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1 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Valvopatias INTRODUÇÃO • Estágios: o Estágio A (paciente possui fatores de risco) → Ex.: LES, história familiar de doença cardíaca ou valvular, colagenoses, idade etc. ▪ Utilizamos as estatísticas para colocar o paciente num patamar de atenção ▪ Se o paciente possui fator de risco, devem ser feitos exame físico, história clínica e algum tipo de exame de imagem para tentar ver se ele tem nesse estágio algum fator que predispõe uma evolução desfavorável o Estágio B (valvopatia discreta ou moderada) o Estágio C (valvopatia importante assintomática) o Estágio D (valvopatia importante sintomática) → Deve-se evitar de chegar nesse estágio, principalmente na válvula aórtica • Sintomas na doença valvar: o Dispneia aos esforços* → Tanto válvula do coração direito, quanto principalmente válvula do coração esquerdo podem provocar sintomas de dispneia de esforço ▪ Isso acontece porque quando fazemos esforço o coração acelera e ↑ o tônus simpático, ao fazer isso ↑ o débito cardíaco (↑ força de contração) ▪ Ao acelerar o coração, mudam os tempos principalmente da diástole e algumas válvulas não toleram esse encurtamento diastólico o Ortopneia → É uma dispneia quando o doente se deita / se repousa ▪ Quando o paciente se deita, o retorno venoso das pernas e do abdome aumentam do lado direito do coração a pressão de enchimento do ventrículo ▪ Quando aumenta a pressão de enchimento do ventrículo direito, aciona-se a Lei de Frank-Starling (outro mecanismo de ↑ da contratilidade miocárdica) ▪ Com Frank-Starling, aumenta o débito para Artéria Pulmonar e o sangue vai para o coração esquerdo, onde, se encontrar uma válvula defeituosa, pode gerar uma congestão que vai gerar a dispneia (ortopneia ou paroxística noturna) o Dispneia paroxística noturna (ver acima) o Insuficiência cardíaca → Uma doença valvar, quando sai de moderada para severa, pode evoluir com insuficiência cardíaca ▪ É possível tratar a IC corrigindo a causa mecânica da válvula ▪ Porém, a IC, uma vez manifesta, usualmente tem uma evolução de cada vez ficar mais grave, podendo levar à morte do paciente por arritmia cardíaca gerada ao final da evolução de IC o Palpitações → Têm etiologia nas valvopatias por sobrecarga de câmaras ▪ O coração sobrecarregado distendendo as câmaras atriais ou ventriculares cria posições propícias ao evento de arritmias cardíacas PROF. ALFREDO FILHO 2 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ▪ Arritmias atriais → Extrassístole atrial, flutter atrial, fibrilação atrial, taquicardia atrial ▪ Arritmias ventriculares → Extrassístole ventricular, extrassístole bigeminada, taquicardia ventricular e eventualmente até parada cardíaca o Dor torácica anginosa ▪ Hipertensão arterial pulmonar importante por valvopatia dá dor precordial, que pode ser confundida com angina pectoris de doença coronariana ▪ Insuficiência aórtica gravíssima, principalmente a aguda → O sangue da aorta desaba durante a diástole para dentro do ventrículo, distendendo-o (sendo que às vezes já está hipertrófico) ▪ Estenose aórtica → O músculo pode passar de 1cm de espessura para 2-3cm e as coronárias, que ficam no epicárdio, não vão conseguir levar sangue para o endocárdio, podendo gerar isquemia subendocárdica ❖ Qualquer situação de esforço (com vasodilatação dos membros), pode fazer a pressão média da aorta cair, o que em cima de uma válvula já entupida não permite o abastecimento correto da aorta (podendo gerar a dor precordial, angina de esforço) o Síncope → Baixo débito = Não irriga o fluxo cerebral = Síncope o Rouquidão → Por compressão do nervo das cordas vocais o Hemoptise → Numa estenose mitral severa, há uma brutal congestão do átrio esquerdo, que retroage em cima das vênulas pulmonares, indo para o capilar pulmonar, fazendo como se fosse um edema pulmonar (podendo romper capilares que jogam seu conteúdo para dentro dos alvéolos e o doente tosse com escarro hemoptoico) ▪ É possível, inclusive, fazer um edema agudo de pulmão por causa de estenose mitral o Tosse e sibilos → Explica-se pelo mesmo motivo da hemoptise (congestão venocapilar pulmonar) o Edema periférico → Pode ser sinal de insuficiência cardíaca direita e problemas na válvula do lado direito ou também do lado esquerdo podem congestionar retrogradamente até gerar uma IC direita com edema ▪ Edema frio, indolor, simétrico, bilateral, cacifo positivo e de características de aparecimento ao longo do dia (manifestando mais do final do dia para noite e quando o doente acorda está seco e o quadro se repete) • Decisão do tratamento da doença valvar (além dos sintomas): o Estágio da valvopatia → O estágio da valvopatia às vezes supera os sintomas o Presença de comorbidades e complicações associadas (cardíacas e não cardíacas) ▪ Pode ser, por exemplo, que o paciente não aguente uma cirurgia para reparação da válvula → Por isso, hoje em dia, tem sido realizado muita correção por cateter o Estado funcional (fragilidade) o Função cognitiva (idosos) o Suporte familiar e social (acompanhamento médico, anticoagulação e recuperação pós-operatória) ▪ É importante a orientação porque se não for feito o uso da medicação corretamente após a cirurgia, vai trombosar a válvula, gerar um coágulo no átrio e pode gerar um AVC o Opinião do paciente • Avaliação dos sopros cardíacos: o Intensidade → A intensidade geralmente é graduada de 1 a 6 cruzes (+), que se refere a sua audibilidade (intensidade na ausculta) 3 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ▪ A partir de 4 cruzes, geralmente ao colocar a mão no precórdio é possível sentir a pele vibrando (frêmito) ▪ Mas, às vezes, o sopro vai para 5/6 cruzes sem que se sinta o frêmito, mas o sopro é extremamente audível ▪ Então, se tem frêmito é pelo menos 4 cruzes, mas se não tem não impede de quantificar em 5 ou 6 cruzes ▪ É necessário sempre colocar a intensidade em cruzes no prontuário ▪ Intensidade do sopro nem sempre quer dizer gravidade hemodinâmica o Localização → Basicamente os 4 focos principais (mitral, aórtico, pulmonar e tricúspide) e outros locais de ausculta também importantes (aórtico acessório, ponta do coração, axila e até coluna vertebral) ▪ Foco aórtico acessório → Muito do que se ouve da válvula aórtica é audível não no foco aórtico, mas no aórtico acessório (sempre examinar) ▪ Ponta do coração, axila e até coluna vertebral → Local de frequente ausculta na insuficiência mitral (sopro de Miguel Couto, sopro sistólico que se irradia para axila) o Irradiação → Axila, coluna, carótidas, fúrcula esternal etc. ▪ Insuficiência mitral normalmente irradia sopro para axila (sopro de Miguel Couto) ▪ Estenose aórtica normalmente irradia o sopro até o pescoço o Avaliação temporal / Relação com B1 e B2 → Na localização temporal falamos primeiro se o sopro é sistólico, diastólico, contínuo ou sistodiastólico (ver abaixo) • Sopro sistodiastólico: o Junção de um sopro sistólico com um sopro diastólico o Ex.: Lesão mista na válvula, estenose aórtica gerando sopro sistólico e insuficiência gerando sopro diastólico (+ intenso na protodiástole e decrescendo ao longo que aorta perde pressão e ventrículo vai enchendo de sangue) • Sopro contínuo: o Sopro não para nunca o Ex. Persistência do canal arterial, como a pressão da pulmonar é bem mais baixa que a da aorta e o canal é bem apertado, sempre há um sopro do sangue percorrendo da aorta para a pulmonar (sopro em maquinária) • Sopro sistólico: o Entre B1 e B2 o Sopro de estenose aórtica/pulmonar (B1 → Gap silencioso → Sopro sistólico) ▪ Quando inicia a sístole a mitral e a tricúspide fecham (gerando B1) e a pressão vai crescendo dentro dos ventrículos, inicialmente insuficiente para abrir a válvula aórtica/pulmonar (gap silencioso), depois quando tem pressãosuficiente elas abrem e o sangue passa pela válvula estenosada (gerando o sopro) ▪ Esse gap é o que define que é um sopro de válvula de base (aórtica ou pulmonar) 4 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ▪ Configuração do som em diamante / ouro do baralho ▪ Para diferenciar o aórtico do pulmonar é só solicitar ao paciente que inspire profundamente e segure o ar para aumentar o retorno venoso e a contratilidade do VD, se o sopro aumentar no foco pulmonar indica uma estenose pulmonar (manobra de Rivero-Carvallo) ▪ Para a estenose aórtica há a manobra isométrica ou handgrip test, em que é solicitado que o paciente segure o dedo do médico e aperte forte, gerando um esforço muito grande e uma resposta simpática, o que ↑ FC e a concentração de cálcio intracitoplasmático, aumentando força e velocidade de contração, além de contrair as arteríolas periféricas (como se clampeasse a aorta) → Diminui a intensidade do sopro ▪ Melhor ouvido com a campânula do estetoscópio o Sopro de insuficiência mitral/tricúspide (B1 + sopro) ▪ Quando entra em sístole o sangue bate na válvula mitral/tricúspide doente com um orifício que não fecha, impedindo a fase de contração isovolumétrica do ventrículo, pois deixa o sangue vazar para o átrio (barulho de sopro sai junto de B1) ▪ Na insuficiência mitral, o handgrip test faz com que o sangue reflua mais para o AE, aumentando o sopro sistólico de insuficiência mitral ▪ Melhor ouvido com a membrana do estetoscópico ▪ Para diferenciar o tricúspide do mitral, é feita também a manobra de Rivero-Carvallo, que aumenta o retorno venoso e enche o lado direito, refluindo mais pela tricúspide (se o sopro aumenta nesse foco confirma que é tricúspide, Rivero-Carvallo positivo) • Sopro diastólico: o Depois de B2 o Sopro de insuficiência aórtica/pulmonar (começa intenso com B2 e vai diminuindo) ▪ O sangue vai para a aorta/pulmonar na sístole, a sístole acaba e a válvula fecha, mas não completamente e o sangue vaza para dentro do ventrículo ▪ Esse vazamento vibra e gera um sopro suave, aspirativo, que começa intenso logo na B2 e vai diminuindo à proporção que vai acabando de vazar sangue para o ventrículo ▪ Quanto + tempo ficar soprando, menor é a insuficiência (demorou mais para a quantidade de sangue vazar), já se o sopro foi bem rápido significa que em menos tempo aquele sangue vazou, então o tamanho da insuficiência deve ser maior ▪ Na insuficiência aórtica, o handgrip test faz com que a força do sangue voltando para o VE pela válvula aórtica aumente, o que deixa o sopro de insuficiência mais audível ▪ Se a insuficiência aórtica for grave, o sangue que reflui para o VE enche muito ele. Então, na sístole seguinte, com todo Frank-Starling acionado e quando ele bate com toda força e velocidade aumentada e a aorta vazia/colabada, gera uma amplitude de pulso aumentada (pulso em martelo d’água / dança das artérias) ❖ Pode chegar num ponto que a cada sístole, a cabeça do paciente balança o Sopro de estenose mitral/tricúspide (estalido → ruflar diastólico → reforço pré-sistólico) ▪ Coração entra em diástole e ao ventrículo relaxar, o sangue sai do átrio para o ventrículo ▪ Se a válvula estiver estenosada, cria um gradiente de pressão artificial, que cria um barulho chamado de ruflar diastólico (durante toda a diástole) 5 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ▪ No final da diástole, ocorre a onda P, o átrio contrai e acelera o sangue a passar na válvula, dando um sopro holodiastólico com reforço pré-sistólico (marca da estenose mitral) ▪ Se a válvula estenosada não é calcificada, no momento que ela consegue abrir ela não abre totalmente e freia bruscamente, gerando um barulho chamado estalido/clique de abertura (daí para frente que aparece o ruflar diastólico) ▪ Para a estenose tricúspide, é possível fazer a manobra de Rivero-Carvallo, levando mais sangue para o AD, batendo mais forte na válvula tricúspide, deixando o sopro mais audível ▪ Para a estenose mitral é difícil ter uma manobra que influencie • Utilidade do ecocardiograma: o Etiologia o Monitorização da progressão o Gravidade (tempo de abordagem cirúrgica / transcateter) o Tamanho e função do ventrículo esquerdo o Condições associadas ▪ Hipertensão pulmonar ▪ Aumento atrial ALTERAÇÕES RELACIONADAS À FEBRE REUMÁTICA • Doença cardíaca reumática aguda: o É a manifestação cardíaca da FR e está associada à inflamação das valvas, miocárdio ou pericárdio o Durante a FR aguda, lesões inflamatórias discretas são encontradas em vários tecidos pelo corpo • Doença cardíaca reumática crônica: o Caracterizada pela organização da inflamação aguda e subsequentes lesões o As alterações anatômicas cardinais da valva mitral (ou tricúspide) incluem espessamento da cúspide, fusão comissural com encurtamento, espessamento e fusão das cordoalhas 6 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 VALVOPATIAS RELACIONADAS À FEBRE REUMÁTICA • Aspectos gerais: o Cerca de 10 – 20% dos procedimentos cardíacos cirúrgicos nos EUA o Febre reumática e suas sequelas ▪ 70% das valvopatias ▪ 40% das cirurgias cardíacas no Brasil o Valvopatia mitral reumática mais comum é a dupla lesão mitral ▪ Insuficiência mitral com comprometimento de cordoalhas → Lesão aguda ▪ Estenose mitral → Lesão crônica • Aspectos importantes na vida do valvopata: o Diagnóstico da causa e gravidade da doença valvar o Medidas de prevenção da disfunção valvar ▪ Febre reumática e endocardite infecciosa o Educação em relação à história natural da doença ▪ Tipo e tempo de início dos sintomas o Prevenção primária e secundária da DCV aterosclerótica o Intervalos de avaliação por imagem da progressão da doença o Reconhecimento das condições cardíacas associadas o Tempo certo de indicação de intervenções cirúrgicas/transcateter p/ correção ou melhora da disfunção valvar 7 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Acometimento valvar da cardite reumática: o A valva pulmonar não faz parte do conjunto das outras 3 valvas, que ficam no anel fibroso (como faz parecer a imagem), ela fica + superior e é desvinculada das outras valvas por um tecido de músculo infundibular. Então, ela não tem o toque anatômico das outras 3 ▪ Essa é provavelmente uma das explicações da pulmonar raramente ser acometida por doença reumática o As valvas que são normalmente da doença reumática são a mitral (em 1º lugar), a aórtica (em 2º lugar) e mais raramente a tricúspide ▪ Quando a tricúspide tem algum processo de estenose, insuficiência ou dupla lesão, geralmente já se tem, no mínimo, lesão de valva mitral Válvulas normais – Observar que a grande valva mitral fica encostada na valva aórtica, existe um toque de maneira que parece que a mitral fica pendurada no anel da aórtica, já a pequena valva mitral é inserida em todo o anel na parte posteroinferior e lateral do ventrículo esquerdo Válvulas alteradas – Observar que a mitral está estenosada e espessada, a tricúspide também com valvopatia, a aorta tricúspide com valvopatia reumática, já a pulmonar está discretamente espessada ou quase nada acometida 8 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ESTENOSE MITRAL (EM) • Características gerais: o É a valvopatia mais frequente de todas o Principal causa → Sequela da FR (99% dos casos de EM no Brasil) ▪ Isso é válido para países pobres e subdesenvolvidos o Sexo feminino em sua maioria o 25% têm EM pura o 40% têm dupla lesão → Quando se tem uma maior predominância da valvopatia, ela vem associada com a dupla lesão, uma lesão de estenose e de insuficiência mitral o 35% têm doença multivalvar → Em que a aórtica e a tricúspide já podem estar acometidas o Causa emergente → Calcificação anular mitral (CAM)em pacientes idosos (isso porque a expectativa de vida vem aumentado em todo o mundo) o As válvulas atrioventriculares são diferentes das de base porque quando se pensa nelas é preciso lembrar de todo o conjunto composto por átrio, anel, cúspides, cordoalhas tendinosas, músculo papilar e parede do ventrículo → Disfunções em um desses componentes podem provocar tanto estenose quanto insuficiência • Evolução da doença: o Fase precoce → A EM pura adquire um aspecto muito clássico, que parece a cúpula de uma igreja, chamada de abertura em “dome” (curvada) – folheto anterior o Fusão comissural → Quando ela começa a ficar acometida, ela apresenta uma fusão da parte lateral / bordas dá um aspecto de “boca de peixe” (visto nitidamente no ecocardiograma) o Espessamento dos folhetos → É uma constante na EM reumática o Estágio avançado → Calcificação intensa, que ocorre por um processo de cura valvar, começando a ficar dura, fazendo com que o som de B1 começa a desaparecer (ficando B1 hipofonética) ▪ Junto da hipofonese, a EM com fusão das comissuras lateais gera na ausculta um estalido de abertura máxima da válvula mitral após B2 (se tiver estalido de abertura, ainda não há calcificação valvar acentuada) o A repercussão fisiopatológica de uma válvula mitral doente é o aumento da pressão do AE (congestão do AE podendo fazer edema pulmonar, dispneias etc.) o O padrão tradicional da estenose mitral reumática é o depósito de fibrina e coágulos na borda da cúspide valvar pela face atrial (ver imagem) • Representação clínica: o Dispneia ao exercício → No exercício, ↑ tônus simpático, ↑ DC e ↑ FC (↓ período de diástole e de tempo de mitral aberta). O AE já está congestionado e piora com a mitral menos tempo aberta, tornando a dispneia mais nítida ao exercício 9 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Dispneia paroxística noturna / ortopneia → Quando já existe um grau de insuficiência ventricular esquerda que faz uma congestão no AE, levando ao lado direito do coração e esse lado também não dá conta (história natural), começa a acumular líquido no organismo (edema generalizado) ▪ Esse edema é + pronunciado ao longo do dia. Durante à noite, pelo repouso, começa a ter uma reabsorção de líquido do espaço intersticial para a circulação sistêmica ▪ Essa reabsorção aumenta o volume que o VD coloca para o lado esquerdo → Esse volume encontra a EM e de novo acontece ↑ de congestão ▪ A ortopneia e a dispneia paroxística noturna são um reflexo desse acúmulo de líquido que é reabsorvido no período noturno o Hemoptise → Quando o sangue está congestionado no AE pode haver ruptura e lesões de capilares pulmonares com transudação para dentro do alvéolo (a pessoa tosse e elimina glóbulos vermelhos, escarro hemoptoico) o Palpitações → Também explicadas pela congestão do AE, que distende o sarcômero e gera palpitação/arritmia o Embolização (risco 10x maior) → O AE congesto tem um sangue residual grande, que fica com certa morosidade dentro da câmara, o que propicia a coagulação na parede do endotélio ▪ O coágulo pode se soltar, passar pela válvula mitral e provocar a embolização sistêmica • Outras causas: o Congênita → Do tipo valvar o Doenças infiltrativas (mucopolissacaridoses) o Mixoma → EM do tipo supravalvar ▪ O mixoma do lado esquerdo é um dos + comuns tumores do coração, que se situa no septo interatrial ▪ É um tumor pediculado, forma uma vesícula que na diástole entra no aparelho valvar mitral e a obstrui ▪ Ao obstruir a válvula mitral, o quadro clínico resultante é semelhante à EM o Cor triatriatum → EM congênita supravalvar o LES o Artrite reumatoide o Síndrome carcinoide (raríssimo) o EM congênita + CIA (síndrome de Lutembacher) • Achados anatomopatológicos: o 1º → Fusão comissural o 2º → Espessamento / calcificação dos folhetos o 3º → Fusão de cordas (encurtamento, dificultando a abordagem cirúrgica) ▪ Quando tem fusão de cordoalhas + calcificação diz a favor de prótese valvular mitral 10 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 11 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Ausculta da EM pura: o Ocorre primeiro B1 e sístole sem sopro o Quando a B2 acontece, a pressão vai caindo dentro do VE até que a válvula mitral abra o Quando a válvula mitral abre, acontece o início do sopro (diastólico), que vem desde a abertura se propagando o No finalzinho da diástole, o AE entra em sístole, gerando uma aceleração do sangue pela válvula mitral, provocando uma exacerbação do ruído que se ouve no estetoscópio (reforço pré-sístole) o O sopro da EM, então, é um ruflar holodiastólico de baixa frequência audível no AE pelo foco mitral que tem um reforço pré-sistólico e uma B1 hiperfonética (VE bateu + vazio e rapidamente) • Eletrocardiograma: o Em V1 achamos uma onda P que começa positiva e fica negativa, que significa sobrecarga de AE o Em DI podemos encontrar uma fase negativa maior que a positiva, o que significa que o eixo elétrico está desviado para direita → Esse paciente também tem sobrecarga de ventrículo direito • RX de tórax: o Dilatação do tronco da artéria pulmonar associada a uma dilatação da auriculeta esquerda o Sinal de duplo contorno (sobrecarga de átrio esquerdo) 12 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 13 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Fibrilação atrial: o A EM, por aumentar o AE, provoca um remodelamento, com dilatação, fibrose parietal e desordem muscular o Tudo isso leva em direção a uma fibrilação atrial (átrio para de ter sístole, fica só balançando) o Isso é causa de trombo intra-atrial esquerdo o Além de perder a sístole atrial, que é fundamental na EM porque ajuda a encher o VE, o coração fica mais taquicárdicos e há risco de tromboembolismo sistêmico por coágulos que se formam dentro do AE o Se o doente está em fibrilação atrial não existe o reforço pré-sistólico no sopro Ecocardiograma – Eco clássico em corte longitudinal. O AE está dobrado de tamanho, a válvula mitral está espessada, com fusão das comissuras e orifício pequeno em diástole Ecocardiograma – A seta maior identifica o folheto anterior mitral no momento de sua abertura, a seta pequena identifica o momento da abertura do folheto posterior. O folheto posterior deveria se deslocar para baixo e o anterior para cima, mas observe que o folheto posterior está verticalizado, isso significa que existe fusão das comissuras, fazendo com que o folheto anterior ao se abrir tracione o folheto posterior. As cordoalhas tendinosas estão espessadas e bem visíveis (não deveriam estar) 14 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Ecocardiograma – Espessamento mais pronunciado na ponta dos folhetos da valva mitral (patognomônico de comprometimento reumático da valva mitral) ECO 3D de uma valva mitral reumática – Presença de fusão assimétrica das comissuras (setas) 15 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 INSUFICIÊNCIA MITRAL (IM) Daremos o foco na insuficiência mitral por doença reumática, porque essa que é muito frequente. • Características gerais: o 80% da população tem regurgitação mitral fisiológica → Porém, é apenas um jato pequeno que escorrega do VE para o AE, não gerando grandes repercussões o O aparato valvar mitral é uma unidade complexa anatômica e funcional composta pelo átrio esquerdo, anel mitral, folhetos valvares, cordas tendíneas, músculos papilares e pela parede do ventrículo esquerdo adjacente ▪ Alterações em qualquer uma dessas coisas isoladamente ou conjuntamente pode dar insuficiência mitral o Na insuficiência mitral aguda há uma súbita sobrecarga de volume impostapelo ventrículo esquerdo, o que aumenta o volume diastólico final ▪ Não há tempo hábil para o AE dilatar → A ausência de uma dilatação compensatória e na circunstância de um AE pequeno resulta em hipertensão venocapilar pulmonar o Já na insuficiência mitral crônica existe tempo para os mecanismos compensatórios se desenvolverem (dilatação de AE e hiperplasia da membrana basal dos capilares pulmonares) Fisiopatologia e aspectos clínicos da regurgitação mitral 16 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Fisiopatologia e aspectos clínicos: o Como vem sangue das veias pulmonares e do VE para o AE, ele cresce o Como não há estenose, no momento que o VE relaxa, do AE para o VE vem uma pancada de sangue o Essa quantidade de sangue muito grande que cai no VE faz ele também dilatar → É importante para diferenciar da estenose mitral, que só sobrecarrega AE (insuficiência mitral sobrecarrega tanto AE quanto VE) ▪ Essa dilatação causa ↑ na pressão venocapilar pulmonar, ↑ na pressão da artéria pulmonar, pode dar um pouco de ↑ de VD e AD ▪ A insuficiência mitral dá muito menos sintoma que a estenose, porque pela dilatação a situação se acomoda, diminuindo a chance de edema pulmonar (dá palpitação e fadiga, mas não dá muito dispneia) o Só da dispneia com IM quando já chegou na dilatação máx., em que já detonou o VE → Não devemos deixar chegar nesse estágio, por isso fazemos as medidas do diâmetro e da contratilidade do VE (fração de ejeção) ▪ Esses diâmetros é que marcarão para o clínico o momento que ele tem que fazer uma proposta de tratamento não mais medicamentosa e sim cirúrgica • RX de tórax: o O ventrículo esquerdo aparece dilatado, até encostando no gradil costal o O átrio esquerdo não chama tanta atenção como na estenose mitral • Eletrocardiograma: o O ECG mostra uma sobrecarga do lado esquerdo do coração o Mostra ondas R enormes em V5 e V6 → Isso somado com V1 e V2 é que dá o diagnóstico de sobrecarga de ventrículo esquerdo 17 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Ausculta: o Como é um sopro de insuficiência mitral, há a primeira bulha quando começa a aumentar a pressão do VE e instantaneamente já começa o sopro o É um sopro em barra holossistólico irradiado para o lado esquerdo e axila (sopro de Miguel Couto) o Se a insuficiência for importante, vai inundar o lado esquerdo e, não havendo estenose, na diástole vai acontecer que grande quantidade vai sair do AE para o VE, o que costuma fazer com que a terceira bulha apareça mais nítida o Uma insuficiência mitral por prolapso de válvula mitral pode gerar uma situação um pouco diferente ▪ Há a B1, mas não inicia o sopro de cara, somente na meso ou telossístole quando acontece aquela dilatação/movimento em direção ao AE e as cúspides deixam escapar um pouco de sangue ▪ Sopro mesotelessistólico → Sopro acontece no final da sístole, depois do clique de abertura/estalido da mitral (se houver) o Lembrando que a manobra que ajuda a exacerbar o sopro da IM é o handgrip (paciente aperta as mãos) ▪ Coração acelera e o sopro vai ficar mais audível ▪ O sangue está tentando ir para a aorta, mas ela está 18 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 “trancada” pelo handgrip test e não aceita mais sangue, que em vez de ir para cima vai refluir pela mitral (deixando o sopro mais audível, handgrip +) Ecocardiograma – Imagem em que o transdutor foi colocado na ponta do coração. Observa-se que é a sístole (válvula mitral fechada), mas com o sangue escapando do VE para o AE, inundando até parede posterior. O fluxo em amarelo indica fluxo turbilhonado 19 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ESTENOSE AÓRTICA (EA) • Aspectos gerais: o A EA clássica é a estenose do anel e da válvula aórtica (foco da aula), mas ela pode ser acima da válvula, lá na aorta (supravalvar) e abaixo da válvula (intraventricular) o A estenose da válvula aórtica pode ser congênita, adquirida por febre reumática (foco da aula), por doenças de colágeno, por calcificação de válvula etc. o É uma obstrução ao fluxo de saída do ventrículo esquerdo geralmente se desenvolve e se mantém às custas de um curso longo e progressivo ▪ Esse curso é o problema da EA, porque ela simplesmente mata o doente silenciosamente ▪ A dificuldade, então, é em fazer o diagnóstico, definir que tem EA, e saber o momento adequado de fazer a intervenção o Os 3 sintomas tradicionais da EA, quando eles aparecem significa que já se perdeu o timing da complicação o Na estenose aórtica, a contração atrial tem papel fundamental no enchimento ventricular ▪ Quando a estenose vai ficando mais grave, o orifício vai ficando menor, o que sobrecarrega o VE, causando o reflexo da hipertrofia ventricular esquerda ▪ Quando tem hipertrofia ventricular esquerda (pouco distensível e duro), é preciso que o AE esvazie e encha o VE com a sístole atrial ▪ Se o doente tem uma sístole atrial presente e eficiente ajuda demais na estenose aórtica ▪ Então, se o doente faz uma fibrilação atrial é um problema importante na evolução da EA e devemos evitar o A EA tem uma história natural caracterizada por um longo período de latência com baixa mortalidade ▪ Por volta dos 60 anos de idade, a EA que vinha no período latente tranquilo começa a mostrar seus sintomas (angina, síncope ou insuficiência ventricular esquerda) ▪ Se acontece qualquer desses sintomas, imediatamente a média de sobrevida do paciente cai 20 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 21 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Fisiopatologia e aspectos clínicos: o O AE é pequeninho, já o VE tem durante muito tempo da vida o diâmetro preservado, mas sua parede vai ficando hipertrófica o A pressão no VE vai a 220-250 mmHg e dentro da aorta fica por volta de 120-130 mmHg → Quando a pressão sobe no VE, a da aorta também sofre, mas tem um momento que o VE chegou num pico e a aorta está num nível abaixo (esse é o gradiente, que gera o diagnóstico) o O fluxo de sangue que vai do VE para a aorta passa em alta velocidade, soprando no foco aórtico acessório, foco aórtico e carótidas durante a sístole o Há a B1, há um tempo sem som e depois a tipicamente sopro que começa lento e vai crescendo depois decrescendo para chegar em B2 • RX de tórax: o Chama atenção porque o VE é normal durante a vida inteira, só cresce se tiver insuficiência ventricular esquerda o Botão aórtico proeminente por conta do fluxo turbilhonar que faz a aorta dilatar/crescer o O RX às vezes pode lembrar uma situação normal, mas às vezes se tem no botão aórtico uma calcificação pelo turbilhonamento que existe na parte alta da aorta ascendente • Eletrocardiograma: o Sinais nítidos de uma hipertrofia ventricular do lado esquerdo o Nas precordiais esquerdas, a onda R vai aparecer enorme 22 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Ausculta: o A estenose aórtica tem o sopro típico em naipe de ouro o O handgrip test faz com que o sangue que vem do VE não saia tão bem para a aorta, o que diminui a intensidade do sopro de estenose aórtica o Outras manobras como Valsava podem ser utilizadas, mas são mais complicadas de fazer e entender Ecocardiograma (corte paraesternal transverso da base) – Válvula aórtica bem aberta (normal) Ecocardiograma (corte paraesternal transverso da base) – Aorta está um pouco mais dilatada, mas as cúspides da válvula não estão abrindo quase nada. É uma estenose aórtica severa 23 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 INSUFICIÊNCIA AÓRTICA (IAo) Daremos o foco na insuficiência aórtica por doençareumática, porque essa que é muito frequente. • Características gerais: o Todo o volume de regurgitação aórtica e todo o volume sistólico ventricular é ejetado em uma câmara de alta pressão, isto é, na aorta o Na insuficiência aórtica, o aumento do volume diastólico final do ventrículo esquerdo (elevação da pré carga) fornece uma grande compensação hemodinâmica ▪ A soma do sangue do AE com o da regurgitação faz com que progressivamente o VE vá se dilatando para se adaptar adequadamente ao manuseio dessa fração regurgitante ▪ Isso acontece de tal maneira que a insuficiência aórtica reumática é uma doença bem tolerada • Características clínicas da IAo crônica: o Pulso com ascensão rápida (porque é o volume do DC + fração regurgitada) e alta amplitude (pulso em martelo d’água ou de Corrigan) o Pressão de pulso ampla o Sinais propedêuticos na IAo crônica grave (alto volume sistólico e ejetado) o Pulso bisferiens (DLA com IAO importante) o É um sopro que pode obviamente ser diastólico do tipo aspirativo, mas como na sístole começa a passar maior quantidade de sangue para um mesmo orifício aórtico começa a aparecer uma estenose relativa ao alto débito sistólico (o sopro passa a ser sistólico também) ▪ Sopro protomesodiastólico em decrescendo ou holodiastólico, imediatamente após B2 e melhor audível ao final da expiração ▪ Sopro mesossistólico de hiperfluxo na válvula aórtica 24 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Válvula aórtica com insuficiência – Alterações nas bordas das cúspides. Observar o ventrículo esquerdo arredondado, dilatado, que perdeu o seu formato em forma de manga espada 25 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 26 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Fisiopatologia e aspectos clínicos: o Há um aumento do VE e secundariamente algum grau de hipertrofia que esse aumento do diâmetro provoca o Ocorre a primeira bulha, não tem sopro na sístole, ocorre a segunda bulha e logo que isso ocorre a pressão alta na aorta empurra o sangue para dentro do VE, então o sopro começa bastante audível, vai decrescendo e até a mesodiástole tende a desaparecer ▪ Se você ouve um sopro nítido em toda a diástole significa uma IAo pequena, porque o gradiente da aorta para o VE permanece alta ▪ Quando o sopro vem alto e some na mesodiástole é necessário atenção, porque deve ser uma insuficiência aórtica severa • Eletrocardiograma: o Ondas R amplas em precordiais esquerdas, denotando uma sobrecarga ventricular esquerda acentuada • RX de tórax: o Mostra fundamentalmente uma grande dilatação do VE, praticamente encostando na reborda costal esquerda → É um ventrículo interdinâmico que chega a balançar o precórdio do doente • Ausculta: o É um sopro que começa colado com a segunda bulha e vem ao longo da diástole, sendo que quanto mais cedo na diástole o sopro parar, provavelmente é uma insuficiência grave 27 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Ecocardiograma – Corte longitudinal. A imagem da direita mostra a vena contracta, que é uma medida da base da área de refluxo que os ecocardiografistas usam para falar da magnitude, de quão severa uma regurgitação aórtica é. Quanto maior o diâmetro da vena contracta, maior a fração regurgitante Ecocardiograma – Com o eco conseguimos ver o refluxo inundando o VE. Na imagem esquerda podemos ver um corte pelo ápice do coração pegando a base da aorta, o fluxo que aparece é diastólico e está indo em direção ao transdutor e essa macha amarelada indica um turbilhão na via de saída do VE Ecocardiograma – Refluxo dando a imagem amarelada (turbilhonamento do sangue) 28 CARDIOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103
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