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HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS_ DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS

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HISTÓRIA DA ÁFRICA 
E DOS AFRICANOS: 
DA DIVISÃO COLONIAL 
AOS DIAS ATUAIS
Programa de Pós-Graduação EAD
UNIASSELVI-PÓS
Autoria: Edilson Pereira Brito 
 Edison Lucas Fabricio
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090
Reitor: Prof. Ozinil Martins de Souza
Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol
Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Norberto Siegel
Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: 
 Profa. Hiandra B. Götzinger Montibeller
 Profa. Izilene Conceição Amaro Ewald
 Profa. Jociane Stolf
Revisão de Conteúdo: Profa. Bruna Scheifer 
Revisão Gramatical: Profa. Camila Thaisa Alves Bona 
Diagramação e Capa: 
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Copyright © Editora UNIASSELVI 2012
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri 
UNIASSELVI – Indaial
 
960
B862h Brito, Edilson Pereira
 História da África e dos africanos: da divisão colonial aos 
 dias atuais / Edilson Pereira Brito; Edison Lucas Fabricio. 
 Indaial : Uniasselvi, 2012.
 146 p. : il 
 
 Inclui bibliografia. 
 ISBN 978-85-7830-612-0
 1. África – História Geral.
 I. Centro Universitário Leonardo da Vinci.
Edilson Pereira Brito
Edison Lucas Fabricio
Licenciado em História pela Universidade 
Estadual de Maringá (2006); Mestre em História 
Cultural pela Universidade Federal de Santa Catarina 
(2011). Foi professor de educação básica na rede 
pública de ensino do Estado do Paraná por quatro 
anos e desde 2012 é aluno do curso de doutorado 
em História da Universidade Estadual de Campinas. 
Realiza pesquisas nas áreas de ensino de História, 
História Social e história dos africanos e seus 
descendentes no Brasil Meridional.
Graduado em História pela Universidade 
Regional de Blumenau (2008); Mestre em História 
pela Universidade Federal de Santa Catarina (2011). 
Professor nos cursos de História da UNIASSELVI, 
FURB e UNIDAVI.
Sumário
APRESENTAÇÃO ..........................................................................01
CAPÍTULO 1
Negociação e Conflito: Portugueses em África ....................09
CAPÍTULO 2
Uma Viagem Sombria: Escravização e Tráfico, 
Séculos XVII ao XIX .....................................................................35
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
Neocolonialismo na África em Fins do Século XIX 
e Início do XX ................................................................................67
“A África é Nossa”: Os Movimentos de Independência
na África .......................................................................................99
Epílogo: Apartheid e Racismo no Sul da África ....................130
APRESENTAÇÃO
Caro(a) pós-graduando(a):
Neste caderno de estudos iremos continuar os nossos estudos sobre a 
História da África e dos Africanos, mas desta vez estudaremos o que ocorreu do 
período colonial até os dias atuais. Dessa forma, esse caderno de estudos foi 
divido em cinco capítulos: 
No primeiro capítulo estudaremos os principais motivos que levaram o 
reino de Portugal a ocupar a vanguardas na expansão ultramarina. Além disso, 
identificaremos como aconteceu o processo de ocupação dos portugueses na 
África Central, entre os séculos XV e XVII, e os principais mecanismos utilizados 
pelos portugueses para assimilar e controlar a população africana e os recursos 
utilizados por tais africanos para negociar com os europeus.
No capítulo seguinte, abordaremos a escravidão e tráfico de negros, pois 
iremos compreender o modo como o tráfico de escravos evoluiu ao longo dos 
séculos. Apresentaremos as regiões de embarque, as formas de captura de 
homens e mulheres transformados em escravos e as interpretações divergentes 
ao longo da historiografia acerca do número de escravizados embarcados. 
No terceiro capítulo analisaremos o neocolonialismo na África no final do 
século XIX e início do século XX, dessa forma falaremos sobre como aconteceu 
o fim do tráfico de africanos e quais foram os impactos disso para a África e as 
demais potências europeias. 
No penúltimo capítulo, o foco de estudo será os movimentos de 
independência da África, assim como compreender o papel da Primeira Guerra 
Mundial para o continente africano, assim como a formação do nacionalismo 
africano, e apresentaremos os desafios contemporâneos da África independente. 
E por fim, o último capítulo será uma grande conclusão do que estudamos 
nessa disciplina, visto que abordará o Apartheid e racismo no sul da África, 
e com isso temos como objetivo, levar você pós graduando, a entender a 
importância e os motivos da revalorização da África e da cultura negra na 
sociedade brasileira atual.
Bons estudos! 
Os autores. 
CAPÍTULO 1
Negociação e Conflito: 
Portugueses em África
A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
� Analisar os principais motivos que levaram o reino de Portugal a ocupar a 
vanguardas na expansão ultramarina. 
� Identificar como aconteceu o processo de ocupação dos portugueses na África 
Central, entre os séculos XV e XVII. 
� Analisar os principais mecanismos utilizados pelos portugueses para assimilar 
e controlar a população africana e os recursos utilizados por tais africanos para 
negociar com os europeus. 
10
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
11
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
Contextualização
Os ibéricos (portugueses e espanhóis) foram os primeiros a lançarem-se ao 
mar rumo ao desconhecido. Tal estratégia acabou levando com que tais povos 
conseguissem o que nenhuma outra nação alcançou nos mesmos níveis, um 
vasto e amplo território. 
Se compararmos, ainda, os países ibéricos, Portugal conquistou um território 
maior e mais diversificado do que os seus vizinhos espanhóis. Em meados do 
século XVII, o pequeno reino português ocupava diversas regiões em todos 
os continentes do planeta (lembrando que a Oceania ainda não havia sido 
descoberta), desde o novo mundo americano, passando pela Ásia e terminando 
na África. Não obstante, foram eles que fizeram a cristandade europeia ocidental 
tomar conhecimento de que havia povos e civilizações em terras desconhecida e 
inimagináveis. 
Cabe lembrar que, durante a Baixa Idade Média, boa parte do território 
português era composta – como ainda é atualmente – por terrenos rochosos, a 
terra era imprópria para o cultivo, a produtividade no reino era baixa. Os rios 
navegáveis eram poucos e insuficientes, as aldeias eram longe umas das outras 
e sua população totalizava, no máximo, um milhão de habitantes. A epidemia 
conhecida como “Peste Negra” provocou milhares de mortes, assim como a 
guerra com Castela (1381-1411). Em 1450, ano de início do chamado século dos 
descobrimentos (1450-1550), as únicas cidades com alguma importância eram 
Porto, Braga, Guimarães, Coimbra e Lisboa. A economia fundamentava-se nas 
trocas e na exploração dos camponeses, maioria esmagadora da população. 
Diante desse quadro desolador, uma pergunta instigante, porém de difícil 
resposta, é a seguinte: como Portugal obteve sucesso nas aventuras marítimas? 
Sem dúvida três mecanismos foram responsáveis pelo sucesso dos 
portugueses em sua jornada por mares nunca dantes navegados, como escreveu 
o poeta Luís de Camões, autor do romance “Os Lusíadas”. Mesmo sendo 
amalgamados, é possível discernirmos, para fins didáticos, aquilo que levou ao 
sucesso das aventuras marítimas. Em primeiro lugar, a monarquia, em seguida, 
a religião, e por último, mas definitivamente não menos importante, o aparato 
tecnológico naval e militar. 
12
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
Monarquia
Ao contrário das outrasmonarquias européias, o Estado moderno português 
definiu-se bem mais rápido. Em 1249, seu território localizado mais ao sul , o Algarve, 
fora tomado de volta dos muçulmanos que haviam ocupado a península desde o 
século anterior, a partir daí as fronteiras portuguesas estavam praticamente definidas. 
O reino permaneceu unido durante todo o século XV, livre das guerras que assolavam 
seus vizinhos. A título de comparação, apenas em 1492 os soberanos Fernando e 
Isabel conseguiram expulsar os muçulmanos de Granada (BOXER, 2002).
Mesmo não fazendo parte de um processo social planejado, 
contínuo e uniforme, Portugal contou com governantes interessados 
na prática de navegação e na exploração de novos destinos. O mais 
famoso, e considerado por boa parte da historiografia portuguesa como 
uma importante figura das grandes navegações, foi o Infante Henrique 
de Sagres, conhecido também como Henrique, o navegador. Membro da 
dinastia de Avis, nascido em 1396, o Infante estimulou seu pai a reconquistar 
Ceuta em 1415 e alguns anos depois passou a ser o administrador da 
cidade. Em 1427, juntamente com seus navegadores, descobriram a Ilha 
dos Açores, que depois veio a ser ocupada por portugueses. O infante 
também conseguiu licença de Roma para “converter os pagãos africanos” 
em 1485, por meio da bula Romanus Pontifex. Essa bula endossou a 
prática de escravização de homens e mulheres da Guiné, que depois eram 
levados para Lisboa como escravos. Segundo um importante estudioso do Império 
ultramarino português, o historiador inglês Charles Boxer:
Até sua morte, em 1460, o infante dom Henrique foi o 
concessionário de todo o comércio ao longo da costa 
ocidental africana, porém isso não significa que ele próprio se 
encarregasse de todos os negócios. Ao contrário, ele podia (e 
muitas vezes assim procedeu) autorizar comerciantes privados 
e aventureiros a fazer viagens, contanto que lhe pagassem um 
quinto de lucros, ou outra porcentagem combinada (BOXER, 
2002, p. 45). 
Portanto, todo o comércio marítimo esteve dominado pelo Infante e 
consequentemente atrelado aos interesses da monarquia. Após a morte de D. 
Henrique, a Coroa resolveu “terceirizar” os negócios ultramarinos, a partir daí um rico 
mercador de Lisboa, chamado Fernão Gomes, passou a cuidar destes assuntos. 
Sobre esse tema, vale a pena consultar o belíssimo livro de 
Valentim Alexandre: “Velho Brasil, Novas Áfricas”. Portugal: Editora 
Afrontamento, 2004. 
Mesmo não 
fazendo parte 
de um processo 
social planejado, 
contínuo e uniforme, 
Portugal contou 
com governantes 
interessados 
na prática de 
navegação e na 
exploração de novos 
destinos.
13
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
Em 1475, a monarquia retomou novamente o controle. O infante e herdeiro 
do trono, D. João, começou a exercer as atividades dos negócios marítimos. Com 
a morte de seu pai, ele herdou o trono, adotando o nome de D. João II. Obcecado 
por aumentar o comércio, principalmente com a África, durante seu governo 
houve avanços importantes na política ultramarina. Com o objetivo de garantir o 
monopólio português, ele criou um posto em terras africanas: o castelo de São 
Jorge da Mina. 
Durante seu reinado, o navegador português Dio Cão chegou ao Congo em 
1484, estabelecendo contato com a população daquela localidade, o Cabo da Boa 
Esperança foi finalmente contornado em 1488. Outro avanço foi a colonização 
da Ilha de São Tomé e Príncipe, que tornou-se uma espécie de laboratório da 
colonização portuguesa (ALENCASTRO, 2002, p. 75-78). Também no governo de 
D. João II uma disputa com a coroa espanhola foi resolvida, com a promulgação 
do Tratado de Tordesilhas, dividindo o novo mundo entre Espanha e Portugal. 
Esses dois primeiros governos realizaram o processo de 
“conquista” dos territórios ultramarinos lusitanos. A partir deles, ou seja, 
a partir do final do século XV, os sucessores tiveram que administrar 
e, sobretudo, negociar os territórios sob jurisdição de Portugal. Vários 
países ameaçavam os domínios ultramarinos dos lusitanos, tais como 
França, Holanda, Inglaterra e a sempre perigosa vizinha Espanha. 
Essa última unificou o reino de Portugal por mais de meio século, 
período denominado União Ibérica (1580-1640). Para visualizarmos 
melhor os reis desse primeiro momento da conquista ultramarina, todos 
da Dinastia de Avis, devemos observar a lista abaixo: 
Dinastia de Avis
Dom João I (1385-1433)
Dom Duarte (1433-1438)
Dom Afonso V (1438-1481)
D. João II (1481-1495)
Dom Manuel I (1495-1521)
D. João III (1521-1557)
Dom Sebastião (1557-1578)
Dom Henrique (1578-1580)
Vários países 
ameaçavam 
os domínios 
ultramarinos dos 
lusitanos, tais 
como França, 
Holanda, Inglaterra 
e a sempre perigosa 
vizinha Espanha.
14
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
Percebemos que, depois de 1557, os dois governos foram curtos. Depois 
do desaparecimento do rei D. Sebastião na Batalha de Alcácer – Quibir contra os 
muçulmanos, desencadeou-se uma crise dinástica no reino. O sucessor natural de 
D. Sebastião, dada a falta de filhos do monarca, era seu tio, o cardeal Henrique, 
que assumiu o reino quando contava com 70 anos de idade. Com a morte de D. 
Henrique, em 1580, o rei Felipe II da Espanha teceu acordos com a nobreza de 
Portugal e sem maiores confrontos foi coroado rei. Com isso chegava ao fim o 
reinado dos membros da Dinastia de Avis em Portugal. 
Para saber mais sobre a construção da memória envolvendo o 
desaparecimento de D. Sebastião, recomendo o livro de Jaqueline 
Hermann: “No reino do desejado: a construção do sebastianismo em 
Portugal, séculos XVI e XVII”. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. 
Em 1640, uma nova dinastia venceu sucessivas batalhas contra os 
espanhóis e passou a controlar o reino de Portugal, era a dinastia de Bragança. 
Seus descendentes dominaram o reino lusitano até o primeiro quartel do século 
XIX, como podemos observar na lista abaixo:
Dinastia de Bragança
D. João V (1640-1656)
D. Afonso VI (1656 – 1667)
D. Pedro II (1667- 1706)
D. João V (1706-1750)
D. José (1750-1777)
D. Maria I (1777 – 1792)
D. João VI (1792-1816)
Esses foram os governantes que, em menor ou maior grau, administraram 
o território que os portugueses haviam conquistado, com desdobramentos 
significativos a partir do século XIX. Veremos agora como se deu o processo de 
outro fator que ajudou a expansão portuguesa: a religião católica. 
15
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
Se você quiser saber mais sobre a atuação dos padres 
jesuítas, recomendo o livro de Jean Lacouture: “Os jesuítas: os 
conquistadores”. São Paulo: L&PM, 1994. 
Catolicismo e Expansão Ultramarina
Na conversão de povos que os portugueses tiveram, homens, 
mulheres e crianças foram tuteladas por missionários enviados por 
Lisboa e Roma para encontrarem a “verdadeira fé”. Isso fazia com 
que a expansão ultramarina tivesse um lado religioso. Vários textos 
religiosos tornaram-se conhecidos pela população das colônias, por 
meio de mensagens e traduções, tendo em vista que vários dos padres 
missionários aprenderam a língua de africanos e indígenas. 
No reino de Portugal, uma ordem em especial agiu diretamente no 
trabalho espiritual das colônias, era a Companhia de Jesus, com seus 
padres chamados de jesuítas. Fundada por Inácio de Loyola em 1515, 
essa ordem obteve o reconhecimento e aprovação de Roma em 1540, quando 
seu estatuto foi aprovado pelo Papa Paulo III. Seu lema era “defender e proteger 
a fé”, tal lema estava associado principalmente ao contexto de sua criação, que 
era o da Contrarreforma católica, levada a cabo por Roma após a ruptura dentro 
da Igreja Católica provocada pelo monge alemão Martinho Lutero. 
Desde o início, o trabalho missionário dos jesuítas destacou-se, e com ele o 
crescimento da Companhia em Portugal. Nesse reino ergueu-se a primeira sede 
dos Inacianos e Lisboa tornou-se sua Escolapara os assuntos de evangelização. 
As missões saíram para os quatro cantos do planeta, levando a dita fé aos 
indígenas, chamados de gentios, de acordo com os contemporâneos do período 
e justificando por vezes o “comércio do resgate de escravos”, que trocando 
em miúdos era a justificativa para o tráfico de africanos escravizados. Para os 
missionários, o povo indígena, e em parte o africano, era um “povo sem fé, sem 
lei e sem rei”, como descreveu o cronista Perô de Magalhães Gândavo, em seu 
Tratado de 1576. 
Dentre os jesuítas que mais se destacaram na atividade missionária, 
podemos citar os padres Manoel da Nóbrega, Francisco Xavier, José de Anchieta 
e o Padre Antônio Vieira. Vieira atuou em missões evangelizadoras no Brasil e 
escreveu vários textos sobre a religiosidade e expansão. Para Vieira, Portugal 
Na conversão 
de povos que 
os portugueses 
tiveram, homens, 
mulheres e crianças 
foram tuteladas 
por missionários 
enviados por 
Lisboa e Roma 
para encontrarem a 
“verdadeira fé”.
16
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
representava o Quinto Império e seus escritos buscavam inserir o reino português 
como representante da cristandade na Europa. De acordo com Menezes: 
Ao profetizar o estabelecimento do Quinto Império por D. João 
IV, Antonio Vieira coroou uma longa tradição que atribuía a 
Portugal, desde suas origens, o cumprimento de desígnios 
divinos. Contudo, as vésperas do iluminismo, muito mais do que 
sonhar com a expansão, importava mesmo aos portugueses 
manter o que restava de seu combalido império ultramarino 
(MENEZES, 2011, p. 179). 
Nesse sentido, percebemos que para os jesuítas a atuação 
missionária estava umbilicalmente ligada à conquista e subjugação dos 
povos sob o domínio português. 
Outra ordem que ajudou na colonização dos povos subjugados 
foram os capuchinhos. No entanto, a hierarquia desses religiosos 
estava concentrada em Roma e seus interesses estavam bem mais 
ligados aos espanhóis, franceses e membros dos reinos italianos. Isso fez com 
que os capuchinhos fossem rivais dos jesuítas em vários empreendimentos, 
principalmente após o fim da União Ibérica, em 1640, quando os portugueses 
tiveram dificuldades para obter o reconhecimento de sua independência frente à 
Espanha pelo Papado. 
Para os jesuítas 
a atuação 
missionária estava 
umbilicalmente 
ligada à conquista 
e subjugação dos 
povos sob o domínio 
português.
Para uma análise da presença da Igreja nos negócios 
ultramarinos, veja o filme “1492: a Conquista da América”. Ano: 1992. 
País: Estados Unidos. Diretor: Ridley Scott. Duração: 150 minutos. 
Navegação e Força Militar
Portugal conseguiu dominar vários povos principalmente pelas armas e pela 
tecnologia que desenvolveu. Os barcos portugueses eram os mais poderosos, 
capazes de cruzar o atlântico sem maiores dificuldades, guardar diversos 
mantimentos e travar combate no litoral das regiões a serem ocupadas. 
Os navios utilizados pelos portugueses eram as caravelas e as naus. As 
caravelas eram navios pequenos e de fácil navegação. O navegador Pedro 
Álvares Cabral, ao chegar ao território que viria a ser a América portuguesa, 
estava pilotando uma delas. Bartolomeu Dias, primeiro navegador que contornou 
17
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
o Cabo da Boa Esperança, também estava pilotando uma caravela. 
Uma das limitações desse tipo de embarcação era que, pela sua 
leveza, ela não podia abrigar muitos tripulantes, coisa que para 
uma viagem longa atrapalhava. Por isso, desenvolveu-se um outro 
navio bem mais poderoso, com uma capacidade maior de navegação, grande 
poder de aparelhamento militar e com mais espaço para transportar tripulantes 
e especiarias. Durante todo o século XVI, a embarcação que chegou ao litoral 
africano e na Índia, responsável por patrulhar os mares americanos, era a nau, 
utilizada até o século XVIII nas viagens lusitanas pelo mar. Conforme assevera 
Boxer, “as embarcações que durante trezentos anos participaram da Carreira da 
Índia eram basicamente, e sobretudo, as naus, mas essa palavra abrangia ampla 
variedade de significados”. Vejamos um exemplo dos dois barcos, primeiro uma 
Caravela, e depois uma Nau. 
Os navios utilizados 
pelos portugueses 
eram as caravelas e 
as naus.
Figura 01 - Caravela portuguesa
Fonte: Disponível em: <http://www.dightonrock.com/
osnordicosnuncativeramnadaaverco.htm>. Acesso em: 10 set. 2012.
Figura 02 - Nau portuguesa
Fonte: Disponível em: <http://www.prof2000.pt/users/hjco/
descoweb/pg000400.htm>. Acesso em: 10 set. 2012.
http://www.dightonrock.com/osnordicosnuncativeramnadaaverco.htm
http://www.dightonrock.com/osnordicosnuncativeramnadaaverco.htm
http://www.prof2000.pt/users/hjco/descoweb/pg000400.htm
http://www.prof2000.pt/users/hjco/descoweb/pg000400.htm
18
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
Outro grande aliado do reino português em sua conquista pelo ultramar 
era seu poder militar. Desde o fim da Restauração, o governo lusitano contava 
com forças regulares em seu quadro, ou seja, oficiais pagos, vivendo do 
trabalho militar. Foram estes homens que entraram em confronto com indígenas, 
africanos e muçulmanos. Aliada a essa força composta por soldados pagos, 
havia outra não paga, formada por membros não remunerados da sociedade 
civil, chamada de milícias. Também se contava com uma cavalaria bem-
formada, como veremos mais adiante. A estratégia de importar cavalos via 
oceano Atlântico tornou-se um mecanismo importante para vencer aqueles 
que resistiam aos avanços portugueses. Geralmente, homens que cometiam 
crimes em Portugal e escapavam da morte eram banidos do reino, estes eram 
denominados degredados. Seu banimento era primordialmente para as colônias, 
na África, Ásia e América. Ao chegarem nessas localidades, os degredados 
eram automaticamente incorporados ao Exército, essa era uma forma rápida, 
fácil e barata de a Coroa recrutar soldados. Nas colônias, além de todas essas 
forças, os portugueses também cooptavam lideranças locais para formar forças 
com pessoas que conheciam bem a região. As forças locais recrutadas eram 
chamadas de terços, organizados da seguinte forma:
O terço deveria ser formado por 2.500 soldados, repartidos 
em dez companhias, compostas, cada uma, de 250 homens, 
todos subordinados ao capitão-mor (ou mestre-de-campo). 
Estas companhias, sob o comando de um capitão, por sua vez, 
deviam se dividir em dez esquadras de 25 homens. O capitão 
de companhia tinha a seu serviço um alferes, um sargento, um 
meirinho, um escrivão, dez cabos de esquadra e um tambor. O 
capitão-mor possuía ele mesmo uma das companhias, que era 
servida também por um sargento-mor, seu substituto natural, 
e por quatro ajudantes. No caso das ordenanças, os senhores 
ou os donos das terras de um termo deveriam, a princípio, 
ser automaticamente providos no comando das tropas como 
capitães (PUNTONI, 1999, p. 190). 
Esses terços atuavam com uma estratégia bem diferente nas 
colônias, readaptando-se à realidade local. Se na Europa os prisioneiros 
recebiam lugar para descanso e recuperação, com uma guerra pautada 
no movimento das tropas e ataques pelos flancos, na colônia era 
diferente, a guerra era marcada por confrontos violentos e a aniquilação 
total do inimigo. Muitos indígenas foram combatidos com a justificativa da 
Guerra Justa (MONTEIRO, 1994). A utilização de armas de fogo difundiu-
se e na África os principais confrontos tiveram uso deste equipamento. 
Na África, Índia ou em Estados africanos organizados no novo 
Mundo, como o Quilombo de Palmares, por exemplo, as técnicas foram 
estas: confrontos violentos, uso da população local e utilização de armas 
de fogo e fortalezas. Sem dúvida a estratégia militar dos portugueses 
favoreceu a conquista em suas colônias.
Na África, Índia 
ou em Estados 
africanos 
organizados no 
novo Mundo, 
como o Quilombo 
de Palmares, 
por exemplo,as 
técnicas foram 
estas: confrontos 
violentos, uso da 
população local e 
utilização de armas 
de fogo e fortalezas.
19
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
Conversando com a Historiografia 
Brasileira
Autores brasileiros, principalmente os clássicos, questionaram o sucesso dos 
portugueses e sua herança na formação do povo brasileiro e o ser brasileiro. No 
contexto da década de 1930, aqueles que vieram a passar pela posteridade como 
sendo a tríade de interpretação do Brasil deixaram suas impressões sobre os 
sucessos dos lusitanos. Vamos ver agora rapidamente a opinião desses autores 
sobre as motivações do sucesso dos portugueses. 
Gilberto Freyre e seu famoso livro “Casa Grande & Senzala”, 
publicado em 1933, buscou compreender a origem do povo brasileiro, 
identificando o etrê nacional como mestiço. Seu trabalho esmiúça o 
contato entre europeus, indígenas e negros. Dotado de uma grande 
capacidade narrativa, Freyre conduz o leitor ao universo privado dos 
domínios senhoriais. Nesse universo predominavam relações lascivas 
e sexuais, envolvendo portugueses, indígenas e africanos. Tais 
contatos teriam forjado o povo brasileiro. Para maiores detalhes sobre 
o texto e sua argumentação, sugiro a leitura do livro, disponível em 
livrarias e várias bibliotecas públicas.
No que tange ao nosso objetivo, o autor busca, antes de adentrar o 
universo senhorial, traçar um perfil dos conquistadores portugueses. Esses, ao 
lançarem-se ao mar, possuíam um determinismo para a miscigenação, devido ao 
domínio muçulmano na península ibérica. Para demonstrar a potencialidade de 
mestiçagem que os portugueses, em sua gênese, possuíam, ele trabalha com a 
lenda da mora encantada: 
O longo contato com os sarracenos deixara idealizada entre 
os portugueses a figura da “moura encantada”, tipo delicioso 
de mulher morena e de olhos pretos, envolta em misticismo 
sexual – sempre de encarnado, sempre penteando os 
cabelos ou banhando-se nos rios ou nas águas das fontes 
mal-assombradas – que os colonizadores vieram encontrar 
parecido, quase igual, entre as índias nuas e de cabelos soltos 
do Brasil. Que estas tinham também os olhos e os cabelos 
pretos, o corpo pardo pintado de vermelho, e, tanto quanto 
as nereidas mouriscas, eram doidas por um banho de rio 
onde se refrescasse sua ardente nudez e por um pente 
para pentear o cabelo. Além do que, eram gordas como as 
mouras. Apenas menos ariscas: por qualquer bugiganga ou 
caco de espelho estavam se entregando, de pernas abertas, 
aos “caraíbas” gulosos de mulher (FREYRE, 2006, pp. 12-16).
Gilberto Freyre e 
seu famoso livro 
“Casa Grande & 
Senzala”, publicado 
em 1933, buscou 
compreender 
a origem do 
povo brasileiro, 
identificando o 
etrê nacional como 
mestiço.
20
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
Percebemos nessa descrição as características principais do autor, quanto 
ao seu modelo e sua argumentação. Segundo ele, o sucesso do reino em suas 
aventuras estava associado à capacidade de miscigenação e adaptação. Evidente 
que o autor adotou o critério antropológico e sexual para descrever as motivações. 
E outros autores, como fizeram? Veremos agora. 
Sérgio Buarque de Hollanda, em seu livro “Raízes do Brasil”, publicado 
originalmente em 1936, também se debruçou sobre a colonização portuguesa. 
Pensando na realidade do Brasil, o autor questionou-se sobre os motivos que 
fizeram com que Portugal tivesse sucesso e não outros reinos mais organizados, 
como Holanda e Espanha. Segundo ele, os portugueses, ao contrário dos ingleses 
que colonizaram as treze colônias, os castelhanos das América espanhola 
não demonstravam um orgulho de raça exacerbado, tampouco uma vontade 
expressiva de impor ao outro sua cultura. Essa falta de orgulho fez com que a 
colonização portuguesa alcançasse êxito. Entre trazer as parafernálias industriais 
europeias para adaptar no novo mundo, ou praticar uma agricultura seminômade, 
em conformidade com as adotadas pelos indígenas, eles, sem dúvida, preferiram 
a segunda. Entre dormir em camas, como praticado na Europa ocidental, ou dormir 
em redes como os habitantes do novo mundo naquele período, eles também 
escolheram deliberadamente a segunda alternativa. O espírito aventureiro, e não 
altaneiro dos lusitanos, fizeram toda a diferença, para o sucesso de conquista do 
novo mundo. Como Sérgio Buarque definiu brilhantemente:
A colonização portuguesa na América aconteceu de modo 
desleixado. Fizeram-no com uma facilidade que ainda não 
encontrou, talvez, segundo exemplo na história. Onde lhes 
faltasse o pão de trigo, aprendiam a comer o da terra, e com tal 
requinte, que afirmava Gabriel Soares – a gente de tratamento 
só consumia farinha e mandioca fresca feita no dia. Habituaram-
se também a dormir em redes a maneira dos índios. Aos índios 
tomaram ainda os instrumentos de caça e pesca, embarcações 
de casca ou tronco escavado que singravam os rios e águas do 
litoral, modo de cultivar a terra ateando primeiramente fogo ao 
mato (BUARQUE DE HOLLANDA, 1997, p. 46).
Dessa forma, mesmo trilhando caminhos opostos ao de Freyre para 
compreender a formação brasileira, observam-se semelhanças quanto aos 
resultados obtidos pelos dois autores. Ambos atribuem à capacidade de adaptação 
e miscigenação dos portugueses o sucesso em seus projetos de colonização. 
Para completar a análise de importantes intérpretes brasileiros que 
analisaram a colonização portuguesa, finalizamos com o livro “Formação do 
Brasil contemporâneo”, escrito por Caio Prado Jr no ano de 1942. Para o autor, 
a aventura marítima lusitana aconteceu principalmente por motivações sociais 
e econômicas. Afinal, seria difícil para um reino paupérrimo, carente de solo 
adequado para o cultivo de alimentos, obter recursos sustentáveis internos. Isso 
21
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
levou os portugueses, acostumados com o trabalho marítimo, a buscar 
recursos externos. A pilhagem e a exploração para fins econômicos dos 
portugueses, que criaram aqui uma colônia montada com o objetivo de 
explorar ao máximo o recurso de suas colônias, caracterizava-se como 
uma colonização de exploração, diferente do tipo de colonização que 
a Inglaterra empregou em suas colônias no Novo Mundo. Essa seria 
empreendida como colônias de povoamento. Logo, para Caio Prado 
Jr, o “sentido da colonização” portuguesa estaria nos seus mais de três 
séculos de exploração da população da colônia (PRADO JR, 1994).
Depois de apresentar como Portugal alcançou seu sucesso e 
como a historiografia clássica sobre o Brasil interpretou a passagem 
dos portugueses por aqui, vamos observar como todos esses 
mecanismos de expansão foram aplicados na África Central. 
Depois de 
apresentar como 
Portugal alcançou 
seu sucesso e como 
a historiografia 
clássica sobre o 
Brasil interpretou 
a passagem dos 
portugueses 
por aqui, vamos 
observar como 
todos esses 
mecanismos de 
expansão foram 
aplicados na África 
Central.
O Reino do Congo e os Portugueses
Quando Diogo Cão desembarcou novamente – era a segunda vez que ele 
aportava – na nascente do rio Zaire, seu objetivo era iniciar contatos amistosos 
com a população daquele reino até então desconhecido. Desde os primeiros 
contatos, vários fatores determinaram seu sucesso e a religião acabou sendo 
o primeiro e mais importante deles. Como vimos anteriormente, o catolicismo 
representava uma importante arma para o domínio português no ultramar, e na 
África Central não era diferente. Claro que essa relação era mais dialógica do 
que pensamos, pois havia também no reino do Congo uma religiosidade própria 
da cultura daquele povo. Para o africanólogo Alberto da Costa e Silva, uma das 
hipóteses que fez com que os súditos do rei do congo aceitassem os portugueses 
caminhava exatamente ao encontro desses pressupostos existentes:
Dizem também que os homens que baixaram das embarcações 
tinhama pele desbotada, falavam uma língua que não se 
entendia e foram tidos como espíritos. Talvez tenha sido 
assim. E talvez os congos da foz do rio Zaire também tenham 
tomado os recém-vindos por seus antigos mortos ou por entes 
sobrenaturais das águas ou da terra. Haviam surgido do oceano 
– o oceano que bem podia ser o calunga, ou as grandes águas 
que ninguém jamais atravessara em vida e que separavam o 
mundo dos vivos do mundo dos mortos (SILVA, 2002, p. 359).
Assim, talvez para os congoleses a chegada daqueles homens brancos 
vindos do mar significasse algo metafísico. Daí a certa facilidade de aceitação 
que Diogo Cão conseguiu no reino do manicongo. Quando de sua volta, o 
navegador trouxe consigo dois africanos e deixou dois portugueses, como mostra 
de confiança mútua. Após dois anos, quando retornou, ele trouxe de volta os 
22
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
dois africanos, agora vestidos à moda europeia e falando o idioma português. 
Neste momento, os contatos entre os dois reinos estreitaram-se ainda mais. O 
manicongo ouviu atentamente os relatos dos dois homens e ficou encantado com 
a riqueza e o poder do soberano português. Animado por tais relatos, o rei do 
Congo enviou uma embaixada ao rei português D. João II. A embaixada levou 
muitos presentes ao soberano lusitano, como dentes de elefante, objetos de 
marfim e panos de ráfia. Entre os pedidos do manicongo estava a instrução de 
dois rapazes enviados para estudar, e o envio de padres católicos para instruí-los 
na religião. O rei português acolheu todos os pedidos, era a oportunidade que 
o monarca queria para começar um estreito diálogo com o manicongo (SILVA, 
2002, p.401).
Quando os portugueses atracaram no reino do Congo ele era composto pela 
capital Banza Congo e algumas províncias: Soyo, Sundi, Pemba, Bata, Pambo. 
Cada província possuía um governador que possuía o título de Ngola ou Mani. 
Todos os governadores pagavam tributo ao rei e também lhe deviam obediência, 
o rei era chamado de manicongo e morava na capital. Havia rivalidades entre 
os chefes locais e o manicongo, todos os representantes das elites tencionavam 
conseguir em algum momento o poder, e para isso era importante aliar-se ao 
poderoso homem branco, vindo do mar. 
O primeiro chefe local que se batizou e converteu-se ao 
cristianismo morava na província do Soyo. Em 1489, antes mesmo do 
manicongo, ele deixou de chamar-se Nzinga a Nkuwa para ser batizado 
com o nome cristão de D. Manuel. A justificava apresentada pelo agora 
D. Manuel para se batizar antes do manicongo era por ser mais velho 
(SOUZA, 2002, cap. 02). No mesmo dia de seu batismo, após uma 
grande festa, tudo o que os padres portugueses compreendiam como objetos de 
idolatria, como imagens e rituais de sacerdócio, tornou-se cinzas. 
Depois de algum tempo, o manicongo demonstrou desejo de ser batizado. 
Em 1491, Nzinga Kuwu mandou construir uma igreja de pedra e cal para esse 
fim. Oficialmente, o reino do Congo tornou-se o primeiro reino africano e católico, 
isso não significa que o catolicismo adotado no reino fosse puro, ele significou, 
sobretudo, uma aliança poderosa com um reino superior militarmente, dono de 
uma tecnologia desconhecida, além de tornar possível às elites locais ampliar 
negociações fora do continente africano. O manicongo talvez tenha percebido 
uma oportunidade maior de aceitar a religião dos europeus no momento em que 
entrou em guerra com os angicos, habitantes do norte do reino. O soberano e 
seus soldados venceram a guerra, levando para o campo de batalha água benta, 
enviada pelo Papa Inocêncio VIII, uma bandeira de cruzado, barcos e arqueiros 
que o seu irmão de fé, o rei de Portugal, lhe mandara. 
 O primeiro chefe 
local que se batizou 
e converteu-se ao 
cristianismo morava 
na província do Soyo.
23
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
Em 1509, o manicongo morreu e seu herdeiro natural seria seu filho Mpanzu 
a Kitima, mas em luta financiada pelos portugueses, D. Afonso, batizado junto com 
seu pai, assumiu o trono. Seu irmão derrotado contou com o apoio dos antigos 
sacerdotes do reino e de lideranças contrárias à aliança com os portugueses. 
D. Afonso buscou tornar o reino do Congo irmão do reino português. Vários 
acordos foram estabelecidos. D. Manuel, rei de Portugal, mandou para o reino do 
Congo vários profissionais, como professores, pedreiros, técnicos em assuntos 
militares, e recebia em Lisboa filhos da elite congolesa para estudar em seu reino. 
O interesse em aproveitar as inovações que o reino europeu trazia era 
imenso, uma escola elementar foi criada na capital Mbanza Congo, cujo professor 
era africano, mas havia estudado em Lisboa. Ademais, o monarca congolês 
também ficou conhecido por ser um cristão fervoroso. Católico devoto, aprendeu 
rapidamente a ler e a escrever em língua portuguesa. Relatos de contemporâneos 
dizem que D. Afonso passava noites em claro lendo biografias de santos. Dono 
de uma capacidade de expressão notável, o rei converteu pessoalmente boa 
parte da nobreza contrária à adoção do catolicismo. Se pensarmos nos relatos de 
contemporâneos e na historiografia sobre o Congo, dificilmente vamos duvidar da 
sinceridade de conversão do rei (GONÇALVES, 2011).
A instrução tornou-se uma poderosa arma de distinção no reino do Congo. No 
início havia um intérprete português responsável pelo envio de cartas a Portugal, 
depois os filhos da aristocracia fizeram o esforço e conseguiram dominar a fala e 
a escrita em português, isso tornou-se um ponto de legitimação dessa linhagem. 
Felizmente para os historiadores o número de cartas escritas por africanos e pelo 
próprio rei Afonso I ao rei de Portugal, e por outros monarcas do reino no século 
XVII, é grande. Infelizmente para os interessados e pesquisadores brasileiros, 
esse material não existe publicado no país. 
Talvez pela grande quantidade de documentos sobre o reinado de D. 
Afonso I, variadas são as lendas que pairam sobre sua vida, uma das mais 
citadas pela historiografia é a de que o monarca enterrou viva sua mãe 
Leonor. Tais lendas, vale a pena dizer, foram escritas cem anos depois de 
seu reinado por missionários capuchinhos (THORNTON, 2004). 
Outro ponto também importante de seu reinado foi além das 
trocas, elaborou-se uma legislação entre os dois reinos, os regimentos. 
Elaborado por Portugal, essa legislação dava conselhos e normatizava 
procedimentos que os africanos deveriam adotar. O lusitano que levou 
às mãos do rei do Congo esse documento, Simão da Silva, tornou-se conselheiro 
do manicongo em todo seu governo. A influência portuguesa no reino do Congo 
era enorme, tanto que a nobreza congolesa adotou títulos nobiliárquicos europeus: 
Elaborou-se uma 
legislação entre 
os dois reinos, 
os regimentos. 
Elaborado por 
Portugal, essa 
legislação dava 
conselhos e 
normatizava 
procedimentos 
que os africanos 
deveriam adotar.
24
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
viscondes, duques, condes e marqueses. O rei enviou seu filho, D. Henrique, para 
estudar em Portugal, depois de sua volta ele tornou-se o primeiro bispo nascido 
no Congo e assumiu a representação religiosa de Roma junto à população. Após 
a morte de D. Afonso I houve uma ferrenha disputa pelo controle do trono, e os 
portugueses apoiaram quem não merecia, de acordo com as normas locais, 
ocupá-lo. Tentarei resumir brevemente essa disputa. 
Os portugueses apoiaram e conseguiram colocar no trono o filho primogênito 
de D. Afonso I, chamado D. Pedro I. Seu reinado, porém, seria muito curto, pois 
segundo os costumes locais ele não poderia assumir o trono por conta de sua mãe, 
que não era a primeira mulher do rei. Quatro anos depois que assumiu o poder, 
ele perdeu o trono, as elites locais conseguiram emplacar o neto de D. Afonso I, 
chamado D. Henrique, no cargo. A partir do reinado de D. Henrique iniciou-se um 
processo dramáticode luta pelo poder no reino. Este último foi assassinado por 
seu irmão, D. Bernardo I, que o sucedeu entre os anos de 1561 e 1567. Morto 
numa batalha, seu filho, D. Henrique I, entrou em seu lugar, este também morto 
em confronto cedeu lugar a seu filho, D. Álvaro I, em 1568, que teve um reinado 
muito difícil, pois enfrentou represálias armadas do jovem soberano português 
D. Sebastião pela morte de alguns europeus no reino, e uma dramática batalha 
contra os Jagas, povos guerreiros que habitavam as regiões fronteiriças do reino. 
Quem substituiu D. Álvaro I foi seu filho, D. Álvaro II, em 1596. Ele conseguiu 
restabelecer uma relação amistosa com Portugal e em seu governo foi criada 
a diocese do Congo e Angola. Após sua morte, quem o substituiu foi seu tio, 
alegando a pouca idade do filho do antigo soberano, e com a ajuda de pessoas 
influentes, D. Bernardo conseguiu o reino em 1614. Após a morte desse soberano, 
uma nova disputa estabeleceu-se e vários soberanos tiveram curtos reinados no 
Congo. Entre 1614 e 1650, o reino teve nada mais, nada menos, que 10 reis. O 
que fica caracterizado nesse período pode ser, grosso modo, definido como o 
início da centralização do poder, inaugurada por D. Afonso I. Ademais, o reino, 
mesmo com a presença dos portugueses, conseguiu manter sua autonomia. 
Tal autonomia esteve ligada principalmente ao catolicismo, trazido pelos 
próprios portugueses. Desde o reinado de Afonso I, reis congoleses obtiveram 
uma instituição de apelo, por conta de suas relações privilegiadas com Roma. No 
começo da catolização do reino do Congo, as elites locais tentaram controlar o 
processo missionário. Exemplo disso foi a escolha do filho do rei para ocupar o 
bispado da capital Mbanza Congo, que posteriormente teve outro nome e passou 
a chamar-se São Salvador. Essa religiosidade, porém, não passou incólume ao 
seu contato com os reinos africanos. Para Reginaldo:
Alguns indivíduos eram capacitados e socialmente reconhecidos 
como intermediários entre eles, como os nganga. Com o auxílio 
de minkisi (plural de nkinsi), “objetos mágicos indispensáveis 
à execução dos ritos religiosos”, prestavam serviços privados 
25
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
ou, em determinadas situações, sociais comunitários. Nos 
primeiros catecismos e dicionários de kikongo, elaborados 
nos séculos XVI e XVII, os sacerdotes católicos também eram 
denominados ngangas e os objetos de culto cristão minkisi. É 
possível que, por um lado, os sacerdotes quisessem assumir 
o lugar dos ngangas, de outra perspectiva, também é preciso 
reconhecer que a informação primária, que permitia a tradução 
para os idiomas europeus, provinha dos próprios congueses 
(REGINALDO, 2011, p. 20). 
Observamos que, para a autora, a prática religiosa congolesa esteve sempre 
ligada à sua ancestralidade. Mesmo convertidos, tais homens, mulheres e crianças 
jamais deixaram de esquecer a calunga e a representatividade que os Deuses que 
eram louvados antes da chegada dos europeus tinham. Assim, fica difícil pensarmos 
em um catolicismo próprio, europeu, o que realmente acontecia era um catolicismo 
africano, uma miscelânea religiosa em que portugueses e africanos reinventaram 
uma nova religião, baseada largamente no catolicismo europeu. 
Os congoleses souberam explorar as rivalidades envolvendo as ordens. 
Em 1645, chegaram ao Reino missões capuchinhas, compostas principalmente 
por italianos, estes eram naturalmente rivais dos jesuítas e dos portugueses. Ao 
contrário dos Inacianos, essa ordem estava subordinada diretamente a Roma, 
e sua chegada esteve concentrada principalmente no momento em que Lisboa 
estava em atrito com Roma, pois o Papa não havia reconhecido a independência 
do reino de Portugal frente a Espanha no período. Por vezes, os opositores dos 
capuchinhos, diziam que eram eles inimigos do reino de Portugal e infiltrados 
de Castela. Sofrendo uma situação hostil os padres, por outro lado, levaram as 
reivindicações do reino do Congo para Roma, fazendo com que os portugueses 
não levassem a cabo uma política de domínio como aquela efetuada em Luanda. 
Dessa forma, a religiosidade serviu bem ao propósito dos africanos do reino do 
Congo, ao menos até a Batalha de Ambuíla, de 1665. 
Angola Portuguesa
Para compreendermos a presença portuguesa em Angola, é 
necessário remontarmos até 1575, ano em que Paulo Dias de Novais, 
neto de Bartolomeu Dias, estabeleceu-se em Luanda como governador. 
Num primeiro momento, a tentativa dos portugueses era de estabelecer 
na região uma colonização parecida com a do Brasil, por meio de 
concessão de territórios e a fundação de algumas fortalezas no interior: 
Massanango, Cassange, Ambaca, Muxima. Novais recebeu a carta e 
assumiu os compromissos para com a Coroa de colonizar e explorar 
aquela terra, que não lhe pertencia. 
Para 
compreendermos 
a presença 
portuguesa em 
Angola, é necessário 
remontarmos até 
1575, ano em que 
Paulo Dias de 
Novais, neto de 
Bartolomeu Dias, 
estabeleceu-se 
em Luanda como 
governador.
26
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
Os povos que habitavam a região eram principalmente os Ibamgalas, 
Jagas e Andongos. O nome Angola foi dado em primeiro lugar pelos europeus 
que habitavam a região, pois os reis eram chamados de Ngola, alguns de mani, 
dada a proximidade com o Congo. O nome que os habitantes naturais do lugar 
chamavam Angola era Dongo. O regime de governo era descentralizado, não 
havia uma um único soberano, os reinos eram em parte independentes, cada 
cidade possuía um governador que recebia as honras de um rei, seu Ngola. Os 
reinos mais poderosos eram o Dongo, Matamba e Cassange. 
No começo de sua estadia, Novais estabeleceu uma relação amistosa 
com o mais importante governante local, responsável pela Ilha de Luanda, este 
identificou o perigo de ter um estrangeiro em suas fronteiras apenas em 1580, 
quando entrou em confronto armado com os portugueses. A guerra entre Novais 
e o Ngola durou nove anos, recheada de vitórias e derrotas para ambos os lados, 
com uma vantagem inquestionável para os lusitanos. Tal vantagem decorria 
principalmente das armas dos portugueses. Além da capacidade de recrutar 
degredados de outras colônias, os portugueses valiam-se do uso de armas de 
fogo, e utilizavam em suas campanhas cavalos importados do Brasil. Esses 
animais, além de concederam vantagens no campo de batalha, causavam medo 
na maioria dos africanos. 
Na visão das autoridades, a principal vantagem do uso de 
cavalos viria do suposto terror que estes animais produziam 
nos africanos. Tal visão é atestada por numerosos relatos do 
século XVI e XVII. Segundo o governador Fernão de Souza, 
o terror dos africanos em relação aos cavalos era tamanho 
que tornaria desnecessário o uso de arcabuzes pelas tropas 
governamentais. Mais tarde o ex-governador Francisco 
Vasconcellos da Cunha afirmou que os africanos têm mais 
medo de 20 cavaleiros do que de duas companhias da 
infantaria (FERREIRA, p. 12).
Essa visão africana sobre os cavalos, evidentemente não durou todo 
o processo de colonização, mas acabou sendo substancial para as vitórias 
lusitanas. Se durante o período de Guerra com o primeiro governador não 
podemos proclamar um vencedor, ao menos se pode dizer que as ocupações e 
a iniciativa da guerra era toda dos europeus. Enquanto o rei estava defendendo 
seu povo e seus privilégios de comércio, os portugueses acreditavam que Angola 
era um novo Peru, e que tinha vários campos de Prata e demais metais preciosos 
(GLASGOW, 1982).
Em 1591, o rei Felipe II da Espanha e Portugal rescindiu as capitanias 
hereditárias e nomeou um governador-geral para Angola. Essa mudança 
institucional fez com que os andongos sitiassem os portugueses, que ficaram 
restritos em seus fortes. Em 1602 houve uma reviravolta e o Ngola foi derrotado. 
27
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
Finalmenteos portugueses chegaram às suas cobiçadas minas, que no final 
compunham-se apenas de chumbo. A coroa espanhola controlava então o reino, 
sempre, claro, tendo que encarar revoltas de alguns Ngolas do interior (idem).
Em 1617, chegou a Luanda o novo governador-geral, Luís Mendes de 
Vasconcelos, com grandes propósitos: manter a paz no território, conter o comércio 
ilegal de escravos, estancar a corrupção e desvencilhar-se dos imbangalas 
“comedores de carne humana”. No mesmo ano de sua chegada, depois de 
sangrentas disputas sucessórias, subiu ao trono Ngola Mbandi, marcado por sua 
crueldade. 
Podemos perceber até aqui o quanto a força militar e a luta armada estiveram 
presentes na ocupação portuguesa em Angola. Ao contrário do reino do Congo, 
onde houve uma negociação e uma tentativa de assimilação por meio da religião, 
na vizinha Angola o modus operandi era diferente. 
O que os portugueses não contavam, no caso angolano, era com 
o contexto atlântico europeu. A Holanda criou uma companhia para 
rivalizar com os portugueses e conquistar territórios no ultramar. Em 
1630, os holandeses invadiram Pernambuco, permanecendo por lá 
14 anos, não satisfeitos, avançaram também sobre as possessões 
africanas dos lusitanos. 
O que os 
portugueses não 
contavam, no caso 
angolano, era com 
o contexto atlântico 
europeu.
Para saber mais sobre a ocupação holandesa em Pernambuco, 
ver: Evaldo Cabral de Mello. Olinda restaurada: guerra e açúcar no 
nordeste (1630-1654). São Paulo: Editora 34, 2007. 
Os holandeses estavam presentes na região desde, ao menos, 1622, quando 
comerciavam com o Nsoyo. Nesse período, uma rainha guerreira de Matamba 
havia entrado em guerra com seu irmão pela disputa do poder. O irmão, Ngola 
Aire, apoiado por portugueses, impôs em vários momentos derrota para sua irmã, 
inimiga dos portugueses. 
Como inimiga dos lusitanos, Nzinga se viu em uma posição difícil, pois 
não possuía armas à altura, e não tinha o poder de recrutar gente de outras 
regiões, como ocorria com os portugueses. Uma importante estratégia da rainha 
foi negociar com os inimigos de Portugal. Assim, a rainha teceu alianças com a 
comunidade dos ambundos e com os holandeses. Para Roy Glasgow, “somente 
28
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
em 1647 que se firmou uma tríplice aliança entre holandeses, congoleses e 
ambundos com o compromisso de empreender uma investida conjunta para 
exterminar os exércitos lusos” (GLASGOW, 1982, p. 128). A rainha conseguiu 
em determinado momento juntar forças para combater seus inimigos. Conhecida 
por sua alta educação e capacidade de diálogo, a rainha conhecia bem o idioma 
português e os costumes católicos. 
Nzinga havia sido batizada em 1622 e seu nome cristão era Ana de Souza, 
sua desenvoltura e capacidade de oratória eram conhecidas há muito tempo 
pelos portugueses. Quando esteve em Luanda, negociando com o governador 
português, após o governador deixá-la de pé e sentar-se em sua cadeira, ela não 
titubeou e pediu para que um dos seus servos se postasse de cócoras para ela 
sentar sobre suas costas e negociar em pé de igualdade com o representante 
da coroa europeia. A aliança com os holandeses não surtiu muito efeito, pois os 
flamengos estavam sem força no período em que Nzinga os procurou, faltando 
pouco para a reconquista de Angola por Portugal. 
A expulsão dos holandeses de Angola não teve quase nenhum tipo de 
envolvimento da nobreza de Lisboa, ela foi patrocinada por membros da elite 
baiana e pernambucana. Uma tropa patrocinada pelo nobre Salvador de Sá 
Benevides, composta por negros do terço dos Henriques de Pernambuco, 
degredados indianos e portugueses, além de soldados pagos brasileiros, 
conseguiu reconquistar Luanda. Esse patrocínio vai ao encontro das afirmações 
do historiador Luiz Felipe de Alencastro, que em seu livro “O trato dos viventes” 
levanta a hipótese plausível e interessante de que as autoridades portuguesas 
entendiam a região de Angola como parte do novo mundo da América. 
Nzinga, no entanto, continuou sua batalha. Dez anos depois ela ainda 
estava em guerra, utilizando os mais variados recursos, talvez tenha pensando 
também em utilizar-se da religião, como os membros da dinastia congolesa. Em 
1657, missionários capuchinhos conseguiram fazer com que a rainha aceitasse 
novamente a fé católica. Lembrando que os capuchinhos eram rivais dos 
portugueses, ou ao menos encarados como tal no reino de Angola e Luanda. 
A rainha combateu de forma heroica os portugueses, enfrentando todos seus 
recursos bélicos, utilizando todos os artifícios que havia ao seu alcance. Para seu 
biógrafo:
A rainha Nzinga simbolizou o primeiro movimento de 
resistência sistemático africano à dominação portuguesa. 
Tendo um compromisso total e absoluto para com a libertação 
e o nacionalismo angolanos, ela foi de 1620 até sua morte 
em 1663, a personalidade mais importante de Angola. Nzinga 
fracassou na missão de expulsar os portugueses e de se tornar 
29
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
rainha da “Etiópia Oriental”, incluindo Matamba e o Dongo. 
Entretanto, sua importância histórica transcende esse fracasso, 
pois despertou e encorajou o primeiro movimento nacionalista 
de que se tem conhecimento na África Central, organizando 
uma aliança nacional e internacional em sua oposição total à 
dominação europeia (GLASGOW, 1982, p.177).
Sua morte aconteceu 1663, seu legado continou. Hoje ainda 
temos grupos de capoeira, maracatu, com o nome da soberana. Dentre 
os nomes africanos que batizam várias crianças brasileiras, esse 
é o mais recorrente. O seu nome abrasileirado tornou-se sinônimo 
da dança utilizada por capoeiras, a Jinga. Talvez, esse legado tenha 
atravessado séculos por conta dos guerreiros dessa soberana. Depois 
de sua morte, cerca de 7000 deles foram escravizados e enviados para 
o Brasil. Tal escravização aconteceu depois de uma importante batalha, 
que mudou a história da África Central. 
Sua morte 
aconteceu 1663, 
seu legado continou. 
Hoje ainda temos 
grupos de capoeira, 
maracatu, com o 
nome da soberana.
A princípio, a 
batalha aparentava 
certo equilíbrio. Os 
portugueses, em 
menor número, 
organizaram suas 
formas em forma 
de quadrado, 
buscando atingir 
preferencialmente 
as chefias 
congolesas.
A Batalha de Ambuíla
O governador-geral André de Vidal Negreiros, depois de fazer uma aliança 
com os Imbangala, derrotar os Jagas e as forças da rainha Nzinga, estava 
convencido de que era chegada a hora de derrotar o reino do Congo, que havia 
aproveitado sua religiosidade para segurar a invasões portuguesas. 
O ataque estava sendo organizado há alguns meses. Negreiros conseguiu 
autorização de Lisboa para ocupar as minas do Congo. Reuniu várias tropas, 
desde soldados remanescentes da expulsão dos holandeses, militares 
profissionais enviados de Lisboa, degredados, munidos de armas de fogo e dos 
temidos cavalos. Ao todo foram reunidos cerca de seis a sete mil soldados. Sob a 
chefia do experimentado comandante Luís Lopes de Serqueira, marcharam para 
Ambuíla em 1665.
Do outro lado, o soberano congolês D. Antônio I não deixou por 
menos. Convocou às armas qualquer pessoa capaz de manusear um 
instrumento letal para defender seu reino e a vida de seus súditos. Os 
governadores locais (manis) fizeram o mesmo em suas províncias, 
havia ainda nas tropas africanas o reforço de 190 mestiços e 29 
portugueses que moravam na capital Banza Congo. Ao todo, as fontes 
relatam que suas tropas somavam aproximadamente cem mil homens. 
A princípio, a batalha aparentava certo equilíbrio. Os portugueses, 
em menor número, organizaram suas formas em forma de quadrado, 
buscando atingir preferencialmente as chefias congolesas. Eles 
30
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
contavam com a chuva para tornar ineficazes as armas de fogo dos portugueses, 
e a chuva veio. O quadrado portuguêsestava sendo demolido pelas forças 
africanas, quando tudo parecia próximo do fim, uma pequena bala acertou em 
cheio o manicongo D. Antônio I, que caiu morto, logo um soldado negro, aliado 
dos portugueses, rapidamente degolou a cabeça do rei e ergueu-a o mais alto que 
pôde com sua lança. Houve um arrefecimento das forças africanas, e os africanos 
acabaram derrotados e saqueados. Para uma melhor descrição desse episódio, 
permita-me, prezado cursista, a longa transcrição do trecho de um contemporâneo 
deste evento:
Teve o governador notícia certa que, quando foi o sucesso 
da batalha do rei do Congo, da nossa gente que de lá fugiu 
com temor de tão numeroso poder, alguns soldados brancos e 
muita gente preta passando pelas terras e senhoria do Dembo 
Manimotemo Aquingengo, toda a nossa gente do arraial 
era degolada, que esta foi a primeira nova que até a cidade 
chegou de ser todo o nosso exército roto e desbaratado. Este 
dito Soba por que ter também ser participante com o nosso 
inimigo naquele gosto e contento, degolou tudo o que lhe veio 
dar as suas terras que não estavam bem distantes onde foi a 
batalha, depois disso vendo e sabendo o nosso bom sucesso, 
verificando a cabeça do próprio rei que lhe passou por sua 
banza e senhorio, ficou muito atônito do que havido obrado 
contra a nação portuguesa, o que verificou-se e sabendo 
com certeza se resolveu o governador em mandar castigar 
semelhante excesso, para o que chamou de conselho e 
propôs esta matéria com pessoas doutas se era justo castigar 
semelhante crime e desaforo; e pelas pessoas que podiam 
ter voto sobre semelhante malefício foi resolvido que sem 
embargo que aquele Soba Dembo reconhecia em outro tempo 
ao rei do Congo, e estava em nosso poder e reféns e penhor 
do comprimento das capitulações, não podia bulir consigo em 
favorecer o partido daquele rei ainda que fosse de seu senhorio 
se não mostrasse neutral e não fazer nada de si nem por uma 
parte nem outra com o que havia delinquido, e era digno de 
todo castigo pelo que havia obrado (CADORNEGA, p. 218).
Apesar do português um tanto quanto arcaico, podemos perceber o grande 
impacto causado pela batalha de Ambuíla em 1665. No imaginário português, a 
Guerra seria a vitória do verdadeiro cristão sobre os infiéis africanos, e em última 
análise ela representou a unificação dos reinos da África central e um controle 
maior sobre o grande pulmão que passou a impulsionar a atuação dos europeus 
na África Central: o tráfico de escravos, tema de nosso próximo capítulo. 
31
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
Atividades de Estudos: 
1) Com base nos temas estudados nesse capítulo, pesquise e 
crie um texto comparando o processo de ocupação portuguesa 
efetuado no Brasil e na África Central. 
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2) Com base no material desse capítulo, crie uma aula e apresente 
aos seus colegas em forma de seminário, contendo os seguintes 
itens: a) tempo de duração; b) material utilizado; c) atividades que 
irá desenvolver; d) resposta esperada dos alunos.
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 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
Referências 
ALENCASTRO, Luís Felipe de. O trato dos viventes: a formação do Brasil no 
Atlântico Sul. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. 
BOXER, Charles. O império marítimo português, 1415-1825. São Paulo: 
Companhia das Letras, 2002.
BUARQUE DE HOLLANDA, Sérgio. Raízes do Brasil. Companhia das Letras, 
1997. 
CARDONEGA. Francisco de Oliveira. História Geral das Guerras Angolanas. 
Lisboa: Agência Geral do Ultramar, 1972.
FERREIRA, Roquinaldo. Brasil e a Arte da Guerra em Angola (sécs. XVII e XVIII). 
Rio de Janeiro, Revista Estudos Históricos, v. 39, 2007. 
FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala: formação da família brasileira sobre 
o regime patriarcal. São Paulo: Global, 2006.
GLASGOW, Roy. Nzinga: resistência africana à investida do colonialismo 
português em Angola. 1582-1663. São Paulo: Editora Perspectiva, 1982.
GONÇALVES, Rosana Andréa. África indômita: missionários capuchinhos no 
reino do Congo (século XVII). Mestrado em História Social, USP, 2010.
MENEZES, Sezinando. “O jesuíta e o sapateiro: de regno de cristhi in terris 
consumato”. Revista Brasileira de História das Religiões, São Paulo, v. 11, 
2011.
Algumas Considerações
Caro pós graduando, neste capítulo estudamos os principais motivos que 
levaram o reino de Portugal a ocupar a vanguardas na expansão ultramarina. Além 
disso, identificamos como aconteceu o processo de ocupação dos portugueses na 
África Central, entre os séculos XV e XVII, e os principais mecanismos utilizados 
pelos portugueses para assimilar e controlar a população africana e os recursos 
utilizados por tais africanos para negociar com os europeus.
No capítulo seguinte, abordaremos a escravidão e tráfico de negros, pois 
iremos compreender o modo como o tráfico de escravos evoluiu ao longo dos 
séculos. Apresentaremos as regiões de embarque, as formas de captura de 
homens e mulheres transformados em escravos e as interpretações divergentes 
ao longo da historiografia acerca do número de escravizados embarcados. 
33
Negociação e Conflito: Portugueses em África Capítulo 1 
PRADO JR. Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. São Paulo: 
Brasiliense, 1994.
PUNTONI, Pedro. “A Arte da Guerra no Brasil: Tecnologia e estratégia militar na 
expansão da fronteira da América portuguesa, 1550-1700”. Novos Estudos, 
CEBRAP, São Paulo, v. 52, 1999.
REGINALDO, Lucilene. O rosário dos angolas: irmandades de africanos e 
crioulos na Bahia setecentista. São Paulo: Alameda, 2011.
SILVA, Alberto da Costa e. A Manilha e o Libambo: a áfrica e a escravidão de 
1500 a 1700. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002.
SOUZA, Marina de Mello e. Reis negros no Brasil escravista. Belo Horizonte: 
Editora da UFMG, 2002.
34
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
CAPÍTULO 2
Uma Viagem Sombria: Escravização e 
Tráfico, Séculos XVII ao XIX
A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
� Examinar o modo como o tráfico de escravos evoluiu ao longo dos séculos.
� Apresentar as regiões de embarque e as formas de captura de homens e 
mulheres transformados em escravos.
� Apresentar as interpretações divergentes ao longo da historiografia acerca do 
número de escravizados embarcados. 
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 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
37
Uma Viagem Sombria: Escravização e Tráfico, 
Séculos XVII ao XIX
 Capítulo 2 
Contextualização
Prezados pós-graduando, neste capítulo vamos estudar um processo de 
suma importância para compreendermos todo o continente africano e a formação 
do Brasil: o tráfico de escravos. 
Entre a segunda metade do século XVII e a primeira metade do século XIX, 
cerca de 10 milhões de pessoas, homens, mulheres e crianças, foram arrancadas 
violentamente de sua terra natal para realizar uma longa travessia, deixando para 
trás familiares, bens materiais, amigos, redes de sociabilidades, enfim, tudo o que 
amavam,com destino ao Brasil.
Essa viagem, sem dúvida, configurou-se na maior imigração forçada do 
planeta, conhecida também como diáspora africana. O conceito de diáspora nos 
remete à mudança de um povo. 
Podemos definir como tal a imigração forçada ou não. O Brasil formou-se por 
meio de várias diásporas étnicas, principalmente de imigrantes europeus no final 
do século XIX. 
No entanto, sem dúvida, a africana foi a maior e a mais brutal. Ela representou 
uma mudança na estrutura social da África e a completa mudança da sociedade 
brasileira. 
Veremos, neste capítulo, um pouco mais sobre esse tema. Quantos 
escravos foram trazidos? O que a bibliografia diz acerca deste tema? Quais as 
interpretações clássicas? Como é possível quantificar o número de africanos vindo 
para as Américas? Espero que você, cursista, possa compreender um pouco mais 
esta dinâmica e intricada rede. 
O Tráfico
O tráfico de seres humanos escravizados existiu em várias 
sociedades ao longo do processo social não planejado chamado pelos 
historiadores de história. Essa prática era comum em várias culturas 
europeias, incluindo eslavos e nórdicos, passando por orientais, 
como chineses e japoneses. Todas elas em algum momento tiveram 
a organização do trabalho de maneira compulsória, chamada de 
escravidão, e também de corveia na Idade Média europeia.
Essa prática era 
comum em várias 
culturas europeias, 
incluindo eslavos e 
nórdicos, passando 
por orientais, 
como chineses e 
japoneses.
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 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
A escravidão na Grécia: na antiguidade também houve o 
processo de escravização de pessoas. Na Grécia os escravos eram 
usados principalmente na agricultura, o principal pilar econômico 
da Grécia. Alguns pequenos donos de terras podiam possuir um 
ou dois escravos. Um grande acervo de manuais para donos de 
terras confirma a presença de dezenas de escravos nas maiores 
propriedades; eles podiam ser trabalhadores comuns ou capatazes. 
A extensão do emprego de escravos na agricultura é motivo de 
debate; sabe-se, contudo, que escravidão rural era muito comum em 
Atenas. Mão-de-obra escrava também prevalecia em minas e em 
pedreiras, onde grandes populações escravas eram frequentemente 
contratadas por cidadãos ricos. General Nicias contratou mil escravos 
que trabalhavam nas minas de prata de Laurium; na Ática Hiponicos, 
contratou 600; e Filomides, 300. Xenofonte indica que cada escravo 
recebia um óbolo por dia, somando, assim, 60 dracmas por ano. 
Esse era um dos investimentos mais valorizados pelos atenienses. 
O número de escravos trabalhando nas minas de Laurium, ou então 
nos moinhos que trabalhavam os minérios, era estimado em 30000. 
Xenofonte sugeriu que a cidade comprasse mais escravos, de modo 
que cada cidadão tivesse três escravos, pois a contratação deles 
asseguraria uma boa renda para todos os cidadãos.
Para que tal forma de trabalho obtivesse resultado, era necessário “reduzir” 
(termo utilizado no século XIX) a pessoa à escravidão. Quando tal redução atingia 
o status de negócio, era preciso montar uma estrutura mais ampla envolvendo 
diversas redes de negociantes e fornecedores. Os cálculos e o detalhamento dos 
custos de cada ação deveriam ser feitos minuciosamente, para cada ação deveria 
existir uma pessoa habilitada para sua execução, e várias eram as atribuições 
específicas do comércio de seres humanos. 
No continente africano, esta formação de um mercado específico para tal 
fim começou a partir de 1650, mas o tráfico já existia desde as chegadas dos 
portugueses no século XV, na África Central, mas tomou proporções alarmantes 
em fins do século XVIII até meados do século XIX. 
A escravidão, praticada até então de forma menos intensa e 
mais ligada à política, transformou-se. Ela passou a crescer e a 
tomar conta da sociedade em várias partes do continente. Ninguém 
conseguiu conter suas redes. A África e os portugueses transformaram 
a escravidão numa Hidra de Lerna. 
Ela passou a crescer 
e a tomar conta da 
sociedade em várias 
partes do continente.
39
Uma Viagem Sombria: Escravização e Tráfico, 
Séculos XVII ao XIX
 Capítulo 2 
A Hidra de Lerna era um animal da mitologia grega. Um dragão 
com sete cabeças e para cada uma das cabeças cortadas nasciam 
duas. Em seu segundo trabalho, Hércules, personagem da mitologia 
grega, derrotou a Hidra, utilizando a técnica de cicatrizar rapidamente 
a cabeça cortada com fogo. 
Quais as ligações com a América? Quais os Estados envolvidos? 
O que recebiam? 
Alberto da Costa e Silva. A enxada e a lança: a África antes dos 
portugueses. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1992. 
 _____. A manilha e o libambo: a África e a escravidão de 
1500-1700. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005. 
O diplomata e historiador Alberto da Costa e Silva escreveu dois importantes 
livros sobre a África. O primeiro, um tomo de aproximadamente seiscentas 
páginas, é dedicado à África pré-colonial, já o segundo, igual em tamanho, 
analisa o impacto da presença dos europeus, principalmente os portugueses, 
no continente. Tal divisão não se deu de forma aleatória, representa o impacto 
e o choque de civilizações que tivemos depois dos primeiros contatos entre as 
duas culturas. Logo, o próprio título do material demonstra claramente o quanto 
o continente africano foi influenciado pelos europeus. Para compreender e se 
aprofundar mais neste tema, recomendo estes dois tomos como os melhores 
guias sobre África em língua portuguesa. 
Voltando aos nossos temas iniciais, a escravidão e o tráfico, cabe responder 
algumas indagações sobre a parte mais importante envolvida nessa imbricada 
rede: os africanos.
40
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
Em que parte lhes cabia a agência (termo emprestado do inglês agency, sem 
tradução específica para nossa língua)? Essas são questões complexas sobre as 
quais iremos nos debruçar doravante. 
Tráfico Africano e Conexões 
Brasileiras
O destino da quase totalidade dos africanos escravizados era a 
América, dentre os países da América, o que mais recebia escravos, 
o líder absoluto, era o Brasil. No continente africano, os lugares que 
frequentemente forneciam homens e mulheres para a travessia atlântica 
era a África central, representada por vários Estados, denominados 
genericamente de região de Angola e região do Congo, o Golfo do 
Benim e a Costa do Ouro. 
Na África Central, os portugueses detinham um controle 
privilegiado, como estudamos capítulo anterior. E desta parte saíram a maioria 
dos escravos desembarcados nas Américas. Dessa forma, constatamos que 
boa parte dos escravizados no Brasil nasceram em Angola, certo? Não, errado. 
As etnias dos africanos eram múltiplas e o fato de Angola ter fornecido o maior 
número de pessoas não quer dizer que os escravos fossem em sua maioria 
angolanos. Até porque a mobilidade de homens e mulheres escravizados era 
enorme, principalmente depois de 1650 até o terceiro quarto do século XIX. Além 
disso, no Brasil, a reprodução dos escravos, por meio de casamentos, criou uma 
segunda geração de cativos, denominados pelos contemporâneos de crioulos. 
O número de cativos diminuiu também com o fim do tráfico de escravos para 
o Brasil, aprovado pelo congresso em 1850. 
Para uma análise dos debates e embates envolvendo essa lei, 
ver o livro: RODRIGUES, Jaime. O infame comércio: propostas e 
experiência do final do tráfico de africanos para o Brasil. Campinas: 
Editora da Unicamp, 2000. 
O termo crioulo guarda uma particularidade. Até hoje é comum 
ouvirmos pessoas referindo-se de forma pejorativa a pessoas negras 
pelo nome de crioulo, para homens, e crioula, para mulheres. 
O destino da 
quase totalidade 
dos africanos 
escravizados era a 
América, dentre os 
países da América, 
o que mais recebia 
escravos, o líder 
absoluto, era o Brasil.
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Uma Viagem Sombria: Escravização e Tráfico, 
Séculos XVII ao XIXCapítulo 2 
A maioria dos escravizados da África Central passavam pelo mesmo 
caminho: o mercado do Valongo, localizado na cidade do Rio de Janeiro, neste 
período já capital do Brasil. 
Figura 3 - Mercado de Valongo
Fonte: Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/
sinapse/ult1063u156.shtml>. Acesso em: 10 nov. 2012.
A pintura do famoso pintor francês Jean Baptiste Debret retrata o 
Mercado de Valongo, que ficava localizado hoje no centro da cidade 
do Rio de Janeiro, onde, no século XIX, os escravos africanos recém 
chegados eram vendidos. 
O comércio entre o Rio de Janeiro e Luanda estava estabelecido desde 
o começo do século XVIII e se enraizou no século seguinte. Tal comércio 
transformou a cidade brasileira, na primeira metade do século XIX, numa espécie 
de pequena África, devido ao grande número de escravizados que fizeram com 
que o índice de africanos entre a população fosse altíssimo. 
Essa maciça presença de africanos não passou despercebida por pintores 
que representaram a cidade por meio de seus pincéis, como os europeus Debret 
e Rugendas. Carlos Eugênio Líbano Soares, em seu importante estudo sobre 
http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u156.shtml
http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u156.shtml
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 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
a capoeira escrava na capital fluminense da primeira metade do século XIX, 
comentou alguns aspectos da pintura do último pintor citado:
Como transparece nas gravuras de Debret, os africanos do Rio 
de Janeiro joanino gostavam de se apresentar vistosamente, 
misturando estilos africanos e enfeites europeus. As formas 
de identificação étnica variavam. Tudo indica que o barrete 
vermelho e as fitas eram símbolos exclusivos de algumas 
etnias, enquanto outros africanos, como os da África Ocidental, 
partilhavam diferentes formas de identificação (SOARES, 
2004, p. 81).
Figura 4 - Fazenda de café no Rio de Janeiro
Fonte: Disponível em: <http://historiacepae.blogspot.com.br/2012/04/
memorias-analise-da-imagem-batuque.html>. Acesso em: 10 nov. 2012.
Atividade de Estudos: 
1) O que é possível analisar a partir da obra do pintor Rugendas 
(Figura 2), na qual os escravos foram retratados em uma fazendo 
de café no Rio de Janeiro?
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http://historiacepae.blogspot.com.br/2012/04/memorias-analise-da-imagem-batuque.html
http://historiacepae.blogspot.com.br/2012/04/memorias-analise-da-imagem-batuque.html
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Uma Viagem Sombria: Escravização e Tráfico, 
Séculos XVII ao XIX
 Capítulo 2 
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Os grupos no começo do século estavam formados, isso quer dizer que 
existiam formas de solidariedades étnicas na cidade desse período, tendo em 
vista que os grupos de africanos da parte central do continente andavam juntos, 
e este tipo de identificação era diferente dos oriundos da África Ocidental. A partir 
deste pequeno trecho, é possível perceber o grande número e a diversidade de 
pessoas que a cidade recebia. 
Para saber mais sobre africanos no Rio de Janeiro do século 
XIX, ver o livro: KARASH, Mary. A vida dos escravos no Rio de 
Janeiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. 
Outra rota secular que envolvia o tráfico de escravos no Brasil era Salvador 
e o Golfo do Benim. A capital baiana possui um dos índices mais altos de pessoas 
declaradamente negros e negras atualmente. Segundo o recenseamento realizado 
pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 82,4% da população da 
cidade é formada por negros ou pardos. 
A maioria dos escravos importados para o norte do Império (não existia o 
termo nordeste) desembarcava na Baía de todos os Santos. Os falantes de língua 
ioruba e os Haussás muçulmanos entraram maciçamente na região, ocupando, 
além de Salvador, o Recôncavo baiano, que contava com várias cidades como 
Cachoeira, Amargosa, Santo Amaro da Purificação, entre outras.
44
 HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS: DA DIVISÃO COLONIAL AOS DIAS ATUAIS
Sobre as revoltas de africanos na Bahia, veja o livro : REIS, João 
José. Rebelião Escrava no Brasil: a História do Levante dos Malês 
em 1835 (Edição revista e ampliada). 2ed. São Paulo: Companhia 
das Letras, 2003.
Os traficantes baianos mantinham relações de amizade com 
grandes traficantes africanos e até mesmo com soberanos locais. Era 
comum o envio de filhos de reis africanos para estudar na Bahia, e 
alguns deles viajavam para a África duas ou três vezes por ano, para 
administrar seus negócios naquele continente e conhecer a região que 
os tornava ricos e poderosos. 
Francisco Félix de Souza, conhecido como Xaxá, foi um dos mais conhecidos 
destes comerciantes. Nascido na cidade de Salvador em 1754, ele morreu no ano 
de 1849 em Uidá, no Benim. Com uma identidade cultural difícil de ser decifrada, o 
“brasileiro” teceu relações comerciais com a África muito além do mero escambo. 
Casado com várias mulheres africanas, filho de um traficante baiano, assumiu o 
cargo de governante da fortaleza portuguesa de São Batista de Ajudá no começo 
do século XIX e depois passou a investir pesadamente no mercado de escravos, 
enriquecendo muito. 
Em sua trajetória africana, ele desafiou alguns soberanos locais, se tornou 
conselheiro de outros, sempre vivendo na sua dupla fronteira cultural. Terminou 
seus dias no reino de Daomé, não desfrutando da riqueza de antes, mas com 
prestígio perante a monarquia. Sua biografia pode ser lida no belíssimo livro de 
Costa e Silva, publicado no Brasil no ano de 2004. Para ele, o Xaxá tinha as 
seguintes características: “Francisco Félix era, ao que tudo indica, um homem de 
notável inteligência, incomum habilidade e grande encanto pessoal, no trato com 
os brancos e com os grandes do Daomé” (COSTA E SILVA, 2004, p. 147). 
Ele escolheu deixar o Brasil e fixar-se em África, onde chegou a construir, 
em dado momento, um verdadeiro império, a partir de suas redes dos dois lados 
do extenso oceano atlântico. Seu caso, apesar de extraordinário, representa bem 
os laços seculares que envolviam baianos e habitantes do Golfo do Benim. 
Segundo Costa e Silva, essa proximidade teve como facilitadora a qualidade 
de um produto que era trocado por escravos no Golfo do Benim e também na 
Costa do Ouro, o tabaco baiano, muito apreciado pelos africanos. Os comerciantes 
levaram o navio carregado deste material e retornavam cheio de pessoas:
 Os traficantes 
baianos mantinham 
relações de amizade 
com grandes 
traficantes africanos 
e até mesmo com 
soberanos locais.
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Uma Viagem Sombria: Escravização e Tráfico, 
Séculos XVII ao XIX
 Capítulo 2 
Os brasileiros contavam com uma vantagem: o 
tabaco. Mercadoria indispensável ao comércio 
na região, os próprios holandeses e ingleses 
procuravam adquiri-lo dos barcos baianos, a fim 
de compor os conjuntos de produtos que ofereciam 
pelos escravos. Nessas relações, era raro faltar o 
tabaco. Não qualquer tabaco: o tabaco em rolo da 
Bahia. Nem tampouco qualquer tabaco em rolo 
da Bahia, mas aquele feito com folhas partidas 
e banhado em melaço, que, na Europa, se tinha 
como de qualidade inferior. Na África era, porém 
apreciadíssimo: os mais exigentes consumidores 
não dispensavam o seu sabor adocicado (SILVA, 
p. 542).

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