ por estímulos inócuos pode provocar a ativação de neurónios nociceptivos, tanto mais quanto aquelas fibras passam a exprimir SP e CGRP, contribuindo assim para a alodínia. A reacção inflamatória que ocorre nos troncos nervosos em algumas neuropatias pode também contribuir para a fisiopatologia da dor neuropática. O processo inflamatório local, que habitualmente envolve o perinervo e o endonervo, leva à produção e libertação de substâncias algogênicas pelos polimorfonucleares, macrófagos e células de Schwann. Estas substâncias podem ativar os nervi nervorum (nervos que inervam os troncos nervosos), provocando uma dor referida ao tronco nervoso, ou condicionar o aparecimento de impulsos nervosos ectópicos, causando neste caso uma dor referida ao território inervado. Observaram-se infiltrados inflamatórios em nervos e GRD de doentes com nevralgias pós-herpéticas. As neuropatias periféricas acompanham-se também de alterações de sensibilização do sistema nervoso central que contribuem significativamente para a fisiopatologia da sintomatologia dolorosa. Finalmente, existem provavelmente fatores genéticos a condicionar o aparecimento de dor associada a neuropatias. Embora esses fatores sejam ainda pouco conhecidos, é de referir um conjunto muito interessante de estudos que demonstraram que o aparecimento de comportamentos indicativos da presença de sintomatologia dolorosa, numa determinada estirpe de animais de experiência que eram submetidos a um modelo experimental de neuropatia periférica, estava associado a um gene autossómico recessivo. DOR NEUROPÁTICA CENTRAL São exemplos de dor neuropática de origem central a que ocorre após lesão medular (degenerativa, traumática ou isquémica), ou a que acompanha doenças como a esclerose múltipla, a doença de Parkinson ou lesões isquémicas em consequência de acidentes vasculares cerebrais. Ao contrário do que acontece na dor neuropática periférica, os mecanismos fisiopatológicos responsáveis pela dor neuropática central são ainda mal conhecidos. Este fato estará seguramente relacionado com a inexistência de bons modelos experimentais de dor neuropática central, contrariamente ao que sucede com a dor neuropática periférica. A maioria dos estudos sobre a fisiopatologia da dor neuropática central apontam para a ocorrência de fenómenos de desinibição por redução da ação do GABA, o neurotransmissor inibitório mais abundante no sistema nervoso central. Lesões isquêmicas experimentais da medula espinhal levam ao aparecimento de alodínia e hiperexcitabilidade dos neurônios medulares, que é acompanhada por uma diminuição do número de interneurônios inibitórios GABAérgicos e revertida pela aplicação de baclofeno, um agonista dos receptores GABAB. Por outro lado, a administração de antagonistas dos receptores GABAA no complexo ventrobasal do tálamo, ou no córtex somatossensitivo, provoca comportamentos indicativos de dor em animais de experiência. Em doentes com dor central, foram observados padrões de atividade neuronal talâmica epileptiforme, semelhante à que se observa experimentalmente após bloqueio da ação do GABA. A eficácia dos fármacos antiepilépticos no tratamento da dor central aponta igualmente para a existência de alterações da excitabilidade neuronal, sejam elas por redução da ação inibitória do GABA ou por aumento da ação excitatória de neurotransmissores como o glutamato. Por fim, estão descritos casos de dor central em resultado de lesões do tracto espinotalâmico. Na origem desta dor podem estar alterações das fibras nervosas semelhantes às observadas nas lesões do sistema nervoso periférico. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: Dor difusa e de difícil descrição. DIAGNÓSTICO: Existe uma tabela(escala de LANSS -Procurar) que auxilia, mas a história clínica do paciente, uma boa anamnese e exclusão de outras causas é o melhor aliado. Ela não responde bem aos opioides e a analgesia convencional. 3- Entender o mecanismo da dor fantasma e suas manifestações FISIOPATOLOGIA Primariamente chegou-se a pensar que a dor do membro fantasma seria uma doença psiquiátrica. Com o acumular de evidências nas últimas décadas, os paradigmas mudaram para as alterações a vários níveis do eixo neural, especialmente do córtex. Mecanismos periféricos e centrais estão entre as hipóteses que ganharam consenso ao longo dos últimos anos. No entanto, nenhuma destas construções teóricasparece ser capaz de explicar o fenômeno da DFa de forma independente, podendo mesmo coexistir múltiplos mecanismos. MECANISMOS PERIFÉRICOS Durante a amputação, os nervos periféricos são seccionados. Isto leva a uma massiva destruição de tecido neuronal, causando rotura do padrão normal de aferência do nervo para a medula espinhal. De seguida dá-se um processo de desaferenciação e a porção proximal dos nervos seccionados pode formar neuromas. Há um aumento da acumulação de moléculas que reforçam a expressão de canais de sódio nestes neuromas, que resulta em hiperexcitabilidade e descargas espontâneas. Assim, em geral, há um aumento na atividade ectópica e uma perda de controle inibitório no corno dorsal . Pensa-se que esta atividade anormal periférica possa constituir a fonte potencial de dor no coto, incluindo da DFa. Estudos relatam a redução da DFa com fármacos bloqueadores dos canais de sódio, corroborando essa teoria. Percebeu-se que essa não seria a única causa, pois existem pacientes que cursam com dor fantasma logo após a amputação. MECANISMOS NEURAUS CENTRAIS ❖ Alterações ao nível da medula Os “sprouts”(formação dos neuromas) axonais na seção proximais do nervo periférico amputado formam conexões nervosas com neurónios do campo receptivo da medula espinhal. Alguns neurónios nas áreas da medula que não são responsáveis pela transmissão da dor, também podem “germinar” na lâmina II do corno dorsal da espinal medula, que é a área envolvida na transmissão de entradas aferentes nociceptivas. Isto é seguido pela atividade neuronal aumentada, expansão do campo neuronal receptivo e hiperexcitabilidade de outras regiões. Este processo é chamado de sensibilização central. Durante este processo, existe também um aumento da atividade dos receptores NMDA, mediados por neurotransmissores, tais como a substância P, taquiquininas, e neuroquininas, no corno dorsal da espinal medula. Isto é seguido de um fenômeno chamado "fenómeno de corda", no qual há uma supra-regulação de tais receptores na área. Este processo produz uma mudança no padrão de disparo dos neurônios centrais nociceptivos. Também pode ser perdida a transmissão inibitória descendente desde os centros supra espinhais até aos neurônios alvo ao nível vertebral. Pode também haver uma redução nos mecanismos inibitórios intersegmentares ao nível da medula, resultando em desinibição espinal e entradas nociceptivas que alcançam os centros supra espinhais. Esta falta de entrada aferente e alterações ao nível da espinal medula foram propostas como causa resultante na geração de DF. OBS.: -Habitualmente a estimulação dos aferentes nociceptivos primários libertam neurotransmissores como o glutamato, que se liga aos receptores pós-sináticos AMPA, originando potenciais de duração muito limitada. Quando há estimulação intensa e repetida, o glutamato passaria também a ligar-se a recetores NMDA dos neurónios de segunda ordem, desencadeando potenciais de longa duração. Se as fibras A sofrerem uma mudança fenotípica para fibras nociceptivas, ganham a capacidade de libertarem substância P . Neste caso aferências veiculadas pelas fibras A, habitualmente inócuas, ou mesmo inibidoras segundo a teoria do gate control, passariam a participar na sensitização dos neurónios pós-sináticos e a contribuir para a DF. Então dois mecanismos principais da espinal medula foram propostos: A. Reorganização Anatómica - que ocorre dentro da espinal medula após a lesão do nervo periférico. As fibras-C não mielinizadas envolvidas na condução da dor normalmente fazem sinapses na lâmina 1 e 2 do corno dorsal. A lesão do nervo periférico pode levar à degeneração destas fibras-C. As grandes fibras mielinizadas AB-fibras, que normalmente estão envolvidas no tato, pressão e propriocepção, enviam conexões a partir das lâminas 3 e 4 (onde normalmente fazem sinapse, para a lamina 1e 2, lâminas estas que foram previamente ocupadas pelas C-fibras. Isto pode contribuir para o desenvolvimento da dor do membro fantasma, onde estímulos não dolorosos podem ser experienciados como dolorosos. B. A sensibilização central de células do corno dorsal - ocorre em resposta ao aumento da barragem de estímulos dolorosos a partir do local da amputação. Este estado de hiperexcitabilidade leva ao desenvolvimento de hiperalgesia, em que o paciente experimenta uma resposta exagerada a estímulos nocivos. Aminoácidos excitatórios, tais como o ácido glutâmico e o ácido aspártico, podem estar envolvidos neste processo, atuando através do N-metil-D-aspartato (NMDA). Outros locais de recetores e neurotransmissores, tais como a substância P e a calcitonina relacionado com o gene, podem estar envolvidos. ❖ Alterações ao nível do cérebro Uma propriedade fundamental dos sistemas biológicos é a sua capacidade de adaptação. Há uma redundância extraordinária no sistema nervoso central, permitindo uma extraordinária capacidade de adaptação e reorganização:NEUROPLASTICIDADE. A reorganização cortical é a razão mais citada para a causa da DFa nos últimos anos. Durante a reorganização, as áreas corticais representando a extremidade amputada são assumidas pelas zonas de representação vizinhas, tanto no córtex somatossensorial primário como no córtex motor. A reorganização cortical em parte explica por que a estimulação aferente nociceptiva dos neurónios dentro do coto ou área circundante produz a sensação no membro ausente (51,52) Em membros superiores amputados, a área do córtex somatossensorial correspondente ao membro perdido aparece para receber informações sensoriais de outras áreas do corpo que fazem sinapse em áreas adjacentes no córtex somatossensorial. O `homúnculo' Penfield mostra que a área da face faz fronteira com a área da mão. Muitas vezes, nos amputados de membros superiores, quando se toca no rosto, experienciam simultaneamente uma sensação de toque na cara e ao longo dos dígitos amputados. A velocidade com que estas alterações ocorrerem após amputação de membros sugere que esta reorganização é provável que seja um resultado de desmascaramento das sinapses ocultas no córtex somatossensorial, em vez de alterações anatómicas diretas. As mudanças neuroplásticas envolvem tanto a perda imediata de entradas inibitórias de uma região para outra, como o surgimento de novas conexões durante longos períodos de tempo. A reorganização de mapas do corpo é evidente noutras condições mal-adaptativas de dor, tais como a síndrome da dor regional complexa (SDRC), ou na sequência de uma aplasia congénita do membro, em que há uma mudança funcional dos membros que se formaram (por exemplo, quando o pés e os dedos são usados para escrever e gesticular). Fenomenologicamente, as mudanças plásticas podem corresponder à experiência de sensações referidas, que podem ser desencadeadas por estímulos externos, especialmente se a parte do corpo estimulada não pode ser vista. Isto implica que as sensações referidas são menos frequentes quando a estimulação é re-aferente (isto é, correspondente a sinais sensoriais resultantes, e prevê, a partir de auto-acções), ou pode ser aumentada pela entrada visual. A ausência de feedback visual e proprioceptivo válido, para corroborar a cópia eferente de comandos motores dirigidos aomembro fantasma, foi relacionado com o surgimento da DFa. A observação de experiências sensório-motoras e dor, no entanto, pode estar envolvida na geração e manutenção de fenómenos de membro fantasma, ou seja, através de sistemas de neurónios-espelho (MNS). Tal atividade “de espelho” tem um efeito de propagação sobre o processamento da informação somatossensorial decorrente do próprio corpo do observador. A DFa nos membros pode surgir a partir de erros que ocorrem neste processo de remapeamento cortical, levando a amplificação excessiva da dor experienciada. Também podem ocorrer erros nas modalidades sensoriais, com o toque a ser experimentado como dor. A extensão da reorganização cortical, está diretamente relacionada com o grau de dor e com o tamanho da região desaferenciada. Vários estudos de imagem têmcorrelacionado maior grau de envolvimento do córtex somatossensorial com experiência de mais dor membro fantasma intensa . B Outro mecanismo proposto para explicar a DFa é baseado no “esquema corporal” conceito que foi originalmente proposto por Head e Holmes, em 1912. O esquema do corpo pode ser pensado como um modelo de todo o corpo no cérebro e qualquer alteração do corpo, tal como uma amputação, resulta na percepção de um membro fantasma (70). Uma nova expansão do conceito de esquema corporal é a "neuromatriz e neurosignature" hipótese proposta por Ronald Melzack em 1989. A matriz neural pode ser descrita como uma rede de neurónios dentro do cérebro que integra numerosas entradas de diversas áreas, incluindo diversos componentes: somatossensorial, límbico, visual, e tálamo-cortical. Em seguida, resulta num padrão de saída que evoca dor ou outras experiências significativas. A "neurosignature" termo foi proposto por Melzack para se referir aos padrões de atividade gerados no interior do cérebro que estão em permanente atualização, com base na nossa percepção consciente, do corpo e do próprio “Eu”. A privação de várias entradas provenientes dos membros para o neuromatriz provoca uma produção de “neurosignature” anormal, que resulta na geração de DFa.. Ou seja , a aferência anormal pode resultar tanto da falta de informação sensorial normal após a amputação, como de perceção de informação excessiva devido à hiperexcitabilidade dos nervos lesados . Estes conduzem a uma neuroassinatura alternativa e à experiência de “fantasma”, que pode ser ou não doloroso. C A outra hipótese em relação ao mecanismo da DFa, surgiu a partir da pesquisa em perceções ilusórias. Demonstrou-se que além do córtex somatossensorial primário, ambos os lobos parietal e frontal, estão também envolvidos na percepção do fenómeno anormal somatossensorial. Sensações dolorosas, podem estar relacionadas com a incongruência da intenção motora e o feedback e correspondem à ativação das áreas parietal e frontal ❖ Mecanismo Psicogénico A suposição de que a DFa é de origem psicogénica não tem sido suportada pela literatura recente, embora se pense que o stress, ansiedade, cansaço, depressão possam exacerbar a DFa. Um estudo transversal demonstrou que pessoas com comportamento catastrófico e personalidade influenciável têm um maior desenvolvimento de DFa independente da ansiedade e da depressão. A maioria das pesquisas sobre a relação entre os sintomas psicológicos e DFa foi retrospectivo e em corte transversal, em vez de longitudinal, o que nos limita nas inferências 4- Compreender o wind up e relacionar com a sensibilidade central Algumas das alterações funcionais que se observam na prática clínica após uma estimulação nóxica podem ser explicadas por mecanismos que envolvem apenas os neurónios aferentes primários. É o caso da dor espontânea e da hiperalgesia primária induzidas pela sensibilização dos nociceptores. Há, no entanto, outros fenómenos, como a hiperalgesia secundária, que dependem de mecanismos centrais que aumentam a excitabilidade do sistema nociceptivo. Estes mecanismos centrais, que também contribuem para a hiperalgesia primária e para a dor espontânea, estão particularmente bem estudados na área sensitiva primária, e são os responsáveis pela sensibilização dos neurónios daquela zona, a que se chama habitualmente sensibilização central, por oposição à sensibilização periférica que ocorre nos neurónios aferentes primários. É necessário distinguir os fenómenos de sensibilização central que ocorrem imediatamente após uma estimulação nóxica aguda, mas que dela dependem exclusivamente e terminam pouco depois do fim da estimulação, não induzindo qualquer tipo de alteração duradoura ou permanente na capacidade funcional dos neurónios, dos fenómenos de sensibilização central, desencadeados por uma estimulação nóxica mais prolongada, ou de alta frequência, que conduzem a alterações neuronais que perduram para além do período de estimulação e se tornam praticamente independentes da própria estimulação. Enquanto os primeiros têm uma função adaptativa, ao facilitar o aparecimento de respostas reflexas e comportamentos protectores, que promovem o afastamento do estímulo nóxico e assim impedem o agravamento das lesões, os segundos estão relacionados com o aparecimento de dor crónica e podem conduzir a alterações permanentes do sistema nociceptivo sem aparente finalidade fisiológica- não adaptativa. Têm, pois, sido objeto de intenso estudo, na perspectiva de que se forem conhecidos em detalhe os mecanismos de plasticidade neuronal que lhes dão origem, mais facilmente se poderá intervir sobre eles e assim evitar as alterações que conduzem ao aparecimento da dor crónica. Devido sobretudo a razões de índole técnica, a sensibilização dos neurónios do corno dorsal da medula espinhal tem sido estudada com especial profundidade nos neurónios WDR da lâmina V que projectam para núcleos supraespinhais. No entanto, provavelmente muitos dos fenómenos e mecanismos descritos nestes neurónios também se aplicam aos neurónios de projecção nociceptivos específicos, ou aos neurónios proprioespinhais e aos interneurónios. A ativação repetida dos nociceptores tipo C, seja por lesão tecidular, inflamação, estimulação química ou eléctrica, conduz a um estado de hiperexcitabilidade dos neurónios WDR, que se caracteriza pelo aumento da resposta aos estímulos, aumento dos campos receptivos, redução do limiar de ativação e aumento da sua atividade espontânea. Estas alterações têm uma correlação óbvia com aquilo que se observa frequentemente na prática clínica, nomeadamente a hiperalgesia primária (aumento da resposta aos estímulos), secundária (aumento dos campos receptivos), alodínia (redução do limiar de activação) e dor espontânea (aumento da atividade espontânea). Uma das características deste estado de hiperexcitabilidade é o seu prolongamento no tempo para além da estimulação que lhe deu origem. Neste aspecto, a sensibilização central assemelha-se a um fenómeno de facilitação da transmissão sináptica descrita em diversas regiões do sistema nervoso central, incluindo o corno dorsal da medula espinhal, e que se designa por potenciação a longo prazo (long term potentiation– LTP). A LTP consiste no aumento da eficácia de uma sinapse excitatória após uma estimulação de curta duração e alta frequência dessa sinapse, e será muito provavelmente um dos mecanismos envolvidos na sensibilização central, com os quais partilha muitas das alterações neuroquímicas. Saliente-se que é possível induzir LTP com estímulos cutâneos térmicos, mecânicos ou químicos. O windup é outro fenómeno de sensibilização central, que consiste no aumento da resposta dos neurónios WDR da medula espinhal, quando se aplica um estímulo repetitivamente, mas a baixa frequência e com intensidade constante e suficiente para activar as fibras C. A sensibilização central, e a LTP ou o windup dependem da ativação dos receptores do glutamato de tipo NMDA (assim designados pelo fato de o seu agonista preferencial ser o N-metil-D-aspartato), e do consequente aumento da concentração intracelular de Ca2+ e ativação de PKs que vão fosforilar determinados receptores e/ou canais iónicos. É necessário referir que os receptores do glutamato se dividem em dois grandes grupos: os receptores ionotrópicos, que possuem na sua estrutura canais iónicos permeáveis a cations como o Na+ ou o Ca2+, e os receptores metabotrópicos, que estão associados a sistemas de segundos mensageiros intracelulares, afetando directamente o metabolismo celular e, indirectamente, a excitabilidade neuronal. Cada um destes tipos de receptores é constituído por vários subtipos. No caso dos receptores ionotrópicos assumem particular importância funcional os receptores tipo AMPA (cujo agonista preferencial é o ácido α-amino-3-hidroxil-5-metil-4-isoxazolopropiónico) e NMDA. A ativação dos receptores AMPA pelo glutamato permite a entrada rápida no neurónio de Na+, e de Ca2+ em muito menor quantidade, ao passo que os receptoresNMDA são particularmente permeáveis ao Ca2+ . No entanto, os receptores NMDA possuem uma característica muito particular, que consiste no bloqueio do seu canal iónico pelo ião magnésio (Mg+), sempre que o neurónio está em repouso, isto é, quando a sua membrana não está despolarizada, impedindo deste modo a passagem de Ca2+. Quando uma fibra C é ativada por um estímulo nóxico, liberta-se glutamato na sinapse entre o seu terminal central e o neurónio espinhal. O glutamato liga-se aos receptores AMPA e NMDA presentes no neurónio espinhal, mas enquanto a ligação aos receptores NMDA não provoca qualquer efeito, devido ao bloqueio pelo Mg+, a ligação aos receptores AMPA provoca a rápida entrada de Na+ e consequente despolarização da membrana do neurónio espinhal, com o eventual aparecimento de um potencial de acção. Esta transmissão sináptica rápida (na ordem dos milissegundos), termina com a inactivação dos receptores AMPA e a abertura de canais de potássio sensíveis à voltagem (VGKC), com a consequente repolarização da membrana, e ocorre em virtualmente todas as sinapses glutamatérgicas. Porém, a despolarização transitória da membrana provoca a abertura de canais de Ca2+ controlados pelo potencial eléctrico da membrana, os chamados canais de cálcio dependentes da voltagem (VGCC), e se houver uma despolarização repetitiva da membrana, em consequência de uma estimulação repetitiva das fibras C, tal como acontece na LTP ou no windup, a membrana neuronal tende a ficar despolarizada devido ao aumento da concentração intracelular de Na+ e Ca2+. Deste modo, os canais iónicos dos receptores NMDA deixam de estar bloqueados pelo Mg+, e a sua activação pelo glutamato libertado pelos terminais centrais das fibras C permite a entrada de grandes quantidades de Ca2+, que vai activar diversas enzimas fundamentais para as alterações da excitabilidade neuronal. A substância P, que é libertada em simultâneo com o glutamato dos terminais centrais de uma grande proporção dos nociceptores, tem também um papel fundamental na ativação dos receptores NMDA. De fato, os receptores preferenciais da substância P, designados NK1, são receptores metabotrópicos. A sua activação conduz à activação da fosfolipase C e consequente produção de diacilglicerol (DAG) e trifosfato de inositol (IP3). O IP3 promove o aumento da concentração intracelular de Ca2+, através da sua saída do retículo endoplasmático, e o DAG ativa a PKC, que vai provocar a fosforilação dos receptores NMDA, tornando-os deste modo resistentes ao bloqueio pelo Mg+. De notar que os receptores metabotrópicos do glutamato do tipo I (mGluR1), que tal como os receptores NK1 estão presentes em elevado número na zona superficial do corno dorsal da medula espinhal, possuem exactamente o mesmo mecanismo de acção intracelular dependente da activação da fosfolipase C, pelo que também contribuem para a activação dos receptores NMDA. Assim, se compreende que, tanto os antagonistas dos receptores NMDA como os antagonistas dos receptores NK1 ou os antagonistas dos receptores mGluR1, inibam o aparecimento de hiperalgesia e outros fenómenos associados à sensibilização central, e não tenham efeito muito relevante sobre a transmissão dos impulsos nociceptivos simples. O aumento da concentração intracelular de Ca2+ é um passo crucial no estabelecimento da hiperexcitabilidade neuronal associada à sensibilização central. Este aumento depende, como atrás descrito, da ativação dos receptores NMDA, mas também da abertura dos VGCC e da mobilização do Ca2+ armazenado no retículo endoplasmático. A principal consequência do aumento do Ca2+ intracelular é a activação de várias enzimas, entre as quais algumas PKs. As PKs constituem um grupo de enzimas intracelulares, cuja função é a fosforilação de proteínas específicas, modificando desta forma o seu estado funcional. Estas proteínas podem ser canais iónicos, receptores membranares, outras enzimas, factores de transcrição de genes, etc. A contribuição de algumas cinases para a hiperexcitabilidade neuronal associada à sensibilização central está claramente demonstrada. Uma delas é a PKC, que, tal como acima referido, pode ser activada pelos receptores NK1 e mGluR1, e/ou pela elevação da concentração intracelular de Ca2+. São inúmeros os efeitos da activação da PKC, mas, no contexto da sensibilização central, os mais relevantes são: 1) fosforilação dos receptores NMDA inibindo o bloqueio pelo Mg+; 2) fosforilação de canais de potássio sensíveis à voltagem, responsáveis pela repolarização da membrana, prolongando assim a despolarização da membrana e permitindo a activação dos receptores NMDA; 3) translocação para a membrana de receptores AMPA armazenados intracelularmente, aumentando o número de receptores presentes nas sinapses. Refira-se, a este propósito, que se observou um aumento do número de receptores AMPA na medula espinhal em modelos experimentais de dor crónica. Uma outra PKs activada pelo aumento do Ca2+ intracelular é a cinase dependente do complexo cálcio-calmodulina de tipo II (CaMKII). Esta enzima fosforila os receptores AMPA, aumentando a sua condutância. Em resumo, estas modificações funcionais dos receptores, bem como o aumento do número de receptores AMPA, fazem com que qualquer activação subsequente das fibras C tenha um maior efeito sobre os neurónios espinhais, pela potenciação da acção pós-sináptica do glutamato. A activação da sintase do NO (NOS), e o consequente aumento da produção e libertação de NO, é outra consequência do aumento da concentração intracelular de Ca2+. Foi descrito um aumento da NOS na medula espinhal, tanto em modelos de dor inflamatória com de dor neuropática, e os inibidores daquela enzima possuem propriedades analgésicas. O NO é uma substância muito lipossolúvel, pelo que atravessa facilmente as membranas citoplasmáticas, o que lhe confere a propriedade de poder atuar sobre os neurónios vizinhos, independentemente da transmissão sináptica. Uma das principais acções do NO é o aumento da concentração intracelular de cGMP, tal como se observa em modelos de dor inflamatória, e a subsequente activação da PKG. A PKG contribui para a sensibilização central através da fosforilação e consequente inibição dos receptores inibitórios GABAA. A activação da PKA pelos receptores do CGRP provoca igualmente desinibição pela fosforilação dos receptores GABAA. A importância das PKs na sensibilização central está bem patente nos estudos que demonstram que a sua inibição atenua a hiperalgesia e a alodínia que se observa em modelos experimentais de dor. Curiosamente, murganhos (ratinhos) transgénicos que não possuíam o gene da PKC, uma isoforma da PKC presente em neurónios da lâmina II da medula espinhal e que está aumentada em modelos de dor inflamatória, não apresentavam qualquer alteração da reacção a estímulos nóxicos agudos, mas tinham uma redução marcada da alodínia induzida por um modelo experimental de dor neuropática. Pelo contrário, murganhos com delecção do gene de uma subunidade reguladora da PKA mantinham as alterações características da dor neuropática, também não apresentavam alterações da resposta a estímulos nóxicos agudos, mas tinham uma diminuição da resposta a estímulos nociceptivos inflamatórios. O aumento da concentração intracelular de Ca2+ pode ainda levar à ativação de alguns genes, através de várias vias de sinalização intracelular. É o caso dos genes designados por immediate-early genes, como o c-fos, o qual tem sido muito utilizado como marcador da activação dos neurónios da medula espinhal pelos estímulos nóxicos. Note-se, a este propósito, que substâncias analgésicas, entre as quais os opióides e os analgésicos antiinflamatórios não esteróides, inibem a indução do c-fos pelos estímulos nóxicos. Embora a função do c-fos nos neurónios nociceptivos não esteja completamente esclarecida, existem estudos que o implicam na activação de outros genes, nomeadamente do gene da dinorfina. A redução da actividade nos interneurónios inibitórios também pode contribuir para a sensibilizaçãocentral, nomeadamente no caso de lesões neuropáticas. A secção de nervos periféricos provoca uma diminuição do número de células imunorreactivas ao GABA e dos níveis de GABA no corno dorsal da medula espinhal, e uma redução dos receptores GABA. Do mesmo modo, lesões isquémicas da medula espinhal causam uma diminuição do número de interneuróniosGABAérgicos e sensibilização dos neurónios WDR, a qual é revertida pelo baclofeno, um agonista dos receptores GABAB. Esta observação indicia a existência de uma actividade tónica inibitória exercida pelos interneurónios GABAérgicos da medula espinhal em condições fisiológicas. Curiosamente, no caso da dor crónica de origem inflamatória observou-se um aumento dos níveis de GABA, bem como da enzima responsável pela síntese deste neurotransmissor, pelo que neste caso a acção do GABA tenderá a contrariar o aparecimento da sensibilização central. Existem vários trabalhos que demonstram fenómenos de sensibilização em estruturas supraespinhais, nomeadamente no tálamo e no córtex. Verificou-se, por exemplo, que os neurónios do complexo ventrobasal do tálamo, que desempenham um papel fundamental no processamento do componente discriminativossensorial da dor , exibem alterações da sua actividade espontânea e das respostas à estimulação periférica, tanto em modelos de dor inflamatória crónica como em modelos de dor neuropática. Também aqui, os receptores NMDA desempenham um papel fundamental na sensibilização dos neurónios talâmicos em situações experimentais de dor crónica. Alterações das respostas neuronais e reorganização somatotópica dos campos receptivos foram igualmente encontradas no córtex somatossensitivo primário utilizando os mesmos modelos experimentais. Além disso, a estimulação térmica nociceptiva repetida da pele provoca um aumento da resposta de neurónios WDR no córtex somatossensitivo primário (SI), um fenómeno semelhante ao windup observado na medula espinhal. A sensibilização de neurónios que participam no componente afectivocognitivo da dor tem sido menos estudada. No entanto, foi igualmente encontrado um aumento da actividade espontânea e das respostas dos neurónios do núcleo parabraquial em animais monoartríticos. Tal como na periferia a sensibilização conduz à activação de nociceptores silenciosos, a sensibilização central poderá envolver a activação de sinapses silenciosas, isto é, sinapses que habitualmente não transmitem os impulsos nervosos mas que, por mecanismos vários, tornam-se activas em situações de hiperexcitabilidade neuronal. Este tipo de sinapses foi já descrito na medula espinhal. 5- Caracterizar o tratamento farmacológico da dor neuropática com ênfase nos anticonvulsivantes Hoje, a melhor abordagem clínica do tratamento farmacológico incorpora observação empírica e determinação dos mecanismos potenciais da lesão neuropática ("alvos"), seguidas da utilização dos melhores conhecimentos de farmacologia disponíveis para se estabelecer a correspondência entre esses mecanismos patológicos potenciais e os mecanismos de ação dos fármacos escolhidos. Embora a monoterapia seja a melhor abordagem, na prática geralmente se recorre à polifarmácia racional. A polifarmácia racional requer consideração detalhada dos mecanismos básicos da dor e uma combinação adequada de fármacos que atuam em diferentes locais do neuroeixo para interferir e nos mecanismos detectados e modulá-los. Duas classes principais de fármacos devem ser consideradas: agentes profiláticos (utilizados regularmente) para controlar a dor e outros sintomas; e fármacos supressores (usados quando necessários) para aliviar os episódios de agravamento da dor ou outros sintomas. Em geral, os fármacos profiláticos são selecionados com base na apresentação clínica do paciente. Por exemplo, se o paciente estiver profundamente deprimido ou ansioso e tiver insônia, o médico pode optar por um antidepressivo tricíclico com propriedades analgésicas, sedativas e ansiolíticas significativas. Antidepressivos A. ANTIDEPRESSIVOS TRICICLICO Os fármacos classificados no grupo dos antidepressivos tradicionais podem ser utilizados no tratamento da dor neuropática porque também atuam como analgésicos. Entretanto, é importante salientar que existem poucas experiências randomizadas e controladas que tenham avaliado a eficácia desses fármacos no alívio da dor neuropática ou na redução dos sintomas específicos desta síndrome. O Quadro 10.5 relaciona os fármacos que produziram efeitos benéficos em experiências clínicas que avaliaram sintomas específicos da dor neuropática, enquanto o Quadro 10.6 descreve as posologias de alguns desses fármacos. Os antidepressivos tricíclicos são opções aceitas distúrbios neuropáticos e uma meranálise dos estudos clínicos randomizados sugeriu que eles são eficazes no tratamento da dor neuropática. Um desses estudos mostrou que a eficácia desses fármacos no alívio da dor neuropática ou na redução dos sintomas específicos desta síndrome. O Quadro 10.5 relaciona os fármacos que produziram efeitos benéficos em experiências clínicas que avaliaram sintomas específicos da dor neuropática, enquanto o Quadro 10.6 descreve as posologias de alguns desses fármacos. Os antidepressivos tricíclicos são opções aceitas para os distúrbios neuropáticos e uma meranálise dos escudos clínicos randomizados sugeriu que eles são eficazes no tratamento da dor neuropática. Um desses escudos mostrou que 30 de 100 pacientes com dor neuropática tratados com antidepressivos conseguiram alívio de pelo menos 50%. Os efeitos anti-hiperalgésicos dos antidepressivos tricíclicos podem estar relacionados com a ativação das vias inibitórias descendentes noradrenérgicas e com o bloqueio parcial dos canais de sódio, mecanismos que não dependem dos seus efeitos antidepressivos. Além disso, o efeito de bloqueio do canal de sódio pode ser o mecanismo mais eficaz dessa classe farmacológica (que tecnicamente inclui a carbamazepina). Quando a dor é independente de estímulos, os mecanismos centrais podem ser razoavelmente controlados, porque esses mecanismos causam sensibilização das fibras aferentes somarosensirivas. Os antidepressivos tricíclicos que causam inibição equilibrada da recaptação da seroronina e da norepinefrina (p. ex., imipramina, amirriprilina) podem ser mais eficazes na polineuroparia dolorosa do que os fármacos que têm seletividade relativa para a recaptação da norepinefrina neurotransmissor (p. ex. , desipramina). O médico responsável deve dispor de um repertório de vários fármacos tricíclicos/rerracíclicos, porque determinados agentes produzem efeitos co laterais específicos associados e, em alguns casos, podem ser utilizados a favor do paciente. Por exemplo, um paciente com dor moderada, depressão , sobrepeso e hipersonol ência com lentidão psicomorora pode utilizar um antidepressivo tricíclico com mais seletividade noradrenérgica (p. ex., desipramina) , que pode ter ação ativadora e causar alguma anorexia, em vez de usa r um agente sedativo associado ao aumento de peso. B- INIBIDORES SELETIVOS DA RECAPTAÇÃO DE SEROTONINA A eficácia dos inibidores seletivos da recaptação de a seroronina na dor neuropática não é convincente. Alguns antidepressivos mais modernos como a venlafaxina e a mirrazapina produzem alguns efeitos promissores na prática clinica e rêm a vantagem de gerar um p er fil d e efeitos co laterais e tóxicos diferentes e mais benignos. Anticonvulsivantes Os agentes anticonvulsivantes estão entre os fármacos mais bem estudados na dor neuropática e há evidências substanciais em favor da sua eficácia, tendo como base metanálises e experiências clínicas randomizadas. Muitos desses anticonvulsivantes mais modernos bloqueiam os canais de sódio e de cálcio e diminuem a excitabilidade neuronal. A. GABAPENTINA Na verdade, a gabapentina, amplamente utilizada no tratamento da dor neuropática, chamou a atenção da comunidade científica quando foi publicado um relato informal sugerindo sua eficácia no tratamento da SCDR. O mecanismo de ação da gabapentina (e da pregabalina , recém-lançada)foi atribuído inicialmente à ativação dos sistemas GABA endógenos que atuam na modulação da dor (embora não seja um agonista GABA). Evidências recentes sugerem que esse pode não ser o mecanismo principal de ação e a teoria moderna enfatiza os "sinaprossomos" da présinapse. Além disso, a gabapentina pode produzir algum efeito como supressora dos aminoácidos excitatórios como o glutamaro. Em várias experiências clínicas randomizadas de grande porte, a gabapentina e a pregabalina tiveram eficácia significativa comprovada na neuralgia pós-herpética e na neuropatia periférica diabética. B. ESTABILIZADORES DA MEMBRANA A fenitoína e os agentes antiepilépticos estabilizadores da membrana (bloqueadores do canal de sódio) podem ter alguma utilidade na dor neuropática, principalmente nos casos em que a atividade ectópica pode contribuir para a geração de dor. A carbamazepina é um estabilizador da membrana e desempenha um papel tradicional e talvez clinicamente importante no tratamento da dor neuropática, especialmente da neuralgia do trigêmeo. A oxicarbazepina pode ser tão eficaz quanto a carbamazepina e causa menos efeitos co laterais, de acordo com os resultados de uma experiência open-label (sem aurorização oficial) com pacientes portadores de neuropatia diabética dolorosa , mas isso não foi confirmado no estudo-piloto. C. OUTROS ANTICONVULSIVANTES Alguns outros anticonvu lsivantes, como o levetiracetam, o topiramato , a lamotrigina e a zonisamida, contam com ev idências razoavelmente convincentes que sugerem que eles podem ser úteis no tratamento da dor neuropática, razão pela qual estão sendo realizados vários estudos-piloto de grande porte hoje . Agentes antiinflamatórios Os AlNE, os corticosteróides e os varredores de radicais livres são utilizados esporadicame nte em alguns distúrbios dolorosos neuropáticos, sobret ud o quando há inflamação sign ifi cativa associada. Na dor neuropática, pode haver interações entre os sistemas imunológico e neurológico, o que justifica a utilização de fármacos imunossupressores. Estudos realizados em animais com cidosporina, talidomida e merotrexato reforçam essa hipótese. Os AlNE inibem a ciclooxigenase (COX) e impedem a síntese das prostaglandinas, que induzem inflamação e talvez hiperalgesia periférica. Além da ação antiinflamatória periférica desses fármacos, outro mecanismo sugerid o é o bloqueio do processamento nociceptivo esp inhal. Entretanto, em várias experi ências clínicas com dor neuropática, os AlNE produziram res ult ados variáveis. O cetoprofeno produz efeitos detectáveis na síntese das bradicininas, além do efeito clássico de bloqueio das prostaglandinas. Nenhum estudo clínico randomizado avaliou os inibidores da COX-2. Os corticosteróides podem ser particularmente úteis nas fases iniciais/agudas de alguns tipos de dor neuropática (como as radiculopatias) , nas quais há inflamação signifi cativa. Os corticosteróid es podem ser indicados por períodos curtos, mas os tratamentos mais prolongados têm relação custo-benefício questionável e várias contra-indicações. Os varredores de radicais livres (i. e., dimetilsulfóxido [DMSO] e vitamina C; ver adiante) podem reduzir a concentração das espécies reativas do oxigênio , que atuam comprovadamente como mediadores dos processos inflam atórios e podem estar envolvidos espec ificamente na inflamação neurogênica. Opióides Os opióides podem ser úteis , sobretudo nas fases agudas, mas sua utilização no tratamento da dor crônica ainda é relativamente controversa. Vários escudos com opióides utilizados na dor neuropática sugerem sua eficácia. Em geral, a dor neuropática parece ser menos sensível aos opióides do que a dor nociceptiva; por esta razão, as doses administradas aos pacientes que têm neuropática devem ser maiores, aumentando o risco de ocorrerem efeitos colaterais. Para evitar essas compl icações, deve-se empregar uma estratégia que utilize os agentes não-opió id es na profilaxia e reserve os opióides para controlar as crises de exacerbação. O tratamento com opióides pode estar associado à melhora funcional e, por esta razão, comumente se utiliza um protoco lo de opióide agudo ou subagudo para permitir que o paciente comece a progredir co m as terapias não-farmaco lógicas. Antagonistas dos receptores NMDA A. CETAMINA E AMANTADINA Os antagonistas de receptores NMDA (p. ex., MK-801, cetamina, amantadina) foram estudados no tratamento da abstinência, da sensibilização e da tolerância aos opióides, mas se mostraram muito tóxicos nas doses eficazes utilizadas regularmente. A cetamina foi avaliada em um estudo de pequeno porte com pacientes portadores de câncer e dor neuropática refratária à morfina e ainda há interesse signifi cativo pelos proroco los hosp italares de doses altas d e cetamina para tratar a SCDR, assim como pelos protocolos ambulatoriais ou hospitalares que empregam do ses menores. Hoje, também estão sendo avaliados vários sistemas de liberação desse fármaco. A amantadina foi aval iada em pacientes com câncer e dor neuropática, assim como em pacientes com dor neuropática crônica, com alguns resultados favoráveis. B- DEXTROMETORFANO O dextrometorfano puro na formulação de comprimidos pode ser mais bem tolerado do que alguns outros antagonistas de receptores NMDA e pode ampliar o efeiro d os outros fármacos, principalmente dos opióides. Um estudo realizado com raros mostrou que a administração oral simultânea do sulfaro de morfina e do dextrometorfano pode evitar o d esenvolvimento de to lerância aos efeitos antinociceptivos do sulfato de morfina . Entretanro, o dextrometorfano é ineficaz em doses baixas, é tóxico nas doses suficientes para mostrar eficácia e, por enquanto, foi ineficaz quando utilizado isoladamente. Tratamentos tópicos Os tratamentos tópicos para dor neuropática diferem das preparações cransdérmicas (p. ex., adesivo de fentanila, clonidina transdérmica). Os sistemas tópicos liberam o fármaco localme nte na pele e nos tecidos moles afetados. Entre os fármacos tópicos utilizados no tratamento da dor neuropática estão o adesivo de lidocaína a 5%, o creme com mistura eu técica de anestésicos locai s (EMLA), a capsaicina e o DMSO. A lido caína cransdérmica é administrada em forma de um adesivo homogêneo, que contém lidocaína a 5%. Essa preparação foi aprovada pelo FDA como tratamento para neuralgia pós-herpécica e seu uso em outros distúrbios dolorosos neuropáticos está aumentando. O adesivo de lidocaína pode ser útil em alguns distúrbios dolorosos neuropáticos focais ou bem local izados, inclusive n a alodinia. A capsaicina é um composto vanilóide presente na pimenta malagueta que causa ativação e depleção das terminações nervosas nocicepcivas porque permite a entrada li vre dos cátions. No local da aplicação, a capsaicina geralmente provoca sensação de queimação. Em um escudo clínico randomizado, a capsaicina cópica foi eficaz no tratamento de neuralgia pósherpética. Contudo, em nossa experiência, a capsaicin a cópica mostrou-se intoleravelmente dolorosa nas primeiras aplicações, sujava as roupas e dificultava a adesão ao tratamento. O DMSO é um varredor de radicais livres. Um estudo de excelente qualidade analisado em uma revisão sistemática, o DMSO (creme a 50%, aplicado por 2 meses) não produziu redução significativa da dor em pacientes com SCDR, em comparação com um placebo. 6- Elucidar a importância da equipe multidisciplinar no tratamento não farmacológico das dores neuropáticas olhar depois no current 7- Descrever a síndrome complexa da dor regional e seus aspectos: epidemiológico, etiológico(dois tipos), fisiopatologia, maniifestações clínicas e tratamento. CONCEITOS E ASPECTOS HISTÓRICOS Até pouco tempo a SDCR era também denominada de causalgia. Este termo foi utilizado pela primeira vez por Mitchell em 1864 , embora a primeira descrição de causalgia tenha sido realizada em 1862 por Paget . Wolff, em 1877, descreveu, pela primeira vez, uma entidade crônica dolorosa,sem causa neurológica,acompanhada por alterações vasomotoras, até então inominada. Muitas terminologias foram utilizadas para designá-la, como causalgia menor, desordem vasomotora pós-traumática, atrofia de Sudeck e síndrome ombro-mão. Em 1953, Bonica sugeriu que todas as patologias dolorosas associadas a fenômenos vasomotores, habitualmente precedidas por trauma, devessem ser denominadas de “distrofia simpático reflexa” , na qual as seguintes características deveriam estar presentes: dor, alterações vasomotoras da pele, perda de função do membro e alterações tróficas em vários estágios. Contudo, as controvérsias sobre o diagnóstico continuaram a suscitar dúvidas. Em 1993, a Associação Internacional para o Estudo da Dor (AIED) elaborou consenso onde foram definidos os critérios para o diagnóstico desta doença, publicados em 1994 5 . Foi adotada a terminologia “Síndrome Dolorosa Complexa Regional” (SDCR) como termo único, para designar a condição dolorosa regional associada às alterações sensoriais decorrentes de um evento nóxico. Nesta, após o trauma, a dor é o sintoma principal, podendo estar associado à coloração anormal da pele,mudanças de temperatura do membro, atividade sudomotora anormal ou edema. Distúrbios motores como tremores, distonias ou fraqueza muscular podem ocorrer. No consenso, foram definidos dois tipos de SDCR: tipo I, anteriormente chamada de “distrofia simpático reflexa” e tipo II, outrora denominada de “causalgia”. ASDCR tipo II diferencia-se da do tipo I pela existência de uma lesão nervosa real,em que a dor não se limita ao território de inervação do nervo lesado. Embora o consenso tenha sido elaborado para o seu diagnóstico, muitas questões foram levantadas sobre como e quantos critérios deveriam ser considerados para que houvesse sua confirmação. Também se observou que outras patologias bem definidas como, por exemplo, a neuropatia diabética, poderiam preencher tais critérios e serem erroneamente tratadas. Após análise e revisão foram propostos os seguintes critérios para o diagnóstico: (a) a presença de lesão inicial pode ser desconsiderada; (b) os sinais e os sintomas devem ser divididos em grupos distintos; (c) o paciente deve ter pelo menos dois dos seguintes sintomas:sensoriais (hiperestesia), vasomotor (alteração da temperatura, coloração ou ambos), sudomotor/balanço líquido (edema, sudorese ou ambos) e motor (diminuição da motricidade, fraqueza, tremores, amputação funcional do membro) ou todos, (d) o paciente deve apresentar ao menos dois dos seguintes sinais: vasomotor, sudomotor/balanço líquido e motor. Assim, a partir destes novos critérios, acredita-se que a avaliação, diagnóstico e seguimento dos pacientes possam ser realizados com melhor propriedade. O termo “Dor Simpaticamente Mantida” (DSM) foi utilizado em outros momentos como sinônimo de SDCR, embora incorretamente. Este termo designa dor mantida pelos eferentes simpáticos,ou por catecolaminas circulantes e algumas hipóteses são aventadas para justificar este fenômeno. Entre elas, uma das mais aceitas é o aumento do número de adrenoceptores nos tecidos periféricos, sensíveis à norepinefrina das terminações simpáticas, que através de sua atuação sobre os receptores, causa a dor. A lesão de nervo periférico proporciona alterações plásticas tanto do aferente primário como nos neurônios simpáticos pós-ganglionares na dependência do tipo de lesão ser total ou parcial. Esta plasticidade neuronal caracteriza-se por alterações degenerativas, regenerativas e reorganização que culminam com ligações bioquímicas entre os neurônios aferentes primários e simpáticos pós-ganglionares, além de ligações colaterais no gânglio da raiz dorsal por parte dos neurônios não lesados. Estas ligações são responsáveis pela ativação desses aferentes primários pelo sistema simpático, onde o provável mediador é a norepinefrina, embora outros mediadores não possam ser excluídos. Também ocorre a expressão ou aumento dos receptores adrenérgicos, tipo 2, nos aferentes primários. Existem ainda estudos baseados na hipótese da desnervação,em que a lesão de fibras eferentes simpáticas causa aumento da expressão do fator de crescimento do nervo ou de outros fatores neurotróficos,ocasionando,em última instância, o aumento da transmissão da dor por vários mecanismos. Trabalhos que corroboram esta hipótese mostram que, em humanos e cobaias, há baixa concentração de norepinefrina ou seu metabólito no plasma do membro afetado em relação ao sadio. Esta hipótese, também explica a vasoconstrição do membro afetado com base no aumento da resposta vasoconstritora a norepinefrina, pela elevada resposta das células musculares dos vasos à desnervação 16. A DSM deve ser entendida como um mecanismo de dor e a SDCR como um diagnóstico clínico. É importante lembrar que, embora em alguns casos haja diminuição da dor após bloqueio simpático, nem sempre a SDCR está acompanhada pela DSM. Não se pode estabelecer a correlação entre DSM e sinais e sintomas disautonômicos. Teoricamente, os pacientes podem ter componentes de DSM e dor não simpático-dependente. EPIDEMIOLOGIA Não está bem definida a epidemiologia da SDCR. Todavia, estudo realizado por Veldman e col. mostra média de idade de 41 anos com predomínio de mulheres numa relação de 3:1. Allen e col. 20 confirmaram que a média de idade é de 41,8 anos e a relação entre mulheres e homens é de 2,3:1. Em crianças há um predomínio do sexo feminino numa relação de 3:1, com idade típica de início da sintomatologia entre 9 e 15 anos de idade 21-23. Freqüentemente um único membro é acometido, em proporções iguais, entre superiores e inferiores. Poucos estudos mostram prevalência dos membros superiores ou dos inferiores, havendo uma incidência maior do lado direito, talvez por serem destros em relação ao esquerdo e o acometimento bilateral ocorre entre 11 e 16 % dos casos .Em crianças,os membros inferiores são os mais afetados. Cerca de 65% dos casos estão relacionados a trauma, normalmente por fratura, 19% no período pós-operatório, 2% após processos inflamatórios e 4% após outros fatores desencadeantes,como punção venosa .Em crianças,estudos mostraram que pequenos traumas e estresse são os principais fatores desencadeantes. Não há evidências de que existam fatores de risco que predisponham o desenvolvimento à SDCR,embora a imobilização possa atuar como fator de lesão quando permanece por período prolongado. Alguns trabalhos estudaram fatores genéticos relacionados à SDCR, que estariam envolvidos em uma predisposição para o desenvolvimento da doença. Esta predisposição pode ter relação com o sistema de antígenos leucocitários humanos. Muitas pesquisas não mostraram alterações psicológicas ou psiquiátricas nos pacientes com SDCR. Observa-se que a incidência de doenças como distúrbios de personalidade ou depressão não difere entre os pacientes com dor crônica de outra etiologia e os com SDCR. Contudo, nos casos pediátricos, há indícios de fatores psicológicos como fenômeno desencadeante da síndrome. FISIOPATOLOGIA A fisiopatologia ainda é incerta e pouco progresso tem sido observado no entendimento dos processos que ocorrem na doença. Há autores que postulam que o fenômeno inicial seja o processo inflamatório desproporcional desencadeado após a lesão tecidual. Os componentes da resposta inflamatória como o edema, calor, rubor, eritema e a perda da função se fazem presentes em seguida à lesão, resultantes da liberação de mediadores químicos no local. A sensibilização dos nociceptores no local da lesão se estabelece por causa de mediadores liberados como bradicinina, leucotrienos, serotonina, histamina e prostaglandinas. Há evidências, também, de que radicais livres de oxigênio podem estar envolvidos com a patogênese da SDCR, embora novos estudos tenham que ser realizados para que esta hipótese seja comprovada e validada. Como a resposta inflamatória é local, a propagação dos sinais e sintomas para áreas distantes da lesão sugere o envolvimento do sistema nervoso central e periférico. Aceita-se que mudanças adaptativas ocorram no sistema nervoso central após a lesão, sejam elas agudasou crônicas. Desta forma, a lesão periférica de um nervo ou outro tecido, causa alterações neuroplásticas no cérebro,podendo ocorrer fenômeno semelhante na medula espinhal MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS De acordo com os critérios do consenso da AIED, os sinais e sintomas localizam-se preferencialmente na extremidade do membro acometido, podendo, entretanto, estabelecer-se em outros locais do corpo que não um membro. Irradiam-se para o restante do mesmo membro, eventualmente acometendo o contralateral . A dor caracteriza-se por ser do tipo em queimação, embora, alguns pacientes e autores a descrevem como sendo profunda, lancinante e quente. Pode ser desencadeada por contato físico, mudanças de temperatura e estresse emocional . As alterações vasomotoras, quando presentes, manifestam-se como diferenças de temperatura e coloração de um membro, em relação ao seu contralateral. Como desordens sudomotoras, a sudorese ou anidrose estão presentes na região acometida. O edema varia de intensidade, desde discreto até intenso e as alterações tróficas da pele e fâneros podem ou não estar presentes. Os distúrbios de motricidade presentes na SDCR caracterizam-se por fraqueza, distonias, espasmos musculares, tremores, aumento do tono e dificuldade de movimentação do membro. A amputação fisiológica do membro é possível ocorrer, sem que haja alterações nervosas associadas. Dor miofascial se estabelece por desuso do membro acometido e/ou por excesso de uso do membro sadio contralateral. Em alguns pacientes a dor miofascial mostra-se mais importante que a própria SDCR. Ocorre na região proximal dos membros, onde durante avaliação clínica podem ser identificados pontos dolorosos, denominados pontos de gatilho. As alterações psiquiátricas são pouco freqüentes, mas quando presentes, os distúrbios afetivos são os mais comuns.Entre as mulheres,os quadros de depressão são mais freqüentes, enquanto que entre os homens são os quadros de ansiedade. DIAGNÓSTICO LABORATORIAL Embora o diagnóstico seja clínico (lesões teciduais, histórico de imobilizações ou inflamações, diagnóstico diferencial-exclusão, edema), podem ser solicitados exames subsidiários que auxiliam tanto na confirmação como na sua exclusão. Exame radiológico simples pode identificar diminuição da calcificação óssea,embora essa alteração não seja específica para SDCR , pois a desmineralização óssea pode ser causada pelo desuso do membro. A eletroneuromiografia indica lesão de nervo nos casos de SDCR Tipo II; porém, não se mostra útil no controle evolutivo da doença. Outros exames laboratoriais de imagem podem ser realizados para que o componente autonômico possa ser identificado. A termografia determina a diferença de temperatura entre o membro afetado e o normal e a pletismografia evidencia as diferenças de perfusão entre os membros. Provas terapêuticas são úteis para auxiliar no diagnóstico pela resposta a uma determinada substância. Diversos fármacos são utilizados, por diferentes vias de administração, como a guanetidina, a fentolamina e a lidocaína entre outros, por variadas técnicas tais como, infusões venosas simples e bloqueios regionais. Estes testes são Utilizados para se Comprovar se o Sistema Nervoso Simpático está envolvido na gênese da dor e nos sinais e sintomas da SDCR; portanto, auxiliam na elaboração do diagnóstico como também orientam a terapêutica adequada e efetiva. Dessaformasãoindicados:a)bloqueiosimpáticocomanestésico local, como bloqueio do gânglio estrelado para membro superior ou bloqueio da cadeia simpático lombar paravertebral para membro inferior. A efetividade do bloqueio identifica-se com a diminuição da dor e o aumento da temperaturadomembroemrelaçãoaocontralateral.Épossívelobter-se resultado falso positivo explicado pela não observação cuidadosa dos sinais inerentes ao bloqueio simpático e pelobloqueiodosaferentesnociceptivos e o resultado negativo pela ausência de DSM ou por erro técnico na realização do bloqueio; b) teste da guanetidina, através de bloqueio venoso regional, pela resposta de depleção das reservas de norepinefrina das fibras simpáticas pós-ganglionares. É positivo se após a injeção ocorrer dor, sensação de calor ou pressão na mesma região onde é referida a dor da SDCR e alívio da dor após desgarroteamento do membro; c) teste da fentolamina, antagonista -adrenérgico, realizado através de infusão venosa simples e positivo se ocorrer diminuição da dor durante a infusão do medicamento. Outros testes mais específicos para avaliação da DSM na SDCR podem ser aplicados, embora sejam mais complexos e onerosos, como o Quantitative Sudomotor Axon Reflex Test (QSART), que identifica a resposta simpática da pele apósaaplicaçãodenorepinefrinaporiontoforese.Épositivo quando há uma diminuição da latência na produção de calor e acredita-se que haja aumento do reflexo somatossimpáticodevidoaumareduçãodolimiardeativaçãodasfibrassimpáticas 43. RestingSweatOutput(RSO),testequemedeadiferença de temperatura dos membros, em regiões padronizados, sem a aplicação de nenhuma substância 43. Thermoregulatory Sweat Test (TST) é um teste que avalia a via termorreguladora, sendo complementar ao QSART, pois pode fazer a diferenciação entre lesões pré e pós-ganglionares, sendo mais complexo que os anteriores. Este teste avalia a respostaglobalesegmentardocorpo,atravésdatemperatura e da sudorese frente a alterações de temperatura de uma salaespecialmentepreparadaparaoexame.Deacordocom as áreas de anidrose, hipoidrose ou hiperidrose podem ser diferenciadas as lesões. TRATAMENTO A SDCR por suas características peculiares mostra-se de tratamento difícil e pouco eficaz. Embora muitos trabalhos tenham sido realizados com propostas terapêuticas 44, poucos são confiáveis para que possam ser aplicados na clínica. De qualquer forma, o mais importante para que haja boa resposta é o tratamento ser instituído em fase precoce da doença 45,46, com o objetivo primário de aliviar a dor. Por ser uma doença complexa, não existe um protocolo padrão para o tratamento da SDCR, devido às inúmeras propostas terapêuticas e às suas variadas respostas. Torna-se necessário, em muitos casos, realizar associações de técnicas para um bom resultado. Acredita-se,atualmente, que o acompanhamento de paciente deva ser multidisciplinar e multiprofissional devido aos vários componentes envolvidos na doença. Logo, a avaliação psicológica e tratamento de seus distúrbios, quando presentes,garantem a melhor adesão do paciente ao tratamento instituído. A fisioterapia, antes utilizada em fases mais tardias, tem seu espaço e importância aumentados na atualidade. A Eletroestimulação transcutânea (TENS) está sendo indicada com mais frequência pelo seu efeito analgésico 47 e técnicas de dessensibilização estão sendo propostas aos pacientes com alodínia 48. Contudo, os procedimentos fisioterápicos para a reabilitação do membro, quanto à movimentação, ainda são os mais requisitados. As terapêuticas farmacológicas são muitas, com variadas técnicas de aplicação. Classicamente, o bloqueio simpático é o mais utilizado 49,50; todavia, alguns estudos contestam a eficácia destas técnicas 51-53, especialmente se não for confirmado o envolvimento do sistema nervoso autonômico. Entre as várias técnicas de bloqueio simpático, citam-se: bloqueio ganglionar simpático, infusão venosa de fentolamina ou lidocaína, bloqueio venoso regional com guanetidina, clonidina, dexmedetomidina, reserpina, bretílio ou corticóides 54-56. Aguanetidinaéofármacomaisutilizadonosbloqueiosvenosos regionais. Ela atua depletando as reservas de norepinefrinaebloqueandosuarecaptação,alémdaatividadeanticolinérgica e serotoninérgica 57. Contudo, são vários os trabalhos que contestam sua efetividade no tratamento da SDCR e/ou na DSM 51-53,58. O bretílio, ainda não comercializado no Brasil, possui atividade semelhante à da guanetidina, depletando as reservas de noradrenalina. A reserpina atua do mesmo modo; entretanto, sem boa resposta 59,60. A fentolamina é um fármaco com ação antagonista á1-adrenérgica, serotoninérgica, histaminérgica,colinérgica e com propriedades de anestésico local 61,62, ainda sem estudos confiáveis sobresuaefetividade 63.Aclonidina,drogaagonistaá2-adrenérgica, possui boa resposta nos casos de SDCR refratárias ao tratamento 64,65, embora poucos trabalhos mostrem sua eficácia nos bloqueios regionais venosos 66. Há relatos de que a clonidina de uso tópico diminua a alodínia 67,68. A dexmedetomidina, novo medicamento 2-agonista, lançado recentemente para uso em anestesia e em Unidade de Terapia Intensiva, mais potente que a clonidina, traz novas perspectivas para o tratamento da dor neuropática nos mesmos moldes da clonidina, embora ainda haja poucos estudos sobre o seu uso em anestesia e nenhum até o momento para o tratamento da SDCR. Os pacientes não apresentam boa resposta ao uso de antidepressivo tricíclico, beneficiando-se apenas do seu efeito sobre a qualidade do sono. A adenosina tem sido recomendada no tratamento de dor neuropática. Estudos em cobaias e em humanos mostraram bons resultados no controle deste tipo de dor, apesar de ainda não existirem trabalhos encobertos expressivos 69. O uso de calcitonina não mostrou melhora tanto por via intradérmica como pela via intranasal 70. A infusão venosa com anestésico local, como a lidocaína, produz melhora da sintomatologia nos casos de SDCR, mas há controvérsias sobre esta resposta 71-73. O uso de mexiletina por via oral é pouco freqüente havendo, contudo, relatos deefetividadenotratamentodedorneuropática.Seuusoélimitado pelos efeitos colaterais que os pacientes apresentam, sendo importante lembrar ser possível que os efeitos colaterais ocorram em concentrações plasmáticas menores que as necessárias para analgesia da dor neuropática 74. Os opióides têm seus defensores 35,76, os quais atribuem bons resultados a seu uso, e seus críticos 75 que negam sua eficácia no tratamento de SDCR. O anticonvulsivante gabapentina é um medicamento recente sem pesquisas confiáveis, embora diversos autores preconizem seu uso. Alguns trabalhos já mostraram sua boa atuação sobre a SDCR 7 . O bloqueio ganglionar simpático promove alívio da sintomatologia, contudo, sem mecanismo de ação claro. Acredita-se que atuaria sobre as fibras de inervação somática e não simpática 79. Osprocedimentoscirúrgicoscomoasimpatectomiaquímica ou cirúrgica têm respostas variadas, sendo indicados naqueles pacientes que respondem bem a outros bloqueios não ablativos, embora a reincidência da dor ocorra em muitos casos. CONCLUSÕES ASDCR continua sendo uma doenças em boas perspectivas de tratamento pelo seu insuficiente entendimento. Diversas são as linhas de pesquisa nas quais todos chegam a resultados nem sempre esperados e, quando esperados, não são compatíveis com a realidade. Continuam, pois, os tratamentos empíricos e relatos de casos com as mais diversas propostas de terapêutica, em que se objetiva de alguma forma tratá-la ou, pelo menos, diminuí-la. ASDCR traz perspectivas de que novos trabalhos sejam realizados para que seu processo fisiopatológico seja entendido e tratamentos mais efetivos e seguros sejam instituídos. .
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