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1. Patogênese do DM2 • Introdução → Etiopatogenia envolve, além do componente genético, a obesidade, inatividade física e o envelhecimento. DM2 parece ser poligênico, com alterações que favorecem a resistência à insulina (RI) e disfunção das céls B. →Hiperglicemia crônica agrava RI e disfunção secretória de insulina, caracterizando glicotoxicidade. Conceito de lipotoxicidade é usado para explicar a patogênese do DM2, já que elevação dos níveis de ácidos graxos livres circulantes e o aumento intracelular de lipídios induzem alterações na secreção e ação insulínicas. →Obesidade é causa mais comum de RI. RI e DM2 estão associados à inflamação subclínica, manifestada por elevação dos níveis circulantes de marcadores inflamatórios. Citocinas pró-inflamatórias e/ou reagentes de fase aguda induzem Ri e alterações de secreção deste hormônio. Origem da associação entre inflamação e DM2 não está bem estabelecida, mas pode envolver TG, por meio da microbiota, o estresse oxidativo e de retículo endoplasmático, como também o tecido adiposo, com infiltração de céls imunes que caracterizam a obesidade. - Mecanismos de RI relacionados com a obesidade →Transporte de glicose para célula é realizado pelos transportadores GLUT. Efeito clássico da insulina é o aumento do transporte de glicose, pelo GLUT-4, em músculo e tecido adiposo. Insulina promove fusão, recrutamento e a inserção do GLUT-$ na membrana plasmática, sendo esse efeito em parte dependente da fosfatidilinositol-3-quinase (PI3q) a ativação da Akt. Essa mesma via estimulada pela insulina exerce papel fundamental na glicogênese, lipogênese e bloqueio da neoglicogênese. →RI da obesidade e DM2 é caracterizada por alterações em diversos pontos da via de transmissão do sinal da insulina. Em geral, RI ocorrerá por meio da redução da concentração e da atividade quinase do receptor, da concentração e da fosforilação do IRS-1 e IRS-2, da atividade da PI3q, da atividade da Akt e do fator de transcrição FoxO1, além da redução da translocação dos GLUT e da atividade das enzimas intracelulares. →Inicialmente, ácidos graxos livres foram implicados nesse processo, mas nos últimos anos, vários mecanismos regulatórios foram descritos, bem como o papel que desempenham no desenvolvimento da RI. Inflamação crônica subclínica, estresse do retículo endoplasmático e alterações na microbiota intestinal são alguns desses mecanismos. - Inflamação crônica subclínica (ICS) no tecido adiposo →Adipócito hipertrofiado do obeso produz e libera adipocitocinas (resistina, TNF-alfa, IL-6 etc.) que contribui para instalação da ICS. Papel mais relevante é das células imunes infiltradas no tecido adiposo do obeso induzindo ICS. →Mecanismo que conecta obesidade ao fenômeno inflamatório é o acúmulo de macrófagos tanto no tecido adiposo quanto em outros tecidos. Essas células imunes são as principais contribuintes para ICS associada à obesidade. Além do aumento no nº de macrófagos no tecido adiposo do obeso, essas células sofrem mudança no estado de polarização para fenótipo pró-inflamatório e são denominadas M1 ou macrófago classicamente ativado. Caracterizadas pela expressão elevada de TNF- alfa e IL-6 que podem atuar de maneira parácrina, inibindo ação da insulina em céls-alvo como hepatócitos, miócitos e adipócitos ou entrar na circulação sistêmica e causar RI por efeitos endócrinos. →Macrófagos M1 amplificam sinal inflamatório na obesidade e contribui para surgimento de RI. Por outro lado, macrófagos alternativamente ativados ou M2 promovem a homeostase do tecido pela liberação IL-10 e do fator de crescimento transformador beta (TGF- beta) que são antiinflamatórios. →IL-6 é produzida por M1 e, junto ao TNF-alfa, é utilizada como marcador de um ambiente pró- inflamatório associado à obesidade. Além dos macrófagos, as céls natural killers, céls T, B, mastócitos, neutrófilos e eosinófilos também desempenham papel no estado inflamatório. - Ativação de vias inflamatórias em diferentes tecidos →No DM2 há ativação de vias inflamatórias que atingem diversos tecidos e órgãos (músculo, fígado, TGI e SNC). Essa inflamação subclínica decorre de diversos estímulos, com ativação do receptor toll-like 4 (TLR-4), ativação de receptores de citocinas, estresse oxidativo, estresse de retículo endoplasmático e ativação por lipídios intracelular dessas vias que inibem sinal de insulina por mecanismos transcricionais e pós- transcricionais. →Tanto TNF-alfa quanto agonistas de receptores do sistema imune inato, principalmente TRL-4, ativam a via IKK/IkappaB/NFkappaB. Uma vez fosforiladas as IKK controlam degradação de IkapaB na via proteossômica, por regularem sua fosforilação em serinas 32 e 36. A degradação de IkapaB induz liberação do fator nuclear kappa B (NFkappaB) que migra para o núcleo celular, onde atua como fator de transcrição e aumenta expressão de genes envolvidos na resposta inflamatória (TNF-alfa, IL-1beta, IL-6, MCP-1 e as próprias IKK). →A conexão entre ativação da via e RI resulta do fato de a IKK-beta atuar como serina quinase que é capaz de promover a fosforilação em serina (sítio inibitório) de IRS, como IRS1 e 2. Essa fosforilação em serina reduz a capacidade do IRS-1 e 2 de interagir com o receptor de insulina, bloqueando a fosforilação em tirosina (sitio de ativação) e induz a degradação proteosômica do IRS-1, resultando em estados de RI. →A via JNK/Ap-1 pode ser ativada pelo TNF-alfa e pela ativação do TLR-4. JNK também é serina quinase e fosforila diretamente resíduos de serina do IRS-1, inibindo o sinal de insulina, resultando em RI. - Acúmulo de lipídios intracelulares e aminoácidos de cadeia ramificada circulantes. →ICS pode ser ativada ou mantida por outras alterações celulares na obesidade, como acúmulo de lipídios intracelulares e elevação dos níveis circulantes de alguns aminoácidos que alteram sinalização de insulina. →Excesso de consumo de lipídios pode induzir efeitos lipotóxicos contribuindo para RI. AG livres ou n]ão esterificados ativam vias intracelulares nos tecidos, por meio do diacilglicerol, ativando proteínoquinase C theta (PKCtheta) que fosforila diretamente IRS-1 em serina, inibindo sinal de insulina. AG também aumentam biossíntese intracelular de ceramidas que ativam fosfatases (PP2A) que inibiem ativação da Akt, induzindo RI. →Níveis circulantes de aminoácidos de cadeia ramificada (BCAA) como leucina, isoleucina e valina estão elevados em obesos e estão associados à predição de RI ou DM2, sendo risco 5x maior de desenvolver DM2. Mecanismos sugeridos para a associação entre BCAA e DM2 envolve ativação do complexo 1 da mTOR (mTORC-1) pela leucina. Quando ativado contribui para expansão do tecido adiposo por meio da ativação de fatores adipogênicos e lipogênicos e também resulta na ativação de S6 K-1 que leva a fosforilação do IRS-1, induzindo RI. Outro mecanismo seria a identificação de um metabolismo anormal dos BCAA em obesos, levando ao acúmulo de metabólitos tóxicos, culminando em disfunção mitocondrial e RI ou DM2. →ICS, anormalidades lipídicas e de aminoácidos são processos completamente separados e esses sistemas intercomunicam-se e podem unificar-se, induzindo estresse do retículo endoplasmático. -Estresse do retículo endoplasmático oxidativo (EREO) na resistência à insulina →Exposição crônica excessiva de nutrientes (lipídios, proteínas e carboidratos) pode causar sobrecarga às respostas adaptativas metabólicas. →RE é organela que possui papel fundamental na homeostase metabólica celular, onde ocorre biogênese, dobramento, montagem, tráfego e degradação de todas as proteínas destinadas às demais organelas a espaço extracelular. Qualidade do dobramento de proteína pe essencial para sobrevivênciae função da célula e fisiologia normal. No RE, existem diversos mecanismos de controle para assegurar transporte de proteínas corretamente dobradas, modificadas e montadas. Alteração da sua homeostase leva à acúmulo de proteínas mal dobradas ou deformadas no lúmen do RE, o que é conhecido como ERE. ERE ativa resposta conhecida como resposta proteica desdobrada (UPR- unfolded protein response). Quando o ERE é acentuado e prolongado, pode ocorrer UPR cronicamente sustentada, induzida pela hiperatividade da via PERK, causando apoptose e morte celular. →Consumo de dieta hiperlipidica, a obesidade e o DM2 sobrecarregam capacidade funciuonal do RE, induzindo estresse e vários tipos celulares (hepatócitos, adipócitos e cels do SNC). Na ativação de 1 das vias da UPR, a IRE-1alfa, na sequência, pode ativar a JNK, serina quinase que fosforila IRS-1 levando a RI. ERE e vias inflamatórias se conectam de várias maneiras. →Aumento da produção de espécies reativas de oxigênio (ROS) induzida por dieta hiperlipídica, obesidade e hiperglicemia, pode ser consequência da auto-oxidação de glicose ou ativação das NADPH oxidases. Aumento de ROS derivadas de xantina ou NADPH oxidases induzem ativação de serinas quinases JNK e IKK e contribuem para indução de RI. -Epigenética e RI →Epigenética: mudança na expressão gênica que independe de modificações na sequência primária do DNA, que envolve metilação do DNA, modificação de histonas e regulação por RNA não codificante. Parece ter papel importante na RI e obesidade. →Hipermetilação na região promotora de proteínas mitocondriais reguladoras provoca disfunção mitocondrial. Alterações em microDNA ehistonas foram descritas em obesos e DM2, destacando ação na regulação da sensibilidade à insulina. →Função da cél B pode ser facilmente alterada por modulações eigenéticas, cmo metilação de DNA e regulação por microRNA, contribuindo para a redução da massa de céls B e de secreção de insulina. -Microbiota e resistência à insulina →Na obesidade e DM2, há mudanças drásticas na composição da microbiota intestinal em todos os níveis, incluindo filos, gêneros e espécies. Quase todas as bactérias presentes no intestino e nas fezes pertencem a dois principais filos bacterianos (bacterioidetes – maioria gram negativa – e Firmicutes – maioria gram + – com predominância do 1º). Em pessoas com sobrepeso ou obesidade ocorre redução em nº e diversidade de Bacterioidetes com aumento da proporção F/B. Dentre os mecanismo, há aumento da absorção de LPS (lipídio presente na membrana de bactérias gram negativas da microbiota intestinal, em decorrência do aumento da permeabilidade intestinal. →LPS, cujo nível sérico está elevado em obesos, pode induzir processo ICS e obesidade, levando a RI mediante ativação do TLR-4, expresso na maioria das cels e macrófagos. Ligação do LPS ao TLR-4 ativa extensa via de sinalização que induz resposta inflamatória e a expressão e secreção de citocinas. →Aumento da permeabilidade ao LPS se deve à expressão reduzida das proteínas da zonula occludens-q (ZO-1), claudina e ocludina, que compõe a junção estreita, criando barreira epitelial intestinal que impede a população bacteriana e os produtos do lúmen intestinal de atingirem a circulação. Quebra da função leva à translocação do LPS que pode ser fator precoce no desenvolvimento de inflamação e Ri em humanos. →Mecanismo adicional seria redução da população de bactérias que produzem AGCC (acetato, butirato, propionato) que são bons estimuladores do metabolismo energético. Menor produção de butirato poderia contribuir para alteração na permeabilidade intestinal. →Também estão envolvidos aminoácidos de cadeia ramificada, cuja absorção e produção estão aumentadas na obesidade. →É possível ocorrer integração de mecanismos da RI como alteração da microbiota, estresse oxidativo e de RE, ativação de citocinas e aumento de lipídios intracelulares, convergindo para fosforilação em serina do IRS-1. Contudo, cada um desses mecanismos promove uma regulação tecido-específica. - Falência da Célula Beta →DM2 tem início quando o pâncreas endócrino falha em secretar insulina adequadamente para as demandas metabólicas, por disfunção secretória e/ou diminuição da massa de células B. Disfunção secretória bem caracterizada é uma redução relativa da fase rápida de secreção de insulina, demonstrada durante o teste oral ou intravenoso de tolerância à glicose, ou mesmo após refeições mistas. Menor secreção pode ser consequência de alterações funcionais genéticas e/ou adquiridas da célula B, mas é mais provável que a associação da disfunção secretória e da redução da massa dessas células seja a causa na maioria dos casos de DM2. →Massa de céls B no adulto é plástica, e ajuste nos mecanismos de crescimentos e sobrevivência destas células é o que mantém o balanço entre oferta de insulina e demanda metabólica. Obesos sem DM apresentam aumento dessa massa, que parece compensar a maior necessidade metabólica da RI associada à obesidade. Isso não ocorre de maneira apropriada em obesos diabéticos, assim, maioria dos diabéticos magros ou obesos apresentam redução dessa massa. Logo, DM2 pode ser visto como doença caracterizada por deficiência relativa de insulina. →Nos idosos a massa de cels B pode reduzir-se porque a apoptose supera a replicação, o que pode explicar a maior propensão a DM2 nesse grupo. Aproximadamente 1/3 dos obesos desenvolve DM2, provavelmente pela predisposição genética que envolve esse controle da massa de céls B. →No DM2 há maior grau de apoptose de céls B, provavelmente em decorrência de: hiperglicemia, lipotoxicidade, estresse oxidativo, ERE e ação de citocinas. Nesse ponto, papel do IRS-2 tem papel na sobrevivência da cél B: o aumento de sua expressão induz replicação, neogênese e maior sobrevida, enquanto a diminuição de expressão desse substrato causa apoptose espontânea. →Hiperglicemia crônica leva à geração de ROS e `expressão IRS-1 dentro das ilhotas, soma-se a isso a elevação dos níveis de TNF-alfa, IL-6 e aumento dos AG livres como fatores ativadores de serina- quinases que podem induzir fosforilação do IRS-2 em serina. Quando o IRS-2 é fosforilado em serina, ele é mais facilmente degradado, deixando desprotegida a cél B. →Menor efeito insulinotrópico na obesidadecontribui para a redução na secreção de insulina, sobretudo no DM2. Incretinas (polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose e peptídeo semelhante ao glucagon 1 – GIP e GLP-1) induzem secreção de insulina mediada por glicose, estimulam proliferação da cél B e inibe apoptose. Esses hormônios do TGI são responsáveis por 50% da secreção de insulina após uma refeição. No DM2, o GLP-1 apresenta atividade insulinotrópica inferior à observada em indivíduos saudáveis, mas ainda é substancial. Já efeito estimulador do GIP é quase todo perdido, sendo ele o principal responsável pelo efeito enteroinsulinar na secreção de insulina. →Desdiferenciação da célula beta em animais diabéticos envolve transformação dessa célula em outras células endócrinas não alfa e não beta, mas com maior produção de glucagon, sugerindo que esta transformação celular esteja presente nas ilhotas de diabéticos, sendo adicional à apoptose. Isso ocorreria como fenômeno secundário ao estresse oxidativo e à menor expressão de proteínas da via de sinalização de insulina. Mesmo pequenas elevações da glicemia poderiam induzir essa adaptação. Lembrar: no DM1 e DM2 esta diferenciação pode ajudar a explicar a elevação dos níveis circulantes de glucagon. - Outros mecanismos patogênicos →Cérebro está bem envolvido na patogênese da obesidade e DM2. Dieta rica em gordura, estresse oxidativo e citocinas pró-inflamatórias podem causar inflamação hipotalâmica, com redução dos sinais anorexígenosmediado pela insulina e leptina, gerando hiperfagia e ganho de peso. RI cerebral leva a aumento da produção hepática de glicose e redução da captação muscular.
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